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DATDR COMP 5 T ------- MATTEO BON FITTO ... deo s r t v o e o r ai 1 c a ar e re- f o e son e OLI 5" e - res, ~ ve o es a o a a e co eCI ento" e q e as co e- ensao I t eri e ca er e ao o ue as çao os e e e tO ta r ue a b "ca la je -fat I - t UI "', t \() I" l ' . I ~ J, ~ ~~,a o estudos estudos estudos ~\\",~ ~~ ~ EDITO R A PER SPECTI V A~,\\~ ~\"I,~ ~~ ~ EDITORA P E R S PECT IV A~/I\~ ISB N 85 2 730284- 5 I I~ I~ 9 79 85 2 7 3 0 2 8 4 4 C o rno p ensar e m " corn p os tç ã o " n o trabalho d o a to r '! E is o ponto d e pa rtida d este i m p o r t a n t e es t u d o realizad o e m O Ato r-C o mpo s itor . por M atfeo Honfitt o . Ape s a r d e n umerosas p e squisas sobre a a tua ç ão e m preend id a s po r g r and e s n ome s d o t e atro oci den t a l d o século XX. a " Irrte r -prefaç ã o d e s i m e srno ' " c o ntinua sen d o a té hoje uma p r ática que se f a z p resen te n o p rocesso c r-ta t fvo d o c o med ia n te e se d e fine c o m o uma e s p écie d e forma c ongcnia l o u es til o i n ere n te . C o m base n e ste f a t o e c ond u z ido p e la idéia d e que () t eatro é. s obretudo. u m exercício d e arte o bjct tvado com d elibera ç ão no corpo d o i nté r prete, a pesquisa aqui proj etada vr-as t r-efa " n a s p ráti c a s artísti cas os elernerrtos essenciais que, c n l c o n j u n t o corn a Invest fgu çêo s is t e m á ti c a . Ievar-am ao d e s en vol v imento de diferentes m étodos de c ons truç ã o e p lasnulç ão d a obra d e mrto-fn c o r -pcn-a ç ã o d o awror-e obje t o , Matteo Bonfitto o ATOR-COMPOSITOR AS AÇÕES FíSICAS COMO EIXO: DE STANISLÁVSKI A BARBA _~\\J~ ~ ~ EDITORA PERSPECTIVA~,\\~ o mundo não é aquilo que eu penso, mas aquilo que eu vivo; eu estou aberto ao mundo, comunico-me indubitavelmente com ele, mas não o possuo, ele é inesgotável. MAURlCE MERLEAU-PONTY A gradeço p r im e ira men te ao Prof: J . G u íns b urg. meu o rien tad o r; c uj a cola boração f oi fundamenta l para a definição e para o d es en- volvimento desta pesquisa. A gradeça também a S ílvia F ernandes ; a L u iz Fernando Ramos;ao es critor Fernando Bonassi; a N ic o le Pscherz. a prime ira t e trora :e a ciu as i m por ta n tes co m p anh e ir a s d e trabalho e d e p esquisa :Beth L opes e Ye d d a C ha ves. A g radeço . por fim , a algun s da q u e les que c o n tr ib uíra m para a construção d e meu s a b e r pragmático c o m o a tor, s em o q ual este trabalho não s e rea lizaria : Grarieta Rodrigues. Luís O ctavto B u rnie r; Luís Damasceno . C e l so Frateschí, Enrtc o Masserott, A ntonio Fava. O noe Ozomn. Judith Mottna, R o b erto Carrer i, J ohn Kalamandalam, C esa r B rte , J o s eph S vobod a , A na K ohler, Ir-faria H elena L opes. S tep h a n S tro ux; Beth L opes e Yoshi Dida Sumário UM MOD ELO DE COMPOSIÇÃO - Sílvia Fernandes XIIJ INTRODUÇÃO : . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XVII I. A CODIFICAÇÃO DOS MATERIAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. I I. I. François Delsarte: Da Representação á Expressão . . . . . . . 1 1.2. E. Jacques-DaIcroze: A Centralidade do Ritmo !O 1.3. Os Teatros Orientais : Ética e Percepção 13 1.4. O Conceito de Material e sua Classificação 16 2. A AÇÃO FíSICA COMO ELEMENTO ESTRUTURANTE 00 FENÔMENO TEATRAL. 2 1 2. 1. Ações Fisicas: Breve Histórico e Aná lise do Conceito . . . 2 1 2. I. I. C. Stanislávski: da linha das forças motivas ao método das ações flsicas 2 1 2.2. Ulteriores Contribuições para o Desenvolvimento do Conceito de Ação Física 37 2.2. I. Vsevolod E. Meierhold: a pré-interpretação e as diferentes matrizes 37 2.2.2 . RudotfLaban: o esforço e o corpo do espaço 49 2.2.3. Antonin Artaud: a respiração e a materialização do s sentidos _ 55 2.2.4. Étienne Decroux: o ator di/atado 59 2.2.5. Bertolt Brecht: o gestus - síntese crítica e dialética na ação o •• •• ••• •• • • • • • • 63 Xll o ATOR-COMPOSITOR 2.2.6. Michael Tchékchov: a incorporação das imagens e atmosferas. O gesto psicológico. . . . . . . . .. 69 2.2. 7. Jerzy Grotóvski: os impulsos e suas in/tensões. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 73 2.2.8. Eugenio Barba: os principias interculturais e a subpartitura 76 2.2.9. Outros teatros: tensões e intersecções. . . . . .. 81 2.2.10. A ação física: horizontes e fronteiras. . . . . . .. 95 2.3. O Movimento, a Ação Fisica e o Gesto 104 2.4. Relações Intratextuais: Elementos de Construção Dramatúrgica 109 2.4.1. A açãofisica e o espaço 110 2.4.2. A açãofisica e ofigurino 110 2.4.3. A açãofisica e os objetos 112 2.4.4. A ação fisica e a luz 113 2.4.5. A açãofisica e a música 113 2.4.6. A ação fisica e a palavra 115 2.5. A Ação Fisica como Elemento Estruturante do Fenômeno Teatral: Uma Hipôtese 119 3. OATOR-COMPOSITOR 121 3.1. Improvisação: Espaço Mental - Método - Instrumento 121 3.2. A Personagem e o Actante: Ainda a Unidade Psicológica? 125 3.3. O Ator-Compositor. 135 BIBLIOGRAFIA 143 Um Modelo de Composição Em palestra recente, a ensaísta Joset te Fé ral teceu consideraçõ e s p recis as sobre a relaçã o entre a teoria e a p ráticado teatro. A reflexão acerca das lig a çõ es de pensamento e cena no pano rama contemporâ - ne o fo i preced ida de uma a b rangen te análise do trânsito que sempre uniu a pro duç ão teórica ao palc o , nas várias fa se s da h istória teatral. Consta ta ndo a recorrência desse v ínculo, F éral fez q uestão de destac ar a m udança s ubstan t iva que acompa nho u a p as sa gem d o teatro-diver- são-p ura , ca rac te rís t ico d os pa lco s e lizabetanos, o nde os espetácu los eram a u m só te mpo o bj eto d e consumo e e lemento d e atua lização d o contrato social palco-platéia, para o teatro-arte-pura inaugu rado pelos s im bolistas franceses no s estertores d o sécu lo X IX. A mudança de foco d a concreta rea lidad e do corpo para os mistérios abstratos d a alrna te ve como resultado visível o afasta mento do p úblico , talvez m a is in te ressa d o em dive rtir-s e do q ue em sondar, v ia correspondências, os in v is íve is segred os de u m outro mundo. Acompanhando o pau latino d is tanc iame n to do espectador, a teo- ria teatral a fa s to u -se, por seu tu rno,. da prática do teatro, como se en- dos sas s e a ruptura do contrato social palc o -p latéia. O resultado de mais de um séc u lo d e s ep araç ão q uase constante foi a clivagem que pas sou a desviar os estudos teór icos da prática do tea tro . Especial- m ente a parti r d o s a nos de 19 50 , a s imbio se entre estud os e realização, teoria e profi ssão, parecia irremediave lmente perdida. B e m ard D ort pareceu a ntecipar o d ia gn ós t ico da situaçã o q uando localizou nos anos de 19 20 a lg uns dos re sulta d o s ma is contu ndentes d e s sa cisão, com a XIV o ATOR-COMPOSITOR publ icação dos p r imeiros escritos o rien ta dos p o r u m a a b o rdagem p u - ramente teórica. Po lt i, M ukar óvs k i , S'curiau, V il tiers e A ndré Veinstcin fi g u rariam n o ro l do s a u tore s d as p rimeira s reflexõ es teorizantes, e m s e n ti d o e s tr ito , nos es t u dos teatra is . E sse p roce sso de d is tanciame nto deu-se d e forrnas distin tas , m a s talve z valha a p ena res salta r, c orno reflex o con temporâneo d e s s a d e calagem, o pesq uisa dor que se tran sfo rma e m c r ít ico, afastando-s e ca d a vez m ais dos processos c r iat iv o s para olhar o teatro como o b ra acabada. A estét ic a d a recepçã o d e Jaus s e Herbert Blau, c o laboran d o pa ra transforma r o es pectado r e m criador d e sua p ró pria c e n a imag iná- ria, foi o utro p a ss o n a tr ilh a d e a u ton o m ia s imultânea de pa lco e p la téi a. N o que di z respeito à pesquis a unive rsit ári a , o s s in to m as m a is co muns d e ssa s ituação são a s p esquisas q ue, m es m o produzindo uma reflexãote óric a consiste n te , ra ramente se debruça m sob re o ato da criaçã o . É ness e s e n tid o que o b r i lhante trabalho d e M a tteo B onfitto vem p re enc h e r u m a lacuna. Fa z parte d o s esfo rço s d e re to m ada do pensamento tea tral l igado à prática , te ndência que e merge com fo rça n o s e studo s univ e rsitários d o s últ im o s arios , n o B ra sil e no exter ior. N o caso de Bo n fi tto , a import ância d o resgate é a inda m a io r se pensarmos q u e se trata de um a to r e x c e lente , afinado c o m os p ro ced i- m ento s m ais recen tes de c r iaçã o teat ra l. Aliando formaç ão teórica rigo- ro sa à prática e ao ensino d o teat ro , empre sta seus co nhec im e n tos d e hist ória, esté t ic a , s e m iologia e teo ria do jog o à inve stig a ção d o s p ro- c esso s de c riação do ator, o ferece ndo uma p ro v a concre t a d e q ue a c o la b o ra ção estreita ent re a te ori a e a prática é pro dutiva e p o s s ível. Com pree nder a produçã o te atral com o pes q uisa e a pe squisa co mo prátic a d o teatro é , se m d úvida, a con tr ib u ição m a io r deste li v ro e tam - bém u m a fonna eficaz de apropriar-se do t raba lh o d o a tor para e n te ndê- lo como c ompo s içã o inte l ig e n te . q ue trans forma m a te ri a is e mentalida - d e s ao p rodu z ir sensib ilização e ação . Ess e é o p o n to de p a rtid a d a pesquisa. Como um m ú sico o u um p in to r, o a tor é um composito r que s is tem atiza p ro c e d imento s quando planeja , c omb ina, constró i e e x ecu- ta s u a p a rtitura d e ações. A s a ções fis ícas, hoje c onsidera das e lemento fu n d a n te d o fe n ô - m eno te atral, fu ncio n a m como g u ia privilegiado n o percu rso de d iscri- m inaç ão d e pro ced imen tos c r ia t ivos . U sando a di ac ron ia para d a r con- ta d o s d ive rso s estági o s da p rát ic a d o a tor, o a utor s e detém com m a is vaga r, como n ã o p oderia d e ix a r d e s e r, n o m étodo p sic ofís ic o de S tan is lávski . e m q ue as açõ e s ag e m co m o isca s d