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A historia da quimica contada por suas descobertas

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A História da Química contada por suas 
descobertas 
 
 Reinaldo Calixto de Campos 
João Augusto Gouveia 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
     
 
 
 
 
Este documento tem nível de compartilhamento de 
acordo com a licença 3.0 do Creative Commons. 
 
 
 
http://creativecommons.org.br 
http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/br/legalcode 
 
 
 
 
.  1 . 
Sala de Leitura 
                            A História da Química contada por suas descobertas 
 
Um pouco de História, de História da Química e de Química contada pela vida de 
Fritz Haber, o descobridor da síntese da amônia a partir das substâncias simples que 
a formam. 
Biografias podem ser escritas apenas como um conjunto de datas e feitos. Podem ser também uma 
novela heroica: ao fim da leitura, não queremos ser outra coisa senão aquele herói. Uma vida mágica, 
uma coleção de vitórias, ou, mesmo nas derrotas, o heroísmo. As angústias, se existentes, são vencidas 
ao fim. Final feliz, sempre. Ou pode ser justo o oposto (ou seja, o mesmo): a biografia de um monstro 
sem coração que, de tão ruim, nos torna melhores: não somos como ele! Herói ou vilão, nenhum dos 
dois humanos. Os dois confortam, ambos por (des)identificação. 
Bem, a vida real é mais complexa. Herói ou vilão, sentimentos contraditórios existem dentro de cada um 
de nós. Coragem e medo; certeza e dúvida. Amor e ódio. São sentimentos humanos, contradições que 
não precisamos negar, e ao reconhecê-los, saberemos como (com)viver, e amar melhor. 
Daí, escolhermos a vida de Fritz Haber para contar a vocês. Um herói, um anti-herói, uma pessoa 
comum, uma pessoa especial, um homem do seu tempo, um homem a frente de seu tempo. Um 
homem atropelado pelo seu tempo. 
Vamos lá, então. 
Fritz Haber nasceu em 9 de dezembro de 1869, em Breslau, na Prússia (que depois passou a fazer parte 
da Alemanha), e hoje fica na Polônia. Bem, já temos que dar uma parada aqui. Que diabo de Prússia é 
esta? Não é Rússia? E o que faz hoje na Polônia uma cidade que era na Alemanha? 
Acontece que a Alemanha, naquele tempo, não era certamente a Alemanha de hoje: um país 
desenvolvido, associado à tecnologia e à capacidade de organização. Na época, a Alemanha, tal como a 
conhecemos hoje, não existia; mas mal estava terminando de se formar. Ao contrário da Rússia, 
Espanha, Portugal, Inglaterra e a França, que mesmo naquela época já existiam há centenas de anos 
mais ou menos como são hoje. Mas então o que havia lá, naquele lugar que hoje chamamos de 
Alemanha? Havia uma série de reinos, principados, ducados maiores e menores, cidades independentes 
etc., com línguas apenas parecidas (nem sempre um entendia o outro), com interesses políticos 
diversos: os interesses da parte ao Norte se associavam mais ao comércio com o norte da Europa, com a 
Escandinávia (ver Mapa I), via mar Báltico, com a Holanda e a própria Inglaterra. Ao Sul havia grande 
influência do Império Austríaco. A parte ao longo do Rio Reno, próxima da França, tinha grande 
influência deste país. Ou seja, dividida em pequenos estados, a Alemanha não era páreo para os países 
 
 
 
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Sala de Leitura 
                            A História da Química contada por suas descobertas 
vizinhos já formados, como a Inglaterra, a França e até mesmo a Suécia. Em alguns momentos, o que 
hoje chamamos de Alemanha foi o saco de pancadas do resto da Europa. A Guerra dos Trinta Anos 
(1618 a 1648), travada entre católicos e protestantes (na verdade, travada entre príncipes que se 
associavam a um lado ou outro, conforme seus interesses) foi especialmente destrutiva para a região, 
contribuindo para perda de colheitas, fome, empobrecimento etc. Depois disso, lá pelo tempo do 
nascimento do nosso Haber, ou seja, no século XIX, definiu-se entre os diversos estados mais ou menos 
independentes que formavam a Alemanha (mapa II) um deles bem mais forte: a Prússia! Não confunda 
com Rússia, embora a Prússia seja a parte da Alemanha mais próxima da Rússia. Ali está Berlim, uma 
grande cidade da Europa Central. Em torno da Prússia deu-se a unificação da Alemanha, por bem e por 
mal. Alguns daqueles estados independentes se associaram à Prússia, após conversas políticas. Outros 
foram associados à força. E assim, lá por aquela época do nascimento do Haber, surgia mais uma grande 
nação europeia: a Alemanha. Houve um grande motor para isso: a revolução industrial. Ela não se deu 
só na Inglaterra, como às vezes parece. A industrialização da Alemanha foi um fenômeno tão incrível 
naquela época, como é o da China hoje. E, mais ou menos, pelos mesmos motivos: mão de obra barata, 
bom nível de instrução da população e razoável infraestrutura. As taxas de crescimento da Alemanha se 
tornaram as maiores da Europa, certamente do mundo. Note também que houve uma revolução 
educacional, pois ficava claro que, naquele mundo que se industrializava, o conhecimento técnico e 
científico era essencial: fundaram-se escolas, centros de pesquisas, cresceram as universidades. E cada 
um daqueles estados, antes separados, não era, antes da unificação, um zero à esquerda. Afinal, nomes 
como Beethoven e Goethe vem bem de antes da unificação. Eles já tinham suas instituições, 
universidades, escolas, institutos de pesquisas, etc. O resultado é que, em uma Alemanha que crescia 
rapidamente, com forte industrialização, começaram a surgir os nomes que conhecemos dos livros de 
Física e Química: Planck (o da constante de Planck), Liebig (estudioso da Química orgânica e agrícola), 
Bunsen (ele mesmo, o que inventou o famoso bico de Bunsen e fundou a espectrometria), Kekulé (o do 
anel benzênico) etc. Se fizéssemos uma curva “grandes nomes da ciência x ano” certamente no caso dos 
alemães essa curva começaria a subir fortemente nesta época. Bem, foi neste momento que nasceu 
Haber. Neste momento, começou também outro fenômeno: o nacionalismo. Para nós, brasileiros, é 
difícil entender como este fenômeno, na Europa, vai terminar desaguando em tragédia. Nacionalismo 
para nós tem até um sentido positivo: significa lutar pelos interesses legítimos do nosso país, lutar para 
que se desenvolva, supere seus dramas sociais, seja respeitado no mundo, etc. Não importa se religioso 
ou não, ou em quem se vote, aqui todos se declaram nacionalistas. Daí a surpresa de muitos brasileiros 
quando, na Alemanha, declaram-se nacionalistas. Nossa, lá o significado não é bom! Leva um tempo 
para entender, mas vamos chegar lá. 
 
 
 
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                            A História da Química contada por suas descobertas 
A Alemanha se tornava, então, um grande país, unificado, industrializado, com altas taxas de 
desenvolvimento. Mas será que havia no mundo espaço para outro grande país? Olhe agora o Mapa III - 
o mapa do mundo, no século XIX - mostrando os domínios europeus. Apesar de os países da América já 
serem independentes, o resto do mundo estava sendo fatiado entre as potências europeias e a 
Alemanha, tendo se unificado tardiamente, não participava da festa... ou, mais exatamente, participava 
muito pouco. E que festa era essa? Certamente não era apenas poder viajar para terras exóticas, fazer 
safáris ou ser tratado com reverência pelos nativos. Na verdade, havia enormes vantagens comerciais, e 
daí econômicas, em ter colônias ou áreas de influência (na América Latina não tinha quase mais 
colônias, mas era uma área de influência da Inglaterra). Só para ficar no barato: eram mercados cativos, 
obrigados a comprar os produtos da metrópole e a vender suas matérias primas a preço de banana. Um 
exemplo, que parece inacreditável: havia um “tratado” entre a Índia (colônia) e a Inglaterra (metrópole) 
que proibia a Índia de produzir sal (é isso aí, sal de cozinha), obrigando osal a ser importado da 
Inglaterra (no filme “Gandhi” há uma bela passagem sobre isso). Pois é, e a Inglaterra era a pátria do livre 
comércio... Mas, livre para quem? Assim, logo, logo, o crescimento da Alemanha esbarrou em limites: ela 
não tinha colônias, e não havia como competir com as outras potências nessas condições. O mundo 
vivia mais ou menos em paz (ou pelo menos a Europa, dona do mundo na época) e, mesmo sem 
colônias, a Alemanha havia encontrado algum espaço para crescer, pelo crescimento de seu mercado 
interno, políticas protecionistas, pelo tamanho relativamente grande de sua população, por apresentar 
condições vantajosas para a industrialização, e assim foi indo. Mas, quanto mais se cresce, mais 
apertado fica o figurino. E aí começam as guerras. Então, a Alemanha (ainda na forma de Prússia e no 
processo de unificação) guerreia com a Dinamarca, com a França, obtendo vitórias que aumentam a 
força do movimento de unificação. E, para levar uma população a um esforço de guerra, é necessário 
convencê-la, contar uma história em que todos acreditem e se identifiquem. Esta história, na Alemanha, 
foi o nacionalismo. Era importante convencer a todos que era admirável ser alemão, tinha-se que se ter 
orgulho de ser alemão… “alemão”, um termo que até poucos anos antes sequer existia... A coisa colou, 
pois junto com o desenvolvimento industrial vieram vitórias militares, melhoria no padrão de vida, a 
sensação de identidade e orgulho nacional. A Alemanha, que era o cachorro morto da Europa (todo 
mundo chutava) havia, enfim, tornado-se uma grande nação. Bem, foi nesse ambiente que nasceu o 
nosso Haber... Depois contamos porque Breslau, que era na Prússia e depois Alemanha, terminou na 
Polônia.. 
Para tornar as coisas ainda mais interessantes, nosso Haber era... judeu! Naquela época, os judeus na 
Europa, por uma série de razões, formavam minorias que não gozavam dos mesmos direitos do que os 
outros. No que hoje conhecemos por Alemanha, a maioria da população era dividida entre católicos e 
protestantes, e inclusive essa divisão havia contribuído para impedir que o país se unificasse. Assim, no 
 
