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I Desenvolvimento e distúrbios do desenvolvimento Alberstone_01.indd 13Alberstone_01.indd 13 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Alberstone_01.indd 14Alberstone_01.indd 14 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 esse processo de disjunção (não disjunção) e o término da disjunção antes do fechamento do tubo neural (disjunção prematura) são duas fontes de disrafismo medular. Antes que o tubo neural se feche completamente du- rante a quarta semana de desenvolvimento embrionário, ele se comunica com a cavidade amniótica através dos neu- róporos anterior e posterior. O neuróporo anterior se fecha entre os dias gestacionais 23 e 25; o neuróporo posterior se fecha entre os dias gestacionais 25 e 27. Ao longo das margens laterais de cada lado das célu- las neuroepiteliais da placa neural, existem duas faixas de células que se originam da fenda neural enquanto ela for- ma o tubo neural. Essas células da crista neural geralmente ocupam uma posição dorsolateral entre a superfície ecto- dérmica e o tubo neural. A maior parte do sistema nervoso periférico é derivada da crista neural, incluindo células de gânglios sensoriais dos nervos cranianos e espinais, gân- glios autônomos e células de Schwann. As células da crista neural dão origem à medula adrenal, assim como aos mela- nócitos (Tabela 1.2). O espessamento das paredes do tubo neural forma o cérebro e a medula espinal, enquanto o lúmen do tubo passa a formar o sistema ventricular e o canal central. As células epiteliais que formam as paredes do tubo neural dão origem aos neurônios e macróglia (ou seja, astrócitos, oligodendrócitos e células ependimárias). A micróglia é de- rivada de células de origem mesodérmica que entram no sistema nervoso central (SNC) a partir da vasculatura du- rante o desenvolvimento (Tabela 1.2). Conhecer o desenvolvimento do sistema nervoso pode fornecer a base para a compreensão de sua estrutura e função. Este capítulo descreve o desenvolvimento inicial do sistema nervoso e, então, discute o desenvolvi- mento da medula espinal e do cérebro. As principais mal- formações devidas ao desenvolvimento anormal do sistema nervoso também são discutidas. A Tabela 1.1 resume os elementos embriológicos do sistema nervoso e seus deriva- dos na idade adulta. Desenvolvimento neural inicial Vide Fig. 1.1. A formação do sistema nervoso se inicia durante a terceira semana gestacional, quando a placa neural se de- senvolve a partir de um espessamento do ectoderma em- brionário. Uma fenda neural longitudinal, delimitada por duas pregas neurais, forma-se ao longo da linha média da placa. A fusão das duas pregas neurais, que se encontram ao longo da linha média, prossegue tanto na direção cra- nial como na caudal, transformando gradualmente a placa neural no tubo neural, que fica situado abaixo da superfície ectodérmica. O processo de formação do tubo neural (neurulação) ocorre simultaneamente à separação do neuroectoder- ma da superfície ectodérmica, um processo denomina- do disjunção. A disjunção promove a separação do futu- ro sistema nervoso da futura pele. A falha em completar 1 Neuroembriologia Tabela 1.1 Derivados adultos das vesículas cerebrais embrionárias Derivados adultos Vesículas primárias Vesículas secundárias Paredes Cavidades Cérebro anterior (prosencéfalo) Telencéfalo Hemisférios cerebrais Lateral Diencéfalo Tálamo Terceiro ventrículo Epitálamo Hipotálamo Cérebro médio (mesencéfalo) Mesencéfalo Cérebro médio Aqueduto cerebral Cérebro posterior (rombencéfalo) Metencéfalo Ponte Quarto ventrículo Cerebelo Mielencéfalo Bulbo Quarto ventrículo Alberstone_01.indd 15Alberstone_01.indd 15 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 16 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz A A' Placa neural Ectoderma Notocorda Prega neural Somito Tubo neural Crista neural Somito Canal central Somito Medula espinal (substância branca) Medula espinal (substância cinzenta)Medula espinal Cérebro AA'Dorsal Neuróporo anterior Neuróporo posterior Fenda neural 3a semana 4a semana Fig. 1.1 Desenvolvimento neural inicial. Tabela 1.2 Comparação dos derivados do tubo neural e das cristas neurais Derivados do tubo neural Derivados das cristas neurais Células do corno ventral Gânglios cranianos Neurônios autônomos pré-ganglionares Gânglios das raízes dorsais Astrócitos, oligodendrócitos e células ependimárias Gânglios autônomos Retina Células de Schwann Neuro-hipófise Medula adrenal Neurônios corticais Melanócitos Núcleos cinzentos do cérebro e da medula espinal Alberstone_01.indd 16Alberstone_01.indd 16 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 17 O neuroepitélio também dá origem aos neurônios pri- mitivos, chamados neuroblastos, que migram periferica- mente para revestir a camada neuroepitelial. Essa camada, denominada camada do manto, mais tarde formará a subs- tância cinzenta da medula espinal. Enquanto os neuroblastos da camada do manto se de- senvolvem em neurônios maduros com processos citoplas- máticos, esses processos se estendem perifericamente para formar a camada marginal mais externa que, mais tarde, se transforma na substância branca da medula espinal. Astrócitos e oligodendrócitos também são derivados de células blásticas precursoras que se originam na camada neuroepitelial e migram perifericamente para o interior das camadas do manto e marginal. Desenvolvimento inicial da medula espinal Vide Fig. 1.2. Três camadas de células são formadas a partir da pro- liferação e diferenciação do epitélio pseudoestratificado es- pesso que forma a parede do tubo neural. De dentro para fora, essas camadas são denominadas camada neuroepite- lial, camada do manto e camada marginal. Na região mais interna do tubo neural, o neuroepitélio forma uma camada de células colunares ciliadas, a cama- da neuroepitelial (ou ependimária), que reveste os futuros ventrículos e o canal central. Membrana limitante externa Camada marginal Camada do manto Camada neuroepitelial Tubo neural Neurônio Neuroblasto Célula neuroglial Cérebro anterior Cérebro médio Cérebro posterior Medula espinal Parede do tubo neural Fig. 1.2 Desenvolvimento inicial da medula espinal. Alberstone_01.indd 17Alberstone_01.indd 17 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 18 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz limitante, que se desenvolve ao longo dos lados da cavida- de central. A placa alar forma as colunas cinzentas dorsais, que contêm neurônios sensitivos aferentes. Em corte transver- sal, essas colunas são denominadas cornos dorsais. A placa basal contém neurônios motores somáticos e autônomos, que constituem as colunas cinzentas ventral e lateral, res- pectivamente. Em corte transversal, essas colunas são co- nhecidas como os cornos ventral e lateral. Substância cinzenta da medula espinal Vide Fig. 1.3. O espessamento das regiões dorsal e ventral do tubo neural dá origem às placas alar e basal, respectivamente. Juntas, essas placas representam a futura substância cin- zenta da medula espinal. Esses abaulamentos dorsais e ventrais são separados por uma fenda longitudinal, o sulco Camada marginal (futura substância branca da medula espinal) Camada do manto (futura substância cinzenta da medula espinal) Camada ependimária (futuro revestimento dos ventrículos e do canal central) Corno dorsal Corno lateral Corno ventral Sulco limitante Placa alar Placa basal Fig. 1.3 Substância cinzenta da medula espinal. Alberstone_01.indd 18Alberstone_01.indd 18 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 19 Os ramos periféricos dos gânglios da raiz dorsal pene- tram os nervos espinais, cursam perifericamente e acabam comoterminações sensitivas em estruturas somáticas ou viscerais. Os neurônios motores nas colunas cinzentas ventrais são derivados da placa basal. Eles projetam neurônios peri- fericamente para dentro das raízes motoras ventrais. Os neurônios motores somáticos nas raízes motoras ven- trais encontram os ramos periféricos dos gânglios das raízes dorsais na região do forame intervertebral para formar os nervos espinais. Os neurônios motores simpáticos nas raízes motoras ventrais também encontram nervos espinais, mas logo depois saem através do ramo comunicante branco para alcançar os gânglios paravertebrais e pré-vertebrais. Raízes ventrais e dorsais Vide Fig. 1.4. Os neurônios sensitivos nos gânglios das raízes dorsais são derivados da crista neural. Esses neurônios pseudou- nipolares projetam ramos centrais e periféricos (axônios). Os ramos centrais dos gânglios da raiz dorsal entram na medula espinal através das raízes sensitivas dorsais. Elas fazem sinapse na coluna cinzenta dorsal (trato espinotalâ- mico) ou ascendem na coluna branca dorsal para terminar no núcleo da coluna dorsal (coluna dorsal – lemnisco me- dial). Os neurônios na coluna cinzenta dorsal e do núcleo da coluna dorsal são derivados da placa alar. Placa alar Placa basal Corno dorsal Corno ventral Gânglio de raiz dorsal (derivado da crista neural) Axônios motores que partem Raiz motora dorsal Tronco de nervo espinal Raiz sensitiva dorsal Ramo comunicante branco para gânglios paravertebrais e pré-vertebrais Fig. 1.4 Raízes ventrais e dorsais. Alberstone_01.indd 19Alberstone_01.indd 19 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 20 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz tebra coccígea por meio de um cordão longo de pia-máter conhecido como filamento terminal. Devido às diferentes velocidades de crescimento da coluna e da medula espinal, o segmento da medula espinal não se correlaciona com os respectivos