e p ro c e ssos interio re s e co m o cata li s a dores de um sistem a. A n tes d is so , por ém , re sg ata as o r ige ns d o conce ito e d a p rática d a ação fi s ica . Traçando o m a pa d a mirra, re cupera . j á n o princíp io d o li vro , e tal v ez d e forma in éd ita n o Brasil , o famoso, ruas pouco conhecid o , S iste m a d e Esté t ica Aplicada , d e Fra n ço is D els arte, re petin d o .. e l TI a b o rdagem d e ta lhada.. e x a ta e inte - Iige n te , o m o v im e n to d e a liar corpo e esp írito q u e e spelha a j unção UM M O DELO DE C O M POSIÇ Ã O Xy teoria/prátic a refer ida há pouco . Sem dúvida Matteo B o n fi tto sabe a q ue se refere quando c ita Dels arte : "Para cada funç ão esp ir'itua l, cor- responde u m a função d o corpo; p ara cada grande função do corpo , co rre spon d e um a to espiritual" . O n ível d e detalham e nto e d e rigo r com que são expostos o s g ê n e - ro s e e spé c ies d e D elsarte é u m exem plo d o s p ro c ed imentos que o pesq uisa dor u tilizará até o fin al d o li v ro, traçando u m panorama c o m - pleto e inteli g en te d o s princípio s d e a tuaç ão discriminados por artista s que . ass im c omo S tanis lá v sk.i, produziram um teatro q ue tem como eixo o intérprete. M eierhold , L a b an , Étien ne Decro u x , M ic hael Tch ékho v, J e rzy G rot óvsk i , E ugen io B arb a . Pina B ausc h e os tea tro s o r ien ta is . rep res entados n a reco nsti tuição primorosa d o m od elo d e kata, são relidos p e lo fi ltro inédito das ações fi s ica s , servindo c o mo s iste mas - fo n te para a o peraç ã o d a s matrize s g e rad o ras. d o s e lem e ntos e dos procedimento s d e com pos iç ão d e s s as ações . Mesrn o e m p e squisas rec e n tes, como a d o sem iólogo italiano Marco D e Mar in is , não s e co ns- ta ta o m e sm o g rau de a p ro fundamen to e d e a bran gênc ia no trato n a que s tão. Além do ined it ismo d a propost a e da qua lidad e inquestionável d a exe c u ção , conv ém lembrar a uti lidade d este li vro para o ator b ras il eiro . N o m o vimento , e x tre m a m e n te g e n e ros o , de soc ia l ização d e s e u sab e r e d e s ua prática , B onfitto s u bst itu i as m itologias d ifusa s d e gen ia l id a de, tale n to e inspir a ção , que tornam o teatro inaces sível à g ra n d e m aioria . por materiais con c retos e palpá veis . disponíveis a a tores e pesquisa- dores capazes d e o p ta r pelo trabalho teatral exig ente . c onstruído a long o p razo e se m conc es s ões. F u n c ion a n d o co mo m o de lo d e u m nov o hom e m de teatro . c r ia d o r d o proj e to estético, m e stre d o s instrumento s d e a tuação, a utor de partit u ras e m que sa ber e fa zer s e harmonizam, o a to r composi to r é prova irre futá v e l de intelig ênc ia prática e in v e n tividad e te ó ri ca. Sílvia F ern andes Introdução Ajustar as lentes. E ste é o o bj e t ivo d esta introdução. Ajustar o o lhar em relação ao objeto que será exam inado: o ator-compositor. Um ator q ue c ompõe. Mas antes de refletir sobre esse ator., examinemo s o conceito que o espec ifi ca - composição. P ois b em : '"'co m p o r H : fo rmar d e várias par tes; e n tra r na c o nsti- tu iç ã o d e ; consrituir; arranj ar; dispor; pro duzir: f azer; escrever. .. E s s a s s ã o algumas das definiç õ e s pres ente s nos m ais importan t e s d icioná r io s e e nciclopédias . T al termo? a ssim como o conceito del e d e r iv ado - com pos ição - ., é a m p lamen te u t ilizado e n q u ant o instru- m ento de a nálise e apre c ia ç ão artística em várias forrnas d e arte : Música. A rq uitetu ra , Pintura . Escu ltura, D a n ç a (com p os ição coreo- g ráfica), e n o Cinema (a c omp o s iç ã o d a m onta g em em E isenstein .. .) . A lé m d is s o , em fun ç ão de sua im portância, tal c onc eito g e rou d ife - re n te s d isciplin as presen tes nos pro gra m a s pedagógicos d o s cursos d e fonnação artística n o mundo in teiro. Nestes pro g ramas v e mos: com- posição I. 11, III , l V. .. Mas q uando lem o s os p rog rama s dos c u rsos d e formação d o a tor n ã o enco n tra m o s a disciplina "Composi ção". Nada m a is s ensato, en- tão, n o s pergu ntarmos : por q uê? Quais seriam os fatores e n volv ido s , neste c aso. q ue p odem ter contribuíd o para a não ut ilização d e tal c onceito n o caso d a fonna ção d o a tor? Será urn pro blema restrito ao te a tro c hamado ....Ocid e n ta l", em q u e valores român t icos tai s c omo o ri- g ina lida de.. gênio e inspiração a inda p e rmeiam a p r átic a d o ator? Ou X V IIl o AfO R·-COMPOSJTOR tal dificuldade teria relação com os problemas ligados a m até ri a desta forma d e a rt e, ou seja, o aparato psicofisico do se r humano? O objetivo de ste trabalh o não é o de explicar o u dar respostas que possam esgotar a s questões levantadas acima, mas s im busc a r si ste- matizar uma reflexão relacionada ao co/no podemos p ensar s obre com - posição no caso do trabalho do ator. Para este fim, tal refle xã o se servirá de in ú m eras refe rê ncias presentes nos três capítulos que seguem. Dentre as re fe rências ut il iz ad a s, ao men os trê s ut ilizam literalmente o termo " c o m p o s ição " refe rindo-se ao trabalho do a tor: V. Meierhold , M . Tch ékho v e E ug en io Barb a ; o primeiro de m aneira mais a ss ídu a . No entanto, este trabalho, ainda q ue util ize tais referências, não s e limita fi e las e ao horiz onte conceitua l nelas presente. O que se propõe aqui é a sistematização de informaç ões relacionadas à questão descrita ac ima , p or meio de um discurso c onstruído a partir de um c aminho específico , este dividido em três partes o u capítulos. No primeiro capítulo - "'A C o d ifi cação d os M ateriais" -. foram escolhidas trê s referências: François D elsarte, Emile Ja cqu e s-D a lcro ze e os tea tro s o ri e n ta is. T ais escolha s não foramcasuais. Elas represen- tam o s fundamentos q ue dão or ige m a um a nova a tit ud e . a um novo o lhar em relação ao trab a lho d o ator: não mais o olhar que reforça o culto à persona lid ade ou o s m ist érios ligados à performance dos g ran- des a tores. mas u m o lhar que vê o tra balho d o ator e a expressão humana como objet o de con hecimento, como arte. Para tal fim , as três referências a c im a citadas contribuíram de m ane ira determin an te. François Delsarte (18 11 - I 87 1) com o seu Sistema, efetua u m deslo- camen to c onceitual fundamental, que p ermitirá futuras elaborações sobre o traba lho do ator, dentre as quais a do próprio Stanislávski. Delsa rte , a travé s de suas formulações, desloca O pensar so b re o ho- m e m , e conseqüentemente sobre o ator, do pólo d a representação para o pólo da exp ress ão . Para entender a importância de tal deslocamento é necessário que se saiba que a atuação d o ator na Europa do séc u lo X IX era concretizada pelo repres entar. Tal representar seguia e n tão certos códigos d efinidos arbitrariamente por a tores e suas companhias , constituídos n a maioria d a s vezes de poses e ges tos que corresponde- r iam a determinados sentimentos e situações . Dess a forma ao ator bas- tava re p roduzir tais p o ses nas s itu ações adeq uadas , e a "personagem" estava pronta . Com a p a ssag e m da representação à e x pressão, concre- ti zada por D elsarte , n ão somente m a terializa -s e a dimensão d os proces- sos inte ri o re s , com o tamb ém passa-se a consta tar a sua ligação c o m a d imensão fisica do homem. A conexão int erno-e xterno co ncretiza-se enfi m . Feita e ssa conexão, Delsarte c o nstrói um m apeamento d a s ex- pressões humanas dividindo cad a pa rte do corpo ern tríades. Dalcroze ( 186 5 - 19 5 0 ) com a sua Euritmica, a do ta n d o a conexão elaborada p o r Delsarte, aprofunda a re flex ã o sob re as possibilidades expres si va s d o homem e d o ator a partir d e um e lemento que e stará ao INTRODUÇÃO X IX centro d e muitas te orias e poéticas: o ri tmo . O ritmo p a ss a a s e r o e ix o da re laçã o entre o corpo e a mús ica , to m ando -s e assim um elemento p rodutor d e sen t ido. D o s te atros orien tais, o p rimeiro cap ítu lo, será examinado so m ente u rn aspecto: o é tico. P o r ém , tal aspecto não s e rá a nalisado isoladamen- te. mas sim em relação com a percepçã o . Como veremos, durante o século X X ,. no trabalho de determinados artistas como Stan is láv ski. :\ Ie ierho ld, B rec h t, Copeau , G ro tó v s k i e Peter B ro ok, a conexão entre ética e percepção é evid e nte. Tais criad ore s m o straram corno, sem a ati tude ade quada ao t rabalho c riativo, n ão se tornam poss íveis as d e s- cobertas artísticas. Como já d ito , o s a specto s extraidos das re ferências escolhid a s foram fundamentais para a construção de um n o vo olhar sobre o traba- lh o d o ator. As con exões entre dimens ã o interior e exte rior n a expres - s ão huma n a , e ntre ética e percepç ã o e a im portância d o ri tmo, fo.m.ece- ra m ins trumentos que c o n tr-ib u fram para o s u rg irn e n to de s is temas e teo ri a s , essenc iais à co nst ruç ão d e um a tor m ais consciente dos ele- m ento s e da comp lexid ad e d e seu oficio. Ao fim d o primeiro cap ítulo.justific a - se a util ização do conceito d e m ateria l redefinindo-o a partir de Aris tóteles . O a tor q u e compõe, o ator-compositor, n e cessita d e m ate r iais para e xecu ta r se u t rabal ho. o s q u a is são c lassifi c a d o s e m três c ategor ia s - m aterial prim ário: o corp o; secu ndár io: as ações fisicas ; e terc iário : os elemen tos constitutivo s das ações fisicas. N o s egu n d o capítulo, seguindo a cla ssifi cação presente n o final d o prime iro, o o bjeto de estudo se rá o m aterial d efinido, neste trabalho, corrro secu ndário: as ações físicas . V istas aq u i como eixo do trabalho do a tor-com positor. as ações fi s ica s são