 
 
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projeto de unificação, ser alemão deveria estar acima de qualquer coisa. Portanto, com a unificação veio 
um certo (eu disse “um certo”) esfriamento das divisões religiosas, o que permitiu, inclusive, uma boa 
integração da população judaica. No caso de Haber, embora judeu, ele era integrado. Toda essa história 
para a gente soa estranha, no Brasil. Aqui, desde que nascemos, estamos acostumados a que pessoas de 
diferentes religiões tenham os mesmos direitos políticos. Não importa se você é católico, evangélico, 
umbandista ou judeu, você pode votar, ser votado, comprar propriedades, terras, ser presidente. Basta, 
para tudo isso, ser brasileiro. Mas não era assim na Europa em relação aos judeus. Por exemplo, foi só 
depois da Revolução Francesa (1789) que, na França, os direitos das pessoas passaram a independer da 
religião. Só então os judeus (e outras minorias) puderam se tornar cidadãos completos, representarem-
se politicamente, comprarem terras, etc. Até então isso era proibido na França e no resto da Europa. Nos 
outros países europeus, essa igualdade de direitos demorou ainda mais a acontecer, porém, ao longo 
do século XIX, terminou também acontecendo, como uma consequência da divisão entre Estado e 
Religião: o cidadão era livre para ter a religião que quisesse e o Estado era laico, ou seja, não havia 
qualquer religião oficial. Na Alemanha recém unificada, os judeus também passaram a ter os mesmos 
direitos de cidadania, com o recuo da influência da religião na vida política e a ascensão do 
nacionalismo. Assim, Haber, nascido em uma família judaica, foi chamado de Fritz Jacob, mas depois 
mudou seu nome para Fritz, não um indicativo de uma negação de suas origens, mas de sua 
autoidentificação como alemão. Seu pai era um rico comerciante e seus negócios envolviam a 
importação de corantes naturais e produtos farmacêuticos. Sua mãe morreu dois dias após o seu 
nascimento (o que era comum naquela época), e seu pai casou-se uma segunda vez, nove anos depois, 
com uma mulher bem mais jovem, e ele ganhou três irmãs deste casamento. Uma figura importante na 
vida de Haber foi seu tio Hermann, um tipo liberal, que o incentivou nos seus primeiros experimentos 
de Química, permitindo, inclusive, que Haber realizasse algumas experiências de Química em sua casa. 
Este interesse por Química teve certamente alguma influência dos negócios do pai, que também 
entendia um pouco do assunto. Sua educação deu-se primeiramente no que seria aqui uma escola 
pública e depois no St Elizabeth Gymnasium, uma escola de Breslau, com ênfase em Literatura e 
Filosofia, e onde metade dos alunos era de confissão cristã e a outra metade, judaica. Apesar das 
pressões da família para assumir os negócios, e com apoio do Tio Hermann, Haber entrou para a 
Universidade com 18 anos, em Berlim, capital da Prússia (e depois, da Alemanha), para estudar Química 
e Física. O sistema alemão de educação, na época, permitia aos alunos fazerem matérias em diferentes 
Universidades. Depois de um semestre em Berlim, ele passou um ano e meio em Heidelberg, onde 
frequentou as aulas de Robert Bunsen (o do bico de Bunsen e muito mais...). Voltou a Breslau para o 
serviço militar e, depois, em 1889, voltou a Berlim, e realizou seu Doutorado em Química Orgânica, em 
1891. Interessante notar que seus examinadores anotaram seu desconhecimento em alguns aspectos 
da físico-química, sem saber que esta seria a área na qual, Haber brilharia futuramente. Ele voltou para 
 
 
 
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Breslau, meio perdido, empregando-se como estagiário em várias indústrias: seu primeiro emprego foi 
em uma destilaria, em Budapeste; depois em uma fábrica de fertilizantes, perto de Auschwitz 
(exatamente, o lugar onde mais tarde, haveria o infame campo de concentração), e em uma indústria 
têxtil, na Áustria. Estas experiências foram, para Haber, um banho de água fria, pois ele percebeu o 
quanto era ainda deficiente sua formação, especialmente em tecnologia química. Não que a teoria na 
prática fosse outra, como se costuma dizer aqui, mas simplesmente que há um espaço entre a teoria e a 
prática bem feita, que deve ser preenchido. Este espaço se chama “tecnologia” e preenchê-lo é 
exatamente uma das nossas grandes dificuldades aqui no Brasil. Só para dar um exemplo: os 
conhecimentos básicos de física necessários para lançar um foguete ao espaço são conhecidos de todos 
os países que possuam bons físicos. O Brasil tem muitos e bons físicos, mas não consegue lançar seu 
foguete VLS (Veículo Lançador de Satélites) no espaço. Por quê? Porque entre a física básica de lançar o 
foguete ao espaço e lançar o foguete realmente há uma grande quantidade de conhecimentos, de 
diferentes áreas (materiais, eletrônica, informática e computação, química, etc.) que não estão 
disponíveis e que teremos que ir descobrindo por nós mesmos, pois ninguém vai dar de graça, para não 
perder mercado. Ou seja, não dominamos a tecnologia de lançamento de foguetes, embora 
conheçamos a sua física básica. Não se trata, portanto, de dizer que, na prática, a teoria é outra, mas 
apenas que a teoria básica é necessária, mas não suficiente... Bem, e o que ocorre se não conseguirmos 
lançar nossos foguetes? Nada, ou tudo. Os nossos satélites de comunicação, indispensáveis para a 
sociedade moderna, inclusive a nossa, serão sempre lançados de foguetes de outros países, a um bom 
preço que teremos que pagar. E é meio desconfortávelsabermos que, para uma coisa tão essencial (ter 
satélites de comunicação no espaço) dependemos dos interesses de outras sociedades. Porém, há 
quem diga que não há problema, pois podemos trocar foguetes por soja... Mas isso é outra discussão. 
Seja como for, na Alemanha que se unificava e se tornava um país poderoso, dominar e desenvolver a 
tecnologia era visto como essencial, e foi nesse rio que Haber viria a nadar na sua vida profissional... 
Assim, Haber, apesar de bem formado em ciências básicas, viu que seus conhecimentos técnicos eram 
fracos. Para superar essa lacuna, foi para a Escola de Politécnica de Zurich (ETH), estudar tecnologia 
química. Essa escola era um dos centros mais avançados do mundo em tecnologia química e por lá 
Haber ficou um semestre. Voltou então para Breslau e aceitou trabalhar com seu pai nos negócios da 
família. Não era bem o que queria, mas ele era o único filho homem, havia estudado Química e 
tecnologia química, o que também o aproximava dos negócios do pai. Acontece que esses negócios já 
não eram promissores: envolviam a importação de tinturas naturais, que já estavam sendo substituídas 
por tinturas sinteticamente fabricadas, e Haber sabia disso. Aliás, este foi um dos grandes ganhos que a 
tecnologia trouxe para a Alemanha: sua indústria química em geral e, em especial, a de corantes. Ao 
sintetizar as mesmas tinturas que até então eram obtidas de produtos naturais, essas se tornaram mais 
baratas, e as empresas alemãs conquistaram uma fatia importante do mercado. Até hoje a Alemanha 
 
 
 
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                            A História da Química contada por suas descobertas 
tem na sua indústria química um dos principais motores de sua economia. Bem, Haber e seu pai 
também não se entediam quanto à condução dos negócios e, de fato, Haber não gostava muito 
daquela vida de empresário-administrador (embora viesse a se tornar um grande empreendedor). Um 
grande problema se deu quando uma epidemia de cólera grassou em Hamburgo, e já se sabia, então, 
que a água deveria ser tratada, no caso com hipoclorito de cálcio, um produto comercializado pela 
firma do pai (só para nos localizarmos, a água sanitária é uma solução de hipoclorito de sódio). Haber 
convenceu o pai a comprar grandes quantidades do produto, prevendo um grande consumo, mas a 
epidemia foi isolada e o produto encalhou; a firma teve um grande prejuízo. Assim, ficou claro para 
ambos que o melhor era nosso Fritz se voltar para a vida acadêmica. Graças a um amigo influente, 
Haber foi para a Universidade de Jena, em 1892. Essa Universidade havia sido fundada em 1548, como 
um centro teológico luterano, uma linha do protestantismo. Dois grandes nomes da cultura alemã, 
filósofos e poetas, Goethe e Schiller, foram ativos ali, na passagem do século XVIII para XIX. 
Posteriormente, ali se fundou a firma Zeiss, que se tornaria uma referência em equipamentos óticos. O 
Departamento de Química da Universidade recebia uma generosa ajuda dessa empresa, por meio da 
Fundação Carl Zeiss. Apesar disso tudo, a Universidade de Jena não era das mais importantes na 
Alemanha, e o que Haber realmente desejava era trabalhar em uma grande Universidade. Ele tentou ser 
aceito para trabalhar com o grande físico-químico Ostwald (o da lei da diluição de Ostwald, entre outras 
coisas), em Leipzig (não muito distante dali). Para isso, começou a assistir às aulas de Físico-Química (as 
suas primeiras na vida), em Jena. Ele até conseguiu um encontro com Ostwald, no ano seguinte, para 
discutir um assunto de interesse comum, mas desse encontro não resultou a esperada oportunidade. 
Assim, ele teve que ir ficando em Jena. Uma coisa marcante aconteceu neste período: ele batizou-se, 
tornando-se cristão, aos 25 anos de idade, na esperança de que a carreira acadêmica lhe fosse, com isso, 
facilitada. Isso porque, apesar de oficialmente não haver nada estatutariamente contra judeus como 
professores nas Universidades, o fato era que havia pouquíssimos, resultado das evidentes dificuldades 
dos colegiados universitários em aceitarem professores com essa origem. Por outro lado, Haber não 
mostrava interesses religiosos, certamente se sentindo muito mais um homem do mundo, de sua 
sociedade, do que ligado a esse aspecto de suas origens. Seu pai também não tinha sido um judeu 
praticante. Este era um movimento de integração em pleno curso, que haveria de ser seguido por vários 
judeus na Europa Ocidental. Marx, Einstein e Freud, por exemplo, estão entre os mais famosos. Bem, 
Jena não era mesmo o local que Haber buscava e, em 1895, ele se foi para Karlsruhe. Não se sabe ao 
certo a origem dessa decisão, até porque tudo que ele parecia ter era uma carta de apresentação. Mas 
terminou ficando por lá 17 anos, e foi ali que se firmou como um dos maiores físico-químicos de sua 
época, aprendendo quase tudo sozinho. 
 
