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Eder Dantas Golpe Civil Militar e Ditadura na Paraíba

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Eder DantasPaulo Giovani Antonino NunesRodrigo Freire de Carvalho e Silva(Organizadores)
Golpe Civil-Militar 
e ditadura na paraíba: história, memória e construção da cidadania
editora da uFpb
João pessoa
2014
SuMÁrio
 apreSentaÇÃo .................................................................07 
 SeSSÃo 1: GOLPE	CIVIL-MILITAR	 E RESISTÊNCIA DEMOCRÁTICA
 1 pedro GondiM: UM GOVERNADOR ENTRE DEUS E O DIABO Monique Cittadino .........................................................................13 2 o antiCoMuniSMo no “A IMPRENSA”: IGREJA .............. 
	 	 CATóLICA	E	GOLPE	CIVIL-MILITAR	nA	PARAíbA ............... Dimitri Sobreira .............................................................................33 3 o partido CoMuniSta braSileiro na paraíba: LUTA DE MASSAS ENTRE A DEMOCRACIA E O AUTORITARISMO Rodrigo Freire de Carvalho e Silva .........................................62 4 Golpe Civil-Militar na paraíba: REPRESSãO E LEGITIMAÇãO Paulo Giovani Antonino Nunes ................................................78 5 priSÃo e deSapareCiMento de pedro ...................... 
 Fazendeiro CoM o Golpe Civil-Militar de 1964 Janicleide Martins de Morais Alves ..................................... 119 6 CaMpina Grande (1964-1968): UM ESTUDO SOBRE O MOVIMENTO UNIVERSITÁRIO CAMPINENSE Érica Lins Ramos ......................................................................... 140 7 MeMóriaS da ditadura Militar: O MOVIMENTO 
	 	 bRAsILEIRO	DE	ALFAbETIzAçãO	(MObRAL)	COMO ........ REFERênCIA	(1967-1985)	 Mª Elizete G.Carvalho, Mª das Graças da Cruz Barbosa e Luciana Martins Teixeira dos Santos .............................. 173
 8 a HiStória Contada pela MúSiCa 
 Ruy Leitão .........................................................................................202
 6 ConStruindo a iMportânCia polítiCa: ..................... MOVIMENTO ESTUDANTIL EM JOãO PESSOA
	 	 nO	COnTExTO	DA	REDEMOCRATIzAçãO	(1976-1979)		 Talita Hanna Cabral Nascimento .......................................... 242
 SeSSÃo 2 ACESSO à INFORMAÇãO, DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA 1 ditadura Militar na paraíba: DOCUMENTOS E MEMóRIAS Lúcia de Fátima Guerra Ferreira .......................................... 263 2 MeMória, deMoCraCia e aCeSSo a inForMaÇÃo .. Éder Dantas ................................................................................... 289 3 arquivo e deMoCraCia inForMaCional Josemar Henrique de Melo ..................................................... 308 4 oS 50 anoS do Golpe Civil Militar de 1964 
 e a eFetivaÇÃo doS direitoS HuManoS, .................. 
 eConôMiCoS, SoCiaiS, CulturaiS e aMbientaiS Alexandre Guedes ....................................................................... 316 5 a eduCaÇÃo para a Cidadania eM direitoS .......... 
 HuManoS CoMo inStruMento para uMa ................ 
 deMoCraCia partiCipativa Maria José Béchade .................................................................... 327
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apreSentaÇÃo
Em 2014, completam-se os cinquenta anos do Golpe Civil-Militar de 1964, que implantou uma ditadura de 21 anos no Brasil. No ano que “comemoramos” – no sentido etimológico da palavra, de “lembrar juntos” – esta data, muitos seminários acadêmicos serão realizados, além de eventos políticos de protestos e infeliz-mente até alguns de apoio. Também será lançada uma vasta biblio-
grafia	sobre	o	tema,	com	as	mais	variadas	abordagens	e	enfoques.Se muito já foi escrito, o avanço da pesquisa histórica, a atuação recente das Comissões da Verdade, a progressiva abertura de novos arquivos e as descobertas de documentos até então indisponíveis ao público, no Brasil e no exterior, vêm 
aprofundando	 a	 compreensão	 historiográfica	 e	 política	 sobre	 o	período. Mesmo assim, em se tratando do acesso à informação – principalmente de arquivos e documentos escritos, mas também de história oral –, muito ainda há que ser feito para se construir uma memória histórica sobre a ditadura instalada no Brasil de 1964 que seja adequada à sociedade democrática que estamos construindo. Desta forma, a pesquisa sobre a Ditadura Civil-Militar no Brasil ainda é um tema em aberto, sujeito a descobertas e inovações, e que está na ordem do dia do debate acadêmico e político.
Visando	 colaborar	 com	 a	 reflexão	 político-social	 sobre	 o	tema, necessária ao aprofundamento da democracia e das práticas de transparência e acesso a informação no âmbito de nosso município, a Secretaria Especial da Transparência Pública de João Pessoa, através da Coleção Transparência, publica esta coletânea. O lançamento da Coleção Transparência, já em seu terceiro número, cumpre o papel de oferecer um conjunto de documentos 
oficiais	e	publicações	referentes	às	políticas	públicas,	no	intuito	de	assegurar aos cidadãos e cidadãs o acompanhamento das ações do poder público e o debate democrático em torno de questões 
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fulcrais de nossa sociedade. O bom debate, com certeza, fortalece a esfera pública.Sobre o Golpe e a Ditadura no estado da Paraíba, a biblio-
grafia	ainda	é	escassa,	assim	como	também	documentos	referentes	à atuação de diferentes atores políticos e sociais no estado. Esta lacuna está sendo parcialmente preenchida com a criação da Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória, que através de Termos de Cooperação trouxe e segue trazendo uma série de documentos para o estado. Mais recentemente, foi criada a Comissão Municipal da Verdade de João Pessoa, cujos trabalhos ora se iniciam. Outras comissões relacionadas com o tema, seja no âmbito municipal, de autarquias, associações de classe ou sindicatos, serão sempre bem vindas. O presente livro – dentro do espírito da Coleção Trans-parência – pretende contribuir, juntamente com outros que serão 
lançados,	para	suprir	essa	escassez	bibliográfica	sobre	o	tema	na	Paraíba. Do ponto de vista acadêmico, representa uma agregação de trabalhos desenvolvidos por pesquisadores dedicados ao período, assumindo, assim, múltiplos enfoques. Mas é um livro que traz ainda o compromisso político de, nos termos do Plano Nacional de Direitos Humanos, contribuir com a construção da memória histórica sobre a Ditadura Civil-Militar na Paraíba. Acreditamos que, desta forma, estaremos contribuindo para fo-mentar o civismo democrático no país, de forma a evitar que períodos de arbítrio, como o retratado neste livro, nunca mais aconteçam.Os textos foram organizados em duas sessões: Golpe Civil-Militar e resistência democrática e; Acesso à informação, direitos humanos e cidadania.Na primeira parte, teremos textos sobre: o anticomunismo da Igreja Católica e o golpe (Dimitri Bichara); a dubiedade do Governo Pedro Gondin (Monique Cittadino); atuação do Partido Comunista Brasileiro na Paraíba (Rodrigo Freire); o golpe, a repressão e o apoio de setores da sociedade civil ao mesmo (Paulo 
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Giovani A. Nunes); trajetória, prisão e morte do líder camponês Pedro Inácio de Araújo (Janicleide Alves); atuação do movimente estudantil na cidade de Campina, entre os anos de 1964 e 1968 (Érica Lins); do movimento estudantil em João Pessoa, na época da distensão (Talita Hanna); o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, experiência educacional desenvolvida no Brasil no período da ditadura civil-militar (Maria Elizete G. Carvalho; Maria das Graças da C. Barbosa e Luciana M. T. dos Santos) e uma análise das mensagens das músicas de protesto compostas e cantadas durante a ditadura militar (Rui Leitão).Na segunda parte, teremos textos sobre: a discussão da importância do acesso a documentos e a informação e um diálogo com os documentos existentes na Delegacia de Ordem Política e Social – DOPS-PB e registros audiovisuais de depoimentos de militantes de esquerda na resistência à ditadura, gerados a partir do Projeto de Extensão da UFPB, “Compartilhando Memórias” (Lúcia Guerra); as políticas de acesso a Informação pública, arquivos públicos, memória e democracia no Brasilrecente e, 
especificamente	na	cidade	de	João	Pessoa	(Eder	Dantas);	a	relação	sobre política de direito a informação produzida pelo Estado e a 
democracia	(Josemar	Henrique	de	Melo);	a	reflexão	sobre	o	legado	do Golpe Civil-Militar para a efetivação dos direitos humanos 
(Alexandre	 Guedes);	 e	 finalmente	 a	 discussão	 sobre	 a	 educação	para os direitos humanos como um instrumento da construção da democracia participativa (Maria José Bechade). Eder DantasPaulo Giovani Antonino Nunes Rodrigo Freire de Carvalho e Silva
SeSSÃo 1GOLPE CIVIL-MILITAR E RESISTÊNCIA DEMOCRÁTICA
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pedro GondiM: UM GOVERNADOR ENTRE DEUS E O DIABO
Monique Cittadino1A discussão do regime militar na Paraíba não pode 
prescindir	 da	 análise	 da	 figura	 do	 governador	 Pedro	 Gondim	 e	do seu papel diante dos acontecimentos desencadeados com o golpe militar do ano de 1964. A bem da verdade, para tal tarefa, obrigatoriamente devemos recuar para o início da década de 60 e discutirmos a conjuntura da sua chegada ao governo paraibano, bem como faz-se mister entender a construção da sua trajetória na política paraibana. Pedro Moreno Gondim nasceu em Alagoa Nova, em 1º. 
de	 maio	 de	 1914,	 filho	 de	 um	 pequeno	 proprietário	 rural	 que,	
por	 força	 de	 circunstâncias	 financeiras,	 perde	 seu	 engenho	 e	 é	incorporado ao funcionalismo público federal (Gondim, 1978, p. 2-3). Gondim fez o curso primário em Alagoa Nova e o secundário em João Pessoa, onde morava com umas tias. Ingressou na Faculdade de Direito do Recife e, com pouco mais de 2 anos, inicia a prática advocatícia como rábula, atuando no brejo paraibano, sobretudo em Areia e Alagoa Nova, para, em 1938, concluir o curso. No momento da redemocratização de 1945 já era bastante conhecido na região, sendo assim convidado por Ruy Carneiro, líder do PSD (Partido Social Democrata), para disputar uma vaga na chapa de candidatos à Assembléia Legislativa Estadual, reelegendo-se em 1950 (Gondim, 1978, p. 12-18). Nesta ocasião, José Américo de Almeida, eleito governador do estado, convida-o 
1 Profa. do Depto. de História da UFPB, mestre em Ciências Sociais pela UFPB e doutora em História Econômica pela Universidade de São Paulo.
