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Hermeneutica_Juridica_Unidade_1

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NEAD
Núcleo de Educação a Distância
Disciplina de Hermenêutica Jurídica
Unidade I - Origem e história
NEAD Núcleo de Educação a Distância
2
Sumário (Unidade 1)
APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA•	
CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA HERMENÊUTICO•	
Hermenêutica - Origem e Significado do Termo1. 
A Compreensão Natural e Espontânea - o Mito2. 
O Bom Senso ou a Razão Natural3. 
As Formas de Manifestação da Razão na História (Teoria do Espírito)4. 
A Linguagem enquanto Veículo de Compreensão5. 
A Hermenêutica e os Vários Significados da Vida Cotidiana6. 
DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA HERMENÊUTICA•	
Hermenêutica Teológica Antiga1. 
Hermenêutica Teológica Contemporânea2. 
Hermenêutica Filosófica Antiga (Platão e Aristóteles)3. 
Hermenêutica Jurídica Romana Antiga4. 
Período de Transição - Glosadores e Comentadores5. 
A Hermenêutica na Modernidade - Lei da Boa Razão6. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS•	
NEAD Núcleo de Educação a Distância
3
Apresentação da disciplina
Esta disciplina tem por objetivo apresentar a hermenêutica como um fenômeno 
universal, presente em todos os instantes da vida, transpondo-o, de forma sis-
tematizada, para uma aplicação no campo do Direito. Visa discutir sobre a inter-
relação que deve existir entre o Direito e as demais ciências da sociedade, a fim 
de justificar a importância da ampla formação do jurista como requisito para um 
melhor exercício da atividade interpretativa.
Assim, para que compreenda melhor o nosso estudo, faz-se importante conhe-
cer quais objetivos foram definidos para esta unidade.
Objetivo
Analisar a evolução histórica do problema da interpretação jurídica, • 
descrevendo suas etapas e estabelecendo as diferenças entre os con-
ceitos de interpretação e hermenêutica.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
4
 
TEMA: CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA HERMENÊUTICO
Você sabe o que trata a hermenêutica jurídica?
Antes de falarmos em hermenêutica jurídica, devemos falar 
da hermenêutica em si mesma. O que vem a ser hermenêu-
tica? É uma atividade da nossa mente, buscando entender 
alguma coisa que lemos, ouvimos ou algum fato que ocorre. 
É natural do ser humano estar sempre à procura de um sen-
tido para as coisas e fatos do mundo em que vive. Seja no 
dia a dia, seja na leitura de um texto jornalístico ou literário, 
seja numa tarefa de estudo ou de trabalho, todas as vezes 
em que algo nos parece confuso, nós procuramos imediata-
mente esclarecer o seu significado, solucionar as dúvidas. 
Esse esforço para chegar à compreensão é o que chamamos 
de hermenêutica. Em resumo, a hermenêutica é a ciência que 
se preocupa com o fenômeno da compreensão humana.
Iniciaremos, assim, o nosso estudo de hermenêutica jurídica, 
fazendo uma análise preliminar sobre a hermenêutica em geral, 
abordando desde o início deste processo na nossa vida pessoal, 
cotidiana, passando pelos diversos rumos que ela tomou na so-
ciedade através dos tempos, bem como pelas demais áreas do 
conhecimento, nas quais ela tem atuação destacada, até nos apro-
ximarmos, pouco a pouco, da integração dessas diversas áreas 
científicas com a área jurídica propriamente dita. Passemos ao sig-
nificado da palavra hermenêutica.
1 HERMENÊUTICA - ORIGEM E SIGNIFICADO DO TERMO
O termo hermenêutica provém do verbo grego hermeneuein, 
que tem o significado de anunciar, interpretar ou esclarecer. Refere-
se também às atividades de tradução, na medida em que traduzir, 
Unidade 1: Origem e história
NEAD Núcleo de Educação a Distância
5
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
também, é uma forma de interpretar. Não há certeza, mas só pro-
babilidade, de que esta palavra derive do nome do deus Hermes, o 
mensageiro dos deuses na mitologia grega.
Curiosidade
Também entre os gregos, era muito famoso e prestigiado o 
Oráculo de Delfos, no templo do deus Apolo, aonde as pesso-
as de diversas regiões da Europa e da Ásia iam em busca de 
saber as coisas do seu futuro e recebiam, através da pitonisa, 
uma mensagem dos deuses, a qual precisava ser interpretada 
pelos sacerdotes do templo. O termo “hermenêutica” referia-
se, desde então, a uma dimensão religiosa: a compreensão e 
interpretação de uma palavra divina. Consulte na Internet e 
saiba mais sobre o Oráculo de Delfos.
É por isso que a palavra “hermenêutica” foi primeiramente em-
pregada no campo teológico, passando daí para a filosofia, e desta, 
para as demais ciências, inclusive para o Direito. Assim, a herme-
nêutica se aplica no estudo dos textos bíblicos, dos escritos dos fi-
lósofos antigos e modernos, das obras literárias em geral, dos tes-
temunhos históricos, dos velhos e novos textos legislativos, etc., 
pois todos devem ser compreendidos corretamente e interpretados 
para uma melhor compreensão do seu sentido.
Conforme se pode verificar, a hermenêutica está sempre liga-
da à interpretação, pois se reporta à compreensão de algum 
significado nas diversas áreas da vida humana. Todavia, her-
menêutica e interpretação não são palavras sinônimas. 
A hermenêutica é uma espécie de teoria geral da interpretação, • 
sendo por isso uma ciência interdisciplinar, já que se aplica a 
diversas áreas do conhecimento.
A interpretação será assim a aplicação da teoria geral (herme-• 
nêutica) para a compreensão de um fato concreto, de um texto, 
de uma expressão linguística.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
6
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Também no que diz respeito ao Direito, a hermenêutica jurí-
dica tem um sentido mais amplo e teórico, buscando a sistema-
tização dos processos adequados para a captação do sentido e da 
extensão das expressões jurídicas, utilizando-se de bases filosófi-
cas. Já a interpretação no Direito é a aplicação prática da herme-
nêutica jurídica. Mediante a interpretação, aparece mais claramen-
te um certo sentido oculto nas palavras da lei. 
Exemplo
Por isso, como exemplo, podemos citar que o comportamento 
do intérprete não pode ser passivo, pois não se trata ape-
nas de um esclarecimento linguístico de termos e expres-
sões. “Assim, interpretar é exercer uma função mediadora, 
através da qual o intérprete compreende o sentido de um 
texto que se lhe apresenta como problemático. A conclusão 
do intérprete, nesse sentido, não é uma dedução silogística, 
mas uma decisão ou eleição entre diferentes possibilidades 
de interpretação” (ANDRADE, 1992, p.09).
A hermenêutica e a interpretação, portanto, têm suas origens 
não no conhecimento científico, mas nas vivências e experiências 
naturais dos seres humanos, sejam eles letrados ou ignorantes. 
Daí o porquê de suas primeiras manifestações ocorrerem no cam-
po religioso. Passamos a examinar uma das formas religiosas mais 
primitivas do ser humano: os mitos.
2 A COMPREENSÃO NATURAL E ESPONTÂNEA: O MITO
As formas mais primitivas do esforço de compreensão do mun-
do realizado pelos seres humanos são conhecidas como mitos. Mito 
quer dizer conto. As mais antigas explicações para os acontecimen-
tos eram feitas em formas de fábulas, narrações, epopeias. Todos 
os povos sempre produziram seus contos, suas lendas, seus perso-
nagens extraordinários. 
NEAD Núcleo de Educação a Distância
7
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Exemplo
Na Grécia antiga ou nos sertões do Nordeste, encontramos 
esses personagens, tornando assim o mito uma presença 
constante e viva na mentalidade do povo simples, que povoa 
o seu mundo com ídolos benfazejos e malfazejos, criações 
fantásticas de sua imaginação exuberante. 
Perante a cultura formal, essas práticas e costumes são conhe-
cidas como folclore. No entanto, na mente de quem as pratica, elas 
são experiências vitais concretas e cheias de significados, os quais 
são constantemente explicitados nas conversas e na maneira de 
explicar os acontecimentos do dia a dia. Esta é a mentalidadebási-
ca do nosso povo mais simples, que busca sempre uma explicação 
religiosa para todos os fatos.