 
 
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Sala de Leitura 
                            A História da Química contada por suas descobertas 
Karlsruhe havia sido a capital do Grão Ducado de Baden, hoje o estado alemão de Baden-Wurtenberg. 
Sempre foi uma cidade liberal, com conhecidas escolas de arte e de comércio. Como já vimos, havia 
forte vida cultural e científica na Alemanha antes da unificação. Os príncipes, grão duques ou duques 
das diferentes regiões esmeravam-se em atrair artistas, arquitetos e pesquisadores. Não surpreende, 
portanto, que já em 1825, tenha sido fundado o Instituto de Tecnologia de Baden, pelo Grão-Duque 
Ludwig. Seguindo uma tendência em curso na Europa, nele se juntaram as ciências básicas e as 
tecnologias, com as pesquisas em Química acontecendo a partir de 1851. Em 1860, foi fundada a BASF 
(Badische Anilin und Soda Fabrik – Fábrica de Baden de Anilina e Soda), em Mannhein, perto de 
Karlsruhe que, como sabemos, existe até hoje, sendo uma das maiores empresas químicas alemãs e do 
mundo. Imediatamente, houve a aproximação da empresa com a Universidade, em um relacionamento 
que dura até hoje. Para Haber, a ida para Karlsruhe não foi fácil. A ele couberam trabalhos em campos 
com os quais não estava familiarizado e, para quem conhece as universidades alemãs, naquele tempo, 
como até hoje, não havia moleza: independente das dificuldades particulares, todos esperam o melhor. 
É a partir daí também que Haber começa a mostrar suas grandes qualidades: enorme capacidade de 
trabalho, tenacidade, rigor exaustivo, grande conhecimento teórico e capacidade associativa, isto é, 
obter e juntar conhecimentos de vários campos para resolver problemas específicos. Ele estudou 
inicialmente o cracking de hidrocarbonetos (de onde resultou uma regra de Química orgânica, 
conhecida até hoje como regra de Haber), mas depois mudou para eletroquímica: estudou a redução 
eletroquímica do nitrobenzeno, a eletrólise do HCl, células combustíveis, desenvolveu um eletrodo para 
medida de oxigênio, estudou o sistema quinina/hidroquinona, que depois foi usado para a medida de 
pH. Mais tarde, os estudos de Haber sobre potenciais de interface levaram-no ao desenvolvimento, 
junto com Max Cremer, do eletrodo de vidro para a medida da acidez de uma solução. Esses trabalhos 
foram publicados em dois livros, que resultaram na sua promoção a professor associado, em 1898. Até 
então ele era um Privatdozent, um tipo de cargo que existe até hoje na Alemanha, no qual pessoas de 
reconhecido saber podem dar aulas na Universidade, mas não recebem senão uma taxa paga pelos 
alunos que frequentam seus cursos. Nessa mudança para a físico-química (lembrando que o doutorado 
dele havia sido feito em Química Orgânica), Haber teve uma ajuda importante de seu amigo, Hans 
Lugin, que havia trabalhado com Arrhenius (aquele mesmo de uma das teorias ácido-base, lembra?), 
em Estocolmo. Lugin ajudoue estimulou Haber com discussões constantes e, certamente, teria sido 
dele a cadeira de Físico-Química do Instituto de Tecnologia de Baden, se não tivesse morrido em 1899. 
Haber acompanhou o amigo no leito de morte, e sempre reconheceu a importância dele em sua 
formação, explicitando isso, inclusive, no prefácio de seu livro sobre eletroquímica, publicado em 1898. 
Essa é outra característica de Haber que vamos ter exemplos: sua capacidade de fazer e conservar 
alguns bons amigos por toda a vida. Ele também lecionava assuntos diversos, como química dos gases, 
corantes, eletroquímica técnica. Uma vez focado o assunto, atacava-o com grande energia e 
 
 
 
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tenacidade. Era também um workhaolic, ou seja, um viciado em trabalho. Como resultado de sua 
competência e energia, foi convidado, em 1902, para visitar os Estados Unidos por três meses, a fim de 
observar e relatar o progresso técnico daquele país. Lá, participou de um congresso de eletroquímica 
(onde tentou falar em inglês “aprendido” durante a viagem de navio - mas não conseguiu...) e visitou 
várias indústrias eletroquímicas. Essa viagem impressionou-o bastante, pois era a época em que os 
Estados Unidos também se desenvolviam velozmente, com grande investimento de capitais e espírito 
empreendedor. As impressões transcritas de Haber são uma excelente fonte de informação do que 
eram os EUA naquela época, em especial quanto ao seu sistema educacional. Após sua volta, Haber se 
dedicou a uma variedade de projetos: prensas de ferro para impressão de notas, corrosão dos dutos 
subterrâneos de gás e água em função de fugas de corrente dos bondes de rua, e patente de um 
processo de alisar fibras de algodão e outras com cromo. Em 1905, publicou um novo 
livro,“Termodinâmica de Reações Gasosas Técnicas” e, em 1906, passou a professor titular e diretor do 
Instituto de Eletroquímica. 
 
Síntese da amônia 
 
Mas o grande feito de Haber, pelo qual ele definitivamente ficaria conhecido, foi a síntese da amônia 
(NH3) a partir do nitrogênio (N2) e do hidrogênio (H2). A princípio, essa reação parece a coisa mais fácil 
do mundo: N2(g) + H2(g) � NH3(g). Equilibrá-la é também simples: N2(g) + 3H2(g) � 2NH3(g). Acontece que a 
coisa não é tão simples assim. Quer dizer que a teoria na prática é outra? Bem, se você considerar 
apenas uma teoria incompleta, sim. Mas, se você considerar toda a teoria, não. Veja agora: N2(g) + 3H2(g) � 
2NH3(g) + 92,4 kJ. Ou seja, trata-se de uma reação exotérmica. Porém, sua energia de ativação é 
extremamente alta, já que não é fácil quebrar a ligação tripla do N2. Daí que, para ela ocorrer, 
temperaturas altas são necessárias. Por outro lado, veja que temos 4 moles de gases do lado esquerdo 
da equação e apenas 2 do lado direito. Ou seja, é uma reação que ocorre com contração de volume, e 
como o volume é inversamente proporcional à pressão (Lei de Boyle, lembra?), se realizarmos a reação a 
alta pressão, ela tenderá para a direita. Lei de Le Chatelier...você deve conhecer dos seus estudos de 
equilíbrio químico. Por isso, para termos um bom rendimento, precisamos de alta temperatura (energia 
de ativação) e alta pressão. Simples, não? Não, não é simples. Não é fácil produzir industrialmente 
milhares, milhões de toneladas de um produto, trabalhando com pressões muito altas e temperaturas 
idem. Mas, por que precisamos de milhares, milhões de toneladas de amônia? Aí é que vem o contexto 
da nossa história, e por que a síntese da amônia era tão importante! Para entendermos isso, vamos 
voltar a nossa química básica, relembrando o que é um reagente limitante. Você sabe que quando duas 
substâncias são capazes de reagir completamente entre si, para que não haja sobra de nenhum dos 
reagentes, esses têm que estar nas proporções certas, ou seja, nas chamadas proporções 
 
 
 