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
-14-
para assumir a Secretaria de Agricultura, Viação e Obras Públicas,2 pasta estratégica para o funcionamento da indústria da seca, onde permanece por apenas 7 meses, quando volta para a Assembléia e conclui seu segundo mandato. 
neste	momento,	 já	começam	a	se	definir	os	grupos	sociais	
que	configurarão	a	base	política	de	sustentação	do	gondinismo	-	a	classe média e o operariado – e o teor do seu discurso: 
Acho mesmo que a nossa palavra, os nossos protestos democráticos, a nossa forma de agir sensibilizavam mais a classe média e o proletariado [...] que precisa-vam mais de cobertura e exaltação democrática, im-primir [sic] uma consciência de cobertura e de exal-tação democrática, imprimir [sic] uma consciência de libertação de certos costumes, de certos condiciona-mentos, levantar um pouco a opinião pública contra a forma de mando, onde o operário, o homem de classe média só tem o direito de ouvir e não de dialogar, de responder (Gondim, 1978, p. 53).
A	 política	 populista	 que,	 na	 definição	 originária	 de	Francisco Weffort (Weffort, 1980, p.63), caracteriza-se não apenas pela perspectiva da existência de um componente manipulador exercido pelas classes dominantes sobre as classes populares, 
nem	 pela	 sua	 configuração	 como	 um	 mero	 instrumento	 através	do qual aquelas classes exercem seu domínio sobre estas, mas sim como um modo de expressão das demandas populares e da incorporação de tais grupos aos jogos políticos convencionais, dos 
2 A respeito do assistencialismo e do funcionamento da indústria da seca no governo José Américo, vide BARBOSA, Jivago Correa. Política e assistencialismo na Paraíba: O governo de José Américo de Almeida (1951-1956). João Pessoa, Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal da Paraíba, 2010.
Sessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
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quais	até	então	eram	excluídos,	 fica	nitidamente	contemplada	na	fala de Gondim:
E	ficava	o	povo	de	cada	município	obrigado	a	só	ouvir,	sentir e saber o pensamento e o querer de cada che-fe local, sem haver um intercâmbio. Nós também pre-gávamos a necessidade deste porejamento, desta cir-culação, fazendo com que a palavra, o pensamento, a mensagem, o comportamento, a crítica pudessem ser não o patrimônio de alguns, só restrito ao meio uni-versitário, ou às grandes cidades, mas que todas estas populações viessem, aos poucos, se integrando nesta forma de ser, de dizer, de criticar, de decidir, de partici-par pelo bom voto (Gondim, 1978, p. 55).O fato é que o espaço de atuação política criado após a re-democratização de 1945 foi, para as classes populares paraibanas, muito estreito, para não dizer, inexistente. Diante da adversidade da conjuntura econômico-social paraibana, que excluía as classes trabalhadoras do mercado de trabalho e obrigava-as a uma sujei-ção absoluta frente ao bloco agro-industrial, as possibilidades de sua organização e de sua incorporação aos quadros da política partidária convencional mostravam-se extremamente limitadas. Em contrapartida, se afastadas da participação política via pro-cesso partidário, restava ainda, naquele momento, um outro espa-ço possível de atuação para as classes trabalhadoras, qual seja, a política populista. A emergência de uma política populista em um estado eminentemente agrário como a Paraíba, onde as atividades industriais eram extremamente incipientes, é, aparentemente, um paradoxo.3 Entretanto, analisando-se os dados relativos ao aumen-to da população urbana entre 1940 e 1960, percebe-se que o de-
3 A respeito da evolução conceitual do termo populismo, sua caracterização, bem como a crítica 
feita	pela	historiografia	 a	 este	 conceito,	 vide	FERREIRA,	 Jorge	 (Org.).	O	populismo	e	 sua	história.	Debate e crítica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
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senvolvimento do populismo na Paraíba não foi um fenômeno ex-cepcional. O que foi excepcional é que o populismo na Paraíba não foi movido, como nos estados do centro-sul, pelo avanço do pro-cesso de industrialização que atraía uma ampla massa de traba-lhadores para os centros urbanos. Aqui, onde a participação da po-pulação trabalhadora em atividades industriais ao longo dos anos 40-60 praticamente não sofre alterações, o populismo só pode ser entendido a partir das transformações processadas no campo que impulsionaram o êxodo rural levando, desta forma, à constituição de núcleos urbanos periféricos e marginalizados. Assim sendo, o desenvolvimento das massas urbanas e, consequentemente, a possibilidade de surgimento de uma política populista no estado 
deu-se,	portanto,	em	função	das	transformações	verificadas	na	es-trutura social do campo que acompanharam o processo de moder-nização do espaço agrário e não em torno de um crescimento do nível de industrialização do estado. Em 1955, por ocasião das eleições para o governo do estado, as principais lideranças políticas paraibanas, congregadas no PSD e na UDN (União Democrática Nacional) promovem a 
chamada	 “pacificação”,	 com	 a	 apresentação	 de	 uma	 chapa	 única	formada por um integrante de cada partido. Assim, no momento em que conclui seu segundo mandato como deputado estadual, Pedro Gondim foi indicado pelo PSD para a vice-governança, 
enquanto	 que	 a	 cabeça	 da	 chapa	 ficou	 nas	 mãos	 da	 UDn,	 na	pessoa de Flávio Ribeiro Coutinho, tradicional proprietário rural da zona do Várzea do Paraíba, de idade já avançada e saúde deteriorada. Desta forma, em janeiro de 1958, em consequência do impedimento do governador Flávio Ribeiro de permanecer à frente do cargo por motivo de agravamento do seu estado de 
saúde,	 Gondim	 assume	 a	 chefia	 estadual,	 aí	 mantendo-se	 até	
março	de	1960,	momento	em	que	deixa	o	governo	a	fim	de	não	seSessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
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ver impedido de candidatar-se ao mesmo cargo nas eleições que ocorreriam em outubro daquele ano.4Ao deixar o governo, Gondim deixa também o PSD. O fato é 
que	a	chefia	partidária,	então	exercida	pelo	senador	Ruy	Carneiro,	tinha como candidato ao governo seu próprio irmão, o deputado Janduhy Carneiro, o que não abrigava, portanto, as aspirações gondinistas. Em consequência destas posições inconciliáveis, 
o	 partido	 decide	 pela	 expulsão	 de	 Gondim	 de	 suas	 fileiras,	 ao	
que	 o	 ex-governador	 responde	 com	 a	 célebre	 frase	 “prefiro	 ser	expulso por rebeldia a ser condecorado por subserviência”, que se transformará em um dos principais slogans de sua campanha.Incorporado ao discurso de campanha do candida-to Pedro Gondim, a ideia de ruptura era explorada de forma ostensiva, sempre associada a representação de coragem e resistência. As “célebres” palavras pro-feridas no telegrama enviado por Gondim ao partido, em resposta a sua “expulsão”, transformam-se em um slogan de efeito para sua candidatura. Efeito principal-mente no que diz respeito ao simbolismo que desen-cadeia, visto que a contestação aos abusos e aos des-mandos produz a evocação de valores pertencentes a sociedade e já cristalizados em seus códigos morais e 
culturais.	A	frase	de	Gondim:	“Prefiro	ser	expulso	por	rebeldia a ser condecorado por subserviência”, convi-dava todos os paraibanos a posicionarem-se contra o PSD, contra Janduhy e Ruy, e, rebeldemente, demons-
4 Os fatos ocorridos na política paraibana entre 1955 e 1958 podem ser vistos em RIBEIRO 
COUTInHO,	 Marcos	 Odilon.	 Poder,	 alegria	 dos	 homens.	 João	 Pessoa:	 Gráfica	 A	 Imprensa,	 1965;	GONDIM, Pedro Moreno. Pedro Gondim (depoimento; 1978). Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas: CPDOC, 1989; SYLVESTRE, Josué. Nacionalismo e coronelismo. Fatos e personagens da 
história	de	Campina	Grande	e	da	Paraíba	(1930-1945).	brasília:	senado	Federal-Centro	Gráfico,	1982;	ZENAIDE, Hélio. “Pedro Gondim: ascensão e declínio de uma liderança popular”. IN SILVA, Pontes da; MELLO, José Octávio de Arruda; SANTOS, Walter (Orgs.) Poder e política na Paraíba. Uma análise das lideranças. 1960-1990. João Pessoa: API/A União, 1993, pp. 131-164; CITTADINO, Monique. Populismo e golpe de estado na Paraíba (1945-1964). João Pessoa: UFPB/Idéia, 1998.
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
-18-
trarem sua força e altivez no pleito de outubro (Araú-jo, 2009, p. 36).
Vitorioso	 nas	 eleições	 que	 se	 configuraram	 em	 um	 dos	pleitos mais disputados e agitados da história republicana paraibana, é num momento de extrema crise política e de grande agitação popular que se inicia o segundo governo Pedro Gondim. A mobilização popular, crescente ao longo dos anos 
50,	 radicalizou-se	 a	 partir	 do	 final	 da	 década,	 quando	 as	 forças	populares na Paraíba se aproveitaram dos espaços da política populista para mobilizar-se em função de seus reais interesses. Indiscutivelmente, coube ao movimento camponês a vanguarda neste processo, que teve como marco inicial a organização dos primeiros núcleos das Ligas Camponesas no estado.5 Em 1958, após o fracasso da tentativa ocorrida em 1954, criou-se, na cidade de Sapé, a Associação dos Trabalhadores e Lavradores Agrícolas da Paraíba, conhecida como Liga Camponesa de Sapé, que passou a ser um foco irradiador do movimento camponês na Paraíba. De Sapé, as Ligas irradiaram-se pela região do Agreste, atingindo o Litoral e perfazendo um total de 15 entidades com cerca de quarenta mil sócios. A Liga de Sapé foi a mais poderosa do Brasil, chegando a perfazer um total de 13.000 membros, seguida pela de Mamanguape, com 10.000. 