Ninguém sabe ao certo quando começaram os mitos, a sua 
origem se perde na penumbra da pré-história, mas podemos 
fazê-la coincidir, ao menos virtualmente, com o acontecimen-
to chave, que demarcou inexoravelmente o surgimento da 
espécie humana, um acontecimento de extraordinária impor-
tância no longo caminho da evolução do homem, que foi o 
despertar da consciência, do pensamento reflexivo, da ca-
pacidade de pensar racionalmente.
 
Nos primórdios, o homem era aterrorizado e subjugado pelas 
forças da natureza. Aos poucos, o homem começa a compreender 
que o raio incendiário, a tormenta voraz, o mar tempestuoso ou o 
sol que escurece no meio do dia não são fenômenos aleatórios, mas 
têm alguma causa, obedecem a uma lei misteriosa, a alguma auto-
ridade poderosa da qual depende a vida de tudo e de todos. Não sa-
bendo determinar com clareza qual seria esta causa, o homem pas-
sa a atribuí-la a deuses, a seres imaginários, ao destino, ao senhor 
da terra, ao espírito cósmico, não importa qual seja a denominação 
ou a personificação que estas forças passem a ter, elas funcionam 
como explicação e como origem para tudo o que ocorre.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
8
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Dessa forma, a explicação advinda do mito é, geralmente, ab-
surda, irracional e até contraditória. Mas isto é o que menos 
importa. O que nos interessa aqui não é aquilo que está sendo 
afirmado, mas o fato de que, por trás desta afirmação, há um 
esforço de correlacionar um efeito a uma causa, de descobrir 
um nexo entre as coisas e a sua origem mais profunda.
Por outras palavras, ao construir seus mitos, o ser humano está 
ao mesmo tempo produzindo uma interpretação prática dos fenô-
menos cósmicos, com base em uma compreensão natural, presente 
em todas as pessoas racionais, independentemente de estudos ou 
de formação escolar, capacidade essa também chamada de senso 
comum ou bom senso, que não são outra coisa senão um exercício 
elementar da razão natural.
3 O BOM SENSO OU A RAZÃO NATURAL
Com a evolução dos seres humanos e o desenvolvimento da 
vida social, a compreensão mitológica foi substituída por uma for-
ma natural de manifestação da razão, que se chama de senso co-
mum ou bom senso. De acordo com o pensador francês René Des-
cartes (séc XVII), todos os seres humanos têm uma razão natural 
que se evidencia pela capacidade de saber distinguir o verdadeiro 
do falso, o bem do mal, isto é o que se denomina o bom senso ou 
a razão, e é naturalmente igual em todos os homens.
Comentário
A diversidade das opiniões não provém do fato de uns serem 
mais racionais do que outros, mas tão somente pelo fato de 
cada um conduzir o pensamento por diferentes caminhos. Pois 
não basta ter o espírito bom: o essencial é aplicá-lo bem.
Dito de outro modo, a razão ou o bom senso é a característica 
básica que nos torna homens e nos distingue dos animais, quer 
NEAD Núcleo de Educação a Distância
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
dizer, é o uso espontâneo da racionalidade presente em cada 
um que torna o ser humano essencialmente diferente de todos 
os demais seres existentes.
 
Ainda de acordo com Descartes, para uma maior eficiência na 
utilização deste recurso, que é natural em todas as pessoas, é ne-
cessário organizar os procedimentos mentais, através da formação 
de um método que seja capaz de proporcionar meios para au-
mentar gradativamente o conhecimento e levá-lo, aos poucos, ao 
mais alto grau que as limitações de cada um permita alcançar. O 
uso de um método não dá garantia absoluta de certeza, pois esta-
mos sempre sujeitos a nos equivocar. No entanto, a sua utilização 
dá maior segurança e reduz as possibilidades de fracasso. O bom 
senso é a fonte de todos os métodos.
O método é, assim, um caminho a ser seguido pelo estu-
dioso com o intuito de encontrar a verdade no seu conheci-
mento. No que concerne ao Direito, o método é o caminho 
que o jurista deve percorrer com o objetivo de chegar à 
solução mais justa e adequada para os casos concretos que 
lhe são apresentados.
Assim, partindo de sua própria experiência intelectual, Descar-
tes ensina um método que cada indivíduo deveria seguir para bem 
conduzir a sua razão, aplicável a todos os ramos do conhecimento, 
o qual ele expõe no seu livro Discurso sobre o Método (2001), e 
que poderia ser resumido nas regras seguintes: 
nunca aceitar uma coisa como verdadeira, sem antes investigar • 
a sua origem e os seus fundamentos;
dividir as dificuldades em parcelas cada vez menores, de modo • 
que através da solução destas se consiga, aos poucos, a solução 
total do problema;
conduzir o pensamento do mais simples para o mais complexo, • 
aumentando gradativamente os conteúdos e a sua abrangência;
NEAD Núcleo de Educação a Distância
10
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
aprofundar ao máximo cada questão examinada, de modo a re-• 
duzir ao mínimo as possibilidades de erro.
Essas regras propostas por Descartes, pela sua simplicidade, 
podem ser adotadas em todas as circunstâncias de dúvidas, 
da mesma forma que a sua obra “Discurso sobre o Método” 
deve ser uma leitura obrigatória para todos os estudantes 
de metodologia, não exatamente pelas regras propostas, 
mas pelo avanço que o livro representou na ocasião do seu 
lançamento em 1639.
Com isso, Descartes demonstrou de que modo a racionalidade 
espontânea ou a razão natural evolui para se transformar na racio-
nalidade científica. Para ele, quando o conhecimento espontâneo, 
produzido pela razão natural, é orientado sob a regência de um 
método qualquer, que organiza seus procedimentos e controla seus 
resultados, transforma-se em conhecimento científico. 
Descartes ainda entendia que a razão era igual em todos os 
seres humanos e se manifestava sempre da mesma maneira em 
qualquer época ou circunstância, o que foi criticado por outros pen-
sadores, que entendiam a razão como um processo evolutivo atre-
lado ao próprio desenvolvimento da sociedade através do tempo, o 
que se chama de história. Passemos, então, a analisar a evolução 
racional do homem dentro da história.
4 AS FORMAS DE MANIFESTAÇÃO DA RAZÃO NA HISTÓRIA 
(Teoria do Espírito)
Desde que o homem inventou a escrita, começou a escrever 
a história do seu tempo. Os egípcios, os babilônios, os sumérios, 
os hindus, os hebreus deixaram os legados escritos mais antigos 
que conhecemos. No mundo ocidental, esta prática começou com 
os gregos. Mas cada povo escreveu isso ao seu modo. O fato de 
escrever a própria história foi realizado de maneiras diferenciadas, 
de acordo com os padrões culturais de cada povo.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
11
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Exemplo
A concepção grega da história, por exemplo, era influenciada 
pela visão que eles tinham da natureza, ou seja, o movimen-
to cíclico de repetição dos fatos a cada período de tempo de-
terminado, assim como se repetem as estações do ano. Eles 
acreditavam na eternidade da matéria e tudo ocorria dentro 
de uma grande e permanente reciclagem. 
 
De outro lado, os hebreus, que eram contemporâneos dos 
gregos mas habitavam outra região do mundo e tinham outra 
cultura, desenvolveram também outra concepção de história, 
porque não acreditavam na matéria eterna, mas tinham a 
ideia da criação do mundo por um ser superior. Os hebreus 
acreditavam que foi Jahwé o criador do mundo, conforme a 
narração conhecida através dos relatos bíblicos, e isso lhes 
dava uma outra visão dos fatos, os quais não se repetiam 
simplesmente (como pensavam os gregos), mas tiveram um 
princípio e se encaminhavam para um futuro promissor, gra-
ças a uma aliança com Jahwé.
Assim, os relatosbíblicos estão comprometidos com a tra-
jetória do povo de Israel, voltada para o cumprimento desta 
aliança e da promessa de um Salvador. Dizemos, então, que os 
hebreus tinham uma consciência histórica, enquanto os gre-
gos não a tinham. Para os hebreus, a história tinha um sentido 
em si mesma; para os gregos, a história era uma mera sucessão 
de acontecimentos no tempo.
