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Dermeval Saviani e a pedagogia histórico-crítica: implicações para a educação brasileira

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Dermeval Saviani e a pedagogia 
histórico-crítica: implicações para
A EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Denise de Oliveira Alves1 
Miliane Nogueira Magalhães Benício2
Introdução
Dermeval Saviani insere-se na linha de frente de educadores para os quais a educação é também uma forma de ação político-social. Seu pensamento ilumina nossas reflexões educacionais e favorece
o discernimento da dimensão de um verdadeiro projeto educacional, capaz 
de transformar a lógica de organização de nossas escolas. Para entender o 
ideário de uma escola democrática e de qualidade para todos é preciso uma 
nova concepção de homem, sociedade, educação, conhecimento; concepção 
que pode ser apreendida dos postulados de sua pedagogia histórico-crítica, 
mais especificamente quando mostra aos educadores a viabilidade de superar 
a crítica reprodutora da situação vigente e construir uma educação voltada 
aos interesses da maioria da sociedade brasileira, explorada pela classe 
dominante.
Concorreram para a elaboração da pedagogia histórico-crítica, dentre 
outros fatores, o contexto de embate ideológico entre ideias liberais do 
capitalismo e ideias progressistas do socialismo, bem como a americanização 
do mundo e as discussões teóricas tanto na educação como na sociologia e 
na filosofia, marcadas por clima de profundo pessimismo e aprisionamento 
da educação e da escola como instrumentos capazes de contribuir para uma
1 Doutoranda em Educação pela Universidade de Brasília - UnB. Mestre em Educação pela 
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Atualmente é pesquisadora do Grupo de Estudos 
e Pesquisa em Psicologia e Educação - GRUPPE e professora no curso de Pedagogia do Centro 
Universitário do Planalto Central - UNIPLAN.
2 Mestre e doutoranda em Educação pela Universidade de Brasília. Professora no curso de 
Pedagogia na mesma universidade. Pesquisadora do Projeto Pontes (entre a pesquisa acadêmica 
de Sociolinguística educacional e a formação de professores) que investiga o processo de 
familiarização de professores em formação com os estudos de sociolinguística de viés educacional, 
de modo a promover o empoderamento desses profissionais.
efetiva democratização dos bens culturais produzidos pela humanidade. 
Tais condições concretas, historicamente construídas e, ao mesmo tempo, 
impostas aos homens e mulheres das décadas de 1960 a 1980, entre eles 
nosso pensador Saviani, configuram-se num terreno fértil para o nascedouro 
de uma aguda crítica dirigida às teorias pedagógicas crítico-reprodutivistas 
que tiveram o seu auge nas décadas de 1970 e 1980.
As teorias crítico-reprodutivistas, embora reconheçam os 
condicionantes sociais da educação, entendem que a sua função é reproduzir 
a sociedade em que ela se insere, o que acabou contribuindo para criar um 
clima de desesperança entre os educadores que se sentiram reféns de um 
fazer sempre a favor do status quo. Porém tiveram a sua positividade no 
momento em que, a partir da Problematização de seus fundamentos, começou 
a ser sistematizada uma nova proposta político-pedagógica, a pedagogia 
histórico-crítica, que reposicionou a educação no processo de transformação 
e reinvenção da sociedade.
A pedagogia histórico-crítica tem sua base epistemo-filosófica no 
materialismo histórico e, portanto, busca captar o movimento objetivo 
do processo histórico e compreende a questão educacional com base 
no desenvolvimento histórico objetivo. Desse modo, quando o homem 
transforma o mundo é por este transformado, naturalizando processos, 
hábitos, atitudes, habilidades, símbolos, valores, ideias, conceitos que vão 
engendrando práticas de criação e reinvenção desse próprio mundo. Logo, a 
escola pode se reinventar de modo a tomar-se um lugar para todos e não um 
bem reservado a alguns.
O contributo da teoria de Saviani para melhorar a educação em nosso 
país pode ser mais bem compreendido, na atualidade histórica, quando se 
procura equacionar o problema da exclusão social e educacional no contexto 
da implementação de políticas que assegurem a promoção e proteção do 
direito à educação.
Podemos dizer que estamos a viver uma fase inédita no cenário 
educacional brasileiro e mundial quando se busca desenvolver, de forma 
nunca vista antes, um processo de inclusão social e educacional pautado no 
acolhimento e na relação respeitosa para com as diferenças e a diversidade 
humana. Vários autores, ao referirem-se a uma educação para todos, 
traduzem a dimensão de um projeto visionário, definidor de uma profunda 
transformação na lógica que fundamenta e organiza o trabalho pedagógico. 
Eizirick (2005) utiliza a guerra como metáfora para defender a ideia de ser 
a inclusão um processo complexo, difícil e doloroso e demandar a “gestação
230 | Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
de uma mentalidade inclusiva”; em Mantoan (2007) encontramos a ideia do 
andar no fio da navalha para expressar o embate, a resistência, a ruptura 
epistemológica inerente à proposição de uma escola que assegure acesso, 
participação, aprendizagem e fluxo escolar para todos os estudantes; ainda, 
Forest e Lusthaus (1987), pesquisadores canadenses, utilizam o caleidoscópio 
como metáfora para a inclusão:
“O caleidoscópio precisa de todos os pedaços que o compõem. Quando se 
retiram pedaços dele, o desenho se toma menos complexo, menos rico. As 
crianças se desenvolvem, aprendem e evoluem melhor em um ambiente rico 
e variado” (FOREST e LUSTHAUS 1987, p. 6).
