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Termodinamica Macroscopica 2009 03 01

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Instituto Superior Técnico 
 
 
 
 
TERMODINÂMICA 
MACROSCÓPICA 
Princípios e Conceitos 
 
 
 
José J. Delgado DomingosJosé J. Delgado DomingosJosé J. Delgado DomingosJosé J. Delgado Domingos 
 
Tiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado Domingos 
 
Tânia Tânia Tânia Tânia Costa e SousaCosta e SousaCosta e SousaCosta e Sousa 
 
 
 
 
 
 
 
Junho de 2008
 
 
Índice Geral 
ÍNDICE GERAL 3 
ÍNDICE DE FIGURAS 7 
PREFÁCIO DA 1ª EDIÇÃO 9 
PREFÁCIO DA 2ª EDIÇÃO 17 
AGRADECIMENTOS 19 
1. FÍSICA PERFEITA E TERMODINÂMICA MACROSCÓPICA 21 
1.1. Física Perfeita: Reversibilidade 21 
1.2. Termodinâmica Macroscópica: Irreversibilidade 23 
1.3. Termodinâmica Macroscópica e Física Estatística: Reversibilidade 
Microscópica e Irreversibilidade Macroscópica 24 
2. PRINCÍPIOS DA TERMODINÂMICA 28 
2.1. Definições e Convenções 28 
2.2. 1º Princípio da Termodinâmica 33 
2.3. 2º Princípio da Termodinâmica 36 
3. FORMALISMO TERMODINÂMICO 53 
3.1. Do Postulado da Dissipação ao Formalismo Termodinâmico 53 
3.2. Axiomática de Tisza-Callen 54 
3.3. Primeiras Derivadas da Equação Fundamental: Variáveis Intensivas 61 
3.4. Equilíbrio Termodinâmico 65 
3.5. Equações de Euler e de Gibbs-Duhem 70 
 Termodinâmica Macroscópica 4 
 Índice Geral 
________________________________________________________________________________________ 
 
3.6. Equações Molares 72 
3.7. Expressões para o Trabalho e para o Calor 76 
3.8. Relações de Maxwell 77 
3.9. Segundas Derivadas da Equação Fundamental: Coeficientes 
Termodinâmicos 81 
3.10. Estabilidade Intrínseca dos Sistemas Termodinâmicos 86 
4. SISTEMAS TERMODINÂMICOS SIMPLES 97 
4.1. Recomendações para a Obtenção de Equações Fundamentais 97 
4.2. Gases Perfeitos 97 
4.3. Gás de van der Waals 102 
4.4. Radiação Electromagnética 103 
4.5. Elástico de Borracha Linear 105 
5. CICLOS TERMODINÂMICOS 107 
5.1. Ciclo de Carnot 107 
5.2. Teorema de Carnot 110 
5.3. Outras Formulações da Segunda Lei da Termodinâmica 117 
6. POTENCIAIS TERMODINÂMICOS 121 
6.1. Teorema do Mínimo de Energia 121 
6.2. Estrutura do Espaço Termodinâmico 122 
6.3. Transformação de Legendre 123 
6.4. Potenciais Termodinâmicos 127 
6.5. Teoremas de Mínimo para os Potenciais Termodinâmicos 134 
7. MUDANÇA DE FASE 141 
7.1. Dimensionalidade do Espaço de Representação 141 
 Termodinâmica Macroscópica 5 
 Índice Geral 
________________________________________________________________________________________ 
 
7.2. Equação de Clapeyron 150 
7.3. Mudança de Fase com a Equação de van der Waals 154 
7.4. O Caso da Água 159 
7.5. Diagramas Termodinâmicos 162 
7.6. Sistemas com Múltiplos Componentes: Regra das Fases de Gibbs 167 
8. SISTEMAS ABERTOS SEM DIFUSÃO 171 
8.1. Introdução 171 
8.2. Balanços de Massa e de Energia para Sistemas Abertos 172 
8.3. Regime Estacionário 176 
8.4. Aplicações 178 
8.5. Balanço de Entropia para Sistemas Abertos 180 
9. TERMODINÂMICA DA ATMOSFERA 183 
9.1. Extensão do formalismo para o campo gravítico 183 
9.2. Sistema Termodinâmico – Ar Seco 185 
9.3. Sistema Termodinâmico – Ar Húmido 197 
9.4. Tefigrama 203 
9.5. Nível de Condensação 205 
9.6. Gradiente de Temperatura Adiabático Saturado 207 
10. BIBLIOGRAFIA 212 
ANEXO - FERRAMENTAS MATEMÁTICAS 215 
10.1. Formas Diferenciais 215 
10.2. Maximização 219 
10.3. Pontos de Equilíbrio e Estabilidade 221 
 Termodinâmica Macroscópica 6 
 Índice Geral 
________________________________________________________________________________________ 
 
11. ÍNDICE REMISSIVO 225 
 
 
 
Índice de Figuras 
Figura 1 - Sistema isolado, com dois subsistemas.......................................................... 38 
Figura 2 – Compressão de um gás................................................................................. 40 
Figura 3 – Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie (exemplo). ........................... 42 
Figura 4 – Evolução adiabática reversível. .................................................................... 43 
Figura 5 – Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-
estática. ............................................................................................................. 44 
Figura 6 – Experiência Fundamental de Joule ............................................................... 45 
Figura 7 – Sistemas termodinâmicos separados por uma parede diatérmica, 
fixa e impermeável ............................................................................................ 66 
Figura 8 – Divisão arbitrária de um sistema homogéneo em dois. ................................. 86 
Figura 9 – Representação esquemática de uma cavidade electromagnética ...................104 
Figura 10 – Elástico de borracha ..................................................................................105 
Figura 11 – Ciclo de Carnot .........................................................................................109 
Figura 12 – Equilíbrio de fases.....................................................................................143 
Figura 13 – Variação da Energia de Gibbs molar (igual ao potencial 
químico) com a temperatura, para pressão e número de moles 
constantes (sistema com um componente químico), para diferentes 
fases. ................................................................................................................146 
Figura 14 – Exemplo de diagrama de fases...................................................................147 
Figura 15 – Comportamento típico de uma isotérmica do fluido de van der 
Waals ...............................................................................................................154 
Figura 16 – Isotérmica da equação da van der Waals, no plano (v, P)...........................156 
Figura 17 – Energia de Gibbs molar em função da pressão, para temperatura 
constante, para um fluido de van der Waals. .....................................................156 
Figura 18 – Evolução na mudança de fase, para um fluido de van der Waals................157 
Figura 19 – Isotérmica com mudança de fase, no plano P – v. ......................................158 
Figura 20 – Representação da zona a duas fases no diagrama (P, v). ............................159 
Figura 21 - Fases da água num diagrama P-T. ..............................................................160 
Figura 22 - Superfície P – V – T para a água (a contracção na passagem de 
sólido para líquido não é normal em fluidos simples). ......................................161 
Figura 23 - Diagrama P, θ (temperatura) para a água líquida e o vapor de 
água. ................................................................................................................162 
 Termodinâmica Macroscópica 8 
 Índice de Figuras 
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Figura 24 - Diagrama (T,s). A área tracejada representa a quantidade de 
calor recebida pelo sistema na evolução isobárica de a a d. No 
diagrama estão também representadas as linhas de título x constante. ...............163 
Figura 25 - Diagrama T-s. Linha de volume constante (isócora). ..................................165 
Figura 26 - Diagrama T-s para a água. Isobáricas (a cheio), isócoras (a 
tracejado), isentálpicas (traço-ponto). ...............................................................166 
Figura 27 - Diagrama de Mollier (h, s) para uma substância simples. 
Apresentam-se também as linhas de volume constante (note-se que, 
neste diagrama, o ponto triplo corresponde a uma área). ...................................167 
Figura 28 – Sistema com um êmbolo adiabáticoe móvel, (a – b). ................................173 
Figura 29 – Deslocamento para a direita, numa distância dl, do êmbolo no 
sistema da Figura 28, passando para a posição a’ – b’.......................................173 
Figura 30 – Definição do sistema A, no contexto da Figura 29. ....................................174 
Figura 31 – Tubo de secção constante, horizontal, com um escoamento em 
regime estacionário. .........................................................................................178 
Figura 1 – Linha a vermelho: gradiente de temperatura adiabático. Linhass 
1, 2 e 3: gradientes de temperatura da atmosfera. ..............................................193 
Figura 2 – Equação de Clausius-Clapeyron (azul). Caracterização da mistura 
(linha a vermelho) de duas massas de ar não saturadas (extremos da 
linha a vermelho)..............................................................................................200 
 
 
 
