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Eugênio S. Ramos – Medicina UFRN P4 IMUNIDADE INATA Existem, basicamente, duas vias de acesso dos patógenos: a superfície de mucosas; e o epitélio externo (pele). A pele e mucosas são as primeiras barreiras para micro- organismos (m.o.), atuando por 3 mecanismos: Mecânico = gap junctions; fluxo de fluidos; movimento ciliar; lágrimas. Químico = peptídeos antibióticos; lisozima (lágrima e saliva); pH; enzimas; surfactante (opsonização); Microbiota normal = competição (prova disso é que o uso prolongado de antibióticos pode afetar a microbiota normal [desequilíbrio] e favorecer o crescimento de outros m.o., como o Candida albicans). Na epiderme, os queratinócitos do estrato espinhoso que produzem as defensinas e catecidinas, além de produzir precursores inflamatórios. No epitélio pulmonar ciliado, o batimento ciliar move o fluxo de muco, expulsando potenciais patógenos. Além disso, os pneumócitos tipo II produzem as defensinas, que têm ação sinérgica com os macrófagos alveolares, pelo fenômeno de opsonização. No intestino, as células de Paneth produzem as defensinas e outros peptídeos antibióticos. É possível que a desregulação da produção desses agentes, por mutações, possa levar à autoimunidade doença de Chron (em estudo). As lisozimas são enzimas que agem em bactérias gram- positivas (e negativas em menor grau), fazendo a degradação de peptideoglicano. As defensinas, por sua vez, rompem a membrana celular dos patógenos, formando poros. Existem fases da resposta imune a uma infecção: (1) barreira anatômica e ação de efetores inespecíficos e naturais; (2) imunidade inata – PAMPs ativam macrófagos; (3) imunidade adquirida. Comparação das imunidades inata e adquirida A especificidade da imunidade inata é restrita, pois reconhece estruturas compartilhadas entre classes de micro-organismos = PAMPs (padrões moleculares associados aos patógenos). Os diferentes tipos de m.o. expressam diferentes PAMPs, incluindo flagelos, ácidos nucleicos exclusivos (vírus), lipídios e carboidratos complexos. Os PRRs (receptores de reconhecimento de padrões) reconhecem os PAMPs, como o lipopolissacarídeo (LPS) de bactérias gram-negativas. Os receptores são codificados na linhagem germinativa dos macrófagos, justificando a restrição dessa especificidade. Existem diversos tipos de PRR, como receptor de manose, toll- like, do tipo RIG, etc. Assim, uma mesma linhagem apresenta os mesmos PRRs. O contrário acontece na imunidade adquirida, em que essa distribuição é clonal – os linfócitos são clones com especificidades distintas, pela expressão de diferentes receptores. Como isso ocorre? Esses receptores são formados por recombinação (rearranjo gênico de receptores de membrana) nos órgãos de maturação, aumentando a diversidade para estruturas patogênicas. Além disso, quanto à discriminação para células do hospedeiro, costuma ser perfeito na imunidade inata. Na adquirida, disfunções podem levar à autoimunidade, pela expressão de receptores que fazem autorreatividade. Esses receptores são programados à morte quando passam por pontos de controle. Quando esses mecanismos de controle são afetados, a autoimunidade é favorecida. Portanto, em um quadro infeccioso por exemplo, em que há estímulo à imunidade inata, problemas nesses mecanismos são exacerbados. Quais são os componentes dessa 2ª linha de defesa? Fagócitos = identificar > capturar > eliminar. A fase de identificar consiste no reconhecimento dos PAMPs. Quais são os PAMPs? São ácidos nucleicos, proteínas, lipídios (LPS, ácido teicoico [gram-positivas]), carboidratos (fungos). Eugênio S. Ramos – Medicina UFRN P4 Além dos PAMPs, há os DAMPs (padrões moleculares associados ao dano), que também disparam a imunidade inata, via proteínas induzidas por estresse, cristais (como na gota) e proteínas nucleares. Os fagócitos têm PRR na membrana, citoplasmas da célula e nas membranas endossomais. TLR (Receptores do tipo toll) NLR – produtos bacterianos (LPS), naturais (cristais). RLR – RNA viral CDS – DNA microbiano Scavenger – reconhece DAG bacteriano. N-formil met-leu-phe – ativador de citoesqueleto e migração celular. Esses receptores, após identificar e capturar, têm ação microbicida, havendo, ao final, formação de citocinas inflamatórias, que se for muito intensa, pode levar a choque. Além disso, há produção de moléculas solúveis que atuam como opsoninas, sendo distribuídas aos