exam inadas e m seu des envolvi- m e nto dia crô nico . Ou s eja, apó s a d es criçã o d o percurso presente e m Stan is lávski d a L inha de Forças M otiv as ao M étodo das Ações Físi- cas, s e rão examinadas u lteriores contribuições p a ra o d e senvolv imen- to da aç ão fi s ica, p as sando, desta forma, por Meierhold e Brecht a té B arb a , P in a B ausch e os tea tro s orientais . EJn seguida, a partir da d es - crição deste perc u rso. serão d e fini d o s , util iz a n d o-s e d a s refe rê n c ia s já presente s a n ter iormente, os e lementos m ovimento e gesto . A s ações fi sicas serão, então, ana lisadas e m relação aos o utros e lemento s do espet ác u lo : o e s paço, o figu rino, os objetos, a luz , a m ú s ica e a pala v ra. Ao fim d o segundo capítulo uma hipótese s e rá le vantada: a ação física, a partir d a s questões tratadas e d e seus elementos consti tutivos (matr i- zes geradoras. e lemen tos de confecçã o e p ro ce di m ento s de confec- ç ão) , pode ser considerada um elemento es tru t u rante do fenômeno teatra l? Na segunda parte d o trabalho, bu sc a-se , portan to, tra çar um per- c u rs o d iacrôn ico através d o q ual a ação fisica se d e se n volveu e se arnpfiou sej a e n quan to conceito, seja enquanto instrum e n to prático xx o ATOR COMPO SITOR fundamental d o trabalho d o a to r. Nesse sentido , n o processo d e esco - lha do s artistas tratados util izou-se com o critério de seleção a m edida da importância das contribu ições de cada a rtista p a ra o de sen volv i- mento e ampliação d a ação fisica. Esse critério m e possibil itou a grupa r B recht e A rtaud, qu e não colocam o ato r como e ixo absoluto d o fenô- meno teatral, aos o utro s c riadores tratados , para os qu ais o intérprete é o p ri n c ipal elemento gerador de significaçõ e s d o fato cên ico . T al agru- pamento j ust ifica-se à m ed ida que - assim como descrito no Q uadro d as A ções Fisic as - també m e m Brecht e A rta u d pode m o s reconhe cer utilizações especificas de m atrizes geradoras, elementos e procedimen- tos de confecção da ação fisica. De sse modo. ta is artistas nã o poderiam ser excluídos da descriç ão so bre as contribui ções feita s pard u desen- volvim e nto teó rico e prático de tal conce ito. Urna vez examinados no s dois primeiros capítulo s os mate riais - primári o , secundário e terciário - no terceiro capítu lo se rão tratado s os aspecto s ligado s à compo sição da atuaç ão , para ao fim chegarmos ao ator-compositor, os princípio s que rege m sua prática e seus instrumen- tos: as diferentes prát ic as impro visac ionai s e os diferentes tipo s de seres fi ccionais. Por fi m , por intermédio das questões e exemplos trata- d os, re flet ir-se- á sobre a importância de tai s conceitos e princ ípios diante d a complexidade do fe nômeno teatral. Tal com p lexidade, p resente e m diferente s momento s hi stó ricos c intensi ficada no séc ulo XX, leva a crer c ada vez mai s que o ator, para ser criador, precisa saber compor. Obviamente , e ste trabalho, as si m como os escritos existentes so- bre a práti c a do ato r, não se propõe a expor "corno fazer" uma composi- ção, m as sim descrever e lem ento s palpáv e is que e stão envolvidas na atuação do ato r. Assim como nas outras formas de arte , porém, a atua- ç ão é v is ta aqu i enquanto po ss ív el prát ica compositiva que le va à c ri ação d e um resultado . d e uma obra. Parece-me importante o desenvolvimento de uma reflexão que abor- de questões técnicas sobre o ator, a partir do apro fundamento do concei- to de ação fisica. A busca de reconhecimento e sistematização do percur- so que envolve tal conceito , de Stanislávsk.i a Barba, representa uma ten- tativa de co nstrução de um fio conduto rque .. sem anular as especific idades das referências abord a das neste trab a lho. pode renovar o sen tido d a rela- ção entre o ator e as técnicas exam inadas, relação esta que muitas vezes se dácomo m ais um ato de consumo. Ass im como nos estudos feito s sobre a dramaturg ia escrita por palavras e sobre a arte da encenação, busca-se aqui ressaltar o "saber artesanal" necessário para a exec ução do trabalho d o ator enquanto processo e a to de criação . É na reflex ão sob re a compos ição na atuação do ator e no reconheci mento da ação física como fio cond u to r de s ua p ráti ca que reside a espec ificidade d este trabalho . A ação física está aci ma das diferenças entre as poéticas teatrais Tal esforço faz -se ainda mai s necessário , se p ens armo s nesse mo- mento e nesse contex to, o brasi le iro , no qual se vive ainda uma situa- INTRODUÇÃO X X I ç ão de semi-amadorismo, n o que diz respeito às condições de p rodução teatral, e no qual a profissão do ator parece s e r uma atividade acessível a todos, que não requer a posse de qualquer competência. 1. A Codificação dos Materiais As três ref'erências descritas a seguir, corno dito na introdução, foram fatores desencadeadores de UITl novo olhar s o b r e o trabalho do ator. As c ontribuições feitas por tais referências a partir da elaboração de efernerrtoe, ou c.orrio veremos mais adiante, materiais, seclirncnraram as bases que levaram a uma progressiva sistematização de conheci- mentos s o b re o trabalho do ator, os quais fundarnentatn a prática de seu oficio. 1 .1. FRANÇOIS DELSARTE: DA REPRESENTAÇÃO À EXPRESSÃO França, início do s éc u lo XIX. U m teatro repleto de contradições, em que a vitalidade do período revolucionário, agora já transfonnada, coexistia com a Ópera e com as pequenas salas construídas nas resi- dências dos economicamente mais favorecidos. No que diz respeito ao trabalho do ator, neste rno.rnerrto Talma1 é a referência rrrafor. A partir de sua experiência na Inglaterra e tendo COITlO parârnetro artístico o ator Lekain, Tahna buscou rever alguns códigos interpretativos vigen- tes na época. Contrário às cdstalizações que buscavam o efeito correto I . Franç ois.-Joseph Talma ( 176 3 - 1R2 6)_ Ator franc ês, autor de Mémo ires deJ F Ta /m a. organizado p or A. Dumas. Paris , H'ippofyte Souverain éditeur, 1849-1 8 50. 2 o ATO R-C"O MPOSrrOR so b re o público, coloca a s e n s ib i lid ade como qualidade indispensável para o ator, revelando ass im u m in e g á v e l traço rom ântico . É ne ste c o ntexto qu e se insere François Delsart e . Impre gnado tam - bém de valores ro m â n tico s , não somente aqueles lig ados ao império d o " sen tir", mas também à neces s idade, assim como em Hegel , de esq ue m a tizar o mundo , s ua o bra se caracte riza p e la presença d e valo- res de forte c u n h o rel ig io s o . Po rém , a pesar de s ua v isão reli giosa, que s e rá o m otor d e suas teo r izações , D e lsarte teve um papel fundamenta l na história d a s a rte s cên icas, n ão tanto como executor de o bras, m as sOb re tudo como transfo rmado r da p e rcepção e d as categorias utiliza- das para pensa r e rea lizar o trabalho a rtíst ico. A obra c omo ex p re s sã o de proces so s interiores e ra um valor j á em circulação em ] 839 2 , data em que D e lsarte inic ia a leciona r, transmi- ti ndo s eus c onhecimento s em seus famosos C ursos de Estét ica Aplica- da. Porém, n ão é a presença deste valo r que dife rencia o tra balho de Delsarte, m as sim o fato d e tê-lo aplicad o ao corpo. Após viver de traba lho s te mporários e m Paris , Delsarte in teressa- se cad a vez mais pela m ús ic a , o que o leva a procurar o apoio d o Con - servatório d e Paris , o nde estud ará canto e inte rpretação. A experiênc ia no Cons ervatóri o acabou se ndo importante, sob re tudo pela via negati- va: sua voz ficou compro metida a p onto de ser obri g ado a abandonar o c a nto; e quanto à interpreta ção, achava-a estilizada e fa lsa . A p a rti r de e n tão, D e lsa rtc se nte a n ece ssidade d e d escob rir como as p e ss o as real- mente agem, movem -se c falam em todas as s it uaçõe s e m o cio nais . Fo ram anos d e observaç ão minuciosa: n o s parque s o bse rva ndo a s m ães com os fi lho s , os casais , os amigos . C h egou a v iaj a r para uma o u tra c id ad e em v irtud e de urn acid e n te e m u m a mina d e carvão p ara o bse r- var as atitude s d o s amig o s e parentes das v ítimas durante as operações d e resg a te. Freq üen tou curso s de medicin a p ara c onhecer a anatomia h umana. Dis secou cadá veres e o bse rvo u d oentes m enta is n o s manicô- mi os'. Como resu ltado d e todo es se m aterial rec olhido atrav és d e ano- tações e desenhos, Delsarte c h eg o u á formulação d e se u Sist ême". O sistema foi o m ode lo usado em seus Cursos de Estética A p lica - d a , os quais e ram fr eqü e ntado s pela s autoridades e personalidades mais im p o rta nt es da é poca, ta is como c antores de ó pera, atores, advo gados, homens d e estado.. da igreja, p intores , escu lto res e com p ositores, d e n - tre o s quais Rossini, R achel, Bizet e D elacroix . Seu s princ ípios b ás i- cos têm efeito sobre toda s as arte s p lá sticas e gráficas, m úsica ins tru- m ental e vocal, inte rpretação e o ratória . N a fig u ra citada, o q uadro d e 2. Bas ta ria uti lizar como exem plo a obra de E. Delacroix . 3 . A opção pela in serção de dados b io g rá fico s d e Delsarte se fez nec essár ia à med ida q ue ta is in fo rmaç ões contr ib ue m para a compreensão do percu rso d e constru- ção d e se u s istema. 4 . Ver figura na p ág ina 9 de ste trabalho . Tal figura foi extra ída d o texto escr ito por Ted Shawn, E very Little Movemen t, New Yo rk , Dance H orizo n s, 19 63 . p . 