Buscar

179424100217 DIR PROC CIVIL AULA 02

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 49 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 49 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 49 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Continue navegando


Prévia do material em texto

JURISDIÇÃO 
 
Como ensina Ovídio Baptista, a ideia de direito, no Estado Moderno, suscita, desde logo, a ideia de jurisdição. O jurista contemporâneo tende a equiparar o direito à norma jurídica editada pelo Estado, cuja inobservância dá lugar a uma sanção. 
 
CONCEITO: 
 
Jurisdição é: 
 
função atribuída a terceiro imparcial (substitutividade) 
de realizar o Direito de modo imperativo (imperatividade) 
reconhecendo/efetivando/protegendo situações jurídicas 
concretamente deduzidas 
em decisão insuscetível de controle externo 
e com aptidão para tornar-se indiscutível (definitividade). 
 
Esse conceito está em consonância com as diversas transformações pelas quais passou o Estado nos últimos tempos, tais como: 
 
a redistribuição das funções do Estado, com a criação de agências reguladoras (entes administrativos, com funções executiva, legislativa e judicante) e executivas; 
a valorização e o reconhecimento da força normativa da Constituição, principalmente das normas-princípio, que exigem do órgão jurisdicional uma postura mais ativa e criativa para a solução dos problemas; iii) o desenvolvimento da teoria jurídica dos direitos fundamentais, que impõe a aplicação direta das normas que os consagram, independentemente de intermediação legislativa; 
a criação de instrumentos processuais como o mandado de injunção, que atribui ao Poder Judiciário a função de suprir, para o caso concreto, a omissão legislativa; 
a alteração da técnica legislativa com a utilização da técnica das cláusulas gerais, deixando o sistema normativo mais aberto e transferindo expressamente ao órgão jurisdicional a tarefa de completar a criação da norma jurídica do caso concreto; vi) a evolução do controle de constitucionalidade difuso, que, dentre outras consequências, produziu a possibilidade de enunciado vinculante da súmula do STF em matéria constitucional. 
 
a) Técnica de solução de conflitos por heterocomposição, na qual um terceiro imparcial e desinteressado substitui (ideia de substitutividade apresentada por Chiovenda) a vontade das partes pela vontade da lei e determina a solução do problema apresentado – exceção na jurisdição voluntária, pois não há substituição da vontade das partes. 
 
Fredie Didier Jr. não adota a ideia de Chiovenda de que a jurisdição é a aplicação concreta da vontade da lei, em atividade meramente declaratória. Entende que a jurisdição é, essencialmente, criativa. 
 
Para Carnelutti, porém, jurisdição consiste na justa composição da lide (conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida), mediante sentença de natureza declarativa, por meio da qual o juiz dicitius, daí porque, para ele, não haveria jurisdição no processo executivo. 
 
O juiz não deve ter interesse no litígio sob sua apreciação, tratando as partes com igualdade (“equidistante”, na posição de Ada Pellegrini Grinover) e garantindo o contraditório em paridade de armas (isso é imparcialidade – aspecto subjetivo), em observância ao art. 7º, CPC. 
 
Ressalte-se aqui a importância de estudar as garantias e vedações constitucionais dos magistrados previstas no art. 95, parágrafo único, CF. 
 
Manifestação de um poder que se impõe de forma imperativa (imperatividade), aplicando o Direito a situações concretas que são submetidas ao órgão jurisdicional. 
 
Atenção! Embora monopólio do Estado, este pode autorizar o exercício da função jurisdicional por agentes privados (como no caso da arbitragem, que será objeto de estudo específico nos tópicos seguintes). 
 
A tutela dos direitos dá-se ou pelo seu reconhecimento judicial (conhecimento), ou pela sua efetivação (execução) ou pela sua proteção (tutela de segurança, cautelar ou inibitória). 
 
A jurisdição sempre atua sobre uma situação concreta que é levada à apreciação do órgão jurisdicional competente, sendo a atuação jurisdicional sempre tópica. 
Atenção! Não se pode restringir a jurisdição a um tipo de situação concreta (por exemplo, a lide), posto que não se excluirá da apreciação jurisdicional a ameaça de lesão a direitos (art. 3º, CPC). 
 
Aplica-se o direito a uma situação concreta deduzida em juízo, sem que se possa submete-la ao controle de nenhum outro poder. A jurisdição somente é controlada pela própria jurisdição, cabendo a ela, exclusivamente, a solução final ao problema apresentado. 
 
Uma decisão judicial somente pode tornar-se indiscutível e imutável pela coisa julgada material (consequência de um princípio maior, que é o da segurança jurídica, evitando-se a eternização dos litígios). 
Apenas os atos jurisdicionais podem adquirir essa especial estabilidade (definitividade), que recebe o nome de coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF). 
 
Em suma, jurisdição é função estatal para prevenir e compor conflitos, aplicando o direito ao caso concreto, em última instância, resguardando a ordem jurídica e a paz social, sendo exercida em todo o território nacional. 
 
Ainda nas palavras de Chiovenda, pode se definir jurisdição como “função do Estado que tem como escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos”. Em outras palavras, limita-se o Estado, ao exercer a função jurisdicional, a declarar direitos preexistentes e atuar na prática os comandos da lei. Tal atividade caracterizar-se-ia, essencialmente, pelo seu caráter substitutivo, já enunciado. 
 
Para o exercício da função jurisdicional é que o Estado Democrático de Direito se utiliza do processo, verdadeiro método que deve garantir o atingimento de seus devidos fins pelos devidos meios. O exercício da jurisdição, portanto, pressupõe o processo prévio (instrumento de manifestação), em que se garantam o devido processo legal e seus corolários. 
 
AÇÃO > JURISDIÇÃO > PROCESSO (alguns autores ainda inserem a RESPOSTA como um quarto elemento). 
 
Há doutrina (Dinamarco) que prefira analisar a jurisdição sob três aspectos distintos: poder, função e atividade.  O poder jurisdicional é o que permite o exercício da função jurisdicional que se materializa no caso concreto por meio da atividade jurisdicional. 
 
Como poder, a jurisdição representa o poder estatal de interferir na esfera jurídica dos jurisdicionados, aplicando o direito objetivo ao caso concreto. Não mais se compreende que o poder jurisdicional se limita a “dizer” o direito, mas também de “impor” o direito (imperatividade). 
Como função, a jurisdição é o encargo atribuído pela Constituição Federal, em regra, ao Poder Judiciário (função típica) e, excepcionalmente, a outros Poderes (função atípica) de exercer concretamente o poder jurisdicional. 
 
 A função jurisdicional não é privativa do Poder Judiciário, como se constata nos processos de impeachment do Presidente da República, realizados pelo Poder Legislativo (art. 49, IX e art. 52, I, ambos da CF), ou nas sindicâncias e processos administrativos conduzidos pelo Poder Executivo (art. 41, § 1º, II, CF), ainda que nestes casos não haja definitividade. Além disso, o Poder Judiciário exerce de forma atípica função administrativa (por exemplo, organização de concursos públicos) e legislativa (elaboração de regimentos internos dos Tribunais). 
 
 Como atividade, a jurisdição é o complexo de atos praticados no processo pelo agente estatal investido de jurisdição. 
 
 
 
EQUIVALENTES JURISDICIONAIS: 
 
São formas não-jurisdicionais de solução de conflitos, daí porque chamadas de “equivalentes” (soluções alternativas – funcionam como técnica de tutela dos direitos, resolvendo conflitos ou certificando situações jurídicas). Não são definitivas, pois podem ser submetidas ao controle jurisdicional. São as seguintes: 
 
Autotutela – forma mais antiga de solução dos conflitos, constituindo-se, fundamentalmente, pelo sacrifício integral do interesse de uma das partes envolvida no conflito em razão do exercício da força (imposição da vontade) pela parte vencedora. Trata-se de solução vedada, como regra, nos ordenamentos jurídicoscivilizados, podendo ser amplamente revista pelo Poder Judiciário. Em outras palavras, é passível de controle posterior pela solução jurisdicional, que legitimará ou não a defesa privada. 
 
São exemplos de autotutela permitida: legítima defesa (art. 188, I, CC), desforço imediato (art. 1.210, § 1º, CC), direito de greve, direito de retenção, estado de necessidade, guerra etc. 
 
Autocomposição – consentimento espontâneo de um dos contendores em sacrificar o interesse próprio, no todo ou em parte, em favor do interesse alheio. É gênero do qual são espécies: 
 
a transação (concessões mútuas): é a mais tradicional, na qual a solução é dada pelas partes, sendo que cada uma delas faz concessões recíprocas (art. 487, III, "b", CPC); 
a renúncia: não há concessões recíprocas, mas apenas unilateral, por parte do autor, que abdica de sua pretensão voluntariamente (art. 487, III, "c", CPC); e, por fim, 
a submissão (reconhecimento da procedência do pedido) onde não se vislumbram concessões recíprocas, mas apenas unilateral, por parte do réu, que reconhece a razão do autor (art. 487, III, "a", CPC). 
 
Atenção! Aqui há uma certa hibridez: substancialmente, o conflito foi resolvido por autocomposição, mas, formalmente, em razão da sentença judicial homologatória, há o exercício de jurisdição. 
 
Julgamento de conflitos por tribunais administrativos – solução estatal não-jurisdicional de conflitos. São exemplos: Tribunal Marítimo, Tribunal de Contas, Agências Reguladoras, CADE. 
 
Atenção! A decisão de conflito por tribunal administrativo é exemplo de equivalente jurisdicional, pois, embora se trate de solução por heterocomposição dada por um sujeito imparcial diante de uma situação concreta, faltam-lhe os atributos da aptidão para a coisa julgada material e da insuscetibilidade de controle externo, indefectíveis da atividade jurisdicional. 
 
