Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE ESTADUAL DA REGIÃO TOCANTINA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS ALÉCIO VERAS RAMOS JÚNIOR JANAYNA FERNANDES DE SOUSA LEONARDO CONCEIÇÃO BEZERRA LETHÍCIA NOGUEIRA SILVA PATRÍCIA ARAÚJO SANTOS ANESTÉSICOS GERAIS INALATÓRIOS IMPERATRIZ – MA 2017 UNIVERSIDADE ESTADUAL DA REGIÃO TOCANTINA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS ALÉCIO VERAS RAMOS JÚNIOR JANAYNA FERNANDES DE SOUSA LEONARDO CONCEIÇÃO BEZERRA LETHÍCIA NOGUEIRA SILVA PATRÍCIA ARAÚJO SANTOS ANESTÉSICOS GERAIS INALATÓRIOS Trabalho realizado por alunos do 6º período de Medicina Veterinária, para a disciplina de Anestesiologia Veterinária, com o intuito de aprendizado e obtenção de nota. Discente: Paulo Henrique Soares. IMPERATRIZ – MA 2017 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................3 2 ANESTESIA...........................................................................................................................4 3 AGENTES INALATÓRIOS.................................................................................................5 4 ESTÁGIOS CLÍNICOS DA ANESTESIA..........................................................................6 5 CLASSIFICAÇÃO.................................................................................................................8 6 FARMACOCINÉTICA, ABSORÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E ELIMINAÇÃO.................9 6.1 Captação do anestésico pelo sangue................................................................................11 6.2 Coeficiente de partição.....................................................................................................11 6.3 Mecanismos de ação..........................................................................................................11 7 EFEITOS GERAIS DOS ANESTÉSICOS INALATÓRIOS..........................................13 7.1 Sistema nervoso central....................................................................................................13 7.2 Sistema cardiovascular.....................................................................................................14 7.3 Sistema respiratório..........................................................................................................14 7.4 Sistema neuromuscular....................................................................................................14 7.5 Fígado e outros órgãos......................................................................................................15 7.6 Outros sistemas.................................................................................................................15 8 USO CLÍNICO E ESPECIALIDADES FARMACÊUTICAS.........................................17 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................19 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................20 3 1 INTRODUÇÃO Uma das grandes preocupações desde a Antiguidade foi à abolição da dor. Neste sentido, existem relatos do emprego de agentes derivados do ópio, bebidas alcoólicas, maconha, haxixe, entre outros, utilizados para minimizar o desconforto do paciente, principalmente aquele ocasionado por uma cirurgia. Por não existirem métodos eficientes que promovessem o alívio da dor, os pacientes eram submetidos à cirurgia por meio de contenção física e pelo emprego de substâncias tais como o álcool. Com o passar do tempo, foi se estudando e buscando formas de promover a analgesia para diminuir a dor e o desconforto de um procedimento cirúrgico. Em 1846, a partir de estudos de William Morton, o éter foi utilizado e o resultado alcançado foi de sucesso absoluto, e pacientes e médicos passaram rapidamente a se beneficiar desta nova descoberta. Os agentes inalatórios utilizados inicialmente possuíam características indesejáveis, pois, além de serem explosivos e inflamáveis, eram responsáveis por altas taxas de mortalidade. Este trabalho tem como objetivo mostrar os anestésicos inalatórios que estão sendo mais utilizados na medicina veterinária, bem como suas características e atuações. 4 2 ANESTESIA Segundo Soares (2015), a anestesia geral é a depressão irregular e reversível do sistema nervoso central. Seja qual for à via de administração, as drogas anestésicas gerais utilizadas determinarão graus variáveis de bloqueio sensorial, motor, de reflexos e mental (consciência). Os agentes inalatórios utilizados inicialmente possuíam características indesejáveis, pois, além de serem explosivos e inflamáveis, eram responsáveis por altas taxas de mortalidade (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Assim, os anestésicos gerais intravenosos foram empregados em algumas circunstâncias no lugar dos agentes inalatórios, principalmente na medicina veterinária. Com o advento do halotano, na década de 1950, e de outros anestésicos halogenados nos anos seguintes, foram incrementadas as técnicas de anestesia (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Para que ocorra anestesia, é necessária a presença dos seguintes fatores: 1. Hipnose, em que há perda de consciência, que facilita procedimentos cirúrgicos como intubação e ventilação; 2. Analgesia, que é essencial para o procedimento cirúrgico; 3. Ausência de respostas reflexas autonômicas frente ao estímulo nociceptivos; 4. Relaxamento muscular, nem sempre presente, porém facilita a cirurgia e os procedimentos cirúrgicos por reduzir o tônus muscular. Até o momento não se dispõe de um anestésico geral que preencha perfeitamente todos os requisitos supracitados de forma equilibrada, sendo pouco provável que se encontre uma substância que induza a anestesia geral com total perda de consciência e suficiente relaxamento muscular sem promover depressão cardiovascular e respiratória importantes. 