Prefácio da 1ª Edição 
 
Deep down, most scientists feel insecure about their 
background in Thermodynamics. (And most of those who do 
not probably should!). But from where does this anxiety 
issue? Certainly, the fundamental laws of Thermodynamics 
are not that difficult to comprehend. 
Ulanowicz (1986) 
Embora fundamental numa formação científica, a Termodinâmica é uma 
disciplina que habitualmente se remete para um subcapítulo da Física, para a 
introdução a outras disciplinas, ou para o conjunto de formulários, tabelas e 
diagramas, de que as aplicações correntes precisam. 
Existem ainda as Termodinâmicas para Químicos, para Mecânicos, para 
Biólogos..., ou ainda as disciplinas científicas especializadas que têm na 
Termodinâmica a sua raiz e fundamento. 
Salvo raras excepções, a unidade global da Termodinâmica não é 
sublinhada, tal como não é explorado o valor pedagógico e metodológico da 
sua estrutura conceptual, sobretudo quando se trata da Termodinâmica 
Macroscópica. 
Esta situação, creio eu, deve-se a alguns equívocos e a erros de perspectiva 
consagrados como normalidade pela sua proliferação em manuais 
universitários. 
Entre os equívocos, encontra-se o próprio nome de Termodinâmica. Na 
esmagadora maioria dos casos, os textos de Termodinâmica tratam de 
TERMOESTÁTICA, ou seja, de situações que a nível macroscópico são de 
equilíbrio estático e a nível microscópico são de equilíbrio dinâmico. 
Sendo um equívoco histórico, fruto da confusão entre desejos e realidades, a 
Termodinâmica que não é Termoestática passou a chamar-se 
Termodinâmica de Não Equilíbrio ou Termodinâmica dos Processos 
Irreversíveis. 
De mais profundas consequências, pelas falsas perspectivas que origina, é a 
generalizada meia-verdade de que nas equações de Boltzman da Mecânica 
Estatística se encontra toda a fundamentação da Termodinâmica 
Macroscópica. 
Esta questão ultrapassou, largamente, o estrito âmbito em que inicialmente 
se formulou e procurava conciliar a evidência experimental da 
Termodinâmica Macroscópica com uma visão cultural do mundo em que 
 Termodinâmica Macroscópica 10 
 Prefácio da 1ª Edição 
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dominava o determinismo newtoniano e a cosmologia de Laplace1. De certo 
modo, era uma visão do mundo decorrente da sua descrição por equações 
lineares ou que poderiam linearizar-se para que a sua solução fosse redutível 
aos métodos matemáticos conhecidos. 
A descoberta recente do «caos determinístico», consequência directa da 
capacidade de tratar numericamente situações descritas por equações 
diferenciais (ou em derivadas parciais) não lineares, bem como a 
possibilidade de auto-organização em sistemas dissipativos muito afastados 
do equilíbrio veio pôr novamente em relevo a importância conceptual da 
perspectiva macroscópica e o renovado interesse pelo paradigma que sob 
esse aspecto a Termodinâmica Macroscópica constitui2. 
Os grandes afastamentos do equilíbrio, em que nascem os fenómenos 
conhecidos de auto-organização dissipativos, são de natureza macroscópica 
e podem descrever-se no âmbito da Termodinâmica Macroscópica dos 
Processos Irreversíveis, ela própria resultante duma extensão quase trivial da 
Termodinâmica Clássica, a que chamamos Termoestática. 
Extensão quase trivial, porque ela decorre da redução da escala espacial e 
temporal em que na Termoestática se mede o equilíbrio. Trata-se, em rigor, 
de admitir que a Termoestática permanece válida ao nível do volume 
infinitesimal (princípio do estado local) e de extrair desse axioma todas as 
consequências matemáticas que nele se contêm. Esta é, aliás, a hipótese 
fundamental subjacente a toda a Mecânica dos Meios Contínuos, quer ela se 
formule como decorrente de axiomas matemáticos abstractos, quer se 
motive por considerações de ordem física. 
Esta unidade, formal e conceptual, de tratamento da Mecânica e da 
Termodinâmica dos Meios Contínuos não encontra expressão corrente nos 
manuais universitários e a estrutura curricular dos nossos cursos de 
engenharia também não a favorece ao separar a Mecânica dos Sólidos, a 
Mecânica dos Fluidos, a Hidráulica, a Transmissão (ou Transferência...) de 
Calor e Massa, os Fenómenos de Transporte, etc., do que resultam 
 
1
 A Mecânica Quântica e a Teoria da Relatividade vieram profundamente alterar esta visão cultural do 
Universo e o modo de encarar a Termodinâmica Estatística. Todavia, permanecem válidas as 
observações aqui feitas. 
2
 O caos determinístico é essencialmente macroscópico e a sua descoberta não se limitou a fazer 
reviver o interesse pela Termodinâmica macroscópica mas sim por muitos fenómenos e 
observações correntes de que a Física se desinteressara, como é, por exemplo, o caso do pêndulo 
que tinha ficado «congelado» nas situações redutíveis a soluções matemáticas conhecidas. 
 Termodinâmica Macroscópica 11 
 Prefácio da 1ª Edição 
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consequências significativas no relacionamento interdisciplinar e na 
investigação mais avançada3. 
Recordada a importância intrínseca da Termodinâmica Macroscópica e a 
impossibilidade, face ao estado actual do conhecimento, de a reduzir à 
Física Microscópica, não deve, todavia, minimizar-se a importância (e 
imprescindibilidade) da sua complementaridade4. Não é essa, porém, a 
questão que aqui se põe, mas sim a de identificar e ultrapassar as causas que 
subalternizaram a Termodinâmica Macroscópica no âmbito das ciências 
básicas. Essas causas têm muito a ver com o modo como a Termodinâmica 
é habitualmente formulada e apresentada, a que não é estranho o carácter 
atribulado de que se revestiu a sua evolução5. 
O nascimento da Termodinâmica como ciência está intimamente associada a 
Clausius que introduziu o conceito de entropia (1850), mas a fonte 
motivadora foram os trabalhos de Carnot6, que revelaram a possibilidade de 
estabelecer um limite intransponível para o rendimento de qualquer máquina 
térmica, independentemente da sua natureza ou do fluído utilizado para 
obter a conversão do calor em trabalho. Este rendimento só dependia das 
temperaturas extremas. 
 
3
 A esta situação não é certamente estranho o facto de a teoria matemática da Mecânica dos Meios 
Contínuos ter sido formulada utilizando apenas os princípios da Mecânica de Newton e uma 
relação fenomenológica (relação constituitiva) entre as forças e as deformações (tipicamente linear) 
baseada na observação experimental. A lei de Hooke para a Elasticidade, ou uma relação empírica 
ligando a pressão e a massa específica foram suficientes para criar a teoria matemática da 
elasticidade ou para Euler fundar a Mecânica dos Fluidos Perfeitos, sem necessidade de invocarqualquer modelo microscópico. 
 Significativamente, na Lei de Fourier, para a Condução do Calor (1822) está implícita a teoria do 
calórico e uma difusa interpretação dos fluxos de calor e dos calores específicos. A Termodinâmica 
Macroscópica, que daria a visão unitária ao conjunto e fundamentaria o tratamento quando existe 
dissipação, ainda não tinha surgido. Sob este aspecto, refira-se que os trabalhos de Carnot são de 
1824 e a publicação fundamental de Clausius, considerada o início da Termodinâmica, é de 1850. 
4
 Toda a argumentação anterior se sintetiza na observação de que o microscópico e o macroscópico 
são apenas níveis diferentes de abordagem da mesma realidade, ambos fundamentais para uma 
compreensão do mundo real onde habitamos. Este facto tende porem a ser esquecido, tanto pelos 
físicos (que privilegiam o microscópico), como pelos engenheiros, que assumem a atitude oposta e 
tendem a reduzir a Termodinâmica Macroscópica a regras operacionais ou ciclos térmicos, sem se 
aperceber das potencialidades unificadoras que ela contém e lhes evitaria alguns paradoxos. 
5
 Ver Truesdell (1980). Truesdell preocupa-se, sobretudo, com aspectos matemáticos da formulação, 
apresentando uma exaustiva bibliografia de trabalhos relevantes desde 1779 a 1979. 
6
 A publicação fundamental de Sadi Carnot, “ Réflexions sur la Puissance Motrice du Feu et sur les 
Machines Propres à développer cette Puissance”, Paris, Bachelier, 1824, foi integralmente 
republicada quase 50 anos depois, com as suas notas manuscritas entre 1824 e 1832 nos Annales 
Scientifiques de l´École Normale Superieur (1872). 
 Termodinâmica Macroscópica 12 
 Prefácio da 1ª Edição 
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É importante situar no seu contexto histórico esta evolução e sobretudo 
sublinhar o papel determinante que teve o aparecimento da máquina a vapor. 
A primeira, da autoria de Savery foi demonstrada em 1698, muito embora se 
devam a Newcomen as formas construtivas que estiveram na origem dos 
desenvolvimentos posteriores de Watt. 
Contrariamente às descobertas fundamentais que tinham feito da Física uma 
paradigma da Ciência, a máquina a vapor não nasceu num laboratório mas 
na realidade externa que a revolução industrial criara e para cujo 
desenvolvimento era crucial uma nova forma de energia, pois as únicas 
formas de energia aproveitáveis até aí eram o vento e as quedas de água, em 
instalações que raramente ultrapassavam os 10 kW de potência máxima. 
O que a máquina a vapor vinha por em evidência era a possibilidade de 
conversão da energia do fogo em energia mecânica, facto esse que para os 
cientistas da época trazia um desafio comparável ao que posteriormente 
trouxe, por exemplo, a descoberta da radioactividade. 
A teoria da máquina a vapor não era dedutível de concepções microscópicas 
e as reflexões de Carnot trouxeram, como contributo essencial, o conceito 
de ciclo. O mérito fundamental do conceito de ciclo é abstrair do que se 
passa a nível microscópico, pois sejam quais forem as transformações 
sofridas o objecto em estudo (o sistema) regressa ao ponto de partida, ou 
seja, à situação em que estava antes de ter sofrido qualquer transformação. 
Nas reflexões de Carnot está implícito o conceito de calórico como um 
fluido imaterial, conservado e indestrutível, que produz trabalho ao descer 
de nível térmico, em total analogia com o que se passa com a água numa 
roda hidráulica. Sabemos hoje que não é o calórico mas a entropia que pode 
usar-se nesta analogia7, mas na altura, nem o princípio da conservação da 
energia tinha sido estabelecido como um pilar fundamental, nem o conceito 
de entropia tinha surgido como elo imprescindível na ligação do 
microscópico ao macroscópico. 
Quando existem fenómenos térmicos, a dialéctica microscópico-
macroscópico8 foi e é de tal modo importante, que a tendência foi, e ainda é, 
 