1. A CODIFIC A Ç Ã O D O S M ATERIA IS 3 s e u s istema, reconhecemos lima unidade, que. segu n d o Delsarte, é re- p res entada tanto por Deus quanto pelo homem, o qual foi criado à imagem e semelhança da Divindade. A parte superior d a figura repre- senta o invis ível mundo d as idéias, o m a c ro co s m o ; e a parte inferior.. a vida fi s ica d o h omem, o m icrocosmo. N a figura estão traduzid as for- m a lmente ta nto a Lei de Correspon d ê n cia q uan to a Lei de T r in d a d e . E n tre as partes s u p e r ior e infe r io r d a figura .. podemos ler ....Homem - O O bjeto de A rte". Pela Lei de C o rrespondência, que é representada pela divisão s imétrica entre a s p artes s uperior e infe rior, todas as qua lida- d es es p irituais invisíveis se tornam v is ív e is através d o homem. Já a Lei d e Trindade , formalizad a n a figura pelos tr iângul o s que representam as trê s d imensões espirituais d o h omem , é para D elsarte o princ ípio regu lado r d e todas as coisas , d o homem e m p a rticular. O homem par- ticipa d a tr íp li c e natureza divina (a qua l tem corno modelo a Trindade Pai - F ilho - Esp ír it o Santo ) por meio de trê s c omponentes (v id a , a lma e esp ír ito). q ue por su a vez estão rela cionadas à trê s e stados (senslvel, m o ral e intelectual): ITríplice -Natureza Divina I [Ho mem] I Estado Sensível (se nsaç õ e s ) I Voz Estados Interiores M odalidade Ex p res s iva Exterior r-Três Componentes Consti tu tiv o s -, Vida Alma Espírito I I E stado Estado M oral Intelectual (sentimento s ) ( p e n s a m e n to ) I I Gesto Palavra A partir d este quadro, Delsarte define o Gênero de cada expressão: • A exp ressão de derivação V ital s e rá Excêntrica - voltada para o exter ior. • A exp ressão de derivação Anímic a se rá N onnal - equilíbrio en- tre e x terior e interior. • A e x p ressão de d e rivação E spiritual se rá Concê ntrica - v oltada para o in teri o r. E defi ne também cada Espécie d e exp ressão - que se refere ao tip o d e in fl u ê ncia exercida sobre a exp ressão a partir de um e stado interior. D o cruz amento d os três gêneros com a s trê s espécies de expres- são, Delsarte construiu uma tabela chamada C r ite r iu m Geral, fonnada 4 o AT O R-CO M PO S ITO R p or no ve c élu la s, segundo a q ual todos o s rn o v im e nto s o u modalida- d es exp ressivas s ão defin íveis. Tabela do CRlTERlU M GERAL' (Gên eros e Espécie s da Expressão) I EXCÊ-N-T-R-I-C--'A l NORMAL CO-'--N-C-Ê-N-TR---I-~~ Excêntr ica : Excê ntrica Excên trica I EXCÊ~-TRICA ! NORMAL CONCÊNTRICA I E:::;Rl~A-+ - :::::AL CO::::RICAL Concêntrica _L _Concêntrica Concêntrica _ As pala v ras escritas e m letra m a i úscula , que d izem re speito aos gênero s, prevalecem sobre aqu elas minúsculas. as quai s representam as espéci es. Poder-se-ia inserir por exemplo neste quadro nove at itu- d es diferenciad as da m ão . A mes ma operação pode s e r fe ita com todas as partes do corpo, A exp ressão não se rá definida som e n te pe lo gêne ro e espécie. mas também p or o utros q uadros, o s quais te rão como parâm etro a varied ade - divisão d o q uadro acima por três, q ue gera vinte e sete class ificações; a sub -variedade - ulterior divisão por três g e rand o oi tenta e uma class ificações ; o tip o - q ue d ividindo-se ainda po r três chegaria a duzento s e quarenta c três; e o f enômeno q ue d esta forma chegaria a setecento s e v inte e n o ve c élu las", Tornemo s com o exemplo a cabeça . D elsarte, dando con tinu id ad e à Lei de T ri n dade, d ivide a c abeça em trê s partes: a parte d e trás que se j unta à co luna é a zona vita l; a parte d e cima, que inclui a parte s uperior d a testa, é a zo na mental; a fa ce corresponde à zona emocional. A face por su a vez é também d ividida em três zon as : a tes ta e o s olhos são a zona mental; o nariz e a parte supe r ior d a face (acima da boca). a zo na emocion a l-e spiritua l; e a boca, o m ax ila r e a pa rte in fe r ior d o rosto, a zona física. O s o lhos também pod em se r divididos e m três partes: g lo - bo ocular, pálpebras e s ob rancelh as . Po d e ríamo s con tin uar a descre- ve r estas tríplices divisões a partir de cada parte d a face, m as o que interessa aqui é levantar a lg u ns aspecto s d a teoria que serão úteis para o desenvolvimento d o no s so d iscurso . S e considerarmos somente as trê s partes d o olho descritas , chegare m o s a quatro centas e cinco com - b inações, tais co m o descritas e m Harmonic Gynmastics and Pantomi- 5 . T. S hawn, op. cit., p. 30 . 6. A . Giraude t, Mimique, p hy s iono m ie et gestres : merhode p ra tiq ue de system e d e Franço is Del S a rte, P aris, 18 92 , p - 52 . A C O D IF ICAÇÃO DOS MATER1AI S 5 mie Expres s ion; texto editado por Marion Lowell, baseado em anota- c ões de palestras de Steele M ack aye" . COlIJO e.x.e.rrrp lo de aplicação d o quadro Crite r iu m G e r a l, v ej a m o s as nove p o sições da cabeça: Cabeça: no ve p o siç ões " - T ~~>- .-. .....-. ~< . ->~ ,.--. -----{ \ ~) ---- -', ~\ r A ti tude EX-ex C~beça le v antada c v irada no sentido oposto em relação ao objeto o u pessoa. Orgulho ou Afastamento At itud e N O R -e x Cabeça le v an tada e centralizada . E x a lta çiio Extase Atitude CON-ex Cabeça levan tada e vi rada na d ireção d o objeto o u pessoa. Abandono ou Vulgar Fwniliaridade Ati tu d e EX-nar Cabeça v irada n o sen t ido oposto em relaç ão ao o bjeto o u pessoa. Crítica contrária ou exame s en s u a l Atitude N O R -nor Cabeça de fente p ara a pess o a o u o bje to. Estado normal Atit ude CON- nor Cabeça v ira da na direç ão do o bjeto ou pesso a. C rítica favorável ou ternura Atitude EX-con Cabeça a ba ix ada na d ireç ã o oposta e m r e la ç ão ao o bje to o u pessoa. S u sp eit a Atitude NOR-con Cabeç a a baixada m a s de fre nte para p es soa o u o bj eto. Reflexão Meditação A titude COtq-con Cabeça abaixada n a d ir eç ã o d o o bje to o u pe ssoa. Veneraçãu o u ter n ura maternal 7 . S teele Mackay e ( 1842- 1894 ) , ator e dire tor americano . Estud ou com D elsarte e m 18 6 9 em Pari s. 8. T. Sh awn , op. cit.; p . 37. 6 o ATOR-COMPOSITOR Em estudos feitos por di sc ípul os e a lunos de Delsarte encontrar- se-ão aplicações do Criterium relacionando diferentes partes d o cor- po , com o no caso abaixo, os braço s e as pernas (A lfred Giraudet, op. cit., p. 105 ). Braços e pernas A ti tude CON-con. Desafio A titude C O N -nor. Indecisão At itude CON-ex. Veemência Alento m as discordante Atitude NOR-con. Reflex ão Atitude: NüR-nor. B em-estar A titude N O R -e x. E:x.pansão In teres se arden te Atitude EX-can. Prostração A titud e EX-nor. Humildade A titude EX-ex . Sem co r Transitório Até agora descrevemos com mais pormenores as implicações da Lei da T rindade representada pelo quadro Tríp lice Natureza D iv ina", que leva, por sua vez, à definição dos gêneros c das espécies de expressão. N ão se deve porém, esquecer do papel fundamental da Lei de Co rrespondência, pois, a lém de ser um produto da Lei de T rindade, é ela que permite a co nstrução do sis tem a enquanto inter-relação de seus e lementos. A cad a função esp iritual. corresponde uma função do corpo; a cada grande função d o corpo. co rresponde u m ato esp iri tual 10 • 9 . Ve r p . 3 d este trabalho. 10 . T . Shawn , op. c u., p . 3 1. A CODIFICAÇÃO DOS MATE RIA IS Esta é a definição dada por D elsarte p ara a Lei de Corre spondên- cia. Nesse sentido , e la atua o tempo todo com a Lei de Tri ndade. e é a partir desta relaçã o que Delsarte construiu parâmetros co ncre to s de aplicação de seus principias no corpo hum ano , chegando assim à tabela do C ritério Geral. Esses parâmetros estão descritos no quadro abaixo 11 Lei de Trindade Lei d e Correspondência • As Três Reg iõ es d o Corpo - Doutrina dos órgão s especiais - Reinos do Espaço C abeç a - div isões d a cabeça - Face - divisões da face - ol hos Tronco - di v isõ es do tronco M embros - pernas e pés - braços (articu lações). • As G randes ordens de Movimento Oposições Parale lismo s S ucessõ es (ou inversões ) - Inclina çõe s - Quedas. • A s Nove le is do Movimento (ou deslocamentoj'? Altura Força M ovimento (ExcêntricofExpansão - Norma l - Concêntri co/Con- tração) S eqüênc ia D ireção Forma Velocidade (Pê ndu lo) Reação - Recuo (ten sã o - relaxamento) Extensão B a lanço - Pre sença - Eq u ilíb rio (Estát ico - D inâmico - Ciné- tico) " . 11. Idem . p. 2 7. ]2. Não é claro porque o autor util iza M o vement e Motion, ern vez de um só termo . A ún ica possibilidade é interpretar M o tion como movimento pois se se traduz o te r- mo por s ina l ou s ugestão . o quadro perde o sentido. ]) . Optei por diferenc iar o significado do s termo s o rig ina is Balance. Poise e Eq uilib riu m , pois os trê s po der iam ser traduzido s corno equilibrio , o qu e tom aria o ite m redundante e obscuro . 