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estequiométricas. E você também sabe que, se quiser aumentar a quantidade de produtos formados, 
não adianta aumentar só a quantidade de um dos reagentes, tem que aumentar as quantidades de 
todos os reagentes. Se você dispõe de grandes quantidades de um dos reagentes, mas muito pouco do 
outro, este em menor quantidade vai determinar o quanto de produto você vai conseguir. Ou seja, ele 
vai ser o reagente limitante. Por exemplo, digamos que para fazer cerca de um quilo de certa massa, 
você precise de 700g de farinha de trigo, 6 ovos, um litro de leite e 100 gramas de manteiga. Se você 
tiver todo o resto, mas apenas meio litro de leite, o máximo que vai conseguir em termos de uma 
farinha da mesma qualidade será meio quilo, certo? Ou seja, o leite será o “reagente” limitante. Na 
natureza, na formação das plantas, normalmente os elementos limitantes são o nitrogênio (N), o fósforo 
(P) ou o potássio (K). As plantas são formadas principalmente por carbono (C), hidrogênio (H) e oxigênio 
(O), além de pequenas quantidades de outros elementos, entre eles o N, P e K. A disponibilidade de C, H 
e O na natureza é bem grande, já que, ao fazer fotossíntese, a planta aproveita o carbono do gás 
carbônico (CO2), presente no ar, e retira tanto o hidrogênio quanto o oxigênio da água, que em 
plantações deve existir em abundância. Por outro lado, o N, o P e o K, além de outros minerais, a planta 
retira do solo. Se o solo for pobre nestes elementos, a quantidade de vegetal que poderá ser obtido em 
uma dada área de terreno será menor do que no caso de um solo rico, isto é, com maiores 
concentrações destes e outros elementos. É a este tipo de solo que chamamos de fértil... E, como há 
muito mais disponibilidade de C, H e O na natureza para a fotossíntese das plantas, os elementos 
limitantes terminam sendo o N, P e o K. Portanto, se quisermos produzir mais alimentos por hectare de 
solo, temos que enriquecê-lo com estes (e outros) elementos. Daí que os adubos, produtos utilizados 
para enriquecer o solo, são ricos nestes elementos. Além disso, estes elementos devem estar em uma 
forma em que possam ser absorvidos pelas plantas, isto é, biodisponíveis. No caso do nitrogênio, como 
nitratos; no caso do fósforo, como fosfatos; e no caso do potássio, na forma de um sal solúvel. Por isso, 
um adubo é, grosso modo, formado por uma mistura de nitrato de potássio (que contém tanto o nitrato 
como o potássio) e fosfato de cálcio, contendo tanto o fósforo como o cálcio, que também é 
importante, além de outros elementos. Mistura-se o adubo ao solo e a planta trata de absorver e utilizar 
estes sais no seu crescimento, já que, como dito anteriormente, C, H e O tem de sobra. Tudo isso já havia 
sido notado há muito tempo e - uma vez que junto com a revolução industrial, na Europa - veio um 
grande aumento de população, a questão da produção de alimentos se tornava crítica. Tinha que se 
produzir mais alimentos por hectare, até porque não havia novas terras a conquistar para a agricultura, 
como acontecia nos Estados Unidos e acontece no Brasil até hoje. Os países europeus resolveram essa 
questão, em parte fabricando fertilizantes, pela mistura de rochas fosfáticas que havia em grande 
quantidade na Europa, com o salitre do Chile (um mineral rico em nitrato de potássio). Foi também 
importado o guano, da América do Sul (litoral do Peru), literalmente cocô de aves acumulado ao longo 
de milhares de anos em ilhas nas costas do Peru. O guano é composto de cloreto de amônio, ácido 
 
 
 
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úrico, ácido fosfórico, ácido oxálico, entre outros, e foi, no século XIX e início do século XX, o principalproduto de exportação do Peru. Já o salitre era encontrado no sul do Peru. Mas, como essa era uma 
região despovoada, a exploração de salitre levou muitos chilenos para lá. Uma desavença entre os 
governos e as empresas envolvidas, girando em torno de impostos, terminou causando uma guerra do 
Chile contra o Peru e a Bolívia (1879-1881). O Chile terminou vencendo e ficando com as províncias, até 
então peruanas e bolivianas, ricas em salitre, enquanto o Peru perdeu suas terras ao sul e a Bolívia, sua 
saída para o mar. Assim, o que era o sul do Peru, hoje é o norte do Chile. Curiosamente, a exploração do 
salitre do Chile foi repassada a capitais britânicos, que praticamente mantiveram o monopólio da venda 
de salitre na Europa. Nesse cenário de aumento de população na Europa, dependência de um produto 
importado e monopolizado, além de seu provável esgotamento em poucos anos, era normal que se 
procurasse um substituto para o salitre na produção de fertilizantes. E não apenas de fertilizantes: os 
nitratos são componentes de explosivos, e daí terem também importância militar. A síntese da amônia 
a partir do nitrogênio e do hidrogênio surgia então como uma alternativa natural, pois ambas as 
matérias-primas eram disponíveis: o hidrogênio (H2) produzido a partir do gás d’água; e o nitrogênio 
(N2) extraído do ar, por liquefação. Uma vez obtida a amônia, essa deveria ser transformada em nitrato; 
mas este já era um processo conhecido. Fácil de imaginar, difícil de fazer, pelos motivos anteriormente 
mostrados. No caso da Alemanha de Haber, a questão era mais sensível, pois o monopólio do salitre era 
inglês e a taxa de crescimento populacional da Alemanha era uma das maiores da Europa. A Alemanha 
consumia 1/3 da produção de guano chileno, ou cerca de 500.000 toneladas de nitrogênio por ano. Em 
setembro de 1898, William Crookes (sim, o da experiência das ampolas, que terminaram levando à 
descoberta do elétron...), já previa que iriam faltar fertilizantes... Previsão do esgotamento de um 
produto natural essencial... essa situação não lembra alguma coisa atual? 
E sem fertilizantes, como a coisa fica? Bem, na natureza existe certa quantidade de nitrogênio já fixo, 
disponível para as plantas. Isso se deve ao fato de que algumas plantas conseguem realizar a chamada 
fixação do nitrogênio, ou seja, a transformação do nitrogênio (N2) do ar em alguma forma de nitrogênio 
possa ser assimilada (nitratos ou amônia, por exemplo). Na verdade, não são bem as plantas, mas as 
bactérias que vivem em suas raízes e que, para isso, contam com enzimas, que facilitam o processo, 
agindo como catalisadores*. Porém, a quantidade de nitrogênio disponibilizada pelos processos 
naturais não é suficiente para alimentar a população. Calcula-se que, mesmo com todo o cuidado no 
manejo, este nitrogênio naturalmente disponibilizado, seria suficiente para produzir alimentos para a 
metade da população atual, apenas. Daí, a necessidade de se fazer essa transformação industrialmente 
ou então se impor um controle populacional extremamente restritivo. Mas, como já vimos, transformar 
o nitrogênio do ar em amônia, por exemplo (N2(g) + 3H2(g) � 2NH3(g)), não é simples. Implica na quebra da 
ligação entre os dois átomos de nitrogênio. Essa é uma ligação tripla, muito forte. Por isso que 
 
 
 
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catalisadores são necessários, pois eles ajudam essa quebra, ou seja, diminuem a energia de ativação da 
reação. Tal como na natureza, a síntese industrial da amônia também precisaria, além de alta pressão e 
temperatura, da presença de catalisadores. Com isso, a temperatura da reação não precisaria ser tão 
alta, pois justamente o catalisador abaixa a energia de ativação. 
Mas, quais eram então as possibilidades da Alemanha “escapar” dos fertilizantes naturais salitre do Chile 
e guano? No início do século XX, além do salitre do Chile e do guano, já havia alguns processos 
industriais para a produção de óxidos de nitrogênio utilizando a passagem de descargas elétricas em 
altas voltagens pelo ar (mistura, principalmente, de N2 e O2, como sabemos). Essas descargas geravam 
óxidos de nitrogênio e, a partir destes, produzia-se o ácido nítrico, e daí os fertilizantes e os explosivos. 
Entretanto, este processo só era viável onde havia energia elétrica barata (cataratas do Niágara, nos 
Estados Unidos, ou na Noruega, por exemplo), pois o rendimento era muito baixo. Outra forma 
utilizável de nitrogênio, a amônia, também era obtida como um produto secundário da obtenção do 
coque por “destilação” do carvão mineral. Havia, ainda, a obtenção de amônia a partir da cianamida de 
cálcio: CaC2(s) + N2(g) → CaCN2(s) + 72 Kcal; CaCN2(s) + 3 H2O(g) → CaCO3(s) + 2 NH3(g). Todos esses 
processos, entretanto, não eram suficientes para garantir um fornecimento estável e barato de amônia 
para a produção de fertilizantes, que continuava a depender do salitre chileno. Portanto, a possibilidade 
da síntese da amônia a partir do N2 e H2 continuava uma meta do mais alto interesse, que atraía a 
atenção de grandes pesquisadores da época, como até mesmo Ostwald e Walther Nernst, os maiores 
físico-químicos de sua época, e que inclusive viriam a ganhar o prêmio Nobel de Química. Ou seja, ao se 
meter na questão da síntese da amônia, Haber se meteu em briga de cachorro grande, como se diz por 
aí... 
Haber não foi o primeiro a tentar a síntese da amônia a partir do nitrogênio e do hidrogênio. Ostwald, 
em 1900, tentou e chegou a encaminhar uma patente nesta direção. Entretanto, os seus resultados não 
se mostraram reprodutivos. Na verdade, tratava-se de um artefato (em poucas palavras, um erro): era o 
nitrogênio contido como impureza nos catalisadores utilizados que era levado à amônia. Já havia 
contratos assinados com a BASF para a produção de amônia baseada no método de Ostwald, mas tanto 
estes contratos como a patente tiveram que ser declinados quando se descobriu o engano. Outro que 
tentou a síntese foi o conhecido Le Chatelier (sim, ele mesmo!). Nada mais natural, pois em função de 
seu próprio princípio, ele sabia que altas pressões seriam necessárias. Entretanto, uma explosão que 
levou a morte de um de seus colaboradores o fez desistir da ideia. Ou seja, não bastava saber que altas 
pressões seriam necessárias, era necessário conseguir trabalhar em altas pressões (isto é, dispor de 
reatores suficientemente resistentes, o que significava um aço resistente, soldas e rebites resistentes, 
válvulas adequadas, etc.). 
 