7
 A analogia fracassava quando o calórico passava de uma temperatura mais elevada para uma mais 
baixa como sucede por exemplo na condução do calor em sólidos. 
8
 O sistema fechado continua sendo o domínio privilegiado da Física fundamental e é para ele que a 
Mecânica Quântica e os modelos microscópicos se formulam, dadas as simplificações formais que 
tal permite e a forma “natural” como se postula e se realiza o equilíbrio macroscópico em tal 
situação. Mas o mundo real, onde os seres vivos existem e as máquinas funcionam, são quase 
sempre sistemas abertos. Trata-se, novamente, de níveis diferentes mas complementares de 
abordagem, que ao não serem tidos adequadamente em conta apenas contribuem para a visão 
estreita e compartimentada do mundo que permeia todo o nosso ensino. 
 Termodinâmica Macroscópica 13 
 Prefácio da 1ª Edição 
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para reduzir a Termodinâmica aos sistemas fechados, deixando 
habitualmente para os textos das aplicações à engenharia o tratamento dos 
sistemas abertos, nos quais a ênfase é na conservação da energia, 
secundarizando ou omitindo mesmo as lacunas conceptuais e lógicas que 
podem existir nessa extensão. 
A existência da vida é incompatível com a hipótese do sistema fechado e 
esse facto deu origem à convicção generalizada, até meados deste século, de 
que a Termodinâmica se não aplicaria aos fenómenos da vida, o que é falso. 
Aliás, está intimamente associado à ultrapassagem deste erro de perspectiva 
o aparecimento da primeira teoria científica dos Ecossistemas, devida a R. 
Lindemann (Lindemann, 1942), depois aprofundada e difundida por Odum 
(1953). 
A evolução histórica que deu origem à Termodinâmica justifica, 
naturalmente, o modo sinuoso como se desenvolveu. O passo decisivo 
inicial foi o conceito de entropia e o enunciado do segundo princípio para 
sistemas isolados. Mas este enunciado, feito por Clausius (1850), antecede a 
aceitação generalizada do princípio da conservação da energia que se seguiu 
aos trabalhos fundamentais de Joule (1850). 
Se os trabalhos de Joule foram muito importantes, o aspecto crucial não 
foram os seus novos dados experimentais mas o novo paradigma 
interpretativo que os seus trabalhos provocaram, ou seja, o princípio da 
conservação da energia. 
O enunciado do princípio da conservação da energia implicou, como é 
óbvio, a elaboração prévia do conceito de energia e a identificação do calor 
como uma dessas formas de energia. Por isso o princípio da conservação da 
energia se identifica com a Primeira Lei da Termodinâmica. 
O aparecimento e evolução de uma teoria física nunca é linear, sem círculos 
viciosos e algumas tautologias. A Termodinâmica é disso um exemplo que 
perdura nos livros de texto correntes que directamente se inspiram de alguns 
clássicos famosos, atraiçoando algumas vezes as restrições e considerandos 
que permeiam os seus textos9. 
Nesta corrente, ainda largamente dominante, o ciclo de Carnot tem um papel 
central bem como a teoria dos pfafianos, ou das diferenciais não exactas. 
Pretendendo ser intuitivas, as demonstrações são artificiosas e sobretudo a 
origem de dificuldades formais e conceptuais logo que nos aproximamos do 
mundo macroscópico e real em que se passam os fenómenos macroscópicos 
directamente observáveis. 
 
9
 É esclarecedor ler Planck e os prefácios das suas várias edições. A 1ªedição é de 1897 e a 7ª de 
1922. 
 Termodinâmica Macroscópica 14 
 Prefácio da 1ª Edição 
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Ora, se tal tipo de formulação foi inteiramente justificada (e possivelmente 
sem alternativa) antes de o princípio da conservação da energia se ter 
transformado no pilar fundamental da Físicamoderna, é difícil entender que 
se continue a proceder como se tal princípio fosse demonstrável com base 
na argumentação aduzida ou nas experiências históricas que inspiraram a 
sua formulação. 
Se a perspectiva histórica é pedagogicamente importante numa introdução à 
Termodinâmica, a redução da Termodinâmica a essa perspectiva é 
dramaticamente empobrecedora da sua capacidade para integrar uma vasta 
área do conhecimento científico e cultural do presente. 
A finalidade destas notas é sublinhar que a aceitação do princípio da 
conservação da energia como pilar fundamental e já adquirido, permite 
reduzir a Segunda Lei da Termodinâmica à formalização, quase trivial, da 
evidência mais palpável da nossa existência, que é o escoar do tempo em 
sentido único ou a existência, intransponível, da «dissipação» da «energia». 
Essa formalização é bem mais acessível e natural do que a tortuosa 
descoberta da entropia como o factor integrante de uma diferencial inexacta 
que emerge depois de laboriosos exercícios mentais em torno de ciclos 
motores irrealisáveis. Dir-se-ia que o conceito de irreversibilidade, que é o 
facto mais constante e permanente da nossa existência humana, só poderia 
ser acessível a quem fosse capaz de reduzir o que observa a imaginários 
ciclos de Carnot. Como esse dom é privilégio de poucos, a maioria reduz a 
Termodinâmica a conceitos esotéricos e regras empíricas para ultrapassar 
exames, uns e outros destinados ao limbo do esquecimento acelerado, como 
ganga inútil. 
Ora, o próprio termo “dissipação”, que o uso corrente consagrou, põe em 
evidência que algo desapareceu.10 
O que desapareceu, ou se dissipou, foram as formas de energia que a Física 
Perfeita descobriu e estão no cerne da visão do mundo que a Física nos 
trouxe e o reduz a partículas cada vez mais elementares.11 
 
10
 Planck adopta o princípio da conservação da energia como um facto “testado por séculos de 
experiência humana e repetidamente verificado de que o movimento perpétuo é impossível, sejam 
quais forem os meios utilizados, mecânicos, térmicos, químicos ou outros”, mas discorda da 
interpretação da segunda lei como uma dissipação de energia, invocando o exemplo da 
irreversibilidade associada à difusão de gases perfeitos ou à diluição adicional de uma solução já 
diluída, na medida em que nesses fenómenos não existe nenhuma perceptível transferência de 
calor, de trabalho externo ou de transformação de energia. Esta observação é imediatamente 
contestável atendendo a que a diferença de potencial químico existente antes da mistura poderia ter 
sido utilizada na produção de trabalho, como imediatamente decorre da formulação de Gibbs e o 
próprio Planck teria certamente notado se não tivesse construído a sua Termodinâmica, como quase 
todos os clássicos, a partir das equações de estado de um gás perfeito. 
 Termodinâmica Macroscópica 15 
 Prefácio da 1ª Edição 
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As formas de energia da Física Perfeita são «personalizadas e 
aristocráticas», convertíveis integralmente entre si, e directamente 
mensuráveis, macroscopicamente. 
Para elas, o tempo pode fluir por igual em ambos os sentidos e a eternidade 
é o seu universo natural. 
Nesse mundo perfeito, a degradação não existe. A degradação é o preço da 
realidade no mundo real e macroscópica em que existimos. 
Nesse mundo, as formas macroscópicas de energia «personalizadas e 
aristocráticas», degradam-se no anonimato microscópico da agitação 
térmica, sem possibilidade de recuperação integral, porque tal recuperação 
exigiria outra perfeição inatingível que seria a existência de uma fonte 
infinita a zero Kelvin. 
Conciliar a conservação da energia total com a degradação macroscópica 
das formas «personalizadas e aristocráticas» de energia, levou directamente 
à concepção da existência de tais formas ao nível microscópico. 
O mesmo conceito de perfeição e eternidade persiste assim, e a imperfeição 
que constatamos ao nível macroscópico passou a ser o resultado de apenas 
nos ser perceptível o colectivo! 
O texto que se segue, destina-se a alunos que já tiveram uma primeira 
abordagem da Termodinâmica num curso Geral de Física e assimilaram já 
os conceitos fundamentais da Álgebra e da Análise Matemática. 
Numa forma próxima da actual, foi objecto das minhas aulas teóricas de 
Termodinâmica I para o curso de Engenharia Mecânica quando voltei a 
reger esta disciplina em 1990/91 e 1991/92. 
A sua origem encontra-se na minha actividade de assistente do Prof. Gouvêa 
Portela quando em 1960/61 iniciou a regência de Termodinâmica para 
Engenharia Mecânica. 
A minha preocupação de unidade formal e de coerência com a Mecânica e a 
Termodinâmica dos Meios Contínuos, com particular relevância para a 
Transmissão de Calor e Massa e a Mecânica dos Fluidos remonta à minha 
Tese de Concurso para Catedrático publicada em 1965. 
Os desenvolvimentos posteriores no âmbito da Termodinâmica dos 
Processos Irreversíveis, a vulgarização do caos determinístico e da auto-
organização em processos dissipativos, bem como o estímulo cultural que a 
cosmologia moderna, o ambiente e a economia actualmente suscitam, 
 
