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CAP 1. INTRODUÇÃO À ECONOMIA 1.1 INTRODUÇÃO A palavra Economia vem do grego oikos (casa) e nomos (norma, lei). No sentido original seria a administração da casa, mais adiante generalizada como administração da coisa pública. A Economia é vista como uma ciência social, que estuda como o indivíduo e a sociedade decidem utilizar os recursos produtivos escassos na produção de bens e serviços, de modo a satisfazer suas próprias necessidades. Para os estudantes de Engenharia trata-se de uma disciplina obrigatória, mas complementar ao conhecimento, dada a importância que ela tem, em particular, no contexto brasileiro, que, historicamente, tem atravessado crises, que colocam a Economia no centro das atenções, mas, diante das dificuldades inerentes, os responsáveis não parecem ser capazes de oferecer soluções satisfatórias. Pode-se imaginar que um Engenheiro tenha a capacidade mínima de captar o chamado “economês”, como popularmente é conhecida a linguagem usada pelos especialistas, muitas vezes com o explícito propósito de não serem claramente entendidos. Ao concluir esta disciplina, o aluno de ITE não deve imaginar que se tornou um economista, mas um engenheiro com visão mais aprofundada do mundo, embora muitos economistas tenham, antes, se formado em Engenharia, como é o caso daquele considerado, por muitos, o mais famoso dos economistas brasileiros, Mário Henrique Simonsen (1935-1997). Para a maior parte dos economistas, o objeto de estudo da ciência econômica vem a ser a questão da escassez. Essa escassez deriva-se do fato que, ao longo da história, os recursos produtivos tradicionais de toda a sociedade, incluindo-se mão de obra, capital, terra, matérias-primas são certamente, escassos. Em períodos recentes, outros fatores produtivos tornaram-se fundamentais, como a tecnologia, a informação além do acesso a recursos financeiros. Nos anos 70, um grupo de ilustres economistas, e especialistas, preocupados com o destino do planeta, em particular com a existência limitada das matérias-primas, reuniu-se em Roma, formando o “Clube de Roma”, no qual propuseram, em bases científicas, limites ao crescimento econômico. Por motivos variados, em particular os avanços tecnológicos e o desenvolvimento de muitos materiais alternativos, e resistências diversas, o “Clube” perdeu sua eloquência, mas surgiram novos e assemelhados problemas, atualmente ligados ao meio ambiente, como a poluição, o aquecimento global, as crises prospectivas, a sustentabilidade etc. A Economia costuma ser subdividida em duas partes: 1) a Microeconomia, que se dedica ao estudo das unidades econômicas básicas, como consumidores e produtores, a estrutura do mercado; a determinação de preços e quantidades etc.; e 2) a Macroeconomia, que estuda o comportamento dos grandes agregados, como: o PIB; o consumo nacional; o investimento agregado; o nível geral de preços; as exportações/importações; a política econômica; o nível de emprego; o desenvolvimento econômico, o equilíbrio das contas públicas, a inflação, o nível das reservas internacionais etc. 1.2. SISTEMAS ECONÔMICOS E ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA Nos últimos anos, o mundo andou dividido em duas formas, digamos, extremas, de organização econômica, a saber: • Economia capitalista ou de mercado; • Economia socialista ou de planejamento central A segunda forma de organização econômica foi praticamente encerrada em 1989 com a chamada “Queda do Muro de Berlim”, que separava a Alemanha em duas partes e, para muitos, mostrou o triunfo de uma forma de organização sobre a outra, mas essa avaliação desperta conflitos e é, certamente, uma visão parcial do problema. Antes dessas duas formas acima, houve uma outra corrente igualmente significativa, que quase dominou o mundo pela força das armas durante a 2ª Guerra Mundial – o nazi-facismo. Anteriormente, existiram outras formas de organização, como o absolutismo, em que monarcas eram autônomos em todas as decisões, sistema este superado pelo advento generalizado da democracia e pelas imposições da revolução francesa. As duas organizações extremas acima citadas impuseram ao mundo, ao longo do pós-guerra, o que então se denominou “guerra fria”, que consistia em um ambiente hostil, de conflagração iminente, incluindo armamentos letais em larga escala, alianças militares de vários tipos etc. Ao longo desta época, alguns outros países, contrários à polarização do mundo, e denominados de países não alinhados, procuraram caminhos alternativos, mas ao custo de severas punições. Um exemplo encontra- se na Índia, então um país que sofria crises de fome, e recebia ajuda alimentícia, decidiu criticar a guerra no Vietnam, que resultou na suspensão da ajuda que recebia. No Brasil, prevaleceu a tese que seríamos um país capitalista, mas que aproveitaríamos elementos úteis derivados do planejamento central, gerando ainda nos dias de hoje um forte debate político entre aqueles que desejam mais capitalismo e menos governo e os que desejam o oposto: mais planejamento centralizado e menos decisões de mercado. Claramente, a formação de um Economista, inserido nas Ciências Sociais, diverge muito de um Engenheiro, exigindo forte conhecimento da filosofia e da história da humanidade, assim como o comportamento da sociedade em geral, e a organização do direito constitucional vigente. O nosso texto examina o funcionamento de uma economia de mercado sob duas óticas: • O sistema de concorrência pura, sem interferência do governo; • O sistema de economia mista, com interferência do governo. A primeira ótica seria um sistema de concorrência pura ou perfeitamente competitivo, aproximando-se do conceito do laissez faire, ou seja, um sistema em que nenhum dos milhares de produtores e milhões de consumidores precisaria da intervenção do Estado na atividade econômica, pois seriam guiados pela mão invisível sugerida por Adam Smith (cf. Seção 1.5) e encontrariam o equilíbrio econômico. Em outras palavras, havendo excesso de oferta haveria formação de estoques nas empresas, que seriam levadas a diminuir preços para escoar a produção e, havendo excesso de demanda, haveria filas, com competição entre os consumidores, fazendo os preços aumentarem, até se alcançar o equilíbrio. Assim, o sistema seria excelente, pois todo problema seria auto regulável. Dessa forma, o equilibro vem a ser sempre alcançado, sem a participação do governo. Tem-se aqui a base do liberalismo econômico, que advoga a soberania do mercado, ficando para o governo as tarefas ligadas à estabilidade monetária, ao nível de emprego etc. e com o mercado definindo outras questões econômicas fundamentais, como os preços e quantidades oferecidas. Certamente, existe uma enxurrada de louvores e de críticas quanto à eficácia desse sistema de concorrência pura, ou economia de mercado. Nosso texto de referência destaca contradições em diversos argumentos econômicos, como as artificialidades inerentes, os monopólios, as crises cíclicas etc., mas poderia incluir argumentos políticos, que obrigassem os governantes a serem menos confiantes no poder do “mercado” e permanecessem mais ativos e menos impassíveis observadores dos problemas econômicos. Por outro lado, a recente crise financeira de 2008 costuma ser creditada, por muitos críticos, justamente à ausência do governo nas regulamentações. Igualmente, muitas outras crises de um passado recente foram superadas pela ação enérgica dos governantes ou órgãos fiscalizadores, em particular a crise da Bolsa de Nova York de 1986, que foi superada pela compra maciça de ações pelo governo americano, usando fundos dos planos de pensão dos funcionários públicos de Nova York, e conseguiu deter a queda das cotações, ao contrário da crise de 1929, em que não havia mecanismos de travamentoda queda da Bolsa. Além dessas tem-se as argumentações de natureza social, que tal sistema agravaria as distorções e a concentração de renda. Certamente, é difícil de esquecer ou ignorar a famosa crise de 1929, que afetou a todo o planeta. O sistema de concorrência pura, mas com interferência do governo, ocorre no Brasil e em muitos países do mundo, possivelmente todos, mas em distintos graus. Em nosso país, o exemplo certamente mais significativo vem a ser a imposição do salário mínimo que regula as relações básicas do trabalho. Para muitos, ligados à economia de mercado, entretanto, esse violaria a livre determinação de preços no mercado de trabalho, mas, para outros, daria a dignidade mínima exigida pelo ser humano, enquanto trabalhador. Na recente eleição americana, questões referentes a aumentos do salário mínimo foram objeto de intenso debate, mas, como se sabe, as forças que defendem o mercado mantiveram seu poder. Na prática, as complexidades trazidas pela evolução tecnológica, a partir de finais do século XIX, com a força dos sindicatos e a ação dos monopólios, estes fortemente monitorados pela Justiça nos Estados Unidos a partir do final do século XIX, tornaram muito comuns os sistemas de economia mista. Esses sistemas favoreceram a criação de empresas denominadas de “empresas de economia mista”, além da criação de empresas responsáveis pelo fornecimento de serviços públicos, pela ocupação de espaços que seriam monopólios naturais, pelo fornecimento de bens públicos etc. Desenvolvimentos bem recentes, denominados de privatizações passaram a questionar a importante presença de empresas públicas na estrutura industrial de todos os países, mas elas são inegociáveis em muitos, como, por exemplo, no sistema ferroviário da Suiça e nos demais países europeus. Aparentemente, existe uma força mais significativa que a organização econômica, que vem a ser a ética individual, juntamente com o respeito ao cidadão, elementos estes – ética e respeito – que garantem a eficácia de qualquer sistema de governo. No caso de países com economia planificada, o exemplo maior era dado pela Rússia. Segundo muitos analistas, como a Enciclopédia Britânica e o famoso historiador Eric Hobsbawn (Era dos Extremos), esse sistema mostrou-se eficaz durante décadas, quando se produziam os Planos Quinquenais, a partir de 1928, que impulsionaram o crescimento relativo daquele país, então uma região agrícola, bem acima dos demais países. Entretanto, o sistema deixou de ser eficaz em épocas mais recentes, com o desenvolvimento acelerado da imensa variedade de produtos de consumo hoje existente. Aparentemente, para alguns, incluindo Mickhail Gorbachev, último governante soviético, o excesso de direitos dados aos trabalhadores, inclusive o direito a manter-se empregado, mas sem trabalhar, acabou decretando a falência competitiva do sistema. 