níveis da coluna vertebral. Na coluna cervical, cada nível vertebral corresponde ao nível do segmento me- dular subsequente (ou seja, o sexto segmento da coluna cervical corresponde ao nível do sétimo segmento da me- dula espinal). Na coluna torácica alta, a diferença é de dois segmentos, e nas colunas torácica baixa e lombar alta, a diferença é de três segmentos. Como todos os nervos espinais passam através de seu forame intervertebral correspondente, as raízes lombares e sacrais são consideravelmente distendidas. Essas fibras alongadas constituem a cauda equina (do latim, cauda de cavalo). Ascensão do cone medular Vide Fig. 1.5. Durante os estágios iniciais do desenvolvimento, a ve- locidade de crescimento da medula espinal equivale à de crescimento da coluna vertebral: assim, os nervos espinais atravessam os forames intervertebrais em seu respectivo ní- vel de origem na medula espinal. Após o terceiro mês do desenvolvimento embrionário, no entanto, a velocidade de crescimento da coluna verte- bral supera a de crescimento da medula espinal, de modo que a terminação da medula espinal assume uma posição cada vez mais alta em relação à coluna vertebral. No adul- to, a terminação caudal da medula espinal, denominada cone medular, encontra-se ao nível da primeira vértebra lombar. O cone medular está fixado ao periósteo da vér- C I Raiz do primeiro nervo sacral Gânglio da raiz dorsal Vértebras L I L I S I S I Raiz do primeiro nervo sacral Medula espinal Medula espinal Cone medular Cone medular Filamento terminal L III S I Dura-máter L I Raiz do primeiro nervo sacral Cone medular Fig. 1.5 Ascensão do cone medular. Alberstone_01.indd 20Alberstone_01.indd 20 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 21 As vesículas cerebrais Vide Fig. 1.6. Durante a quarta semana gestacional, o tubo neural rostral toma a forma de três vesículas cerebrais primárias: o cérebro anterior ou prosencéfalo, o cérebro médio ou me- Parede Cérebro anterior (prosencéfalo) Cérebro médio (mesencéfalo) Cérebro posterior (rombencéfalo) Telencéfalo Diencéfalo Mesencéfalo Metencéfalo Mielencéfalo Hemisférios cerebrais Tálamo, etc. Cérebro médio Cerebelo Bulbo Ventrículos laterais Terceiro ventrículo Aqueduto cerebral Parte superior do quarto ventrículo Parte inferior do quarto ventrículo Medula espinal 3 vesículas primárias 5 vesículas secundárias Derivados adultos de Paredes Cavidades (4a semana) Ponte (5a semana) Fig. 1.6 Vesículas cerebrais. sencéfalo e o cérebro posterior ou rombencéfalo. Durante a quinta semana, o cérebro anterior se divide em telencéfalo e diencéfalo, o cérebro médio se transforma no mesencéfa- lo, e o rombencéfalo se divide em metencéfalo e mielencé- falo, resultando na formação de cinco vesículas cerebrais secundárias. Alberstone_01.indd 21Alberstone_01.indd 21 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 22 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz As flexuras cerebrais Vide Fig. 1.7. Com o desenvolvimento das vesículas cerebrais primá- rias, o cérebro se flete, ou se dobra, para formar a flexura Rombencéfalo Flexura cervical Flexura cefálica Prosencéfalo Telencéfalo Mesencéfalo Metencéfalo Mielencéfalo Flexura pontina Fig. 1.7 Flexuras cerebrais. cefálica na região do cérebro médio e a flexura cerebral na junção do rombencéfalo com a medula espinal. Mais tarde, forma-se uma flexura pontina compensatória entre as flexu- ras cefálica e cervical. Alberstone_01.indd 22Alberstone_01.indd 22 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 23 Outra alteração produzida pela expansão das paredes laterais do quarto ventrículo é a posição lateral que as pla- cas alares assumem em relação às placas basais. Isso expli- ca por que os neurônios sensitivos (derivados das placas alares) se situam lateralmente em relação aos neurônios motores (derivados das placas basais) na ponte e no bulbo, diferente de sua relação dorsal-ventral na medula espinal. O mielencéfalo Vide Fig. 1.8. O mielencéfalo se desenvolve para dentro do bulbo (medula oblonga). Muitas das semelhanças estruturais en- tre o bulbo e a medula espinal, que lhe é contínua, desa- parecem durante o desenvolvimento com a expansão do quarto ventrículo (vide discussão anterior). Os neuroblastos da placa alar se transformam em nú- cleos sensitivos; já os da placa basal se transformam em núcleos motores. Alguns neuroblastos da placa alar mi- gram ventralmente para formar áreas isoladas de substân- cia cinzenta, incluindo os núcleos olivares inferiores, que estão associados ao cerebelo, e os núcleos grácil e cunei- forme, que estão associados aos tratos coluna dorsal-lem- nisco medial. Na região mais ventral do bulbo caudal, situam-se as pirâmides medulares, que contêm os tratos corticospinais. O rombencéfalo (cérebro posterior) A flexura cervical marca a junção entre a medula espinal e o rombencéfalo. O rombencéfalo é dividido pela flexura pontina em mielencéfalo (o futuro bulbo) e metencéfalo (a futura ponte e cerebelo). A cavidade central do rombencéfalo se transforma no quarto ventrículo; sua superfície dorsal é delimitada por um teto de placa ependimária. A placa do teto é formada à medida que o quarto ventrículo se expande, avançando sobre suas paredes laterais, abertas tal como páginas de um livro. Como resultado dessa alteração, a placa do teto do quarto ventrículo, que é coberta por pia-máter vascular, é distendida e se torna muito fina. Em conjunto, a placa do teto e a pia-máter vascular constituem a tela corióidea. A invaginação da tela corióidea para dentro da cavidade do quarto ventrículo forma o plexo corióideo, que é respon- sável pela secreçãodo líquido cerebrospinal (LCS). Plexos similares se desenvolvem nos ventrículos laterais e no ter- ceiro ventrículo. O LCS sai do quarto ventrículo através de duas aber- turas laterais (os forames de Luschka) e de uma abertura mediana (o forame de Magendie), que se formam a partir de reabsorções locais do teto do quarto ventrículo. Alberstone_01.indd 23Alberstone_01.indd 23 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 24 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Placa alar Placa basal Placa basal (núcleos motores) Núcleo olivar inferior Placa alar (núcleos sensitivos) Quarto ventrículo Núcleo olivar inferior Pirâmide Núcleos sensitivos Núcleos motores Bulbo caudal Pirâmide Bulbo rostral Núcleo grácil Núcleo cuneiforme Camada do manto Camada marginal Canal central Fig. 1.8 O mielencéfalo. Alberstone_01.indd 24Alberstone_01.indd 24 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 25 centralmente se diferenciam formando os núcleos intracere- belares profundos. O desenvolvimento da ponte ocorre ventralmente ao cerebelo, na região ventral do metencéfalo. Os núcleos pon- tinos, cujos axônios se projetam para os córtices cerebelares contralaterais, passam a situar-se na ponte ventral; a ponte dorsal contém os núcleos dos nervos cranianos. Como no mielencéfalo, os núcleos motores dos nervos cranianos são derivados da placa basal, enquanto seus núcleos sensitivos derivam da placa alar. O metencéfalo Vide Fig. 1.9. A parte dorsal do metencéfalo se desenvolve formando o cerebelo, enquanto a parte ventral forma a ponte. O cerebelo é formado pela fusão dos espessamentos dorsolaterais do metencéfalo que crescem sobre o teto do quarto ventrículo. Esses espessamentos, ou lábios rômbicos, fundem-se na linha média para formar o verme do cerebelo, que é delimitado de cada lado pelos hemisférios cerebelares em crescimento. Neuroblastos migratórios periféricos con- tribuem com o córtex cerebelar, enquanto aqueles situados Alberstone_01.indd 25Alberstone_01.indd 25 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 26 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Quarto ventrículo Núcleos pontinos Placa basal com núcleos motores dos nervos cranianos em desenvolvimento Placa alar com núcleos sensitivos dos nervos cranianos em desenvolvimento Lábio rômbico (futuro cerebelo) CH 1C O Núcleos pontinos Núcleos motores dos nervos cranianos Núcleos sensitivos dos nervos cranianos Quarto ventrículo Verme do cerebelo Hemisfério do cerebelo Núcleos intracerebelares Córtex cerebelar Fig. 1.9 O metencéfalo. Alberstone_01.indd 26Alberstone_01.indd 26 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 27 nados com os reflexos visuais. Esses agrupamentos de célu- las produzem quatro abaulamentos na superfície dorsal do mesencéfalo, conhecida como placa quadrigêmea. A subs- tância cinzenta central que circunda o aqueduto também é derivada dos neuroblastos das placas alares. Os neuroblastos das placas basais dão origem a diver- sos grupos de neurônios no tegmento do mesencéfalo, in- cluindo os núcleos dos nervos cranianos oculomotor (III) e troclear (IV), os núcleos reticulares, o núcleo rubro e a substância negra. Os dois pedúnculos cerebrais no mesencéfalo ventral contêm fibras corticais descendentes para o tronco cerebral e a medula espinal. O mesencéfalo Vide Fig. 1.10. Dentre todas as partes do cérebro, com exceção do rom- bencéfalo caudal, o mesencéfalo é a estrutura que passa pelas alterações menos dramáticas durante seu desenvol- vimento. A cavidade central do mesencéfalo forma o aque- duto cerebral de Sylvius, que conecta o terceiro ao quarto ventrículo (cavidades com maior capacidade de expansão). Neuroblastos oriundos da placa alar migram para o teto do mesencéfalo para formar os colículos inferiores, re- lacionados com a audição, e os colículos superiores, relacio- Placa alar (futuro teto) Placa basal (futuro tegmento) Teto Aqueduto cerebral de Sylvius Substância cinzenta central Colículos