11
 Note-se como a justificação de Planck para o primeiro princípio exclui, implicitamente, todos os 
modelos microscópicos como sendo deste mundo, pois eles traduzem, todos, um conceito de 
movimento perpétuo. 
 Termodinâmica Macroscópica 16 
 Prefácio da 1ª Edição 
________________________________________________________________________________________ 
 
 
levaram-me a pensar que teria interesse reintroduzir este modo de encarar a 
Termodinâmica num âmbito mais alargado. 
Valorizando a estrutura conceptual sobre as aplicações imediatas, perde-se 
em utilitarismo mas ganha-se em amplitude. Se o tempo o propiciar, as 
aplicações surgirão para demonstrar que a melhor prática é sempre a que se 
inspira numa sólida teoria12. E em Física, uma sólida teoria é sempre a que 
resiste a uma formulação matemática rigorosa e sem artifícios dedutivos. 
Pessoalmente, sempre entendi a Termodinâmica Macroscópica como uma 
modelo de simplicidade formal e dedutiva. 
Pedagogicamente, o seu valor formativo decorre disso mesmo, ou seja, da 
capacidade de construir algumas certezas a partir de um conjunto reduzido 
de factos evidentes e de alguns conceitos e definições suficientemente 
assimilados para nunca mais serem esquecidos. 
Como nota final, devo novamente sublinhar que esta ênfase na 
Termodinâmica Macroscópica não só não visa minimizar a Termodinâmica 
Estatística como constitui a base lógica para a sua introdução e 
desenvolvimento a partir dos conceitos fundamentais da Mecânica Quântica. 
A perspectiva microscópica da entropia aparece então, com toda a clareza, 
associada ao processo de inferência Bayesiana e à Teoria da Informação de 
Shanon. Alias, foi esse o ponto de vista adoptado quando assumi a regência 
da disciplina em 1966, motivado pela preocupação de introduzir o conceito 
de entropia de modo não axiomático, como sucedia no curso do Prof. 
Gouvêa Portela, directamente inspirado da formulação de Tisza-Callen. 
Aquele modo de apresentar a Termodinâmica, na sequência de alguns 
trabalhos notáveis de Jaynes, encontra-se exemplarmente tratado por 
Tribus13, que era adoptado como um dos livros de texto fundamentais. 
 
JJDD 
1995 
 
12
 O texto “Prática de Termodinâmica”, reeditado pela AEIST em 1991, responde parcialmente às 
necessidades de ilustração da teoria e exemplifica a utilização nos casos habituais da engenharia. A 
sua profunda revisão aguarda, porém, melhor oportunidade. 
13
 Tribus (1961).Prefácio da 2ª Edição 
A primeira edição desta Termodinâmica foi proposta à IST Press para 
publicação em 1995 e submetida ao processo de revisão habitual nesta 
editora. O parecer elaborado pelo revisor, invulgarmente cuidadoso, 
minucioso e extenso, concluía pela qualidade e originalidade da obra e 
recomendava a publicação, desde que corrigidas algumas questões. O 
contributo deste revisor, que para nós continua anónimo e a quem 
sinceramente agradecemos, foi muito estimulante e suscitou a decisão de 
não só atender às sugestões como ainda a de aprofundar e clarificar outros 
aspectos aconselhados pela experiência da sua utilização pelos estudantes. 
Quando o parecer do revisor foi recebido, em 1998, o autor da 1ª edição, 
embora responsável, não estava já directamente envolvido na regência da 
disciplina de Termodinâmica I para a Licenciatura em Engenharia Mecânica 
no IST, e assumira entretanto a responsabilidade pela disciplina de 
Termodinâmica na Licenciatura em Engenharia do Ambiente. Este facto 
veio sublinhar a importância da reflexão já expressa no prefácio da primeira 
edição do livro acerca da unidade global da Termodinâmica Macroscópica e 
do valor pedagógico e metodológico da sua estrutura conceptual e dedutiva, 
facilmente perdida quando reduzida às aplicações (expeditas) das várias 
engenharias. De facto, para além da fundamentação rigorosa das equações 
fundamentais dos meios contínuos, em particular da Mecânica dos Fluidos e 
da Transmissão de Calor iniciada há muitos anos (ver, por exemplo, 
Domingos, 1964, 1966) havia a extensão aos organismos vivos (Sousa et al., 
2004) e à Economia (Domingos e Sousa, 2004), que o formalismo 
matemático e/ou o conteúdo físico permitiam unificar sob múltiplos 
aspectos, como tem vindo a ser demonstrado pelo Prof. Tiago M. D. 
Domingos e sua equipa. 
Posteriormente, foi confiada ao Prof. Tiago M. D. Domingos a regência da 
disciplina de Termodinâmica para a Licenciatura em Engenharia do 
Ambiente, tendo utilizado e testado o texto revisto que ora se apresenta, e a 
que foi naturalmente associado como segundo autor. 
Em verdade, tudo o que nesta segunda edição difere da primeira é da autoria 
do Prof. Tiago M. D. Domingos (o que justifica também que ele surja agora 
como um dos autores do texto), o qual, além de ter considerado as sugestões 
e corrigido as gralhas assinaladas pelo revisor, incorporou a experiência 
adquirida com a utilização do texto pelos alunos. Para além destas evidentes 
melhorias, são sobretudo relevantes os contributos de natureza científica que 
trouxe a esta edição, e de entre os quais se destacam: 
 Termodinâmica Macroscópica 
 Prefácio da 2ª Edição 
________________________________________________________________________________________ 
 
 
18 
1) Aprofundamento da distinção entre os conceitos de energia interna e de 
calor que estão na origem de contradições e incoerências em muitos 
livros de texto, sobretudo quando existe transferência de massa. 
2) Reformulação da apresentação feita por H. B. Callen, no seu consagrado 
livro Thermodynamics and an Introduction to Thermostatistics, do 
formalismo de Tisza. Como se mostra nesta edição, as componentes do 
formalismo de Tisza que não foram considerados por Callen são 
essenciais para a coerência do conjunto. 
3) Introdução do formalismo das formas diferenciais, eliminando a 
necessidade de utilizar o método dos jacobianos e substituindo o método 
das áreas para a manipulação das derivadas parciais. 
4) Utilização sistemática do formalismo das formas diferenciais ao longo 
de todo o curso: 
a) Dedução das expressões para as variáveis intensivas nas formas 
diferenciais da equação fundamental. 
b) Dedução dos princípios de extremo para a energia interna e para os 
potenciais termodinâmicos. 
c) Obtenção das relações de Maxwell. 
d) Introdução de um algoritmo para a redução de derivadas parciais a 
coeficientes termodinâmicos. 
5) Distinção clara entre princípios de extremo, que se aplicam só a sistemas 
compostos, e características de convexidade e concavidade das equações 
fundamentais nas diferentes representações, que se aplicam a sistemas 
simples. 
Tal como se refere no título, trata-se de um livro sobre Princípios e 
Conceitos de Termodinâmica Macroscópica. Acrescente-se que se destina 
sobretudo a estudantes universitários de Engenharia e de Física. As 
aplicações da Termodinâmica Macroscópica a áreas especializadas de 
engenharia decorrem dedutivamente e com toda a naturalidade deste tronco 
comum. 
 
JJDD 
2004 
 
 
 
Agradecimentos 
Gostaríamos de agradecer ao revisor deste livro, cuja revisão extremamente 
cuidadosa o permitiu melhorar substancialmente. 
Gostaríamos também de agradecer aos alunos cujos comentários durante as 
aulas de Termodinâmica da Licenciatura em Engenharia do Ambiente do 
Instituto Superior Técnico enriqueceram diversos pontos do texto, em 
particular o Nuno Cegonho, o Tiago Veiga e o Pedro Antunes. 
Gostaríamos em particular de agradecer à aluna Alexandra Nogal, cujo 
estudo extremamente cuidadoso deste texto permitiu detectar e eliminar um 
elevado número de gralhas. 
 