1.3. A CURVA DE POSSIBILIDADES DE PRODUÇÃO (CPP) A curva ou fronteira CPP vem a ser a fronteira máxima de produção que a economia pode alcançar com os seus recursos produtivos. Basicamente, todo livro texto de economia menciona esta curva, em geral, em termos das opções: canhões versus manteiga; ou bens civis versus bens militares ou outras alternativas radicais.No primeiro caso, a curva indicaria em um eixo quanto de canhões poderia ser produzido, mantendo-se ao nível zero a produção de manteiga, e, no outro eixo, a produção máxima de manteiga, mantendo-se ao nível zero a produção de canhões e os pontos intermediários seriam pontos onde mais de uma opção e menos de outra podem ser produzidas, gerando- se uma curva convexa. Aparentemente, na Idade Média, quando prevaleciam governantes autoritários ou monarcas absolutistas, tais opções extremas faziam todo sentido e seriam adotadas por decisão de governantes, mas, nos dias de hoje, com o advento de sistemas democráticos e com a participação da população local nas decisões, existirão sempre questionamentos e situações intermediárias. Portanto, tais decisões extremas são hoje raramente praticadas. Em todo caso, podemos arriscar dois exemplos, caso as informações que nos chegam pela imprensa sejam efetivamente verdadeiras. Em tais casos, a Coréia do Norte seria um país que adota a prática de investir preferencialmente em armas, em lugar de alimentos; em outro extremo estaria a Costa Rica, na América Central, um país idílico, em sua maior parte coberta por parques nacionais, sem exército e com elevados níveis de bem-estar, sugerindo ser um país em que a prioridade vem a ser produção de alimentos e a felicidade de seus cidadãos. Dentro do conceito CPP surgem diversas outras variações que, representados em gráficos, teriam outros eixos determinantes • Nações pobres e nações desenvolvidas. Para as nações pobres ou primitivas, só existe uma alternativa: produzir para sobrevivência, enquanto às desenvolvidas permitem-se outras opções; • Investimentos no bem-estar coletivo, em que a sociedade concorda em pagar impostos que facilitarão a vida coletiva, como abertura e manutenção de escolas, de estradas, de hospitais, de segurança etc. Trata-se de opção aberta às nações mais desenvolvidas; • Consumo hoje e consumo futuro, são decisões que interessam às nações mais desenvolvidas e sem sentido para as mais pobres, estas preocupadas com a sobrevivência de hoje, enquanto as mais ricas buscam planejar e melhorar os dias futuros; e • Inovações tecnológicas são formas modernas de poupar hoje, em lugar de consumir, e investir na melhoria do futuro. Nos dias atuais, as inovações tecnológicas fazem parte das políticas públicas em todo país minimamente moderno. 1.4. Relação da Economia com outras Ciências Na era denominada de pré-economia, ainda durante ou até a Idade Média, a atividade econômica era orientada por princípios morais e de justiça, fazendo parte da Filosofia, Moral e Ética. Alguns princípios encontravam-se na Lei da Usura, que não aceitava o juro como parte do pagamento, preocupando-se com o preço justo, tema ainda hoje complexo. O estudo sistemático da Economia coincide com os avanços nas áreas de Física, trazendo a concepção mecanicista, e na Biologia, com sua concepção organicista nos séculos XVIII e XIX. Com o passar dos tempos, predomina uma visão humanística, que coloca em plano superior os motivantes psicológicos da atividade humana. Como a economia se insere no campo das ciências sociais, surge uma relação direta entre a Economia e a Sociologia, pois esta se depara com a mobilidade social das diversas classes de renda, enquanto a Economia influencia diretamente tal mobilidade. Por outro lado, muitos afirmam que todas as guerras têm motivações econômicas, e bem mais raramente, motivações religiosas. Uma dessas exceções foram as Cruzadas no século XI, que tiveram motivação religiosa, mas fortes consequências econômicas. Uma dessas consequências imprevistas foi a conquista da Inglaterra pelos Normandos, enquanto o alto comando inglês encontrava-se em guerra no Oriente. A história encontra-se romanceada no célebre livro Ivanhoé, do literato inglês Sir Walter Scott, quando havia duas línguas em uso no país: o francês do dominador e o inglês do povo. Ao retornarem das Cruzadas, houve uma composição entre normandos e ingleses e a língua evoluiu para o atual inglês, que tem forte influência latina, via o francês. Com tudo isso, a História tem um papel básico na observação de fatores econômicos e vice-versa. No caso do Brasil, para muitos, a História só faz sentido quando associada aos ciclos econômicos do país, como o extrativismo vegetal do pau brasil, o ciclo do açúcar, o ciclo do ouro, o ciclo da borracha, o ciclo do café, o desenvolvimento industrial iniciado em 1929 etc. Decorrente disso, tem-se a conexão entre Economia,História e Geografia, assim como outros desdobramentos, como a Economia Regional, a Economia Urbana, a Teoria da Localização Industrial, a Urbanização etc. Outras relações importantes decorrem da relação entre Economia, Política e o Direito, com suas normas jurídicas e a importância da Constituição. Tais fatores interagem entre si de múltiplas formas, segundo cada país e eventuais alterações dependem de ações variadas e, muitas vezes, das tradições existentes. Além disso, a Economia se relaciona fortemente com a Matemática e com a Estatística, pois estas criam ferramentas capazes de estabelecer relações entre variáveis econômicas, assim como fazer previsões econômicas. Um instrumento específico para o estudo das relações econômicas encontra-se na Econometria, e nos avanços da Informática. Em capítulos posteriores, a partir do Capítulo 8, serão definidas funções como a Renda Nacional (RN) e a função Consumo (C), e será notado que o Consumo vem a ser uma função da Renda Nacional, C = f(RN), e o crescimento da Renda Nacional acarreta um aumento do Consumo, ou seja, dC/dRN> 0, notando-se que as necessidades humanas são ilimitadas, mas os recursos são escassos. Cabe notar que a Economia lida com leis probabilísticas, pois o comportamento de uma pessoa pode ser previsível, mas o comportamento de um conjunto de pessoas seria mais incerto. 1.5. ELEMENTOS HISTORICOS DA ECONOMIA Existem muitos textos exclusivos sobre a história da Economia, como pode ser encontrado no Google, mas nas presentes notas somente alguns nomes marcantes serão citados, ao custo de muitas injustiças. Na Bíblia, não vejo contribuições, mas interpretações do texto levaram à proibição do recebimento de juros como parcela do preço e dos ganhos, procedimento que vigorou por centenas de anos, e, segundo analistas, teria levado, ao longo da história, muitos judeus a se tornarem banqueiros e intermediários financeiros. Em períodos mais recentes, tem-se a corrente de economistas clássicos, assim nomeados por Keynes. O francês Jean Baptiste Say (1767-1832) advogava o comércio livre e afirmava que “a oferta cria a própria procura”, ou Lei de Say, hoje refutada. Quesnay (1694-1774) era o líder dos fisiocratas, que o termo “laissez faire”, afirmava que a terra é a única fonte de riqueza, afirmativa talvez correta para aquela época. O escocês Adam Smith (1723-1790) que escreveu o texto: A Riqueza das Nações, talvez seja a figura mais marcante desses primórdios. Ele formulou a teoria da mão invisível, segundo a qual o equilíbrio das necessidades da sociedade era alcançada sem planejamento externo, como se houvesse uma mão invisível a direcionar os agentes produtivos, seus intermediários, e os consumidores. Curiosamente, a frase de Adam Smith parece ter maior relevância nos dias de hoje do que naquela época, quando ele se inspirava na observação dos mercados públicos de alimentos, sempre reabastecidos ao longo das noites, antes de conhecida a demanda dos consumidores. Outras correntes e nomes significativos foram: o mercantilismo, corrente combatida na época por muitos e hoje irrelevante, que buscava promover barreiras e protecionismo, de modo a auferir lucros derivados das trocas comerciais e favorecer governantes de perfil autocrático. O mercantilismo se expandiu nos séculos XV a XVIII e se explica pela gestação de novos Estados nacionais, em geral pobres e sem acesso ao ouro e prata, mas ambiciosos, que viram possível fonte de riquezas no controle do comércio e na posse de colônias em outros continentes. Consultar: David Ricardo; Malthus; James Mill; Stuart Mill etc. Em 1870 