 
 
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Além disso, havia que se conhecer bem o equilíbrio da reação. Aqui, vale recordarmos um pouco de 
equilíbrio químico: a uma dada pressão e temperatura, em um sistema fechado, uma transformação 
química alcança um estado de equilíbrio, em que as concentrações de reagentes e produtos não 
mudam. Este estado de equilíbrio pode ser descrito por uma constante. No caso da síntese da amônia 
teríamos: 
N2(g) + 3H2(g) ↔ 2NH3(g) K= [NH3(g)]2/ [N2(g)] . [H2(g)]3 
Trata-se de um equilíbrio chamado de dinâmico, porque, uma vez alcançado o equilíbrio, moléculas de 
amônia ainda se formam a partir dos reagentes, mas em igual número que aquelas que se decompõem 
de volta em moléculas de nitrogênio e hidrogênio. Le Chatelier mostrou que a posição deste equilíbrio 
e, por conseguinte, sua constante, depende da temperatura e, em alguns casos, da pressão. No caso da 
síntese da amônia, tal como ela está equacionada acima, uma vez que temos 4 moles de reagentes, para 
cada 2 moles de produtos formados, e sendo todos gasosos, se realizarmos a reação em alta pressão, o 
equilíbriovai deslocar-se para a direita, favorecendo a formação do produto. Por outro lado, a reação é 
fortemente exotérmica, implicando que temperaturas muito altas desfavorecem a reação. O fato de a 
molécula de nitrogênio ser muito estável (ligação tripla entre os dois átomos de nitrogênio) faz também 
com que haja uma grande dificuldade em quebrá-la, e daí ser necessária uma grande energia para 
vencer essa barreira (de potencial), o que implica que temperaturas altas ajudam a vencer essa barreira. 
Por isso, catalisadores devem ser utilizados. Esses, como sabemos, não alteram a posição do equilíbrio, 
mas fazem com que o equilíbrio seja alcançado mais rapidamente. Ou seja, para uma síntese da amônia 
com sucesso, eram necessários alta pressão, uso de catalisadores e temperaturas altas. Mas não altas 
demais. Mas por que não tão altas? Bem, ele precisava de pressões altas porque a reação era de 
contração de volume e pressões altas favorecem essa contração (lei de Boyle), pois deslocam o 
equilíbrio para o produto NH3. Uma das formas de aumentar a pressão é aumentar a temperatura, pois a 
pressão é diretamente proporcional à temperatura. Aumentar a temperatura era então uma boa, pois 
além de aumentar a pressão quebrava as moléculas do N2. Só tinha um probleminha: a reação era 
exotérmica e o aumento excessivo de temperatura favoreceria o deslocamento do equilíbrio na direção 
dos reagentes (o que não se queria, pois queria-se o produto, a amônia). Além disso, o volume é 
diretamente proporcional à temperatura, ou seja, aumento da temperatura ocasiona o aumento do 
volume, e como a reação é de contração, isso também favoreceria o deslocamento do equilíbrio para os 
reagentes. Ou seja, Haber tinha que encontrar a pressão certa (e quanto menor a pressão, melhor, por 
tornar o processo industrial mais fácil), a temperatura certa e o catalisador certo. 
 
 
 
 
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Mas, de qualquer modo, a primeira coisa a se medir eram os valores das constantes de equilíbrio a 
diferentes pressões e temperaturas. Estes valores iriam determinar se a síntese era viável ou não. O 
primeiro encontro de Haber com a questão da síntese se deu quando ele foi procurado por uma firma 
austríaca, em 1903, sobre um projeto nesta direção. Haber entrou em contato com Ostwald, sugerindo 
que a firma o procurasse, sem saber do que acontecera com a tentativa de Ostwald. Ele não sabia que o 
esforço de Ostwald não tinha dado certo. De qualquer modo, Haber se interessou pela físico-química do 
problema e resolveu estudar o equilíbrio da formação da amônia, com o suporte da forma austríaca 
(aparentemente, Ostwald não se interessou em voltar a estudar o problema). Ele iniciou estudando o 
equilíbrio à pressão ambiente, o que era mais simples, utilizando ferro como catalisador, e temperatura 
de 1020 oC! Sua conclusão naquele momento foi a de que a síntese direta não iria funcionar 
industrialmente, e informou essa conclusão aos industriais austríacos, voltando-se para o estudo da 
síntese da amônia a partir do NO gerado em arcos voltaicos. As coisas provavelmente teriam ficado por 
aí, mas no outono de 1906, Haber recebeu uma carta de Walther Nernst (o da equação de Nernst, ele 
mesmo), que havia lido as publicações de Haber. Nernst apontava que os resultados de Haber não se 
ajustavam ao seu teorema do calor (teorema este que lhe daria o prêmio Nobel de 1920). Haber 
imediatamente repetiu seus experimentos, agora com a ajuda de um químico muito experiente no 
trabalho com gases (Le Rossignol) e, embora os resultados diferissem um pouco dos originais, ainda 
estavam muito distantes dos esperados pelo teorema de Nernst. Os dois grupos se encontraram em um 
congresso, e deu-se a discussão. Acontece que Nernst já era uma espécie de sucessor de Ostwald como 
o maior físico-químico da Alemanha, o que dava a ele uma posição de superioridade na discussão. Vale 
reproduzir as palavras de Nernst: 
“É lamentável que o equilíbrio tenda muito menos à formação da amônia do que o que foi assumido até 
agora, em função dos dados altamente incorretos de Haber....” 
Essas palavras colocavam uma pá de cal na possibilidade de síntese industrial da amônia a partir do 
nitrogênio e hidrogênio, além de colocarem em dúvida a reputação de Haber como bom cientista. 
Cientistas não são diferentes dos outros seres humanos. Haber se sentiu ofendido com a observação de 
Nernst e sua resposta à situação, além de somatizar sua ansiedade como dor de estômago e problemas 
de pele (o que lhe era comum), foi voltar imediatamente ao laboratório e repetir seus experimentos. 
Dessa vez, trabalhou a 30 atm, e confirmou que seus dados estavam corretos. Mais tarde, descobriu-se 
que os dados experimentais de Nersnt também estavam corretos, mas como ele usava o valor na época 
tabelado para a capacidade calorífica da amônia, e esse valor estava errado, vinha daí a diferença. De 
qualquer modo, o rendimento ainda seria muito pequeno, a não ser que se empregassem pressões 
muito altas, nunca antes tentadas em uma síntese industrial. Era necessário construir um vaso de reação 
suficientemente resistente, juntas adequadas, válvulas, ou seja, toda a tecnologia de alta pressão. Mas 
 
 
 
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Haber tinha escolha, porque possuía uma equipe qualificada, pois, além de Le Rossignol, ele pôde 
contar com a ajuda de Friedrich Kirchenbauer, um excelente mecânico que, entre outras coisas, 
desenvolveu as válvulas cônicas, que depois se tornaram de uso geral em sistemas de alta pressão. Na 
verdade, Haber montou todo um departamento de desenvolvimento de tecnologia de alta pressão! A 
primeira patente de Haber (1908) descrevia um equipamento em que os gases recirculavam, o calor 
desenvolvido pela reação era transferido aos reagentes e a amônia era retirada sem perda de pressão. O 
compressor foi comprado com suporte da BASF. Em 1909, Haber descobriu que o ósmio era um 
excelente catalisador, permitindo um rendimento de 8% a uma pressão de 175 atm e a 550 oC. Um 
resfriador foi adicionado ao sistema, permitindo a obtenção de amônia líquida, obtendo então um fio 
de amônia líquida saindo do seu reator. Ao mesmo tempo em que desenvolvia seu projeto, Haber 
negociava com a BASF no sentido de um suporte maior e da futura síntese industrial. Não foram 
negociações fáceis, pois havia muito ceticismo quanto à viabilidade industrial do projeto; também não 
foi fácil chegar a um acordo em termos do quanto o próprio Haber receberia. Foi essencial, na 
discussão, se o processo seria viável ou não, a opinião de um jovem químico industrial da BASF, Carl 
Bosch, que encorajou seus chefes pela aceitação do risco. Bosch viria, ele mesmo, depois, a levar o 
processo de Haber à escala industrial, tendo, por isso mesmo, recebido o prêmio Nobel de Química de 
1931. Por isso, o processo industrial é hoje chamado de “Haber-Bosch”. Bem, voltando à nossa história, 
graças a Bosch a BASF enfim concordou em dar uma chance a Haber, e a mandar seus técnicos a 
Karlsruhe a fim de presenciar uma demonstração da síntese. Como era de se esperar, justo no dia da 
demonstração, uma junta do equipamento de Haber se rompeu, o que causou um atraso de horas 
(imagine o estômago do Haber...) mas, no segundo experimento, a coisa funcionou, e a amônia líquida 
escorreu do reator. Isso foi em 2 de julho de 1909 e, a partir daí, a BASF passou a financiar fortemente o 
trabalho de Haber, autorizando-o a construir uma planta piloto em Ludwigshafen, onde era a fábrica da 
BASF, em colaboração com o grupo de Bosch. A questão ainda era o preço do catalisador. Por via das 
dúvidas,a BASF havia comprado todo o raro ósmio existente no mercado, mesmo sendo ele muito caro. 
O problema foi resolvido em janeiro de 1910, pelo grupo de Bosch, usando o ferro reduzido sobre 
alumina, após terem sido tentadas centenas de formulações. O próprio Haber, em uma carta a Bosch, 
comentou o fato de que o ferro havia sido tentado por Ostwald, e em várias outras oportunidades, mas 
no estado puro, só tendo funcionado quando impuro... No caso, as impurezas vinham do hidrogênio, 
obtido do gás d’água. Finalmente, em março de 1910, Haber anunciou a realidade da síntese da amônia 
a partir dos seus elementos, e virou a sensação do ano. Imaginem a cara do Nernst... De qualquer modo, 
Nernst teria a possibilidade de se reabilitar frente a Haber, como vamos ver. 
 