tecidos quando há processo inflamatório, que aumenta a permeabilidade do vaso. Nesse caso, é a produção basal que é multiplicado. Ao encontrar o patógeno, sua ação faz a exposição do sítio de ligação do patógeno, o que facilita o reconhecimento do patógeno. A proteína C reativa (PCR) é um indicador de processo inflamatório. A PCR e outras proteínas da fase aguda podem agir como opsonina e também ativar o complemento. O que é opsonização? É um mecanismo da imunidade em que há um revestimento do patógeno por proteínas que sinalizam para a fagocitose. As citocinas são indutoras de maior produção dessas moléculas, em que sua ação no fígado leva a ↑ proteínas da fase aguda. Além disso, as citocinas também são ativadoras do sistema complemento, favorecendo a captura do patógeno. As citocinas da imunidade inata, portanto, têm grande importância. O TNF, IL-1 e IL-6 são produzidas pelos fagócitos ativados para iniciar o processo inflamatório. Os IFNs (interferon) tipo 1 (IFN-α e -β) são antivirais. Os IFNs tipo 2 (IFN-γ) têm ação ativadora de macrófagos, ativando suas vias microbicidas, além de atuar nas células NK e linfócitos T. As citocinas IL-12 e IL-18 também são produzidas pelos macrófagos ativados, com ação parácrina nas células NK para produção de IFN-γ. Esse é um exemplo de retroalimentação positiva que potencializa a imunidade inata. Também atuam em linfócitos T – síntese de IFN e ↑ atividade citotóxica (IL-12). A IL-15 é produção pelo macrófago ativado e favorece a proliferação das células NK. A IL-10 e o TGF-β são moduladores da resposta imune, sendo produzidas pelos macrófagos e linfócitos Treg – citocinas anti-inflamatórias controle da infecção. Os macrófagos ativados englobam o patógeno, iniciando a resposta inflamatória. Os TLRs reconhecem diversas estruturas, estando na membrana ou nos endossomos. A ativação das cascatas bioquímicas se dá com a ativação desses receptores atuvação de fatores de transcrição [NF-kB] ↑citocinas e ↑pró-citocinas produtos secretados = inflamação aguda + resposta imune inata. Se a ativação do IRF (fator de transcrição) predominar, como em uma infecção viral, há grande secreção de IFN do tipo I. Com isso, é estabelecida um estado antiviral. Eugênio S. Ramos – Medicina UFRN P4 Os NLRs são sensores intracelulares (citosólicos) de infecções bacterianas, que apresentam 3 domínios, em que a ação do domínio efetor termina pela formação de citocinas. Esse efetor é ativado quando o ligante é acoplado a outro domínio, recrutando proteínas (sinalossoma) proteínas adaptadoras ativação do NF-kB inflamação. No intestino, há um domínio de NLR que regula as defensinas. É possível que uma mutação desse domínio leve a uma perda de função => ↓defensinas propensão a doenças autoimunes, como doença de Chron. A NLR também responde a PAMP e DAMP, em que a ação do efetor é com a ativação da pró-caspase-1 por meio da formação de inflamassoma = complexo que ativa a caspase. A caspase-1 ativada agena pró-IL-1β para formar IL-1β, a qual é secretada e dispara inflamação aguda. Esse mesmo mecanismo se dá para IL-18. A CAPS – síndrome periódica associada à criopirina – é uma síndrome auto-inflamatória por ganho de função em componente do inflamassoma = inflamação desregulada excesso de IL-1 ataques recorrentes de febre e inflamação no TGI e articulações. Os RLRs também são receptores citosólicos e reconhecem RNAviral, estimulando produção de IFN tipo 1. O receptor, ao reconhecer o RNA, sofre uma mudança conformacional e se acopla à mitocôndria, acionando moléculas adaptadoras para a transdução do sinal bioquímico de ativação do NF-kB e TRF. Com isso, ↑citocinas e ↑ IFN tipo 1. Os CDS são sensores de DNA microbiano e se acoplam ao retículo endoplasmático para acionar a produção de IFN tipo 1 via fator de transcrição. Além disso, estimulam a autofagia, formando membrana para os patógenos para que sejam encaminhados para os lisossomos. Porém, certos vírus escapam desse mecanismo de autofagia, por meio de alteração do processo que leva à inibição dos fatores autofágicos do lisossomo. Estudos indicam a possibilidade de que o ZIKV tenha esse mecanismo, favorecendo sua replicação. Como se dá a migração celular ao tecido? As citocinas pró-inflamatórias, estimuladas pela ligação de patógenos aos fagócitos, leva à ativação o endotélio vascular para elevar a permeabilidade de proteínas e de células do sangue para o tecido. Nesse evento, a IL-1 e o TNF