Arbitragem – é o equivalente jurisdicional mais polêmico no que tange à sua natureza. Alguns doutrinadores entendem que a arbitragem é jurisdição privada e não equivalente jurisdicional, enquanto outros afirmam não ser nem mesmo uma jurisdição, porque não é estatal. 
 
ARBITRAGEM: 
 
Técnica de solução de conflitos mediante a qual os conflitantes buscam em uma terceira pessoa, de sua confiança, a solução amigável e imparcial do litígio. É, portanto, heterocomposição, não compulsória, constituindo-se em opção conferida a pessoas capazes para solucionar problemas relacionados a direitos disponíveis. 
 
Para a maioria doutrinária, a arbitragem é equivalente jurisdicional (Humberto Theodoro Jr., Vicente Greco Filho, Luiz Guilherme Marinoni e Cassio Scarpinella Bueno). Há, porém, quem entenda que não se trata de equivalente jurisdicional, sendo jurisdição propriamente dita, exercida por particulares, com autorização do Estado (Fredie Didier Jr., Carlos Alberto Carmona e Joel Dias Figueira Jr.). 
 
 Há confusão nesse tocante, mas com pouca importância prática, já tendo, o STJ, tratado a arbitragem ora como equivalente jurisdicional e ora como espécie de jurisdição privada (CC 111.230/DF, Segunda Seção, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 8.5.2013). 
 
A arbitragem é regulamentada pela Lei nº 9.307/96 (com alterações pela Lei nº 13.129/2015) não afrontando o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF). 
 
Com relação à abrangência da Lei de Arbitragem, o STJ editou a Súmula 485: “a lei de arbitragem aplica-se aos contratos que contenham cláusulas, ainda que celebradas antes da sua edição”. Pacificou dessa forma a discussão gerada em torno de sua efetividade frente aos contratos que possuíam cláusulas de previsão de arbitragem, porém, celebrados antes de sua vigência. 
 
A convenção de arbitragem (art. 3º da Lei nº 9.307/1996) compreende tanto a cláusula compromissória como o compromisso arbitral: 
 
A cláusula compromissória (art. 4º) é aquela que designa a intenção das partes de resolver disputas futuras por meio da arbitragem, celebrada, assim, previamente. É também chamada de cláusula compromissória “cheia”. 
O compromisso arbitral (art. 9º) é o ato, formal e escrito, que efetivamente dá início ao processo de arbitragem (regras deverão constar expressamente neste sentido). Trata-se, pois, de um contrato, por meio do qual se renuncia à atividade jurisdicional estatal, relativamente a uma controvérsia específica e não simplesmente especificável. Pode ser estabelecido independentemente da existência de cláusula compromissória, até mesmo no curso do procedimento arbitral, mas sempre antes da audiência de tentativa de conciliação. 
 
A convenção de arbitragem não é pressuposto processual por ser matéria de direito dispositivo que, para ser examinada, não dispensa a iniciativa do réu. Caso o réu não a alegue, o processo prossegue e é julgado perante a jurisdição estatal. A ausência de alegação do réu torna a justiça estatal competente para julgar a lide e, por inexistir qualquer invalidade, o processo não será extinto. 
 
CARACTERÍSTICAS DA ARBITRAGEM: 
 
Possibilidade de escolha da norma de direito material a ser aplicada (art. 2°, §§ 1º e 2º, Lei nº 9.307/1996); 
Árbitro (art. 13, Lei nº 9.307/1996): exige-se que para o exercício das funções de árbitro seja pessoa física e capaz; 
Desnecessidade de homologação judicial da sentença arbitral (art. 31, Lei nº 9.307/1996), que produz efeitos imediatamente; 
A sentença arbitral é título executivo judicial (art. 31, Lei nº 9.307/1996 c/c art. 515, VII, CPC): o árbitro pode decidir, mas não tem poder para tomar nenhuma providência executiva; 
Possibilidade de reconhecimento e execução de sentenças arbitrais produzidas no exterior (art. 34 e seguintes, Lei nº 9.307/1996). 
 
Atenção! A decisão arbitral faz coisa julgada material, podendo ser invalidada (vícios formais) pela via judicial no prazo de 90 (noventa) dias após o recebimento da intimação da sentença arbitral (art. 33, § 1º, da Lei de Arbitragem). 
 
Existência de conflito de competência entre um órgão jurisdicional do Estado e uma Câmara Arbitral: o STJ entendeu ser competente para a apreciação, porque a arbitragem teria natureza jurisdicional, como anteriormente mencionado (CC 111.230/DF, 2ª Seção, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 8.5.2013). Entendeu-se, ainda, que é de competência do tribunal de arbitragem, e não do Judiciário, analisar pedidos de indicação de bens para garantir execuções de dívidas, antes mesmo da instauração de procedimento arbitral. Foi a primeira vez que a Corte analisou a questão, mas o placar apertado do julgamento - cinco votos a quatro - indica, segundo advogados, que a discussão ainda está longe de terminar. 
 
A 3ª Turma do STJ, REsp 1.277.725/AM, 3ª Turma, j. 12.3.2013, estabeleceu que, ainda que conste de contrato inadimplido a previsão de resolução de conflitos por meio da arbitragem, é possível ao credor ajuizar pedido de falência do devedor ou mesmo execução sem a prévia realização de juízo arbitral. Asseverou o referido acórdão que a celebração da convenção de arbitragem não é causa impeditiva da deflagração do processo de falência perante o Judiciário, eis que “a executividade de um título de crédito não é afetada pela convenção de arbitragem”. 
 
ARBITRAGEM E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: 
 
O tema ainda é polêmico, doutrinariamente falando, pois, tradicionalmente, sempre houve resistência para a arbitragem com o Poder Público. Ao longo dos tempos, formaram-se 3 (três) correntes: 
 
a que não admite arbitragem que envolva o Poder Público; 
a que admite sempre, mesmo sem lei específica; 
a que admite, desde que haja lei específica. As posições mais atuais se situam entre a segunda e a terceira correntes, havendo uma tendência de prevalecer a letra “b”. 
 
De todo modo, com a alteração da Lei nº 9.307/96 pela Lei nº 13.129/15, como afirmado em aula, o § 1º, do art. 1º, passou a contar com a seguinte redação: “A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. 
 
O § 2º,do mesmo art. 1º, passou a ter a seguinte redação: “A autoridade ou o órgão competente da administração pública direta para a celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações”. 
 
Assim, em tese, nada impediria a instauração do procedimento arbitral envolvendo o Poder Público, desde que, vale repisar, estejamos diante de situação que envolva a disponibilidade de um direito patrimonial. 
 
PRINCÍPIOS INERENTES À JURISDIÇÃO: 
 
INVESTIDURA: exercício da jurisdição somente por aqueles que tenham sido regularmente investidos na condição de juiz mediante concurso público (art. 93, I, CF) e indicação pelo Poder Executivo, por meio do quinto constitucional (art. 94, CF). É considerado pressuposto processual de existência. 
 
TERRITORIALIDADE: todo juiz terá jurisdição em todo o território nacional (limite espacial sujeito à soberania do Estado). Entretanto, por uma questão de funcionalidade, considerando o elevado número de juízes e a extensão do território nacional, o exercício da jurisdição que lhes compete é delimitado à parcela do território, conforme a organização judiciária da Justiça em que atuam, sendo as áreas de exercício de sua autoridade divididas na Justiça Federal em seções judiciárias e na Justiça Estadual em comarcas. Assim sendo, as regras de competência territorial definirão um determinado território, e pelo princípio da aderência ao território, a atuação jurisdicional somente será legítima dentro desses limites territoriais. 
 
É com base neste princípio que surge a necessidade de as autoridades judiciárias cooperarem entre si no exercício da atividade jurisdicional, cada uma ajudando a outra no exercício da atividade jurisdicional em seu território (surgem as cartas precatória (juízes de mesma hierarquia no mesmo país) e rogatória (juízes de países diversos) como atos de comunicação entre órgãos jurisdicionais: a maior parte dos atos de interesse ao processo, que devam ser praticados fora dos limites territoriais em que o juiz exerce a jurisdição, dependerá da cooperação do juiz do lugar). 
 
Há mitigação do princípio da territorialidade da jurisdição em duas hipóteses previstas no CPC: art. 60 (imóvel localizado em mais de uma comarca, Estado, seção ou subseção judiciária) e art. 255 (citação, intimação, notificação, penhora e quaisquer outros atos executivos – em comarcas contíguas ou da mesma região metropolitana, independentemente de carta precatória). 
 
Atenção! O lugar onde a decisão deve ser proferida não se confunde com o lugar em que ela deve produzir efeitos. 
 
INDELEGABILIDADE: o exercício da função jurisdicional não pode ser delegado, cabendo exclusivamente à CF estabelecer as funções e direcioná-las aos órgãos que entende competentes. 
 
 Atenção! Essa vedação se aplica integralmente no caso de poder decisório, sob pena de violação à garantia do juiz natural. Há, porém, hipóteses em que se autoriza a delegação de outros poderes judiciais, como o poder instrutório, o poder diretivo do processo e o poder de execução das decisões. 
 
A carta de ordem, expedida pelos tribunais no sentido de delegar, ao juízo de primeiro grau, a produção de provas orais e periciais, é um exemplo, justificando-se por faltar estrutura aos tribunais para a prática de tais atos (por exemplo, art. 972, CPC). 
 
Nas cartas precatórias não há delegação, pois sequer há competência a ser delegada, apenas um pedido de cooperação. (Fredie Didier Jr. e Daniel Assumpção). 
A CF, no art. 93, XI, autoriza a delegação da competência do Tribunal Pleno (todos os membros do tribunal) para o órgão especial deste mesmo tribunal (mínimo de 11 e máximo de 25). 
 