surge a teoria marginalista, muito baseada na utilidade marginal (discutida no Capítulo 2), e grandes nomes como Eugen Von Böhm-Bawerk; Alfred Marshall; Léon Walras; Shumpeter (ligado ao desenvolvimento econômico); Vilfredo Pareto; Arthur Pigou etc. Em 1929 surge o crack da Bolsa de Nova York e a grande depressão, levando a taxa de desemprego a cerca de 25%, e milhões ao desespero, com reflexos em todo o mundo, inclusive na produção de café no Brasil, então sem mercado, que levou o governo da época a comprar as safras e jogá-las ao mar, em política inflacionária, mas vista com razoável apoio nos dias de hoje, pois manteve a renda do campo e preservou a manutenção da atividade. Nesse ambiente, surge o inglês Keynes (1883-1946), visto hoje como o pai da moderna Economia. Ele advogava a ação do governo para estimular os agentes econômicos, e, para muitos, foi o responsável pela recuperação da economia americana no pós 1929, mediante programas intensos, como a construção da notável malha rodoviária daquele país. A obra de Keynes, publicada em 1936, a ser muito explorada nos capítulos posteriores, teve a contribuição de John Hicks, em 1937, em sua divulgação e popularização, e de Alvin Hansen, que desenvolveu a análise IS-LM, a ser abordada em nosso último capítulo (Cap. 12). Dentre os monetaristas, Milton Friedmann (1912-2006) é o nome mais importante, associado à Escola de Chicago, fortemente conservador e anti-keynesiano, que expõe seus pontos de vista no livro: “Freedom to Choose”. Uma de suas teses, certamente polêmica, é que a recuperação da crise de 1929 poderia ter ocorrido sem o uso da terapêutica keynesiana, mas com políticas monetárias. Recebeu um prêmio Nobel em 1976. Chicago boys é o nome pejorativo dado aos economistas formados em Chicago, e que tiveram, em fins do século passado, importante papel na gestão econômica de alguns países da America Latina, especialmente o Chile. Em corrente contrária ao capitalismo, Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels redigem, antes do crack da Bolsa de Nova York, o manifesto comunista, explicitando os malefícios sociais advindos do capitalismo, com a concentração de poder e patrimônio, contra os interesses básicos da classe operária. O manifesto conclui com a exortação à classe trabalhadora: “trabalhadores, uni-vos”. Para Marx, o desenvolvimento do capitalismo levaria naturalmente ao comunismo, mas, para surpresa geral, o comunismo se impôs na Rússia, um país de perfil agrícola e pré-capitalista, adiante denominada de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Figura acadêmica importante, de orientação marxista, é o economista polonês Kalecki (1899-1970), considerado precursor de Keynes, embora não reconhecido, pois seus trabalhos foram publicados em sua língua materna e, naquela época, ignorados no Ocidente. John Kenneth Galbraith (1908-2006), economista, filósofo, professor e escritor americano, com posições keynesianas, visto como um liberal reformista. Suas obras mais difundidas foram: A Era da Incerteza e “The Affluent Society”, além de séries para a TV. Foi nomeado por John F. Kennedy embaixador na Índia. Com respeito à política do Partido Republicano americano de reduzir os impostos para o segmento mais rico, como forma de melhorar a vida dos demais, criticamente, ele comparou-a à ideia de alimentar bem um cavalo de modo a enriquecer seus excrementos e melhorar a dieta dos pássaros. Outros nomes, sejam novos clássicos, novos keynesianos ou pós-keynesianos, destacam-se (em lista fortemente incompleta): Sargent; Lucas; Joan Robinson etc. No caso Brasil, cabe citar o economista Celso Furtado (1920-2004), especialista em Desenvolvimento, primeiro diretor da Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), e primeiro chefe do Ministério do Desenvolvimento, criado no Governo Kubitscheck, tendo sido, antes, diretor da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), órgão criado pela ONU em 1948. A CEPAL tinha um escritório no Brasil chefiado por Furtado até 1964, quando foi fechado pelo regime militar e Furtado seguiu exilado para Paris. A tônica da CEPAL era criticaro espaço secundário dado aos países da América Latina, constituída por países marginais à cena mundial, quando o continente era visto como um mero fornecedor de matérias-primas, e implementar ali o desenvolvimento econômico. Celso Furtado era um economista desenvolvimentista, instrumental na aplicação da política do Governo Kubitschek, entre 1955 a 1960, cujo mote era: “cinquenta anos em cinco”, que pretendia em cinco anos fazer o país progredir cinquenta, mas desprezando as consequências inflacionárias. Furtado foi autor de muitos livros, tendo sido eleito, em 1997, para a ABL (Academia Brasileira de Letras). O primeiro incentivador da CEPAL foi o economista argentino Raúl Prebish (1901-1986), e seu diretor no longo período 1950 até 1963. Segundo Prebish, os estágios de subdesenvolvimento e processos inflacionários em que viviam os países da América Latina tinham a ver com as deficiências trazidas pela estrutura econômica reinante, como a estrutura agrária, a estrutura oligopolística do mercado, a estrutura do comércio internacional etc. O pensamento estruturalista, de acordo com Prebish, tem o desenvolvimentismo como antídoto. Essas visões, certamente, muito impulsionaram as organizações estudantis da época, sempre muito críticas às políticas econômicas adotadas, e animaram os conflitos com o regime militar que surgiu em 1964, o qual suspendeu por alguns anos as atividades da CEPAL no Brasil, levando Celso Furtado ao exílio. Em contraposição ao desenvolvimento estruturalista, havia, na mesma época, a visão monetarista de Milton Friedmann, que via a solução dos problemas na economia de mercado, sem a intervenção do Estado, em conflito ideológico que, por uma multiplicidade de razões, que ultrapassam o estrito domínio de Economia, deve perdurar por longo tempo. Os monetaristas são, hoje, também chamados de neoliberais ou de ortodoxos, enquanto os desenvolvimentistas costumam ser chamados de heterodoxos, em conflitos que têm envolvido por longa data toda a nossa sociedade e, possivelmente, têm legitimado a existência deste curso introdutório para engenheiros, de modo a incluí-los nos debates ideológicos. 1.6. DIVISÃO DO ESTUDO ECONÔMICO Como já dito antes, a Economia se divide em duas partes: A Micro e a Macroeconomia, que costumam ser estudadas separadamente, mas no presente curso para estudantes de Engenharia – ITE – são vistas brevemente na mesma disciplina. A nosso ver, pode-se afirmar que a parte profissionalmente mais importante para o Engenheiro vem a ser a Microeconomia, pois a parte Macroeconômica, embora afetando a todos os cidadãos, parece mais talhada para os decisores políticos no Governo Central e economistas de formação. Portanto, a divisão da Economia em duas partes resulta em: A) A Microeconomia, que estuda o comportamento das unidades econômicas básicas, como os consumidores e os produtores, e busca determinar preços e quantidades ofertadas, coberta nos Capítulos 2 a 7; B) A Macroeconomia que estuda os grandes agregados, como o PIB, o consumo nacional, o investimento, exportações e importações etc. Preocupa-se com o nível geral de preços, o nível deemprego, a inflação etc. A partir do Capítulo 8, o texto dedica-se a esse tema 2. DEMANDA, OFERTA E EQUILÍBRIO DE MERCADO 2.1 FUNDAMENTOS DE MICROECONOMIA A Microeconomia, ou Teoria dos Preços, é a parte da teoria econômica que estuda o comportamento das famílias e das empresas, assim como as características dos mercados nos quais operam. Os Capítulos 2 a 7 dedicam-se à Microeconomia, enquanto que, a partir do Cap. 8, iremos examinar a Macroeconomia, onde são estudados os grandes agregados, seja o conjunto de indivíduos ou de famílias, seja o conjunto de empresas, unindo ainda o governo e o mercado exterior. Naquele momento definiremos o PIB, o Produto Nacional, o Nível de Renda, a Moeda etc. A Microeconomia, embora estude as unidades menores, famílias ou indivíduos, e empresas, não tem um foco específico na empresa ou nas famílias, mas no mercado no qual as empresas e consumidores interagem. Em um primeiro modelo mais simples, a ser visto no Capítulo 9, os preços são formados com base em dois mercados: 1) o mercado de bens e serviços adquiridos pelos consumidores; e 2) o mercado dos fatores de produção, formado por salários, alugueis, lucros e juros, os quais remuneram os referidos fatores de produção. Os dois grandes tópicos abordados pela Microeconomia são: a Teoria da Demanda e a Teoria da Oferta, aos quais se somam elementos desenvolvidos mais recentemente pela pesquisa científica, os quais se encontram no Capítulo 7, a saber: a análise das estruturas de mercado, a teoria do equilíbrio geral e do bem-estar e as imperfeições do mercado. Entretanto, esses últimos tópicos não são abordados com detalhes nestas notas introdutórias. 2.2 ANÁLISE DA DEMANDA DE MERCADO A Demanda pode ser definida como a quantidade de determinado bem ou serviço que os consumidores desejam adquirir, num dado período, dados alguns elementos como a sua renda, a composição de seus gastos e o preço de mercado. Os fundamentos da análise da demanda estão baseados no conceito de utilidade, que tem raízes no século XVIII, quando o célebre matemático suíço Bernouilli, buscando entender a racionalidade das decisões humanas, nem sempre voltadas para valores monetários, percebeu a necessidade de conceituar tal elemento, essencialmente subjetivo e propôs o que veio a ser conhecido como o Paradoxo de Bernouilli. A Teoria do Valor Utilidade veio substituir ou complementar a teoria vigente até então, a Teoria do Valor Trabalho. Entendiam os economistas clássicos, por razões bem razoáveis para aquela época, que o valor de um bem estava relacionado aos custos do trabalho aplicado na produção daquele bem, ou seja, o valor de um bem se formaria do lado da oferta. Pela atual Teoria da Utilidade, o valor do bem tem a ver com a satisfação oferecida ao consumidor, o lado da demanda, que envolve a utilidade. 