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Prefácio Gramática Rocha Lima

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xvi 
PREFÁCIO 
SERAFIM DA SILVA NETO 
POUCAS PROFISSÕES terão merecido, no curso dos tempos, tantos remoques como 
a dos gramáticos. Sobre esses abnegados defensores da pureza do idioma 
desabaram, sempre, as irreverências e os sarcasmos. E que a vaidade humana, 
tão inclinada a criticar os outros, não admite, contudo, a menor restrição: 
daí a revolta contra os gramáticos. 
O grande escritor seiscentista, dom Francisco Manuel de Meio, chegava a ponto 
de dizer que as gramáticas eram “tão impertinentes guisados que na maior fome 
do mundo as não comera o demo”. 
A que se deve tão feroz campanha? A razão encontra-se, evidentemente, na falta 
de um critério seguro, um método científico que servisse de fio condutor dos 
fatos da língua. Até os princípios do século XIX os estudos linguísticos se 
debatiam no mais desordenado empirismo: hasta lembrar que as gramáticas 
latinas serviam ainda de modelo para as gramáticas românicas! 
Só no primeiro quartel daquele século, com Bopp, Grimm, Rask e outros, surgiu 
o método científico aplicado às línguas, mas a gramática normativa, em geral, 
continuou entregue aos amadores e vernaculistas. Assim, enquanto a filologia 
cada vez mais se aperfeiçoava e alargava o campo de estudos, a gramática 
continuava a marcar passo, por causa das solas de chumbo dos ‘gramáticos’. 
Por isso, como há pouco salientava Jespersen em recente Congresso 
internacional, os especialistas não devem desinteressar-se dos problemas 
práticos da língua, pois, se o fizerem, a gramática ficará à mercê dos amadores. 
Realmente, como escreve o notabilíssimo lingüista dinamarquês: 
Aqueles que estão seriamente ocupados com as línguas e com o seu 
desenvolvimento não devem mostrar-se alheios a tais discussões, mas devem 
contribuir, com sua experiência e saber, para o bem da própria língua, pois 
do contrário o seu coniiecimento prático ficará entregue a amadores sem o 
preparo indispensável a quem se torna guia neste campo do saber. 
xvii 
É precisamente o amadorismo, a falta de visão de conjunto, que 
...losalumnosdeiosliceostiene faz os gramáticos perderem-se numa infinidade 
de questiúnculas, num Lo atribuye a que la reacción con labirinto de 
classificações e numa nomenclatura tão rebarbativa quanto ha ilevado ai exceso 
contrano, de 
- .. . . . - . a conciencia la estructura de la lei inutil. A gramática deve 
ser simplificada e nao complicada: deve registrar 
o mínimo de noções, não arbitrariamente deduzidas na cabeça E concluía Leite 
de Vasco dos gramáticos e pretensos gramáticos, mas, ao contrário, rigorosa- 
un estudio más detenido de mente justificados pelos fatos da língua. Pois, 
acrescentamos nós: 
Obedece a estes critérios e corresponde a este espírito a gramática 
que ora nos oferece Carlos Henrique da Rocha Lima. 
Grande e extraordinário professor, magistral comentador de Rui Barbosa, 
profundo exegeta da linguagem clássica, espírito ordenado e disciplinado, 
estava em condições privilegiadas para dotar a língua 
portuguesa com uma gramática que, sem erro ou fastio, lhe desse as 
normas cultas do bem escrever e do bem falar. 
Pelas substanciosas páginas de Rocha Lima perpassam (ainda que 
discretamente dosadas) as idéias da lingüística moderna, idéias fecundas 
que renovaram muitas das teorias gramaticais. Ainda que relativamente 
jovem (na força dos quarenta anos), a Rocha Lima não lhe 
falta aturada experiência. Só se abalançou a dar-nos a gramática de 
que há tanto precisávamos, depois de longa meditação e depois de atingir 
(em brilhante concurso de provas e de títulos) as culminâncias da 
cátedra do Colégio Pedro II. Pôde, assim, dar-nos uma gramática longamente 
amadurecida no espírito e revitalizada com as doutrinas modernas. 
Veja-se, por exemplo, como, ao estudar a teoria da frase, não 
nos oferece uma sintaxe hirta e gelada, mas, bem ao contrário, procura 
interpretar estilisticamente os trechos de bons escritores da língua 
portuguesa. 
A gramática normativa do professor Rocha Lima vai desempenhar 
papel relevantíssimo no estudo da língua portuguesa. E que a pertinaz 
campanha contra o ensino pela gramática está a prejudicar o estudo 
da língua. 
É verdade que a língua se aprende sobretudo na minuciosa e atenta 
leitura dos textos clássicos de todas as épocas. Mas não somente neles, 
pois as línguas, com serem expressões de arte, possuem um arcabouço 
gramatical que precisa ser conhecido. 