 
 
 
 
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Se o mundo dos cientistas tem cenas de ciúme, inveja, amor, ódio e atitudes nem sempre 
recomendáveis, no mundo dos negócios o jogo é ainda mais pesado. Em primeiro lugar, Haber teve que 
esperar até 1914 para que o Departamento de Patentes da BASF permitisse que ele publicasse seus 
artigos sobre a síntese, criando uma série de restrições às informações que poderiam ser passadas. 
Depois, várias objeções a sua patente foram feitas, com base em que ele não havia descoberto nada de 
novo, em função de estudos anteriores, inclusive os artigos publicados por Nernst em 1907. A mais 
formidável objeção veio de outra gigante industrial alemã, a Hoescht (que existe até hoje); objeção essa 
que se baseava, entre outras coisas, na opinião de Ostwald. Entretanto, no processo, a BASF recorreu à 
opinião de Nernst que, surpreendentemente, deu um parecer favorável a Haber. Desse modo, em 4 de 
março de 1912, a objeção à patente foi rejeitada. No acordo com a BASF, Haber receberia 1.5 pfennings 
(centavos de marco) por tonelada de amônia vendida, o que lhe valeu vários milhões de marcos ao 
longo da vida. A primeira fábrica de amônia pelo método de Haber começou a operar em 1913. Desde 
então, apesar de inúmeros avanços, envolvendo principalmente a eficiência dos catalisadores, o 
método de Haber, basicamente o mesmo, é o responsável por 99% do nitrogênio usado em fertilizantes 
no mundo. Em 1914 eclodiu a Primeira Guerra Mundial e, se não fosse a capacidade da Alemanha de 
produzir sua própria amônia, o bloqueio imposto pela Inglaterra, que dominava os mares, teria causado 
sua derrota já no primeiro ano de guerra. Vale lembrar, de novo, que a amônia também servia para 
fabricar nitratos, utilizados em explosivos. O impacto da produção da amônia pelo método de Haber-
Bosch foi de tal ordem que há quem considere essa “invenção” a mais importante do século XX. Ao 
mesmo tempo, este pode ser considerado o primeiro grande sucesso da colaboração entre uma 
universidade e a indústria, realizado por um grupo interdisciplinar, com uma estratégia de risco e 
grande investimento de capital. Foi o que hoje se chama “pesquisa e desenvolvimento”. A BASF se 
tornou o maior produtor do mundo de insumos químicos básicos (não entramos em detalhes aqui, mas 
ainda havia que produzir o hidrogênio), e Ludwigshafen, um dos pólos mundiais de Química, uma vez 
que a produção de amônia implicava em uma grande integração de diferentes indústrias. E, uma vez 
que a amônia é difícil de ser transportada, fábricas de seus derivados – como explosivos, devem ser 
montadas na proximidade da usina de síntese. 
Depois da síntese da amônia... 
Bem, nossa história poderia parar por aqui, pois, afinal, o feito do nosso herói já teria sido 
suficientemente grande. Mas ainda não terminamos e pedimos ao honorável público paciência para a 
segunda parte. 
É claro que Haber recebeu inúmeras condecorações e reconhecimento pelo seu feito. Ele passa a ser um 
dos grandes cientistas da Alemanha, o que lá não é pouca coisa. É convidado para organizar uma nova 
 
 
 
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entidade de pesquisa em Berlim: o Kaiser Wilhelm Institute, uma instituição de pesquisa básica, em 
diferentes áreas, onde funda e passa a dirigir o Instituto de Físico-Química e Eletroquímica. 
Em 1914, estourou a guerra. Não cabe aqui examinar as causas da guerra, mas sim apresentar alguns 
pontos que contribuíram para o ambiente de então. O nacionalismo grassava solto na Europa 
(discussões sobre o nacionalismo podem ser encontradas em livros de História; quem quiser saber mais, 
pode consultar Hobsbawn e Elias, ver literatura ao fim do texto). Elias chama a atenção para que, em 
uma Europa com classes médias ascendentes, em que a nobreza estava em decadência, assim como a 
igreja, o nacionalismo passa a ocupar o espaço que essas instituições ocupavam no ideário das pessoas. 
Ou então que o nacionalismo era um antídoto para as ideias socialistas também em voga. Bem, seja 
como for, o nacionalismo era uma realidade vivida pelas pessoas, como é até hoje, e a Primeira Guerra 
Mundial é a primeira guerra entre nações como um todo, pois as outras, até então, eram guerras entre 
exércitos (embora, é claro, esses exércitos fossem formados por convocados das classes populares). 
Nunca o número de mobilizados foi tão grande. O nacionalismo era especialmente popular na 
Alemanha, pois ascendeu junto com a melhoria econômica experimentada após a unificação do país e 
se confundiu com ela. O militarismo também se misturava nessa “sopa”, pois a unificação alemã havia 
sido conseguida a custas de vitórias militares. Guerras contra a Dinamarca (que dominava um pedaço 
ao norte da Alemanha), e contra a França (a Guerra Franco-Prussiana), para dizer dois eventos. Ou seja, 
unificação, ascensão econômica, nacionalismo, militarismo. Junto com isso, chegava ao fim a 
predominância econômica da Inglaterra. Desde o fim das Guerras Napoleônicas, com a derrota de 
Napoleão e a vitória inglesa, e o consequente tratado de Viena (1815), o mundo se organizara à feição 
inglesa. As colônias espanholas e portuguesas nas Américas haviam se tornado independentes, mas 
eram uma área de grande influência inglesa. Além de áreas de influência, onde os ingleses despejavam 
seus produtos, a Inglaterra tinha as colônias propriamente ditas nas Américas (pequenas ilhas do 
Caribe), na África e na Ásia, sem dúvida a mais importante sendo a Índia. Só para ter uma ideia da 
importância do mercado latino-americano para a Inglaterra, 1/3 da produção têxtil de Manchester (a 
cidade de maior produção têxtil da Inglaterra) vinha para a América Latina. As relações econômicas 
eram sempre favoráveis aos ingleses, que trocavam matéria prima dos países periféricos ou das colônias 
por produtos industrializados, de maior valor agregado. Junto com isso, os ingleses controlavam os 
fluxos de capitais e Londres, com sua bolsa de valores, era o coração financeiro do mundo, e a libra, a 
moeda franca, tal como o dólar é hoje. Como política, a Inglaterra procurava evitar o surgimento de 
qualquer potência hegemônica no continente europeu, que pudesse vir a competir pelo seu evidente 
primeiro lugar. Nesse caminho para o topo, a Inglaterra havia guerreado, desde o século XVI, com a 
Espanha, Holanda e, finalmente, com a França de Napoleão. Em 1815, com a derrota de Napoleão, havia 
se tornado líder inconteste. Mas líder não quer dizer única, e a Inglaterra era inteligente o suficiente 
 
 
 
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para perceber que haveria de ter lugar para outros, que, como sociedades já bem desenvolvidas, não 
podiam ter um papel excessivamente secundário. Daí, que, no mundo “inglês”, França, Holanda, emesmo Espanha e Portugal, mantinham seus interesses, ou melhor dizendo, as classes dominantes se 
entendiam. Isso contribuía para o equilíbrio do mundo, e a Europa conheceu 100 anos sem guerras, ou 
quase sem guerras. Uma exceção foi a Guerra da Crimeia, travada pela Inglaterra e França contra o 
Império Russo, para frear a expansão deste para o sul (ver mapa III), o que ameaçaria os interesses 
anglo-franceses no Oriente Médio e na Índia. Uma poderosa marinha, tanto de guerra como mercante, 
garantia esse mundo inglês e a Inglaterra era a senhora dos mares. Os produtos do mundo eram 
transportados principalmente pelos navios ingleses. Veja também que interessante: a Inglaterra havia 
sido aliada de Portugal durante a invasão daquele país por Napoleão, e foi por navios ingleses que a 
família real portuguesa veio escoltada para o Brasil. Isso não impediu que essa mesma marinha inglesa, 
não mais que 14 anos depois, assegurasse a independência do Brasil, apoiando o nosso movimento de 
independência contra Portugal. Não havia estado de guerra entre Inglaterra e Portugal, ao contrário, os 
dois países mantinham intenso comércio e relações diplomáticas e, ainda assim, Portugal teve que 
engolir a interferência inglesa. O tratado de aceitação de nossa independência por Portugal foi 
intermediado pela Inglaterra. Toda cidade grande do Brasil tem uma rua com o nome de Almirante 
Cochrane, comandante da esquadra inglesa que garantiu que a esquadra portuguesa não impedisse o 
nosso movimento de independência. E assim agia a Inglaterra, intervindo em todo o mundo, mexendo 
os pauzinhos de modo a que seus interesses prevalecessem. Mas, o mundo é dinâmico, a história não 
para, e esses mesmos interesses geram situações que vão terminar se voltando contra eles mesmos. E o 
aparecimento na Europa de uma Alemanha unificada, industrializada, em franco desenvolvimento, 
colocava em risco o equilíbrio europeu, ou seja, a política que assegurava à Inglaterra que nenhuma 
potência europeia estivesse em condições de desafiar sua hegemonia. Quando se tornou claro que era 
impossível parar o desenvolvimento industrial da Alemanha, e que em vários setores da economia a 
Alemanha ultrapassava a Inglaterra (inclusive no setor químico), iniciou-se uma corrida armamentista. 
Ou seja, o barril de pólvora aumentou. Daí, que a crise dos Bálcãs, simbolizada pelo assassinato do 
Arquiduque Ferdinando, herdeiro do trono austríaco, por um nacionalista sérvio (olha o nacionalismo aí 
de novo) foi apenas o estopim da guerra mais sangrenta que o mundo conheceu até então, a Primeira 
Guerra Mundial (1914-1918). Quase cinco anos de guerra, com um número total de mortos de cerca de 
15 milhões – números que só seriam superados na Segunda Guerra Mundial, ainda assim porque nessa 
segunda versão da catástrofe o número de civis mortos foi maior. A Alemanha, em função de seus 
sucessos militares anteriores, acreditava em uma guerra rápida e que a vitória era certa. O clima 
nacionalista era de tal ordem que multidões foram para a rua saudar o início da guerra (mas logo iriam 
se arrepender...). Esse clima não foi característico apenas da Alemanha, mas da França e Inglaterra, 
também. E, claro que a Inglaterra, nesse caso, alia-se à França, pois o poder que ameaçava o predomínio 
 
 
 