inferiores/superiores Núcleo oculomotor Núcleo rubro Substância negra Tegmento Pedúnculos cerebrais Fig. 1.10 O mesencéfalo. Alberstone_01.indd 27Alberstone_01.indd 27 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 28 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz O hipotálamo contém diversos grupos celulares re- lacionados com funções autonômicas e endócrinas, bem como um par de grupos neuronais denominados corpos ma- milares, vistos como proeminências arredondadas na super- fície ventral do diencéfalo. Mais rostralmente aparecem duas outras proeminên- cias na superfície ventral do diencéfalo. São elas o quias- ma óptico, no qual as fibras das metades mediais da retina cruzam a linha média, e o infundíbulo, que é o tronco da glândula hipófise. As retinas e a glândula hipófise são deri- vadas de uma combinação de ectoderma superficial e neu- ral, sendo que o último é derivado de uma evaginação do diencéfalo em sentido inferior. O telencéfalo No sistema nervoso, o telencéfalo está sujeito às alterações de desenvolvimento mais intensas. Ele dá origem aos he- misférios cerebrais, comissuras cerebrais, corpo estriado e cápsula interna. No início do desenvolvimento, o telencéfalo consiste em uma porção mediana e dois divertículos laterais, as ve- sículas telencefálicas, que irão se desenvolver em hemisfé- rios cerebrais. Como mencionado anteriormente, a porção mediana do telencéfalo está preenchida pela extensão ros- tral do terceiro ventrículo. As vesículas telencefálicas estão preenchidas pelos ventrículos laterais, que se comunicam com o terceiro ventrículo através do forame interventricu- lar (Monro). O prosencéfalo (cérebro anterior) No início do desenvolvimento, de cada lado do prosencéfa- lo se forma uma excrescência lateral denominada vesícula óptica. Essas vesículas, que dão origem às retinas e aos ner- vos ópticos, dividem o prosencéfalo em parte rostral e cau- dal, denominadas telencéfalo e diencéfalo, respectivamen- te. (As vesículas ópticas, em si, têm origem diencefálica.) O diencéfalo Vide Fig. 1.11. A cavidade central do diencéfalo se transforma no ter- ceiro ventrículo. Enquanto o terceiro ventrículo se estende para dentro da porção medial do telencéfalo, ele passa a ser delimitado por dois grandes ventrículos laterais. Nas paredes laterais do terceiro ventrículo se desenvol- vem três proeminências, que dão origem ao epitálamo, aos tálamos (dois) e ao hipotálamo. Os tálamos estão situados entre o epitálamo, dorsalmente localizado, e o hipotálamo, de localização ventral, sendo separados do epitálamo pelo sulco epitalâmico e do hipotálamo pelo sulco hipotalâmico. O epitálamo dá origem aos núcleos habenulares e à glândula pineal. Os tálamos, que se expandem acentuadamente para dentro das paredes laterais do terceiro ventrículo, reduzem o ventrículo a uma fenda fina. Em muitos cérebros, os tála- mos se encontram e se fundem na linha média, formando uma estrutura de substância cinzenta denominada massa intermédia. Lobo occipital Terceiro ventrículo Lâmina terminal Quiasma óptico Infundíbulo Corpo mamilar Hem isfé rio cer ebr al Tá lam o Hip otá lam o Epitálamo (futuro núcleo habenular e glândula pineal) Fig. 1.11 O diencéfalo. Alberstone_01.indd 28Alberstone_01.indd 28 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 29 Telencéfalo Futura ínsula 40 dias 3 meses 7 meses Sulco central Fissura lateral Sulco parieto-occipital Sulco pré-occipital Formação do lobo parietal Formação do lobo frontal Formação do lobo temporal Formação do lobo occipital Lo bo fron tal Lo bo pa rie tal Lo bo o cc ip ita l Lob o te mp ora l Ínsu la Fig. 1.12 Hemisférios cerebrais. Hemisférios cerebrais Vide Fig. 1.12. Durante a quinta semana gestacional, os hemisférios cerebrais em desenvolvimento se expandem em várias di- reções, cobrindo o diencéfalo, o mesencéfalo e o romben- céfalo. O mesênquima embrionário que é aprisionado na fissura longitudinal entre os dois hemisférios cerebrais dá origem à foice do cérebro. As múltiplas direções através das quais se dá a expansão dos hemisférios cerebrais são responsáveis por sua configu- ração madura, em forma de C. Assim, o lobo frontal é forma- do pelo crescimento anterior dos hemisférios; o lobo parietal, pelo crescimento laterossuperior e os lobos occipital e tem- poral, pelo crescimento posteroinferior. O lento crescimento da ínsula ou córtex insular que cobre a superfície externa do corpo estriado é sobrepujado pelos lobos frontal, parietal e temporal e, com isso, passa a ficar situado profundamente no sulco cerebral lateral (fissura de Sylvius). Um complexo padrão de sulcos e giros se desenvolve na superfície externa dos hemisférios cerebrais, o que leva a um aumento na superfície cerebral sem que haja um au- mento proporcional no volume cerebral total. Internamen- te, o desenvolvimento dos ventrículos laterais praticamente acompanha o desenvolvimento dos hemisférios. O corno anterior se forma no interior do lobo frontal, o corno poste- rior se forma no lobo occipital e o corno inferior se projeta no lobo temporal. O padrão de crescimento em forma de C apresentado pelo hemisfério cerebral e ventrículo lateral produz estru- turas paralelas em forma de C, incluindo o fórnice e o nú- cleo caudado (vide comentários adiante). Alberstone_01.indd 29Alberstone_01.indd 29 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 30 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz fibras de orientação longitudinal que se projetam do hipo- campo até os corpos mamilares do hipotálamo. Fibras co- missurais do fórnice conectam as formações hipocampais de ambos os lados, formando a comissura hipocampal. Fi- nalmente, a maior das comissuras cerebrais, o corpo caloso, assume a forma de um arco acima do terceiro ventrículo. Ele conecta os neocórtices de ambos os lados. Após o desenvolvimento dessas comissuras, o que resta da lâmina terminal é uma parede fina denominada septo pelúcido, que separa os cornos anteriores dos ventrículos la- terais. O corpo caloso e o fórnice ligam os cornos anteriores dos ventrículos laterais superior e inferiormente, respecti- vamente. Comissuras cerebrais Vide Fig. 1.13. Trata-se de grupos de fibras que interconectam regiões correspondentes dos dois hemisférios cerebrais. Essa fun- ção é originalmente assumida pela terminação cefálica do tubo neural, a lâmina terminal, que mais tarde forma a parede anterior do terceiro ventrículo. Três comissuras principais se desenvolvem dentro (ou a partir) da lâmina terminal. A comissura anterior é a primeira a ser formada. Ela conecta os bulbos olfatórios e os lobos temporais de ambos os lados. Formando um arco em forma de C que recobre o tálamo, o fórnice, que se desenvolve a seguir, consiste em Terceiro ventrículo Lâmina terminal Epitálamo Corpo caloso Comissura hipocampal Comissura anterior Quiasma óptico Fórnice Septo pelúcido Comissura hipocampal Corpo caloso Comissura anterior Quiasma óptico Fig. 1.13 Comissuras cerebrais (continua na pág. 31). Alberstone_01.indd 30Alberstone_01.indd 30 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 31 Hipocampo Corpo mamilar Tála mo Fórnice Corpo caloso Septo pelúcido Comissura hipocampal Fig. 1.13 Comissuras cerebrais (continuação). Alberstone_01.indd 31Alberstone_01.indd 31 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 32 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz No entanto, o desenvolvimento do corpo caloso como um todo não ocorre simultaneamente; na verdade, ele se- gue uma sequência rostral-caudal. Isso quer dizer que a interrupção do desenvolvimento do corpo caloso antes de sua conclusão resulta em uma porção anterior normalmen- te formada e uma porção posterior ausente ou só parcial- mente formada. Exceções dessa sequência rostral-caudal do desenvolvimento incluem as porções mais rostrais do corpo caloso – o rostro e a parte anterior do joelho. A vio- lação da regra “da frente para trás” também pode ocorrer como resultado de processos destrutivos secundários que lesam o corpo caloso depois de totalmente formado. Esses processos podem levar a um joelho e corpo ausentes ou pequenos, com esplênio e rostro intactos. Corpo caloso Vide Fig. 1.14. Em função de sua importância clínica, o desenvolvi- mento do corpo caloso merece uma discussão mais detalha- da. Anatomicamente, o corpo caloso é dividido em quatro partes: rostro, joelho, corpo e esplênio. O desenvolvimento do corpo caloso começa em torno da sétima semana gesta- cional, quando a região dorsal da lâmina terminal se espes- sa, formando a estrutura conhecida como placa comissural. Uma vez formada, desenvolve-se uma ranhura na placa comissural, que se enche de material celular. Esse material celular forma uma ponte glial superiormente acima da ra- nhura, cujos componentes celulares expressam moléculas de superfície e secretam mensageiros químicos que atraem e guiam axônios através da linha média para formar as três comissuras cerebrais. Exceção da regra rostral-caudal: o rostro e o joelho anterior se desenvolvem por último Formação da placa comissural (7 semanas) A fossa na placa comissural se enche de material celular Ponte glial formada pela atração de material celular, guiando axônios através da linha média para formar as comissuras cerebrais DESENVOLVIMENTO DO CORPO CALOSO Sequência ro stral-caudal do desenvolvimento Joelh o Corpo Esplênio Rostro Fig. 1.14 Corpo caloso. Alberstone_01.indd 32Alberstone_01.indd 32 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 33 A anatomia topográfica do corpo estriado é apresenta- da a seguir. O núcleo lentiforme (globo pálido + putame) situa-se ventrolateralmente ao