8 o ATOR-COMPOSITOR As três regiões d o c orpo, assim co mo as o rden s e as leis de m o vi- m enta , atuam umas sobre as outras formando ass im u m a unid ade com- plex a. M a s esta é somente uma das partes de s ua teoria. D e fato, pa ra D elsarte.. cada m oda lidad e expressiva exterior está relacionada com um esta do inter ior, tal como d e scrito n o quadro Trípl ic e N a turez a Di- v ina 14 . E é a partir d es ta relação q ue a exp ressiv idade se d á . Ao vértice d as lin g u a g e n s ex p res siv as p ara D elsarte está o g esto. Agente diretamente ligado à a lma, a o s sentimentos e às facu ldades m o ra is d o homem!", o gesto p o de a t uar sem o auxílio d a palavra e da voz.. as q u ais adquirem uma d e fi nição a parti r dele . D e lsarte estuda o g e sto segu in do t rês linhas d e pesquisa16: • Estática: le is q ue reg ulam o e q uilibrio d o corpo; • Dinâmica : leis dos movimentos que estão conectados aos re la t i- vos im pulsos interio re s ; • S eruei ótica : leis que regulam a forma d o mov imento ao seu s ig- n i fic ado . Cada gesto toma-se assim analisãvel seja n as suas relações de equilíbrio.nas modali dades d inâ m icas do ritmo, inflexão, harmonia, como ta m b ém n as suas qualidade s s rg nicas, transformando-o, a s sim, em u m e lemento do código de linguag em, S e Ienno s com atenção os e sc rito s de Talma o u m e smo os anterio - re s relacionados à prát ica d o ator, ta is como O Paradoxo sob re o C o - m ediante, d e D . Diderot ( 1773). podemos recon hecer neles uma " cons- c iência sernió tica", o u seja, o corpo é percebid o e nquanto signo, que pode veicular di ferentes con te údos d e o rd e m psic ológica o u so cial. Mas o q ue diferenc ia o trabalho d e Delsarte é o n ív e l d e d e talhamento e ri g or com o q ual analisa cada parte d o corpo; a terminologia técnica criada para d iferenciar os e lementos e modalidades de expressão; e, sobretudo, a u ti lização d o con ceito d e expressividade, n e ste c aso rela- c ionad o especificamen te ao corpo , cons iderado com o representação d a conexão entre o h o mem e o divino . Como sabemos, a conexão e n tre a a rte e religiosidade já h a v ia sido re tomada pelo romanti smo alemão. Nesse sentido, poderíamos citar in ú m ero s exemplos, tais como: Princípios Gerais d a Arte Pic tó- rica, d e 18 0 3 ; o u As Artes Figurativas e a Natureza'" , Con tudo, a ssim corno tais escr itos p r ivilegiam a pintura , o u tros irão colocar a m úsica o u a poesia ao centro de suas reflexões. Nesse ponto Delsarte interv ém de maneira transformadora, a pa rt ir do deslocamento de foco das ou- 14 . Ve r pág in a 3 . I S. Id em , ib id em. 16 . A . Giraudet, op . cu., p . 32. 17 . F. Von Sch le gel, P rincíp ios G e rais da A rte P ict órica , 1803; F. Sch e lting, A s ;I .., ... ... P i o ..rnt i v a .. P n Natureza, 1807 . A C O DI F ICAÇÃO D O S M AT E RI AJ S 9 tras a rtes para o homem, co m s e us m ovimento s, seus gesto s e sua voz. Em s ua o b ra C iência da Express ã o Humana estabelece como critério de verdade urna conexão necessária : não há verdade na expressão, s e a uma m odal idade exp ressiva e xterior não c orresponder um respectivo Impulso interio r. o Sistem a de François Delsarte -<- .~ -'--";r. ".'d ", ' .::.J .....r.. ::::J ~-....;:...I~~ i~X ..7t_f . ll"f,v.,· N EZ.1.:.fhTT. ( 'ollll""lIfliulIl \ "; / \~~~~.i <: l'IUlI 'u:--ITIH:'ô u r :--Y~T DIt: LI_...... ..,.. _ TK I ~IIF. lot_ l' u . :-OO .... l<.::O- .I'....u ....!.: J .... nlll".~ A' 'J'_\. HUI. • Se k ; .... k ... r ,. ... l ·tll " lT r ,..: 1..\ :0;';'\'1:1: 100 "' I I..-t" HI.lT'; II11· " L' .' T ...... ' ..\.r(-0fttI IOf; :"U-' It>Ol: 10 o ATOR-COMPOSITOR 1.2 . E . JACQUES-DALCROZE: A CENTRALlDADE DO RITM O A partir do século X IX. vemos nos pa íses de c ultura alemã u m m o vimento complexo n o qual po d e m o s reconh ec er como eixo a "rod es- coberta d o corpo" , Contrib u iu nes se sen t ido de maneira dete rminante o Jugendbewegung, rnovirne nto juvenil a le mão formado por e studa n- tes , os quais, cansad os dos pro b lemas cara cte rísticos da vida n a c ida- de, buscaram recuperar a relação co m a nature z a . Acred itav a-se que um contato m a is constan te com a natureza geraria corpos s ãos e v itais p or intennédio de exerc íc ios físi cos a o ar li vre, acam p am entos etc. N e sse aspecto O Jugend bewegung se u ne à Lebe nsreform, movimento m ais a b ra ngente q ue busc av a um retorno às "fo r ças geradoras d a vida'" e a regenera ç ão do homem e da sociedade p o r m e io da re cusa d o á lcool e da c arne na alimentação. E s se s dois movimentos, por sua vez, fazern pa rte daquela que foi denominada K õperkultur (cultura do corpo) que levo u a uma revolu- ção d a mentalidade. d o gosto e do uso da h ig iene . Pode-se reco n hec er pelo m eno s d uas referências teóric a s importantes para o pro ces s o de con stituição da Kõperkuttur: a corren te es té tica q ue parte de Scho- p enhauer, envolvendo Nietzsche e W agner e enc ontra uma re ss o n ân- c ia ern cam po teatral com A . Appia e U . Fuchs, a partir de s ua s teorizaçõe s e re a lizações a rtíst icas; a s te o rizações e prátic as de F. Delsarte p re sentes em s e u Sistema d e Estética Aplic ada , visto e m a l- gu n s de seus a spec to s no início d e ste trabalho . No que d iz respeito à prime ira refe rê ric ia, vemos a música como m atriz d as a rtes no tempo e espaço; e o espírito d ionisíaco como sen - d o a expre s sã o da subj etividade m a is p regnante. Q uanto á segunda re ferência , o corpo pass a a adq uirir a mesma " dignidade" já co nquista- da pelo intele c to e pelo espfrito, através de uma concepção em q ue a trindade é vista como estrutural n o ho m e m . É através de u m a conexão necessária entre movimento interior e ex te r io r , como v imos em Delsa rte, que a expressividade se dá. Se Schopenhauer, N ietzsche e Wagner faziam parte da bagagem cultural a lemã, D e lsa rte foi introdu- zido na Alemanha e assim ilado de maneira específica com m odi fi ca- ções e m relação às s uas concepções originais. A partir de s ua Uginásti - c a harrn ôni ca " , detalhad a p o r Gcn evieve Stebbins !" e introduz ida na A lem a nha por B . Mensedie ck e H . K allmey er, bus c ou-se desenvolver uma prática q ue deveria inte grar corpo e psique . É importante a ssinalar que 110 âm bito d a Kõperk ultur; pesquisa estética e p rá ti c a p e dagógica se fundern, re veland o claramen te a uti li - zação d a associação e s tabele c ida por Platão entre o bom e o be lo '" , O 18. G . S teb b in s , D elsa rte Sistem of Express íon, N ew Yor k, Werner, 18 8 5 . 19 . P lat ão. " O Banquete", Os P ensad ores , S ã o Pau lo , Ed itora A b ri l, 1974. A CO D IFICAÇÃO lX)S MAT E R IA IS " corpo belo e sad io, a ssirn .. pas sa a s er a representação d e uma s uperio- ridade não somen te estét ica como também moral. Estes são alguns dos parâme tros nec essários para podermos situa r o trabalho de Émile J acquc s-Dalc roz e (1865- 1950). Suíço . na scido em Viena, fo i a luno de Bruckne r e R. F uchs e d esde 189 2 lecionou no Conservatório de-Genebra. E m 18 9 8.. ele ain da não hav ia encontrado uma tradução prática para suas nec es s ida d es e pensamen tos, os q u a is conti nham muito s elementos p ro venientes do trab alho de D elsarte , com o qual teve contato em P aris. E m funç ã o de a lgu m as dí fi culdade s enco n tradas n o trabalho pe- d ag ógico com o s alunos do Conse rvat ório, sobretudo no que diz res- peito à compreensão d o ritmo, D alcro ze com eça a e laborar estratégias as q uais e nvolvem progressívamente o corpo d o a luno. O trabalho teve início com exercícios rítmicos d e solfej o util izando os braç o s e as per- nas . O objetivo inicial era dese n vo lver aqu i!o q ue c ha m a ria m ais tarde de "'o u v ido interior" : o corpo como conectar entre os son s e o p ensa- m ento . Eis-m e a sonhar com uma e ducação m usica l na q ual o corpo seria o intermedi ário entre os so ns e o nosso pensamento. tom a ndo-se assim o in strumento do s nossos sent i- rnento sê'' , Se por um la d o e le descobre o corpo como possível ins trum en to de conexão entre os sons e o pensamen to , a partir d a relaç ã o dual e n tre m ús ica e solfejo, D alc ro ze rec onhece , por o utro lado, a importància d o ri tmo, o q ual s e tra n sformar á no e ixo, seja d e sua prática .. s ej a de suas teorizaçõ e s . C om o desenv olvimento do trabalho , ele p e rcebe que a assim ilação do ritmo é um prod uto da com preensão do sen tido rítmi- co. É neste m o m ento q ue Dalcroze cons trói a hipótese do "sontido muscular" . A consciê nc ia do ritmo é a faculdade de representarem-se cada sucessão e cada reunião de fraç ões de tempo e m todos os seus matizes de rap idez e energia. Ta l consciên- c ia se fo rma mediante repetidos exercíci os de contração e de scontração muscular em qualq uer grau de energia e rap idezê'. A construção do "sentido m uscu lar" , c hamado por Dalcroze de s ex to sen tido , é conseqüênciapor sua vez, das relações e n tre a dinâm i- ca dos movimentos e a s itua çã o do corpo no espaço . Neste mom ento o pesqu isador s uíç o estabelece a s regras correspondentes à s relações e ntre os pontos in icia is e fi nais d o s movimentos, envolve ndo todos os m atize s d e duração e de energia. e m tod as as d im en sões d o e spaço ê- . 20. E . Jecques-Da lcroze, Rumo-Musioa-Educaztone , Miiano. Hoep li, 19 25. p. 8 . 2 1. Idem. p . 45. 2 2 _ Podemos rec onhece r também u m a busc a constante em Dalcroz e no sentido de associa r através de u m a relação c a us a l, o corpo com o univ erso esp iri tual. As em o - 12 o ATOR-COMPOSITOR Além disso, afirma que esse sentido muscular não deve s e r percebido somente pelos sentidos. Segundo ele~ o intelecto também deve estar envolvido nesse processo, pois é por meio dele que se chegará à cons- ciência rítmica. A consciência do ritmo é também a faculdade de captar as relações entre os mo- vimento s fls icos c os intelectuais. e de sentir as modificações que imprimem nesses m ovimentos o s impulsos da emoção e d o pensamento. Ela pede o emprego de todos o s músculos conscientes. Portanto . para criar o sentimento rítmico, a e ducação deve colo- car em movimento o corpo inteiro~3 . Por fim, para que essa consciência rítmica se instaure, é necessá- rio que se construa uma representação do ritmo. Deve-se então ser penetrado p e la representação d o ritmo, refletindo a sua imagem com todos o s músculos do COrp024 . Portanto, para Dalcroze a assimilação do ritmo requer um percur- so precrso: Movimento ritmico-s-oS ernido rítmico (muscularl-w Representação ritmica-e-Consciéncia rítmica Partindo da execução do movimento r íunico, se chegará à percep- ção do sentido ritmico (ou sentido musculars, Tal percepção desenca- deará a construção da representação rítmica, que por sua vez, levará à consciência rítrnica. A partir destes pressupostos, Dalcroze elabora procedimentos cada vez mais complexos, os quais buscam codificar plasticamente o corpo, com o objetivo de transfonná-Io em um canal de expressão visual da própria música, para ele~ a arte maior, Nesse sentido, constrói exercícios de dificil execução, como os de polírritmía: execução simultânea de diferentes ritmos enl diferentes partes do corpo; ou os de p olidin âmi- ca: execução simultânea de movimentos com diferentes gradações de tensão. Como dissemos acima a respeito da Kóperkultur, também para Da1croze h á um elo inseparável entre arte e pedagogia. De fato, para o criador da R ítmica, seu trabalho não tem somente a função de criar "be.los" corpos. mas sim de desenvolver a sensibilidade a seu ver ções purificadoras são o produto desta associação. Idem, p. 46: "Esse sexto se nt id o harmoniza o s múltiplos matizes de força e ve lo c id ad e dos m o vimento s corporais que estão relacionados c o m a s emoçõe s inspiradoras desses movimento s. T a l sent id o, por- tanto, assegura assim ao organismo humano, como um todo, a possibilidade de purifi- car as suas emoções" . 