 
1. Física Perfeita e Termodinâmica 
Macroscópica 
 
Theoretical Physics is the science of 
successful approximations 
Stauffer e Stanley (1991) 
1.1. Física Perfeita: Reversibilidade 
Designamos por Física Perfeita a Física onde não existe atrito nem 
dissipação e em que a expressão matemática das suas leis é invariante para 
as transformações de t em (- t), sendo t a variável tempo. Em termos 
formais diremos que são simétricas para inversões no tempo. 
As leis de Newton, bem como as equações de Maxwell para o 
electromagnetismo e as equações da mecânica quântica gozam da mesma 
propriedade. 
A simetria para as inversões no tempo significa que todos os fenómenos 
descritos por essas equações são reversíveis no tempo. Num universo 
descrito, totalmente, por equações com simetria no tempo, é impossível 
para um observador distinguir se os fenómenos que observa se desenrolam 
a caminho do futuro ou a caminho do passado. 
Nesse Universo, os conceitos de passado e de futuro (que estão ligados ao 
fluir do tempo num único sentido) não se distinguiriam dos de espaço. 
Passado e Futuro seriam um pouco como os equivalentes de Norte e Sul ou 
Este e Oeste. Neste espaço-tempo, todos os pontos seriam igualmente 
acessíveis, podendo caminhar-se no tempo, como se caminha no espaço, 
em qualquer sentido. 
O conceito de causalidade está intimamente ligado ao sentido único do 
fluir do tempo. De facto, quando afirmamos que a causa A provocou o 
efeito B, está implícito que A antecedeu B. Esta clarificação do conceito 
de causalidade, permite esclarecer melhor o conceito de determinismo em 
Física e mostrar que o determinismo não implica a causalidade. 
Por exemplo, o movimento da Terra e dos planetas à volta do Sol é 
determinístico no sentido em que as equações da mecânica nos permitem 
prever, com todo o rigor, as suas posições relativas em qualquer instante 
desde que ela seja conhecida num instante dado. Essa previsão, tanto pode 
fazer-se em relação ao passado como em relação ao futuro. O movimento é 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
22 
determinístico. Todavia, não existe relação de causalidade no sentido 
referido porque não podemos afirmar (no âmbito das mesmas leis da 
mecânica que estabelecem o determinismo das posições relativas) que a 
causa do movimento de um dos planetas foi o sol, ou outro planeta, etc., 
uma vez que a inversa também seria igualmente aceitável. 
As simples considerações anteriores mostram como é importante e 
fundamental a existência de uma variável tempo que flui num só sentido e 
as implicações filosóficas e metafísicas que teria a suareversibilidade. 
Mesmo nos inúmeros filmes e romances de ficção científica em que a 
“máquina do tempo” permite saltos para o passado ou para o futuro, nunca 
se vai além de translações descontínuas na origem da coordenada tempo. 
Salta-se para o futuro ou o passado, mas logo que se “aterra” o tempo 
retoma o seu fluir em sentido único para que as relações de causalidade 
que formam a trama do enredo sejam inteligíveis. Isto é, na ficção podem-
se fazer “aterrar” os heróis de hoje com as espingardas de hoje no tempo 
do Império Romano. Todavia, as balas que essas espingardas disparam vão 
da espingarda para o inimigo e não do corpo do inimigo para dentro da 
espingarda. 
Se, no mundo real, o tempo flui em sentido único, a questão que 
imediatamente se põe é se o tempo teve uma origem absoluta. Isto é, se 
existe no passado algo que corresponda à origem do tempo, ao seu 
nascimento. Esse seria também o nascimento do próprio Universo. Esta 
questão é hoje uma questão central activamente discutida em cosmologia e 
em astrofísica. A tendência actual é a de pensar que houve essa origem e 
de, inclusivamente, a quantificar relativamente ao presente, utilizando para 
tal as equações e teorias fundamentais da física moderna, nomeadamente a 
relatividade geral e a mecânica quântica. 
Todavia, e por mais surpreendente que pareça, a Física Moderna, tal como 
a conhecemos, é essencialmente uma Física Perfeita e os modelos 
microscópicos da matéria que actualmente possuímos baseiam-se 
inteiramente no pressuposto de simetria temporal das equações e da 
inerente reversibilidade temporal que tal simetria implica. Isto é, nessa 
Física Perfeita, a flecha do tempo (como lhe chamou Eddington) não tem 
um sentido único. 
O mundo real que macroscopicamente observamos não se comporta de 
acordo com a Física Perfeita. Todavia, e em muitos casos, as previsões 
que ela permite fazer possuem um extraordinário rigor experimental de 
que é exemplo marcante e fundamental a previsão do movimento dos 
planetas e seus satélites em torno do Sol. O carácter quase divino que a 
previsão do movimento dos astros representou foi um factor decisivo na 
evolução do pensamento moderno e na generalização dos modelos de 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
23 
raciocínio determinista aos mais variados domínios da actividade humana, 
nomeadamente à economia. 
1.2. Termodinâmica Macroscópica: 
Irreversibilidade 
No mundo real, macroscopicamente observável, não existe reversibilidade 
no tempo. Nas equações da mecânica e nas outras equações fundamentais 
da Física Perfeita introduziram-se por isso termos correctivos, para que as 
previsões dadas pelas equações se ajustem à realidade observável. 
Se for a queda de um papel na atmosfera, introduz-se a resistência do ar. 
No movimento de um pêndulo, será o atrito no fulcro, a resistência do ar, 
etc. Estes termos quebram a simetria temporal das equações. 
Um pêndulo posto em movimento e entregue a si próprio acabará por 
parar, mesmo se suspenso no interior de um recipiente onde se fez o 
vácuo. Uma onda electromagnética que transmite um sinal de rádio 
atenua-se à medida que se propaga. 
Com a quebra da simetria, desaparece a conservação da energia nas formas 
contempladas pela Física Perfeita. O atrito mecânico faz desaparecer 
energia mecânica, isto é, dissipa energia mecânica, tal como uma 
resistência eléctrica faz desaparecer energia eléctrica, isto é, dissipa 
energia eléctrica, etc. 
Seja qual for a forma macroscópica de energia considerada na Física 
Perfeita (mecânica, electromagnética, química, etc.), existe sempre 
uma dissipação, que se associa ao equivalente a um atrito. Quando 
falamos de dissipação de energia, está sempre implícito que essa 
dissipação se refere a uma das formas de energia contempladas na 
Física Perfeita. 
Atrito (em sentido mecânico restrito ou em sentido generalizado), 
dissipação de energia, irreversibilidade, quebra de simetria temporal, estão 
sempre associados, pois têm como raiz comum a “imperfeição” do mundo 
onde existimos. 
A dicotomia aqui introduzida e realçada entre o que designamos por Física 
Perfeita e o que chamamos Termodinâmica Macroscópica, destina-se a 
acentuar a importância que tal dicotomia tem para a compreensão e 
assimilação da estrutura conceptual da Termodinâmica Macroscópica, a 
qual pressupõe a prévia familiarização com os conceitos e métodos da 
Física Perfeita. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
24 
À Termodinâmica Macroscópica compete integrar as “imperfeições” em 
que radica o fluir do tempo em sentido único e negam ao Homem a 
intemporalidade divina da eternidade. 
Podemos assim dizer que: 
Termodinâmica Macroscópica = Física Perfeita + Imperfeições 
1.3. Termodinâmica Macroscópica e Física 
Estatística: Reversibilidade Microscópica e 
Irreversibilidade Macroscópica 
Como ponto de partida da Física Teórica tivemos a Mecânica de Newton 
que nasceu e ganhou validade universal com a capacidade de previsão do 
movimento dos astros. Tratar os astros como pontos materiais que se 
movem sem atrito é uma aproximação praticamente perfeita quando se 
trata de prever as suas trajectórias e movimentos relativos. Neste 
movimento há conservação de energia e estamos no domínio por 
excelência da Física Perfeita.14 É ao mesmo tipo de idealização que se 
recorre quando se começa a abordar a constituição da matéria ao nível 
microscópico. É assim como se a “perfeição” existisse nos extremos do 
muito grande e do muito pequeno, mas não existisse à nossa escala do 
observável. 
Note-se porém uma diferença fundamental entre os dois extremos no que à 
observação e validação experimental da teoria se refere. No caso dos 
astros, as nossas observações e medidas não afectam praticamente o 
resultado da observação, enquanto que ao nível microscópico a observação 
interfere directamente e de modo significativo com o observado e nunca 
pode assumir por esse facto um carácter absoluto. O princípio da incerteza 
de Heisenberg foi o primeiro reconhecimento formal desta incapacidade 
intrínseca do ser humano em poder vir a conhecer na sua totalidade a 
constituição íntima da matéria. Esta constatação tem implicações de 
natureza filosófica e cultural para os que buscam uma explicação do 
universo em torno de princípios ou axiomas cada vez mais universais. 
As observações anteriores, ditadas pelo desenvolvimento recente da Física 
Microscópica, em nada alteram a natureza puramente macroscópica de 
 