liberados agem no endotélio. O processo de migração, que é executado pelo leucócito, se dá em etapas: adesão por rolamento; união forte; diapedese; migração. Obs: no processo de vasodilatação local há grande ação de aminas vasoativas, como a histamina. A adesão por rolamento é mediada por selectina, a qual determina uma adesão fraca entre o endotélio e o leucócito. A ativação do ligante de integrina leva a um aumento da liberação de quimiocinas, que se ligam ao seu receptor no leucócito. Com a formação do complexo quimiocina- receptor, há ativação de integrina de alta avidez, havendo uma adesão firme ao endotélio. Assim, a associação da integrina ao ligante de integrina funciona como um freio para o leucócito. Eugênio S. Ramos – Medicina UFRN P4 Após o freio, a diapedese corresponde à atração química pelas citocinas, o que é determinando por um gradiente quimiotático de maior concentração no tecido. Por fim, há a migração, favorecida pela maior permeabilidade do endotélio. As quimiocinas atuam na medula para aumentar a produção de polimorfonucleares. Assim, o TNF atua em monócito como fator de diferenciação para macrófagos. Uma quantidade muito alta de TNF determina formação de granuloma, como forma de defesa a um tecido que escapa da resposta imune. O leucócito, atingindo o seu sítio de ação (fagócito), realiza sua função fagocítica, endocítica e microbicida. Como se dá a ação microbicida dos fagócitos? A morte dos m.o. se dá por enzimas lisossomais proteolíticas, por ROS (espécies reativas de oxigênio) e NO (nitrogênio reativo). A deficiência genética de NADPH oxidase leva à doença granulomatosa crônica, em que a dificuldade de fagocitar patógenos leva à grande formação de granulomas. A via do NO é induzida pelo IFN-γ. A ação microbicida ocorre: pela inativação do ferro ao se ligar ao NO; ou pela ação de peroxinitrito (formado pela reação NO + H2O2). Como se dá a ação das citocinas da imunidade inata? A IL-6 tem ação nos hepatócitos para formar proteínas da fase aguda, como PCR, fibrinogênio, proteína amiloide sérica (opsoninas e ativação do complemento). O TNF pode ter ação local ou sistêmica. Localmente, atua ativando o endotélio vascular, aumentando sua permeabilidade e, consequentemente, a leucocitose. Sistemicamente, a ação pode ser protetora ou patológica. Fisiologicamente, ativa COX-2 que leva a síntese de prostaglandinas no hipotálamo (PGE2) e faz um quadro de febre. Na medula óssea, estimula a leucocitose. No fígado, atua aumentando a síntese de proteínas da fase aguda. Patologicamente, pode levar a um quadro de choque séptico, principalmente em infecção sistêmica por gram- negativo. Nesse processo, uma liberação sistêmica elevada de TNF-α pelos macrófagos ativados do fígado e do baço leva a uma ativação generalizada do endotélio vascular, com consequente colapso de vasos sanguíneos. Com esse colapso, há coagulação intravascular disseminada, contribuindo para a falência de múltiplos órgãos. Além disso, esse colapso leva a edema tecidual hipovolemia – hipotensão bradicardia. Células NK As células NK contém grânulos com enzimas que atuem em células infectadas acionando diversas vias que levam à morte celular. A ativação dos receptores de morte leva à liberação dos grânulos. Além disso, após serem estimulada por IL-12 do macrófago, levam a maior produção de IFN = alça de retroalimentação positiva. Os MHC configuram um mecanismo imune importante. Os MHC-1 são expressos em células normais. Quando sua expressão é alterada, como quando ele deixa de ser expresso, por ação de certos vírus, a célula é reconhecida pela célula NK como célula infectada, levando à liberação de seus grânulos. A superexpressão de MHC leva à mesma sinalização de morte. Portanto, o MHC-1 é um marcador de células normais. Outra forma de ação da célula NK é por ação de anticorpos (opsonização), os quais são reconhecidos pela célula NK. Perfurinas granzimas = ativação de pró-caspases ativa DNAase = degrada DNA apoptose e lise osmótica. Eugênio S. Ramos – Medicina UFRN P4 Certos patógenos são capazes de evadir os mecanismos da imunidade inata, como a presença de cápsula em penumococos para a evasão da fagocitose; a resistência a intermediários reativos, como o S. aureus, que produz catalase; resistência a peptídeos antibióticos, como a Pseudomonas. Por fim, o sistema imune inato interage com o sistema imune adaptativo.
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