Ainda, a CF, no art. 93, XIV, autoriza a delegação, a serventuário da justiça, do poder de praticar atos de administração (não autoriza a delegação de poder de polícia, como a presidência de uma audiência de instrução) e de mero expediente sem caráter decisório.  O CPC, no art. 203, § 4º, autoriza a prática, de ofício, dos chamados atos meramente ordinatórios (juntada e vista obrigatória) que podem ser revistos pelo juiz quando necessários. 
 
INEVITABILIDADE: as partes hão de submeter ao quanto decidido pelo órgão jurisdicional. A situação das partes é de sujeição perante o Estado-juiz, independentemente de sua vontade, o que também reforça a ideia de imperatividade. “Vinculação obrigatória” e “estado de sujeição” dos sujeitos processuais. 
 
INAFASTABILIDADE: previsão legal no art. 5°, XXXV, CF, constituindo-se na consagração, em sede constitucional, do direito fundamental de ação, também designado como direito de acesso ao Poder Judiciário, direito de acesso à justiça ou direito à jurisdição. 
 
É considerado como uma conquista obtida a partir do momento em que, proibida a autotutela privada, assumiu o Estado o monopólio da jurisdição. 
 
Ação (criou-se o direito, abstrato) e jurisdição (poder-dever do Estado) são institutos que nasceram um para o outro, segundo Fredie Didier Jr.  Não há, portanto, matéria que possa ser excluída da apreciação pelo Poder Judiciário, ressalvadas raríssimas exceções, como a do processamento e julgamento de determinadas autoridades em hipóteses específicas (art. 52, I e II, CF). 
 
A ameaça a que faz referência o dispositivo constitucional consagra a tutela preventiva, a tutela de urgência e a tutela contra o perigo. 
 
A única imposição constitucional de esgotamento das vias extrajudiciais é em relação às questões desportivas (art. 217, § 1º, CF). 
 
Conforme entendimento pacificado no STJ, o habeas data só é cabível se houver recusa de informações por parte da autoridade administrativa (Súmula 2, STJ).  Aqui, a exigência de recusa é indispensável para o surgimento da lide, sem o qual não há interesse de agir, não representando espécie de abrandamento do princípio. 
 
Atenção! Leis que limitam ou proíbem a concessão de medidas de urgência, notadamente, em face do Poder Público (4.348/64, 5.021/66, 8.437/92 e 9.494/97) foram consideradas pelo STF, neste aspecto restritivo, constitucionais (ADIN 223-DF). Nada impede, porém, que o Juiz aprecie a constitucionalidade/razoabilidade da restrição, se for o caso. 
 
Importante: 
 
- CONCESSÃO de benefício previdenciário. Para que a ação judicial proposta seja conhecida é necessário que fique comprovado que: 
 
o autor requereu administrativamente o benefício, mas este foi negado pelo INSS (total ou parcialmente); 
o autor requereu administrativamente o benefício, mas o INSS não deu uma decisão em um prazo máximo de 45 dias; 
o benefício pleiteado trata de matéria sobre a qual o INSS tem posição manifestamente contrária ao pedido feito pelo segurado. 
 
Em regra, portanto, é indispensável o prévio requerimento administrativo do benefício no INSS. Obs: não é necessário o esgotamento da via administrativa (o segurado não precisa interpor recurso administrativo contra a negativa do pedido). 
 
- REVISÃO de benefício previdenciário. Em regra, não há necessidade de prévio requerimento administrativo. EXCEÇÃO: será necessário prévio requerimento administrativo se o pedido envolver apreciação de matéria de fato. 
É preciso garantir a efetiva concretização do direito de ação e do juiz natural através de uma tutela jurisdicional rápida, efetiva e adequada. Significa dizer, então, que a adequação compreende a garantia do procedimento, a espécie de cognição, a natureza do provimento e os meios executórios adequados às peculiaridades da situação de direito material (é daí que se extrai a garantia do devido processo legal). 
 
 A criatividade judicial, mencionada por Fredie Didier Jr., pode ser justificada pelo princípio da inafastabilidade da jurisdição, que proíbe a recusa da prestação jurisdicional, consagrado no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, reafirmado no art. 3° do CPC e ratificado pelo art. 140 do CPC ao estabelecer que “o juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico”. 
 
f) JUIZ NATURAL: garantia decorrente dacláusula do devido processo legal, sem previsão expressa, mas que resulta da conjugação de dois dispositivos constitucionais, quais sejam, o que proíbe juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII, CF) e o que determina que ninguém será processado senão pela autoridade competente (art. 5º, LIII, CF). 
 
Juiz natural é o juiz competente de acordo com as regras gerais e abstratas previamente estabelecidas (aspecto formal), bem como aquele que seja imparcial e independente (aspecto substancial). 
 
As regras de distribuição dos feitos servem exatamente para fazer valer a garantia do juiz natural, sendo que o desrespeito às regras de distribuição por dependência implica incompetência absoluta. 
 
O legislador tenta evitar a escolha do juiz pelo autor com a previsão do art. 286, II, CPC, ao criar uma regra de competência absoluta do juízo que extinguiu o processo sem resolução do mérito (art. 485) quando essa demanda é novamente proposta, ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam parcialmente alterados os réus. 
 
g) INÉRCIA: consagrado pelo art. 2º, CPC, o qual estabelece que “o processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei”, o princípio da inércia orienta o Estado-juiz de que, em regra, exerça a função jurisdicional somente quando provocado pela parte ou interessado, na medida da respectiva pretensão. Referido princípio preserva, ainda, a imparcialidade do julgador. 
 
Assim, dito que a atividade jurisdicional será prestada apenas mediante provocação das partes ou interessados, ressalvadas as exceções legais, mister destacar as hipóteses de autorização para que o agente estatal exerça sua função jurisdicional de ofício: 
 
instauração da execução de sentença que imponha prestação de fazer, não fazer ou dar coisa distinta de dinheiro (arts. 536 e 538, CPC), 
instauração do IRDR – instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 976, CPC), (iii) conflito de competência (art. 951, CPC), 
conversão do processo de recuperação judicial em falência (Lei nº 11.101/05, arts. 53, 56, § 4°, 61, § 1°, 72, § único, e 73), além do 
habeas corpus de ofício (art. 654, § 2°, CPP) e (vi) execuções trabalhistas (art. 114, VIII, CF). 
 
Atenção! O art. 989 do Código de Processo Civil de 1973 permitia que o juiz determinasse, de ofício, o início do processo de inventário, não havendo enunciado semelhante no Código de Processo Civil de 2015. 
 
h) PROMOTOR NATURAL: indicado por parcela da doutrina, consiste no impedimento de que o Procurador-Geral de Justiça faça designações discricionárias de promotores ad hoc, o que elimina a figura do acusador público de encomenda, que poderia, em tese, tanto ser indicado para perseguir o acusado como para assegurar a impunidade de alguém. 
 
A indicação de “promotor assistente”, para atuar em conjunto com o promotor da causa, não ofende o princípio em questão (Informativo 390, STJ, 6ª Turma, HC 40.394/MG, rel. Min. Og Fernandes, j. 14.4.2009), o mesmo ocorrendo com as “equipes especializadas de promotores de justiça” ou “formação de forças-tarefas” para determinada área de atividade (STF, 2ª Turma, HC 96700/PE, rel. Min. Eros Grau, j. 17.3.2009). 
A designação de promotor para atuar em determinada sessão do tribunal do júri, desde que previamente feita, e motivada, não afronta o referido princípio (STF, HC, 103038/PA, 2ª Turma, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 
11.10.2011). 
 
ESPÉCIES DE JURISDIÇÃO: 
 
A jurisdição é una e indivisível, razão pela qual a única forma de conceber a “divisão” da jurisdição em diferentes espécies é adotando-se determinados critérios com a finalidade meramente acadêmica: 
 
1. Pelo critério que a exercem: 
 Jurisdição comum e especial: esta última é exercida pelas chamadas “justiças especiais”, que tem fixação constitucional de sua competência em virtude da matéria que será objeto da demanda judicial. A CF reconhece a Justiça do Trabalho (arts. 111/116), a Justiça Eleitoral (arts. 118/121) e a Justiça Militar (arts. 122/125). Assim sendo, a jurisdição comum é residual, ou seja, tudo que não for de competência dessas justiças especiais, englobando a Justiça Estadual e a Justiça Federal. 
 
2. Pela posição hierárquica: 
 Jurisdição superior ou inferior: a inferior é exercida pelo órgão jurisdicional que enfrenta o processo desde o início, ou seja, aquele que tem competência originária para a demanda, enquanto a jurisdição superior é exercida em hipótese de atuação recursal dos tribunais. Os tribunais podem tanto exercer jurisdição superior como inferior. 
 
3. Podem ser ainda: 
 Jurisdição penal ou civil: critério que leva em conta a natureza do objeto da demanda judicial. Sendo matéria penal, naturalmente haverá jurisdição penal, e, de forma subsidiária, não sendo o direito material discutido na demanda de natureza penal, a jurisdição será civil. A jurisdição civil é bastante ampla, pois abrange, ao menos em tese, todas as matérias que não sejam penais. A jurisdição civil é delineada por exclusão, razão pela qual se apresenta com a característica de generalidade. Aquilo que não cabe à jurisdição penal ou especial, a ela pertencerá.  Jurisdição contenciosa ou voluntária, sendo essa apenas homologatória de acordos feitos entre as partes, e aquela presumida de haver um litígio que origina um processo que produzirá a coisa julgada. 
 
JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA (arts. 719/770, CPC): 
 
Tema doutrinariamente polêmico, já tendo sido dito, inclusive, que não se trataria nem de jurisdição, tampouco de voluntariedade. Não tem relação com a chamada jurisdição administrativa de países como Itália, Portugal, Espanha, França e Argentina. 
 