14
 Em rigor, as interacções Sol-Lua que provocam as marés dão origem a uma dissipação de energia 
(nos oceanos) que se reflectem na redução do período de rotação da Terra. Todavia, o valor 
estimado para esta redução do período é tão pequeno (1-2 milisegundos por século) que pode de 
facto desprezar-se. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
25 
conceitos como os de calor e temperatura, os quais têm necessariamente de 
entender-se (quando se busca a sua interpretação ao nível microscópico) 
como o resultado da interacção mútua de um número muito grande de 
agregados elementares para que a observação macroscópica dessas 
interacções tenha o sentido de uma média estável (e repetitiva) na escala 
de tempo adequada. A forma de que se reveste a energia ao nível 
microscópico, ou de que forma interaccionam os agregados ou partículas 
elementares, é irrelevante para a Termodinâmica Macroscópica. 
Fica no entanto de pé uma questão recorrente e que é a da coerência da 
transição microscópico-macroscópico e que é: 
Como é que uma concepção microscópica da matéria assentena Física Perfeita e no seu determinismo (mesmo tendo em 
conta o princípio da incerteza de Heisenberg e outras 
aquisições mais recentes como o caos determinístico), em que 
não existe flecha do tempo, é susceptível de explicar um facto 
tão fundamental e intransponível como é o fluir do tempo em 
sentido único, facto a que a própria irreversibilidade de todos 
os fenómenos naturais dá conteúdo e sentido? 
É habitual afirmar-se que a resposta a esta questão se encontra na Física 
Estatística iniciada por Boltzman, o que não é verdade em sentido lato. A 
verdade (tornada evidente pelo estudo teórico e experimental dos sistemas 
termodinâmicos muito afastados do equilíbrio) é que continua a não existir 
uma resposta satisfatória e convincente para essa questão central, não só da 
Física Moderna como do pensamento filosófico contemporâneo. 
Esta perspectiva, necessariamente sumária, deve ter-se em conta ao 
abordar a posição e o papel da Termodinâmica Macroscópica no âmbito da 
Física e do pensamento filosófico contemporâneos. Espera-se evitar assim 
a fácil tentação de pensar que existe já toda uma teoria consistente e 
completa levando sem contradições nem falhas das partículas elementares 
aos observáveis macroscópicos e à cosmologia. Quando tal teoria existir, a 
Termodinâmica Macroscópica continuará a ser o elo fundamental que dá 
ao fluir do tempo o sentido radical e inultrapassável que os humanos lhe 
conhecem. 
O modo como surgiram e evoluíram os conceitos que deram origem à 
Termodinâmica é importante para situar na perspectiva adequada muitas 
das contradições e inconsistências que ainda permeiam muitos dos textos e 
cursos de física. Nestes, a sedução pela elegância formal da física perfeita 
contrasta com os raciocínios obscuros, tortuosos e muitas vezes artificiais 
com que a Termodinâmica é apresentada. Esta dicotomia remonta ao 
século XIX. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
26 
Velha como o fogo, a Termodinâmica é por vezes acusada de ser o único 
ramo da física que nasceu com os engenheiros e de ter sido construída por 
Carnot para explicar factos observáveis (e economicamente importantes da 
máquina a vapor) contrariamente ao electromagnetismo, por exemplo, em 
que as equações de Maxwell anteciparam a existência de fenómenos só 
posteriormente observados, ou das equações de Newton que permitiram 
prever a existência de satélites desconhecidos em planetas há muito 
observados. 
A verdade porém é que a Termodinâmica Macroscópica teve um papel 
central no desenvolvimento da Física Moderna e surgiu como corpo de 
doutrina e método de análise tornado exemplar na medida em que, 
dispondo de um conjunto restrito e imperfeito de observações, conseguiu, 
por pura dedução lógica a partir de conceitos fundamentais, estabelecer 
relações de validade universal e incontroversa sem recurso a qualquer 
modelo microscópico da constituição da matéria. 
Surgida numa época de crise e de descrença nos modelos microscópicos da 
matéria, a força e generalidade da Termodinâmica Macroscópica como 
doutrina científica e estrutura conceptual provém do facto de ser 
independente de qualquer pré-conceito ou modelo do que se passa quanto 
à estrutura íntima da matéria. 
É certo que esta generalidade e independência lhe confina o âmbito da 
aplicabilidade imediata a situações concretas. Por exemplo, a relação entre 
os calores específicos de qualquer substância é do seu âmbito, mas o valor 
concreto assumido pelo calor específico de uma substância particular não 
lhe é acessível pelo cálculo directo a partir dos seus princípios 
fundamentais. Tal valor concreto terá de ser obtido experimentalmente ou, 
eventualmente, por cálculo a partir de modelos e hipóteses quanto à 
estrutura íntima da matéria que constitui tal substância particular. 
A Física Estatística, que estuda os observáveis macroscópicos que 
resultam do comportamento colectivo de agregados de muitas partículas 
microscópicas, pode permitir o cálculo directo de muitas propriedades 
termodinâmicas de substâncias particulares sem ter que recorrer à 
experimentação. 
A Física Estatística complementa assim a Termodinâmica Macroscópica. 
Mas complementar não é substituir. Contrariamente ao que se afirma com 
frequência, a Termodinâmica Estatística não só não substitui como, 
sobretudo, não fundamenta completamente a Termodinâmica 
Macroscópica. 
O que sucede, e não deixará de continuar a suceder, é o facto de a 
Termodinâmica Macroscópica ser um teste fundamental (porventura 
indirecto) da Física Estatística, na medida em que os observáveis 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
27 
macroscópicos que esta for susceptível de prever não podem contradizer as 
relações fundamentais que a Termodinâmica Macroscópica estabelece a 
partir dos seus princípios fundamentais. E estes, como já sublinhámos, são 
independentes de qualquer modelo ou hipótese sobre a constituição 
microscópica da matéria. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
28 
2. rincípios da Termodinâmica 
A introdução precedente situa o fio condutor deste curso de 
Termodinâmica. 
Partindo do Princípio da Conservação da Energia como um dado adquirido 
e indiscutível, trata-se agora de integrar na teoria o facto incontroverso e 
indiscutível da dissipação da energia e do sentido único da flecha do tempo 
que lhe está associada, ou seja, da irreversibilidade. 
Para isso precisamos de exprimir com todo o rigor formal possível essa 
constatação do trivial, que é a existência de um passado e de um futuro ou 
a da dissipação das formas nobres da energia. 
Constatar e aceitar que a dissipação de energia é macroscopicamente 
inevitável, ou que o fluir do tempo se faz em sentido único, constitui na 
sua radical essência, esse princípio, famoso e universal, que é a segunda lei 
da Termodinâmica. 
2.1. Definições e Convenções 
A capacidade de comunicar depende da existência de símbolos, vocábulos, 
imagens, sons, etc, igualmente inteligíveis por ambos os interlocutores e 
com significado equivalente. A partir desse conjunto, é possível elaborar 
conceitos e alargar a base comum que permite ampliar e facilitar a 
comunicação. 
Em Física, os conceitos fundamentais formam-se, habitualmente, a partir 
de factos da vida corrente que vão sendo sucessivamente elaborados até 
assumirem a forma rigorosa e sem ambiguidades que lhes confere a sua 
expressão matemática. Esta atitude assume a sua expressão mais abstracta 
na física moderna e em particular na mecânica quântica, em que o conceito 
se condensa na própria equação matemática ou nas propriedades de uma 
solução particular. A expressão do conceito pode então nem sequer ser 
susceptível de tradução sensorial rigorosa, porque tal expressão rigorosa 
existe apenas na própria linguagem matemática que o traduz. 
Conceitos correntes como calor, temperatura, quente, frio, etc. existem 
na linguagem corrente mas sem o rigor adequado. Nestes casos, 
procederemos à sua discussão e reelaboração até assumirem a forma 
rigorosa que utilizaremos em Termodinâmica. 
A partir destes conceitos o corpo da teoria obtém-se então por dedução 
lógica a partir de um número mínimo de axiomas ou princípios 
fundamentais (que também designaremos por leis ou princípios). 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
29 
Como já se referiu, a Termodinâmica Macroscópica (TM) foi construída 
sem recurso a qualquer modelo microscópico, partindo de um número 
muito reduzido de conceitos e princípios fundamentais. 
Basicamente, a Termodinâmica Macroscópica estabelecerelações 
funcionais entre grandezas aplicáveis à generalidade dos sistemas. 
A particularização para substâncias particulares exige o recurso à 
experimentação que pode, eventualmente, ser substituída por cálculo a 
partir de modelos microscópicos adequadamente validados. 
É muito importante haver um entendimento claro dos termos e conceitos 
que iremos utilizar. 
Muitas das dificuldades encontradas na apreensão da Termodinâmica 
radicam na pouca atenção prestada às definições e ao significado estrito 
dos termos utilizados. 
Sistema termodinâmico: É a região do espaço, contida numa superfície 
geométrica fechada, sobre a qual incide o nosso estudo. Este espaço pode 
ser dividido em sub-regiões fechadas e disjuntas a que chamamos 
subsistema. 
Ao espaço, para que constitua um sistema termodinâmico, apenas se exige 
que contenha energia. Mesmo num espaço onde exista o vácuo perfeito 
teremos um sistema termodinâmico desde que a superfície material que o 
confina não esteja a 0 K. Esta condição verifica-se sempre no Universo 
conhecido (a radiação de fundo no espaço exterior corresponde a uma 
temperatura de 3-4 K). 
2.1.1. Variáveis 
As variáveis termodinâmicas são grandezas físicas que permitem 
caracterizar o sistema quanto ao modo como acumula e troca energia. 
As variáveis extensivas são variáveis escalares somáveis (volume, V, 
massa, m, quantidades dos componentes químicos independentes, Ni). No 
caso geral de a variável ser um tensor, consideram-se como variáveis 
termodinâmicas as suas componentes independentes. 
As variáveis intensivas são variáveis escalares não somáveis (pressão, P, 
temperatura, T, potenciais químicos dos componentes químicos 
independentes, µi). 
A aditividade ou não aditividade que distingue as variáveis extensivas das 
variáveis intensivas é considerada no seu sentido físico, isto é, quando 
juntamos um sistema com massa m1 a um sistema com massa m2, o sistema 
conjunto fica a possuir a massa 1 2m m m= + . Tal não sucederia se em vez 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
30 
da massa (ou do volume, por exemplo) se tratasse de pressões ou 
temperaturas15. 
A Termodinâmica Macroscópica trata apenas das situações em que o 
sistema pode ser dividido em subsistemas no interior dos quais as 
variáveis intensivas são macroscopicamente uniformes.16 
É ainda importante definir as variáveis molares. Para isso comecemos por 
definir N, o número total de moles de todos os componentes químicos 
existentes no sistema: 
 
1
r
i
i
N N
=
≡ ∑ , (0.1) 
sendo r o número de componentes químicos existentes no sistema. As 
variáveis molares são então definidas como o quociente de cada variável 
extensiva por N: 
 
S
s
N
= , (0.2) 
 
U
u
N
= , (0.3) 
 
V
v
N
=
, (0.4) 
 