É, pois, no mote da inclusão que o pensamento de Saviani se vê 
reeditado e sua profunda e rigorosa reflexão a respeito da função social da 
escola adquire essencialidade epistemológica. A maior riqueza heurística de 
seus postulados é resumida por ele em entrevista concedida as autoras desse 
texto3, ao afirmar:
A Pedagogia histórico-crítica é claramente uma teoria contra-hegemônica. 
Penso que ela desempenha, em relação à educação, papel análogo à teoria 
elaborada por Marx. Assim como Marx esperava que sua teoria da sociedade 
pudesse servir como uma arma nas mãos do proletariado em sua luta para 
instaurar outra forma social, também espero que a pedagogia histórico- 
crítica sirva como uma arma nas mãos dos trabalhadores para instaurar 
relações educativas que correspondam às suas necessidades e aspirações. 
(SAVIANI, 2011a, p.3).
Saviani põe em cheque o papel da escola nos moldes em que se encontra 
e desenvolve uma crítica rigorosa em relação à lógica que está subjacente a 
organização do trabalho pedagógico. Seu horizonte é a superação da divisão 
da sociedade em classes e a consequente “reconciliação da humanidade 
consigo mesma”, pois à escola cabe garantir também aos trabalhadores e 
aos filhos destes o acesso e o domínio do saber sistematizado, uma vez que “ 
(...) o acesso à cultura erudita possibilita a apropriação de novas formas por 
meio das quais se podem expressar os próprios conteúdos do saber popular”. 
(SAVIANI, 2011b, p. 20)
É por pleitear lugar legítimo também para a cultura dos filhos da 
marginalidade, que o desafio de pensar e fazer uma educação de qualidade 
para todos tem ocupado a vida desse pensador contemporâneo, cujas ideias-
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício | 231
3 Entrevista não publicada, concedida via email à Denise de Oliveira Alves e Miliane Nogueira 
Benício, alunas do Doutorado em Educação da UnB - 02 de novembro de 2011.
chave discutimos neste artigo. Espera-se avançar na compreensão de seu 
pensamento para o enfrentamento dos velhos e sempre atuais desafios que 
envolvem a multifacetada e contraditória realidade educacional brasileira.
É interessante registrar que o pensamento de Dermeval Saviani 
é apresentado, neste artigo, tomando como referência duas entrevistas 
concedidas por ele a alunas do curso de Pós-Graduação em Educação da 
Universidade de Brasília, o que justifica a ausência de citações de outrasfontes para grande parte das ideias aqui desenvolvidas. Uma das entrevistas, 
foi realizada pelas autoras (primeira quinzena de novembro de 2011), por 
meio eletrônico. A outra foi concedida por ele a duas colegas de doutorado no 
Fórum Internacional de Políticas Públicas de Educação na América Latina, 
realizado em novembro de 20104. Para facilitar a compreensão do leitor, 
todas as citações literais das palavras de nosso entrevistado são colocadas em 
itálico, tanto no corpo do texto como nas citações recuadas.
2 alguns referentes biográficos para melhor entender o “ponto de 
vista”
Todo ponto de vista é a vista de um ponto. (...) A cabeça pensa a partir de 
onde os pés pisam. Para compreender, é essencial conhecer o lugar social 
de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que 
experiências tem, que desejos o alimenta, como assume os dramas da vida e 
da morte e que esperanças o animam. (BOFF, 1997, p. 9)
“Todo ponto de vista é a vista de um ponto” é um fragmento do livro A 
Águia e a Galinha, que, ao desejo do autor, o teólogo e filósofo Leonardo Boff, 
é para ser lido e compreendido como uma “metáfora da condição humana”. De 
fato, ele pode ser assim entendido! Mostra-nos duas dimensões da existência 
humana que, em diferentes momentos da vida, estão imbricadas, em embate 
permanente, evidenciando nossos conflitos, fragilidades, contradições e, 
fundamentalmente, os espaços de resistência possíveis para que, mesmo em 
meio a condições materiais adversas, possamos nos construir em oposição 
a valores hegemônicos que, como numa parede de fumaça, ofuscam nosso 
olhar e por vezes parecem nos roubar o desejo de sonhar e a crença de que a 
mudança é possível.
232 | Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
4 Expressamos nosso agradecimento ao professor Dermeval Saviani que, em meio a uma agenda 
intensa de trabalho, foi sensível a nossa solicitação e mesmo considerando ter-nos respondido 
“telegraficamente” prestou-nos uma grande contribuição. Também agradecemos às colegas 
Simone Gontijo e Elisângela Dias que gentilmente nos forneceram a entrevista por elas realizada e 
ao professor Célio da Cunha, que incentivou-nos e orientou na elaboração do roteiro da entrevista.