As características gerais da jurisdição voluntária, porém, são aceitas, pela doutrina, em sua maioria: 
 
Atividade estatal de integração (da vontade do interessado) e fiscalização, pois os efeitos jurídicos almejados somente poderão ser obtidos após a atuação do Estado-juiz, que o faz após a fiscalização dos requisitos legais (é por isso que se diz que não haveria voluntariedade alguma, mas, sim, obrigatoriedade). A obrigatoriedade é decorrência exclusiva da previsão legal, significando uma opção do legislador de condicionar o efeito jurídico de determinadas relações jurídicas, em razão de seu objeto e/ou de seus sujeitos, à intervenção do juiz, provavelmente em razão do status de imparcialidade, retidão de conduta e compromisso com a justiça que todos os juízes devem ter;  Leonardo Greco conceitua a jurisdição voluntária como “uma modalidade de atividade estatal ou judicial em que o órgão que a exerce tutela assistencialmente interesses particulares, concorrendo com o seu conhecimento ou com a sua vontade para o nascimento, a validade ou a eficácia de um ato da vida privada, para a formação, o desenvolvimento, a documentação ou a extinção de uma relação jurídica ou para a eficácia de uma situação fática ou jurídica”. 
 
Aplicam-se as garantias fundamentais do processo e as garantias da magistratura (quanto aos poderes processuais, a doutrina aponta a característica da inquisitoriedade – o juiz pode tomar decisões contra a vontade dos interessados e ter a iniciativa do procedimento, como nos arts. 738, 744, 746, CPC – e a característica da possibilidade de decisão fundada em equidade – não observar a legalidade estrita e usar de discricionariedade, decidindo de acordo com os critérios de conveniência e oportunidade, como afirma o art. 723, parágrafo único, CPC, ainda que contrariamente à lei, situação que, para a época, era bem interessante, mas que, hoje, somente diz o que já se sabe); 
 
Procedimentalmente falando, há regras comuns (arts. 719/725, CPC) e especiais (arts. 726 e seguintes, CPC); 
 
Em todos os procedimentos de jurisdição voluntária, por força do art. 178, o MP somente será ouvido nos casos ali indicados (art. 721, CPC). O STJ tem entendido que a intervenção do MP não deve se dar nos procedimentos de alienação, locação e administração da coisa comum e alienaçãode quinhão em coisa comum, mas, tão-somente, nas questões que envolvam os direitos indisponíveis, comprovando, concretamente, uma das causas do art. 178. 
 
Classificação dos procedimentos de jurisdição voluntária (Leonardo Greco): 
 
Receptícios (registrar, documentar ou comunicar manifestação de vontade), como as notificações, interpelações e protestos; 
Probatórios (produção de prova é o limite), como a justificação. A produção antecipada de prova é discutível se voluntária ou contenciosa; 
Declaratórios (limita-se a declarar a existência ou inexistência de uma situação jurídica), como na extinção de usufruto, da posse em nome do nascituro e na confirmação do testamento particular; 
Constitutivos (a criação, a modificação ou extinção de uma situação jurídica dependem da concorrência da vontade do juiz, por meio de autorizações, homologações, aprovações etc.), como a interdição, a emancipação, o arrendamento ou oneração de bens de incapazes, a locação de coisa comum, o alvará para a venda de bens de incapazes; 
Executórios (Estado-juiz exerce atividade prática que modifica o mundo exterior), como a alienação de coisas, a administração de coisa comum, a arrecadação de herança jacente etc.; 
Tutelares (envolve a proteção de determinadas pessoas que se encontram em situação de desamparo), como a nomeação ou remoção de tutores/curadores, a exibição de testamento. 
 
José Frederico Marques trata de jurisdição voluntária da seguinte forma: “é atividade resultante de negócio jurídico que se exige um ato do Estado, para que o negócio se realize ou complete”. Acrescenta que, como função, ela tem natureza administrativa, do ponto de vista material, e é ato judiciário, do ponto de vista subjetivo ou orgânico; em relação às suas finalidades, é função preventiva e também constitutiva. 
 
Na jurisdição voluntária não há lide, mas somente administração pública de interesses privados. É uma das funções do Estado, confiada ao Poder Judiciário, em virtude da idoneidade, responsabilidade e independência dos juízes perante a sociedade, visando evitar litígios futuros, ou irregularidades e deficiências na formação do ato ou negócio jurídico. 
 
Quanto ao conceito da jurisdição voluntária, está muito longe de ser pacificado na doutrina pátria, existindo correntes que procuram explicar sua natureza sobre três atividades: a administrativa, a jurisdicional e a autônoma. Entretanto, nenhuma possui unanimidade. 
 
 A jurisdição voluntária como administração pública de interesses privados (natureza administrativa) é a primeira corrente e ideia que prevalece na doutrina brasileira, conforme concepção de José Frederico Marques. Os principais argumentos, segundo Ovídio Baptista, de que se valem os juristas para demonstrar a natureza administrativa dos atos de jurisdição voluntária, são: 
 
A jurisdição contenciosa tem caráter repressivo e a jurisdição voluntária tem caráter preventivo do litígio; 
Aquela tem função meramente declaratória enquanto esta tem função constitutiva, haja vista que se destina à formação de atos e negócio jurídicos; 
A jurisdição voluntária não comporta o princípio do contraditório, não existindo, portanto, partes, mas simples interessados; 
Os atos de jurisdição voluntária não produzem coisa julgada, enquanto a sentença proferida em processo de jurisdição contenciosa produz coisa julgada; 
A jurisdição contenciosa corresponde a uma forma de atuação do direito objetivo, enquanto a jurisdição voluntária visa realizar certos interesses públicos subordinados ao direito. 
 
 A jurisdição voluntária como atividade jurisdicional (natureza jurisdicional) é a segunda corrente, minoritária, mas que vem ganhando adeptos, como Calmon de Passos, Ovídio Baptista e Leonardo Greco. A corrente doutrinária que entende que a jurisdição voluntária tem natureza jurisdicional justifica-se ao afirmar que toda atividade jurisdicional depende da iniciativa da parte interessada, sendo feita mediante o ajuizamento de uma ação. Ora, existindo ação, existirá processo e consequentemente jurisdição. São suas premissas: 
 
Não se pode dizer que não há lide, bastando, para tanto, os exemplos da interdição e da retificação de registro. A lide não precisa vir afirmada em petição inicial. Os casos de jurisdição voluntária são potencialmente conflituosos e é por isso que são submetidos à apreciação do Poder Judiciário e que se impõe a citação dos possíveis interessados; 
A única definição possível de jurisdição se baseia em seu aspecto subjetivo: jurisdição é atividade exercida por juízes. A jurisdição voluntária é, assim, inevitável; 
O processo é categoria que pertence à teoria geral do direito e é por isso que se fala em processo legislativos, administrativo, negocial e jurisdicional. Não se pode negar, portanto, a existência de um processo na jurisdição voluntária (que se exerce por meio das formas processuais conhecidas, como a petição inicial, sentença, apelação etc.), ainda que um processo administrativo. É, também, procedimento em contraditório; 
O juiz atua para atender interesse privado, como terceiro imparcial. A administração, por sua vez, age no seu próprio interesse, no interesse do Estado, da coletividade como um todo; e) Se há processo e jurisdição, então há ação; 
Há partes, com todos os direitos e deveres dela decorrentes. Dizer que porque não há litígio não há partes é desconhecer comezinha distinção dogmática. Parte em sentido substancial é a parte do litígio, enquanto que parte no sentido processual é o sujeito da relação jurídica processual; 
A decisão proferida em sede de jurisdição voluntária tem aptidão para a formação da coisa julgada. Não há nada no CPC que aponte em sentido contrário, pois até mesmo decisões que não examinam o mérito se tornam indiscutíveis (art. 486, § 1º, CPC); 
Outro argumento de que a decisão proferida em jurisdição voluntária se submete à coisa julgada material advém, por exemplo, da possibilidade de homologação de divórcio ou arrolamento consensuais em sede extrajudicial, desde que não haja interesse de incapazes (Lei nº 11.441/2007), pois o CNJ entendeu que a via extrajudicial é opcional (Resolução 35/2007). Assim, a homologação judicial confere às partes a indiscutibilidade da decisão, a coisa julgada, algo além do que oferece o extrajudicial. 
 
 A jurisdição voluntária como atividade autônoma (natureza autônoma) é a menos aceita na doutrina. Trata da ideia de que a jurisdição voluntária não se enquadra nem como voluntária, nem como contenciosa, configurando como categoria autônoma. Comunga dessa ideia Alcalá-Zamora, destacando que a jurisdição voluntária nem é jurisdição, nem é voluntária, eis que não representa atividade de um órgão público para declarar o direito de uma parte em face de outra, e porque muitas vezes o interessado é obrigado a obedecer à decisão de autoridade. 
 
AÇÃO 
 
Teorias da ação 
 
O desenvolvimento do direito processual civil, como um todo, seguiu de perto a evolução do conceito de direito de ação, peça fundamental para a tutela dos direitos, mesmo porque, não obstante seja, o cumprimento das normas de conduta, a regra para as sociedades, a não observância é dado não desprezível, devendo ser repreendida de forma severa, impedindo que a proliferação da desobediência ponha por terra a paz social. 
 
Se a validade do direito está ligada a um mínimo de eficácia social, também deve voltar sua atenção para a revisão das lesões ou ameaças de lesão aos direitos que fazem parte do patrimônio pessoal dos sujeitos. E o método eleito é o acionamento estatal. 
 
Surge, assim, o direito de ação, como instituto essencial nessa dinâmica, como mecanismo diretamente ligado à transição de sua forma estática à dinâmica. 
 