A respeito da mobilização popular urbana, observa-se, desde o 
final dos anos 50, uma articulação envolvendo grupos políticos como 
a Seção Paraibana do Movimento Nacionalista Brasileiro, criada em 
1957; associações estudantis secundaristas e universitárias, a exemplo 
da União dos Estudantes da Paraíba (UEEP) e da Associação dos 
Estudantes Secundaristas da Paraíba (AESP); trabalhadores urbanos 
5 Para a análise sobre as Ligas Camponesas na Paraíba, nos centramos nos trabalhos de AUED, Bernadete W. a vitória dos vencidos. Partido Comunista Brasileiro e Ligas Camponesas (1955-64). Campina Grande: Dissertação de Mestrado, 1981 e BENEVIDES, Cezar. Camponeses em marcha. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
Sessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
-19-
que, aproveitando-se do clima geral de mobilização social e política, 
avançaram em sua organização classista, chegando a levar até o 
interior do estado o processo de sindicalização, com a transformação 
em sindicatos de diversas associações profissionais existentes; e 
integrantes da sociedade civil paraibana a exemplo da Associação 
Paraibana de Imprensa (API). Grupos distintos, mas que tinham como 
núcleo articulador as bandeiras do movimento camponês. Contando, portanto, com a participação de estudantes, intelectuais e jornalistas, de operários e líderes sindicais urbanos, 
de	 profissionais	 liberais	 e	 políticos	 de	 esquerda,	 vinculados	 às	teses nacionalistas e reformistas, o movimento camponês selará, no estado, a aliança política popular, congregadora de todas as forças progressistas do estado. E o ano de 1962, em grande parte sofrendo as repercussões e os desdobramentos da morte de João Pedro Teixeira6, uma das principais lideranças das Ligas Camponesas, marcará o clímax da mobilização e tensão social na Paraíba, inserindo o estado no contexto de efervescência nacional dos primeiros anos da década de 60.
Portanto, nessa conjuntura local de grande agitação popular, 
rural e urbana, observamos que durante a fase inicial (1961-1963) 
do governo (que se estende de 1961 até janeiro de 1966), Gondim 
permanece fiel aos princípios populistas através dos quais foi eleito 
chegando, inclusive, a permitir o avanço desse populismo em direção 
ao meio rural paraibano. Podemos dizer que o marco inicial deste 
processo se dá em 1962, ano extremamente agitado na Paraíba, e que 
ficou marcado pela ocorrência de numerosas mobilizações sociais, 
sobretudo as evidenciadas no campo. Diante desse crescendo da 
mobilização camponesa, Gondim manteve uma posição de tolerância 
e compreensão e seus pronunciamentos a respeito da questão agrária 
6 A respeito do episódio do assassinato de João Pedro Teixeira, ocorrido no município de Sapé, por ordem de latifundiários da região, e das consequências para os integrantes de sua família, vide o documentário “Cabra marcado para morrer”, do cineasta Eduardo Coutinho, de 1985.
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
-20-
no Nordeste revelam claramente um aspecto de identificação com 
as reivindicações dos trabalhadores rurais, por ele consideradas 
legítimas, e de condenação da estrutura agrária então vigente. 
Isto pode ser percebido pela leitura do trabalho sobre a economia 
paraibana, apresentado pelo governador no ciclo de estudos do INES 
(Instituto Nacional de Estudos Superiores), realizado em janeiro 
de 1962, oportunidade em que condenou o latifúndio no Nordeste: 
“O atual regime da terra é um convite à agricultura extensiva, à 
baixa produtividade, à ação predatória do homem e, pior do que 
tudo, às relações de trabalho tipicamente feudais, semi-escravistas e 
desumanas”.Pedro Gondim, ainda neste trabalho, apresenta dados sobre o crescimento da concentração fundiária no estado, sobre as péssimas condições de vida e de trabalho dos trabalhadores rurais e conclui mostrando as conseqüências disso em termos de organização das Ligas Camponesas:
Na Paraíba, mais de 14 mil lavradores e trabalhadores rurais já buscaram a incipiente organização das ligas camponesas como forma associativa de condução da defesa de seus interesses. E essas sociedades civis não se transformaram em faces de agitação subversi-va porque a política do Governo tem sido, até agora, 
a	de	admiti-las	dentro	de	uma	filosofia	realista	nasli-mitações permitidas pelo grau de maturidade social e política, como grupos de pressão democraticamente formados.Na verdade não se poderá cuidar dos agudos proble-mas do Nordeste sem tratar primeiro de incorporar à força do trabalho de uma legião desventurada de fa-mintos, retirados de qualquer participação na vida da comunidade brasileira. Não devemos deixar que eles permaneçam nessa remota idade político-econômica 
Sessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
-21-
quando, no Brasil, São Paulo já vive, felizmente, todo o fulgor do século industrial moderno. (a união. João Pessoa, 28 de janeiro de 1962, p.8).
Este	 pronunciamento	 reflete	 bem	 a	 concepção	 do	governador acerca das Ligas Camponesas: um instrumento legítimo para a organização classista dos trabalhadores rurais. 
Em	março	de	1962,	após	o	conflito	registrado	no	Engenho	Miriri	(Mamanguape), envolvendo camponeses e vigias da propriedade e que resultou em três mortos e vários feridos, sendo dois dos mortos vigias dos proprietários (Mello, 1976), Gondim em uma 
entrevista	a	um	programa	de	televisão,	afirmou	que	considerava	as	Ligas Camponesas um fenômeno natural decorrente de uma luta entre o legal e o justo: “...o legal ao lado dos proprietários de terras amparados pela lei; o justo no que reivindicam os camponeses. Resta o Congresso dar o legal ao justo”. (a união. João Pessoa, 23 de março de 1962, p.3). 
Esta mesma concepção está presente em uma entrevista dada 
ao jornal A Gazeta de São Paulo em dezembro de 1963:
Em princípios, não temos porque vislumbrar em qual-quer movimento, amplo e sistemático de organização de classe, objetivo ou prenúncios revolucionários. Deve representar, antes, consciência de posição e pro-cesso de autodefesa [...]A discriminação para excluir ou cercear, nos operários rurais ou camponeses, o direito de representação, ar-regimentação e defesa classista, não teria sentido legal 
nem	explicação	humana.	Obrigá-los	a	 ficar	parados	e	
mudos,	 desassistidos	 e	 aflitos,	 meros	 portadores	 de	direitos naturais ou potenciais, como elementos de observação e de estudos de terceiros, no aguardo de que um dia as demais classes, prévia e integralmente 
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
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atendidas, deles se lembrem, por eles falem e para eles legislem, seria exigir ou mesmo subestimar demais, sabido, sobretudo, que nenhuma assim se comportou, nesse estado contemplativo, quase sobrenatural de ex-
pectativas	e	de	confiança	(Gondim,	1964,	p.	211-212).Assim sendo, a atitude inicial de Gondim frente à ocorrência 
dos	 primeiros	 conflitos	 mais	 sérios	 envolvendo	 camponeses	 e	proprietários pautava-se na concepção de legitimidade das Ligas e, neste sentido, caracterizava-se pela rejeição ao uso da repressão e da violência contra o movimento.Essa postura de Gondim também é expressa pelo jornal A União, cujo editorial do dia 24 de fevereiro de 1962, intitulado “O Governo e o Problema Agrário”, reproduz a resposta dada por Gondim aos representantes das classes patronais, no início de sua gestão à frente do Governo. Segundo o editorial, Gondim disse que:
o problema da mobilização camponesa excluía-se das atribuições policiais, representando efetivamente, um estado de tensão social, cuja solução, que não pode ser da alçada repressiva da polícia, mas de medidas mais radicais que venham reformar em termos sociais o in-quietante problema. (A União. João Pessoa, 24 de feve-reiro de 1962, p.1).Nesse mesmo editorial, o jornal enfatiza que, por iniciativa de Francisco Julião, a Assembléia Legislativa de Pernambuco deu um voto de aplauso a Gondim pela isenção policial em relação às Ligas e à ocorrência de um movimento de ocupação de terras devolutas do Estado pelos camponeses e, “...compreendeu democraticamente como uma simples conseqüência de um problema social de raízes profundas, cujo tratamento jamais 
Sessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
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deverá ser tentado pela repressão miliciana”. (A União. João Pessoa, 24 de fevereiro de 1962, p.3).
Os sucessivos editoriais de A União, ao longo do ano de 1962, 
expondo a linha de análise do jornal não deixam margens a dúvidas 
sobre a tendência do governo.
O Equilíbrio da Miséria:[...] Ninguém pode cogitar do desenvolvimento eco-nômico do Nordeste, da valorização efetiva de seu po-tencial humano, da implantação de novas e melhores condições de vida, sem a coragem de proclamar que, antes de tudo, estamos precisando de um plano auda-
cioso	capaz	de	modificar	a	estrutura	da	situação,	com	vistas à construção de uma ordem inteiramente nova. A questão não é só de reparos. Só um balanço geral da situação, a aceitação entusiástica de uma concepção mais avançada de problemas sociais, poderão dar ao Nordeste um processo humano e democrático de cres-cimento econômico, conjugando novas forças ao invés de associal [SIC] debilidades que acabaram instituindo um verdadeiro sistema equilibrado e autônomo de misérias. (A União. João Pessoa, 13 de janeiro de 1962, p.3). 