 
O primeiro pensador a chamar a atenção para o fato de que a his-
tória tem um sentido implícito foi Santo Agostinho (séc. IV), na sua 
obra A Cidade de Deus. No entanto, foi Hegel (séc XIX) quem uniu as 
duas tradições grega e hebraica de compreensão da história, trans-
portando isso para a filosofia através do seu conceito do espírito.
Hegel instaurou um fator na história concreta da humanidade 
com o qual e dentro do qual tudo se encaminhava para um fim, 
que podia ser alcançado através da racionalidade. Ele chama esta 
NEAD Núcleo de Educação a Distância
12
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
“racionalidade” de espírito, tomando como referência a palavra 
grega noûs (mente, espírito). O espírito absoluto na história era o 
logos (razão histórica) que tornava possível a compreensão dela e 
sua marcha para um telos (finalidade).
Mas não se trata de uma lógica pura, abstrata, matemática, 
trata-se de uma lógica diferente, densa em significados, que per-
passa a história humana e comanda o homem, o qual através dela 
vê desfeita a antiga opacidade dos acontecimentos, possibilitando 
a compreensão do encadeamento dos fatos e, até certo ponto, a 
previsão deles. Esta nova razão filosofante avança na história para 
uma auto-reflexão absolutamente transparente. 
Resumo
Em resumo, portanto, temos três formas de manifestação do 
espírito, enquanto razão histórica: 
1. Espírito Subjetivo, na medida em que as pessoas são 
dotadas dessa capacidade de perceber o sentido subjacen-
te nos fatos, nos objetos produzidos e nas outras pessoas 
e relacioná-lo com o telos, ou seja, com a direção em que a 
humanidade se desenvolve.
...
Os gregos usavam a 
palavra logos como 
sinônimo de razão, 
palavra e noûs como 
sinônimo de enten-
dimento, pensamen-
to. Embora possam 
ser gramaticalmente 
equivalentes, a se-
gunda tem alcance 
mais abrangente, 
indo além da pura 
razão. Daí o porquê 
dos estudiosos cos-
tumam traduzir por 
“espírito”.
Na sua obra Enciclopédia das Ciências Filosóficas, Hegel ex-
plica esta sua teoria do espírito ou da razão histórica, se-
gundo a qual há três níveis de compreensão racional da his-
tória, ou três manifestações do espírito, isto é, esta razão 
histórica pode ser compreendida diretamente em si mesmo, 
em seu processo abstrato (logos = espírito absoluto) ou 
enquanto se manifesta em forma subjetiva (logos = pen-
samentos	e	reflexões	das	pessoas) e em forma objeti-
va (logos	=	obras	e	produções	humanas)	como	espírito	
materializado. Este espírito objetivo é tudo aquilo que com-
põe a história humana visível na cultura.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
13
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
...
2. Espírito Objetivo, na medida em que a racionalidade 
humana como que se transfere para as obras que os seres 
humanos vêm produzindo ao longo dos tempos, tornando 
possível integrar a humanidade presente com as pessoas do 
passado, encontrando assim os elos que tornam a cadeia dos 
fatos historicamente compreensível
3. Espírito Absoluto, na medida em que o conjunto desses 
fatos evolui para um contexto mais amplo da racionalidade, 
que transcende a própria história e confere sentido às ações 
singulares dos homens, elevando-as ao patamar da raciona-
lidade geral, no qual se integram e se consolidam em objetos 
e instituições que formam o patrimônio cultural de cada povo 
e da humanidade como um todo.
Ao enfatizar a importância da história, Hegel chama a atenção 
também para a importância da cultura, porque esta é o resultado das 
ações humanas ao longo do tempo. Assim, numa perspectiva cultura-
lista, todas as ciências que estudam os fenômenos sociais trabalham 
com objetos culturais, inclusive o Direito. Com efeito, a norma jurídica 
é também um objeto cultural, na medida em que ela está sempre re-
ferenciada a circunstâncias concretas e a valores sociais, e o processo 
hermenêutico apresenta um condicionamento histórico e cultural.
Ora, o principal veículo da cultura é o elemento linguístico, já que 
é através da linguagem que o homem expressa os conteúdos dos 
seus pensamentos. Este fato é claramente perceptível no Direito, uma 
vez que os textos jurídicos estão redigidos em linguagem comum ou 
natural, exatamente porque para cumprirem sua função social de-
vem ser melhor compreendidos por todas as pessoas. Contudo, isso 
traz uma desvantagem por causa da ambiguidade e da polissemia da 
linguagem natural, criando-se assim uma situação problemática que 
reclama uma solução hermenêutica.
A compreensão de expressões linguísticas, dentro e fora do Direito, 
só se dá através da interpretação, o que transforma a linguagem num 
elemento primordial da convivência humana, capaz de unir o abstrato 
NEAD Núcleo de Educação a Distância
14
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
das expressões linguísticas ao concreto dos fatos sociais. A linguagem 
é reconhecida, assim, como o elemento central e necessário das rela-
ções sociais, pois é através da comunicação entre as pessoas que os 
diversos sentidos implícitos nas expressões se tornam claros. 
Nesse sentido, nota-se que a linguagem é o componente cen-
tral e indispensável em todo processo de interpretação, cujos 
fundamentos são encontrados numa teoria filosófica da lin-
guagem. Conforme veremos adiante no próximo tópico com 
as reflexões de Heidegger.
5 A LINGUAGEM ENQUANTO VEÍCULO DA COMPREENSÃO
Heidegger é um pensador alemão do século XX. Na sua obra A 
Caminho da Linguagem (2003), ele destaca o papel fundamental que 
tem a linguagem para a vida humana em todos os seus aspectos, dos 
mais simples aos mais complexos, pois a linguagem não é apenas 
uma habilidade humana, ela traduz a própria essência do homem.
Reflexão
O homem é o ser que fala. Falamos quando acordados e em 
sonho. Falamos continuamente. Falamos mesmo quando não 
deixamos soar nenhuma palavra. Falamos quando ouvimos e 
lemos. Falamos igualmente quando não ouvimos e não lemos 
e, ao invés, realizamos um trabalho ou ficamos à toa. Fala-
mos sempre de um jeito ou de outro. Falamos porque falar 
nos é natural. Falar não provém de uma vontade especial.
Costuma-se dizer que por natureza o homem é o ser vivo do-
tado de linguagem. Essa definição não diz apenas que, den-
tre muitas outras faculdades, o homem também possui a de 
falar. Nela se diz que a linguagem é o que faculta o homem a 
ser o ser vivo que ele é enquanto homem. Enquanto aquele 
que fala, o homem é homem.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
15
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
A linguagem pertence, assim, à vizinhança mais próxima do 
humano, pois é através da linguagem que o ser humano se re-
conhece como pessoa e reconhece os outros. Não é, portanto, 
de admirar que, tão logo o homem faça uma ideia do mundo que 
se encontra ao seu redor, ele encontre imediatamente também a 
linguagem. É assim que o homem cria a linguagem e constante-
mente a transforma com seu uso dinâmico e inovador, fato que a 
torna um organismo vivo, tanto quanto o seu próprio autor. O uso 
da linguagem está ligado diretamente e essencialmente à consci-
ência que o homem tem do seu mundo.
Importante
O pensamento, linguisticamente estruturado, busca elaborar 
uma representação universal da linguagem, através da 
formação de conceitos universais. O universal, o que vale 
para toda e qualquer coisa, chama-se essência, termo criado 
por Aristóteles (em grego = ousia). Desde então, prevalecea opinião de que o traço fundamental do pensamento é 
representar, de maneira universal, o que possui validade 
universal. Assim, é possível estudar cientificamente a 
própria linguagem, como é o caso do que se faz ao elaborar 
teorias acerca da linguagem.