15
 A definição das variáveis extensivas e intensivas em termos da aditividade é susceptível de 
alguma ambiguidade ou mesmo contradição, quando se trata de grandezas não escalares. A 
origem da designação de propriedade extensiva encontra-se no facto de a "extensão" do sistema 
ser directamente proporcional ao seu valor, o que é óbvio quando se trata, por exemplo, do 
volume, da massa, ou das quantidades dos componentes químicos, pois nesse caso é a "extensão" 
do sistema, no sentido de "tamanho", "dimensão", “massa” que está em causa. Há porém 
variáveis extensivas em que a sua associação à "extensão" física do sistema não é óbvia. Nesses 
casos, a ambiguidade desaparece se a sua definição se fizer a partir da expressão do fluxo 
infinitesimal de energia que o sistema pode trocar, pois este fluxo se exprime sempre como o 
produto escalar de uma diferencial por uma quantidade finita. A diferencial é sempre a 
diferencial do deslocamento generalizado, que, para os tipos de trocas de energia consideradas 
neste texto, é uma variável extensiva. O factor finito é sempre a força generalizada, que, para os 
tipos de trocas de energia consideradas neste texto, é uma variável intensiva. Notar-se-á que 
falamos de produto escalar e não de produto vectorial. 
16
 No caso limite da Termodinâmica Macroscópica dos Meios Contínuos o subsistema reduz-se a 
um volume infinitesimal e as variáveis intensivas passam a ser função do ponto. A hipótese 
fundamental é então que no subsistema infinitesimal se verificam, a cada instante, as mesmas 
relações termodinâmicas que existiriam num sistema de dimensão finita em que as propriedades 
intensivas seriam uniformes e de igual valor ao que se verifica no ponto. Este é o ponto de 
partida para a Termodinâmica dos Processos Irreversíveis. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
31 
 
, 1, ,jj
N
x j r
N
= = … . (0.5) 
Estas variáveis são respectivamente designadas como entropia molar, 
energia interna molar, volume molar, e fracção molar do componente 
i. As variáveis molares são sempre designadas com letras minúsculas. 
Dada a definição (0.1), temos que 
 
1
1
r
j
j
x
=
=∑ . (0.6) 
As variáveis externas são variáveis que podem ser fisicamente medidas 
do exterior do sistema termodinâmico. São, por exemplo, o volume, a 
massa, o campo eléctrico, o campo magnético. A identificação destas 
variáveis é fundamental para o desenvolvimento da teoria pois é através 
delas que podemos medir os fluxos de energia perfeita entre o sistema 
termodinâmico e o seu exterior, independentemente de qualquer hipótese 
sobre o que no seu interior se passa. 
As variáveis internas não são directamente mensuráveis e o seu valor 
apenas pode obter-se por cálculo a partir do valor de variáveis externas. A 
energia interna e a entropia são variáveis internas. 
2.1.2. Paredes 
À superfície que contém o sistema termodinâmico chamamos parede. As 
paredes (que constituem idealizações) correspondem a casos limite de 
realização prática e são caracterizadas pelas propriedades físicas que as 
definem. 
A parede impermeável ao componente k não permite a passagem através 
dela de moléculas do componente químico k. A parede impermeável não 
permite a passagem de moléculas de qualquer componente químico. 
A parede adiabática não permite através dela a passagem de calor. A 
parede adiabática corresponde a um conceito particularmente importante 
em termodinâmica macroscópica e corresponde ao caso limite de um 
isolamento térmico perfeito, o qual se obtém com um material isolante de 
espessura infinita. Na prática, corresponde ao limite assimptótico dos 
resultados que se obtêm aumentando progressivamente o isolamento17. 
Uma parede adiabática é necessariamente uma parede impermeável. 
 
17
 A possibilidade de, assimptoticamente, se poder realizar uma parede adiabática foi crucial para o 
estabelecimento da base fenomenológica da Termodinâmica. A calorimetria, que levou à 
formulação da teoria do calórico, começou com essa possibilidade experimental. Em termos 
puramente lógicos, seria absurdo procurar estudar o que era o calor se não fosse possível, sequer, 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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32 
A parede adienergética não permite através dela qualquer passagem de 
energia. Uma parede adienergética é necessariamente uma parede 
adiabática. 
Os sistemas que não estão contidos em nenhuma parede ou que se 
encontram contidos por paredes (fixas ou não) permeáveis a pelo menos 
um dos componentes são designados como sistemas abertos. Os sistemas 
contidos por paredes impermeáveis são designados como sistemas 
fechados.18 Os sistemas contidos por paredes adiabáticas são designados 
como sistemas adiabáticos (e portanto,são necessariamente sistemas 
fechados).19 Os sistemas contidos por paredes adienergéticas são 
designados como sistemas isolados (e, portanto, são necessariamente 
sistemas adiabáticos). 
2.1.3. Convenção de Sinais 
O sinal dos fluxos de energia e massa permutados pelo sistema com o 
exterior podem ser arbitrários desde que sejam consistentes entre si e na 
escrita das equações. 
Deste facto resultou o longo (e infeliz) hábito de muitos autores darem 
sinais diferentes à energia que entra ou sai do sistema consoante se trata de 
energia interna ou das formas macroscópicas da Física Perfeita. 
Neste curso, as quantidades recebidas pelo sistema20 são 
sempre positivas. As cedidas são sempre negativas. 
Esta convenção de sinais é frequente nos cursos modernos de Física, mas 
não o é na maioria da literatura anglo-saxónica de engenharia, sobretudo 
quando a ênfase é na aplicação a motores. Nessa convenção, o calor 
recebido é positivo mas o trabalho recebido é negativo, correspondendo à 
noção de que se a finalidade do motor é fornecer trabalho à custa de calor, 
 
impedir a sua passagem ou circunscrevê-lo, de modo a tornar os seus efeitos acessíveis à 
experimentação. 
18
 A confusão entre sistema fechado e sistema isolado é frequente, sobretudo em textos de biologia 
e de ecologia. O planeta Terra é um sistema termodinâmico praticamente fechado, mas não é 
isolado. A característica fundamental de um ser vivo é ser um sistema aberto. 
19
 Dada a importância na Termodinâmica de separar os efeitos de trocas de calor dos efeitos das 
restantes trocas de energia, isto explica a importância que têm os sistemas fechados no 
desenvolvimento da teoria termodinâmica. 
20
 Energia, seja qual for a sua forma, massa, etc. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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33 
o trabalho deve ser tomado como positivo se o motor o cede. Como é 
óbvio, se se trata de um frigorífico, a noção fica invertida!21 
2.2. 1º Princípio da Termodinâmica 
Sempre que em Física Perfeita há dissipação de energia, constata-se que 
existe uma alteração de temperatura ou uma mudança de estado. Os 
conceitos de quente e frio são velhos como a humanidade, sendo, a febre, 
que corresponde a um aumento de temperatura do corpo acima do normal, 
considerada como um dos primeiros sintomas de doença. Certamente por 
isso, os primeiros termómetros e as primeiras observações consistentes 
sobre os fenómenos térmicos partiram de médicos (a que se chamavam 
físicos...) e de químicos (... alquimistas). 
A sistematização dos conhecimentos nesta área (a teoria do calórico, a 
calorimetria, etc.) com a mecânica, a electricidade, etc., só se concretizou 
quando Joule estabeleceu a equivalência entre trabalho e calor. 
Existindo já a equivalência entre as várias formas de energia da Física 
Perfeita, a identificação do calor com a forma de energia que surgia 
quando as outras se dissipavam surge como um facto central e o princípio 
da conservação da energia transforma-se no pilar mais importante em que 
assenta toda a Física. 
O 1º Princípio da Termodinâmica, ou princípio da conservação 
da energia, não se demonstra. A sua validade aceita-se como 
universal pois nenhum facto até hoje observado o contradiz. 
2.2.1. Formulação do Princípio 
Sendo o conceito de energia um conceito primitivo, e sistema isolado o 
que não troca energia com o exterior, o primeiro princípio da 
termodinâmica traduz-se por: 
Num sistema isolado, a energia (que inclui a massa) permanece 
constante. 
Deve notar-se, neste enunciado, que na energia está a implícita a relação 
de Einstein para a equivalência entre massa e energia. 
 
21
 Exemplos desta convenção encontram-se, por exemplo, em Moran e Shapiro (1988, pp. 32 e 46) e 
em Deus et al. (1992). 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
34 
Não existindo reacções nucleares, a energia e a massa são 
separadamente conservadas. 
A conservação da energia (não considerando a energia interna) era já uma 
constatação da Mecânica clássica obtida impondo a simeteria no tempo. 
Outras leis de conservação incluem a conservação do momento obtida 
impondo a simetria na translacção no espaço e a conservação do momento 
angular impondo a simetria na rotação no espaço. A colisão elástica entre 
corpos conserva a quantidade de movimento e a energia cinética. Isto é, se 
mi for a massa em repouso e iu
�
 a velocidade do corpo i, as quantidades 
ii
i
m u∑
�
 e 
2
ii
i
m u∑
�
, 
correspondentes, respectivamente, à soma das momentos lineares e à soma 
das energias cinéticas, são independentemente conservadas. Se a colisão 
não for elástica e conduzir à perda de identidade dos corpos que colidem, 
como na "reacção" nuclear 
7 1 4 4Li H He He+ → + 
estudada por Cockroft e Walton, continua a existir a conservação da 
quantidade de movimento, mas nem a massa total nem a energia 
cinética se conservam. Todavia, como os mesmos autores confirmaram 
experimentalmente, verifica-se a relação 
∆∆∆∆ ∆∆∆∆E c mcinética∑ ∑+ =2 0, 
onde c é a velocidade da luz no vazio. Neste caso, definimos a energia 
interna de cada um dos corpos que colidem como 
E mcinterna =
2
 