Há Governo na Paraíba:[...] O homem do campo tem tanto direito a lutar por melhores condições de vida, para si e para sua famí-lia, quanto os operários e trabalhadores urbanos, já amparados pelas leis trabalhistas e pela Previdência Social. A luta é, portanto, legítima e legal. Ninguém lhe pode negar o direito sagrado de reunião, de associa-
ção,	de	sindicalização,	de	unificação	de	classe,	para	a	
reivindicação	e	conquista	dos	benefícios	coletivos	e	do	
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
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amparo social, que lhe garantam melhores condições de existência. Reforma social, reforma agrária, direito de sobrevivência e de subsistência, luta reivindicató-ria por melhores condições de vida, não se combatem com espancamentos, com violências, com chacinas, com o derramamento de sangue de irmãos, numa fa-bricação inconsequente e macabra de vítimas e de mártires. (A União. João Pessoa, 13 de setembro de 1962, p.3). Vinculado, portanto, a essa postura de rejeição ao uso da violência contra as manifestações dos camponeses, o Governo 
procura	adotar	a	difícil	posição	de	relativa	imparcialidade	na	qual	
a	resolução	dos	conflitos	se	desse	através	de	medidas	judiciárias,	ou seja, pelo respeito às leis. Por exemplo, em conseqüência das 
repercussões	 do	 conflito	 registrado	 entre	 camponeses	 e	 vigias	do Engenho Miriri e das acusações lançadas pelos proprietários rurais de omissão por parte do governo, o secretário Sílvio Porto é obrigado a ir à Assembléia Legislativa prestar declarações sobre a 
posição	do	governo.	Lá	ele	reafirmou	que:	
o poder público, na Paraíba, especialmente o setor da Segurança Pública, não se tem distanciado, nem se omitido, nas alterações e lutas desencadeadas entre as Ligas Camponesas e os Proprietários Rurais.[...]As questões da terra, como estão se processando em todo o nordeste e em vários estados do sul, estão afe-tas ao Poder Judiciário, escapando à alçada policial [...]Não serão, portanto, medidas policiais e de força que possam resolver os ingentes problemas dos campone-ses sem terra e dos proprietários rurais [...]A ação do Governo deve merecer os aplausos de todos os paraibanos, pois a nossa polícia não está fuzilando, nem desrespeitando o direito dos cidadãos, mas colo-
Sessão 1: Golpe Civil-Militar e Resistência Democrática
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cada numa posição de equidistância, para garantia e manutenção da ordem e da legalidade. (A União. João Pessoa, 20 de março de 1962, p. 3 e 7).
Na verdade, a posição do Governador, não muito demarcada e 
definida, em uma tentativa de manter-se como árbitro entre as classes 
litigantes, como ele mesmo define (Gondim, 1978, pp. 144 e 171), 
deve ser analisada tendo-se em vista a composição populista que 
o elegeu, assim como a sua disposição em governar no centro dessa 
política populista. Gondim, ao sair do PSD, lança-se candidato pelo 
PSB (Partido Socialista Brasileiro), ingressando posteriormente no 
PDC (Partido Democrata Cristão). Contudo, foi feitauma composição 
com a UDN, partido de feições nitidamente conservadoras e que 
naquele momento não tinha condições de lançar um candidato próprio 
capaz de derrotar o esquema pessedista e que apela para a aliança 
com o populista Gondim a fim de chegar ao poder. Assim, a UDN 
indicou o nome do vice-governador, André de Paiva Gadelha, grande 
proprietário do sertão paraibano, bem como contribuiu com toda 
sua força junto aos currais eleitorais do interior do estado. E como 
Gondim não dispunha de uma máquina partidária capaz de assegurar 
sua vitória aceita o apoio udenista. Entretanto, mesmo contando 
com o apoio partidário da UDN, ele não poderia prescindir do apoio 
das forças populares e de esquerda, que se tornaram a base de sua 
campanha e que irão desempenhar um significativo papel ao longo da 
fase inicial de seu governo. Usando uma expressão popular que reflete 
a ambigüidade da posição populista de Pedro Gondim, Joacil de Brito 
Pereira assim caracteriza o governador: “Ele acendia uma vela a Deus 
e outra ao Diabo.”7 
7 Depoimento de Joacil de Brito Pereira à autora, em 05 de janeiro de 1995. Uma expressão 
similar	também	foi	usada	pelo	ex-governador	Clóvis	bezerra	para	definir	a	posição	de	Gondim,	em	depoimento à autora em 3 de fevereiro de 1995. 
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O fato é que Gondim exerce seu governo encurralado entre a crescente pressão dos trabalhadores rurais e das forças de esquerda e os compromissos com os grupos agrários tradicionais do estado, o que fazia com que a margem de conciliação de Gondim fosse extremamente reduzida. A impossibilidade de 
atingir	 este	 difícil	 ponto	 de	 equilíbrio	 reflete-se	 nas	 respostas	dadas pelos seus interlocutores (tanto os grupos de esquerda quanto os latifundiários) que ora o aplaudem e ora o criticam. As forças políticas vinculadas às esquerdas, em diversas vezes expressaram-se reconhecendo a posição do Governador do Estado frente às suas propostas: a Federação das Ligas Camponesas, a API e o PSB aplaudem Pedro Gondim por ele ter enviado a Jango e Tancredo mensagem de que se realizassem, com urgência necessária, esforços no sentido da adoção das reformas de base (A União. João Pessoa, 28 de abril de 1962, p.1); os trabalhadores de Brasília enviaram mensagens de aplauso a Pedro Gondim pela sua posição em relação ao problema camponês na Paraíba (A União. João Pessoa, 12 de junho de 1962, p. 8); a Liga Camponesa do Cruzeiro em Campina Grande comunicou estar satisfeita com o pronunciamento corajoso de Jango e com o discurso sincero de Gondim por ocasião da visita do Presidente à Paraíba (A União. João Pessoa, 3 de agosto de 1962, p.7) e, 
em	 comício	 no	 ponto	 de	 Cem	 Réis,	 já	 no	 final	 de	 63,	 líderes	 do	movimento operário-camponês-estudantil na Paraíba, exaltaram a posição do governador por ter-se recusado de transformar a polícia em instrumento de opressão contra o direito da livre manifestação dos trabalhadores no campo. Nesse comício, todos os oradores repudiaram os ataques que ele vinha recebendo na Assembléia. (A União. João Pessoa, 21 de dezembro de 1963, p.3). Entretanto, em diversas outras ocasiões, estas mesmas forças tecem severas críticas, acusando Gondim de cumplicidade com os grandes proprietários ao deixar que os seus grupos 
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de capangas agissem livremente. Por exemplo, por ocasião do espancamento de Assis Lemos e Pedro Fazendeiro, em 11 de setembro de 1962, em Itabaiana, por membros da família Veloso 
borges,	 José	 Joffily	 acusa	 Gondim:	 “Admite-se	 tolerância	 com	inépcia administrativa, porém jamais com a violência perpetrada com a complacência ou cumplicidade da suprema autoridade do estado”. (A União. João Pessoa, 23 de setembro de 1962, p.8). Por outro lado, os grandes proprietários criticavam o governo por não estar policiando devidamente as áreas em 
conflito,	 permitindo	 que	 ocorressem	 movimentos	 armados	 dos	camponeses. Segundo Hélio Zenaide, diversos representantes da UDN, insatisfeitos com as declarações e os direcionamentos de Gondim em relação ao problema agrário, procuraram afastar-se do governador, isolando-o politicamente.8 Na Assembléia Legislativa Estadual, registravam-se queixas contra a posição de Gondim:
Alguns deputados mais exaltados estendiam as suas críticas às autoridades federais e estaduais responsa-bilizadas pelo apoio que vinham dando às ligas, con-sideradas por muitos como instrumento de agitação social, em permanente pregação esquerdista, com sé-rios perigos para as instituições democráticas (Mariz, 1987, p. 146).Se a posição de equidistância tentada por Gondim ao 
longo	 dos	 anos	 61-63	 demonstrou	 ser	 de	 difícil	 concretização,	
com	os	acontecimentos	verificados	entre	o	 final	de	1963	e	 início	
de	 1964,	 tal	 situação	 inviabilizou-se	 por	 completo.	 Os	 conflitos	sociais, após terem permanecido latentes durante o ano de 1963, voltaram à cena com redobrada força, dando uma idéia dos níveis da tensão sócio-política presente no estado às vésperas da eclosão 