23. Id em, pp. 48-49. 2 4 . Idem. p. 5 2. A C O D I F ICAÇÃO DOS M ATERIA IS J3 s ufocada pelo intelecto. E sta seria a causa d a a rritm ia presente em al- gu n s d e seus alunos . Um c o rpo treinado a p artir de s ua g inást ica , a Eu rítrn ica, che garia a uma hannonia n ão so m e n te muscular, mas tarn- bérn d e seu sistem a nervos o . L iberado d e seus a u to rn a t is rno s , o ho- m em poder ia c h e g a r a expressar s ua "rn úsjca pessoal' < ". 1.3 . OS T E ATROS O R IE N TAIS' ·: ÉTIC A E P ERCEPç ÃOn Q uanto a o e spetáculo cên ico . decerto q ue é o mais e mocionan te. mas ta m b ém é o m enos art íst ico e menos próprio da poesia. Na ve rd a de. " ,esm o s e m rep resenta ç ão e s e m a tores. pode a tr ag é d ia manife s tar seu s efeitos... ARI~IÓTF.I .ES211 U rna vez q ue a dança d a mulh er d eriva d e mn estilo particular mente exa lta do. n e la se man ifes ta a s u bstâ ncia d o en c anto s u t il. Z EAMI29 C o m o sa b e m os, a história d o teatro n o Ociden te, s o b re t ud o a " o fi - c ia l", foi p ontuada por tentativas de normatiz a ç ão a s quais ti'verarn c o mo referência a P oética de A ri s tóteles . B a s taria cita r C a s te lv e t ro ou B o ileau. T al fato g e ro u muitas impli cações , m a s ta lvez a -m a is impor- tante seja a de pensar o fenômeno teatral a partir dos elementos constitutiv os d o texto dram ático, deixando d e lado todos os aspectos perform áticos , ou sej a, aqueles relativos ao cspet áculoê". De fato, se 25 . O ri t m o é recon hecido como eleme n to fu nda m e n tal da a tuação d o ator tam- bém na s c u ltura s te a tra is o r ien ta is, tai s c o m o o Jo -Ha -Kyu d e Z eam i, no Jap ão . 26. Examinarei a q ui sob re tu d o que st ões li g ad a s ao a tor n õ c kab u ki . N o en tan to. o p tamos por m a n ter no títul o d e s te parágrafo " Te a tros Orientais" e m fu nção da g ran d e se melh a nça e x isten te e n tre as q uestões aqui tratada s e a q u e las p re sentes nas o u tras forma s de tea tro n o Oriente . A re íl exão s urgid a a partir d e q ues tões co m o a " ética" , poderia ser a p licada a muitas o u tras formas te a t rais orientai s , tai s como Ó pera d e P c- qu im , Kat ha kal i o u o Teat ro-Dança Bal in ês. 2 7 . Como d iz G rot ôv s ky , a s e p a ração c o nce itual e n tre Orien te e Ocid ente torna - se frági l se le v armo s e m con s ideração sej a o s intercâmbios cu lturais existentes e ntre leste e oeste desde a a n t igü ida d e. seja a n ã o inc1usão , a part ir d e ta l polarização. por exemplo do O rien te M édio o u da África. C o ntudo. por m o t iv o s interno s a o d isc u r-s o m a nte remo s ta l p olariz aç ã o re lacionando o termo Oriente aos países as iá ticos e à ind ia . 2 8 . A r istóte les , " Po ét ica", e m O s Pensadores , S ão Pau lo. Ed itora A b rit, 19 7 3 . p .44 9 . 29. Z . M otoky o , li S egreto d e I Teatro N o , M itano , A delph i, 1966, p . 4 7 . 30 . M esm o sabendo q ue a referência estética de A r is t óte les é a q u e la d a "forma perfeita" q u e n ece ss ita de u m a fixação espaço -te mporal, o que fa z com q u e o espet ác u- lo seja c onsiderado u m ep ifcn ômc no. isso não muda O quadro d a s coisas . 14 o ATOR-COMPOSITOR tomarmo s e m e xame os li vro s de história d o teatro o que veremos na g rand e m aioria d o s c a sos são h is tórias dos te xtos dramátic o s per- m e ado s p or um histórico d a s idéias d e frá gil s u s tentação te óric a?". N e les, o trabalho do a tor e o s proc e s so s de atuação, o espaço , o s mate- r ia is sonoro s env olvido s , bem como o s difere ntes conceito s de pe rso - nagem nã o são ex aminado s . Tal s ituação n ão se re p rod uz n o s paíse s asiá t ic os. Nesse sentido, p odemos c itar como exemplo o K andensho japonês o u o Natya-S a s tra indiano. Por raz õ es de economia d o dis- c u r so, e x aminaremos som e n te a lgu ns as p e c t os presen t e s no kandensho , O K a ndensho (O L ivro da Trans missão da Flor), uma descrição sob re a s técn icas d e inte rpretação. é a transcriç ã o fe ita por Zeami d o s e nsin a men tos d e se u pai, K anami . A mbos, a tore s e fu n dadores do Tea- tro Clássi c o Japonê s Nó, d e screvem os n ove degraus neces sá ri o s p ara a o b te nção daflor , n ível m á ximo de aperfeiç oamento para o a tor. S e o a lu no q uer a lcan ça r o nível de u m gran d e mes tre. dev e sa t is faze r trê s co n d i- çõe s . P ri m e iro . d eve have r uma boa d ispos iç ão e um ta le n to adequado ; se gundo , deve ser m o v ido pelo amor por e s ta arte e por uma fo rte d ete rminaç ão a d edicar-se totalmen - te a e la; terceiro. precisa de u m mestre que seja capaz d e transmi tt r-I h e os elemento s e ssenc iais da arte . S e e ssas trê s c o n d ições não e s tão p resente s . o a lu no não a lc a nçará o s u c es so . isto é . n ã oa lcança rá o nív el d e u m grand e e hábi l mestreêê. Nos e s c r ito s ou Upoéticas H presentes no O rie n te , a lém de vennos os aspe cto s perfonnáticos s e re m examinado s , ao inv é s d o texto esc r ito , tal como koko ro (c o ração) e yuge n (e legâ ncia profunda) , n o trecho desc r ito acima p o d e m os reconhecer a pres e n ça não m e no s importan te de um o utro aspecto, pres e nte na forrna ção e no tra b alho d o a tor: o é t ic o . U m primeiro d ado que p oderíamos extrair desse trecho e stá rela- c io na do à transmis sã o de princípio s é t ic os j á no proce s so de formação do ator nó. processo e ste que tem início aos sete a nos e vai até o s cinq ü e n ta. média d e idade de um j aponês d a é poca (s éc u lo XV). O a to r d e ve dedica r-se inte gralmente à su a a rte, e estar disponível para a p erfe iç o a r-s e a v ida inteira . É freqüe n te, e ntre os e s tudi o so s o c id en - tais, a j u s t ifi c ação d e tal atitude em funçã o d o caráter religio s o q ue p enneia as prática s teatrai s o ri e ntais . D e fato . muito s s ã o o s valores budista s e x in to íst a s presentes na prática te atral do Nô , nesse caso. Porém, cumpre também o bse rva r que a dedicação indicada por Z e am i e n co n tra uma razão de s e r prática e o bj e t iva: o refinamento e a com- 3 I . Uma exce çã o importa nte é a c o leção Tea tro e S perta c o lo d a Editora Latc rza, B ar-i. N essa o b ra. com pos ta, a té 1988 . d e nov e v o lumes. a través de uma p e sq u isa in te rdiscip lin a r, busca -se rec ons titu ir os fe nômeno s cênicos trata d o s . 32. Z . Z c nch iku, Lwan.a m í S hoten, To k y o , 19 74; t rad u ç ão para o ita li a n o de A nto nella C hi ni , A CODIF ICAÇÃO DOS MATERiAIS 15 p lex id a d e d a lingua gem d o Nó (assim como da grande maioria das o nna s teatra is o rientais) e xig em por si só um longo tempo para q ue os cód igos sejam assimilados. E aq ui nos deparamos com uma o utra questão . que é aquela relativa ao percurso peda gógico dessa forma tea t ra l. Não exist e uma div is ã o tempo ral entre formação e e x erc íc io d a profis s ão . A linguagem é estrutu rad a a través d e personagens que e nco n tram u ma corresp o ndência com os d iferente s níveis d e conheci- m e n to d o a tor em relaçã o à própria arte. E tal percurso está previsto para dura r a v id a inteira d o ator. Ou s ej a, a necessidade d a dedic aç ão in tegra l não é som e n te a ex p re s sã o de uma atitude d e fundo religio s o , mas ai nda um a n e c es s idade objetiva para que p o s s a dar vida a uma linguage m e xtremamente comple x a e detalhada , que requer um n ív e l de conhec imento té cnico e e xpre s si v o inco m parável em rela ç ã o ao Ocid e n te 33 . Não q uero com is s o estabelece r um j uízo d e valor o u urn a hierarq uia e m rela ç ão às formas teatrais , m a s s o m e n te constatar u m fato concreto : as fo rmas te atrais o r ientais, em fu nção de sua pró p r ia nat u reza, pre ci sa m e n te codificada, m ateriali zam um nível de ela b o ra- ção que revela u m a ltíssimo con hecimento do funcionam e n to d o fe- nôm e no te a tral e da arte d o ato r. E é nes se p onto q ue po demos voltar a Aris tóteles. N ão seria pertinente diz er, ao m eno s em relaçã o ao teatro ' ''o fic ial'' o u cutto ê", que e n q uan to o Ocid e n te, por m eio d e Aristóte les , Castel- vetro, B oile au, a teve-se (pelo men o s a té a emerg ência do direto r ) a o s e lem e n tos const itutivos do texto te atral, o Oriente se a tev e ao fe n ô m e - no, ou s ej a, aos seus a spectos perforrnát icos ? E se ta l afirmação é ver- dadeira, ela n ã o teria uma c orrespondência direta com o fato de, n o O riente , a s formas teatrais serem criada s e c o dific a d a s por a tores? Com o sabemos, os a tores n ã o somen te foram os e laboradores das té c- n icas d e interpreta çã o , mas ta m bém fo ram, n a m a ioria d os cas o s , o s autores d o s textos d ramáticos. Nesse s e n tido, a a titude é tica d escrita por Z eami não te ri a , como dito ac ima, somente u m a rel aç ã o com a religiosidade ne la pre sente , m a s ta mbé m com as nec e ss idade s rela c io- nada s à pró pria arte. Outro aspecto impo rtante, ligado à esfera é tica e pre s e nte n o texto citado de Z eam i, refe re-s e aos o bjetivos li g ado s à escolha e à e xpectativ a e m rela ç ã o à própria profis s ã o , n e s s e caso, a de a tor. O 33. Tal rec o n he c irnanto não é so m e n te pessoal. E le con ta com u m respaldo h is t ó- rico im portan te, co mo sa b e m o s. D esde Meierhold , E isenste in, C ra ig, Brech t, A rtaud , Düll in , Copeau, C la udc l, at é G ro t óvski , Ba rba, Bob Wilso n , Mnoucnkinc, Bro o k e Se rba n; to d o s reconheceram o e norme v a lor art ís tico pre sen te nas formas teatra is o r ien- .a is, d a s qua is e x tra íram p r incípios e e s t ímu los pa ra as p ró p ria s c riações . 