caudado, separado pela per- na anterior da cápsula interna, que contém fibras dirigidas para o córtex e dele provenientes. A perna posterior da cáp- sula interna separa o núcleo lentiforme do tálamo. Funcional e histologicamente, o putame é similar ao núcleo caudado e, em conjunto, eles são conhecidos como estriado. O estriado recebe todos os impulsos aferentes dos gânglios basais. O globo pálido, que é funcional e histo- logicamente distinto do estriado, dá origem às principais eferências dos gânglios basais. Corpo estriado e cápsula interna Vide Figs. 1.15 e 1.16. O putame, o globo pálido e o núcleo caudado formam, em conjunto, o corpo estriado, que representa o principal componente dos gânglios basais. Essas estruturas se desen- volvem dentro do espesso assoalho dos hemisférios cere- brais, que passam por um crescimento menos lateralizado comparado com as finas paredes corticais. Como resulta- do, o estriado permanece próximo à linha cerebral média, imediatamente lateral ao diencéfalo (tálamo), devido à sua expansão posterior. Cápsula interna Núcleo caudado Núcleo lentiforme (globo pálido + putame) Fig. 1.15 Corpo estriado e cápsula interna. O putame, o núcleo caudado e o globo pálido constituem o corpo estriado. O tálamo é medial. O núcleo lentiforme (globo pálido + putame) situa-se ventromedialmente ao núcleo caudado, separado por uma cápsula interna. Alberstone_01.indd 33Alberstone_01.indd 33 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 34 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Como foi mencionado,o desenvolvimento peculiar em forma de C dos hemisférios cerebrais é responsável pela configuração dos ventrículos laterais. Isso também vale para o núcleo caudado em forma de C, cuja cabeça e corpo formam o assoalho do corno anterior e cuja cauda forma o teto do corno inferior. A B C Corpo estriado Fissura corióidea Forame interventricular Ventrículo lateral Fissura corióidea Ventrículo lateral Corno inferior do ventrículo lateral Corno anterior do ventrículo lateral Núcleo lentiforme Cabeça do núcleo caudado Cauda do núcleo caudado Corno inferior do ventrículo lateral Fig. 1.16 Desenvolvimento em C do núcleo caudado. Dois pequenos tratos de fibras nessa região devem ser mencionados. A cápsula externa contém fibras de projeção cortical que passam lateralmente em relação ao núcleo len- tiforme. A cápsula extrema separa outro núcleo, o claustro, do córtex insular. Alberstone_01.indd 34Alberstone_01.indd 34 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 35 um joelho ou corpo pequeno ou ausente e um esplênio e rostro intactos, geralmente são evidências de um processo destrutivo secundário, e não de uma interrupção do desen- volvimento. Uma exceção é a anomalia calosa, associada à holoprosencefalia, na qual o corpo apresenta um esplênio intacto na ausência do joelho ou corpo. Como o corpo se desenvolve ao mesmo tempo que o cérebro e o cerebelo, anomalias calosas frequentemente es- tão associadas a outras anomalias cerebrais, como a malfor- mação de Dandy-Walker, distúrbios da migração e organiza- ção neuronal e encefaloceles. Anomalias isoladas do corpo caloso em geral são assintomáticas. Os sintomas, quando presentes, frequentemente estão relacionados com as ano- malias cerebrais associadas. Os sintomas associados mais co- muns são convulsões e retardo mental. As anomalias calosas contribuem para diversos complexos sindrômicos, como a síndrome de Aicardi, que é um distúrbio ligado ao X envol- vendo espasmos infantis, agenesia ou hipogenesia do corpo caloso, coriorretinopatia e um eletroencefalograma anormal. Malformações congênitas Vide Tabela 1.3. Anomalias do corpo caloso Vide Fig. 1.17. Conforme mencionado, o corpo caloso se desenvolve em uma sequência rostral-caudal, com exceção do rostro e da porção anterior do joelho, que se desenvolvem mais tarde. Normalmente, o corpo caloso se desenvolve entre a oitava e a vigésima semana gestacional, no mesmo mo- mento que o restante do cérebro e cerebelo. A parada no desenvolvimento do corpo caloso pode resultar em sua au- sência parcial ou completa. Devido à sequência normal de seu desenvolvimento, uma ausência parcial do corpo calo- so quase sempre se apresenta com um joelho intacto, um corpo parcial ou completamente formado e um esplênio e rostro pequenos ou ausentes. Desvios desse esquema, como Corpo Joelho Rostro Esplênio CORPO CALOSO NORMALMENTE DESENVOLVIDO CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS O rostro e o esplênio do corpo caloso estão ausentes A hipogenesia do corpo devido à interrupção do desenvolvimento produz, tipicamente, um joelho e corpo intactos, com ausência de esplênio e rostro Outros padrões de hipogenesia sugerem um processo destrutivo secundário, mais do que uma interrupção do desenvolvimento Anomalias calosas estão frequentemente associadas a outras anomalias cerebrais, como a malformação de Dandy-Walker, distúrbios da migração e organização neuronal e encefaloceles Os sintomas, que mais comumente incluem retardo mental, em geral resultam das outras anomalias cerebrais Fig. 1.17 Anomalias do corpo caloso. Alberstone_01.indd 35Alberstone_01.indd 35 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 36 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Tabela 1.3 Malformações congênitas do sistema nervoso central Processo de desenvolvimento anômalo Malformação congênita Defeito estrutural Manifestações clínicas Fechamento do tubo neural Anencefalia Crânio e hemisférios cerebrais ausentes Natimorto Crânio bífido Defeitos cranianos com herniação das meninges (meningocele); meninges e cérebro (meningoencefalocele); meninges, cérebro e ventrículos (meningo-hidroencefalocele) Variam de nenhum distúrbio funcional a grave comprometimento motor e mental com convulsões Espinha bífida oculta Defeito do arco vertebral Geralmente assintomática Espinha bífida cística Defeito do arco vertebral com herniação das meninges (meningocele) ou meninges e medula espinal (meningomielocele) Diferenciação e crescimento do hemisfério cerebral Varia dependendo do nível, de anestesia em sela a completa perda motora/sensitiva nas extremidades inferiores e incontinência vesical/retal Agenesia do corpo caloso Ausência de corpo caloso Pode ser assintomática, retardo mental, convulsões, síndrome de desconexão Microcefalia Tamanho e peso cerebral diminuídos Retardo mental Lissencefalia Ausência de giros corticais Retardo mental e hipotonia ou espasticidade Polimicrogiria Giros corticais abundantes e de pequeno tamanho Desenvolvimento da circulação do líquido cerebrospinal Retardo mental e hipotonia ou espasticidade Hidrocefalia Alargamento dos ventrículos com aumento da pressão intracraniana Dificuldade de alimentação, vômitos, paralisia do olhar para cima, espasticidade, retardo mental, redução da acuidade visual Alberstone_01.indd 36Alberstone_01.indd 36 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 37 de massa significativo sobre estruturas cerebrais circun- dantes; assim, a necessidade de uma intervenção cirúrgi- ca é igualmente rara. Encefaloceles Uma encefalocele é um defeito da base do crânio ou da calvária, associado a uma herniação do conteúdo intracra- niano. Se o conteúdo herniado contiver meninges e tecido cerebral, a malformação é denominada meningoencefalo- cele; se o conteúdo herniado contiver somente meninges, a malformação é denominada meningocele. A patogênese das encefaloceles varia dependendo de sua localização. En- cefaloceles da base do crânio, que representam defeitos do osso endocondral, são causadas por uma falta de indução do osso devido a uma falha no fechamento do tubo neural ou à desunião dos centros de ossificação basilares. Encefa- loceles da calvária, que representam defeitos do osso mem- branoso, são causadas por um defeito da indução óssea, efeito de massa e erosão por pressão sobre o osso, causada por uma lesão intracraniana expansiva ou falha no fecha- mento do tubo neural. As encefaloceles também são clas- sificadas de acordo com suas localizações, sendo as mais comuns (1) occipital, (2) frontoetmoidal, (3) parietal e (4) nasofaríngea. Lipomas intracranianos Vide Fig. 1.18. Na desenvolvimento normal, o mesênquima indife- renciado que circunda o cérebro em desenvolvimento dá origem às leptomeninges e ao espaço subaracnóideo. Por motivos ainda não bem compreendidos, a diferenciação anormal desse mesênquima indiferenciado pode levar à formação e deposição de gordura no espaço subaracnói- deo. Devido à sua localização no espaço subaracnóideo, tais lipomas contêm, tipicamente, vasos sanguíneos e ner- vos cranianos, dificultando sua remoção cirúrgica. Em or- dem decrescente de frequência, os lipomas intracranianos são encontrados na profunda fissura inter-hemisférica, na cisterna da placa quadrigêmea, na cisterna interpeduncu- lar, na cisterna do ângulo pontocerebelar e na cisterna de Sylvius. Os lipomas inter-hemisféricos, também conhecidos como lipomas do corpo caloso, estão tipicamente asso- ciados à hipogenesia ou agenesia do corpo caloso. Muitas vezes também existem evidências de calcificações punti- formes ou curvilíneas na linha média, ou a presença de outras anomalias, como encefaloceles e lipomascutâne- os. Os lipomas intracranianos raramente exercem efeito CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Lipoma inter-hemisférico Representam uma diferenciação anormal do mesênquima indiferenciado que circunda o cérebro em desenvolvimento Esse desenvolvimento anômalo resulta na formação e deposição de tecido adiposo em um espaço subaracnóideo As localizações mais comuns: tecido inter-hemisférico, cisterna