8 Entrevista de Hélio Zenaide à autora, em 23 de maio de 1994. 
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do	golpe.	Foram	conflitos	que	se	iniciaram	em	novembro	de	1963,	com uma manifestação envolvendo estudantes secundaristas e universitários que reivindicavam o respeito ao abatimento nas passagens de ônibus, mas que, com a repressão policial que se abateu, resultou num sério embate com o governo estadual. Em seguida, nos primeiros dias de 1964, registrou-se um sangrento 
conflito	 envolvendo	 camponeses	 e	 proprietários	 na	 região	 do	
brejo,	 num	 episódio	 que	 ficou	 conhecido	 como	 a	 “Tragédia	de Mari” e que teve como desfecho a morte de 11 pessoas e a 
presença	 de	 diversos	 feridos.	 Logo	 após,	 um	 novo	 conflito	 em	torno da notícia da visita do governador da Guanabara, Carlos Lacerda, envolvendo estudantes e grupos de esquerda e membros das classes conservadoras, tomou lugar na Praça João Pessoa e na Faculdade de Direito, o que exigiu a intervenção tanto do Exército quanto da Polícia Militar. Estes três episódios são emblemáticos da transformação que já vinha se processando no relacionamento entre o Governo e as forças de esquerda e que se consolida a partir dessas ocorrências: eles funcionam como um marco decisivo do esgotamento do populismo gondinista, o que se consubstancia no afastamento de Gondim das forças populares e de esquerda do estado e no seu aprisionamento absoluto às classes conservadoras. Diante desse quadro de radicalização social, marcado pelo crescimento das manifestações de insatisfação popular e pela feroz intolerância dos grupos conservadores e, considerando-se a fragilidade genética do seu partido, o PDC, incapaz de propiciar-lhe sustentação e apoio nesse momento 
de	 (in)definições,	 Pedro	 Gondim	 percebe	 a	 impossibilidade	 da	manutenção de um esquema político próprio, que o permitisse manter-se independente e soberano em relação à pressão das classes sociais e faz, intuitivamente, uma opção que talvez fosse a única capaz de garantir a sua sobrevivência política e, quiçá, sua 
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segurança	 física,	 (não	 podemos	 esquecer	 que	 governadores	 no	campo da esquerda, a exemplo dos nordestinos Seixas Dória e Miguel Arraes foram não só destituídos do governo, como também 
presos):	 rompe	 definitivamente	 com	 as	 forças	 de	 esquerda,	isolando-se daquela que foi, durante algum tempo, a base de apoio capaz de garantir-lhe sua autonomia política, independência sua posição de líder emergente, conquistada nas eleições de 1960 e vê-se jogado em uma situação de profunda fragilidade política, na qual a única perspectiva vislumbrada é a acentuação e o aprofundamento de suas ligações com a UDN e a submissão às pressões exercidas pelas classes proprietárias, tornando-se um refém dos seus interesses. Percebe-se tal movimento já com as medidas tomadas pelo governador em consequênciado episódio em Mari, quando Gondim desencadeia um forte esquema repressivo aos camponeses, com o envio de tropas da Polícia Militar, sob o comando do coronel Luiz de Barros para a região entre Sapé e Mari, o que terá como resultado o completo aniquilamento das Ligas Camponesas na Paraíba. Ainda, o governo impede a realização de outras manifestações contestatórias que estavam sendo anunciadas para João Pessoa e outras cidades e reprime de forma exemplar os manifestantes envolvidos com o episódio da Faculdade de Direito. Finalmente, impõe uma radical mudança no aparelho repressor do estado, com a nomeação de 
oficiais	 nitidamente	 anticomunistas	 para	 os	 principais	 órgãos	de segurança do estado. Tais medidas são claros indicativos do novo direcionamento político adotado pelo governo, voltado agora para as forças sociais mais conservadoras. Muito mais do que apenas o reforço da vinculação com as classes conservadoras, o que se percebe a partir desse posicionamento de Gondim é o estabelecimento, anteriormente ao 31 de março, de uma franca sintonia do Governo do Estado com os interesses 
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e com o pensamento das Forças Armadas em consequência dos acontecimentos dos primeiros meses do ano.
Essa sintonia do governo da Paraíba com o ideário mi-litar vitorioso em 64 torna-se cristalina com a leitura da declaração dada pelo Cel. Bandeira, do serviço se-creto do IV Exército sobre a situação da Paraíba:A Paraíba, com a sua região canavieira altamente in-
filtrada,	 vinha	 causando	 preocupação	 até	 o	 princípio	deste ano. Contudo, com o incidente de Mari houve uma mudança. O Governo do Estado teve de agir e, empregando a valorosa Polícia Militar, sob o comando 
do	Coronel	Luiz	de	barros,	foi	o	suficiente	para	resta-belecer a ordem no Estado. De forma que a 31 de mar-
ço,	 a	Paraíba	era	um	estado	pacífico.	não	havia	mais	problema. (Correio da Paraíba. João Pessoa, 2 de julho de 1964, p. 1).Com a eclosão do golpe militar, Pedro Gondim continua à frente do governo concluindo seu mandato em janeiro de 1966, quando transfere o cargo para seu sucessor, João Agripino, da UDN, eleito com seu apoio. Contudo, se a guinada em direção às forças conservadoras da política local e nacional garantiram a 
sobrevivência	política	e	a	integridade	física	do	governador	no	ano	de 1964 e ao longo dos anos imediatamente seguintes, quando chegou a ser eleito deputado federal pela UDN, em 1966. Já em 
1968,	 com	a	 radicalização	do	perfil	 repressivo	do	 regime	militar,	ele cairá nas malhas do AI-5 (Ato Institucional Nº 5), perdendo seu mandato e tornando-se o único governador paraibano a ser cassado pelo regime militar.
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REFERÊNCIASARAÚJO, Railane Martins de. o governo pedro Gondim e o teatro 
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o antiCoMuniSMo no “A IMPRENSA”: IGREJA CATóLICA E 
GOLPE	CIVIL-MILITAR	nA	PARAíbA	
Dimitri da Silva Bichara Sobreira1
1 INTRODUÇãOEste texto é fruto do Trabalho Acadêmico de Conclusão de Curso (TACC) de mesmo título que discute o posicionamento da Igreja Católica contra a ideologia comunista, que ganhava espaço no Brasil na década de 1960, através das publicações do jornal A Imprensa, de responsabilidade da Cúria Metropolitana da cidade de João Pessoa. Desta forma entendemos o anticomunismo como uma cultura política, conceito que, segundo Rodrigo Patto Sá Motta (2009), seria:
Conjunto de valores, tradições, práticas e representa-ções políticas, partilhado por determinado grupo hu-mano, que expressa uma identidade coletiva e fornece leituras comuns do passado, assim como fornece ins-piração para projetos políticos direcionados ao futuro. (2009, p.21)O anticomunismo na década de 1960 é fundamental para entender o golpe civil-militar dado em 31 de março de 1964. Naquele ano, o então presidente João Goulart, o Jango, dava margens, através de suas ações e discursos, para que os setores mais conservadores da sociedade acreditassem que estava em execução um plano de tomada de poder pelos comunistas no país. Durante todo seu governo, os grupos de esquerda tiveram uma 
1 Aluno do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
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grande liberdade para agir, criando organizações (ou fortalecendo as já existentes) e realizando ações como greves, passeatas e comícios, gerando uma perturbação na ordem social e política existente até então. Diante de toda a movimentação da esquerda brasileira que, junto com as propostas de Reformas de Base2 de Jango, 
ganhavam	 adesão	 de	 uma	 significativa	 parcela	 da	 população,	 a	
direita	 conservadora	 passa	 a	 atuar	 no	 sentido	 de	 desqualificar	as propostas esquerdistas, relacionando-as com o comunismo, ideologia que dividia o mundo junto com capitalismo no período da Guerra Fria. Não podemos negar que a grande maioria 
desses	 grupos	 recebia	 influência	 do	 comunismo	 ou	 da	 teoria	marxista, mas o que será relatado neste texto é um discurso de 
desqualificação	 desses	 grupos	 de	 esquerda	 feita	 de	 uma	 forma	simplista, maquiavélica e mal fundamentada. Na Paraíba na década de 1960, os principais grupos de esquerda a serem combatidos eram os sindicatos, os estudantes (secundaristas e universitários), organizações educacionais como a Campanha de Educação Popular (CEPLAR), os membros da própria Igreja Católica, políticos do extinto Partido Comunista Brasileiro (PCB) e as Ligas Camponesas. Veremos como o periódico católico de posiciona perante cada um, fazendo do discurso cristão uma crítica a um posicionamento político.No primeiro tópico discorreremos sobre os grupos urbanos e a organização política do estado. Já na segunda parte faremos um relato sobre o discurso católico contra os movimentos sociais do campo, em especial às Ligas Camponesas.
2 Foi o nome dado à uma série de projetos elaborados pela equipe de governo de Goulart que propunham mudanças na estrutura organizacional brasileira, principalmente nos setores político, 
fiscal,	agrário	e	educacional
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2	 O	 AnTICOMUnIsMO	 nA	 PARAíbA:	 TRAbALHADOREs,	PADRES ESqUERDISTAS E ESTUDANTESPara analisaro anticomunismo na Paraíba na década de 1960 é preciso retroceder um pouco mais no tempo e discutir a situação política que o estado vivia. Segundo Monique Cittadino 
(1998)	 no	 final	 da	 década	 de	 1950,	 Pedro	 Gondim	 assume	interinamente o governo do Estado. Diferente de seu antecessor, Flávio Ribeiro Coutinho, usineiro, ligado aos grupos latifundiários 
e	 filiado	 à	 União	 Democrática	 nacional	 (UDn),	 Gondim	 coloca	em prática um novo estilo de governo, com novas diretrizes mais ligadas ao povo. Cresce então na Paraíba um movimento que era tanto popular como elitista de preferência à candidatura de Pedro Gondim ao governo do Estado nas eleições de 1960, denominado “queremismo”. Com a possibilidade de falecimento do governador afastado, Gondim assumiria o cargo não mais como interino, impossibilitando-o de concorrer às eleições estaduais. Diante dessa situação ele abandona o cargo para concorrer nas próximas eleições. Gondim era a maior revelação política dos últimos tempos na Paraíba, porém sua candidatura pela sua agremiação, o Partido Social Democrático (PSD), não estava certa, visto problemas com o principal líder do partido na Paraíba, Ruy Carneiro. Com a rejeição de seu nome pelo PSD, Gondim se desliga do partido. Filia-se ao Partido Democrático Cristão (PDC), mas mesmo com o apoio do movimento “queremista”, não tinha força 
política	e	 financeira	o	suficiente	para	ganhar	uma	eleição.	Assim,	alia-se à União Democrática Nacional (UDN), que, na Paraíba, estava passando por uma crise interna e não tinha condições de lançar um candidato pelo partido. 
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Ao longo do seu mandato como governador interino e em 
campanha pelo pleito estadual, Gondim fez uma série de visitas à 
fabricas e sindicatos, dialogando com os operários, desempenhando 
um papel de intermediário entre os trabalhadores e seus patrões, visando o cumprimento das exigências do proletariado. Isso gerou 
uma	identificação	das	esquerdas	com	o	Gondim.	Com sua vitória nas eleições de 1960, o governador eleito estava politicamente alinhado entre as principais forças conservadoras do estado e de uma classe trabalhadora cada vez mais organizada. E diante dessa organização dos trabalhadores e do medo de que isso resultasse em mudanças na estrutura política paraibana, a classe conservadora passou a agir no intuito de desconstruir as lutas da esquerda organizada. Servindo aos interesses da classe conservadora, o A Imprensa segue seu plano editorial de acordo com o plano elaborado pelos 50 principais jornais católicos brasileiros, apresentando “[...] fatos, incoerências, falhas, insucessos do comunismo. Confrontará os países democráticos com os países dominados pelo marxismo.” (A Imprensa, 17 de junho de 1962).Antes de ser um problema paraibano, o comunismo é um 
problema	 mundial.	 Para	 poder	 desclassificar	 os	 movimentos	populares que surgiram no Estado, o jornal cria uma imagem negativa do sistema. Desenhou-se uma linha maniqueísta entre o bem e o mal. Os bons defendem a democracia e a liberdade para os povos do mundo, liderados pelos Estados Unidos, e os maus estão do outro lado da cortina de ferro, junto à URSS. Segundo relato de uma porto-riquenha transcrita pelo A 
Imprensa, Cuba antes de Fidel Castro “era feliz”. Para ela, na época de Fulgêncio Batista, o país tinha o nível de vida mais alto da América Latina, onde havia abundância na alimentação. “Hoje em dia Cuba não tem alimentos nem água. Nem medicamentos para os doentes, e lá só existe fome, pobreza, miséria, ditadura e paredão.” 