2.3 A UTILIDADE TOTAL E A UTILIDADE MARGINAL Dois elementos podem ser agregados na análise, e que ajudam as visualizações gráficas: as curvas de indiferença e a restrição orçamentária. As primeiras, aplicadas a comparações entre dois bens X e Y, estabelecem quanto o consumidor trocaria de um bem X por outro Y, de modo a manter-me no mesmo nível de utilidade. Essa relação é conhecida como Taxa Marginal de Substituição (TMS), taxa que representa a quantidade de um bem a ser trocado por um outro bem, mas mantendo o mesmo nível de satisfação e bem-estar do consumidor, ou seja, a mesma utilidade. Matematicamente, a TMS pode ser calculada por: , onde o sinal negativo tem a ver com a diminuição da quantidade q1 do bem 1, em favor do aumento da quantidade do outro bem, inicialmente fixada em q2 ou o contrário: aumento do bem q1 em favor de uma diminuição do bem q2. Após a curva de indiferença vista acima, o segundo elemento que pode ser agregado na análise vem a ser a reta orçamentária, dada pela equação abaixo, que estabelece as opções viáveis entre dois bens X e Y, cada um com um preço distinto, à luz do orçamento disponível do consumidor. Certamente, eu posso aumentar minha curva de utilidade, mas isso impõe o uso de mais recursos. Com a reta orçamentária, o consumidor pode identificar tanto a curva de utilidade de maior nível alcançável, mas também a composição do consumo entre os bens X e Y, que levam a atingir a maior utilidade possível, mas respeitando a renda R existente. Algumas figuras podem ilustrar tais comportamentos e a escolha mais apropriada. A restrição orçamentária, matematicamente, pode ser mostrada por uma relação linear. Seja R o orçamento, e px e py os preços unitários dos bens X e Y respectivamente,sendo qx e qy as quantidades demandadas. Então, a equação orçamentária é: Ao se maximizar o valor da utilidade, tendo como restrição a equação orçamentária, a solução obtida vai identificar os valores qx e qy a serem adquiridos aos preços dados. 2.4 A FUNÇÃO GERAL DE DEMANDA De uma forma geral, a quantidade demandada de um bem pode ser expressa por uma função de muitas variáveis, que seria denominada de função geral da demanda, que pode ser verbalizada da seguinte forma: a demanda por um bem ou serviço pode ser afetada por muitos fatores, como o preço daquele bem ou serviço i, o preço de outros bens ou serviços, em particular os bens substitutos ou alternativos, e os bens complementares, além da renda, a riqueza, fatores climáticos e sazonais, a localização, a propaganda, os gostos, hábitos e preferências dos consumidores, as expectativas sobre o futuro, as facilidades de crédito etc. Seja, assim, a seguinte função de demanda: , onde: = quantidade demandada do item i, no período t; = preço do bem i, no período t; = preço dos bens substitutos no mesmo período t; = preço dos bens complementares no mesmo período t; R = renda do consumidor; H = hábitos e preferências do consumidor. Relação entre a quantidade demandada e o preço do bem. Seja a curva simplificada de demanda, em que a demanda pelo bem i depende unicamente do preço deste bem: , certamente o elemento mais significativo, com os demais parâmetros mantidos constantes, sendo ⁄ , ou lei geral da demanda, que significa que a quantidade demandada de um bem varia na relação inversa de seu preço. Relação entre quantidade demandada e preços de outros bens A relação entre quantidades demandadas de dois bens ou serviços leva ao conceito de bens substitutos ou alternativos e bens complementares. No primeiro caso, o de bens substitutos, tem-se bens em que há uma relação entre o consumo de ambos, ou seja, se um certo bem passa a custar mais caro, isso estimula o consumo do outro bem, visto como substituto ou alternativo. Exemplos abundam, como: i) marcas de cerveja; ii) consumo entre carne, frango, peixe e ovos; iii) consumo de marcas de refrigerantes; iv) carros novos ou usados etc.; No caso de bens complementares, o consumo de um estimula ou induz o consumo do outro. Exemplos abundam, como: i) consumo de pão e manteiga; ii) compra de carros e consumo de gasolina ou pneus; iii) padrão de elegância no passado era usar uma camisa com sua cor combinando com a cor da meia ou da gravata. O segundo exemplo sugere que um aumento nos preços dos automóveis deve diminuir o consumo de gasolina ou de pneus. Relação entre demanda de um bem e renda do consumidor Aqui, tem-se a conceituação de três tipos de produtos: i) Bem normal, cuja demanda aumenta em decorrência do aumento da renda. Exemplo muito citado seria o consumo de yogurt; ii) Bem inferior, cuja demanda diminui em decorrência do aumento de renda. Exemplos muito citados são: a carne de segunda, roupas inferiores, carros usados etc.; e iii) Bem neutro ou de consumo saciado, que seria aquele em que seu consumo permanece constante com o aumento da renda. O Paradoxo de Giffen. Trata-se de um caso incomum, mas muito referenciado, que representa uma exceção à lei geral da demanda em que o efeito renda supera o efeito substituição. Em outras palavras, a baixa dos preços poderia levar a população a se sentir mais próspera, e aumentar o consumo de bens, inclusive aqueles vistos como inferiores. O nome Giffen corresponde ao economista inglês Giffen (1837-1910), que observou o fenômeno no século XVIII, em uma comunidade irlandesa muito pobre, cujo consumo básico era de batatas, mas cujo preço caiu muito. Com isso, a população teve um aumento em seu poder aquisitivo, permitindo-a consumir outros bens, inclusive batatas. Portanto, o preço da batata caiu, mas, embora inferior, aumentou a sua quantidade demandada. 2.5 ANÁLISE DA OFERTA DE MERCADO Oferta, ou supply, em inglês, e abreviado por “s”, é a quantidade de determinado bem ou serviço que os produtores desejam vender em dado período. Basicamente, os produtores estão buscando maximizar os seus ganhos, ou lucros. De uma forma geral, a quantidade ofertada de um bem pode ser expressa por uma função de muitas variáveis, que seria denominada de função geral da oferta: , onde: = quantidade ofertadado item i, no período t; = preço do bem i, no período t; = preço dos bens substitutos no período t; = preço dos bens complementares; T = tecnologia produtiva; A = fatores climáticos e/ou ambientais. De modo geral, , com os demais parâmetros constantes, sendo ⁄ , ou lei geral da oferta, em que a quantidade ofertada de um bem varia na relação direta com seu preço. A expressão da curva de oferta pode ser traçada por uma reta, mas o problema se encontra na linearidade, que, em geral, não ocorre nos processos produtivos, como discutido na Seção 2.6, com respeito à produtividade agrícola. A curva de oferta pode ser entendida de duas formas: dado o preço, qual a quantidade máxima que o produtor estará disposto a ofertar, ou, alternativamente, dada a quantidade ofertada, qual o preço mínimo que o produtor estará disposto a receber por tal quantidade. Exemplos de estímulos à produção abundam: quando o preço da cana de açúcar sobe muito, no interior do Estado de São Paulo o odor da cana invade toda a atmosfera, pois todos estão plantando cana. O mesmo processo ocorre em outros Estados, com outros produtos. O leitor pode bem entender que isso gera um desafio para o governo, pois o equilíbrio é alcançado por meio da variação de preços, mas evitando-se uma cultura única por todo o país. No caso de produtos de consumo corrente, a estrutura de comercialização no Brasil não favorece, pela ação dos chamados “atravessadores”, que exploram tanto o produtor como o consumidor. Sabe-se que os produtos de consumo corrente são produzidos por pequenos agricultores situados nas proximidades das zonas metropolitanas, enquanto que os grandes produtores dedicam-se aos produtos de exportação, que têm outros sistemas de comercialização. Nos Estados Unidos é periodicamente divulgado um estudo denominado “intenção de plantio”, que avalia as áreas estimadas pelos agricultores que serão destinadas à produção de cada item. Certamente, tal informação, processada antes do plantio, é útil para evitar crises no abastecimento e alterações substanciais de preços. Por outro lado, o produtor rural tem noção, diariamente, do preço de cada tipo de cereal que vigora na Bolsa de Chicago, levando-o a atualizar seus planos de plantio. Inversamente, se os fatores produtivos aumentarem de preço, a tendência vem a ser a redução da produção. Essa lógica vale para todo fator de produção, seja o preço da terra, seja a mão de obra, sejam as matérias-primas, sejam os demais insumos. No caso da colheita do café, em Minas Gerais, hoje o maior produtor nacional, o processo de colheita, em pequenas cidades, mobiliza toda a população, que vê, no processo, a oportunidade de fazer uma poupança para o restante do ano. Cabe notar que, em muitos países, a produção do café não é viável, pois o processo de colheita exige muita mão de obra, a um custo muito elevado, ou exigindo um contingente populacional não disponível. Isso justifica a notável evolução tecnológica que tem levado à mecanização da lavoura, que reduz a utilização da mão de obra nas grandes propriedades, mas que ainda não alcançou a colheita do café. Outras derivadas importantes na função de produção ocorrem comrespeito à tecnologia, que leva a um aumento da produção, caso notável na agricultura no Brasil, em especial pela ação da empresa estatal Embrapa, que tem levado a termo pesquisas de alta relevância. Outra derivada são os preços interdependentes. Cabe também notar que o Brasil tornou-se hoje o maior produtor de milho e soja do mundo, em parte devido aos fatores climáticos que reinaram recentemente nos Estados Unidos. Por outro lado, o Brasil tem sobretudo exportado grãos, o que agrada aos compradores, pois os Estados Unidos usam os grãos internamente, e exportam produtos elaborados. 