Assim, ao procurarmos entender o pensamento de Dermeval Saviani 
e suas implicações para a educação no Brasil, procuramos fazê-lo a partir de 
um posicionamento deste no mundo concreto, historicamente feito e, como 
não poderia deixar de ser, idiossincraticamente lido pelas autoras.
Para conhecer um pensador, entender suas ideias sem praticar 
reducionismos tão comuns no meio acadêmico, é fundamental ouvirmos a sua 
história de vida, olhar o seu “álbum de infância”, os retratos de sua família, 
saber sobre as condições das estradas por onde passou, sobre as intempéries 
e calmarias. Isso porque nossas ideias, crenças e produções materiais e 
simbólicas são forjadas na feitura histórica de cada um, na sua relação com 
o outro e com o mundo, como defendem os materialistas históricos, com cujas 
ideias nos identificamos.
Para Severino (1994), o traço fundamental da obra de Saviani é o 
seu caráter de “solidária militância” e o seu “pensar generoso”, melhor 
compreendido por quem, como ele, teve o privilégio de conviver de perto com 
a pessoa de Saviani, conhecer o caminho por ele trilhado na vida anterior à 
acadêmica, repleto de limitações relacionadas à pobreza e que deixou marcas 
profundas em seu pensamento.
Talvez se possa afirmar que por esses caminhos íngremes estejam 
plantadas as raízes de seu pensamento, a elaboração de uma teoria 
pedagógica crítica, transformadora, comprometida, em especial com os 
filhos da classe trabalhadora e, sobretudo, sensata, capaz de reconhecer, em 
virtude da coerência teórica, o que de bom os diferentes homens e mulheres, 
de diferentes épocas, construíram5.
Sua leitura marxista otimista do homem e do seu fazer, seu olhar 
criterioso, mas justo e respeitoso em relação ao ser humano, com o poder de 
transformar-se a si próprio e ao mundo, carrega os elementos estruturantes de 
sua proposta pedagógica esperançosa e exequível, capaz de levar a escola a 
romper com as próprias amarras e transcendê-las para se refazer e se colocar 
a serviço de todos, reconhecendo, desse modo, o seu caráter contraditório.
O entrelaçamento do passado com o presente, da obra do pensador com 
a sua história de vida fica muito claro em vários momentos nas formulações 
conceituais de Saviani. Ao afirmar, por exemplo, que “(...) com tempo e 
ambiente de estudo é possível a qualquer criança aprender, ainda que sem
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício | 233
5 Saviani não nega os conhecimentos acumulados pelas diferentes correntes teóricas pedagógicas, 
da tradicional confessional às crítico-reprodutivistas; ao contrário, busca dominá-los e internalizá- 
los, superando os seus limites, incorporando-as para então transcendê-las. (SAVIANI, 2011b e 
2010).
orientação alguma além daquela dispensada coletivamente no horário das 
aulas” (GONTIJO & DIAS, 2010), Saviani invoca a experiência vivida por ele 
no seminário, onde a disciplina era rígida e, para cada três horas de aula, 
correspondiam cinco horas de estudos. Nessa condição, embora os alunos 
fossem recrutados nos mais diferentes lugares e tivessem pouca ou nenhuma 
escolaridade prévia, conseguiam aprender, sendo praticamente inexistentes a 
repetência e a evasão.
O autor recupera essa sua experiência para confrontar práticas como 
as desenvolvidas nos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) e nos 
Centros de Atenção Integral à criança (Caics), que, segundo ele, almejam 
combater a evasão e repetência, com escolas de tempo integral, mas utilizam 
esse tempo para assistência social e recreação, descuidando-se do tempo 
necessário ao trabalho pedagógico. Para Saviani, sem tempo e ambiente de 
estudo as crianças não podem aprender e se essa obviedade fosse incorporada 
pelas escolas de tempo integral aliada a uma adequada orientação pedagógica, 
problemas como evasão e repetência deixariam de existir.
Em entrevista concedida a Gontijo e Gomes, Saviani diz considerar 
que sua infância de menino pobre o identifica com os filhos da maioria da 
população que habita este país. Nosso emérito pensador, o “maquininha”, 
como era chamado por seus colegas de peladas de rua pela rapidez com que 
se desvencilhava das guaxumas, driblando e conduzindo a bola até o gol do 
adversário, nasceu em 25 de dezembro de 1943, em uma fazenda situada 
em Santo Antonio da Posse, no interior do Estado de São Paulo, vindo a 
ser registrado em 03 de fevereiro de 1944. Seu pai jamais frequentou os 
bancos escolares, embora tenha conseguido se alfabetizar, com a ajuda de 
seu avô e se tomar, mais tarde, o “alfabetizador” de sua esposa (mãe de 
Saviani) e de muitas outras pessoas que desejavam aprender a ler e escrever, 
as quais ele reunia, após sua jornada de trabalho na roça, e transmitia-lhes o 
que sabia como conta o próprio Saviani na sua autobiografia (FACULDADE 
DE EDUCAÇÃO DA UNICAMP, 2011).