da placa quadrigêmea, cisterna interpeduncular, cisterna do ângulo pontocerebelar e cisterna de Sylvius Aspecto radiográfico clássico de calcificação curvilínea nas margens de um lipoma inter-hemisférico Hipogenesia do corpo caloso Fig. 1.18 Lipomas intracranianos. Alberstone_01.indd 37Alberstone_01.indd 37 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 38 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz A avaliação dessas lesões irá determinar se existe um seio venoso dural no saco herniário e qual a anomalia cerebral associada, se houver. Anomalias cerebrais co- mumente associadas incluem anomalias calosas, anoma- lias da migração neuronal, malformações de Chiari e de Dandy-Walker. Indicadores de mau prognóstico incluem hidrocefalia, microcefalia e presença de tecido cerebral no saco herniário. Encefaloceles occipitais Vide Fig. 1.19. A região occipital é a localização mais comum para o desenvolvimento de uma encefalocele, estando geral- mente associada a um prognóstico menos favorável se comparada a outras localizações. Conteúdos intracra- nianos herniados, quando presentes, incluem estruturas supratentoriais e infratentoriais com igual frequência. CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Representa a localização mais comum de uma encefalocele O prognóstico é menos favorável em comparação com outras localizações Estruturas supratentoriais e infratentoriais estão incluídas no saco herniário com igual frequência Anomalias cerebrais associadas são comuns Indicadores de mau prognóstico incluem hidrocefalia, microcefalia e a presença de tecido cerebral no saco herniário Fig. 1.19 Encefalocele occipital. Alberstone_01.indd 38Alberstone_01.indd 38 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 39 (vide discussão adiante). O exame revela uma massa su- perficial coberta de pele ou uma covinha nasal e, frequen- temente, hipertelorismo. Subtipos de encefaloceles fron- toetmoidais são identificados pela localização do defeito ósseo, que pode estar situado entre os ossos frontais e na- sais (encefalocele frontonasal); entre os ossos frontal, nasal e etmoide (encefalocele frontoetmoidal); ou entre os ossos frontal, lacrimal e etmoide, estendendo-se para dentro da porção anteromedial da órbita (encefalocele naso-orbital, não representada na figura). Encefaloceles frontoetmoidais Vide Fig. 1.20. A anomalia de desenvolvimento responsável pelo de- senvolvimento de uma encefalocele frontoetmoidal pare- ce ser uma falha na regressão normal de uma projeção da dura-máter que se estende da cavidade cranial para a pele, através de um forame cego persistente ou fontanela frontonasal. A persistência dessa projeção de dura-máter pode dar origem a um trato de seio dérmico que, por sua vez, pode originar um tumor dermoide ou epidermoide Embriologia da região frontoetmoidal Dura-máter Fontanela frontonasal Osso nasal Osso nasal Espaço pré-nasal Cartilagem nasal Cartilagem nasal Cartilagem nasal Base do crânio Projeção da dura- -máter em contato com a pele Forame cego Regressão da projeção da dura-máter; fechamento da fontanela frontonasal e do forame cego Osso nasal Fontanela frontonasal com encefalocele frontonasal Forame cego aberto com encefalocele frontoetmoidal Formação de encefaloceles frontoetmoidais Osso frontal Osso frontal Fig. 1.20 Encefaloceles frontoetmoidais. Alberstone_01.indd 39Alberstone_01.indd 39 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 40 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz sagital, que deve ser especificamente investigada. A região parietal também é uma localização comum para encefalo- celes atrésicas, que são pequenas massas da linha média, desprovidas de cabelos, associadas a um defeito bem deli- mitado da calvária e a uma alta incidência de anomalias da linha média, como porencefalias, cistos inter-hemisféricos e agenesia do corpo caloso. Encefaloceles parietais Vide Fig. 1.21. As encefaloceles parietais são incomuns. O prognóstico em geral é ruim, como resultado da associação comum com anomalias cerebrais importantes, incluindo malformação de Dandy-Walker, agenesia do corpo caloso, malformação de Chiari II e holoprosencefalia. Devido à sua localização, existe uma incidência aumentada de envolvimento do seio CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Incomum Prognóstico ruim devido a grandes malformações cerebrais associadas Localização comum para encefaloceles atrésicas, que são massas da linha média frequentemente associadas a anomalias da linha média, como porencefalias, cistos inter-hemisféricos e agenesia do corpo caloso PARIETAL CEPHALOCELE Fig. 1.21 Encefalocele parietal. Alberstone_01.indd 40Alberstone_01.indd 40 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 41 ção bucal” excessiva. Ao exame, elas aparecem como mas- sas nasofaríngeas que aumentam de tamanho com uma manobra de Valsalva. Anomalias intracranianas associadas, como agenesia do corpo caloso, são comuns. Adicional- mente, o ancoramento do hipotálamo e do quiasma óptico, enquanto estes se estendem para dentro do saco, pode re- sultar em disfunção endócrina e visual. Encefaloceles nasofaríngeas Vide Fig. 1.22. Essas lesões são muito incomuns. Seu significado clí- nico baseia-se no fato de serem ocultas. Enquanto outras encefaloceles são evidentes ao nascimento, essas lesões ge- ralmente não se apresentam até o final da primeira década de vida, quando são diagnosticadas durante uma avaliação motivada por uma obstrução nasal persistente ou “respira- CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Quiasma óptico Palato duro posterior Dorso da sela Encefalocele Corpo caloso ausente Incomuns e clinicamente ocultas Apresentam-se tipicamente ao final da primeira década de vida como obstrução nasal ou “respiração bucal” Anomalias cerebrais associadas, como agenesia do corpo caloso, são comuns Podem causar disfunção endócrina ou visual devido ao ancoramento do hipotálamo ou aparato óptico Fig. 1.22 Encefalocele nasofaríngea. Alberstone_01.indd 41Alberstone_01.indd 41 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 42 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Seios dérmicos Vide Fig. 1.23. Os seios dérmicos são formados entre a terceira e a quinta semana de vida intrauterina, quando ocorre um defeito na separação do neuroectoderma (o precursor em- briológico do tecido nervoso) da superfície ectodérmica (o precursor embriológico da pele). O trato do seio dérmico assim formado pode representar uma comunicação anor- mal entre a derme e a cavidade intracraniana, apesar de o trato poder terminar no tecido subcutâneo ou em qualquer plano tissular superficial. Como o ectoderma primitivo tem a capacidade de formar tecido dérmico e epidérmico, o trato do seio frequentemente contém elementos de ambos. Assim, um seio dérmico é tipicamente composto de epité- lio escamoso estratificado (componente epidérmico), bem Cisto dermoide Fístula dermoide Forame cego aberto Fig. 1.23 Seios dérmicos. como de folículos capilares, glândulas sebáceas e glândulas sudoríparas (componente dérmico). O seio dérmico é um defeito de linha média que pode ser encontrado em qualquer local entre a sutura nasofron- tal e o cóccix, apesar de não ser comumente encontrado entre a glabela e a protuberância occipital. Cistos dermoi- des ou epidermoides associados podem se formar em qual-quer ponto ao longo do trato sinusal, mas ocorrem com maior frequência na terminação do trato. A apresentação clínica varia de uma mácula cutânea benigna e cosmética a uma infecção intracraniana séria ou um processo do tipo tumoral devido ao efeito de massa de um cisto dermoide ou epidermoide. Estigmas cutâneos frequentemente asso- ciados incluem angiomas, anormalidades da pigmentação, hipertricose, padrão de pilificação anormal, lipomas subcu- tâneos e apêndices cutâneos. Alberstone_01.indd 42Alberstone_01.indd 42 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 43 mais comumente na cisterna de Sylvius, enquanto o restan- te encontra-se localizado no espaço infratentorial, este úl- timo uniformemente dividido entre ângulo pontocerebelar, posterior ao verme do cerebelo e superior à placa quadrigê- mea. Outras localizações supratentoriais incluem suprasse- lar, inter-hemisférica, intra-ventricular e superficial em re- lação às convexidades cerebrais. As manifestações clínicas dos cistos aracnóideos podem ser variavelmente atribuídas a efeito de massa, hipertensão intracraniana ou hidroce- falia obstrutiva. Os pacientes podem apresentar cefaleia, convulsões ou déficit neurológico. Cistos aracnóideos Vide Fig. 1.24. Cistos aracnóideos são lesões que contêm LCS cober- tas por membranas que consistem em células aracnóideas e fibras de colágeno, as quais são contínuas com a arac- noide-máter normal circundante. A formação de um cis- to aracnóideo parece ser resultado da divisão anômala e duplicação da endomeninge, que normalmente forma uma substância extracelular frouxa no futuro espaço subarac- nóido preenchido por LCS. Cerca de dois terços dos cistos aracnóideo estão localizados no espaço supratentorial, Calvária Dura-máter Ar ac no id e- m át er Espaço subaracnóideo Córtex Camada externa Camada interna Cisto aracnóideo em desenvolvimento (uma bolsa cega) Aracnoide-máter em desenvolvimento Endomeninge Pia-máter em desenvolvimento Espaço subaracnóideo em desenvolvimento Fluxo pulsátil do líquido ventricular CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Pia-máter Caracterizados por cistos contendo LCS, formados por uma cisão anômala da aracnoide-máter Os cistos são revestidos por membranas de células aracnóideas e fibras