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(A Imprensa, 15 de julho de 1962). Segundo o jornal o comunismo seria a vertente totalitária da esquerda3. Esse comunismo totalitário de atitudes radicais cria elementos nocivos à sociedade. Seus adeptos “são comunistas por maldade, por inveja, porque não podem ver os outros contentes” (A Imprensa, 3 de novembro de 1963). A maldade e a inveja comunista que em 1959 entrou em Cuba, estavam agora entrando no Brasil através dos movimentos populares que cresciam em todo o país. Para o jornal eles se 
infiltram	 nas	 organizações	 populares	 e	 progressistas,	 “[...]	
ficando	nos	bastidores	a	manejar	como	fantoches	os	“soi-disants”	socialistas, nacionalistas, progressistas, avançados – quais inocentes (nem sempre) úteis (sempre) do imperialismo russo.” (FERNANDES. A Imprensa, 6 de maio de 1962). Como hábeis 
espiões,	 os	 comunistas	 se	 infiltram	 nas	 organizações	 sindicais	do país, estudando o contexto econômico e social brasileiro para poder agir.As esquerdas, que tanto defendiam a soberania nacional, para o jornal eram falsos nacionalistas. Faziam uso dos órgãos estatais para o interesse dos comunistas de fora.
A Petrobrás transformou-se em casa de emprego e aos nacionalistas não importa nada mais. Depois inven-taram a necessidade das relações diplomáticas com a União Soviética e eles se aproximam dos cofres que 
lhes	 financiarão	 as	 novas	mazorcas.	 [...]	 Eles	 querem	reformar o rosto da nação, os mascarados. (SCHIMITT, A Imprensa, 11 de março de 1962)
não	 só	 a	 Petrobrás	 estaria	 infiltrada	 pelos	 comunistas,	mas vários sindicatos na Paraíba partilhavam dessa ideologia 
3 a imprensa, 06 de janeiro de 1963.
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esquerdista de buscar melhores condições de trabalho. Os principais sindicatos no estado estavam se articulando. Essa organização gerava a quebra da ordem social, como era 
classificado	pelos	anticomunistas.	Os principais líderes sindicais, que antes exerciam sua representatividade política através do extinto PCB, passaram 
a	 atuar	 em	 outros	 partidos.	 Apesar	 de	 importantes	 figuras	 da	política da Paraíba, como José Américo de Almeida, criticarem a cassação do registro do PCB, para o periódico: “O que quer o comunismo ao organizar-se em partido “legal” é manipular os sofrimentos coletivos como quem usa a matéria prima para obter os mais variados produtos.” (A Imprensa, 13 de maio de 1962, p.1). Com os políticos comunistas atuando nas demais legendas, coube ao padre M. Batista de Medeiros alertar ao eleitor católico sobre os candidatos comunistas:
Pode um católico votar em candidatos apoiados por comunistas? 
Para	que	não	pensem	que	estou	agindo	sob	influxo	de	paixão partidária, transcrevo para aqui e na íntegra, 
um	documento	pontifício	emanado	há	quatro	anos,	da	
sagrada	Congregação	do	santo	Ofício:“Foi consultada esta suprema Congregação se é lícito aos católicos, na escolha dos representantes do povo DAR SEU VOTO àqUELES PARTIDOS OU CANDIDATOS 
QUE,	 EMbORA	 nãO	 PROFEssEM	 PRInCíPIOs	 OPOs-TOS à DOUTRINA CATóLICA e até mesmo se digam cristãos, todavia, de fato, SE UNEM AOS COMUNISTAS e, pelo seu modo de agir, os favorecem (re tamen co-munistis sociantur et sua agendi ratione iisdem fa-vent)” (MEDEIROS, A Imprensa,18 de agosto de 1963, p. 1)
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A	Igreja	Católica	não	era	unânime	no	combate	a	influência	comunista na política brasileira. Crescia dentro da instituição grupos de católicos engajados nos movimentos populares. Os “padres comunistas” eram de conhecimento da Arquidiocese 
paraibana,	 que	 procurou	 desqualificar	 a	 atuação	 desses	indivíduos. Os que pertencem a Cristo, não lutam contra si mes-mos. [...] Sentem com a Igreja. Agem com a Igreja. Só conhecem e praticam uma doutrina única: a dos Evan-gelhos, segundo os ensinamentos da Igreja. Catolicis-mos misturados com comunismo, é apenas um dis-farce da tática nova, de propagar um erro marxista de uma forma indireta, através dos que dizem pertencer... (TELLES, A Imprensa, 14 de novembro de 1962, p. 6)Para os conservadores, não havia possibilidade do catolicismo estar junto ao comunismo. O leitor, segundo o jornal, 
deve	 ficar	 atento	 aos	 padres	 que	 professam	 a	 fé	 em	 nome	 do	comunismo, pois eles não falam pela Igreja4. Mas o jornal não emitia apenas opiniões conservadoras radicais. O periódicoprocura ponderar a atuação desses clérigos junto aos movimentos populares. Esses indivíduos querem apenas um mundo mais igualitário, justiça social que o capitalismo não pode dar. 
Eles, os padres, não são comunistas, e agem, cremos, com a melhor das intenções. às vezes porém, na luta contra o capitalismo maloquiano, tubarônico, parecem considerá-lo o pior de todos os males, a causa única da miséria que campeia no mundo – ocultando incon-sientemente de certo, os males que provém do comu-nismo materialista, totalitário, algoz de todas as liber-dades. (LIMA, A Imprensa, 23 de junho de 1963)
4 a imprensa, 7 de abril de 1963, p. 2. 
Dantas, Nunes e Silva (Org.)
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Diante do crescimento de vertentes sociais cristãs, a Igreja em determinados momentos busca uma posição de cautela ao abordar esses grupos esquerdistas católicos, diferente dos membros mais radicais, ligados diretamente à organizações conservadores, como partidos ou grupos de latifundiários. 
O	comunismo	não	estava	 “camuflado”	apenas	na	 Igreja	ou	nos sindicatos. A classe estudantil sofria, segundo o jornal, grande 
influência	 da	 ideologia	 comunista.	 Idealizando-se	 nas	 principais	
figuras	 comunistas	 da	 época,	 como	 Fidel	 Castro	 e	 Che	 Guevara,	
os	 estudantes	 comunistas	 eram	 identificados	 primeiramente	pela aparência. J. Barreto relata uma experiência em um estabelecimento de ensino paraibano:
Outro dia estávamos em um estabelecimento de ensi-no, quando entrou um efebo, com a barba crescendo à Fidel Castro. Não o conhecíamos. Procuramos a sua 
identificação,	devido	à	singularidade	do	seu	gosto	e	o	porteiro que o tinha coberto com um olhar de repug-nância e revolta, nos respondeu bem azucrinado: “É um comunista... que vive aqui fazendo propaganda. Ele e Fulana de Tal”. (BARRETO, A Imprensa, João Pessoa, 23 de junho de 1963, p. 1)Os estudantes, como os demais militantes de esquerda, eram estereotipados. Suas vestimentas, a barba por fazer ou as palavras que utilizavam eram dignas de alguém que idolatrava os comunistas de fora. Além de ser necessário mencionar que a estereotipização do comunista não era prática apenas no 
colunista,	 uma	 figura	 da	 classe	 média,	 tal	 prática	 estava	 no	porteiro da escola, o que mostra como o anticomunismo estava presente entre as classes populares.A aparência dos estudantes comunistas gerou uma comparação com os estudantes norte-americanos. Segundo o 
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jornal, o movimento estudantil norte-americano é engajado 
nas	 causas	que	dizem	respeito	ao	 seu	país,	 o	perfil	do	estudante	daquele país é de um aluno primeiramente preocupado com os estudos, o que difere do estudante brasileiro, que primeiro milita depois estuda. O movimento estudantil nacional é formado por indivíduos que tem excessiva ligação com a política, tornando-o imaturo: Movimentos e expansões que tem como ponto de par-tida uma falsa incompleta noção dos problemas. que 
se	deflagram	na	base	das	emoções.	Que	são	inspiradas	e atiçadas pela demagogia. que fogem ao cumprimen-to do dever estudantil. que só enchem o balão dos “di-reitos” e esvazia-os das “obrigações”. que perturbam a ordem pública. que servem de trampolim à vaidade e ambição pessoal de certos líderes estudantis. que desrespeitam a propriedade pública. que fazem ques-tão de dar provas de irresponsabilidade, má conduta e agitação barulhenta. que são agitadas por estudantes “perpétuos”. que re-velam inspirações comunizantes. Tais movimentos são provas de imaturidade e fuga ao dever essencial. E são um grande contrassenso, ridículo em grande es-tilo, quando envolvem globalmente pré-adolescentes a adolescentes imaturíssimos. (FRANTZ, A Imprensa, João Pessoa, 07 de outubro de 1962, p. 4)Esses estudantes esquerdistas não estariam preocupados com a situação da classe trabalhadora, ou dos menos favorecidos 
da	 sociedade,	 como	 aponta	 o	 autor,	 encaixando-os	 no	 perfil	 do	comunista padrão, aquele que só se interessa pelo caos social. Mas a preocupação anticomunista não se limitava aos estudantes universitários ou secundaristas que engrossavam as passeatas dos movimentos sociais. Existiam os programas de educação popular que cresceram na década de 1960 no Brasil. 