2.6 PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA Uma lei tradicional, relacionada à produção agrícola, e muito considerada nos primórdios da Economia, mas entendida como aplicável a qualquer organização produtiva, mostra que, dado um determinado lote agrícola, um único trabalhador consegue produzir muito pouco, talvez nada. À medida em que o número de trabalhadores aumenta, a produção tende a aumentar significativamente, em razão da racionalização do trabalho, divisão de tarefas etc. Porém, se o número de trabalhadores seguir aumentando, a produção pode vir a atingir um máximo e, depois, tende a diminuir, em razão dos conflitos organizacionais e pessoais que tendem a surgir. Portanto, a não linearidade dos custos nos processos produtivos leva a diversos desafios, a serem avaliados nos Capítulos 5 e 6. No ambiente industrial, essa relação pode ser defendida com maior facilidade, como será discutido em capítulos posteriores, pois a produção física depende também do capital investido, não se conseguindo aumentar a produção simplesmente com a ampliação indiscriminada da mão de obra. Caso curioso ocorreu recentemente,durante a construção de estádios de futebol para a Copa do Mundo. Sob pressão da FIFA, o Prefeito do Rio prometeu acelerar a reconstrução do Maracanã, e ampliar a quantidade de homens para, eventualmente, milhares. O que, provavelmente, não foi colocado é se isso violaria a lógica discutida acima, pois os milhares de homens poderiam ultrapassar a quantidade ideal e levar a uma perda de produtividade. De qualquer modo, como se sabe, o estádio foi concluído a tempo, embora a custos exagerados. 2.7 O EQUILÍBRIO DE MERCADO O equilíbrio de mercado de um bem ou serviço é o pilar do mecanismo capitalista. Se a demanda tem um comportamento decrescente com o nível de preços, e se a oferta tem um comportamento crescente, essas duas curvas devem se interceptar, no que se denomina ponto de equilíbrio, ou equilíbrio de mercado. Assim, esse mercado determina a quantidade e o preço de equilíbrio. Qualquer afastamento desse equilíbrio gera forças que promovem seu retorno ao equilíbrio. Certamente, essa afirmativa, tomada como dogma por muitos, promove criticas de outros. A razão básica consiste na existência de populações marginalizadas (chamadas em alemão de lumpen Proletariat) sem recursos para imporem suas preferências, tornando-se expectadoras e vítimas do processo. Outro exemplo, que sugere muitos debates, seria o desemprego, o qual não existiria pela simples ação das chamadas forças de mercado. Ao se definir um “salário mínimo” elevado, que atenda às necessidades básicas de um cidadão, isso pode gerar um desequilíbrio estrutural promotor de desemprego. Quando o salário mínimo foi criado no Brasil, na década de 1940, talvez em bases elevadas, pois as mulheres não eram preparadas para o trabalho, muitos empregadores não desejavam pagar tanto, e havia o comportamento corrente de registrar um valor na carteira de trabalho, mas pagar menos. Muitos comparam o salário mínimo hoje em vigor com o poder aquisitivo do salário na época em que foi implantado, em prática que certamente não é tecnicamente correta. Outro exemplo vem a ser o controle de preços, que foi muito usado no Brasil em diversas épocas, mas que viola muitos dos princípios de mercado da oferta e procura, gerando, se tal preço for baixo, excesso de consumo e baixo nível produtivo, e vice-versa se o preço for elevado. Lembro-me de dois episódios: o transporte de arroz, pela FAB (Força Aérea Brasileira) do Sul para o Rio de Janeiro e o episódio conhecido como “fiscais do Sarney”, em que todos tinham o direito de fiscalizar preços, para manter vivo o chamado Plano Cruzado. Normalmente, o problema de controle de preços tem elementos políticos, pois os mais abastados preferem pagar mais e sempre conseguir o produto, enquanto os mais pobres preferem enfrentar filas e outros inconvenientes, mas terem poder aquisitivo suficiente. Aliás, os termos escassez ou excesso de produto não fazem sentido no sistema de concorrência pura, pois o preço seria sempre o elemento equilibrador. 2.8. A LEI DA OFERTA E DA PROCURA Com os elementos expostos acima, o leitor deve ter a percepção que a Lei da Oferta e Procura conduz a um equilíbrio estável, envolvendo preço e quantidade. Se a produção for excessiva, há um excesso de oferta, que gerará estoques não planejados e os vendedores deverão reduzir seus preços. No caso oposto, haverá um excesso de demanda, quando os consumidores estarão dispostos a pagar mais pelos produtos escassos. Em ambas as situações, as medidas corretivas automáticas, mediante o preço, farão com que a demanda e a oferta convirjam para um valor idêntico. Uma outra situação consiste nas mudanças no ponto de equilíbrio decorrente de deslocamentos das curvas de oferta ou de demanda. Essas alterações podem ocorrer em função de diversos fenômenos, como o aumento de renda, avanços tecnológicos, efeitos sazonais etc. Em tais circunstâncias, o equilíbrio se desloca em busca de um novo ponto, ou seja, preço e quantidade distintas do equilíbrio anterior. 3. ELASTICIDADES 3.1 Definições No Capítulo anterior foi visto que, para bens normais, o aumento do seu preço provoca a redução em sua demanda, e a elasticidade complementa o conceito, buscando a quantificação numérica desta redução. De modo análogo, a redução de preço de um bem ou serviço deve promover um aumento de sua demanda, enquanto que a elasticidade provê avaliações numéricas. Relações inversas ocorrem com a oferta de bens por parte dos produtores, que se eleva com o aumento de preços e se reduz com sua redução. A definição de elasticidade pode ser feita e aplicada a muitas formas distintas, mas as definições mais populares seguem abaixo: Elasticidade–preço da demanda – é a variação porcentual na quantidade demandada, dada a variação porcentual no preço do bem; Elasticidade–renda da demanda – é a variação porcentual na quantidade demandada, dada a variação porcentual na renda; Elasticidade–preço cruzada da demanda – é a variação porcentual na quantidade demandada de um bem, dada a variação porcentual no preço de outro bem; Elasticidade–preço da oferta – é a variação porcentual na quantidade ofertada, dada a variação porcentual no preço do bem. 3.2 ELASTICIDADE-PREÇO DA DEMANDA Como, pela lei geral da demanda, p e q variam em sentidos opostos, a elasticidade tende a ser sempre negativa. Por essa razão, no uso prático, a elasticidade é informada pelo seu módulo. Além disso, para a demanda, tem-se três tipos de elasticidade-preço: a) Demanda elástica: Por exemplo, se , ou , significa que uma variação de 10% no preço promove uma variação de 15% na quantidade demandada. Portanto, um produto que tem demanda elástica, significa que um produto cuja demanda é bastante sensível às variações de preço. b) Demanda inelástica: . Por exemplo, se , ou , significa que uma variação de 10% no preço promove uma variação de5% na quantidade demandada, ou seja, a demanda parece ser pouco influenciada pelo preço. c) Demanda de elasticidade unitária: . Por exemplo, se , ou , significa que uma variação de 10% no preço promove uma variação de 10% na quantidade demandada, ou seja, se o preço cai em 10%, a demanda aumenta em 10%, e se o preço aumenta em 10%, a demanda reduz-se em 10%. Os casos extremos da elasticidade podem ser facilmente representados em gráficos, Assim, se a demanda for “totalmente inelástica”, = 0, o preço pode variar à vontade, que a demanda permanece fixa; se a demanda for “totalmente elástica”, = ∞, a demanda pode ir de zero a infinito que o preço permanece constante. Cabe notar que expressão “a demanda de um certo bem é elástica” não estaria correta, pois, exceto em casos muito particulares, a elasticidade varia ao longo da mesma curva de demanda, podendo ser elástica para certos valores de preço e inelástica para outras faixas de preço. 