Em suas lembranças da infância, Saviani traz a memória de doenças 
e do desespero de sua mãe diante da ameaça da mortalidade infantil, pois ela 
perdeu a primeira filha e também aquele que seria o quinto. Lembra-se da 
situação de penúria em que saía, com sua família, a margem da estrada de 
ferro catando serralho para compor a alimentação familiar.
As limitações da vida na roça, que dificultavam a sobrevivência da 
família, obrigaram seus pais a se transferirem, em 1948, com a família, para a 
capital São Paulo, onde seu pai empregou-se de foguista de caldeira na indústria
234 I Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
e seus irmãos se tomaram operários nas fábricas. Nesse período, o menino e o 
jovem Saviani assistiu o engajamento do pai e dos irmãos nos movimentos 
sindicais, embaladospelas ideias socialistas de igualdade para todos, que 
mais tarde orientarão o pensamento militante e generoso desse pensador como 
disse Severino (1994).
Saviani fez o “curso primário” no período de 1951 a 1954, em uma 
escola que era um galpão de madeira na periferia de São Paulo. Em 1955 
iniciou o curso de admissão no “Ginásio”, equivalente ao 5o, ao 6o. 8o. e 9o. 
anos do ensino fundamental, em uma paróquia em São Paulo, mas no mesmo 
ano seguiu com o vigário daquela paróquia para Cuiabá - Mato Grosso, onde 
realizou o curso ginasial, revelando-se um aluno aplicado e dedicado, sendo 
classificado, a cada mês em primeiro lugar.
A experiência de Mato Grosso revestiu-se de um sentido contraditório 
para Saviani. Por um lado a violência da ruptura bruta com tudo o que lhe 
era familiar, por outro, a riqueza de novas vivências, costumes, lugares, 
linguagens e até etnias que essa experiência propiciou.
Após ter ficado três anos e três meses sem rever seus pais e irmãos, 
ele conseguiu uma licença de doze dias para visitá-los. Quando ia do 
aeroporto para a casa em São Paulo, olhava as paisagens, as ruas, os prédios 
e se perguntava sem encontrar respostas: estou chegando em casa ou estou 
saindo? É aqui ou é lá o meu lugar? Essa sensação de desenraizamento se 
agravou quando Saviani chegou a casa e percebeu que nada mais lhe era 
familiar, tudo estava muito diferente a ponto de ter a sensação de que, se 
tivesse encontrado com um de seus irmãos na rua, não o teria reconhecido. 
Certamente que nosso pensador não passou imune a tantos atravessamentos 
de sentidos e sobre as marcas indeléveis deixadas por essas vivências como 
ele diz:
A violência da ruptura foi sentida como se eu tivesse sido arrancado, 
com apenas onze anos de idade de meu habitat, projetado nas nuvens e 
depositado em um lugar totalmente desconhecido. As dores da separação eu 
as sentia fisicamente e desejava ou acreditava estar doente, imaginando que 
assim poderiam me mandar de volta para casa. (GONTIJO & DIAS, 2010).
Em um exercício de reflexividade Saviani avalia que talvez tenha a ver 
com essa experiência algumas características suas, como a auto-suficiência 
e a indiferença pelos lugares: tanto faz estar aqui ou estar lá, me adapto a 
qualquer lugar sem me ligar efetivamente a nenhum. Tal sentimento pode
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício | 235
ser tomado para ilustrar a dimensão em que a apropriação desta ou daquela 
cultura impacta na identidade e sentimento de pertença do sujeito.
Na pedagogia histórico-crítica, a importância do ensino da cultura 
letrada aparece como fio condutor, “razão de ser da escola”. Em entrevista, 
Saviani retoma reflexões de sua obra Pedagogia histórico-crítica: primeiras 
aproximações e deixa clara a preocupação com a preservação da cultura 
popular:
Como registrei no livro Pedagogia histórico-crítica: primeiras 
aproximações, “o acesso à cultura erudita possibilita a apropriação de 
novas formas por meio das quais se podem expressar os próprios conteúdos 
do saber popular”, E acrescento: “Cabe, pois, não perder de vista o caráter 
derivado da cultura erudita em relação à cultura popular, cuja primazia 
não é destronada”. Mostro, em seguida, que “a restrição do acesso à 
cultura erudita conferirá àqueles que dela se apropriam uma situação de 
privilégio, uma vez que o aspecto popular não lhes è estranho Concluo, 
então: “A recíproca, porém, não é verdadeira: os membros da população 
marginalizados da cultura letrada tenderão a encará-la como uma potência 
estranha que os desarma e domina. (SAVIANI, 201 la, p. 5).
Nessa mesma direção Kleiman (2001, p. 224), ao refletir sobre o processo 
de aculturação pela escrita, esclarece que a apropriação desta implica diretamente 
na construção da identidade, pois “envolve uma mudança e uma reorganização 
de práticas e sistemas de conhecimentos, valores e crenças do aluno, que 
não podem ser ignorados”, logo implica na condição do sujeito e o lugar 
que ocupa no seu grupo e/ou comunidade. Assim foi com o menino Saviani, 
poderia ter dito Kleiman se tivesse conhecido a sua história e as dores e 
sentimentos contraditórios que o assolaram ao ser afastado de sua família e 
também ao regressar após três anos à casa dos pais. Vejamos, então, como 
o aprofundamento na cultura letrada e as experiências vividas pelo jovem 
docente e acadêmico Saviani vão delineando caminhos sem volta.
