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BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. Síntese elaborada para fins didáticos Professora: Ramone Mincato Prólogo Objeto de análise: a tv habitual – comercial. Justificativa: ela ameaça as outras esferas de produção cultural (a arte, a literatura, a filosofia, a ciência, o direito) e a vida democrática. Submete tudo ao sucesso comercial. Concede espaço aos fomentadores de xenofobia. (p.9-10). Método de análise: Dedutivo: argumentativo e demonstrativo. A autonomia do discurso analítico, crítico e articulado continua a ser uma das formas mais segura de resistência à manipulação e de afirmação da liberdade de pensamento. (p.11). Contribuição/Preocupação: oferecer ferramentas para os profissionais da imagem e da comunicação que lutam para que a tv se converta num instrumento de democracia direta em contraposição a instrumento de opressão simbólica (TESE FUNDAMENTAL) (p.13). Objetivo da análise: examinar os mecanismos ocultos/velados, anônimos e invisíveis de funcionamento da TV, por meio dos quais se exercem todos os tipos de censura que transformam a tv num instrumento de manutenção da ordem simbólica e de exercício de violência simbólica (TESE FUNDAMENTAL). CAPÍTULO I – O ESTÚDIO E SEUS BASTIDORES Condições habituais (impostas) para participar da comunicação televisiva: O convidado não tem domínio sobre os instrumentos de produção do seu discurso. É objeto. Pq. a) o assunto é imposto, implicando em perda da autonomia do discurso; b) o tempo é limitado, restringindo o discurso de forma que é muito pouco provável que alguma coisa seja dita; c) o discurso é censurado pelas condições impostas pelo programa/jornalista. Condições excepcionais da comunicação televisiva: O convidado tem completo domínio sobre os instrumentos de produção do seu discurso. É sujeito. Pq. a) o assunto é escolhido livremente; b) o tempo não é controlado; c) o discurso é autônomo, não é censurado em nome da técnica, da moral, da conveniência, do público que não entende. Problematização: Por que as pessoas aceitam participar da tv nas condições habituais? Para serem vistas, transformando a tv num instrumento de exibição narcisista (1ª TESE). Para obterem notoriedade que não conseguem no seu campo profissional. E porque desconhecem a especificidade do instrumento televisão que consiste na possibilidade de atingir todo o mundo (meio de comunicação de massa). Censuras exercidas sobre a tv (objeto) e na tv (sujeito): Censura econômica é exercida sobre a televisão pelos: donos, anunciantes de publicidade e pelo estado que às subvenciona. Censura política é exercida sobre a tv através da nomeação para os cargos dirigentes, mas sobretudo através do conformismo político que é mais eficaz, uma forma consciente ou inconsciente de autocensura dos jornalistas devido: o enorme exército de reserva e a precariedade do emprego. Censura política = conformismo político = autocensura. Censura invisível e anônima (sem sujeito) é exercida pelos próprios mecanismos de funcionamento da tv (a concorrência pelas fatias de mercado, o círculo vicioso da informação e as operações de censura - na composição do estúdio, na escolha dos convidados, na distribuição do tempo, na definição do assunto). São esses mecanismos invisíveis e anônimos que transformam a tv num instrumento de manutenção da ordem simbólica e de exercício de violência simbólica. (2ª TESE) Poder simbólico: é o poder de construir simbolicamente a realidade e provocar efeitos na realidade. Violência simbólica: é a violência (práticas, ações) exercida no âmbito das representações simbólicas, com a cumplicidade, conivência, conveniência daqueles que a exercem e sofrem, ambos inconscientes de exercê-la ou sofrê-la, pelo fato de desconhecerem os mecanismos de funcionamento dos veículos com os quais operam. A violência simbólica não rompe com as estruturas mentais do público. Ela trabalha com idéias prontas e aceitas. Tipos de Ação Simbólica praticados na TV: Mostrar ocultando: consiste em atrair a atenção para os “fatos-ônibus”: aqueles que interessam a todo mundo, não chocam ninguém, não dividem, não envolvem conflitos e disputas, não tocam em nada de importante, formando o consenso. Exemplo: notícias de variedades/fúteis (uma espécie rudimentar e elementar de informação que ocupa grande parte do tempo televisivo e que servem para ocultarem coisas importantes, não-fúteis, informações que os cidadãos deveriam possuir para exercerem seus direitos democráticos.). Ocultar mostrando (3 formas): a) mostrar acontecimentos de forma diferente do que seria preciso mostrar se ela quisesse apenas informar. Exemplo: as dramatizações dos fatos. Dão mais importância do que o fato tem; b) mostrar o que é preciso mostrar, mas de forma insignificante. Não dão a devida importância ao fato. Exemplo: Reformas do Estado; c) mostrar os acontecimentos de tal forma que eles adquirem um sentido que não corresponde à realidade.