3.3 A ELASTICIDADE–PREÇO DA DEMANDA São quatro os fatores que afetam de modo consistente a elasticidade–preço da demanda, a saber: i) a disponibilidade de bens substitutos; ii) a essencialidade do bem; iii) a importância relativa do bem no orçamento do consumidor; e iv) o horizonte de tempo. Em breves termos, i) a disponibilidade de bens substitutos torna o consumidor mais sensível a variações de preços e, em conseqüência, a demanda do bem em análise mais elástica, o contrário ocorrendo em casos de inexistência de bens alternativos. ii) no caso de bens essenciais, esta essencialidade torna mais inelástica a procura pelo bem e iii) no caso da importância relativa do bem no orçamento, pode-se afirmar que quanto maior o peso no orçamento, maior a elasticidade do bem, e um horizonte de tempo mais longo permite que os consumidores de determinada mercadoria descubram novas formas de substituí-la quando seu preço aumenta. Para as outras duas definições mais populares da elasticidade, quais sejam: elasticidade–renda da demanda e elasticidade–preço cruzada da demanda as definições são precisamente assemelhadas e não serão repetidas aqui, mas estão ilustradas no Exemplo 3. Basicamente, a elasticidade–renda da demanda examina quantitativamente como a mudança no nível de renda vai afetar a demanda de um certo bem; a elasticidade–preço cruzada da demanda examina a influência que a variação de preços de um bem exerce sobre um outro bem; e a elasticidade– preço da oferta busca quantificar a influência que uma certa variação de preço exerce sobre a oferta ou nível de produção de tal bem. Relação entre Receita Total e Elasticidade A Receita Total (RT), certamente, é definida como o produto do preço vezes a quantidade vendida, ou seja: RT = p.q Caso o vendedor almeje maximizar sua Receita Total, tem-se um interessante desafio, pois os valores de p e q variam em sentidos opostos, de modo que, se p for aumentado, q tende a diminuir e, se p for diminuído, o valor de q tende a aumentar. Além disso, como discutido na Seção 2.5 e nos Capítulos 5 e 6, o custo de produzir não tem o comportamento linear, o que introduz mais uma importante dificuldade. No Capítulo 7 serão abordadas as estruturas de mercado, onde encontraremos a estrutura competitiva, em que o valor de p é uma constante, e a estrutura monopolística, onde existe um produtor único, que tem a liberdade de definir o preço e, possivelmente, buscar a otimização da expressão de RT dada acima, tornando este último caso, em termos matemáticos, mais complexo. 3.4 ELASTICIDADE–PREÇO DA OFERTA O lado direito desta expressão pode ser entendida como a derivada da oferta em relação ao preço. Cabe notar que aumentos de preços criam estímulos aos produtores, aumentando as quantidades oferecidas, e vice- versa. Analogamente à elasticidade preço da demanda, a expressão acima pode ser interpretada como: Eps > 1, tem-se um bem cuja oferta é elástica; Eps < 1, tem-se um bem cuja oferta é inelástica; Eps = 1, tem-se um bem cuja oferta é unitária. Exemplo 4: Seja a curva de demanda ligando o preço p com a quantidade q: p = 10 – 0,2q. Sabe-se que ao preço p = 2 o mercado encontra-se em equilíbrio. Se o preço variar para p = 2,04, a quantidade equilibra-se em q = 39,8. Pede-se: a) qual a elasticidade preço da demanda ao preço inicial do mercado e b) verifique a elasticidade preço da oferta no mesmo ponto inicial. 4 APLICAÇÕES DA ANÁLISE MICROECONÔMICA EM POLÍTICAS PÚBLICAS 4.1. INTRODUÇÃO Neste capítulo vamos destacar alguns tópicos específicos, mas distinguindo quatro importantes aspectos da atuação do setor público em nível microeconômico, quais sejam: 1) a incidência de impostos sobre vendas; 2) a fixação de preços mínimos na agricultura; 3) a correção de externalidades; e 4)a provisão de bens públicos. O conhecimento da incidência de um imposto é importante para se determinar aspectos econômicos e sociais da tributação. Já foi notado (cf. Cap. 1) que os impostos decorrem da evolução econômica, quando a sociedade passou a entender a importância da manutenção dos bens públicos e mostra-se de acordo com a cobrança de impostos que favorecem os bens comuns, como a construção e manutenção de escolas, estradas, assistência médica, a segurança pública, as forças armadas etc. Portanto, o pagamento dos impostos passa a ser um compromisso coletivo, não sendo eticamente correto a um indivíduo sonegá-los. Muita gente se justifica, afirmando que o governo usa mal os recursos, o que justificaria a sonegação. Caso o governo use mal os recursos coletivos, cumpre exigir melhorias administrativas, e nunca a sonegação. Os impostos podem ser de dois tipos: impostos indiretos, caso do ICMS, IPI etc., que incidem sobre o preço das mercadorias, enquanto os impostos diretos, caso do Imposto de Renda, impostos sobre herança e doações, impostos sobre grandes fortunas etc., incidem diretamente sobre a renda das pessoas. Os impostos indiretos são ditos regressivos em relação à renda, pois representam uma parcela maior da renda das classes menos favorecidas, relativamente aos mais ricos. Os impostos diretos são progressivos (quem pode mais paga proporcionalmente mais). No caso brasileiro, a prioridade sempre foi dada aos impostos indiretos, e nem tanto aos impostos diretos, embora o Imposto de Renda, tornado compulsório em décadas recentes, e direcionado aos assalariados, tenha tomado uma elevada importância nos últimos anos, com sistemas de controle extremamente eficientes. Em países mais avançados, os impostos diretos são muito mais aplicados, como na Inglaterra e na França, onde o museu Picasso, por exemplo, foi resultado do pagamento de impostos sobre a herança transferida a seus herdeiros, em que estes concordaram em doar obras de arte, em lugar de fazer os pagamentos em moeda. Cabe notar que, com respeito aos impostos indiretos, há exceções, as quais variam em cada Estado, usualmente com relação aos produtos que constituem a cesta básica, os quais, às vezes estão isentos, às vezes recebem taxações muito menores que o usual. Em outro exemplo mais radical, no Canadá, por razões próprias ao ambiente local, os alimentos e as roupas estão isentos de impostos. Ainda quanto ao ICMS, termo vindo do francês e significando: imposto sobre o valor agregado, no caso de uma cadeia produtiva, cada fornecedor deve emitir uma nota fiscal com discriminação do ICMS cobrado, de modo que os subsequentes membros da cadeia paguem somente a taxa sobre o valor que foi agregado ao produto. Particularizando a análise sobre os impostos indiretos, os mais usados no Brasil,existem dois tipos de impostos sobre vendas, também conhecidos como impostos sobre o consumo. Imposto específico: representa um determinado valor por unidade vendida, independente do valor da mercadoria. Normalmente, é aplicado aos produtos de consumo corrente; Imposto ad valorem: aplica-se uma alíquota (porcentual) determinada sobre o valor de cada unidade vendida. Ou seja, a alíquota é fixa, mas o valor em $ do imposto aumenta, conforme aumenta o preço do bem. Normalmente, é aplicado a produtos de maior valor comercial, como automóveis, equipamentos etc. EFEITO DE UM IMPOSTO DE VENDAS NO EQUILÍBRIO DE MERCADO Um imposto sobre vendas representa um ônus tanto para os produtores ou vendedores, como para os consumidores. Para os produtores, o estabelecimento de um imposto sobre vendas funciona como um custo adicional, o que desloca a curva de oferta para trás, ou seja, para oferecer a mesma quantidade há que aumentar o preço. No caso dos consumidores, isso faz com que paguem mais caro para consumir uma menor quantidade, o que reduz a curva de demanda. Por desconhecimento, os vendedores entendem ser eles os penalizados, ou “perseguidos”, pois são eles os responsáveis pela arrecadação e recolhimento dos tributos, mas, como será visto logo adiante, os consumidores são também onerados, talvez em escala superior, mas dependendo da elasticidade do produto. Com o estabelecimento de um imposto, podemos definir duas curvas de oferta: uma função S = f(p)sem imposto e outra S’ = f(pr) com imposto: S = f (p) sem o imposto S' = f (pr) com o imposto Seja p o preço de mercado, pago pelo consumidor, e seja pr o preço relevante para o produtor (que é o preço de mercado menos o valor do imposto T ), isto é, pr = p –T A expressão acima informa que o preço para o produtor, pr, é o que lhe resta após receber p do mercado e recolher o imposto T aos cofres públicos. Evidentemente, o estabelecimento de um imposto sobre vendas funciona como um custo adicional para o produtor, o que desloca a curva de oferta para trás, como poderá ser ilustrado mediante uma figura (cf. a Figura 1), ou seja, para oferecer a mesma quantidade que oferecia anteriormente, o produtor tem que aumentar o preço, ou, se quiser manter o preço, deve oferecer menor quantidade, pois encareceu a mercadoria. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO Do ponto de vista da sociedade, a aplicação de um imposto sobre vendas, ou consumo, em um mercado concorrencial causa uma distorção na alocação de recursos, embora a sociedade entenda que toda operação do Governo requer a cobrança de impostos. A ilustração por meio de uma figura talvez seja mais ilustrativa, mas um novo exemplo poderá fornecer as mesmas percepções. A Seção seguinte, acompanhada da Figura 1, mostra que o ônus decorrente de maior preço e menores volumes transacionados recaem tanto sobre os consumidores como sobre os produtores, mas em proporções que dependem da elasticidades da demanda. ELASTICIDADES-PREÇO DA OFERTA E DEMANDA: INCIDÊNCIA DO IMPOSTO Figura 1 – Incidência do imposto específico, e as elasticidades-preço da oferta e da demanda. Quem realmente “paga” as proporções do imposto dependerá das elasticidades das curvas de oferta e demanda. A lógica diz que, se a demanda é inelástica, o consumidor não vai mudar hábitos e assumirá o ônus do aumento de preços e, inversamente, no caso contrário. Os retângulos pontilhados nas duas Figuras ilustram a incidência do imposto. Se a demanda for bastante elástica, dada a curva de oferta (parte a da Figura 1), a maior parcela do imposto incidirá sobre os vendedores ou produtores, pois os consumidores tendem a reduzir bastante o consumo do bem, dada uma elevação de preços provocada pelo imposto. Se a demanda for inelástica, dada a curva de oferta (parte b da Figura 1), quem deve arcar com a maior parcela do imposto é o consumidor, que, neste caso, não tem muitas possibilidades de “fugir” do aumento de preços. O PESO MORTO DO IMPOSTO Genericamente, em termos econômicos, peso morto é o custo social devido à redução da quantidade produzida, quando o preço de mercado fica acima do que seria cobrado em um mercado perfeitamente competitivo. OBS.: Esse peso morto representa uma perda de bem-estar para a sociedade, mas oferece, certamente, contrapartidas, em particular na construção e manutenção dos bens públicos Observando-se a Figura 1, pode-se dizer que o imposto representa um ônus para o consumidor e para o produtor, sendo que a parcela de cada um depende da elasticidade do item. Entretanto, esse ônus resulta também em benefícios para a sociedade, podendo-se dizer que existe uma contrapartida em tais pagamentos, em montante equivalente aos retângulos maiores. Por outro lado, existem dois triângulos menores que representam parcela do ônus, mas sem nenhuma contrapartida, e a esses caberia a denominação de peso morto do imposto. Usando os dados do Exemplo 4, os dois triângulos seriam: 1) triângulo superior: (p1 – p0)x(q0 – q1)/2 = (5,5 – 5,0) (2000 – 1800)/2 = $50 e 2) triângulo inferior: (T)x(q0 – q1)/2 = (0,9)x(2000 – 1800)/2 = $90. Portanto, $140 seria, no exemplo, o peso morto decorrente da cobrança do imposto, enquanto que a arrecadação seria de $1.620. 