2.1 Trajetória acadêmica, áreas de pesquisa e produção
Acompanhar a trajetória acadêmica de Saviani, para Vidal (2011) “(...) 
é, de certo modo, acompanhar a própria constituição do campo da história 
da educação no Brasil nas últimas quatro décadas” (p. 17). Isso por que seu 
nome figura entre os pensadores de maior importância para o pensamento 
pedagógico brasileiro na contemporaneidade.
236 | Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
Saviani iniciou sua carreira acadêmica como docente universitário, 
em 1966, aos vinte e três anos de idade, imediatamente ao concluir sua 
formação em Filosofia, vindo a assumir a cadeira de Filosofia da Educação, 
inicialmente como monitor, e em 1967 iniciando oficialmente sua atividade 
docente, simultaneamente no curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade 
Católica de São Paulo (PUC/SP) e no ensino médio, ministrando a disciplina 
de Filosofia, em ambos os casos.
Como docente desenvolveu o hábito de escrever ele próprio o material 
para os seus alunos, mesmo porque na época não havia grande produção 
bibliográfica sobre filosofia da educação brasileira ou mesmo sobre a história 
da educação brasileira, áreas para as quais contribuiu significativamente, 
como informa Vidal (idem).
Em 1968 inscreveu-se para o doutorado. Nessa ocasião, sua primeira 
ideia era desenvolver um trabalho sobre os fundamentos para um sistema 
de educação no Brasil, mas ao começar sua investigação constatou que o 
Brasil não tinha um sistema de educação, o que fez com que redimensionasse 
seu trabalho. Ao invés de investigar a organização do sistema nacional 
de educação no Brasil, passou a pesquisar se existia, ou não, um sistema 
nacional de educação no Brasil e em 1971, aos vinte e oito anos de idade, 
doutorou-se em Filosofia da Educação pela PUC/SP. O interesse na discussão 
sobre política e legislação educacional acompanhou o pesquisador durante 
toda a sua trajetória acadêmica, tendo produzido vários trabalhos defendendo 
a necessidade de desenvolver um sistema nacional de educação no Brasil6, 
vindo inclusive a intervir na elaboração da segunda Lei de Diretrizes e Bases 
da Educação - Lei 9394/96, o que culminou, em 1997 com a publicação da 
obra: A nova lei da educação: trajetória, limites e perspectivas.
Ainda para Vidal, “Saviani esteve à proa de movimentos que 
permitiram configurar a comunidade dos historiadores brasileiros da educação 
e rearticular interesses de pesquisa na arena educacional” (p. 17). Isso pode ser 
evidenciado, segundo a autora, particularmente em três momentos: nos anos 
1970, quando integrou equipes e liderou processos de criação de Programas 
de Pós-Graduação em Educação em instituições de prestígio7; em meados da
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício \ 237
6 Devido a seu envolvimento com o tema Dermeval Saviani foi convidado a participar, em março de 
2010, da Conferência Nacional de Educação, cujo tema central era “a construção de um sistema 
nacional de educação”. Para a conferência o professor organizou e apresentou um texto que trouxe 
como título: Sistema Nacional de Educação articulado ao Plano Nacional de Educação, disponível 
no endereço: <http://www.scielo.br/>. Acesso em 10 novembro 2011.
7 Entre essas instituições estavam: PUC de São Paulo - Metodista de Piracicaba - Federal de 
São Paulo e Estadual de Campinas. Era exatamente o momento em que começavam a surgir os 
Programas de Pós-Graduação em Educação.década de 1980, partilhando de preocupações que começavam a atravessar 
a investigação em história da educação, quando manifestou vivo interesse pelo 
levantamento e catalogação de fontes documentais e propôs a organização de 
um grupo de pesquisa em âmbito nacional e, na segunda metade da década 
de 1990, quando se engajou intensamente no movimento que deu origem a 
Sociedade Brasileira de História da Educação - SBHE, ocupando o lugar de 
seu primeiro presidente.
Fato curioso é que a sistematização e o delineamento da pedagogia 
histórico-crítica começa a ganhar corpo quando Saviani estabelece vínculo 
com instituições educacionais fora do Brasil, especialmente depois do seu 
estágio de pesquisa em Paris (1977), em Roma (1978), de um intercâmbio 
acadêmico na Alemanha (1979) e de sua atuação como orientador de 
doutorado na PUC-SP. Foi a partir de 1979 que as formulações teóricas de Saviani 
começaram a apontar para uma diferenciação entre as concepções crítico- 
reprodutivistas e as concepções dialéticas, até então vistas como sinônimas. 
Parece que o visitar “lá fora”, permitiu-lhe aproximar-se de distintos modos 
de ver as mesmas questões, fato que pode lhe ter provocado a refletir mais 
profunda e criticamente sobre a problemática educacional brasileira e ter- 
lhe feito avançar na proposição de uma teoria alternativa às teorias crítico- 
reprodutivistas.