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A Campanha de Educação Popular (CEPLAR) aqui da Paraíba, desempenhou papel fundamental na educação de jovens e adultos no estado.Segundo Maria das Dores Paiva de Oliveira Porto e Iveline Lucena da Costa Lage (1995) a CEPLAR surgiu a partir da atuação da Juventude Universitária Católica (JUC) na crítica ao assistencialismo do governo estadual. Traçou-se um plano de 
ação	junto	aos	cursos	da	Universidade	Federal	da	Paraíba,	ficando	
os	estudantes	da	Faculdade	de	Filosofia	engajados	na	questão	da	educação dos bairros mais pobres da capital. A partir dos questionamentos sobre a sociedade brasileira e da ação junto às comunidades carentes, surge a CEPLAR no ano de 1961. Tal entidade é fruto da junção de dois fatores: a atuação dos estudantes e da JUC e do projeto lançado pelo governo do Estado para a criação de um movimento de educação popular. 
Apesar	do	financiamento	por	parte	do	governo,	a	CEPLAR	sempre	se manteve independente das questões administrativas do Estado, tendo suas atividades realizadas por estudantes. Com a adoção do método Paulo Freire, a CEPLAR ingressou no Plano Nacional de Educação, do ministro Darcy Ribeiro, que visava melhorar o ensino primário no Brasil. Com o 
aumento	 do	 financiamento,	 a	 entidade	 cresceu	 e	 trouxe	 para	 si	os olhos dos conservadores que eram contra a política social do governo federal. Sua atuação junto às comunidades colocou seus membros em contato com associações de trabalhadores e grupos religiosos, todos voltados para a melhoria da condição de vida 
do	 povo.	 Classificada	 como	 comunista,	 agitadora	 e	 deturpadora	da ordem social pelo A Imprensa, a CEPLAR atuava junto à classe trabalhadora através da educação.Ligando os movimentos de educação popular com as experiências revolucionárias em Cuba e nos demais países 
comunistas,	 o	 periódico	 buscou	 desqualificar	 o	 método	
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educacional utilizado pela CEPLAR, pois era um meio de levar as ideias marxistas para as camadas sociais mais baixas. 
Por lá [Cuba] o movimento começou com as “educa-ções populares”. E este ensinamento das primeiras letras ia se fazendo – pouco a pouco – a difusão das sentenças comprometedoras do regime democrático. As frases todas rumadas para o desencanto com as instituições livres, para que todos fossem chegando à compreensão de que o problema econômico do povo, pelo menos, só teria solução com o comunismo. E essa convicção tanto se espalhou que o povo caiu nas ma-lhas da bolchevização, quase de olhos fechados. (A Im-prensa, João Pessoa, 23 de junho de 1963).Visto o perigo para a democracia nacional dos movimentos de educação popular como a CEPLAR, o jornal mostra uma alternativa para a sociedade, o trabalho de educação dos párocos do estado. O Instituto Don Adauto ou o trabalho dos padres da cidade de Alagoa Grande são exemplos de como não se precisa do método do Paulo Freire para fazer um trabalho de educação de jovens e adultos das camadas mais baixas da sociedade.
que nosso povo veja o trabalho de alfabetização dos padres, e se disponha a ajudá-los mui generosamente. A classe abastada deve prestar todo o amparo às ativi-dades dos srs. vigários, neste sentido. Devem prestar-lhes toda a cobertura, como se vem dizendo na lingua-gem administrativa. Os Inimigos da Fé – os desafetos de Deus – estão agindo mui empenhadamente. E sabe-mos quais são as metas visadas pelo alto comando que os dirige. (BARRETO, A Imprensa, João Pessoa, 27 de outubro de 1963)
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O apelo para a “classe abastada” me faz considerar o quão é necessário buscar a unidade de todos os grupos anticomunistas contra os comunistas, inimigos da democracia.Uma cultura política como o anticomunismo estava presente primeiramente na classe conservadora, aquela que resguarda para si o poder econômico e político de um Estado. Uma cultura política para sobreviver em uma sociedade precisa de força não só na classe social em que se tem hegemonia, ela tem que ser legitimada entre as demais classes no intuito de servir como base para conter movimentos que quebre a hegemonia desse grupo. E essa força não se dá apenas no discurso, as práticas cotidianas, como a educação, são fundamentais para consolidar a cultura política e dar ainda respaldo para a classe dominante no poder. Na Paraíba, a classe social que detinha a maior parte do poder econômico e político, ou seja, maiores cadeiras nas Assem-bleias Legislativas ou Câmaras de Deputados, maior número de prefeitos eleitos pelo Estado, era a elite agrária. Os latifundiários, que concentravam a maior parte da terra produtiva da zona rural, eram contra os movimentos sociais no campo que eclodiam com as Ligas Camponesas. E para poder conter o crescimento desse 
movimento	era	preciso	também	desclassificá-lo.	
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3 O ANTICOMUNISMO CONTRA AS LIGAS CAMPONESAS EM FAVOR DA PAZ AGRÁRIAConta-se que o rei Alexandre certa vez prendeu um pi-rata e perguntou-lhe com que direito vivia infestando os mares. “Com o mesmo direito, respondeu o prisio-neiro, com que V. M. vive devastando o mundo inteiro. Mas porque faço isso num pequeno navio, sou chama-do salteador; V. M. porque o faz com armada e exérci-to, é considerado imperador”. O dinasta limitou-se a rir, sentindo-se desarmado para castigar o pirata, e o deixou em paz. (BARRETO, A Imprensa, João Pessoa, 10 de junho de 1962, p. 1)É com essa analogia que o colunista descreve a situação agrária na Paraíba na década de 1960. Os piratas seriam os proprietários de terra, “Todo o mundo vive com as vistas sôbre êsses homens. Tôda a acusação de exploradores para eles.” (BARRETO, A Imprensa, João Pessoa, 10 de junho de 1962, p. 1). E Alexandre, O Grande, representaria os camponeses, trabalhadores rurais assalariados, que “Ninguém lhes aponta os males. Ninguém se apercebe do que vivem praticando. O dinheiro lhes chega às mãos (Deus sabe como), e não há quem diga que são exploradores.” (BARRETO, A Imprensa, João Pessoa, 10 de junho de 1962, p. 1).Pode parecer sem nexo colocar nessa analogia o poderoso conquistador macedônico representando os camponeses, que lutavam não só por um pequeno pedaço de terra para a sobrevivência, mas por igualdade e justiça nas relações de trabalho no campo. Porém é assim que o discurso anticomunista do jornal vai ser pautado no âmbito rural. A força que os camponeses estavam ganhando dentro do Estado deixava os grupos latifundiários em alerta, se mostrando necessária uma 
desconstrução	 da	 luta	 dos	 trabalhadores	 rurais	 em	 benefício	
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da manutenção da estrutura agrária excludente em que vivia a Paraíba. Assim, no meio da luta agrária, colocava-se o grande latifundiário como vítima do camponês. Numa tentativa de desvirtuar a interpretação do leitor que passou a ver o camponês como um inimigo que o governo reformista de Goulart estava criando.O problema agrário no Estado é polarizado pelas Ligas Camponesas de um lado e nos proprietários de terras, 
mais	 especificamente	 no	 chamado	 Grupo	 da	 Várzea	 ou	 bloco	agroindustrial, do outro. Esse último era um grupo político-econômico formado pelos latifundiários e usineiros da chamada zona da várzea, ou zona da mata. Suas atividades econômicas estavam estreitamente ligadas à exportação de produtos como a cana-de-açúcar e seus derivados, abacaxi e à pecuária extensiva. 
A	principal	zona	de	influência	desse	grupo	eram	os	municípios	de	Sapé, Marí, Mamanguape, Araçagi, Pilar, São Miguel de Taipu, Santa Rita, Cruz do Espírito Santo e Caldas Brandão.De acordo com Cesar Benevides (1985), a década de 1960 foi de mudanças na estrutura agrária. Houve o início da mecanização do trabalho rural e o aumento da quantidade de terras destinadas à prática da pecuária extensiva. O morador, que antes trabalhava no latifúndio para poder morar e usufruir de um pequeno pedaço de terra, era, como relata o autor, substituído pelo trabalhador sazonal.Passou a predominar na zona da mata paraibana a morada, o forro e a renda como principais relações de trabalho. Na morada, o camponês tinha um pequeno pedaço de terra, o sítio, onde matinha uma lavoura de subsistência, e era obrigado a trabalhar nas terras do proprietário. No forro, o camponês arrendava um pequeno lote de terra, pagando uma quantia anual em dinheiro para poder utilizá-la; sendo obrigado a prestar serviço obrigatório dois ou três dias na semana. E a renda ocorria quando o camponês 
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acordava com o proprietário uma porção de terra por uma determinada quantia em dinheiro ou em produtos, deixando-o dependente dos resultados de sua colheita. Assim, as relações entre trabalhador e empregado no campo não eram semelhantes às dos centros urbanos, pois a legislação trabalhista não havia chegado ao âmbito rural. Antes da organização das Ligas Camponesas, as discursões políticas não eram pautadas junto aos trabalhadores rurais. A falta de organização dos trabalhadores rurais era um fator que contribuía para o atraso do campo. O Grupo da Várzea controlava a máquina administrativa do estado em favor da manutenção de uma ordem no campo que favorecesse seus interesses. A falta de organização dos trabalhadores rurais dava margem ao controle dos camponeses pelos latifundiários fazendo deles dependentes econômicos e 
controlados	 políticos.	 Esta	 organização	 social	 ficou	 conhecida	como paz agrária. Era uma prática:
[...] garantida pelo jogo entre o Grupo da Várzea e o Estado populista, fundamentava-se na exploração máxima do campesinato, na medida em que a oligar-quia tradicional mantinha o monopólio do estoque de terras através do coronelismo, que representava a dominação de uma classe sobre a outra. (BENEVIDES, 1985, p. 32)A paz agrária englobava os dois principais partidos na Paraíba, o PSD e a UDN. As duas agremiações sempre se entendiam quando era necessário manter seus interesses comuns, 
na	 chamada	 “conciliação	 conservadora”.	 Porém,	 de	 pacifica,	 essa	organização rural não tinha nada. Todo o aparato repressivo do Estado era utilizado para assegurar ao latifundiário o controle da terra e a subordinação do camponês. Indivíduos comprometidos 
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com a manutenção da ordem pública estavam a serviço dos principais grupos oligárquicos gerenciadores da agroindústria. O camponês se encontrava em uma situação de completo desamparo social por parte do governo, que ainda agia contra sua integridade 
física	sempre	que	era	considerado	necessário.	Devido essa situação de marginalidade social do trabalhador rural, grupos de trabalhadores rurais nordestinos de organizaram nas Ligas Camponesas5. A tomada de consciência de classe pelos camponeses trouxe para o debate não só as relações de trabalho entre os camponeses e latifundiários, mas toda uma estrutura agrária elitista.A luta do camponês tomou grande repercussão no meio urbano. Suas reinvindicações foram incorporadas por estudantes, jornalistas, membros da igreja, trabalhadores 
sindicais,	 profissionais	 autônomos	 (advogados,	 por	 exemplo)	 e	seguimentos da classe política (principalmente os membros do extinto PCB). Não só as lutas camponesas foram incorporadas pelos seguimentos urbanos, as barbaridades cometidas contra os camponeses, como os assassinatos, também foram motivos de protestos pelos segmentos citadinos engajados nas lutas agrárias.Toda essa movimentação surgida a partir das Ligas fez com que o Grupo da Várzea entrasse em estado de alerta. O governador, que estava politicamente localizado entre os trabalhadores organizados e os grandes latifundiários (UDN), precisou se decidir porum lado, optando pelos conservadores. Isso resultou numa 
intensificação	do	aparato	repressivo	contra	os	camponeses.