Fazer uma colocação sobre a linguagem não significa tanto con-
duzir a linguagem em si, mas conduzir a nós mesmos para o lugar 
de seu modo de ser, de sua essência. Apreender a linguagem é 
compreender a cultura de um povo, pois ela é muito mais que um 
mero código de comunicação. No bojo linguístico se aninha a pró-
pria “alma” do povo que a utiliza, de modo que adquirir a compe-
tência de falar em outra língua, além da sua própria, é acrescer à 
sua personalidade valores e modos de pensar pertencentes a outra 
cultura, a outro universo existencial histórico e compreensivo.
Desse modo, a linguagem é o fator que aglutina as pessoas 
e torna possível a sociedade humana. Grupos humanos que 
falam a mesma linguagem constituem uma comunidade e
...
NEAD Núcleo de Educação a Distância
16
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
...
nela constroem a sua vida, produzem objetos e se reprodu-
zem geneticamente num ambiente de conteúdos e valores 
que compõem um conjunto de vivências e significados asso-
ciados ao dia a dia de uma coletividade, criando um ambiente 
propício para o desenvolvimento do nosso corpo e da nossa 
mente, ou seja, o nosso ambiente vital ordinário, aquele com 
o qual nos identificamos e dentro do qual nos sentimos à von-
tade. Ao conjunto de todos esses elementos físicos, culturais 
e valorativos dentro do qual todos nós somos criados e que 
constitui a base concreta do nosso pensamento e das nossas 
ações, é o que chamamos de vida cotidiana.
6 A HERMENÊUTICA E OS VÁRIOS SIGNIFICADOS DA VIDA 
COTIDIANA
Na vida pessoal de cada um de nós, as primeiras formas de 
compreensão do nosso mundo são produzidas no local de nos-
sa vida. O cotidiano ou a vida cotidiana se refere a um conjunto 
de atividades exercidas no espaço vital das pessoas, onde se 
desenvolvem as diferentes práticas sociais e suas respectivas 
socialidades através dos tempos. Nos dizeres de Agnes Heller 
(1985), pensadora marxista húngara, é o ponto de encontro 
do meu ser humano-individual (consciência individual) com 
o ser humano-genérico (consciência coletiva).
É o contexto no qual exercitamos a nossa compreensão no nível 
espontâneo e imediato, através do relacionamento com os que nos 
são mais próximos. Por isso, a vida cotidiana é a vida do homem 
inteiro, não se podendo dissociar o cotidiano pessoal da história da 
sociedade, pois os fatos históricos nascem no cotidiano e remetem 
à ideia de repetição. Contudo, esse espaço não é só de repetição 
e reprodução, mas também de produção de novos significados, no 
qual Agnes Heller (1985) descobre quatro importantes caracterís-
ticas da vida cotidiana.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
17
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
A primeira e mais importante, segundo Heller (1985):
[...] é a espontaneidade, não querendo dizer com isto que 
todas as atividades do cotidiano o sejam no mesmo nível, 
mas que existe uma tendência marcante do cotidiano para a 
espontaneidade (p.30).
Ela é absolutamente indispensável nas atividades rotineiras, pois se 
nos dispuséssemos a refletir sobre o conteúdo de verdade de cada 
uma das atividades que realizamos cotidianamente, não sobraria 
tempo para realizá-las. Pode-se afirmar que a espontaneidade das 
atividades rotineiras é condição de possibilidade das outras ações 
de maior responsabilidade, na medida em que libera o indivíduo 
para refletir sobre estas.
A segunda característica da vida cotidiana é a probabilidade, 
baseada na confiança em relação às outras pessoas. Do mesmo 
modo que ocorre com a espontaneidade, o indivíduo não pode-
rá calcular com precisão os rumos e as consequências das suas 
ações, devendo confiar-se nas ações das outras pessoas. Isto co-
loca sempre em evidência a possibilidade do fracasso e por isso as 
atividades da vida cotidiana têm sempre o tempero do risco. Não 
se trata de um risco assumido irresponsavelmente, mas um risco 
imprescindível e necessário para a vida. Do mesmo modo, não se 
trata de uma probabilidade calculada cientificamente.
Exemplo
Se uma pessoa necessitasse calcular matematicamente a rela-
ção tempo/velocidade de um veículo em movimento cada vez 
que precisasse atravessar a rua, não conseguiria sair do lugar. 
Trata-se, pois, de uma probabilidade intuitiva e natural, 
que existe em todas as pessoas, mesmo nas iletradas.
A terceira característica da vida cotidiana é o economicismo. 
Podemos afirmar que este é o motor das ações humanas, pois toda 
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
categoria da ação e do pensamento manifesta-se e funciona exclu-
sivamente enquanto é imprescindível para a simples continuação 
da cotidianidade. Ações supérfluas serão automaticamente cance-
ladas e esquecidas, num processo contínuo de aperfeiçoamento 
das rotinas do dia a dia.
O conjunto dessas três características, que se implicam mu-
tuamente, permite-nos falar de uma unidade imediata entre 
pensamento e ação na cotidianidade, uma unidade pragmática 
na qual existe a total identificação entre o “correto” e o “verda-
deiro”. É isto que forma o plano ético das relações sociais.
A quarta característica do cotidiano é o uso de precedentes. 
O precedente é fortíssimo indicador de ação na esfera da cotidiani-
dade. A repetição de ações adotadas por outras pessoas em situa-
ções semelhantes é muito adotada como critério para a ação pes-
soal. Não há nada demais nisso, fato que está associado à ideia da 
economicidade acima exposta. O uso de ações exitosas de outras 
pessoas é sempre um indicador que dá segurança à pessoa, numa 
primeira experiência em determinado assunto. Essas atitudes só 
se tornam impeditivas e improdutivas quando a pessoa se deixa 
dominar tanto por elas, de modo que não consegue mais captar o 
sentido do novo e do irrepetível próprios de cada situação.
O conjunto dessas atividades práticas do cotidiano forma aqui-
lo que comumente se chama de cultura popular, ambiente no 
qual vivem todas as pessoas de uma determinada comunidade 
e que influencia de modo mais marcante essas pessoas quanto 
menor for o seu nível de instrução. Do ponto de vista das ciências 
sociais, essas ações formam a substância da história, na medida 
em que a história é o processo de explicitação da essência huma-
na dentro da irreversibilidade dos acontecimentos sociais.
Portanto, o cotidiano é a nossa história viva, na medida 
em que sintetiza a própria estrutura da sociedade em que 
vivemos e dentro da qual nos tornamos o que somos en-
...
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19
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
...
quanto pessoas. Nunca podemos esquecer que essas culturas 
populares constituem as bases para a nossa visão do mundo 
no decorrer de toda a existência, herdada da comunidade na 
qual fomos criados e educados, pois é dela que assimilamos 
os conteúdos e os valores permanentes nas nossas vidas.
Dentro dessa visão culturalista, o Direito se apresenta na vida 
cotidiana das pessoas nos conceitos espontâneos de justo e injusto, 
de legal e ilegal, de proibido e permitido, de obrigatório e facultati-
vo, independentemente de alguém ter lido ou estudado sobre isso. 
Eles brotam naturalmente na mente das pessoas, a partir de suas 
relações cotidianas, com base nos costumes sociais e nas práticas 
aceitas ou reprovadas dentro da comunidade. Com base nessas vi-
vências cotidianas, todas as pessoas sabem distinguir claramente o 
que é o “meu direito” e o “direito do outro”, mesmo quando agem 
concretamente infringindo essa distinção.
A vidacotidiana produz nas pessoas uma espécie de nor-
ma jurídica genérica implícita, pela qual estas avaliam as 
próprias ações e as ações alheias e são capazes de expres-
sar vereditos imediatos e rigorosos, como se vê em certos 
fatos que despertam o clamor popular e o sentimento de 
revolta perante ocorrências violentas de grande repercus-
são. Percebe-se nesses casos uma espécie de hermenêuti-
ca espontânea, totalmente levada pela emotividade e pelo 
imediatismo, demonstrando assim a presença de um tipo 
de direito vivo, pré-científico, na vida cotidiana.
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20
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
TEMA: DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA HERMENÊUTICA
Nesse segundo momento da unidade I, abordaremos a 
história da hermenêutica, a partir de três vertentes do 
seu desenvolvimento:
na teologia, • 
na filosofia e • 
no direito.• 
Demonstraremos que existe uma vinculação entre estes 
três ramos da hermenêutica desde a antiguidade, de modo 
que eles se influenciaram reciprocamente nos diversos 
períodos históricos.