de colágeno, que apresentam continuidade com a aracnoide-máter normal circunjacente A localização mais comum é a cisterna de Sylvius (fossa craniana média); outras localizações incluem ângulo pontocerebelar, posterior ao verme do cerebelo e superior à cisterna da placa quadrigêmea Os sintomas, quando presentes, são devidos a efeito de massa, hipertensão intracraniana ou hidrocefalia obstrutiva Cisto aracnóideo Cisto aracnóideo Cis to intra -aracnóideo Fig. 1.24 Cistos aracnóideos. Alberstone_01.indd 43Alberstone_01.indd 43 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 44 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz das corticais superficiais. Uma exceção é constituída pelos neurônios destinados a formar a camada mais superficial, a camada molecular (camada 1), os quais aparentemente migram primeiro. Uma vez que os neurônios tenham atingido o córtex cerebral, inicia-se um período de organização neuronal no qual os neurônios são arranjados em um discreto padrão laminar, depois de terem estabelecido contatos sinápticos com outro local e neurônios remotamente localizados. De- feitos nos processos de migração e organização neuronal resultam em uma variedade de anomalias cerebrais que têm em comum o fato de que neurônios corticais normal- mente formados se apresentam em padrões anormais de localização. Malformações específicas que podem se en- quadrar nessa categoria incluem lissencefalia, heterotopia, polimicrogiria e esquizocefalia. Anomalias da migração e organização neuronal Vide Fig. 1.25. Durante a sétima semana de vida intrauterina, ocor- re uma proliferação de neurônios nas paredes subependi- márias dos ventrículos laterais, em uma área denominada matriz germinativa. A proliferação desses neurônios, que geralmente darão origem ao córtex cerebral, é seguida por um período de migração radial, que se inicia por volta da oitava semana gestacional. Essa migração de neurônios é facilitada por fibras gliais radiais da superfície ventricular em relação à pia-máter. Essa glia fornece uma via para a migração neuronal, que segue uma sequência ordenada e previsível; isto é, os neurônios destinados à camada corti- cal mais profunda (camada 6) migram mais cedo, seguidos pelos neurônios que irão formar sucessivamente as cama- Processo principal Fibra radial Neurônio Processo subsequente Célula glial M at riz g er m in at iva Matriz germinativa Note a relação da parede do ventrículo lateral e a matriz germinativa com o desenvolvimento da placa cortical Note a relação entre os neurônios migrantes com as fibras de células gliais radiais P L AC A CO RT IC AL Fig. 1.25 Anomalias da migração e organização neuronal. Alberstone_01.indd 44Alberstone_01.indd 44 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 45 Lissencefalia Vide Fig. 1.26. Nessa condição, uma migração defeituosa de neu- rônios cerebrais resulta na falha de desenvolvimento dos giros corticais. Grosso modo, os hemisférios cerebrais são Ausência de sulcos cerebrais CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Representa um defeito de migração de neurônios cerebrais com falha na formação dos giros corticais Hemisférios cerebrais lisos Camadas de células cerebrais aberrantes Associada a retardo mental grave Fissuras de Sylvius rasas Fig. 1.26 Lissencefalia. lisos, os sulcos cerebrais ausentes e as fissuras cerebrais, rasas. Microscopicamente, as camadas de células corticais são aberrantes. Crianças afetadas apresentam retardo men- tal grave. Alberstone_01.indd 45Alberstone_01.indd 45 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 46 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz senta com função motora normal, desenvolvimento normal e início das crises convulsivas na segunda década de vida. A heterotopia subcortical focal, dependendo de seu tama- nho, apresenta-se com desenvolvimento normal a retardo grave anormal do desenvolvimento e distúrbios motores as- sociados a um distúrbio convulsivo. A heterotopia em faixa (também conhecida como heterotopia difusa da substância cinzenta) geralmente se manifesta com retardo de desen- volvimento moderado a grave e convulsões que não podem ser tratadas com medicamentos. Heterotopia Vide Fig. 1.27. Heterotopias englobam coleções de neurônios “corti- cais” normais que falham em atingir o córtex como resulta- do de um defeito da migração neuronal radial. Essas ilhas ectópicas de substância cinzenta podem ocorrer isolada- mente ou em associação com outras anomalias cerebrais. São identificados três subtipos por localização e padrão de organização; cada um deles está associado a um quadro clínico distinto e todos têm em comum a presença de um distúrbio convulsivo. A heterotopia subependimária se apre- Subependimária Subcortical Em faixa CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Definida como ilhas ectópicas de substância cinzenta (neurônios “corticais” que não atingem o córtex) Representa um defeito na migração neuronal radial Três subtipos: subependimária, subcortical e em faixa O distúrbio convulsivo é a característica clínica comum aos três tipos Fig. 1.27 Heterotopia. Alberstone_01.indd 46Alberstone_01.indd 46 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 47 terminação posterior da fissura de Sylvius. Grosso modo, a polimicrogiria pode demonstrar uma superfície irregular ou acidentada, ou pode ser paradoxalmente lisa como re- sultado da coalescênciados microgiros na camada (superfi- cial) molecular. Clinicamente, a malformação está associa- da a disfunção motora e intelectual de gravidade variada, dependendo da extensão do envolvimento cortical. Existe uma associação muito próxima entre displasia cortical e in- fecção congênita por citomegalovírus. Polimicrogiria Vide Fig. 1.28. A polimicrogiria, ou displasia cortical, como o dis- túrbio também é conhecido, representa uma anomalia na organização neuronal. É definida como um defeito na la- minação normal do córtex em seis camadas e uma distri- buição anormal dos neurônios em múltiplos pequenos gi- ros. Essa organização celular cortical anormal é capaz de afetar uma porção considerável do córtex em um ou ambos os hemisférios. A área de envolvimento mais comum é a CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS É uma anomalia da organização neuronal Representa uma distribuição anormal dos neurônios em múltiplos pequenos giros A terminação posterior da fissura de Sylvius é a área mais comumente envolvida Clinicamente, manifesta-se por disfunção motora e intelectual Associada a infecção congênita por citomegalovírus Fissura de Sylvius Fig. 1.28 Polimicrogiria. Alberstone_01.indd 47Alberstone_01.indd 47 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 48 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz ou serem interrompidas pouco antes do ventrículo dentro da substância cerebral (lábios fechados). Histologicamente, as fissuras englobam neurônios corticais que não apresentam a laminação normal em seis camadas. Elas ocorrem com mais frequência na região do giro pré ou pós-central e podem ser uni ou bilaterais. Fissuras bilaterais estão associadas a um prognóstico significativamente pior. Clinicamente, a mal- formação é marcada por crises convulsivas, hemiparesia e retardo variável do desenvolvimento, cuja gravidade é de- terminada pela localização, extensão e número de fissuras. Esquizocefalia Vide Fig. 1.29. A esquizocefalia caracteriza-se por um desenvolvimen- to anormal de uma fissura revestida por substância cinzen- ta dentro do hemisfério cerebral, que pode se estender por toda a distância desde o revestimento de pia-máter da su- perfície cortical até o revestimento ependimário do ventrí- culo lateral. Essas fissuras também são classificadas como de lábios abertos ou fechados, dependendo de elas se esten- derem por toda a distância até o ventrículo (lábios abertos) Esquizocefalia de lábios abertos CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Esquizocefalia de lábios fechados VentrículoVentrículo Definida como um desenvolvimento anormal de uma fenda revestida por substância cinzenta que se estende por uma distância variável da superfície cortical até o ventrículo lateral A fenda pode se estender por toda a distância desde a superfície cortical até o ventrículo (esquizocefalia de lábios abertos) ou cessar um pouco antes do ventrículo (esquizocefalia de lábios fechados) Os giros pré e pós-centrais são a localização mais comum da fenda, que pode ser uni ou bilateral Fig. 1.29 Esquizocefalia. Alberstone_01.indd 48Alberstone_01.indd 48 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 49 Holoventrículo (contínuo com um cisto dorsal grande) CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Tálamos fundidos com ausência do terceiro ventrículo Ausência de fissura inter-hemisférica, foice do cérebro e corpo caloso O holoventrículo apresenta continuidade com um cisto dorsal grande Associada a graves deformidades faciais de linha média e hipotelorismo Terceiro ventrículo ausente Tálamos fundidos Forma mais grave de holoprosencefalia (uma falha na diferenciação e clivagem do prosencéfalo) Fig. 1.30 Holoprosencefalia alobar. evaginação e separação dos hemisférios cerebrais, que co- meça no dia 35. Um defeito no processo de clivagem en- volvendo a matriz germinativa e a lâmina terminal resulta em uma falha da diferenciação transversal e clivagem do prosencéfalo em telencéfalo e diencéfalo e uma falha na diferenciação lateral e clivagem do prosencéfalo em dois hemisférios cerebrais. São identificados três subtipos de holoprosencefalia. A holoprosencefalia alobar (Fig. 1.30) é a forma mais grave. Ela se caracteriza