E quais são as teorias que visaram explicar o fenômeno do direito de ação? 
Lembrar que, como já explicitado pela doutrina abalizada de Moacyr Amaral Santos, toda teoria se reveste de um fundo parcial de verdade, cumprindo recolher e condensar o melhor suco de cada uma, não havendo soluções definitivas.Teoria imanentista (civilista) 
 
Aqui, o direito de ação é considerado o próprio direito material em movimento, reagindo a uma agressão ou a uma ameaça de agressão (aspecto dinâmico). O direito de ação seria algo imanente, característica própria do direito material (civil) lesado. 
 
É a primeira das teorias que se invoca ao estudar o direito de ação, calcada na ideia de que não haveria direito de ação sem direito material, tendo sido Savigny seu maior defensor. Couture aponta que a essa ideia também deu desenvolvimento a doutrina francesa. 
 
Nessa concepção, que não consegue compreender o direito de ação como direito autônomo, quando há respeito ao direito material, ele permanece estático, colocando-se em movimento somente no caso de agressão ou ameaça, hipótese em que passa a ser considerado direito de ação. 
 
Para seus defensores, o direito de ação é um direito que o cidadão possui contra seu adversário, e não contra o Estado, sendo o processo um mero procedimento. 
 
Era plenamente aceita, no âmbito científico, a definição dada ao tema pelo romanista Celso, para quem “a ação seria o direito de pedir em juízo o que nos é devido”. 
 
A referida ideia já foi, há tempos, abandonada, tendo apenas interesse histórico, mesmo porque entendia o direito de ação e o direito material como um mesmo direito. 
 
Deve-se à famosa polêmica entre Windscheid e Müther, dois romanistas alemães estudiosos da actio romana (cujos ensinamentos clássicos foram resgatados em universidades como a de Bolonha), no século XIX, a superação da confusão. 
 
Em termos pátrios, o CC/1916, em seu art. 75, estabelecia que a todo direito corresponde uma ação que o assegure. 
 
Ex.: “A” chega em sua fazenda e percebe que a mesma foi invadida, ato que cria uma relação jurídica entre ele e os invasores, a partir da qual surge seu direito subjetivo de reaver o que lhe foi tomado. Ajuizada demanda possessória, não se cria uma nova relação jurídica entre o autor e o Estado, diferente do vínculo de direito material. O que se tem é a continuidade da relação de direito material. 
 
Em suma, para Savigny, não haveria ação sem direito e não haveria direito sem ação. A ação segue a natureza do direito. 
 
Teoria concreta da ação 
 
Surgiu na esteira da polêmica entre Windscheid e Müther, um estudo que sepultou de uma vez por todas a teoria imanentista, a “teoria concreta da ação”, também conhecida como “teoria do direito concreto de ação”, sendo criação de Wach, na Alemanha. 
 
Para seus defensores, o direito de ação é um direito do indivíduo contra o Estado (com o objetivo de uma sentença favorável) e, ao mesmo tempo, um direito contra o adversário (que estará submetido à decisão estatal e aos seus efeitos jurídicos), separando o direito em 2(dois) planos, o substancial e o processual. 
 
O maior argumento de Wach foi a existência da “ação declaratória negativa”, que tem por finalidade certificar a inexistência de um vínculo jurídico entre determinados sujeitos, extirpando uma incerteza que possa pairar com relação a eles. 
 
Em suma, é ação dirigida ao Estado, que deve outorgar uma proteção; e se dirige contra a parte contrária, frente a qual deve ser outorgada a dita proteção. 
 
Defende-se que o direito de ação só existiria se o direito material existisse, condicionando a existência do primeiro à existência do segundo. Reconhece-se a “autonomia” do direito de ação, mas não a sua “independência”, considerando que o direito de ação dependeria do direito material. Só haveria ação quando restasse comprovada razão ao autor. 
 
Enfim, para essa teoria a concessão da tutela jurídica dependeria de um pronunciamento judicial favorável; a própria existência da ação, portanto, ficaria sujeita à procedência da demanda ajuizada. É exatamente por isso que se atribui o adjetivo de “concreta” à teoria elaborada pelo jurista alemão; o exercício da ação, em sua ótica, condicionava-se totalmente ao reconhecimento judicial de razão ao ajuizador do pleito. 
 
Como vertente da teoria do direito concreto, Chiovenda (discípulo de Wach), na Itália, defendeu que o direito de ação seria um “direito potestativo”, considerando que o direito a uma sentença favorável não cria nenhuma obrigação ao adversário diante do exercício do direito de ação, simplesmente estando sujeito ao seu exercício, independentemente de sua vontade ou de conduta a ser por ele prestada. 
 
A ação não seria um “direito” contra o Estado, mas um “poder” a ser exercido contra o réu, que ficaria sujeito aos efeitos jurídicos derivados do exercício do direito de ação pelo autor e a consequente sentença em seu favor. Teoria superada, possuindo somente interesse histórico. 
 
Teoria abstrata do direito de ação 
 
Também chamada de “teoria da ação em sentido abstrato”, foi criada pelo alemão Degenkolb e pelo húngaro Plósz, os quais procuraram um fundamento para a ação, desvinculado e independente de qualquer direito anterior. Apoiavam Büllow quanto à autonomia do processo como relação jurídica diversa daquela submetida ao órgão jurisdicional. 
A propósito, Büllow, cerca de 9 (nove) anos depois, publicou a obra que foi o marco inicial da nova ciência do processo. Para aquele que quer compreender melhor o tema, a leitura é essencial. O livro chama-se “Teoria das exceções processuais e dos pressupostos processuais”. 
 
A ideia principal foi a de incorporar o entendimento assimilado pela “teoria concreta” de que direito de ação e direito material não se confundiam, mantendo a autonomia entre esses 2(dois) direitos e também afirmando que o direito de ação é independente do direito material, podendo existir o primeiro sem que exista o segundo. 
 
Foi a grande responsável pelo salto científico da ciência processual, marcando a fase autonomista do direito processual civil. 
 
Importante ressaltar que as teorias de Degenkolb e Plósz não são absolutamente abstratas, uma vez que ambos consideravam que o exercício do direito de ação estava condicionado à boa-fé do ajuizador, ou seja, à efetiva crença de ser realmente detentor do direito alegado. 
 
O direito de ação, portanto, passou a ser entendido como o direito abstrato de obter um pronunciamento do Estado, por meio da decisão judicial, inexistindo requisito que precise ser preenchido para sua existência. Não há condições para a ação, pouco importando se a demanda seria exitosa ou não. 
 
Essa característica de ser incondicionado o direito de ação (portanto, subjetivo e público no sentido de obtenção da tutela jurisdicional), leva os abstrativistas puros a rejeitar a existência das condições da ação consagradas em nosso ordenamento processual. 
 
Assim, o termo “carência de ação” não existe, sendo as condições da ação, na realidade, matéria de mérito, de forma que a inexistência das chamadas condições da ação no caso concreto devem gerar uma sentença de improcedência, com a rejeição do pedido do autor e a declaração da inexistência de seu direito material. 
 
Consequência prática da adoção desse entendimento é relevante: ao entender que toda sentença de carência da ação é na realidade uma sentença de mérito (art. 487, I), após o trânsito em julgado essa sentença estará protegida pelo fenômeno da coisa julgada material, o que não ocorre com a sentença terminativa em tal situação (art. 485, 
VI). 
 
Para alguns doutrinadores, essa tese seria, academicamente falando, a mais correta, condizente com o princípio da economia processual, evitando a repropositura de demandas cuja pretensão do autor já foi rejeitada. 
 
 
 
Teoria eclética 
 
Tem em Liebman seu criador, consistindo, por conta do fato de o mestre italiano ser um dos muitos adeptos do abstrativismo, num desenvolvimento da teoria abstrata com alguns temperamentos. 
 
Aqui, o direito de ação existe de forma autônoma e independente em relação ao direito material, subordinando-se, porém, à existência de pressupostos denominados condições da ação, sem a existência dos quais não há ação, verdadeiramente. 
 
Em suma, seria, a ação,o direito a um julgamento de mérito, sendo que esse julgamento de mérito só ocorreria no caso concreto quando alguns requisitos são preenchidos de forma a possibilitar ao juiz a análise da pretensão do autor. 
 
Para ele a ação é formada por 3 (três) elementos distintos: os sujeitos, o pedido (a manifestação e a atuação judiciais desejadas pelo autor) e a causa de pedir (as questões fáticas e jurídicas que embasam o pedido). 
 
Aqui, as conhecidas condições da ação não se confundem com o mérito, mesmo que aferidas à luz da relação jurídica de direito material discutida no processo, sendo analisadas preliminarmente e, quando ausentes, gerando uma sentença de extinção sem resolução de mérito (terminativa) (art. 485, VI, CPC), sem a formação de coisa julgada material. 
 
Tratando-se de matéria de ordem pública, não há preclusão. 
 
O CPC adotou a teoria eclética e prevê, de forma expressa, que a sentença fundada em ausência das duas condições da ação remanescentes no texto é meramente terminativa, não produzindo coisa julgada material (art. 485, VI, CPC). 
 
Teoria da asserção ou prospecção (in status assertionis) 
 
Surgida em tempos mais recentes, a teoria da asserção pode ser considerada uma teoria intermediária entre a 
“abstrata” e a “eclética”. 
 
Para seus defensores, sendo possível ao juiz, mediante “cognição sumária”, perceber a ausência de uma ou mais condições da ação, deve ser extinto o feito sem resolução de mérito (art. 485, VI), mesmo porque já teria condições desde o limiar do processo de extingui-lo, e assim evitar o desenvolvimento de atividade inútil (princípio da economia processual). 
 