Assim, foi a partir de 1977, em virtude da insuficiência das teorias 
crítico-reprodutivistas em dar conta do caráter contraditório da educação, o 
que provocou uma estagnação na prática pedagógica, que Saviani propôs os 
fundamentos epistemo-filosóficos de uma teoria que possibilita a articulação 
da escola com os anseios populares de transformar a realidade: a pedagogia 
histórico-crítica.
3 A pedagogia histórico-crítica: contexto econômico e político e 
fundamentos filosóficos
Se, por um lado, o século XX e o início do XXI são marcados 
por profundos avanços científicos e tecnológicos, por outro, na mesma 
proporção, são marcados por grandes massacres e disputas, sendo o século 
XX considerado por muitos como o “Século Sangrento”, para usarmos a 
terminologia do historiador Eric Hobsbawm.
Foi nesse século que tivemos a segunda guerra mundial, o conflito que 
causou mais vítimas em toda a história. Esse foi o contexto em que Saviani 
nasceu, cresceu, constituiu-se como sujeito, educador, teórico da educação e
238 | Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
desenvolveu sua sensibilidade e identificação com os filhos da classe menos 
favorecida. Desde muito cedo ele optou por uma posição radical contra o 
sistema socioeconômico capitalista, que coloca milhões na marginalidade, 
situação que se expande com o grande impulso da globalização.
A depressão econômica de 1929, segundo analistas e estudiosos, 
(FURTADO, 1980; GALBRAITH, 2010; HOBSBAWM, 1995; LOMBARDI, 
J; SANFELICE, J; & SAVIANI, D, 2002) comprometeu a onda pacifista 
do Pós-Primeira Guerra que havia estimulado a indústria e a economia. 
Nesse contexto de crise e decadência do sistema de produção vigente, 
cresce o ecletismo de ideias, onde o socialismo ganha força e aparece 
como alternativa, sendo praticado em diversas nações, enquanto em outras, 
sistemas autoritários, como o fascismo e o nazismo, ascendem ao poder. No 
Brasil temos, então, a experiência do Estado Novo, sob o comando de Getúlio 
Vargas, que perdurou de 1937 a 1945.
Nesse cenário de disputas, marcadas principalmente por ideias 
liberais-capitalistas e ideias socialistas, explode a Segunda Guerra Mundial 
(1939-1945), que vai desencadear na divisão do mundo em dois grandes 
blocos: de um lado os Estados Unidos e de outro a URSS, no que ficou 
conhecido como “Guerra Fria”. Assim, “(...) o mundo se organizou sobre 
novas bases, destituindo a Europa da posição de eixo do poder mundial e 
elegendo Washington e Moscou como novos centros, o que reativou o 
confronto entre capitalismo e socialismo”. (VICENTINO, 1997, p. 391). 
É, em meio à disputa entre essas duas vertentes ideológicas e o reflexo das 
mesmas na vida cotidiana que se forma o jovem seminarista Saviani, que 
assiste a militância do pai e dos irmãos nos movimentos sindicais e participa 
ativamente dos movimentos estudantis, dedicando-se, com afinco, ao estudo 
das ideias progressistas, embora estivesse no contexto do seminário.
Após a Segunda Guerra Mundial se consolida a polarização do 
mundo, configurando, pois, a “era de ouro do capitalismo” e a americanização 
da sociedade, com a inculcação definitiva da ética da competição e do 
consumismo que vão moldar as relações sociais, desde então. Amplia-se, 
pois, a lógica da competitividade em detrimento da cooperação, uma vez 
que foram mal sucedidas as tentativas de organização das nações pela lógica 
da cooperação, advogada pelo socialismo. É justamente contra essa lógica 
excludente, de falsa democracia e igualdade, que a pedagogia histórico- 
crítica de Saviani insurge:
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício | 239
De fato, a sociedade capitalista, centrada nos mecanismos de mercado, 
se baseia na concorrência e tende, consequentemente, a exacerbar a 
competição. Em decorrência, a política educacional, sendo acionada 
pelo Estado que tem por principal função assegurar a manutenção dessa 
ordem social, é determinada de forma mais ou menos clara, direta ou 
indiretamente, pelas exigências de competitividade. (...) Poderíamos, 
pois, falar que existe disseminada na sociedade uma espécie de “ética da 
competitividade”. (...) se queremos que a educação pública se paute por 
uma ética da solidariedade, portanto, contraposta à orientação dominante, 
devemos nos posicionar numa perspectiva contra-hegemônica, isto é, de 
resistência e de crítica à ordem capitalista buscando pressionar o Estado 
para orientar a política educacional na direção da superação dessa ordem 
social. (SAVIANI, 2011a, p. 5).
Saviani, ao desejar uma educação pública pautada por uma ética da 
solidariedade, justifica e demarca o valor da sua teoria, como um posicionar- 
se numa perspectiva contra-hegemônica, de resistência e de crítica à ordem 
capitalista, oferecendo aos educadores ferramentas intelectuais e proposições 
práticas capazes de orientar um fazer na direção da superação dessa ordem. 