4.2. FIXAÇÃO DE PREÇOS MÍNIMOS PARA A AGRICULTURA A política de preços mínimos visa dar uma garantia de renda aos agricultores, prática adotada em todo mundo, cada país com suas particularidades, tanto pela importância pública da produção agrícola, a força política do conjunto dos pequenos agricultores, como diante das incertezas da natureza. No caso do Brasil, o governo anuncia, antes da época de plantio, um preço mínimo pelo qual ele garante que compra a safra após a colheita. Se o preço de mercado for maior que o preço mínimo, o agricultor vende no mercado; se o preço de mercado for menor que o preço mínimo garantido, o agricultor vende ao governo. Embora louvável, a idéia de proteger os agricultores pode ser distorcida e oferecer espaços políticos para guerras comerciais. Basta abordar o “Google”, usando o termo “subsídios agrícolas” para se ter acesso a uma imensa variedade de artigos e panfletos sobre o tema, envolvendo todos os mais importantes países do mundo. No plano estritamente conceitual, duas práticas podem ser adotadas pelo governo: uma política de compras ou uma política de subsídios, discutidas a seguir. Cabe notar que: i) na prática, o problema é mais complexo que aquele visualizado pelos gráficos conceituais, pois as curvas de demanda e de oferta não são conhecidas com a precisão suposta; ii) o preço mínimo pm tende a ser definido em termos políticos, e nem tanto em termos matemáticos; iii) independentemente de tais políticas, é recomendado que os governos mantenham estoques, que costumam chamar de estoques estratégicos, pelo menos com respeito a itens fundamentais e de maior durabilidade, como feijão, arroz, açúcar, farinhas etc., para evitar problemas decorrentes de secas, enchentes etc.; e iv) o governo americano, sabidamente, por razões militares, armazena estoques de petróleo e outros combustíveis. Para entender as políticas descritas abaixo, suponha que o ponto de equilíbrio de mercado seja (p0, q0), e o preço mínimo seja colocado acima do preço de equilíbrio, pm > p0. Desse modo, define-se: (pm, qs) = ponto indicativo da quantidade a ser ofertada diante do preço pm. (pc, qs) = ponto indicativo do preço que os consumidores estão dispostos a pagar para absorver a quantidade qs. Nessas condições, pc < pm e pm > pc > p0 e a política de compras tem o custo pm(qs – qd). Portanto, essa política é mais afetada pela variação dos volumes. Para entender a política de subsídios, suponha que os produtoresproduzam qs, diante do preço mínimo pm. Para colocar no mercado toda esta quantidade, os produtores devem reduzir o preço para pc. Assim, a política de subsídios tem o custo (pm pc)qs. Portanto, essa política é mais afetada pela variação dos preços. Claramente, a política de menor custo dependerá da elasticidade do produto. Caso o produto tenha uma demanda elástica (quantidades muito sensíveis aos preços, ou seja, grandes alterações nas quantidades derivam-se de pequenas variações de preços), a política de subsídios será mais barata para o governo, pois a variação de preços tenderá a ser relativamente menor diante da variação de volumes, enquanto que, se a demanda for inelástica, a variação de quantidades será pequena relativamente à variação de preços. Em outras palavras, se a demanda for elástica, o valor (pm pc)qs. tenderá a ser menor que o valor pm(qs – qd) Política de Compras: O governo compra o excedente (diferença entre a quantidade qs produzida e a que os consumidores desejam comprar ao preço mínimo, qd). Em outras palavras, o governo compra, ao preço mínimo, a quantidade produzida menos a quantidade adquirida pelos consumidores. O custo seria pm(qs – qd); Política de Subsídios: O governo paga ao agricultor a diferença entre o preço mínimo prometido (pm) e o que o consumidor paga no mercado (pc). Em outras palavras, o governo paga ao agricultor a diferença entre o preço mínimo e o preço que o consumidor pagou no mercado. O custo seria: (pm pc)qs. Como mencionado acima, a adoção de uma das políticas dependerá das elasticidades-preço demanda e da oferta. Será certamente oportuno para o governo escolher, dentre as duas políticas, aquela na qual gastará menos. Uma outra política, que já foi amplamente adotada, foi a política de pagar aos agricultores para não plantarem, mas mantendo as terras prontas para eventual cultivo. Como se observa nos artigos acessados pelo Google, as políticas públicas foram desvirtuadas, e servem hoje como mecanismo político e instrumento de pressão. Inclusive, existe um órgão internacional, denominado de OMC (Organização Mundial do Comércio), que serve como corte para processar os numerosos conflitos. 4.3 EXTERNALIDADES Em certas ocasiões, o consumo ou a produção de determinado bem ou serviço pode produzir efeitos colaterais, positivos ou negativos, que são chamados de externalidades ou economias externas.Basicamente, trata-se de comparar benefícios e custos privados com benefícios e custos sociais, esta segunda opção sendo a mais relevante, e os impostos ou multas, podem ser um mecanismo corretivo ou punitivo. Exemplos serão apresentados logo a seguir, e os impostos corretivos parecem ser bem aceitos pela população em geral. No Brasil, a criação de órgãos com autonomia, destinados à proteção ao meio ambiente, mostra um passo nessa direção, notando que países mais avançados têm legislações bem mais rigorosas. Lembro-me da época, nos anos 70, em que o Brasil promovia no exterior movimento para atrair empresas poluidoras, apregoando não haver aqui legislação coibindo a poluição. Não sei quantas empresas foram atraídas, mas, felizmente, essa época ficou no passado. EXTERNALIDADE NO CONSUMO Externalidade negativa no consumo: A demanda desejada pela sociedade é menor do que a demanda efetiva de mercado; Externalidade positiva no consumo:A sociedade incorre num “peso morto”, pois estaria disposta a consumir uma quantidade superior àquela que é transacionada no equilíbrio de mercado, sem intervenção do governo. Um exemplo de externalidade negativa seria a aspiração de fumaça de cigarro por um não fumante, decorrente da presença de fumantes no mesmo recinto. Na ausência de qualquer tipo de intervenção, como o sistema de preços não considera os efeitos negativos derivados do consumo desse bem, a sociedade terminaria consumindo uma quantidade superioràquela que estaria disposta a consumir, ou seja, os custos sociais associados ao consumo dessa quantidade adicional superam os benefícios sociais (benefícios sociais = benefícios privados – externalidade). Nesse caso, a sociedade sofrerá uma perda, ou “peso morto”, posto que os custos sociais associados à quantidade transacionada pelo mercado serão maiores que os benefícios sociais derivados do consumo dessa quantidade. Forma de corrigir tal caso de anomalia foi proposta pelo economista inglêsArthur Pigou (1877-1959), no sentido de cobrar impostos que forcem o sistema de preços a igualar custos e benefícios privados e sociais associados ao consumo de determinado bem. A ideia é boa no senso técnico, mas de difícil implantação no sentido prático, em razão da dificuldade de identificar as curvas de demanda, consumo e de seus efeitos exteriores. Em lugar de ajustes de preços, no Brasil têm sido adotadas normas proibitivas ao consumo de cigarros em todo ambiente fechado. Caso inverso seria o caso de uma externalidade positiva no consumo. Um exemplo seria o caso do nível de educação de uma pessoa, o que a beneficia, mas também pode beneficiaro conjunto da sociedade. Um exemplo, talvez extremo, me foi passado por um pesquisador africano. Ele afirma que existem uns 10.000 pesquisadores e profissionais senegaleses de alto nível atuando em outros países, mas que, caso se estabelecessem no Senegal, este país seria bem mais próspero. Muitos países criaram impostos sobre a chamada exportação de “cérebros”, ou seja, de pessoas de elevada qualificação, em política fortemente criticada por países interessados em receber tais imigrantes, como também pelos próprios interessados. Por outro lado, muitos países facilitam a recepção de pessoas de elevado nível de formação, enquanto dificultam a migração de outras. Em países em que a taxa de natalidade tem sido muito baixa, caso especial dos países europeus, existe o interesse contrário em atrair pessoas de baixa qualificação