Considerando que, em todas as sociedades, as normas jurídicas 
foram constituídas a partir de normas religiosas primitivas, a ativida-
de interpretativa tinha, nos seus primórdios, características religiosas 
e era realizada por sacerdotes, como parte de sua tarefa específica.
Foram os romanos os primeiros a fazerem aproveitamento da 
hermenêutica filosófica grega, através da atividade dos jurispru-
dentes. A partir de então, o desenvolvimento da hermenêutica ju-
rídica esteve atrelado à evolução da hermenêutica filosófica, inclu-
sive na formação da hermenêutica jurídica contemporânea, que 
sofreu fortes influências dos filósofos alemães.
1 HERMENÊUTICA TEOLÓGICA ANTIGA
Conforme já apresentamos, não só a palavra “hermenêutica” 
provém do âmbito religioso (teológico), mas também o proble-
ma objetivo da hermenêutica começou com as questões da in-
terpretação da lei judaica (a Torah). A questão da correta inter-
pretação da lei religiosa escrita sempre foi motivo de estudos e 
discussões entre os rabinos desde a antiguidade judaica.
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21
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Assim, sabemos pelos Evangelhos da existência dos “escri-
bas”, de sua importância e influência, da mesma forma como 
das várias escolas e correntes da exegese no antigo judaísmo 
(fariseus, saduceus, zelotes, etc.). Os Evangelhos relatam de-
bates e discussões de Jesus Cristo com os intérpretes da lei ju-
daica, como, por exemplo, o caso da moeda do tributo a César, 
o caso de comer sem lavar as mãos, o caso do trabalho no dia 
de sábado, dentre outros.
Na início da teologia cristã, na fase da exegese patrística (as-
sim chamado o período dos Padres da Igreja entre os séculos II 
e III) surgiu na realidade plenamente o problema hermenêutico 
entre os Padres Gregos, através da oposição entre a escola de 
Antioquia, que se atinha ao sentido histórico literal da narração 
bíblica, e a escola de Alexandria, que procurava atingir um “sen-
tido espiritual” mais elevado, e uma exposição simbólico-alegó-
rica. Esta dualidade de tendências continuou entre os Padres La-
tinos, com São Jerônimo de um lado e Santo Ambrósio do outro, 
ao passo que Santo Agostinho procura aliar esses dois modos de 
interpretar. A compreensão patrística da Escritura repercute, sob 
várias formas, na teologia da Idade Média.
A partir do começo da era moderna, o problema se agrava. 
A Reforma Protestante rejeita as interpretações dos padres 
medievais e apregoa a exigência de uma volta à pura palavra 
da Escritura. Conforme Lutero, a Bíblia não deve ser exposta 
e interpretada segundo o ensinamento tradicional dos Padres 
da Igreja, mas apenas compreendida por si mesma, pois ela é 
sui ipsius interpres, ou seja, intérprete de si mesma. Esta nova 
maneira de interpretar é conhecida como o princípio da scriptura 
sola (a escritura sozinha) e representa um novo princípio 
hermenêutico, contra o qual a Igreja Católica se pronunciou 
expressamente no Concílio de Trento, afirmando que cabe somente 
à Igreja a interpretação da Escritura. Enquanto isso, a tendência 
inaugurada por Lutero passa por sucessivos desdobramentos, 
fazendo surgirem diferentes denominações religiosas.
Escolas de Antioquia 
e de Alexandria - 
Duas escolas de te-
ologia da antiguida-
de, uma localizada 
em Antioquia (Síria) 
e a outra em Alexan-
dria (Egito), onde se 
iniciaram os estudos 
bíblicos antigos e 
que exerceram im-
portante influência 
sobre a interpreta-
ção da Bíblia.
Movimento religioso 
surgido no século 
XVI e liderado por 
Martinho Lutero com 
o objetivo de refor-
mar a Igreja Católi-
ca, o que originou o 
Protestantismo.
Concílio convoca-
do pelo Papa Paulo 
III para assegurar 
a unidade da fé e a 
disciplina eclesiásti-
ca, no contexto da 
reação da Igreja Ca-
tólica à divisão en-
tão vivida na Europa 
quanto à apreciação 
da Reforma Protes-
tante, razão pela 
qual é denominado 
como Concílio da 
Contra-Reforma.
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22
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Dessa forma, enquanto a Igreja Católica permanece fiel ao 
modelo interpretativo dos padres medievais, entre os protes-
tantes o problema toma-se mais grave com o advento do pen-
samento iluminista, que penetra lentamente no pensamento dos 
teólogos protestantes. John Locke e os livres pensadores ingleses 
do início do século XVIII mostram-se claramente tendenciosos a 
reduzir o cristianismo ao plano de uma religião da razão natural 
e, portanto, excluir todo caráter de sobrenatural e de mistério. 
De acordo com isso, a Sagrada Escritura deve ser entendida ape-
nas no sentido de uma pura religião racional, excluindo-se tudo 
o que ultrapassa essa ideia.
Cria-se então o princípio hermenêutico da racionalidade, 
aceitando apenas o que se aprende e esclarece racionalmente, 
com a eliminação dos conteúdos sobrenaturais da Bíblia.
2 HERMENÊUTICA TEOLÓGICA CONTEMPORÂNEA
Exemplo
Seguindo os passos do pensamento iluminista, que 
provocou uma verdadeira reviravolta na hermenêutica 
bíblica, abriu-se definitivamente o espaço para uma 
interpretação crítica da Bíblia. Um significativo exemplo 
disso foi o livro “Vida de Jesus”, de David Strauss (1835), 
no qual é apresentada uma nova versão dos ensinamentos 
de Cristo à luz da pura razão, fazendo uma distinção entre 
o Jesus histórico e o Jesus da fé.
A radicalidade de sua posição (Strauss achava que quase 
tudo o que está nas Escrituras pertence ao mito e deve ser 
cientificamente superado) desencadeia uma violenta discussão 
entre os teólogos, conduzindo à introdução do que foi denominado 
de método histórico-crítico no campo da exegese bíblica.
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23
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Importante
Segundo este método, a interpretação da Bíblia devia ser 
contextualizada, abrangendo não apenas o que estava 
escrito, mas ainda as influências sociais, históricas e culturais 
a que estavam submetidos os autores dos textos sagrados. 
Passou-se a entender a Bíblia não como um livro “ditado” 
por Deus, como se fosse um texto psicografado, mas como 
sendo uma mensagem divina escrita em linguagem humana.
Aliás, isso se relaciona com a descoberta de documentos antigos 
até então desconhecidos e com a irrupção de toda a pesquisa histó-
rica, histórico-cultural e histórico-religiosa do século XIX, pela qual 
se ficou conhecendo sempre melhor a história do Antigo Oriente, 
suas línguas e suas culturas, sua literatura e formas literárias, suas 
religiões, seus mitos religiosos e formas de expressão (gêneros lite-
rários). Assim, se começam a compreender os livros da Bíblia em seu 
ambiente, na história de seu surgimento e em sua peculiaridade, de 
acordo com umavisão mais moderada, embora alguns seguidores 
mais radicais da “teologia liberal” do protestantismo, em nome do 
cientificismo, insistissem em investigar de um modo puramente his-
tórico e crítico os livros da Sagrada Escritura, excluindo tudo quanto 
não fosse apreensível ou aprovado por esse método científico, rejei-
tando todos os milagres e fatos sobrenaturais ali descritos.
Contra esse radicalismo, ergue-se o protesto do “movimento 
hermenêutico”, que surge da oposição contra o predomínio exclu-
sivo da escola histórico-crítica, a saber, da ideia de que nessa con-
sideração e investigação da Escritura não há dúvida de que se fez 
algum trabalho valioso, esclarecendo-se muita coisa pelo contexto 
histórico, mas que não se alcança, e muito menos se entende, o 
que é precisamente próprio, ou seja, o “sentido” da Escritura, aqui-
lo que foi pensado e expresso.
Além da pesquisa histórica, impõe-se a tarefa de uma com-
preensão mais profunda, à qual unicamente se abrirá o ver-
dadeiro sentido da palavra de Deus. 