É indispensável que os alunos manuseiem a gramática. Essa opinião, 
por nós acalentada há vários anos, vem a coincidir com a do grande 
mestre Leite de Vasconcelos. Assim respondia ele a um inquérito levado 
a efeito pelo pedagogo espanhol Rubén Landa: 
xviii 
los alumnos de los liceos tienen un conocimiento muy deficiente de la 
gramática. Lo atribuye a que ia reacción contra ei antiguo aprendizage 
abstracto y memorista ha lievado ai exceso contrario, de tal modo que ahora 
se saie dei liceo sin conocer a conciencia ia estructura de ia iengua. 
E concluía Leite de Vasconcelos: “... para evitarlo debería hacerse 
un estudio más detenido de la gramática”. 
Pois, acrescentamos nós: aqui está a Gramática! 
Rio de Janeiro, em 18 de maio de 1957. 
xix 
A PARTIR de certa altura de sua jornada, teve este livro o texto estereotipado, 
e, pois, irrefundível. 
Em razão disso, não pôde o Autor, muito a seu malgrado, carrear para a obra 
novas idéias, novas doutrinas, novos métodos - enfim, a visão nova que passou 
a ter, no curso dos últimos anos, dos problemas de teoria gramatical e seu 
ensino. 4 
Tempo era, portanto, de quebrar pedras e refazer o trabalho - o 
que se realiza agora, quando, editada pela José Olympio Editora, passa 
a Gramática normativa a viver a segunda fase de sua carreira. 
Mantivemos-lhe, decerto, a fisionomia original com que fora planejada e 
redigida, a fim de que se lhe não deformasse a inteiriça estrutura intelectual 
e didática; mas, além da correção de um deslize aqui, da atualização de um 
conceito ali, e, até, da substituição integral de alguns capítulos e 
acrescimento de outros, enriquecemos copiosamente a exemplificação dos 
‘fatos’ da língua, a qual estendemos aos escritores de nossos dias. 
E cabe, a propósito, uma observação importantíssima, que vem assim à guisa 
de pôr os pontos nos is: a de que, em matéria de bom uso da língua literária, 
os ensinamentos até aqui esposados pela Gram&ica normativa são confirmados, 
em sua quase totalidade, pela lição dos prosadores e poetas de hoje - o que 
patenteia, de maneira solar, a continuidade histórica das formas 
verdadeiramente afinadas com o sentimento idiomático. 
Assim que, sem embargo de sua tonitruante intenção demolidora e a despeito 
de certos exageros postiços que lhe marcaram a fase inicial, inevitavelmente 
revolucionária -, a decantada rebeldia dos modernistas de 1922 à tradição 
gramatical do idioma não passou de “boato falso”, como viria a confessar, mais 
tarde, o próprio Mário de An xxi 
drade.* Pois já agora, à distância de cinqüenta anos da Semana de Arte Moderna, 
se pode ter por certo que, havendo realizado profunda renovação no estilo 
literário brasileiro, os continuadores do Modernismo não lograram, todavia, 
no terreno da língua, romper os compromissos com o passado: sua contribuição, 
neste particular, foi, de fato, muito mofina - e meramente episódica. 
Daí o verem-se - na presente edição -, a fundamentarem os mesmos fatos 
lingüísticos, citações de Vieira, Bernardes, Herculano, Camilo, Eça, 
Gonçalves Dias, Castro Alves, Rui, Bilac, Machado de Assis..., de par com 
exemplos de Manuel Bandeira, Menotti dei Picchia, Graciliano Ramos, Erico 
Veríssimo, Cyro dos Anjos, Rachei de Queiroz, Anfbal M. Machado, Cecflia 
Meireles, Carlos Drummond de Andrade..., todos a estilizar numa só e excelente 
língua portuguesa. 
Ao terminar esta breve explicação, queremos deixar consignado nossoagradecimento aos amigos e colegas que, de uma forma ou de outra, colaboraram 
conosco no melhoramento da obra: a Olavo A. Nascentes, pelas inteligentes 
anotações com que, em carta particular, nos ofereceu um mundo de sugestões 
e achegas; a Othon M. Garcia, pelos retoques, sem conta, que o seu reconhecido 
bom gosto literário nos levou a introduzir no livro; a Raimundo Barbadinho 
Neto, pela prestimosidade com que amealhou - e pôs à nossa disposição - material 
para documentar a linguagem dos modernistas. 
E uma palavra final para os companheiros de professorado que, generosamente, 
têm levado a Gramática normativa aos mais longínquos 
rincões do país. 
Rio de Janeiro, maio, 1972. 
* Mário de Andrade. “O movimento modernista”, em Aspectos da literatura 
brasileira (4a ed.). São Paulo, Martins, 1972, p. 244. 
xxii 
PROFISSÃO DE FÉ 
[À GUISA DE PREFÁCIO DA 3l EDIÇÃO] 
ROCHA LIMA 
ASSIM SE isurvm, como se lê na folha de rosto, o espírito desta 31 
edição: “retocada e enriquecida”. 