Por outro lado, caso o juiz precise no caso concreto de “cognição mais aprofundada” para então decidir sobre a presença das condições da ação, não mais haverá tais condições da ação, que passarão a ser entendidas como matérias de mérito. Aquilo que poderia ter sido, no início do processo, uma condição da ação, passa a ser matéria de mérito, gerando sentença de rejeição do pedido do autor (art. 487, I, CPC), com a geração de coisa julgada material. 
 
Resumidamente, o que interessa para fins da existência das condições da ação, para a presente teoria, é a mera alegação do autor, admitindo-se, provisoriamente, que o autor está dizendo a verdade. Não é o momento que a caracteriza, mas, sim, a produção ou não de prova para a verificação do preenchimento das condições da ação. 
 
O STJ afirmou que "se mostra saudável a lembrança de que a doutrina moderna, bem como, em decisões recentes, também o Superior Tribunal de Justiça, têm entendido que o momento de verificação das condições da ação se dá no primeiro contato que o julgador tem com a petição inicial, ou seja, no instante da prolação do juízo de admissibilidade inicial do procedimento. Trata-se da aplicação da teoria da asserção, segundo a qual a análise das condições da ação seria feita à luz das afirmações do demandante contida em sua petição inicial. Assim, basta que seja positivo o juízo inicial de admissibilidade, para que tudo o mais seja decisão de mérito” (REsp 879188/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, p. 2.6.2009). 
 
 
 
 
Assim, sedimentando essa nova teoria, o STJ também se manifestou: 
 
“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. TEORIA DA ASSERÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO E DANO MORAL. VERIFICAÇÃO DE EXISTÊNCIA. SÚMULA 7.1. Sobre a apontada afronta ao artigo 267, VI, do CPC, nos termos da teoria da asserção, o momento de verificação das condições da ação dá-se no primeiro contato que o julgador tem com a petição inicial. (REsp 879.188/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJ: 02/06/2009). Assim, é suficiente que a causa de pedir e o pedido se dirigiram à recorrente para que esta ocupe o polo passivo da ação.2. Acrescente-se que a verificação da efetiva responsabilidade da recorrente pelo dano demandaria a análise do Termo de Reconhecimento Recíprocos de Direitos e Obrigações, firmado entre a Companhia, o Município do Rio de Janeiro e o Estado do Rio de Janeiro, o que encontraria óbice no Enunciado Sumular n. 5 desta Corte.3. No que tange à aludida ofensa aos artigos 2º, §2º, 3º da Lei n. 8.078/1990, 186 e 927 do Código Civil, que dizem respeito à existência da relação de consumo e à presença do dano, é inviável analisar a tese defendida no recurso especial, a qual busca afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido. Aplica-se o Enunciado Sumular n. 7/STJ.4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido” (REsp 1358754/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, p. 13.3.2013). 
 
Exemplo: se o autor alega ser o possuidor numa ação possessória, já basta para ser considerado parte legítima, sendo a análise da veracidade ou não dessa alegação relegada ao juízo de mérito. 
 
São adeptos, dentre outros: Alexandre Freitas Câmara, Kazuo Watanabe, Flávio Luiz Yarshell, Barbosa Moreira, Luiz Guilherme Marinoni, José Roberto dos Santos Bedaque, Leonardo José Carneiro da Cunha. 
 
Condições da ação 
 
Conforme mencionado anteriormente, nosso CPC consagrou a teoria eclética, sendo indispensável, portanto, a análise das “condições da ação”. Há que se ponderar, porém, o pensamento daqueles que entendem que a retirada do termo “condições da ação” fez com que elas passassem ser tratadas como pressupostos processuais ou como mérito. 
 
Não se pode, de qualquer forma, confundir mérito com condições da ação. Para Fredie Didier Jr. há diferenciação entre “mérito” e “condição da ação”: “Realmente, há uma dificuldade muito grande de diferenciar aquilo que é mérito daquilo que seja simples condição da ação. A discordância reside em ponto fundamental, notadamente porque, de acordo com nosso sistema, a sentença de carência de ação, por não ser sentença de mérito, não poderia ficar acobertada com a imutabilidade da coisa julgada material, o que permite que a demanda seja repetida. Se de mérito se tratasse, este problema não existiria.” 
 
Enfim, o criador da teoria eclética foi Liebman, o qual, em seus primeiros estudos sobre o tema entendia existirem 3 (três) espécies de condições da ação: 
 
- possibilidade jurídica do pedido; - interesse de agir; - legitimidade. 
 
O próprio Liebman, porém, reformulou seu entendimento original, a partir da 3ª edição do seu “Manual”, passando a defender que a “possibilidade jurídica do pedido” estaria contida no interesse de agir, de forma que ao final de seus estudos restaram somente 2 (duas) condições da ação: “interesse de agir” e “legitimidade” (o motivo foi a permissão do divórcio na Itália, no ano de 1970). 
 
Possibilidade jurídica do pedido 
 
O CPC não mais a prevê como condição da ação, passando a ser tratada como verdadeira questão meritória (art. 332, CPC). Um dos aspectos menos versados da teoria da ação, é considerado por Calmon de Passos como uma 
“invenção nacional”. 
 
À luz do ordenamento jurídico, são 3 (três) os possíveis resultados: 
 
o pedido está expressamente previsto como apto a receber a proteção jurisdicional; 
não há nenhuma previsão legal a respeito do pedido; 
existe uma expressa vedação na lei ao pedido formulado. 
 
Dos 3 (três) resultados possíveis, somente a “vedação legal” constitui a impossibilidade jurídica do pedido. Numa análise abstrata e realizada “a priori”, o juiz deve considerar hipoteticamente que o autor tem razão em tudo que alega, e a partir daí verificar se existe a “vedação legal” ao que pretende receber, o que impedirá a continuidade do processo. 
 
Moniz de Aragão ensina que a possibilidade jurídica não deve ser considerada com vistas à existência de uma previsão no ordenamento jurídico, que torne o pedido viável em tese, mas, sim, com vistas à inexistência, no ordenamento jurídico, de uma previsão que o torne inviável. 
 
Atentar para a redação dos seguintes dispositivos: 
 
art. 17, CPC – “Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”; 
 
art. 485, VI, CPC – “O juiz não resolverá o mérito quando (...) VI – quandoverificar ausência de legitimidade ou de interesse processual”; 
 
Interesse de agir 
 
Também chamada de interesse processual, essa condição da ação está intimamente ligada à “utilidade” da prestação jurisdicional que se pretende obter com a movimentação da máquina jurisdicional. Assim, cabe àquele que busca o Poder Judiciário demonstrar que o provimento jurisdicional pretendido será capaz de lhe proporcionar uma melhora em sua situação fática, o que será o suficiente para justificar o tempo, a energia e o dinheiro que serão gastos pelo Poder Judiciário na resolução da demanda. 
 
O STJ já entendeu que não existe nulidade prática e, por consequência, interesse de agir, em execução de valor ínfimo pela Fazenda Pública (REsp 796.533/PE, rel. Min. Paulo Furtado – Desembargador convocado do TJ/BA, j. 9.2.2010). 
 
O interesse de agir está presente na jurisprudência do STJ, como se analisa no julgado a seguir: 
“AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDACAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO. AUSÊNCIA DO REQUISITO DO FUMUS BONI IURIS.[...]2.- Na hipótese, não restou configurada a presença do requisito do fumus boni iuris, de maneira que falta à medida cautelar a condição da ação consistente no interesse de agir, pela qual só se autoriza a ingressar em Juízo – ainda que com medida cautelar – se imprescindível a invocação da atividade jurisdicional, ao passo que essa nova atividade jurisdicional cautelar é a absolutamente desnecessária no caso.3.- Agravo Regimental improvido” (AgRg na MC 20632/RJ, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, p. 2.4.2013). 
 
Se o autor tem, efetivamente, o direito que alega ter e que, portanto, se sagrará vitorioso na demanda, tal situação diz respeito ao mérito. O juiz deve analisar em abstrato e hipoteticamente se o autor, sagrando-se vitorioso, terá efetivamente a melhora que pretendeu obter com o pedido de concessão da tutela jurisdicional que formulou por meio do processo. 
 
Segundo parcela doutrinária, o interesse de agir deve ser analisado sob 2 (dois) aspectos: a necessidade de obtenção da tutela jurisdicional reclamada (se dará sempre que o autor não puder obter o bem da vida pretendido sem a devida intervenção do Poder Judiciário) e a adequação entre o pedido e a proteção jurisdicional que se pretende obter (o pedido formulado pelo autor deve ser apto a resolver o conflito de interesses apresentado na petição inicial). 
 
O interesse-adequação, apesar de adotado por considerável doutrina, não agrada a todos, existindo parcela doutrinária que entende não haver nenhuma correlação entre o interesse de agir e a adequação, até porque a inadequação da pretensão não gera a perda do interesse de agir, considerando-se que mesmo de forma inadequada o autor pretende uma melhora em sua situação como o processo (Barbosa Moreira, Dinamarco e Didier). Por outro lado, há doutrina (Greco e Costa) que entende ser a inadequação da tutela pretendida questão referente aos pressupostos processuais e não às condições da ação. Assim, a escolha do procedimento inadequado significa que o meio adotado é impróprio, o que deve gerar uma extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, VI, CPC). 
Daniel Assumpção entende que o interesse-adequação está intimamente associado à ideia de utilidade na prestação jurisdicional, estando presente essa condição da ação quando o pedido formulado tem aptidão concreta de melhorar a situação do autor. 
 
O STJ assim se manifestou: 
 
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CONCESSÓRIA DE BENEFÍCIO. PROCESSUAL CIVIL. CONDIÇÕES DA AÇÃO. INTERESSE DE AGIR (ARTS. 3º E 267, VI, DO CPC). PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE, EM REGRA. [...] 3. O interesse de agir ou processual configura-se com a existência do binômio necessidade-utilidade da pretensão submetida ao Juiz. A necessidade da prestação jurisdicional exige demonstração de resistência por parte do devedor da obrigação, mormente em casos de direitos potestativos, já que o Poder Judiciário é via destinada à resolução de conflitos.[...]”(AgRg no AREsp 152247/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, p. 8.2.2013). 
 