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24
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Assim, o movimento hermenêutico conseguiu aproximar os es-
tudos bíblicos nas teologias católica e protestante, fato que foi ob-
servado com maior clareza a partir de 1943, quando o Papa Pio XII 
(Encíclica Divino Afflante Spiritu) permitiu os métodos científicos 
de investigação e interpretação da Escritura e ainda na Constitui-
ção Dei Verbum do Concílio Vaticano II (1965), a qual exige que se 
veja e que se compreenda os estudos científicos da Escritura em 
íntima união com a tradição, porque a única revelação de Deus nos 
é transmitida na Escritura e na tradição.
Acentua-se igualmente o caráter humano e divino da Escritura. 
Enquanto ela é palavra humana pronunciada e transmitida atra-
vés da história, deve ser investigada histórico-criticamente com os 
meios da ciência moderna, quanto à origem histórica de cada um 
dos livros e quanto à maneira de pensar e de falar aí vigente. Ape-
sar disso, ela constitui um todo em que se manifesta a mensagem 
salvadora de Deus, mensagem transmitida na fé da Igreja e que 
continua a operar e se interpreta na vida e na doutrina da Igreja, 
devendo, por isso, ser entendida a partir desse contexto total e 
vivamente histórico. 
Dentro dessa linha de entendimento, surgiu na América La-
tina uma nova “leitura” dos textos bíblicos, abertos para a 
realidade típica dos países do terceiro mundo, que veio a cha-
mar-se Teologia da Libertação e representa uma tentativa 
de interpretar a Escritura a partir da vivência das pessoas 
dos países subdesenvolvidos, mostrando a mensagem cristã 
comprometida com os autênticos movimentos de superação 
da pobreza e da libertação do domínio econômico dos países 
mais poderosos. Essas reflexões entraram em choque com 
as escolas da exegese bíblica da Europa, gerando conflitos 
internos dentro do cristianismo, com momentos de tensão e 
incerteza que ainda não foram de todo superados.
O Concílio Vatica-
no II ocorreu entre 
1961 a 1965 convo-
cado pelo Papa João 
XXIII e concluído 
pelo Papa Paulo VI.
Divino Afflante Spiri-
tu (Ao soprar do Di-
vino Espírito) - Carta 
doutrinária do Papa 
Pio XII tratando dos 
estudos da Bíblia, 
escrita em 1943.
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25
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
3 HERMENÊUTICA FILOSÓFICA ANTIGA (PLATÃO E ARISTÓTELES)
Na filosofia grega antiga, a hermenêutica era vista primordial-
mente sob um caráter linguístico, voltada para a transmissão de 
uma mensagem. Trata-se de anunciar, esclarecer, traduzir algo que 
não está claro. Portanto, não se trata ainda de uma ciência herme-
nêutica, mas de uma simples técnica. Os filósofos gregos enten-
deram a hermenêutica apenas no âmbito da palavra, do discurso, 
portanto, no plano puramente literal.
Para Platão (séc. IV a.C.), a hermenêutica é uma técnica de 
compreensão que fica em segundo plano, já que as palavras nunca 
poderão nos dar um conhecimento verdadeiro sobre o mundo, uma 
vez que somente a ideia (pensamento) pode alcançar a verdade, 
entender e conhecer o real. Do mesmo modo que o artesão copia 
a obra de um artista, o intérprete faz uma imitação da ideia atra-
vés da palavra. Não produzindo saber, por ser mera repetição, a 
hermenêutica em Platão nunca poderia ajudar o homem a alcançar 
aquilo que ele coloca como meta de sua vida, o conhecimento do 
bem. No seu diálogo Crátilos, Platão expõe a origem e a utilização 
das palavras como mera convenção social, sem estarem relaciona-
das com as realidades verdadeiras, que são as ideias.
Por isso, segundo Platão, a hermenêutica não estaria relacio-
nada ao processo do conhecimento das coisas, mas apenas ao 
processo de comunicação entre as pessoas.
Aristóteles, discípulo de Platão, desenvolveu um pensamento 
diferente do mestre, mas também relacionado com o processo co-
municativo. Na sua obra “Peri Hermenéias” (acerca da interpreta-
ção), ele exibe um estudo sobre os conceitos e proposições, que 
apresentam uma característica de verdade. Uma proposição será 
verdadeira se corresponder com os fatos da realidade, ou seja, 
quando a comunicação descreve exatamente aquilo que ocorre no 
mundo, para que, com isso, outra pessoa também possa reproduzir 
na sua mente o que foi descrito por alguém. 
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Portanto, Aristóteles faz uma relação entre os conceitos e a rea-
lidade (mundo), pois ele entende que o processo do conhecimento 
se faz através de abstrações mentais daquilo que é adquirido por 
meio da experiência sensível (órgãos corporais). Porém, a herme-
nêutica de Aristóteles não investiga a verdade ou falsidade do juí-
zo, apenas a adequabilidade entre a linguagem e o pensamento.
Neste sentido, de acordo com Aristóteles, a hermenêutica 
será uma parte da lógica, tendo um papel acentuadamente 
explicativo de esclarecimento de conceitos, não da aquisição 
de novos conhecimentos.
Essas teorias filosóficas gregas, embora não vinculadas ao Di-
reito, tiveram influência marcante sobre os jurisconsultos romanos 
a partir da República (sobretudo Cícero), os quais eram estudiosos 
e admiradores de Platão e de Aristóteles, estando portanto presen-
tes nos primeiros tempos da formação do Direito Romano, através 
dos seus jurisprudentes.
Na próxima unidade, estudaremos o desenvolvimento da her-
menêutica filosófica moderna e contemporânea, bem como a 
sua aplicação ao Direito.
4 HERMENÊUTICA JURÍDICA ROMANA ANTIGA
Os jurisconsultos romanos, apoiados nas ideias dos pensadores 
gregos, evoluíram o conceito de hermenêutica para a interpretatio 
(interpretação), através do trabalho dos “juris prudentes”. Com estes, 
a hermenêutica formal dos gregos transformou-se pela aplicação prá-
tica em verdadeira criação do Direito. A interpretatio adentra o real e 
seu significado axiológico no momento da aplicação, pois se trata não 
apenas de entender um texto teórico, mas sobretudo aplicá-lo na prá-
tica, isto é, não apenas entender o texto da lei, mas compreender o 
seu significado nos efeitos práticos produzidos na vida das pessoas.
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Importante
Alguns estudiosos consideram a interpretatio romana como 
categoria básica da hermenêutica jurídica que se desenvol-
veu depois na idade média, tendo estabelecido também mé-
todos de interpretação, tais como o método analógico, 
que busca explicitar o que está implícito na norma, o método 
gramatical, que busca a conexão das partes da lei, o méto-
do lógico conjugado com o método histórico, que vincula a 
lei atual com as leis anteriores, com o método teleológico, 
que persegue a finalidade da lei, bem como o método siste-
mático, referente à extensãodos conceitos ao seu máximo 
alcance, sempre buscando o mais correto sentido da lei.
Dessa forma, a interpretatio romana buscava desvendar o sen-
tido e o alcance da norma, através da análise de três elementos 
fundamentais, para sua melhor compreensão:
a) a • ratio legis, isto é, o motivo ou causa determinante da nor-
ma, aquilo que se pretendeu atingir com a sua aprovação;
b) a • mens legis, isto é, o pensamento da lei, a intenção, o signi-
ficado social do seu conteúdo, por que e para que ela foi feita;
c) a • occasio legis, isto é, o momento histórico do seu aparecimento, 
as condições concretas que determinaram o seu surgimento.
A junção desses três elementos corresponde à interpreta-
ção mais correta do conteúdo da norma. Acompanhe alguns 
exemplos de juristas romanos famosos.
 
De acordo com o jurista Ulpiano, “a expressão ex legibus [de 
acordo com as leis] assim deve ser entendida: tanto de acordo com 
o espírito das leis, quanto pelas suas palavras”1. Esta citação re-
1 Expressão na língua original: Verbum ex legibus sic accipiendum est: tam 
ex legum sententia, quam ex verbis. (Digesto 50, 16, 6, 1)
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
presenta a preocupação dos romanos com a interpretação verbal, 
também chamada de gramatical ou filológica, a qual, porém, não 
pode ser tomada isoladamente, privilegiando-se o espírito da lei, 
ou seja, a intenção do legislador.