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inglês era a Alemanha. Os cientistas, em ambos os lados, não estavam alheios a esse clima. Às vezes, 
pensa-se que os cientistas são mais sábios que o comum dos mortais em todos os assuntos, mas não é 
verdade. Os cientistas são sábios naquilo em que estudaram (e, às vezes, nem tanto quanto pensam...). 
Portanto, cientistas de ambos os lados estavam imbuídos do mesmo clima nacionalista. Haber, muito 
menos, escapava disso. E, como cientista-nacionalista, jogou-se de corpo e alma na guerra. Não no 
campo de batalha, mas...de um modo muito especial. Haber, pode-se dizer, foi defensor, lobista, 
idealizador e gerente geral do esforço de guerra química alemã. Você certamente deve já deve ter visto 
fotos dos soldados vestindo máscara de gases, parecendo extraterrestres. Bem, ao contrário do que 
esperavam todos, a guerra não foi rápida como as outras. A Alemanha começou, digamos, ganhando, 
inclusive invadindo a Bélgica, um país neutro, de modo a se esquivar das fortificações na fronteira com a 
França. Foi um escândalo, mas cientistas do porte de Max Planck, Ostwald e Nernst assinaram um 
manifesto que defendia a quebra da neutralidade da Bélgica, entre outras coisas, em nome das ameaças 
que cercavam, a seu ver, a Alemanha. Só Einstein e alguns poucos se posicionaram contra a guerra, e 
lançaram um contra-manifesto, pela paz. Os franceses, ingleses e belgas conseguiram frear o avanço 
alemão, e a guerra se transformou em uma desgastante guerra de trincheiras, com cada um dos lados 
sem conseguir derrotar o outro. Foi nessa situação que Haber, e outros, imaginaram que o uso de armas 
químicas poderia definir a situação em favor da Alemanha. Assim, Haber colocou toda sua energia 
primeiramente em convencer os militares alemães e, depois, na pesquisa de gases tóxicos e na melhor 
forma de usá-los. Mesmo a pesquisa da morte requer método, e isso implicava em estudar as 
propriedades tóxicas dos gases, como eles se dispersavam, os efeitos da umidade, a melhor forma de 
acondicioná-los, de liberá-los, etc. Havia, também, que se saber da meteorologia, direção dos ventos, 
etc. Isso era, mais uma vez, uma junção de problemas de ciência básica, aplicada e de tecnologias, tais 
como os que Haber havia enfrentado na questão da síntese da amônia, e ele era mesmo muito bom 
nessa organização de esforços. Esses estudos foram realizados no seu Instituto, em Berlim. Haber se 
ocupou também dos problemas relacionados com a produção industrial dos gases tóxicos, e 
supervisionou, pessoalmente, na linha de frente, o primeiro lançamento de gases contra as tropas 
inimigas. Foi em Ypres, cidade belga, contra tropas francesas e (sintomaticamente) argelinas (a Argélia 
era uma colônia da França), em 22 de abril de 1915, o primeiro emprego moderno, em larga escala, de 
um agente químico como arma letal direta. Este agente foi o gás cloro, lançado a partir de 5.730 
cilindros de metal, cada um pesando 100 quilos, com cloro líquido, ao longo de 10 km de frente. O uso 
de armas químicas, por acordos anteriores, era proibido, e este ataque reforçou a imagem dos alemães 
como agressores e bárbaros. Haber defendia-se, dizendo que o uso de armas químicas não era diferente 
do de qualquer outra arma, e que a guerra química iria, na verdade, ao precipitar a vitória alemã, 
diminuir a mortalidade da guerra. Nisso, não ficou sozinho, e devemos lembrar que este argumento 
viria a ser utilizado na defesa do uso da bomba atômica pelos Estados Unidos contra o Japão, ao fim da 
 
 
 
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Segunda Guerra Mundial. Bem, o primeiro ataque foi um sucesso, com uma nuvem de gás verde, de 
cerca de 1 m e meio de altura, avançando empurrada pelo vento, abrindo uma larga brecha nas linhas 
inimigas, uma vez que os que não sufocaram, debandaram, com os alemães avançando pela terra de 
ninguém e tomando as trincheiras aliadas, devidamente protegidos. Mas, imediatamente, os aliados 
contra-atacaram, fecharam a brecha, e a guerra voltou ao impasse. Com a diferença, agora, que aos 
aliados passaram a usar também gases químicos contra os alemães. Bem, aí a loucura humana não tem 
fim. Tratou-se de produzir mais gases, mais letais, lançados de forma mais eficiente, e máscaras 
protetoras capazes de neutralizá-los, e gases contra as máscaras protetoras, ou seja,o círculo absurdo 
que nos caracteriza. E era no instituto de Haber que a maioria dessas pesquisas era feita. Ele não estava 
sozinho nessa empreitada, e outros futuros prêmios Nobel, como Otto Hahn (Prêmio Nobel de Química, 
1944, pela descoberta da fissão do urânio), James Franck e Gustav Hertz (ambos Prêmio Nobel de Física, 
1925, pelo estudo do impacto de elétrons sobre os átomos) faziam parte do grupo de Haber. Não se 
pode dizer que foi a primeira vez que a ciência serviu aos senhores da guerra, pois desde os tempos de 
Arquimedes, passando por Leonardo da Vinci, os cientistas emprestaram seu saber aos poderosos de 
então. Mas, tal como a síntese da amônia simbolizou o primeiro esforço bem sucedido de íntima 
colaboração Universidade–Indústria, talvez o esforço de guerra química da Alemanha tenha sido a 
primeira vez, no âmbito da ciência moderna, em que se forma um “complexo industrial-militar” 
envolvendo indústria (que fabricava os gases em grandes quantidades), militares (por motivos óbvios) e 
pesquisadores. Apesar do sucesso, embora parcial, da arma química, Haber não estava satisfeito. Ele 
defendia um ataque maciço, com uma quantidade muito maior de gás, de modo a definir a vitória 
alemã logo no primeiro ataque. Ele temia, como realmente aconteceu, que o uso apenas limitado 
levaria à retaliação dos aliados, e os alemães perderiam a vantagem da surpresa. Já outros eram contra 
o uso das armas químicas, não por motivos humanitários, mas porque a frequência com que os ventos 
sopravam contra as tropas alemãs era muito maior do que no sentido inverso...Por força da 
impossibilidade de retaliar com as mesmas armas imediatamente, os soldados aliados responderam 
matando os prisioneiros alemães que estavam nas suas mãos, e a guerra só fez crescer em sua escalada 
de violência. Até o fim da guerra, 22 diferentes agentes químicos foram testados, lançados de canhões, 
morteiros, granadas de mão e bombas aéreas. O fato de o primeiro ataque não ter dado certo do modo 
pretendido não fez Haber recuar. As pesquisas em seu Instituto continuaram (como parar, depois de 
começar?). Para se ter ideia, um tipo de gás foi desenvolvido, que envolvia uma mistura de fosfogênio 
(COCl2 - sufocante) com um irritante que penetrava nas máscaras: os atacados eram obrigados a tirar as 
máscaras e ficavam envolvidos pelo gás venenoso... 
Quando a guerra enfim terminou, com a derrota da Alemanha, Haber foi procurado como criminoso de 
guerra e teve que se esconder na Suíça. Mas logo essa acusação foi retirada, e Haber pode voltar para a 
 
 
 
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Alemanha. Haber continuou, ainda, durante muito tempo, com pesquisas sobre o uso militar de gases, e 
sugeriu a criação de um Instituto de Guerra Química... Como a Alemanha foi proibida pelo tratado de 
Versailles de realizar tais pesquisas, elas eram conduzidas secretamente em outros países, inclusive 
mesmo na União Soviética, sob supervisão alemã. Essas relações secretas continuaram até a subida de 
Hitler ao poder, em 1933. Assim são os países... Mas Haber não cuidou só de gases letais, mas continuou 
sua trajetória científica a frente do seu Instituto de Físico Química, em Berlim. Além das pesquisas 
secretas com gases, vale citar as discussões que levaram a formulação do ciclo de Born-Haber, e a 
pesquisa sobre a possibilidade de retirar ouro da água do mar. Haber fez essa pesquisa com a intenção 
de tentar conseguir um modo de permitir à Alemanha pagar suas dívidas de guerra, resultantes do 
tratado de Versailles. Os dados até então existentes sobre a concentração de ouro na água do mar (30 a 
65 mg por tonelada) indicavam essa possibilidade, e Haber montou um projeto secreto nessa direção. 
Desenvolveu um método para determinar ouro na água do mar, o que não é trivial, dado os níveis de 
concentração muito baixos. O método consistia na co-precipitação dos íons ouro com sulfeto de 
chumbo, produzido pela mistura de acetato de chumbo com sulfeto de amônio. Veja que aqui, 
também, tal como na síntese da amônia, fatores econômicos tem que ser levados em consideração, 
uma vez que se tratava de um processo que visava se tornar industrial. Preço e disponibilidade dos 
materiais a serem empregados eram essenciais. Haber embarcou com sua equipe em alguns cruzeiros 
marítimos, montando um laboratório de bordo, coletando amostras e tomando o cuidado de não 
deixar ninguém fora de sua equipe perceber do que se tratava. Foram feitas análises de inúmeras 
amostras, ao longo de 1925-7, mas, infelizmente, os valores de concentração reais, que Haber 
demonstrou serem menores do que 0,001 mg/tonelada, estavam muito abaixo dos estimados até 
então, e tornavam inviável economicamente a extração de ouro da água do mar. Pelas contas de Haber, 
se as concentrações inicialmente estimadas estivessem certas, “apenas” o ouro contido no Mar do Norte 
seria suficiente para pagar a dívida. Você pode imaginar o impacto ambiental que isso teria? Bem, 
naquela época ninguém pensava em meio ambiente... 
 