Contesta, dessa maneira, as teorias pedagógicas que marcaram a história 
da educação brasileira e oferece uma resposta às teorias histórico-críticas 
fatalistas. Mas de que modo a lógica capitalista de produção contribuiu 
para a fadiga e contestação de uma cultura pedagógica secular na educação 
brasileira?
No terreno pedagógico convivemos por mais de quatro séculos (1500 
a 1920) com uma educação organizada a partir dos legados da pedagogia 
tradicional confessional e/ou leiga, liberal clássica, para utilizarmos a 
cronologia e as terminologias de Saviani (2010), legado este que só passou 
a ser questionado a partir da década de 1920, com o manifesto dos pioneiros 
nos anos trinta e o impulso da pedagogia nova. A partir daí, o ecletismo que 
tanto marcou os séculos XX e XXI alcança também a educação.
A pedagogia nova desloca o foco, no âmbito educacional, do 
professor e do conhecimento/conteúdos para os métodos e o aluno e, dessa 
forma, confronta a pedagogia tradicional que privilegia o conteúdo, e, 
consequentemente, o ensino e o papel do professor. São duas perspectivas 
filosóficas que, segundo Saviani (idem) provocaram um intenso debate que 
perdurou ao longo de quase quarenta anos (1920 a 1969), do qual a pedagogia 
nova sai vitoriosa alcançando a hegemonia da classe dominante.
O movimento da escola nova tende a classificar, segundo Saviani 
(1987), o método tradicional como “pré-científico e dogmático”, articulando
240 I Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
o ensino como “processo” de desenvolvimento da ciência enquanto para o 
métodotradicional ele estaria articulado com o “produto” da ciência. Assim, 
o ensino, na escola nova seria considerado como “processo de pesquisa” e os 
assuntos de que trata seriam “problemas”, assuntos desconhecidos tanto pelos 
estudantes quanto por seus professores. A caracterização clarifica a distinção 
do ensino tradicional, já que, nesse, “(...) se impunha a tarefa de transmitir 
os conhecimentos obtidos (pela ciência) e, portanto, já compendiados, 
sistematizados e incorporados ao acervo cultural da humanidade”, (idem, p. 
30). Essa argumentação é contraposta por Saviani que, coerente com o seu 
ideário de democratização do ensino, defende o método tradicional, em sua 
especificidade de transmissão e difusão do conhecimento:
[...] para se conduzir uma multidão de homens a pensar coerentemente, é 
necessário difundir criticamente verdades já descobertas, é necessário, em 
suma, elevar as camadas populares do nível do senso comum à consciência 
filosófica. Isso significa, continua Saviani, “(...) passar do senso comum 
à consciência filosófica significa passar de uma concepção fragmentária, 
incoerente, desarticulada, implícita, degradada, mecânica, passiva e 
simplista e uma concepção unitária, coerente, articulada, explícita, original, 
intencional, ativa e cultivada, (id, ibd, p. 35).
Ao expressar essa sua concepção, que vem a ser o mote de sua 
pedagogia histórico-crítica Saviani não diferencia a educação básica do ensino 
superior. Para ele, também o ensino enquanto transmissão de conhecimentos 
é constituinte da função primordial nessa etapa de ensino, “(...) caso se queira 
decididamente colocar a universidade a serviço do desenvolvimento nacional 
e regional”, (1987, p. 34). Saviani reclama que, para o desenvolvimento 
nacional, seria necessário uma rigorosa revisão curricular da universidade de 
modo a formar não apenas o pesquisador militante, mas também o pesquisador 
com um bom domínio do conhecimento acumulado, na mesma medida com 
domínio das questões metodológicas relacionadas ao fazer científico, com 
foco na realidade concreta brasileira.
Ainda no aprofundamento dessa discussão Saviani traça um paralelo 
interessante e elucidador de sua ênfase na transmissão de conhecimentos 
mesmo no ensino superior:
Na forma reificada da relação da universidade e educação, a universidade 
manter-se-á alheia à educação popular; (...) já na sua forma humanizada, a 
educação ocupará lugar central no âmbito da universidade. A formulação 
da pergunta: como é produzida a educação?, se constituiria num vasto 
programa de tarefas que a universidade passaria a cumprir com toda a
Denise de Oliveira Alves, Miliane Nogueira Magalhães Benício | 241
seriedade, começando a desvendar o modo concreto pelo qual a educação se 
vincula à sociedade, (idem, p. 39).
Outras perspectivas que podem ser registradas nesse contexto são a 
penetração e a consolidação da pedagogia tecnicista na educação, desde a 
educação básica ao ensino superior a partir da década de 1970. Essa teoria 
pedagógica, segundo Saviani (2010) advoga o princípio da neutralidade 
científica e busca tomar o processo educativo objetivo e operacional, a 
exemplo do funcionamento do sistema fabril. Nessas condições, a orientação 
tecnicista no trabalho pedagógico se coaduna com as práticas tradicionais 
predominantes nas escolas bem como com a influência da escola nova, 
acabando por
“(...) contribuir para aumentar o caos no campo educativo, gerando tal 
nível de descontinuidade, de heterogeneidade e de fragmentação que 
praticamente inviabiliza o trabalho pedagógico”, (SAVIANI, 2010, p. 383- 
384).