por tálamos fundidos e ausência do terceiro ventrículo. Não existe fissura inter-hemisférica, foice do cérebro ou corpo caloso. Um holoventrículo é con- tíguo com um cisto dorsal grande, permanecendo somente uma pequena borda de cérebro anteriormente. Anomalias associadas incluem graves deformidades faciais da linha média e hipotelorismo que, em suas formas mais graves, se manifesta por ciclopia. Holoprosencefalia A holoprosencefalia se refere a um grupo de distúrbios rela- cionados que têm em comum uma falha na diferenciação e clivagem do prosencéfalo. Por volta do 32o dia do desen- volvimento normal, a matriz germinativa começa sua cliva- gem em porções superior e inferior. A matriz germinativa dá origem a todos os neurônios dos hemisférios cerebrais e dos núcleos cerebrais profundos. Ao mesmo tempo, a por- ção superior da matriz germinativa irá originar neurônios que formam o telencéfalo (caudado, putame e hemisférios cerebrais), enquanto a porção inferior dará origem aos neurônios que formam o diencéfalo (tálamo, hipotálamo e globo pálido). Quase simultaneamente, entre os dias 32 e 34, a lâ- mina terminal começa a se diferenciar em comissuras ce- rebrais inter-hemisféricas, cuja formação está associada à Alberstone_01.indd 49Alberstone_01.indd 49 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 50 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz A holoprosencefalia semilobar (Fig. 1.31) representa uma malformação menos grave do que a holoprosencefa- lia alobar. Nela está presente pelo menos uma separação parcial dos tálamos e um terceiro ventrículo pequeno, assim como uma fissura inter-hemisférica e uma foice do cérebro parcialmente formadas ou ausentes. Em contraste com o Fissura inter-hemisférica ausente Terceiro ventrículo pequeno Esplênio do corpo caloso intacto Ausência do joelho e corpo do corpo caloso CARACTERÍSTICA ÚNICA CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Separação parcial dos tálamos com um terceiro ventrículo pequeno Tecido inter-hemisférico e foice do cérebro parcialmente formados ou ausentes Esplênio do corpo caloso intacto (joelho e corpo ausentes) Forma moderadamente grave de holoprosencefalia (uma falha na diferenciação e clivagem do prosencéfalo) Fig. 1.31 Holoprosencefalia semilobar. corpo caloso em geral hipogenético, no qual o joelho e o corpo estão normalmente desenvolvidos, mas o esplênio é pequeno ou ausente, a holoprosencefalia é a única exceção que apresenta um esplênio intacto, com joelho e corpo pe- quenos ou ausentes. Alberstone_01.indd 50Alberstone_01.indd 50 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 51 Finalmente, a holoprosencefalia lobar (Fig. 1.32) re- presenta uma forma menos grave de holoprosencefalia. Ca- racteriza-se por um terceiro ventrículo totalmente formado OBAR HOLOPROSENCEPHALY Esplênio normal CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Cornos frontais rudimentares Terceiro ventrículo normal Fissura inter-hemisférica anterior Forma mais leve de holoprosencefalia Septo pelúcido ausente e lobos frontais hipoplásicos, mas o terceiro ventrículo e o corpo caloso estão intactos Fig. 1.32 Holoprosencefalia lobar. e um corpo caloso intacto. Assim como em todas as formas de holoprosencefalia, o septo pelúcido está ausente e os lobos frontais costumam ser hipoplásicos. Alberstone_01.indd 51Alberstone_01.indd 51 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 52 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz Displasia septo-óptica Vide Fig. 1.33. A displasia septo-óptica caracteriza-se por dois aspec- tos primários: (1) hipoplasia dos nervos ópticos e (2) hipo- CARACTERÍSTICASPRINCIPAIS Caracterizada por hipoplasia do nervo óptico e hipoplasia ou ausência de septo pelúcido Associada a distúrbios visuais e deficiências endócrinas Ausência de septo pelúcido Quiasma óptico pequeno Cornos frontais tipo caixa Fig. 1.33 Displasia septo-óptica. plasia ou ausência do septo pelúcido. Clinicamente, a mal- formação apresenta distúrbios visuais, que podem incluir nistagmo ou perda da acuidade visual e uma deficiência endócrina que costuma envolver o hormônio do crescimen- to e o hormônio estimulante da tireoide. Alberstone_01.indd 52Alberstone_01.indd 52 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 53 Malformações de Chiari Chiari descreveu três malformações do rombencéfalo que apresentam a hidrocefalia como característica em comum. A malformação de Chiari I (Fig. 1.34) consiste em uma extensão caudal da tonsila do cerebelo abaixo do nível do CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Siringomielia Plano do forame magno Deslocamento para baixo das tonsilas do cerebelo, abaixo do plano do forame magno Definida por uma extensão caudal das tonsilas do cerebelo abaixo do nível do forame magno Aproximadamente 50% dos casos estão associados a siringomielia Pode ser assintomática ou associada a cefaleia, dor no pescoço ou no braço Os sintomas de siringomielia (paralisias de nervos cranianos, perda sensitiva dissociada ou mielopatia) também podem ocorrer Fig. 1.34 Malformação de Chiari I. forame magno. Essas malformações podem ser assintomá- ticas ou associadas a sintomas relacionados com siringo- mielia, como paralisias de nervos cranianos e perda sensiti- va dissociada. No adulto, pode ocorrer o desenvolvimento de cefaleia, dores no pescoço e no braço. Alberstone_01.indd 53Alberstone_01.indd 53 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 54 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz de reparo da mielomeningocele e derivação da hidrocefa- lia. Eles podem apresentar sintomas bulbares com risco de vida, como apneia e bradicardia, e o nistagmo é um achado clínico comum. Na infância, pode ocorrer o desenvolvimen- to progressivo de fraqueza espástica e ataxia apendicular, incapacitando ainda mais a criança. Adolescentes podem apresentar dificuldade insidiosa da marcha e ataxia do tronco, apesar de os sintomas tenderem a se estabilizar na idade adulta. A malformação de Chiari II (Fig. 1.35) é uma malfor- mação complexa que invariavelmente está associada a mie- lomeningocele e múltiplas outras anomalias cerebrais. Foi postulado que os achados rombencefálicos da malformação de Chiari II podem ser explicados pelo desenvolvimento de um cerebelo de tamanho normal na presença de uma fossa posterior anormalmente pequena e uma fixação tentorial baixa. As manifestações clínicas da malformação de Chia- ri II são complexas e variadas. Lactentes podem necessitar CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS ANOMALIAS CEREBRAIS ASSOCIADAS Agenesia calosa parcial Cerebelo alto Teto saliente Quarto ventrículo alongado Verme do cerebelo deslocado inferiormente Acotovelamento medular Grande massa intermédia Deformidade anterior do hemisfério do cerebelo ao redor do tronco cerebral Definida por um verme do cerebelo deslocado inferiormente e múltiplas anomalias associadas Associada a um crânio lacunar (“lückenschädel” ou “crânio com lacunas”), mielomeningocele (100%), siringomielia (50-90%), foice fenestrada, fossa posterior pequena, hidrocefalia (90%) e múltiplas anomalias cerebrais (vide lista abaixo) Verme do cerebelo deslocado inferiormente As manifestações clínicas são complexas e variadas (vide texto) Acotovelamento medular Teto salienteGiros interdigitados Cerebelo alto com deformidades anteriores ao redor do tronco cerebral Grande massa intermédia Agenesia calosa parcial Heterotopias Polimicrogiria Fig. 1.35 Malformação de Chiari II. Alberstone_01.indd 54Alberstone_01.indd 54 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 55 Por fim, a malformação de Chiari III (Fig. 1.36), uma condição extremamente rara, é caracterizada por hernia- ção do conteúdo da fossa posterior através de um defeito de espinha bífida ao nível de C I – C II. Essa malformação raramente é compatível com a vida. CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Syrinx* Encefalocele occipital ou cervical baixa Condição rara Definida por uma encefalocele occipital baixa ou cervical alta O tecido neural herniado pode incluir porções do cerebelo, lobos occipitais ou tronco cerebral Fig. 1.36 Malformação de Chiari III. * N. de T. Literalmente, a flauta pan. Caracteriza a siringomielia. Alberstone_01.indd 55Alberstone_01.indd 55 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 56 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz também deve ser considerada no diagnóstico diferencial da malformação de Dandy-Walker, é definida por hipogenesia do verme do cerebelo e dilatação cística do quarto ventrícu- lo, porém fossa posterior de tamanho normal. A hidrocefalia frequentemente acompanha as malfor- mações de Dandy-Walker, afetando ~90% dos pacientes no momento do diagnóstico. A anomalia cerebral mais comu- mente associada é a agenesia do corpo caloso, que afeta cerca de um terço dos pacientes com a malformação. Cli- nicamente, a malformação pode se apresentar com retardo no desenvolvimento, aumento da circunferência craniana ou sinais e sintomas de hidrocefalia. Malformação de Dandy-Walker Vide Fig. 1.37. A malformação de Dandy-Walker caracteriza-se por uma fossa posterior aumentada em tamanho com uma fi- xação tentorial elevada, hipogenesia ou agenesia do verme do cerebelo e uma dilatação cística do quarto ventrículo. A presença de uma comunicação entre o quarto ventrículo e a cisterna magna diferencia essa malformação de uma me- gacisterna magna, que apresenta uma fossa posterior au- mentada em tamanho, mas um verme do cerebelo intacto e um quarto ventrículo intacto sem comunicação entre o úl- timo e a cisterna magna. A variante de