Epílogo 
Com a derrota da Alemanha na Primeira Guerra, Haber nunca voltou a ser o mesmo homem. Apesar dos 
feitos alcançados, apesar de ter recebido o prêmio Nobel em 1920 (relativo ao ano de 1918), ele nunca 
se recuperou por completo. De qualquer modo, Haber continuava no seu sonho nacionalista de uma 
Alemanha desenvolvida, potência, cultuando sua cultura e história. Continuou um obstinado, mas já 
não tinha a mesma energia. Lutou para ver a ciência da Alemanha reaceita nos círculos científicos 
mundiais, fazendo viagens e palestras nos espaços internacionais que lhe eram abertos. Continuava 
 
 
 
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politicamente um “autoritário”, um monarquista, apesar da abdicação do Imperador e da proclamação 
da república (a chamada República de Weimar, pois havia sido proclamada na cidade de Weimar, em 
1919, levando o Imperador alemão, o Kaiser, ao exílio na Holanda). Certamente, Haber nunca se 
entendeu bem com a democracia representativa e não estava entre aqueles que a apoiavam. Seu viés 
era francamente autoritário, como de tantos outros importantes professores alemães. Apesar de todas 
as dificuldades, a Alemanha começava a se recuperar da derrota na primeira guerra, havia uma 
significativa reação ao militarismo prussiano, mas, sobreveio a crise de 1929. O desemprego abateu-se 
sobre a Alemanha, a recuperação econômica cessou. A inflação tornou-se galopante, corroendo salários 
e poupanças. Isso, junto com a frustração da derrota e o medo das elites de uma convulsão social, 
levaram ao crescimento popular do nazismo (nacional-socialismo, veja aí o nacionalismo de novo), e de 
sua aceitação pelas classes dominantes como uma espécie de antídoto malcheiroso, porém eficiente, ao 
socialismo de inspiração soviética. A esquerda, por sua vez, via na fraqueza política da República de 
Weimar a possibilidade da tomada de poder, e não fez muito, ou quase nada, para apoiá-la. O impasse 
político se forma e Hitler, em janeiro de 1933, presidente do partido nacional-socialista (nazista), o 
partido mais votado (mas não obteve maioria, mas cerca de 34% dos votos; aliás, essa foi a sua maior 
votação sob um regime ainda democrático), foi chamado pelo Marechal Hindemburg, presidente da 
Alemanha, a formar um governo. O regime era parlamentarista, e Hitler seria o primeiro ministro 
(Chanceler). Inicialmente, era um governo de coalizão, com ministros nazistas e não nazistas, dos 
partidos de direita. Social-democratas e comunistas, naturalmente, estavam fora do governo, e eram 
oposição. Tudo muito bonitinho e democrático. Acontece que, foradas linhas políticas, o partido 
nazista tinha uma “torcida” muito poderosa e violenta. Organizado de modo militaresco (tinham até 
uniforme), seus membros faziam manifestações de massa, marchas, discursos, comícios e 
demonstrações, e não se furtavam nem um pouco a usar de violência contra seus opositores. Ou seja, 
Hitler trazia uma face institucional (era o Chanceler legalmente indicado), mas na outra mão, um 
porrete, pronto para usá-lo. E o fez com eficiência e precisão: aproveitando o incêndio criminoso do 
Reichstag, ocorrido pouco depois de sua indicação a chanceler, Hitler fez passar, imediatamente, uma 
lei de exceção que lhe dava amplos poderes. Essa lei foi aprovada pelo congresso, ou seja, Hitler 
conseguiu poderes discricionários legalmente! Bem, aí, ele mostrou o porrete de vez, cassando 
deputados social-democratas, comunistas e independentes, perseguindo opositores em todos os níveis 
da sociedade alemã e, quando legalmente (isto é, dentro da lei de exceção) ele não conseguia o que 
queria, os assassinos de seu partido tratavam de fazê-lo. E a Alemanha lançou-se na aventura mais 
destrutiva de sua história. Naturalmente, Hitler apelava para os sentimentos nacionalistas, tão presentes 
no povo alemão, e magoados pela derrota na primeira guerra e pela crise financeira. Mas, neste 
nacionalismo, não havia lugar para Haber, pois Haber era judeu. O antissemitismo não era novo na 
Europa. Na unificação da Espanha, antes da descoberta da América, Fernão de Aragão e Isabel de 
 
 
 
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Castela tinham colocado a comunidade judaica da península ibérica contra a parede: ou se convertiam, 
ou iam embora. Muitos se converteram (os chamados cristãos novos) e outros foram embora, justo para 
a Europa central. Bem, de qualquer maneira, havia a possibilidade de conversão, ou seja, na visão 
católica da época, os judeus eram “recuperáveis”, podiam ser convertidos , se tornarem bons cristãos, e 
serem aceitos. Mas a visão antissemita de Hitler e seus asseclas trazia algo de novo e radical: era 
baseada em teorias pseudocientíficas de raça, muito em voga no fim do século XIX e início do século XX. 
Até no Brasil essas teorias tiveram adeptos. Havia “cientistas” que diziam, por exemplo, ser possível 
identificar criminosos por suas características anatômicas (procure, na Internet, por Lombroso). Outros 
procuravam explicar a situação dos povos por teorias de raça que, implícita ou explicitamente, diziam 
que os brancos eram superiores e os outros povos (asiáticos, negros), inferiores (uma maneira de 
justificar o colonialismo). Nessas condições, surgiram programas eugênicos, quer dizer, programas 
governamentais, ou “paragovernamentais”, de proteção da “pureza” ou “saúde” da “raça”, que 
impediam ou dificultavam a imigração de populações “inferiores” ou, ao contrário, incentivavam a 
imigração de populações brancas, para “branquear” os países mestiços (nosso caso). A base disso tudo 
era acreditar na existência de raças, ou seja, que existiam diferenças genéticas, ou de estrutura 
biológica, entre as raças branca, negra, amarelo, índios, ciganos, judeus, irlandeses. Bem, cada povo 
elegia o “seu” inferior, conforme suas conveniências. Para piorar, os racistas invocavam uma 
interpretação distorcida da seleção natural (proposta por Darwin, que nada tinha a ver com a distorção 
de suas ideias), proclamando que a riqueza do mundo dividia-se entre os povos em função de sua 
capacidade de competir, ou seja, de ser mais “forte” (ou “capaz”). Chegava-se a provar que o tamanho 
médio do cérebro dos brancos era maior que o dos amarelos e o desses maior que o dos negros. É claro 
que os que promoviam essa falsa ciência nunca eram os que estavam entre os inferiores, e é claro 
também que ela servia muito bem a determinados interesses. Todos os argumentos pretensamente 
científicos dessas ideias foram devidamente desmascarados, desde as medidas comparativas de 
tamanho de crânios até pretensos estudos com gêmeos. No caso dos crânios, mostrou-se, entre outras 
coisas, que entre os crânios das “raças inferiores” tomados para estudo, a proporção de crânios 
femininos era maior do que a mesma proporção entre crânios “brancos”. Como o crânio masculino é 
maior que o feminino, em média, é lógico que a média de tamanho dos crânios “brancos” ficava maior. 
Além disso, tamanho de crânio nada tem a ver com inteligência. Quanto ao estudo com gêmeos, 
provou-se, simplesmente, que os gêmeos nunca existiram. O objetivo desse “estudo” era provar que a 
influência da genética era mais forte do que o da educação, e para isso estudava-se a ascensão social de 
gêmeos separados entre si na primeira infância, de diferentes “raças”. Claro que o estudo concluía que, 
em média, gêmeos de “raça” branca conseguiam se sair melhor, independentemente de terem sido 
criados em famílias diferentes, com níveis de educação distintos, etc. Veja que só na década de 1970 é 
que se descobre a falsificação dos dados. Apesar do desmascaramento desses e de outros “estudos” (ver 
 
 
 
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“A Falsa Medida do Homem”, um livro de Stephan Jay Gould), volta e meia alguém surge de volta com 
essas tolices. No início dos anos 2000, por exemplo, aproveitando a onda conservadora que se seguiu à 
subida de George Bush à presidência dos EUA, (re)surgiu um livro, pseudoestatístico, chamado “The Bell 
Curve - A Curva do Sino”, que procurava mostrar que os negros americanos tinham pior desempenho 
escolar, mesmo descontadas as questões sociais. Nos anos 90, até o fim do projeto genoma, houve uma 
nova deformação ideológica das ciências, surgida com a explosão da genética: havia gene de tudo, 
alegria, tristeza, sexualidade, etc. Cada dia um jornal anunciava a descoberta de um gene relativo a um 
comportamento particular. A intenção era clara: não há o que fazer, somos o que somos e a sociedade 
em que vivemos é fruto do que somos, não vai mudar. Bem, todas essas mensagens, no fundo, pregam 
o conformismo com a situação vigente e dão a dominados e dominantes motivos para aceitarem seus 
respectivos papéis no mundo, tal como está posto. Infelizmente, para os espertos de ocasião, a 
(verdadeira) ciência genética mostrou que as coisas são muitíssimo mais complicadas do que o simples 
“um gene, uma proteína”, que as interações com o ambiente têm um inequívoco papel no 
desenvolvimento humano e que somos um resultado da interação da nossa genética com o nosso 
meio. Além disso, nosso genoma é muito mais pobre em genes do que queríamos supor, e a carga 
genética, pura e simplesmente, não pode ser responsável por explicar, por si só, a infinita variabilidade 
das características humanas. Finalmente, o conceito de “raça” foi mais uma vez desmascarado, 
provando-se que a variabilidade genética intra-grupos “raciais” é maior do que entre diferentes grupos. 
As diferenças anatômicas entre os povos são resultados de variações irrisórias, pequenas adaptações 
para situações ambientais diferentes, mas que em nada nos fazem diferir enquanto raças diferentes. 
Teorias de raças, pseudocientíficas voltam de quando em quando e continuarão a voltar, não na 
esperança de convencer os informados, mas pegar os desprevenidos, que são muitos, ou a maioria. 
Infelizmente, ao longo de toda a história humana, sentir-se superior aos outros parece confortar-nos de 
nossas próprias misérias e, naquele momento de crise da Alemanha, foi isso do que Hitler, 
espertamente, se aproveitou. Na oratória que o levou ao poder, Hitler sempre vociferava contra os 
judeus, percebendo o antissemitismo latente na sociedade alemã. Nada como jogar as pessoas

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