(MST=violência) Resultado das Ações Simbólicas: jornalismo uniforme, homogêneo e banal. A busca do extraordinário e da exclusividade gera a uniformidade. O extraordinário se torna ordinário. Poder da Televisão: é o poder simbólico. O poder de construir simbolicamente a realidade, gerando efeitos na realidade. A construção simbólica da realidade tem efeitos sobre o real. É o poder de evocação que gera mobilização ou desmobilização. 3ª TESE: A TV é um instrumento de criação da realidade. Isto porque produz efeitos da realidade e na realidade. Efeitos não desejados, mas que os jornalistas por ingenuidade, interesses, pressupostos, categorias de percepção da realidade e expectativas inconscientes produzem da realidade e na realidade. 4ª TESE: A TV é um instrumento de luta política. Isto porque dada a sua abrangência social é preciso impressionar a mídia para se obter sucesso e eficácia política. Ela possibilita impor visões de mundo, óculos para as pessoas verem o mundo segundo certas visões. Para utilizá-la é preciso gerar fatos que interessam aos jornalistas, devido suas categorias de percepção da realidade: fatos espetaculares, trágicos, fantásticos, sensacionalistas. TESES SOBRE A CIRCULAÇÃO CIRCULAR DA INFORMAÇÃO/ EFEITOS DO CÍRCULO VICIOSO DA INFORMAÇÃO (p.30). TESE: Os produtos jornalísticos são homogêneos (p.30/31). Isto porque estão submetidos às restrições impostas: a) pelas fontes de informação (oficiosas e oficiais, mesmas pesquisas de opinião, mesmos anunciantes); b) e pela lógica da concorrência (se um falou o outro também falará). A concorrência jornalística leva todos a fazerem a mesma coisa. SUB-TESE: A produção jornalística é coletiva (p.32). Isto porque está submetida: a) às restrições da concorrência jornalística; b) aos mesmos instrumentos de trabalho dos jornalistas (a leitura – interleitura- dos jornais, as mesmas fontes de informação, o clipping: “para saber o que se vai dizer é preciso saber o que os outros disseram” p.32).; c) às mesmas estruturas cognitivas e categorias de percepção da realidade: todos buscam o furo, o extraordinário.Todos os jornalistas estão sujeitos às pressões do índice de audiência/da concorrência pelas fatias de mercado. SUB-TESE: As escolhas produzidas na televisão são escolhas sem sujeito. Isto devido aos efeitos do círculo vicioso da informação: a “informação da informação” é que decide o que é importante de ser transmitido e que conduz ao nivelamento, fechamento mental. Resultado: as pequenas diferenças entre os jornais servem apenas para mascarar as grandes semelhanças, uma espécie de “jogo de espelhos” que produz fechamento, nivelamento mental e homogeneidadecultural. As diferenças existem apenas para os jornalistas que acreditam que contribuem para aumentar o índice de audiência. Para a média dos espectadores são imperceptíveis. Índice de audiência: é a medida da taxa de audiência das diferentes emissoras ou é a medida do sucesso comercial das emissoras: se vende é legítimo, está certo e é legal, embora possa estar comprometido apenas com o dinheiro. É o “juízo final do jornalismo”. O sucesso comercial se torna instância de legitimação (p.37). Efeitos do Índice de Audiência sobre a TV: a busca do furo para ser o primeiro. A pressão da urgência/do tempo. A concorrência pelo furo de reportagem. É o círculo vicioso da informação. “...há objetos que são impostos aos telespectadores porque se impõem aos produtores...porque são impostos pela concorrência com outros produtores” (p.39). Ex: todos vão cobrir uma enchente para pegar um furo. TESE: A TV não propicia a expressão do pensamento (p.39). Isto porque: a) está submetida à pressão do índice de audiência e à pressão da urgência/ do tempo. Na urgência não se pode pensar. O pensamento requer tempo e a televisão está submetida à pressão do tempo, devido o índice de audiência; b) a TV só possibilita pensar com idéias prontas, pré- digeridas, aceitas por todos, banais, convencionais e que não colocam o problema da recepção; c) a comunicação na TV é instantânea, ela não existe. A banalidade é comum ao emissor e ao receptor. Por isso, ela privilegia os fast-thinkers, os falantes habituais da mídia que propõem alimento cultural pré-digerido/fast-food cultural; d) o pensamento é subversivo e requer tempo: começa desmontando idéias prontas por cadeias de argumentação, o que leva tempo. CAP. II - A ESTRUTURA INVISÍVEL E SEUS EFEITOS Objetivo: explicar a prática dos jornalistas, analisando as relações de força invisíveis que se manifestam em conflitos pessoais e em escolhas existenciais. Campo jornalístico: é um espaço social estruturado que possui suas próprias leis de funcionamento (o que nele se passa não pode ser explicado somente a partir de fatores externos, de pressões econômicas externas) e que pressupõe a existência de relações de força entre dominantes e dominados. Parâmetros metodológicos para analisar uma emissora de TV: CAMPO: refazer a história