profissional, para desempenhar tarefas que não atraem os nativos. Conforme publicado nos jornais recentes, 50% dos matemáticos trabalhando no Vale do Silício americano são de outras nacionalidades. EXTERNALIDADE NA PRODUÇÃO A análise é similar, no caso de externalidades que ocorrem na produção. Nesse sentido, se existe uma externalidade negativa na produção, o “verdadeiro” custo social de produzir determinado bem ou serviço (custos sociais = custos de produção + externalidade), é maior que o custo privado (custo de produção). Um exemplo seria a produção de algo que prejudique o meio ambiente, como a geração de fumaça, ruído, poluição etc. Dessa forma, na ausência de intervenção do governo, como o sistema de preços, em princípio, não leva em consideração esse maior custo social provocado pela externalidade, no equilíbrio de mercado haverá uma perda social ao produzir-se uma quantidade (qp) superior à quantidade socialmente ótima (qs). Ou seja, novamente, os custos sociais de produzir a quantidade de equilíbrio do mercado superam os benefícios sociais derivados do seu consumo. A cidade de Petrópolis ofereceu no passado diversos exemplos de externalidades negativas, como os rios que, periodicamente, mudavam de cor a partir das fábricas de tecidos, ou a fábrica de fermento em Cascatinha, que teria, no dizer do seu gerente da época, esterilizado o rio de mesmo nome por muitos quilômetros, em razão de seus rejeitos periódicos extremamente ácidos.Na Alemanha, país muito consciente com respeito aos dejetos, a captação d’água em qualquer rio tem que ser feita a jusante da área em que o esgoto é lançado. No Rio de Janeiro, o uso dos emissários submarinos lançam o esgoto urbano in natura no oceano, em prática criticada por muitos. Por normas locais no Hawaí todo esgoto é tratado na Ilha, e nenhuma gota é lançadaao mar. Nos dias de hoje, os órgãos ligados ao meio ambiente e ao patrimônio histórico têm forte ingerência nesses processos, podendo exigir, previamente, medidas protetoras ou restritivas. A externalidade positiva pode ser também exemplificada na criação de abelhas próximas a uma área agrícola, a qual pode gerar benefícios para as plantações vizinhas. 4.4. BENS PÚBLICOS E RECURSOS COMUNS A existência dos chamados bens ou recursos públicos e bens comuns, cuja oferta pelo setor privado não seria viável sem a ação do Estado, é outra justificativa do governo para a intervenção econômica. Trata- se de bens tipicamente assumidos pelo governo, e seu pagamento é feito de modo compulsório pelos usuários na forma de impostos. Exemplos abundam, como a abertura e manutenção das vias de circulação, a segurança pública e o ensino, sobretudo o mais básico, embora a política de privatizações tenha redefinido o conceito e tentado justificar suas alterações, tornando a decisão sobretudo política. No caso do ensino básicoentre 70% a 100% do ensino básico ocorre em escolas públicas, ficando o sistema privado com cerca de 30% das vagas nos municípios maiores. A questão da qualidade deste ensino é uma questão aberta ao debate, como se constata, mas nada justifica que o ensino público seja de pior qualidade, como afirmam muitos. O debate público sobre a qualidade do ensino, entretanto, mostra que os debatedores mostram paixão, mas têm visão parcial do problema, pois a escola privada seleciona seus alunos, enquanto a pública não tem esse direito. A questão da saúde é outro ponto controverso, pois seus custos são brutalmente superiores aos da Educação, havendo fortes diferenças entre as políticas públicas adotadas por diferentes países. A proposta brasileira de oferecer saúde a todos, sem cobertura de seus custos é demasiadamente ambiciosa e aberta às críticas, frequentemente pontuais e inapropriados. BENS PÚBLICOS Os bens públicos são caracterizados pelo fato de seu consumo ser não excludente e não rival, isto é, o consumo de uma pessoa não reduz a disponibilidade do bem, e não impede (não exclui) o consumo de outra. A mesma quantidade do bem estará disponível independentemente de quantos os consomem. Exemplos são o acesso à justiça, à segurança pública, à iluminação etc. Boa parte dos bens públicos são do tipo não excludentes, estando aqui um dos grandes desafios ao serviço público, que oferece tais serviços. Um bem é rival ou não disputável quando o seu consumo por um agente impede o consumo por outros agentes.Todos os bens privados, como automóveis, alimentos, vestuário, serviços pessoais, são rivais e excludentes, pois todos que não tenham pago pelo uso do bem podem ser impedidos de ter acesso a eles. Os bens públicos são considerados um caso extremo de externalidade positiva, pois beneficiam toda a coletividade, independente das pessoas desejarem comprá-los. BENS OU RECURSOS COMUNS Ao contrário dos bens públicos, existem os recursos comuns, que são bens que apresentam consumo rival,mas não são excludentes. A atividade pesqueira é um exemplo. São pescados e utilizados por todos, mas o peixe não é propriedade de nenhum indivíduo. Isso pode levar a um consumo predatório do bem, o que tem levado o governo a tomar iniciativas do tipo proibir a pesca em certas épocas (a época do defeso). A atuação do Estado envolve a criação de regulamentos de uso, além de impostos ou tarifas. 5. PRODUÇÃO 5.1 INTRODUÇÃO O objetivo maior de uma firma que opera no setor privado é a maximização dos seus lucros, e o estudo de seu comportamento é denominado de Teoria da Firma. Para muitos, talvez, mediante raciocínio imediatista e intuitivo, lucro e receita seriam sinônimos, o que está conceitualmente errado. Por exemplo, na venda de um par de sapatos a receita vem a ser o seu preço, mas, para determinar o lucro, há que deduzir o custo do sapato, assim com todos os custos, devidamente rateados, que viabilizaram tal venda, como aluguel do espaço, salário dos vendedores, depreciações diversas etc. Assim, a expressão do Lucro Total (LT) é dada pela diferença entre a Receita Total (RT) e o Custo Total (CT). A expressão vem a ser: C As duas parcelas acima sugerem que a Teoria da Firma seja subdividida em duas partes: a parcela positiva, referente à receita, teria a ver com a Teoria da Produção e a negativa, referente aos custos, teria a ver com a Teoria dos Custos de Produção, a ser detalhada neste e no Capítulo 6. A primeira parte parece mais simples e é calculada pelo produto do preço e a quantidade vendida; mas a segunda envolve considerações mais amplas, como as matérias-primas, a mão de obra, os níveis salariais, o nível de emprego e desemprego, os fatores tecnológicos, as depreciações etc., além do próprio comportamento não linear dos custos. 5.2 CONCEITOS BÁSICOS A Produção é o processo pelo qual uma firma transforma os fatores de produção, em particular a mão de obra e as matérias-primas, usando a tecnologia disponível. Em termos matemáticos, a função de produção seria dada por uma expressão do tipo: q = f(N, K, M, T), onde q = a quantidade produzida N = o nível de mão de obra utilizado K = o investimento utilizado M = materiais e matérias-primas utilizadas T = a tecnologia usada O processo de produção passa pela escolha do item a ser produzido, que deve atender a critérios de eficiência e viabilidade, tanto técnica como econômica. No caso do Brasil, sujeito a fortes pressões inflacionárias e, por longos anos, pressões cambiais decorrentes do escasso acesso à moeda internacional, o dólar, o que ocorreu ao longo de muitas décadas, um preponderante critério protecionista, certamente justificável na época, em que deveria ser dada preferência a produtos nacionais, cuja indústria ainda era nascente. Caso alguma empresa desejasse importar algum produto ou equipamento deveria solicitar licença de importação à CACEX (Caixa de Comércio Exterior do Banco do Brasil S.A., criada em 1953 pelo Governo Getúlio Vargas e desativada em 1990 no Governo Collor), órgão que faria, antes, um levantamento no país sobre a existência de alguma empresa capacitada a atender àquele pedido. Caso encontrada uma empresa, a licença seria negada e o importador deveria optar pelo produto nacional. Questões igualmente relevantes, como preço, a qualidade, serviços pós-venda etc. tendiam a ser ignoradas. A facilitação das importações, ocorrida a partir de 1990, trouxe diversas vantagens econômicas ao consumidor, mas alguns setores ficaram tecnologicamente prejudicados, especialmente o setor têxtil e o de sapatos, que trabalhavam com baixo nível de mecanização e eram importantes empregadores de mão de obra. Esses setores viram-se obrigados a enfrentar a concorrência internacional e os produtos importados. Na outrora cidade industrial de Petrópolis, por exemplo, muitas fábricas de tecidos foram simplesmente fechadas, o que é constatado por todos os moradores. Entretanto, por ser um país relativamente próspero, muitas linhas de financiamento foram instituídas e os setores mencionados vieram a sobreviver e a se atualizar, e os consumidores se encontram, hoje, possivelmente em situação superior à que tinham no passado, comprando produtos mais baratos e de melhor qualidade, embora o nível de emprego tenha se reduzido. Sob novos nomes, e em certas circunstâncias, aqueles princípios protecionistas tradicionais seguem funcionando. Um desses novos nomes é denominado de: “conteúdo nacional”. Nos dias de hoje, a principal empresa brasileira, a Petrobrás S.A., deve comprar os navios e equipamentos de fornecedores nacionais, em políticas que aumentam os seus custos operacionais. No caso do campo de petróleo marítimo
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