Foi, pois, nesse cenário caracterizado por uma profunda descrença na 
possibilidade de se fazer uma revolução social pela revolução cultural, que 
as teorias crítico-reprodutivistas de Boudelot e Establet, a escola dualista 
de Bordieu e Passeron (Educação como violência simbólica) e de Althusser 
(Escola como Aparelho Ideológico do Estado) ganham corpo, representando 
uma possibilidade de confrontar o autoritarismo da pedagogia tecnicista e seu 
objetivo precípuo de manter a ordem social vigente, adequando a educação 
às exigências da sociedade industrial e tecnológica.
Ao dizer de Saviani, essas teorias Crítico-reprodutivistas “(...) 
alimentam reflexões e análises daqueles que em nosso país se colocavam 
na oposição à pedagogia oficial e à política educacional dominante” (2011b. 
p.58). Contudo, a elas escapava o caráter contraditório próprio dos processos 
históricos e, portanto, lhes faltava elementos para a formulação de uma 
proposta de intervenção prática.
Foi no livro Ação cultural para a liberdade, de Paulo Freire, que 
Saviani pôde enfim encontrar elementos de uma dialética do concreto, 
pois Freire explicita a luta de classes como Baudelot e Establet, Bourdieu 
e Passeron, e Althusser, mas põe em destaque a revolução, a ação cultural 
como um trabalho que precede a mudança da estrutura social, inspirado na 
experiência marxista maoísta. (SAVIANI, 2010). Esta era a ideia que faltava 
para que essa dialética do concreto fosse empregada na análise do contexto
242 | Desafios Contemporâneos: Qualidade Social e Conteúdo
educacional, tomando possível lançar luzes sobre o caráter contraditório, 
essência do ato educativo, tão bem apontado por Saviani na sua teoria 
histórico-crítica.
É nesse sentido que, ao buscar captar o movimento objetivo do 
processo histórico e levar às últimas consequências o conceito de contradição 
do materialismo histórico, Saviani preencheu uma lacuna no pensamento 
pedagógico brasileiro, possibilitando se pensar propostas práticas exequíveis.
4 Reflexões finais: implicações teórico-práticas que advêm da 
adoção do pensamento de Saviani
Ancorada no materialismo histórico de Marx, aos moldes maoista, a 
pedagogia histórico-crítica de Saviani entende o homem como um ser ativo, 
capaz de conhecer, produzir sua própria realidade e intervir na situação para 
aceitar, rejeitar ou transformá-la. Ao transformar a natureza, criando o mundo 
humano, o mundo da cultura, o mundo social, o homem produz a sua própria 
existência por meio do trabalho, ação adequada a uma intencionalidade.
Essa compreensão do homem nos remete à finalidade da educação, 
entendida aqui como uma forma de trabalho, já que por meio dela o homem 
transforma a natureza e a si mesmo; um trabalho não material, mas um 
processo de trabalho em si próprio. Assim, cabe à educação, na perspectiva da 
pedagogia histórico-crítica, promover o homem, tomá-lo capaz de conhecer 
os elementos de sua situação para intervir nela transformando-a no sentido 
de uma ampliação da liberdade, da comunicação e da colaboração entre os 
homens. É nesse sentido que a proposta da pedagogia histórico-crítica delineia 
quatro objetivos gerais para a educação: educar para a subsistência; educar 
para a libertação; educar para a comunicação e educar para a transformação. 
(SAVIANI, 2009).
Esses objetivos, a nosso ver, constituem o maior legado das ideias 
de Saviani, uma vez que dão visibilidade à dimensão de contra-hegemonia 
inerente ao seu pensamento. Deles podemos extrair fundamentos filosóficos 
e epistemológicos de grande fecundidade enquanto indutores de uma 
nova educação, assentada em princípios democráticos e superadora das 
desigualdades sociais.
Poderíamos dizer, sem sombra de dúvida, que a pedagogia histórico- 
crítica constitui um arsenal analítico que alimenta a formulação de políticas, 
o trabalho pedagógico e os novos e renovados estudos que encontram, em seu
Denise de Oliveira Alves , Miliane Nogueira Magalhães Benício | 243
pensamento, não só a denúncia das formas disfarçadas de discriminação, mas as 
diretrizes orientadoras de um novo projeto de escola e de sociedade.
O pensamento de Saviani tem sua relevância histórica renovada 
na atualidade, em cada passo que dá na direção do direito de todos a umaeducação de qualidade e promotora da superação da desigualdade social. Mas 
os espaços de construção continuam abertos, a depender da capacidade de 
mobilização de cada educador, de sua habilidade de construção, reconstrução 
e transgressão, uma espécie de travessia epistemológica contra toda a sorte 
de formalismos que acabam por legitimar dogmatismos que impedem a 
busca do novo, da imaginação, da criatividade e mantém a escola e seus 
professores, via de regra, como meros reprodutores da realidade social ou 
expectadores passivos da mesma.
Que as reflexões e inquietações aqui socializadas possam instigar 
mais e mais educadores a refletirem sobre a relevância epistemológica e o 
caráter emancipatório subjacente ao pensamento de Saviani.
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