Assim também: 
 
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANISTIA. LEI 8.878/1994. EMPREGADA PÚBLICA DO EXTINTO BANCO NACIONAL DE CRÉDITO COOPERATIVO-BNCC-. CONDUTA OMISSIVA DA ADMINISTRAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. FALTA DE INTERESSE DEAGIR. EXTINÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. [...] 4 Restrição ao cabimento do mandado de segurança sob o ângulo do interesse de agir, pois inadequada a via eleita e por isso, não preenchido o binômio necessidade-utilidade. 5. De rigor seria o indeferimento da petição inicial, logo de plano, fundado no descabimento da via mandamental utilizada. Todavia, superado o momento processual oportuno aos requisitos da exordial, impõe-se a extinção do mandado de segurança, em razão da ausência de interesse processual no que se refere à adequação da via eleita.6. A omissão é pressuposto processual objetivo, corresponde à adequação do procedimento. É preciso que o modelo procedimental seja realmente adequado. Trata-se do binômio necessidade-utilidade que preenchido caracteriza o interesse de agir.[...]” (MS 14238/DF, Primeira Seção, rel. Min. Mauro Campbell Marques, p. 24.4.2013). 
 
Legitimidade 
 
A todos é garantido o direito constitucional de provocar a atividade jurisdicional, mas ninguém está autorizado a levar a juízo, de modo eficaz, toda e qualquer pretensão, relacionada a qualquer objeto litigioso. Impõe-se a existência de um vínculo entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada, que lhes autorize a gerir o processo em que esta será discutida. Surge, então, a noção de legitimidade ad causam. 
 
A legitimidade para agir (ad causam petendi ou ad agendum) é condição da ação que se precisa investigar no elemento subjetivo da demanda: os sujeitos. É a “pertinência subjetiva da ação”. 
 
Parte legítima é aquela que se encontra em posição processual coincidente com a situação legitimadora, decorrente de certa previsão legal, relativamente àquela pessoa e perante o respectivo objeto litigioso. 
 
São as principais características: 
 
situação jurídica regulada por lei; 
qualidade que se refere a ambas as partes; 
afere-se diante do objeto litigioso, a relação jurídica substancial deduzida. 
 
Para Liebman, a ação é problema de dupla face; pertinência ao autor, do interesse em agir, e pertinência ao réu, do interesse em defender-se a incidir sobre situação jurídica ou de fato relativa a esse último. 
 
É bilateral, pois o autor está legitimado a promover a demanda em face daquele determinado réu, e não em face de outro. 
 
Todavia, a legitimidade é uma atribuição específica para agir concretamente, conferida exclusivamente pelo direito objetivo aos titulares da lide, podendo, às vezes, ser conferido a outras pessoas que não integram diretamente a relação jurídica afirmada em juízo. 
 
A classificação principal é aquela que divide a legitimidade em: ordinária (quando há correspondência entre a situação legitimante e as situações jurídicas submetidas à apreciação do magistrado; legitimado ordinário é aquele que defende em juízo interesse próprio – tutela individual – art. 18) e extraordinária (também chamada de legitimação anômala ou substituição processual, ocorre quando não houver correspondência total entre a situação legitimante e as situações jurídicas submetidas à apreciação do magistrado; legitimado extraordinário é aquele que defende em nome próprio interesse de outro sujeito de direito), classificação baseada na relação entre o legitimado e o objeto litigioso do processo. 
 
A doutrina também fala em legitimação extraordinária autônoma, que se dá quando o legitimado está autorizado a conduzir o processo independentemente de participação do titular do direito litigioso, dividindo-se em exclusiva (somente se dá com a presença de um determinado sujeito de direito) e concorrente (mais de um sujeito de direito estáautorizado a discutir em juízo determinada situação jurídica). 
 
Quanto à legitimidade concorrente: 
 
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. FALTA DE REPARO EM REDE PÚBLICA 
DE ESGOTO SANITÁRIO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. DIREITO TRANSINDIVIDUAL. AMPLIAÇÃO DOS REMÉDIOS JURÍDICOS. LEGITIMIDADE CONCORRENTE. [...] 4. Considere-se ainda que a) as tutelas de direitos transindividuais fazem parte de sistema que contempla técnica de ampliação dos remédios à disposição do jurisdicionado (e não de restrição) e que pressupõe a legitimação ordinária do lesado, geradora da legitimidade extraordinária dos sujeitos elencados no art. 5º da Lei 7.347/1985. Logo, não se trata de legitimidade exclusiva, mas concorrente. 
 
5. Agravo Regimental não provido” (AgRg no AREsp 401510/RJ, Segunda Turma, rel. Min. Herman Benjamin, p. 5.12.2013). 
 
Já a legitimação extraordinária subordinada ocorre quando a presença do titular da relação jurídica controvertida é essencial para a regularidade do contraditório. Autoriza-se o terceiro, estranho ao objeto da lide, a participar no processo como assistente do legitimado ordinário. Ex.: assistente simples. 
 
Não obstante a existência de divergência doutrinária, fato é que a substituição processual e a legitimação extraordinária tratam-se do mesmo fenômeno. 
 
A expressão substituição processual, porém, não se confunde com sucessão processual, este último caracterizado pela substituição dos sujeitos que compõem os polos da demanda, ocorrendo sempre que um sujeito que compõe o polo ativo ou passivo é retirado da relação jurídica processual para que um terceiro tome o seu lugar. Segundo o art. 109, sendo alienado bem litigioso, o autor será intimado e: 
 
caso concorde com a saída do réu originário e o ingresso do terceiro adquirente em seu lugar, haverá sucessão processual; 
caso não concorde com tal alteração, haverá uma substituição processual, considerando-se que a partir da alienação da coisa litigiosa o réu originário permanecerá no processo em nome próprio defendendo interesse alheio, admitindo-se o ingresso do terceiro adquirente como assistente litisconsorcial do réu. 
 
Também não se pode confundir substituição processual com representação processual, esta última relacionada à capacidade de estar em juízo (legitimatio ad processum). O representante processual atua em nome alheio na defesa de interesse alheio, não sendo parte no processo, mas mero sujeito que confere à parte capacidade para que esteja em juízo. Ex.: na ação de investigação de paternidade, a mãe será representada processual do incapaz, que será autor e titular do direito discutido nessa demanda. 
 
Elementos da ação 
 
São reconhecidos como elementos identificadores da ação, importante tarefa a ser considerada quando se pretende comparar uma ação com a outra. A coisa julgada, a litispendência e a perempção, por exemplo, exigem a existência de ações idênticas. 
 
São os componentes mínimos e suficientes da ação que as identificam como tais e, consequentemente, as distinguem de quaisquer outras ações. A indicação vem da própria lei (art. 337, § 2º, CPC). 
 
São eles: 
 
partes; 
pedido; 
causa de pedir. 
 
Partes 
 
São partes, em sentido formal, o autor e o réu, isto é, aquele que pede, em nome próprio, a prestação jurisdicional e aquele contra quem ou em face de quem o autor formula o seu pedido, ou a pluralidade de autores ou de réus, litisconsortes ativos ou passivos. Já em sentido material, são partes os sujeitos da relação interpessoal que a sentença irá regular diretamente. Em geral há coincidência: as partes em sentido formal o são também em sentido material, como no caso em que o autor, afirmando-se credor do réu, pede a condenação deste, apontando-o como devedor. 
 
Porém, há divergência doutrinária a respeito do conceito. 
 
Para Chiovenda, parte é o sujeito que “pede” ou “contra quem se pede” tutela jurisdicional (partes na demanda). 
 
Já para Liebman, parte é todo sujeito que participa da relação jurídica processual em contraditório defendendo interesse próprio ou alheio, podendo sofrer alguma consequência com a decisão final (mais amplo, partes no processo). Pode ser parte na demanda (autor e réu) ou parte auxiliar (assistente). 
 
Ao defenderem interesse próprio ou alheio em juízo, esses sujeitos se tornam titulares de situações jurídicas “ativas” e “passivas” (faculdades, ônus, poderes, deveres, estado de sujeição), as quais são responsáveis pelo desenvolvimento das atividades a serem praticadas pelas partes. 
 
Há uma parcela da doutrina pátria que entende ser possível a convivência dos dois entendimentos que, em tese, são contraditórios. 
 
A tese restritiva, defendida por Chiovenda, determina o conceito de “partes na demanda”, exigindo-se para que o sujeito seja considerado parte, além de sua presença na relação jurídica processual, que esteja em juízo pedindo tutela ou contra ele esteja sendo pedida tutela jurisdicional. A tese ampliativa, defendida por Liebman, determina o conceito de “partes no processo”, bastando, para que o sujeito seja parte, que participe da relação jurídica processual, sendo titular de situações jurídicas processuais ativas e passivas, independentemente de fazer pedido ou contra ele algo ser pedido. 
 
Há outra corrente doutrinária que entende que parte só é o sujeito que participa da lide, sendo que os demais sujeitos, apesar de serem considerados participantes do processo, são terceiros. 
 
Registre-se posicionamento do STF de que o amicus curiae não é parte, mas um colaborador informal da Corte, não configurando sua atuação espécie de intervenção de terceiros: 
 
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. LEGITIMIDADE RECURSAL LIMITADA ÀS PARTES. NÃO CABIMENTO DE RECURSO INTERPOSTO POR AMICICURIAE. (…) 2. Entidades que participam na qualidade de amicus curiae dos processos objetivos de controle de constitucionalidade, não possuem legitimidade para recorrer, ainda que aportem aos autos informações relevantes ou dados técnicos. Decisões monocráticas no mesmo sentido. (...)” (ADI-ED 2.591/DF, Pleno, rel. Min. Eros Grau, j. 14.12.2006). 
 