Dandy-Walker, que Dilatação cística do quarto ventrículo (em comunicação com a cisterna magna) Fossa posterior de tamanho aumentado Verme do cerebelo hipodesenvolvido Tentório elevado CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Associada a hidrocefalia em 90% dos casos Associada a agenesia do corpo caloso em um terço dos casos Pode estar associada a retardo do desenvolvimento, aumento da circunferência craniana, ou sinais e sintomas de hidrocefalia Caracterizada por (1) uma fossa anterior aumentada em tamanho, (2) uma fixação tentorial elevada, (3) hipogenesia ou agenesia do verme do cerebelo e (4) uma dilatação cística do quarto ventrículo Fig. 1.37 Malformação de Dandy-Walker. Alberstone_01.indd 56Alberstone_01.indd 56 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 57 Síndrome Lhermitte-Duclos Vide Fig. 1.38. A síndrome de Lhermitte-Duclos, também conhecida como hipertrofia difusa do córtex cerebelar ou ganglioci- toma cerebelar displásico, é definida por uma hipertrofia focal do córtex cerebelar. Histologicamente, o córtex afe- tado demonstra uma camada espessa de células gangliona- CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Hipertrofia focal do córtex cerebelar Caracteriza-se por uma hipertrofia focal do córtex cerebelar Pode ser assintomática ou produzir sintomas de tronco cerebral ou cerebelares devidos a um efeito de massa Histologicamente marcada por uma camada espessa de células ganglionares que ocupa a camada granular, uma camada marginal hipermielinizada e uma fina camada de Purkinje Fig. 1.38 Síndrome de Lhermitte-Duclos. res anormais que ocupam a camada granular, uma espessa camada marginal hipermielinizada e uma fina camada de Purkinje. Grosso modo, o distúrbio pode se estender para dentro do verme do cerebeloou, raramente, para dentro do hemisfério contralateral. Um efeito de massa, caso presen- te, pode produzir sintomas cerebelares, apesar de muitos indivíduos afetados serem assintomáticos. Alberstone_01.indd 57Alberstone_01.indd 57 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 58 Alberstone, Benzel, Najm & Steinmetz tendem a envolver o tronco e as extremidades. Lesões ce- rebrais associadas compreendem uma variedade de lesões hamartomatosas, incluindo hamartomas subependimários, tumores de células gigantes, “tubérculos” corticais e lesões da substância branca. Lesões do tipo hamartoma também acometem os rins (angiomiolipoma), o coração (rabdo- mioma), os pulmões (linfangiomioma) e os olhos (hamar- toma retiniano). Os hamartomas subependimários, que tendem a se instalar ao longo da superfície ventricular do núcleo cauda- do, são as lesões cerebrais mais comumente associadas. Os tumores subependimários de células gigantes são diferen- ciados dos hamartomas subependimários por seu intenso realce ao contraste nas imagens de ressonância magnética (RM), seu tamanho maior, sua tendência ao crescimento e sua propensão a ocorrerem próximo ao forame de Monro, levando a uma obstrução que pode resultar em hidrocefa- lia. Os tubérculos corticais são hamartomas característicos compostos de células gigantes bizarras, gliose fibrilar e bai- nhas de mielina desorganizadas que parecem nódulos sub- corticais lisos, levemente aumentados em tamanho. Síndrome de Sturge-Weber A síndrome de Sturge-Weber é uma típica malformação congênita não familiar, caracterizada por angiomatose que envolve a face, a coroide ocular e as leptomeninges. O angioma facial, um nevo com coloração tipo vinho do Porto, segue tipicamente a distribuição da divisão oftál- mica do nervo trigêmeo. Atrofia localizada e calcificação do córtex cerebral ipsilateral ao nevo facial é outra lesão comum, cuja etiologia aparentemente independe das malformações angiomatosas das leptomeninges. Clinica- mente, os pacientes afetados apresentam convulsões, he- miparesia e uma hemianopsia homônima. Um ou todos os sintomas podem ser progressivos. O retardo mental é outro achado comum. Doença de von Hippel-Lindau A doença de von Hippel-Lindau é um distúrbio autossômi- co dominante caracterizado por angiomas de retina, he- mangioblastomas cerebelares e da medula espinal, carcino- ma de células renais, feocromocitomas, angiomas de fígado e rim, e cistos de pâncreas, rim, fígado e epidídimo. A base genética da doença foi localizada no cromossomo 3. Crité- rios suficientes para estabelecer o diagnóstico exigem uma das diversas combinações de lesões: mais de um hemangio- blastoma do sistema nervoso central (SNC), ou um heman- gioblastoma com uma manifestação visceral da doença, ou uma manifestação da doença com uma história familiar conhecida. Os sintomas mais comuns entre os pacientes afetados são redução da acuidade visual ou dor ocular, com frequência seguidas por sintomas cerebelares ou sintomas associados ao aumento da pressão intracraniana. As facomatoses As facomatoses representam um grupo de distúrbios congê- nitos que têm em comum um defeito no desenvolvimento de estruturas ectodérmicas, incluindo estruturas nervosas, a pele, a retina e o bulbo do olho. São identificadas qua- tro malformações principais: neurofibromatose, esclero- se tuberosa, síndrome de Sturge-Weber e doença de von Hippel-Lindau. Neurofibromatose Existem dois tipos de neurofibromatose, tipo 1 e tipo 2, que se distinguem em relação a suas manifestações patológi- cas e clínicas. A neurofibromatose tipo 1 (NF1), conhecida como doença de von Recklinghausen, é um distúrbio au- tossômico dominante que afeta ~1 em 3.000 a 5.000 pes- soas. A análise genética associou a doença ao braço longo do cromossomo 17. Os critérios diagnósticos para NF1 fo- ram estabelecidos pelo National Institutes of Health (NIH) Consensus Development Conference. As principais lesões cutâneas associadas à doença são gliomas ópticos, outros astrocitomas cerebrais, displasia da asa do esfenoide e neu- rofibromas plexiformes. As manifestações espinais incluem escoliose, tumores da bainha do nervo e meningoceles la- terais. A neurofibromatose tipo 2 (NF2) é um distúrbio au- tossômico dominante associado a uma anormalidade do cromossomo 22. Sua característica mais distinta é o apa- recimento quase invariável de schwanomas acústicos bi- laterais. Outros tumores intracranianos, particularmente meningiomas, podem ocorrer de modo múltiplo. Manifes- tações medulares incluem schwanomas extramedulares múltiplos e meningiomas, assim como ependimomas in- tramedulares. Muitas das características da NF1, incluin- do manchas café com leite, neurofibromas cutâneos, glio- mas ópticos, displasias esqueléticas e nódulos de Lisch, estão ausentes ou são mínimas em tamanho e número. Os critérios diagnósticos para NF2 foram estabelecidos pelo NIH Consensus Development Conference. Esclerose tuberosa A esclerose tuberosa, ou doença de Bourneville, como o distúrbio também é conhecido, é uma doença autossô- mica dominante que afeta ~1 em 100.000 indivíduos. Caracteriza-se classicamente por uma tríade de retardo mental, epilepsia e adenoma sebáceo, apesar de a tríade estar presente em somente cerca de metade dos pacientes portadores de esclerose tuberosa. O distúrbio consiste, pre- dominantemente, em lesões hamartomatosas envolvendo o cérebro, os olhos e os órgãos viscerais. As manifestações cutâneas, que também são comuns, incluem adenoma se- báceo, que é um angiofibroma envolvendo a face, e má- culas hipomelânicas, que são nevos despigmentados que Alberstone_01.indd 58Alberstone_01.indd 58 10/05/11 10:4210/05/11 10:42 Bases anatômicas do diagnóstico neurológico 59 Mielomeningocele Vide Fig. 1.39. A mielomeningocele é uma malformação muito mais comum do que a meningocele. Aparentemente é causada por um defeito de disjunção, processo através do qual o neuroectoderma e o ectoderma cutâneo se separam nor- malmente durante a neurulação. Foi postulado que esse defeito é causado por uma falta de expressão das molécu- las complexas de carboidratos na superfície das células do neuroectoderma. Como resultado, existe uma falha loca- lizada de fusão das pregas neurais, que permanecem em continuidade com o ectoderma cutâneo junto à superfície da pele (não disjunção). O tecido neural dorsalmente exposto, conhecido como placoide neural, é composto por células que normalmente formam o revestimento ependimário do tubo neural. Como o placoide permanece dorsal e fixado à pele, os elementos mesenquimais não são capazes de migrar e se fundir. Isso leva ao desenvolvimento de diversas anomalias vertebrais, incluindo a ausência de processos espinhosos e lâminas, re- dução do tamanho anteroposterior dos corpos vertebrais, aumento da distância interpedicular e grandes processos transversos que se estendem lateralmente. Essas anoma- lias, por sua vez, levam a deformidades cifoescolióticas em aproximadamente um terço dos pacientes com mielome- ningocele. As sequelas neurológicas da mielomeningocele in- cluem alterações sensitivas e motoras abaixo do nível da lesão, com ou sem incontinência fecal e urinária. Outras malformações ou sequelas que podem produzir deteriora- ção neurológica precoce ou tardia são a malformação de Chiari (presente em 100% dos pacientes), a hidrocefalia e o aprisionamento da medula espinal. O diagnóstico de mie- lomeningocele sempre é evidente ao nascimento, e a ope- ração costuma ser feita dentro de 48 horas (Tabela 1.4). Disrafismo medular O disrafismo medular compreende um grupo de malforma- ções congênitas que têm em comum um defeito de desen- volvimento da neurulação (fechamento do tubo neural). É um termo amplo que envolve todas as formas de espinha bífida, aberta ou fechada,
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