Para que a relação anterior se possa escrever como: 
∆ ( )E Ecinética interna∑ + = 0 
a qual exprime a conservação da energia total, ou seja, da energia interna 
mais cinética. A relação anterior entre a massa e a energia interna é a 
mesma que Einstein previu em 1905, no mesmo ano mas não no mesmo 
artigo, em que enunciou a teoria da relatividade restrita. Como a relação 
2
internaE mc= 
é independente da velocidade, não é necessária a Teoria da Relatividade 
para a justificar, podendo assumir-se como um facto experimental a 
equivalência da massa à energia interna. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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35 
Todavia, a menos que ∆∆∆∆Einterna seja muito grande, como nos 
processos nucleares, a variação de massa é tão pequena que não é 
detectável. Nestes casos procedemos como se massa e energia fossem 
separadamente conservadas22. 
Na situação actual, poderíamos quase dizer que o princípio da conservação 
da energia se transformou no princípio da conservação do próprio 
princípio, na medida em que, se surgirem contradições, a teoria será 
mudada para que o princípio da conservação da energia permaneça válido. 
A energia e a conservação da energia tornaram-se em 
pilares fundamentais do conhecimento científico . 
Tendo sido uma aquisição fundamental da Termodinâmica Clássica, o 
primeiro princípio da Termodinâmica, ou princípio da conservação da 
energia, está hoje implícito em toda a nossa concepção do universo como 
um dado fundamental que não só não se questiona como se aceita como 
ponto de partida. 
2.2.2. Forma Generalizada do Fluxo de Energia na 
Física Perfeita 
O conceito de energia surgiu em mecânica ligado ao trabalho de uma 
força. Por definição: 
δW=F.dL 23 
 = ∑F dLi
i
i. 
em que F é a força aplicada (de componentes Fi) e dL (de componentes 
dLi) o deslocamento elementar do seu ponto de aplicação. 
O conceito de força em mecânica deu origem ao conceito de força 
generalizada bem como o de deslocamento originou o de deslocamento 
generalizado. O conceito de deslocamento generalizado corresponde ao de 
uma variação da coordenada generalizada a que se refere. Por sua vez, as 
coordenadas generalizadas (que correspondem aos graus de liberdade do 
sistema) constituem o número mínimo de variáveiscom que é possível 
 
22
 Este exemplo permite sublinhar como o princípio da conservação da energia, enunciado no século 
anterior, foi preservado e levou à identificação da massa com a energia. Mostra também como 
aquela identificação reconciliou todo o conhecimento anteriormente existente e foi consistente 
com todas as descobertas posteriores. 
23
 Utilizaremos os símbolos em negrito itálico para designar vectores. F e dL são por isso vectores 
e o ponto (.) exprime o seu produto interno. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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36 
descrever completamente a evolução do sistema. Por definição, é possível 
variar independentemente cada uma das variáveis generalizadas. 
Nessa generalização, a característica comum e fundamental é o 
facto de um fluxo de energia (ou de uma troca de energia) se 
poder sempre exprimir como o produto de uma força 
(generalizada) por um deslocamento (generalizado). 
Aliás, na expressão de qualquer troca elementar de energia, os dois termos 
são sempre identificáveis, correspondendo quase sempre o deslocamento 
generalizado a uma variável extensiva e a força generalizada a uma 
variável intensiva (no sentido termodinâmico anteriormente referido). Por 
exemplo, 1) no fluxo de energia transferido sob a forma de calor, a força 
generalizada é a temperatura, T, e o deslocamento generalizado é a 
variação de entropia, dS e 2) no fluxo de energia transferido sob a forma 
de trabalho de expansão, a força generalizada é a pressão, -P, e o 
deslocamento generalizado é a variação de volume, dV. 
 
2.3. 2º Princípio da Termodinâmica 
2.3.1. Calor 
Não existindo dissipação na Física Perfeita, mas sendo o mundo 
macroscopicamente observável caracterizado pela dissipação e pela 
irreversibilidade, o princípio da conservação da energia em sentido lato, 
isto é, no sentido da Termodinâmica Macroscópica, conduz 
necessariamente a transformar o conceito de calor num como que resto, ou 
“caixote de lixo”, no qual se transformam as energias nobres (formas de 
energia da Física Perfeita) quando se degradam. 
Que modelo microscópico podemos nós associar àquilo a que chamamos 
calor para que ele próprio não se degrade também? No caso de se 
“degradar”, em que observável macroscópico se traduziria essa 
“degradação”? A esta questão central a Física responde (no estado actual 
do conhecimento) identificando aquilo a que chamamos calor com as 
formas de energia perfeitas, mas agora ao nível microscópico 
Passamos a admitir que a Física Perfeita é a única que existe ao nível 
microscópico, pelo que continua a existir a esse nível a conservação das 
suas formas de energia. 
A dissipação de energia a nível macroscópico traduz-se no aumento da 
energia interna a nível macroscópico. A energia interna traduz-se nas 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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37 
formas de energias perfeita a nível microscópico. O calor é um fluxo de 
energia que permuta energia interna entre sistemas24,25. 
O facto fundamental é que a passagem de energia do nível 
macroscópico para o nível microscópico nunca é 
completamente invertível, isto é, enquanto que a passagem de 
energia do nível macroscópico para o nível microscópico 
(dissipação) acontece em todos os fenómenos naturais, a 
conversão de energia do nível microscópico para o nível 
macroscópico obedece a condicionantes suplementares e nunca 
se realiza completamente (no mundo real). 
Para a Termodinâmica Macroscópica Clássica é irrelevante a forma ou 
formas, conhecidas ou desconhecidas, que a energia assume enquanto 
energia interna. Para a elaboração da sua estrutura conceptual bastam os 
pressupostos de que tal energia existe e de que, globalmente, a energia se 
conserva. Este conceito base, associado ao da existência de 
irreversibilidade que a dissipação traduz (2º princípio), é quanto basta para 
deduzir um número muito importante de propriedades e relações 
fundamentais. A pura visão macroscópica do sistema termodinâmico fica 
porém enriquecida quando a perspectiva microscópica lhe é associada. 
Por outro lado, o dado central a ter em conta em qualquer modelo 
microscópico da matéria é de que nesse modelo a energia não se dissipe. 
Na sua forma mais elementar, a questão que surge então é: como e porque 
se conserva a energia num sistema isolado de tal modo que ela possa 
permanecer indefinidamente constante? 
A resposta surge inspirada nos modelos mecânicos macroscópicos. Se 
imaginarmos a matéria formada por pontos materiais em movimento, 
realizando entre si choques perfeitos, a energia cinética do conjunto 
mantém-se. O choque elástico destes pontos materiais com a parede do 
sistema (se o número de pontos for muito grande e o período de 
observação suficientemente longo) manifesta-se exteriormente como uma 
pressão. O modelo de gás perfeito monoatómico corresponde a esta 
idealização. 
 
24
 O termo calor deve usar-se em sentido análogo ao da chuva. Uma nuvem não é chuva acumulada, 
tal como a água que resulta de ter chovido não é chuva, mas sim água. O calor, tal como a chuva, 
só existe como trânsito ou passagem de energia interna de um sistema para outro. 
25
 No entanto, o calor não é o único tipo de permuta de energia interna. Por exemplo, é também 
possível permutar energia interna através da difusão de massa. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
_________________________________________________________________ 
 
38 
Será então possível admitir que os choques entre os pontos materiais co m 
que idealizamos o gás perfeito não seja perfeitamente elástico? 
É evidente que não, porque se o choque fosse inelástico haveria dissipação 
de energia mecânica (a nível microscópico) pelo que teríamos de admitir 
que o ponto material que representava o átomo teria de possuir uma 
estrutura mais complicada do que um ponto material, estrutura essa que 
teria novamente de comportar um nível em que voltasse a admitir-se a 
conservação da energia numa das formas contempladas pela Física 
Perfeita. 
Este exemplo simples e clássico do gás perfeito monoatómico ilustra a 
questão central que desejamos sublinhar: nos modelos microscópicos de 
constituição da matéria, há sempre um nível último em que as únicas 
formas de energia concebíveis são as da Física Perfeita pois elas são as 
únicas que comportam a exigência formal imposta pela conservação de 
energia. Ao nível microscópico fundamental não pode pois haver 
dissipação, o que implica a reversibilidade no tempo, ou ainda a 
indistinguibilidade do passado e do futuro. 
2.3.2. Postulado da Dissipação 
Consideremos um sistema isolado, separado em dois subsistemas que 
trocam energia entre si (Figura 1). 
Figura 1 - Sistema isolado, com dois subsistemas. 
Parede adienergética
Parede adiabática
 
Admitamos que a energia contida em A é U(A) e em B, U(B). A energia do 
sistema conjunto (A + B), U(A+B) é dada por 
 
( ) ( ) ( )A B A BU U U+ = + . (0.7) 
Por simplicidade, admitamos que A é fisicamente homogéneo, e vai ser a 
partir de agora o objecto de estudo. Neste entendimento, ao subsistema A 
chamaremos simplesmente sistema, e a B chamaremos exterior. 
Pressupomos que em B se encontra o observador que vai procurar inferir o 
que se passa no interior de A a partir do que pode observar e medir em B. 
Termodinâmica Macroscópica 
rincípios da Termodinâmica 
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39 
Supomos também que no interior de B não há dissipação de energia. Nesta 
situação idealizada, no sistema B, o universo é completamente descrito 
pelas leis da Física Perfeita. 
Suponhamos

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