Em decisão recente, o STF tomou o mesmo sentido: 
 
“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI). AMICUS CURIAE. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NÃO CONHECIDOS. 1. Segundo a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o amicus curiae não tem legitimidade para opor Embargos de Declaração em ações de controle concentrado.2. Embargos de declaração não conhecidos” (EMB.DECL. NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.163/SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Teori Zavascki, p. 18.10.2013). 
 
O conceito de “parte na demanda” ou “no processo”, porém, não se confunde com o conceito de “parte material”, que é o sujeito da situação jurídica discutida em juízo, aquele que participa da relação de direito material que constitui o objeto do processo. 
 
Dessa forma, mesmo que não seja o titular dessa relação de direito material, mas participe do processo, o sujeito será considerado “parte processual”, independentemente da legalidade de sua presença no processo pelo simples fato de participar do processo. Por outro lado, mesmo sendo parte legítima, não há necessidade de a parte processual ser também parte material, como bem demonstra o fenômeno da “substituição processual”. 
 
A doutrina aponta que existem quatro formas de adquirir a qualidade de parte: 
 
pelo ingresso da demanda (autor/opoente); 
pela citação (réu, denunciado à lide e chamado ao processo); 
de maneira voluntária (assistente e recurso de terceiro prejudicado); 
sucessão processual (alteração subjetiva da demanda, como na extromissão de parte). 
 
Intervenção do MP como fiscal da ordem jurídica: forma voluntária vinculada, ou seja, a palavra final a respeito da intervenção no processo é sempre do MP, mas não será sua vontade, e sim a vontade da lei, que demandará sua participação. 
 
Pedido 
 
O pedido pode ser analisado sob a ótica processual, representando a providência jurisdicionalpretendida – condenação, constituição, mera declaração, acautelamento, satisfação – e sob a ótica material, representado pelo bem da vida perseguido, ou seja, o resultado prático (vantagem no plano dos fatos) que o autor pretende obter com a demanda judicial. De acordo com a doutrina tradicional, o pedido aceita um desdobramento em pedido imediato (aspecto processual, providência jurisdicional solicitada ao Estado-juiz), e o bem da vida, como pedido mediato (aspecto material, aquilo que é desejado através da dita providência jurisdicional). Assim, são elementos objetivos da ação o pedido e a causa de pedir, distinguindo-se o pedido imediato, que corresponde à natureza do provimento solicitado, e o pedido mediato, correspondente ao teor ou conteúdo do provimento. 
 
Apesar de tradicional a afirmação de que o réu não “pede”, mas apenas “impede”, Daniel Assumpção afirma que o réu formula pedido em sua contestação, afinal, a improcedência do pedido é um pedido do réu por uma sentença meramente declaratória (declara a inexistência do direito material alegado pelo autor e, no caso de ação declaratória negativa, declara a existência do direito material). Interessante notar que, justamente porque o réu faz pedido, nem sempre a natureza da sentença será determinada pela natureza da ação, fixada somente pelo pedido do autor. Assim, se o autor faz um pedido condenatório, a ação tem natureza condenatória, mas somente na hipótese de sentença de procedência a sentença terá essa natureza, já que na hipótese de improcedência a natureza da sentença será meramente declaratória. 
 
Requisitos: certeza e determinação do pedido 
 
Não obstante o art. 286, caput, CPC/73, dispusesse que o pedido deveria ser certo “ou” determinado, a verdade é que as pretensões devem ser certas “e” determinadas, porque os requisitos da certeza e determinação são cumulativos, e não alternativos, como a interpretação literal do dispositivo legal leva a crer, situação que foi corrigida pela nova legislação (arts. 322 e 324, CPC). 
 
A “certeza” é exigida tanto no pedido imediato (aspecto processual) quanto no pedido mediato (material). Naquele, o autor deve indicar, de forma precisa e clara, qual a espécie de tutela jurisdicional pretendida, enquanto no pedido mediato deve indicar o gênero do bem da vida pleiteado. O direito brasileiro não admite pedido incerto, sendo a certeza do pedido o mínimo exigível em todo e qualquer pedido. 
 
A “determinação”, por sua vez, só se refere ao pedido mediato, significando a liquidez do pedido, ou seja, a quantidade e a qualidade do bem da vida pretendido. Ainda que a determinação do pedido seja a regra do sistema processual, o próprio art. 324, § 1º, CPC, em três incisos, prevê as exceções a essa exigência, hipótese em que haverá um pedido genérico. 
 
Pedido genérico, portanto, é o que deixa de indicar a quantidade de bens da vida pretendida (quantum debeatur) pelo autor, sendo admitido somente quando houver permissão legal em lei. Registre-se mais uma vez que, mesmo no pedido genérico, cabe ao autor fazer o pedido certo, ou seja, deve determinar a espécie de tutela e o gênero do bem da vida. 
 
Pedidos genéricos 
 
Universalidade de bens 
 
A primeira possibilidade de pedido genérico verifica-se nas chamadas “ações universais”, caso o autor não consiga individualizar na petição inicial os bens demandados (art. 324, § 1º, I, CPC). Por ações universais se devem entender as ações que têm como objeto uma universalidade de bens em situação na qual falte ao autor condições de precisar, já na peça inicial, os bens efetivamente pretendidos. Ex.: universalidade de bens fática (livros que compõem o acervo de uma biblioteca ou um rebanho) e universalidade de bens jurídica (herança). 
 
Demanda de indenização quando impossível a fixação do valor do dano 
 
A segunda hipótese de pedido genérico é a impossibilidade ao autor de determinar de modo definitivo as consequências do ato ou do fato ilícito (art. 324, § 2º, CPC). Na realidade, o ato ou fato pode ser lícito, desde que danoso e que por ele responda civilmente o réu. Trata-se de dispositivo utilizado nas demandas de indenização quando não for possível ao autor a fixação do valor de todos os danos suportados em virtude do ato imputado ao réu. Essa impossibilidade decorre da circunstância de o ato ainda não ter exaurido seus efeitos danosos no momento de propositura da demanda. 
 
Registre-se nesse tocante que nas ações de indenização caberá ao autor especificar o prejuízo que pretende ver ressarcido, ainda que não tenha condições de indicar o quantum debeatur. Ainda que não seja necessária a indicação do valor que se pretende obter, o pedido deverá conter elementos identificadores da pretensão do autor, a fim de que seja possível o exercício do direito de defesa por parte do réu e limitar a atuação do juiz em sua eventual condenação. 
 
Na praxe forense, a admissão do pedido genérico não se restringe às situações em que seja impossível ao autor indicar o valor do dano e, por consequência, o quantum debeatur de sua pretensão, mas também àquelas hipóteses nas quais, apesar de possível, torna-se difícil ao autor comprovar o valor do dano ab initio (prova complexa, de natureza técnica). O panorama é aceito pelos tribunais superiores (STJ, 1ª Turma, AgRg no REsp 906.713/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 23.6.2009). 
 
Relativamente aos danos morais, o STJ admite, de forma pacífica, o pedido de condenação ao pagamento de danos morais pode ser genérico (3ª Turma, REsp 777.219/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 5.10.2006). Entendendo que não parece ser a melhor solução colocar a valoração dos danos nas mãos de terceiro que não participou da relação de direito material, posicionam-se Daniel Assumpção, Nélson Nery Jr, Cassio Scarpinella Bueno e Fredie Didier. 
 
Valor depender de ato a ser praticado pelo réu 
 
Hipótese prevista no art. 324, § 1º, III, CPC, a impossibilidade de indicação do valor deriva do fato de o réu ser o responsável pela indicação, como ocorre na prestação de contas, quando o autor faz pedido de condenação em prestar as contas e em pagar o eventual saldo remanescente, sendo que esse segundo pedido poderá ser genérico quando o valor só puder ser determinado após a efetiva prestação das contas a ser praticada pelo réu. 
 
 
 
 
 
Pedido implícito 
 
O pedido deve ser expresso, não podendo o juiz conceder aquilo que não tenha sido expressamente requerido pelo autor, bastando, para se chegar a tal conclusão, a redação da leitura do art. 492, CPC, que proíbe o juiz de conceder diferente (extra) ou a mais (ultra) do que foi pedido pelo autor. 
Deve ser entendido por pedido implícito qualquer tutela não pedida pelo autor que a lei permite que o juiz conceda ex officio. 
 
São hipóteses de pedido implícito: 
 
despesas e custas processuais; 
honorários advocatícios (art. 85, CPC); 
correção monetária (art. 404, CC); 
prestações vincendas e inadimplidas na constância do processo em caso de contratos de trato sucessivo (art. 
323, CPC); 
juros legais/moratórios (arts. 404 e 406, CC) – não sendo considerados pedidos implícitos os juros convencionais ou compensatórios. 
 
Lembrar, quanto aos juros moratórios, o teor da Súmula 254, STF, que admite sua inclusão na liquidação de sentença mesmo quando omissa a sentença liquidanda. Tal entendimento torna os juros moratórios uma verdadeira condenação implícita, pois o autor terá direito a eles mesmo que o juiz não os conceda expressamente na sentença. 
 
Quanto à correção monetária, verdadeira atualização do dinheiro, apesar de ser tradicionalmente entendida como pedido implícito, fato é que, em termos econômicos, não agrega ao patrimônio do vencedor mais do que ele pediu. De se destacar, ainda, agora relativamente aos honorários advocatícios, que o STJ entende que não podem ser executados sem sua concessão e nem serem objeto de cobrança em ação autônoma, em respeito à coisa julgada (Súmula 453). 
 
Cumulação de pedidos 
 
Requisitos para a cumulação de pedidos