Mas	a	violência	sobre	o	camponês	não	era	só	 física.	Muito	se falava a respeito da situação do campo. A imprensa passou a 
5 As primeiras Ligas Camponesas foram organizadas pelo Partido Comunista Brasileiro em 
1947,	mas	foram	desativadas	devido	o	partido	ter	sido	colocado	na	ilegalidade.	Mais	tarde,	no	final	da década de 1950, as organizações camponesas voltam em Pernambuco, no Engenho da Galiléia, tomando grandes proporções por todo o nordeste.
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difundir	 ideias	 contra	 os	 camponeses,	 desqualificando	 a	 causa	agrária como “agitadora” e “baderneira”. O fato dos camponeses reivindicarem uma nova organização da estrutura agrária, alicerçados pela proposta de Reforma Social do presidente João Goulart, levou as classes conservadoras, inclusive à alta cúpula da Igreja Católica, a acreditarem que as Ligas Camponesas eram um 
dos	meios	de	infiltração	de	ideologia	subversiva	no	brasil,	visando	uma Revolução Comunista, ou mesmo porque elas eram uma forma de derrubar a paz agrária.A desconstrução do A Imprensa contra as Ligas Camponesas começa a partir da situação agrária dos países comunistas. Em uma comparação com os Estados Unidos, é debatido o custo de vida e a produção do trabalhador comunista, o jornalista escreve: Enquanto o trabalhador soviético consegue três ovos, 215 gramas de açúcar, 1400 de pão misto, 80 de man-teiga, 200 de carne e dois litros de leite, e na américa do norte 20 ovos, 4300 gramas de açúcar, 2500 de pão, 650 de manteiga, 1000 de carne e 5 litros de lei-te.[...] De 1959 a 62, a produção agrícola diminuiu até 20% em todos os países comunistas. Menos na Polô-nia, que descoletivizou suas fazendas. Na Alemanha Oriental faltam gêneros de primeira necessidade. Já quis pedir empréstimo de bilhões a Bonn. Em Cuba a safra de açúcar baixou 30%. Alimentos, objetos higi-ênicos, tudo foi racionado e distribuído pelo governo. “Estamos envergonhados por não termos cumpridos nossas promessas” – declarou Fidel Castro à nação. Na China houve progresso; muito menor, porém do que se prometeu. A fome mata milhões por ano. E milhares por mês fogem para Hong Kong e Macau. – O quadra-gésimo propósito soviético de alcançar a produção ocidental – e nunca conseguido – mostra a superiori-dade do sistema livre sobre o comunista. (A Imprensa, 1 de julho de 1962, p. 6).
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Esse discurso serve como desmotivação para o trabalhador camponês não se engajar nas Ligas. A partir desses dados, o camponês tende a não se interessar por uma luta que, 
supostamente,	 só	 trará	 malefícios	 para	 sua	 vida,	 preferindo	
manterem-se	 alheios,	 já	 que	 o	 comunismo	 não	 trará	 benefícios	para sua produção. A reforma agrária, tão defendida pelas Ligas, não era condenada por completo pela Igreja Católica. Só a partir do momento em que ela se vincula à ameaça externa comunista o jornal passa a criticá-la. Ele demonstra em alguns pontos ser bastante simpático às causas trabalhistas camponesas, apenas criticando o modo como eles estão agindo. O jornal procura debater como pode ser feita uma reforma agrária pelos órgãos federais sem dar margem a ideologias subversivas, e cobra uma atitude, pois: “As fôrças do mal se congregam, disciplinadas e terríveis, e não lhes oferecemos um potencial de resistência, 
suficiente	 para	 inutilizar-lhes	 o	 ímpeto	 e	 poder	 destruidor.”	 (A	Imprensa, 25 de fevereiro de 1962). Como então resolver o problema do camponês sem dar margem à atuação subversiva? A Igreja Católica, mais 
especificamente	 a	 Confederação	 nacional	 dos	 bispos	 do	 brasil	(CNBB), a partir do estudo da Encíclica “Mater et Magistra”, aponta meios de como essa pode ser utilizada no meio rural:
1) Ação Católica Rural (JAC e Movimentos de Adultos) capaz de preservar e desenvolver a doutrina cristã en-tre os urbanizadores do campo.2) Sindicalização rural visando dar aos lavradores o direito de fazerem suas justas reinvindicações.3) Frentes Agrárias, a exemplo das experiências do Pa-raná e Rio Grande do Sul.4) Movimento de Educação de Base (MEB) para dar melhor formação aos jovens e adultos, pois não basta 
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uma simples recomendação econômica e técnica. (A Imprensa, 25 de fevereiro de 1962, p. 8)A Igreja tinha uma ligação com o problema no campo, apoia e mostra meios para a sua organização. Ela tem apreço pela reinvindicação do trabalhador rural quanto às melhorias de salário e das condições de trabalho em geral. O grande problema da questão agrária é quando os camponeses vão reivindicar 
mudanças	 através	 de	 modos	 classificados	 como	 “violentos”.	 A	solução cristã que a Igreja propõe (que ela chama de “reforma agrária”) não pode dar margem a atitudes como a invasão das terras dos latifundiários, que, segundo eles, é uma ação de violência e desrespeito à ordem pública, que é inspirada nas ações de violência que instalaram o comunismo em Cuba6.
A reforma agrária verdadeira seria aquela que modi-
ficasse	a	mentalidade	retrograda	de	alguns	proprietá-rios. E que lhes desse senso de justiça fundamentado na caridade cristã. Por aí chegaríamos às metas da re-forma satisfatória para as duas classes. (BARRETO, A Imprensa, 2 de junho de 1963, p. 1)Ou seja, para os católicos, toda a reivindicação camponesa 
deve	ser	feita	desde	que	não	modifique	a	estrutura	agrária	vigente,	que é excludente, elitista e violenta, mas altere o comportamento e o pensamento do proprietário. quando as lutas dos trabalhadores 
do	campo	são	pautadas	para	o	fim	do	latifúndio,	elas	perdem	toda	a sua legitimidade. E as Ligas Camponesas são contra o latifúndio. O problema não são os trabalhadores rurais, sim as Ligas, 
formadas	pelos	agentes	comunistas	infiltrados.	
Mas	 o	 que	 neste	 trabalho	 classifico	 como	 um	 sistema	excludente, elitista e violento, o jornal entende como ordem. As 
6 a imprensa, 18 de fevereiro de 1962, p. 2.
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invasões de propriedades na luta pela democratização da terra, 
propostas	 que	 são	 direcionadas	 ao	 benefício	 da	 sociedade	 como	um todo, são consideradas apenas agitação e desordem:
Já estamos fardos dessas incursões das ligas campone-sas, pelas propriedades alheias. O ideal que o agitador 
Julião	prega,	não	é	de	reforma	pacífica.	nada	de	rein-vindicações de direitos por meios legais, como devem ser as nossas vitórias democráticas. O que o preocupa, em todos os momentos, são os expedientes violentos. A confusão de quem espera tirar algum proveito aos seus planos eleitoreiros. Eis o que é o programa das ligas camponesas no nosso Estado e nos Estados vizi-nhos. (BARRETO, A Imprensa, 14 de janeiro de 1962, p. 1)Julião, ao qual o autor se refere é Francisco Julião7. Ele é colocado como o personagem que mais incentiva a desordem das Ligas Camponesas, pregando a ideologia comunista. Para o jornal, “quer Deus para si e o diabo para os outros” (A denúncia... 15 de abril de 1962, p. 8), pois prega a divisão das terras, mas é dono de uma vasta propriedade rural.Nas comemorações de primeiro de maio o autor vai descrever como Julião desvirtua o homem do campo para seus 
interesses	 particulares,	modificando	 todo	 o	 sentido	 de	 uma	data	comemorativa. O interesse de Julião é fazer da classe camponesa massa de manobra para suas pretensões políticas comunistas. 
Que	 confiança	nos	pode	merecer	 a	massa	numerosa,	guiada pela bandeira de um Julião? Certamente ele não falará nessas comemorações de 1º de maio. Aqui 
7	 Foi	um	advogado	e	parlamentar	pernambucano	filiado	ao	Partido	socialista	brasileiro	(Psb).	Um dos maiores responsáveis pela organização das Ligas Camponesas naquele Estado. Era favorável à atuação das Ligas em favor da reforma do sistema agrário brasileiro. Com o golpe de 1964 teve seu mandato cassado se exilando no México em 1965. (Fonte:

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