Nada mais que isto - muito apesar de retocada em não poucos pontos, e 
copiosamente enriquecida, sobretudo na exemplificação dos fatos da língua. 
Nada mais que isto, para que a GN continue a ser, fundamentalmente, o que sempre 
aspirou a ser: um livro redigido com simplicidade e clareza, e norteado por 
obsessiva busca de exatidão no sistematizar as normas da modalidade culta do 
idioma nacional -‘ dever primeiro do ofício de professor de português. 
Em matéria doutrinária, procurou o Autor equilibrar, com avaro e prudente 
critério de seleção, as variadas e muita vez conflitantes correntes da 
lingüística moderna, naquilo que lhe pareceu pertinente à finalidade dos 
estudos de teoria gramatical. Com tal proceder, preservou-se da precipitação 
de aderir cegamente à ditadura das últimas e passageiras ‘novidades’ 
importadas, assim como aos ouropéis de uma terminologia quase sempre também 
superfluamente inovadora. 
Nesta cautelosa orientação, talvez repouse o gasalhoso acolhimento 
com que, ao longo de tantos anos, tem o favor público premiado o meu 
esforço de bem servir o ensino da língua portuguesa em nosso meio. 
Rio de Janeiro, maio, 1991. 
VALENTINA DA ROCHA LIMA 
As PALAVRAS que se seguem, eu as disse no dia 28 de junho de 1991. Era a Missa 
de 7º dia de meu pai. Em um mesmo 28 de junho, passados já seis anos, partira 
minha mãe. Completava-se naquele momento o ciclo perfeito de uma história de 
amor. 
Na cerimônia, chorando todos, celebrávamos em comunhão a existência de um homem 
professor Rocha Lima -, e o percurso generoso que fizera. O Colégio Pedro II, 
paixão e casa de papai por tantos anos, mais uma vez abrira suas portas para 
ele. Foi uma Missa campal, no velho Internato em São Cristóvão. Cantava o coro 
do Colégio 
- tudo se passava como um hino de louvor entre lágrimas. 
Meu sentimento não era o de estar dizendo algo iii memoriam, mas sim o de estar 
falando com papai, ali, naquela hora, naquele local, diante daquelas pessoas. 
A céu aberto, era a Ele, meu pai, que eu me dirigia. E tive a pretensão de 
expressar um ‘nós’ maior do que cada um de nós. 
Trêmula de emoção, assim falei: 
PROFESSOR Rocai LIMA, 
Nós, seus alunos, estamos aqui para agradecer o privilégio de termos ouvido 
a sua palavra - “No princípio era o Verbo e o Verbo 
estava junto a Deus, e o Verbo era Deus.” 
A terra por Você arada frutificou; hoje estamos espalhados por todo o Brasil, 
trabalhamos nas mais diferentes profissões. E carregamos conosco sua presença. 
Você, portas dentro de sala de aula, trouxe ao ensino uma qualidade mógica, 
encantada, imorredoura. Ela emanova de sua pessoa e retirava seiva do amor 
que Você nutria por seus alunos e da paixão com que Você exercia o Magistério. 
Magistério com miiúsculas, que Você honrou, dignificou e embelezou. 
xxv 
 
E o Verbo só é Verdade se expresso com alma; e sua alma, papai, Você foi 
entregando-a, entregando-a, até que a doou por inteiro no 
momento em que proferia suas últimas palavras. 
PROFESSOR ROCH4 LIMA, 
Nós, brasileiros, homenageamos e reverenciamos sua memória. Nesses nossos 
‘tristes trópicos’, é a Língua Materna o maior elo unifica- dor de cento e 
cinqüenta milhÕes de pessoas. É na Língua Materna que se forjou nosso 
inconsciente coletivo. Somos um povo, uma cultura, uma nação -, na Língua 
Materna. E nela que deita origens nossa identidade de brasileiros. 
Cultuando-a, desvendando seus mistérios, sua pujança, Você nos presenteou com 
um bem precioso - Você nos fez ver, na grandeza que ela encerra, o horizonte 
dos possíveis. 
Não morrerá sem poetas nem soldados 
A língua em que cantaste rudemente 
As armas e os barões assinalados. 
assim Manuel Bandeira dirigiu-se a camões. E foi essa a epígrafe que Você 
escolheu para a sua Gramática normativa. E agora, diante de todos, eu repito: 
Não! Não morrerá sem poetas nem soldados... Rocha Lima, lírico! Rocha Lima, 
mais que soldado, incansável guerreiro! 
PAPAI, 
Nós, suas filhas; nós, fruto da família que Você constituiu com mamfie 
- Mariota, digam por favor! -, nós, que crescemos alimentadas do amor de Vocês 
dois; nós, o que podemos dizer agora? Ainda não descobrimos todos os recursos 
do Verbo para expressar o que sentimos neste momento. Mas um dia haveremos 
de fazê-lo.