É do jurista Celso a formulação jurídica que sintetiza a impor-
tância dada à interpretação analógica. Diz ele: “Preferencialmente 
e mais poderosa do que a palavra é a intenção de quem fala”2. 
Seguindo esse mesmo entendimento, afirma o jurisconsulto Sálvio 
Juliano, considerado um dos maiores de todos os tempos: “Naque-
las coisas em que o direito se constituir contra a razão, não pode-
mos seguir a regra jurídica”3.
Também foi preocupação dos romanos a interpretação sistemá-
tica. Neste aspecto, é significativa a afirmação de Celso: “É contra 
o direito civil responder ou julgar de acordo com uma pequena 
parte retirada da lei, a não ser que toda a lei seja considerada”4. A 
síntese de tudo isso encontra-se no conceito de aequitas (equida-
de), como elemento norteador e ao mesmo tempo integrador da 
interpretação, seguindo o entendimento de Aristóteles. O mesmo 
Celso é o autor da formulação que melhor representa o conceito 
do direito romano clássico: “jus est ars boni et aequi” (o direito é a 
arte do bem e da equidade).
A produção jurídica da Roma antiga chegou até nós através do 
trabalho dos juristas do século VI d.C., encarregados pelo impera-
dor Justiniano de compilar e atualizar todos os escritos dos juris-
consultos clássicos, os já citados e outros, num total de 39, tendo 
como resultado o famoso Código de Justiniano (também conhecido 
como Corpus Juris Civilis).
Para Aristóteles, a 
equidade é o direito 
mais justo, a espé-
cie mais perfeita da 
justiça, a expressão 
do justo natural, em 
relação ao caso con-
creto, ou melhor, é a 
justiça concreta.
2 Expressão na língua original: Prior et potentior est, quam vox, mens 
dicentis. (Digesto, 33, 10, 7, 2)
3 Expressão na língua original: In his quae contra rationem jurisconstituta 
sunt, non possumus sequi regulam iuris. (Digesto, 1, 3, 15)
4 Expressão na língua original: Incivile est, nisi tota lege perspecta, uma 
aliqua particula eius proposita judicare vel respondere. (Digesto 50,17,1)
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29
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Curiosidade
Para se ter uma ideia da vastidão deste trabalho, observe-
se que a obra se compunha originalmente de três partes, as 
quais posteriormente foram reunidas num grande compên-
dio. Eram as Institutas ou Instituições (4 livros com 98 títu-
los), o Digesto (50 livros com 408 títulos e 150 mil verbetes) 
e o Codex (12 livros com 775 títulos e 4.700 constituições 
imperiais). A quarta parte foi acrescentada no século XVI, 
formada com as leis baixadas pelo próprio Justiniano (as 
Novellas), em número de 168.
Mesmo após a queda do império romano, as leis romanas conti-
nuaram a ser utilizadas no território europeu, nas terras dos bárba-
ros, os quais mesclaram a legislação romana às suas próprias e aos 
costumes dos povos locais, dando origem assim às Leis Romanas 
Bárbaras, que vigoraram na Europa nas regiões dominadas por eles. 
Destas, a mais importante foi a Lex Romana Visighotorum, também 
chamada de Breviário de Alarico, por ter sido composta por ordem 
deste imperador dos visigodos. Enquanto isso, na Itália, surgiram os 
primeiros estudiosos técnicos do direito romano: os glosadores. 
5 PERÍODO DE TRANSIÇÃO - GLOSADORES E COMENTADORES
Por influência dos bárbaros, o Código de Justiniano espalhou-
se por todo o território europeu, dispersando-se em 
bibliotecas de diversas cidades, as quais se localizavam em 
mosteiros religiosos. Foi assim que surgiram, no século X, os 
glosadores medievais, com um novo método de estudar 
o Direito baseado no Código de Justiniano (denominado 
depois de Corpus Juris Civilis - CJC), que eles ajudaram a 
organizar, ocorrendo assim a redescoberta do Direito Romano.
Os glosadores eram monges que encontraram casualmente en-
tre os alfarrábios da biblioteca do seu mosteiro, em Bolonha (Bo-
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30
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
logna, Itália), exemplares do Digesto de Justiniano e passaram a 
estudá-lo, observando que aqueles ensinamentos podiam ainda ser 
adotados com proveito, dada a sua bem cuidada elaboração. O tra-
balho desse monges consistiu em reinterpretar o Direito Romano 
para a sociedade medieval, estudo que repercutiu favoravelmente 
em toda a Europa, surgindo daí a primeira escola de Direito depois 
de Roma, chamada Escola de Bolonha, que influiu na formação dos 
juristas europeus das diversas nações.
Nessa época, não havia um estudo jurídico de modo autônomo, 
mas estava subordinado aos estudos da retórica e da dialética, 
de acordo com o currículo das Universidades Medievais. O traba-
lho dos glosadores mostrou a necessidade do estudo do direito de 
forma separada dos demais assuntos, surgindo daí o Direito como 
matéria acadêmica. O primeiro glosador foi Irnério (Werner), que 
iniciou o estudo jurídico autônomo e fez estudos completos sobre 
o Corpus Juris Civilis. Outro importante glosador foi Acúrsio, res-
ponsável pela obra denominada Glosa Ordinária, a maior do pensa-
mento jurídico da época, que serviu como texto de estudo jurídico 
para sucessivas gerações de juristas.
Importante
As glosas eram, portanto, interpretações explicativas feitas 
sobre os textos do Código de Justiniano. Inicialmente, fo-
ram um trabalho de exegese literal dos vários textos do CJC, 
representado por comentários situados às margens e entre 
as linhas dos manuscritos, destinados a esclarecer ou tornar 
compreensível alguma passagem mais duvidosa ou obscura, 
por se tratar de textos antigos. Posteriormente, passaram a 
abranger títulos inteiros, dada a sua extensão e complexida-
de. Este trabalho destinava-se a auxiliar os estudiosos e os 
magistrados na aplicação do direito aos casos concretos.
Tudo isso era feito com grande respeito ao texto, com o au-
xílio da gramática e da lógica, pois o conteúdo da obra tinha um 
caráter quase sagrado, limitando-se a resolver suas dificuldades 
e atualizá-lo para aquela época, sem alteração do texto original. 
As Universidades 
haviam surgido 
na Europa, a par-
tir do século X, e 
o seu currículo era 
composto de duas 
partes: o trivium 
(gramática, retóri-
ca e dialética) e o 
quadrivium (música, 
geometria, aritmé-
tica, astronomia). 
Nesta época, não 
havia uma matéria 
chamada “direito”, 
que estava embuti-
da no trivium (como 
parte da retórica e 
dialética). Com o 
trabalho dosglosa-
dores, percebeu-se 
a necessidade de 
um estudo à parte 
do CJC, tornando-se 
o “direito” uma ma-
téria autônoma de 
estudo, separada do 
trivium.
NEAD Núcleo de Educação a Distância
31
Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Nessa época, são compilados também e ampliados os conhecidos 
brocardos jurídicos, os quais representam formas interpretativas 
didáticas das leis e dos costumes tradicionais.
Os glosadores de Bolonha constituíram uma escola de grande signi-
ficação histórica para a evolução do Direito, considerada pelos historia-
dores como a mais célebre depois dos próprios jurisconsultos romanos. 
É fácil notar também a sua importância para a hermenêutica, dada a 
sua preocupação de adequar o CJC aos casos concretos da sua época.
Assim, as glosas nada mais eram do que um novo significado 
dado as antigas regras jurídicas romanas. O seu método con-
sistia no seguinte: para cada ponto ou problema particular, 
eles classificavam as passagens jurídicas em dois planos. No 
primeiro plano, buscavam compreender o sentido antigo da 
norma (de iure) e no segundo plano, tentavam estabelecer 
uma relação deste com o novo sentido da norma no seu tem-
po (de aequitate), conseguindo assim resolver as antinomias 
encontradas entre as leis antigas e os novos problemas.