3 4. A e speci fi ca çã o " tea tro o ficia l o u c u lto " é neces sária, pois , com o sabemo s, -nui t o s são o s d ocumentos relativos à s formas teat rai s " n ão-cu lta s " , tai s com o a Co m m e d ia dett ta r te , e m que es tão pres entes reflexõe s sob re diferentes a specto s oer form áticos, ta is como a atua ção d o alar c a utilização do espaço. I h o ATOR -COM POSITOR obj eti v o do alun o-ator é o d e se tornar um mest r e e d e a lcança r o suc ess o . Por ém, como o m e s m o t r echo d iz , o êx ito nes se caso s ó é pos sív e l à medida que o a lu n o possui o s ~ ~e lemen tos e ssenciai s da sua a rte . ". H á p ortanto UlTI3 conexã o n e ces sária entre s uces s o e c o - nhecimento da própria arte ; s i tu a ção b e m divers a e m rel a ç ã o a o O cidente , o n de m u ita s vez e s o s u c e sso é produto d e ~ ~e l aboradas " ope ra ç õ e s extra-art ístic a s . R e sumindo . o asp ecto ético.. a q u i, t o r n a-se objeto d e refl e x ã o à medida q ue assume um p a p el fundame nta l n o pro c e s s o d e t rabalho d o ator" e n q uan to con st ruto r das perc e p ç õ e s ade qua d a s a cada pro- ces s o a rt ís tic o . A maio r ia d o s h omens m a is sig n i ficativos d o te a t ro no séc u lo XX, como já dito .. reconhe c eram a im portân cia d e s s e a s- p e cto p a ra o des env o lvimento d e seus tra balho s : S ta n is lávski (Éti- c a ; Minha Vida n a Arte ) ; B . Bre cht (Sc r itti Tea trali); Grotóvsk i ( P or um Teatro P o b re ; li Teatro d elle sorgenti; L ' Arte c o m e Ve ic o lo y; P c te r Bro ok (O Teatro e o seu E spa ç o : O P o nto d e Mudança; A P orta A b erta) . Alé m d isso, a defini ç ã o d o conceito d e mate r ial, que s e rá fe ita a s e g u ir, con t ri b ui rá par a o e n tendimento d a in serção de tal aspec to n e s s a p arte d o tra b a lho. IA. O C O N C E IT O D E MA TER IA L E SUA C LASS IFICAÇÃO A esco lh a e a conse q üen te inserç ã o d a s trê s refe rências e xamina- das nes te primeiro c ap ítulo, o u seja, Dels urte, D alcro ze e o s teatro s orientai s , c omo j á d ito , n ã o s ã o ca s u a is . S e por urn lado esta investiga- ç ã o se p ropõe a tratar d e que stões li g a d a s a o trabalho do a tor.. p or outro as c olo c a d entro d o pon to d e vi s ta d o ....a t o d e c ompo r", As implic a ç ões resu ltan tes d e tal p o nto d e vista serão vi s tas n o decorrer d o d iscurso. No e ntanto, p arece-me im p orta n te e s cla re c er, ao menos p arcialmente , a lg u mas d e s s a s imp li caçõe s . O resga te d a s · ·or igens~ ·: essa foi a n ece s sidade que n orte ou a for- mula ç ã o d e ste c a p ítu lo . O r igens porque a s referência s tratadas repre- s e n tam m a t r izes g e ra d o r a s d o a t o de com p o r n o traba lho d o ator. M e smo s a b e n d o que refletiremo s s o b re o a to r - c o m pos ito r somen te na terceira parte deste trabalho .. p odemo s antecipar alguns a spe cto s que just ificam tais e scolha s. R e to rnemo s , e n tão,as definiçõe s a ceitas c oletivamente l ig a d as ao tenno " comporu : J. Fonna r o u cons tru ir d ife re n te s partes. ou de várias coisas . 2 . E n tra r n a c o m po- s iç ã o d e . faze r p a rte de . 3 . P rod u z ir. in ven ta r (escre vend o. p in tand o . e s culpindo e t c ). 4. Colocar o u d ispor com c e rta o rdem o u arranjo. 5 . H armo n izar. 6 . Pôr em o rdem: a rru - m a r. ajei tar. c nd irc ita rê", 35. N o vo D icio n á r io A urélio. Rio d e J a n e iro . N ova Prorue ir a . 19 8 8 . p . 164 . A CODIFICAÇÃO DOS MATERIA IS 1 7 Observando os ite ns pre sente s na d e fi n iç ã o d o termo " c o m p o r" p o d e m o s reconhece r um deno m inador com u m a todos e les: é o ato d e " p ôr c o rn" . Definido tal s ign ificado comum, imed ia tamente vem à tona a pergu nta : mas pôr o q uê.. com o q uê? Como sabemos.. o t rabalh o d o a tor e nvolve m uitos e lementos : e le se rnovc, fala, ouve.. constrói imagens interiores e exteriores.. reag e d e maneiras diferentes a partir de diferentes est ímulos , u t il iza o bj e tos.. adereços etc. Elementos.. portanto.. de diferentes naturezas. D e s sa for- m a .. para responder a pergunta em questão.. devemos e ncontrar u m con- ceito que possa abarcar elemen tos" como vimos.. de d iferentes nature - zas . Foi a partir d e s se p e rc urso de reflexão e da leitura d e Aristóte les .. q ue cheguei ao conceito d e m ate r ia l . C o m o sabemos.. esse termo fo i usado p o r vários d iretores tea tra is .. tais como Meierhold.. Brecht., B a rb a e Kantor. Por ém, a s ua utilização fo i feita semp re de m odo partic ular, constituindo nesse sen ti do id iole tos e nã o teo r ia s. Tal é a razão que me levou a buscar uma definiçã o que seja adeq uada a este trabalho. N esse senti do.. p a rtimo s do conce ito aristo- télico d e mat éria .. o u seja, mat éria enq ua n to potên c ia operativa e a tiva : Uma casa ex is te potencialmente se nào existe c o isa a lg u m a e m seu m aterial que lh e im pe ça de tomar-se u ma casa e se nã o há na d a mais q ue d e va ser acrescen tado, ret irado o u m udado [.. .] E as coisas q ue têm e m s i p rópria s o se n tid o d e sua gênese ex is t irão d e per s i q uando na d a d e externo o impeça'": A p artir d e s se exem p lo . podemo s fa zer algum a s inferências. S e uma casa pode existi r potencia lme n te sornen te se n ã o há alguma cois a e m se u mater ia l que lhe impeç a d e torna r- se tal, podemos dizer e ntão que não p o d e h a ver n e n h u m material que n ã o seja funcional à c onstru- ção d a ident idade d e ss a casa e n q uan to " oasa ". O u sej a .. o que causa a trans fo rma ção da mat éria e m m ate rial é justamente a aq u isição.. por parte da rnat éria, de u m a função que contribui p a ra a construção d a identidade do o bjeto do q ual é parte con s t itutiva . Po rta nto, p or material p o d e -s e entender qualquer e lem e nto que a dquire urna função no pro- cesso d e construção da identidade do próprio o bjeto . U ma vez defi nido o conceito de material.. examinarei agora al - guns a spectos que d e tennin a ram a escolha d a s três re ferê n c ias pres e n - tes nesta parte do trabalho. Delsarte.. a partir d a construção de seu sistema, cujo valor vai muito além de s u as implicações relig io sa s .. constrói .. c o m o j á foi di to .. um e lo fundamenta l e ntre gesto e impulso interior, ent re processo interior e exp ressão .. sendo o corpo o canal de tais rel aç õ e s . Tal re laç ã o implica numa ruptura e m relação à realidade teatral da épo c a , em que os ele- 36. Aristótele s . " M e ta fís ica", IX . Os P ensa d o re.... 7 . São Paulo, Editora A b r il. 19 82. p. 82 . 18 o ATOR-COMPO SITOR rnentos e ra m util izado s d e fo rma exterior, o q u e le v a v a a uma cristali- zação ou p e rda d e vitali dade d o s códigos u tiliz ado s. Por m e io d a a n á- lise das possibilidades e x p re s s iv a s d e cada parte do corpo, Delsarte p a s s a a vê- las e a util izá-Jas como materiais; p o is , seguindo a defini- ção feita a c ima, as partes do corpo adqu irem a fu nção de con t r ib uírem p a ra a const rução d a id e ntida d e de cada e xpre s sã o . Além dis so , p or interm édio de suas " Ieis". Delsarte identifica uma série de princípios q ue po r sua vez resultarão e m procedimentos artísticos, os quais serào fund amentai s num prime iro momento para o s urgimen to da Modern D a n ce , e posterionnente para o teatro a pa rti r da d éc ada de sessenta. Nesse sentido, como observa Eugenia Casini-Ropa (La Danza e L 'A g it- P rop ; B olo gna , 11 M uli no, 19 9 1) , Delsarte é o desencad eador históri co da tran si çã o e n tre o Teatro de R epre s enta çã o e o Teatro d e Expressão . E s sa tra n s i ção, fundamental se pensarmos no t rab a lh o criativo d o ator, antecipa historicamente as outras sistematizações no campo da inter- pre taçã o (Stanislávski, Meierhold.. .) justi fi c a n d o portan to sua inser- ç ã o nesta p arte d o tr a balho. J a cque s-Da lcroze , a partir dos estímulos recebidos pelo t rabalho de Delsarte, dá uma contribuição fundamental nesse processo de cons- trução dos parâmetro s , ou c omo escrito n o título, n a escolha dos mate- r iai s que se rão fu ndamen tais para a p rát ica d o ato r. Como dito a n te r ior- mente, Dalcroze constrói um percurso pedagógico que fa z com q ue o a luno absorva e entenda a música a partir de seu corpo. Tal percurso le vou à construção d e um c orpo q ue traduz a música n o espaço. Po- r érn , a con tr ib u ição que le v ou à in c lusão d e seu nome a q ui foi o rec o - nhe cimento d a central idade de um elemento fundamental , que e s ta rá p re sente e m muitas das reflexões sobre o trabalho do ator no século XX - o r itmo . S t a n is lávski , Meie r ho ld, Bre cht, Grotóvsk i, P eter B ro ok.. . todo s rec onhec erão a impo rtânc ia d e s se " rn ate r ial", seja n o trabalho d o ator, seja na construção da obra teatral. O ritmo , em D alcro z e , p a s sa a se r v is to e utilizado como