social das relações de força do conjunto do campo para conhecer o poder específico daquele veículo de comunicação (TV) no campo jornalístico, pois num campo o que conta são os pesos relativos, por exemplo entre a imprensa escrita e a falada (Conhecer a estrutura do campo). No final dos anos 50, a TV torna-se dominante econômica e simbolicamente com a crise dos jornais; VEÍCULO: examinar as relações de poder da mídia nacional no cenário mundial, por meio da comparação, para saber quem domina do ponto de vista econômico, técnico e simbólico. Ex: a tv americana domina a alemã, a brasileira (Conhecer o poder da mídia nacional); EMISSORA: verificar o poder específico/relativo da emissora nas relações de concorrência entre as diferentes emissoras, através dos seguintes indicadores: índice de audiência; peso dos anunciantes; capital simbólico ou prestígio social dos jornalistas. Obs: na prática, a concorrência se realiza pelas relações de força entre os jornalistas, implicando em desafios próprios, pessoais, tais como: a busca da informação exclusiva ou furo jornalístico; a reputação na profissão ou reconhecimento pelos pares; o reconhecimento ou prestígio social. Parâmetros para compreender o que um jornalista pode fazer num órgão de imprensa: a) conhecer o poder específico (econômico, técnico e simbólico) do órgão no campo jornalístico; b) conhecer a sua própria posição dentro do órgão. Efeitos sociais da emergência da TV: a) homogeneização e banalização da informação- assuntos-ônibus; b) manutenção intacta das estruturas mentais do público, submetendo-se demagogicamente aos gostos populares – trabalha com idéias prontas; c) despolitização do público; d) cerceamento do cidadão ao espaço público, pois para ter acesso ao debate público qualquer discurso ou ação passa pela prova de seleção jornalística – uma forma de censura exercida inconscientemente pelo jornalista; e) tornar o conjunto do campo jornalístico heterônomo, sujeito às pressões econômicas e comerciais. Efeito estrutural do campo jornalístico nos outros campos de produção cultural: a heteronomia. O campo jornalístico acaba com a autonomia dos outros campos, introduzindo as leis do comércio e produtores heterônomos neles. De que forma? a) quando consagra pessoas não reconhecidas no seu campo específico, dando peso jornalístico desproporcional ao seu capital/peso específico, por exemplo “escritores não- escritores”. A consagração de um escritor pela mídia se impõe contra o julgamento dos pares. Se a mídia exerce esse poder é porque encontra no interior do campo pessoas heterônomas, não consagradas dentro do seu campo (fracassadas), ou seja, encontra cumplicidade, colaboracionistas (produtores heterônomos) no campo científico. Obs: “Quanto mais as pessoas são reconhecidas por seus pares e ricas em capital específico, mais são levadas a resistir. Quanto mais heterônomas em suas práticas e atraídas pelo comercial, mais inclinadas a colaborar”(p. 88). b) julga por “referendo popular” divergências entre profissionais do mesmo campo, do tipo “você decide”; c) propõe “debates científicos” entre profissionais de campos diferentes (astrônomo x astrólogo, químico x alquimista, padre x médico). Obs: a existência de um verdadeiro debate pressupõe que as pessoas comunguem, partilhem de pressupostos comuns. Requer um alto grau de acordo no terreno do desacordo. d) age como instrumento de informação mobilizadora, ao estabelecer a lógica da vingança contra a lógica jurídica-política que surgiu para acabar com a vingança. Ex: morte do índio queimado por adolescentes. A mídia julga, absolve, condena. A mídia interfere na autonomia do campo jurídico e se apresenta como “alma humanista”. TESE: “o antiintelectualismo é uma constante estrutural do campo jornalístico” devido o poder de autoconsagração (de existir publicamente), de abrirem vagas para si mesmos. A notoriedade dos jornalistas é desproporcional aos seus méritos. Daí a tendência ao antiintelectualismo. Efeitos da tendência ao antiintelectualismo do campo jornalístico: a) nivela por baixo o direito de entrada ao espaço público, consagrando pessoas que não tem direito do ponto de vista da profissão para atender o índice de audiência; b) diminui o direito de entrada das pessoas que são reconhecidas no seu campo, usando o índice de audiência como justificativa. Alternativas para produtores culturais: a) defender a elevação do direito de entrada ao espaço público; b) reforçar o dever de saída daqueles que não são reconhecidos no seu campo; c) generalizar as condições de acesso ao universal, lutando para que todos tenham acesso à educação e ao conhecimento universal; e lutando para que os produtores culturais tenham a propriedade dos meios de difusão da cultura. BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. Síntese elaborada para fins didáticos Professora: Ramone Mincato CAPÍTULO I – O ESTÚDIO E SEUS BASTIDORES
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