Com este método e com uma interpretação literal mais agu-
da, os bolonheses conseguiram sistematizar toda a matéria e es-
tabelecer com segurança os princípios fundamentais e as ideias 
diretrizes do Direito Romano, assim como extrair as suas conse-
quências lógicas, perfazendo uma análise de profundidade, capaz 
de eliminar as dúvidas e incertezas.
Com o passar do tempo, as glosas foram se tornando repe-
titivas e não mais conseguiram acompanhar a evolução social. 
Assim, a partir do século XIII, surgiu uma nova forma evolutiva 
da Ciência do Direito, chamada escola dos Pós-glosadores ou 
Comentadores, que pretendia dar maior amplitude à interpreta-
ção. Com Acúrsio se encerra o período da interpretação literal do 
CJC e com Cino de Pistóia começa a nova interpretação, que iria 
perdurar na Itália até o século XVIII.
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
Importante
O ponto culminante desta escola deu-se com os comentado-
res Bártolo de Sassoferrato e Baldo de Ubaldis, que são con-
siderados os fundadores da ciência jurídica moderna. Par-
tindo do trabalho dos glosadores, eles ampliaram o alcance 
de suas interpretações, o que faziam levando em conside-
ração também outras fontes, tais como o Direito Canônico, 
o direito dos bárbaros, os costumes e direitos próprios dos 
diferentes povos e comunidades. Desta maneira, os comen-
tadores encaram a matéria jurídica de modo diferente dos 
glosadores, que a viam apenas exegeticamente. Acentua-
ram a necessidade de examinar os textos do Direito Roma-
no, no seu conjunto, e deles retirar princípios gerais, a fim 
de os aplicar aos problemas concretos do seu tempo. 
Os comentadores utilizaram em suas obras o método escolásti-
co, predominando o procedimento lógico dedutivo criado por Aris-
tóteles, método anteriormente já aplicado com sucesso na filosofia 
e na teologia. Porém, chegaram a exagerar em suas análises, com 
divisões e subdivisões, classificações e subclassificações, que re-
sultaram num desenvolvimento complicado e prolixo, cheias de su-
tilezas estéreis e excessivamente formais, contribuindo para o sur-
gimento de uma massa disforme de interpretações, que foi abolida 
pela Lei da Boa Razão, em Portugal, conforme se verá adiante. 
6 A HERMENÊUTICA NA MODERNIDADE - LEI DA BOA RAZÃO
O grande mérito dos glosadores e comentadores foi que, in-
terpretando e aplicando o Código de Justiniano, associando-o aos 
costumes e leis locais, aos poucos criaram uma base jurídica co-
mum (ius commune), que foi utilizada pelos juristas das nações 
europeias entre os séculos XVI e XVIII, para a elaboração de suas 
leis. Com o início da formação das nações modernas, a partir das 
grandes navegações, surgiu a necessidade de atribuir um cará-
ter oficial ao novo Direito, assumido pelos governos nascentes, os 
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
quais compuseram diversas Ordenações a partir das normas dis-
persas que já eram conhecidas, uma mistura de direito romano, 
leis romanas bárbaras e normas dos conquistadores muçulmanos. 
Era necessário, porém, dar um novo rumo à jurisprudência, 
porque a massa dos comentários se tornou um verdadeiro dilúvio 
de interpretações e opiniões, gerando inevitáveis discrepâncias com 
as leis e tornando o direito um labirinto de ideias, uma verdadeira 
árvore do bem e do mal, movimentada segundo os interesses de cada 
um. Impunha-se urgentemente uma organização metodológica.
Importante
Em Portugal, este esforço de organização legislativa culminou 
com a edição das Ordenações Afonsinas, que depois foram 
substituídas pelas Ordenações Manuelinas e posteriormente, 
pelas Filipinas. Visto que, porém, as regras e comentários dos 
antigos glosadores e comentadores continuavam sendo utili-
zados em Portugal, foi necessário um ato de autoridade para 
aboli-las e isto se deu pela chamada “Lei da Boa Razão” 
(Lei de 18.08.1769), baixada pelo Marquês de Pombal, que 
proibiu a utilização das glosas e comentários em juízo, seja 
pelos advogados, seja pelos magistrados, obrigando a todos 
ao uso da legislação pátria, sob pena de pesadas sanções. 
Isso não desmerece, no entanto, o trabalho interpretativo e 
criativo dos glosadores e comentadores, muito embora isso 
tenha contribuído para uma interpretação excessivamente 
formalista do direito, que ficou conhecida como mecânica ro-
manista, de grande influência em Portugal e no Brasil.
Esta hermenêutica de caráter medieval, baseada na escolástica 
foi também recusada e escarnecida pelo humanistas e iluminis-
tas que, na sua postura anti-metafísica e anti-religiosa, rejeitaram 
tudo o que fora produzido nos séculos anteriores. O iluminismo 
instala um novo modo de conhecer a realidade através da razão 
natural, utilizando-se do método crítico, com o auxílio da filologia e 
da história, combatendo toda autoridade que não seja baseada na 
razão e na experiência, tudo que impede o homem de pensar por si 
O Professor Salva-
tore Riccobono co-
menta no seu livro 
Roma Madre de las 
Leyes de 1975, que 
Lutero chamava a 
essas glosas e co-
mentários plenos de 
contradições, a “Bí-
blia do Diabo”.
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Hermenêutica Jurídica Unidade I - Origem e história
mesmo. Seus instrumentos são a razão autônoma, o conhecimen-
to, a ciência, a educação e teve um caráter pedagógico, através do 
projeto enciclopedista, uma tentativa de popularização do saber, 
com o intuito de libertar o homem da ignorância e da superstição. 
O iluminismo foi um movimento cultural geral, que abrangeu a 
filosofia, as artes, a literatura, as ciências, a política e também o 
direito, pois todos se encontravam sob o domínio da religião. 
Este movimento de cunho racionalista crítico, contudo, não 
trouxe contribuição significativa para a hermenêutica, sendo re-
conhecido aos glosadores e comentadores o mérito de serem 
considerados os verdadeiros intérpretes da obra de Justiniano e 
fundadores do direito comum europeu, fonte mais próxima dos 
direitos modernos, que permaneceram vigentes até a Revolução 
Francesa, quando teve início a hermenêutica contemporânea.
Chegamos ao final da primeira unidade do nosso estudo. Tra-
taremos sobre o tema das escolas da hermenêutica jurídi-
ca contemporânea a partir da Unidade IV. Mas lembre-se de 
complementar seus estudos nas web-aulas e nas participa-
ções do fórum. Até a próxima unidade!
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Referências Bibliográficas
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Interpretação Jurídica. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1992.
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CORETH, Emerich. Questões	 Fundamentais	 de	 Hermenêutica. 
São Paulo: Ed. EPU/EDUSP, 1973.
DESCARTES, René. Discurso sobre o Método. São Paulo: Ed. 
Martin Claret, 2001.
FALCÃO, Raimundo Bezerra. Hermenêutica. São Paulo: Malheiros, 2004.
HEIDEGGER, Martin. A caminho da Linguagem. Petrópolis - RJ: Ed. 
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MACHADO, Antônio Carlos. Fundamentos Sociológicos de uma 
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STEIN, E.. História e Ideologia. RS: Ed. Movimento, 1972.
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Créditos
UNIVERSIDADE DE FORTALEZA
Núcleo de Educação a Distância
Coordenação Geral
Carlos Alberto Batista
Supervisão Administrativa
Graziella Batista de Moura
Supervisão de Desenvolvimento
Liadina Camargo Lima
Produção de Conteúdo Didático
Antônio Carlos Machado
Projeto Instrucional
Andrea Chagas Alves de Almeida
Roteiro de Áudio e Vídeo
Andrea Chagas Alves de Almeida
Produção de Áudio e Vídeo
Sávio Félix Mota
Régis da Silva Pereira
Identidade Visual
Viviane Claudia Paiva Ramos
Programação
Filipe Pinto Cajazeiras
Diagramação de Material Didático
Sávio Félix Mota
Revisão Gramatical
Elane Silva Pereira
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