material à medida que se toma o elemento p r inc ip al d o processo de construção da id entid ad e d e cada momento expressivo d o corpo. O s teatros orientais. Q ualquer pessoa ligada ao teatro e que te n h a um conhecimento hi stórico rn ínimo , te rá id éia d a impo rtância q ue os teatros o r ie n ta is têm, ainda hoje, no processo d e produção e re-invenção d o te atro n o Ocidente. Poderíamos nomear novamente : o s te a tro s clássicos japone - ses, em M e ie rh old, Eisenstein, C la u d e l até Bob Wilson; o Teatro d e B ali em Artaud ; o teatro ch in ês, em Brecht; os tea tros c lássicos j a p o - neses e indianos em Gordon Craig, Grot óvsk.i e Mnouchkine.. . Tais formas teatrais exerceram uma enonne influência sobre esses e o utros criadores. Examinamos aqui o aspecto é tico. Tal aspec to toma-se u m material à m ed ida q u e , corno s e ve rá duran te o século XX com Stanislávsk i, Copeau, B re cht , Grotóvski, Peter B ro o k .. ., e le contribui A C O DIFICAÇÃO DOS MATER IAIS 19 de maneira d e te rmin a nte para construçã o d os proces s os perceptiv o s n e cessá rio s à concretiz a ç ã o d o q ue s e e stá investigando em cada pro - cess o art ístico, e que, p or sua vez, c onstituirá a identidade d a o b ra . Os c riad o re s acima citado s , util izando -se do a spe cto é t ico enquanto m a - terial, m o straram-no s que a s verdadeiras des c oberta s a rtíst ic a s d e vem necessariamente g e ra r uma transfonnação perceptiva n o s artistas e n - vo l'vidos , para. a p a rti r dela, transforma r p e rc e p tiv a m e nte também o público. Essas três escolhas, ou p o d e m o s dizer matri ze s , responsáveis p e la c o n c e p çã o e u ti li zação dos materiais enquanto tai s, a o mesmo tempo os c odific ararn ê". N o s três casos e m que stão, v emo s o e s tabelec imento de uma c onexã o e n t re os respectivo s materia is e o s p lanos do c onteú- d o e d a expressão . Detsarte, para cada po sição d as partes do corpo, d e termina u m s ign ifi c a d o . D alcro ze, e stabelecend o a re lação entre corpo e música através d o ri tmo, assoc ia -o à e xpre s sã o d o c o rpo e aos con teúdos d a m ú sica. Nos teatros o r ien tais, a a ti tu de e s pecífica d o a to r e m rela ç ã o ao próprio trabalho materializa a c one x ã o e n tre o asp ecto é t ico e a quali dade e x p ress iva d e s ua criação a rtíst ica. Tal conexão s e d á nos d o is plano s c ita dos, o d o c o n teúd o e o da exp ressão . Des sa forma , v e m o s n o s trê s cas o s examinado s e le m e n tos s e ndo ut i lizad o s como m ater ia is , ou s ej a, c o mo fundamentai s para a con stru- ção da identidade d o o bj eto express ivo do q ual fazem parte. A lém dis- so, v imos co mo ta is utilizações e n vo lve m os dois p lano s constitutivo s do código. Toma-se pertinente , portanto , d enom inar o s casos d esc ritos como representativo s de um p ro cesso de co d ificação d os materiais. • C lassificaç ão dos m a teria is O s m a teriais, existe n tes enquanto tais, p re s ente s na pratica s tea - trai s tratada s n e s ta p a rte d o trabalho, com o vimos são: o co rp o ê", con - siderado c omo canal d e e xpre s s ã o , o u s eja , e nquan to con e c tar entre p ro c e s s o interio r e m ani festa ção e x terior; o r irmo , v is to com o e lemento fundam enta l p a ra a construção da identidade da expressão ; o aspecto ét ico ; g erad o r d e uma a ti tude q u e constrói a p e rcepç ã o neces s ária para ) des envolvimento d e cada pro c e s s o c ria t iv o. O conc eito d e m arerial tal com o definido a nteriorrnente; torna-se efi ca z à m edida que a b a rc a e lementos d e d iferentes naturez as, e lemen- o s e stes util iz ado s n o s proces s o s d e trabalho d o a tor. Tais materiais , 3 7 . " Í . . .] u m có d ig o deve po ssuir, o u ser c o m p os to , para se r tal , d e dois s istemas : m presente , rec o n he c id o como o ' p la no d a expressão'; e o o utro. a usen te . reconhe c id o :)1110 ' p la no d o conte úd o "". M . D e M arin is, S emiotic a d eI Te a tro . M ila no, Bompiani , 98 2 . p . 113 . 38. En tendemo s por c o rp o . ad o tando co mo matri z ne s te caso a feno meno logia d e lerleau-Ponty, todo s os atributos m a te r iai s ligado s a o se r h u m a no . Portanto. n ão 50- le n te a c a beça. tronco e membros , como ta mbém a p ala v ra can tad a e ra lad a e a sua m oi-i dade . 20 o ATOR-C O M POSITO R porém.. em função de s uas diferente s nature za s . ex igem uma ulterior diferenciaç ã o: o corp o , entendido com o u n id a d e p sicofisica,. p ode ser defi nido c omo material p rim ár i o , po is é nele que os materiais secun - dários e te rc iá r io s estã o contido s , e será sobre ele que tais m a te r iais a tuarão; a a çã o fis ic a s e rá o mate rial secu n d á rio , pois a lém d e conter os mate r iais terc iá r ios , ela é. corno v e re m os,. o e lemento estruturante dos proc e di m ento s exp res s ivos do co rp o ; o r itm o e o aspecto é tico são a qui c lass itic ados e ntre o s materia is te rc iá r ios . p o is s ã o pro c edimen- to s e/ o u e le m ento s const it u t ivo s d a a ção física, a tuan d o e m seus p ro - c esso s de preen c hime n to e justific a ç ão !" . T e n do já e xaminado o c o rpo a p arti r d as teorizações de D e ls a rte , aq u i c lassificado com o mate rial p rim ári o . passemo s à a n á l ise dos o u - tros materi ai s a partir d a q u e le consid e rad o n e ste trabalho c o rno s e n d o o m aterial s e c undário, o u sej a , a a ção fisica. 39. O r itmo e o aspecto é tico fo ra m aq u i clas s ifi cad o s como m a teria is te rciá r ios . No e n ta n to, ele s n ão são o s ú nicos com po nentes d a aç ão fistca, o bvia m en te. Outro s m a ter ia is te rciá r io s serão tratad o s n a segu nda parte desta pesqu isa. 2 . A Ação Física como Elemento Estruturante do Fenômeno Teatral 2 . 1. AÇÕES FíS ICA S : B R EVE HISTÓRIC O E ANÁLISE D O CONCEITO Categor ia con trá r ia àq ue la da paixã o. a ação para Aristóte les é a que p re ssupõ e o S er. a sua existênc ia. De m ane ira se m e lh a n te. para Leibn iz e Spinosa a a ç ão é a essência d e urna s u bstânc ia. P o d e r-se -ia . nes s e sen tido . percorrer a H istória da F ilo sofia busc ando demarcar as d iferenças e especi fic id a des que o conceito de a ção adquire em cada caso. Contu do. ta l esco lha le v a r ia-n o s- ia a que s tõ e s e meandro s que consrituiriam, p o r si só. o o bjeto d e uma p esquis a . O ptei portanto , p or partir do conceito de ação fisica., tendo como re fe rência p ri m e ira os escritos do a to r, diretor e teór ico russo Constan t in S tan islávski. A pós a d e s criç ã o de a lguns mom entos do percurso artístico d e S tan islávski.. q ue o le va ra m ao Método das Ações P ís icas, tra tarei d as posterio res contr ib u içõe s fei tas para o desenvolvimento do conceito de ação fis ica. Tal conceito será por fim revisto, a partir das análises fei tas no item 2 .2. 2 . 1. 1. C . S ta n islávsk i, Da L inha das Forças Motivas ao M é todo das Ações Físicas Com o sa b e rn o s, o conceito de a ção fís ica foi p ri m e ira mente ela- borado por C o ns ta n t in Stanislávski ( 1863 -1938), após inúmera s e tapas de aprendizado e p r áti c a teatra l. No in ic io, nas mon tage ns d o s vaudevilles .. ele constata q ue o tra b a lho do ator cons istia na simp les 2 2 o ATOR-COMPO S ITOR re p etiç ã o d e p ro c e d imento s e códigos q ue caracterizavam as p ers o n a- gens e as situações: " Q uanto mais eu representava, tanto mais insisten- te m ente pro c ura v a para mim caminhos verdadeiros, e tanto m a is forte- mente crescia a m inha perple x id a d e " ' . Em seguida, na passagem pelo Teatro Mali .. Stanislávski b uscou.. a partir da observação dos atores m a is experientes.. extrair princ ípio s utilizáveis praticamente. Assim como n a p rática com o vaudevil/e .. também n e sse caso os alunos deve- fiam imitar o s professores , sem portanto a ssimilar conhecimentos que pudessem fazer com que eles c onstruíssem as próprias per s o n a g e n s . Seguiu-se então a experiência com as operetas do Círculo Aleksiêiev, em que ele percebe p e la prirneira vez a importância d o tra b a lh o rítmi- co na construção da ação; e a criação em 18 8 8 da S ociedade de Arte e Literatura de Moscou. Na Sociedade de Arte, Stanislávski trabalhou com o diretor P iecí ótov, que, a partir d o trabalho com O Cavaleiro Avarento , de P ú s chk in, p ropo rcio n o u a ele uma experiência que privi- le g ia v a as a ções inte riores . P oré m , e ssa n ã o foi a ú nica lição aprendi- d a por Constant in nessa o c a s iã o. Ela serviu para q ue e le c hegasse a u rrra conclusão fundamen tal para o desen cadeamento d o s a c ontecim e n- tos posteriores : O s dire tores exp licam com ta le n to o q u e querem o b ter, o que é p rec iso para uma peça; interes sa a e les a pen as o resu ltado final. E le s c ri tica m, ind icando a inda o que n âo se deve fazer. m a s " c o m o" o bter o d esejado é coisa q ue ninguém dí z". E m 18 9 7 , e rifi rn, o long o e ncontro com N ierniróvitch - Dân tchen ko. B uscando construi r as bases p a r a a prá tic a d e u m n o v o te a t ro , a u tôno- m o em re lação aos buro c r ata s q ue administravam os teatro s e cafés d a c idade, S tan islávski e D ântche n k o fundam em 18 9 8 o T eatro d e A rte d e M o s c ou . Nos p r imeiros mom e ntos do Teatro d e Arte, S tanislávski bus c a in stau rar novas p rát icas n o processo de montagem d o s e spetá culo s : a música d e v e r ia ser composta em função de cada espetácu lo e specifi- camente, e os figu rinos deveriam ser s u b m e t id o s , quando nec e s s á r io , a u m a pesquisa h istó rica . P o ré m , no que diz respeito ao trabalho d o ator, ele a inda n ã
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