5 3 AGENTES INALATÓRIOS Anestesia inalatória é a obtida por meio da absorção de um princípio ativo através da via respiratória passando, posteriormente à corrente circulatória e atingindo o SNC e gerando seus efeitos anestésicos (NATALINI, 2007). Incialmente os fármacos anestésicos eram utilizados para produzir apenas anestesia geral, mas hoje, inconsciência, relaxamento muscular e analgesia são requeridos em um bom anestésico (GRAY; UTTING; NUNN, 1980). Segundo Braz (2000), a sua segurança na utilização não requer apenas conhecimento de seus efeitos farmacológicos, mas sim suas propriedades químicas e físicas, o anestésico inalatório ideal deve ser fácil de controlar, permitir a indução e recuperação rápidas e não conter efeitos adversos. 6 4 ESTÁGIOS CLÍNICOS DA ANESTESIA GERAL Na metade do século XIX foram descritos, pela primeira vez, alguns sinais que refletiam a profundidade da anestesia geral em pacientes que recebiam éter ou clorofórmio. No início do século XX, mais precisamente em 1920, Guedel, com base nessas observações e em outros sinais, dividiu a anestesia geral em quatro estágios e o terceiro deles – a anestesia cirúrgica – em quatro planos. Sua proposta foi feita inicialmentepara o éter, cuja indução anestésica é bastante lenta. Este esquema varia na dependência do anestésico empregado e é totalmente modificado pelo uso de medicação pré-anestésica e associações de agentes anestésicos (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Segundo Spinosa; Górniak; Bernardi (2011), a divisão proposta por Guedel consiste nos seguintes estágios: Estágio I – Analgesia: esta fase inicia-se com a administração do anestésico geral e termina com a perda de consciência. O paciente perde progressivamente a sensação da dor, porém a atividade motora e os reflexos estão presentes. Estágio II – Delírio: esta fase se segue à perda de consciência e apresenta como característica respiração irregular e espástica, findando com o retorno à respiração regular e automática. O animal pode apresentar aumento da atividade motora e do tônus muscular, debatendo-se intensamente. Os reflexos palpebrais estão presentes; observam-se movimentos oculares erráticos, pupilas dilatadas, porém que reagem à luz, e, às vezes, movimentos de deglutição, náuseas e vômitos. Estágio III – Anestesia cirúrgica: estende-se do final do estágio II, quando cessam os movimentos espontâneos e a respiração torna-se automática e regular, e termina com o aparecimento de movimentos erráticos do globo ocular (BRAZ, 2000). Além disso, os reflexos desaparecem gradativamente, advém um relaxamento muscular completo e, com o aumento da concentração do anestésico, a respiração torna-se pouco a pouco mais superficial. Esta fase foi dividida em quatro planos, cujos sinais físicos são específicos para cada um deles. Para diferenciá-los, leva-se em conta o tipo de respiração, os movimentos do globo ocular, a presença ou ausência de reflexos e o tamanho das pupilas. No 1º plano observa-se respiração regular e automática, associada a movimentos errantes do globo ocular – nistagmo, observados principalmente no cavalo, desaparecimento dos reflexos laringotraqueal e interdigital. Ainda no equino verifica-se lacrimejamento. No 2º plano verifica-se que a respiração gradativamente se torna menos profunda e cessam os movimentos do globo ocular. No 3º plano, a respiração se torna preferencialmente abdominal, com esforço inspiratório 7 torácico. O reflexo corneal torna-se ausente neste plano. Finalmente no 4º plano o animal apresenta respiração exclusivamente abdominal, pupilas dilatadas, sem reação à luzm e total flacidez muscular. Estágio IV – Paralisia respiratória: esta fase se inicia com a parada respiratória e termina com insuficiência respiratória. Este último sintoma é característico desta fase, porém poderá ocorrer também colapso vasomotor, se a respiração for suprida artificialmente. As pupilas ficam dilatadas, podendo sobrevir à morte caso se mantenha a administração do anestésico e a respiração não seja assistida. Os sinais e sintomas variam para cada anestésico, assim, o óxido nitroso não é capaz de induzir relaxamento muscular, o halotano causa hipotensão mais precocemente que o éter, enquanto ambos não são capazes de induzir anestesia até o estágio III (MUIR et al., 2008). Muitas substâncias apresentam atividade anestésica, porém o seu emprego como medicamento na clínica é restrito a apenas algumas delas. Neste sentido, verifica-se que, embora apresentem propriedades requeridas para serem consideradas um bom anestésico, exibem outras que as tornam inadequadas para tal procedimento (BRAZ, 2000). No quadro 1 são descritas as propriedades ou efeitos de um anestésico inalatório ideal. Quadro 1: Quesitos de um anestésico inalatório ideal. Fonte: SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI (2011). 8 5 CLASSIFICAÇÃO Os anestésicos inalatórios podem ser divididos, do ponto de vista físico, em gasosos e voláteis e, quimicamente, em orgânicos e inorgânicos; o quadro 2 mostra a classificação dos principais anestésicos inalatórios disponíveis (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Os anestésicos gerais inalatórios mais empregados em medicina veterinária são o óxido nitroso, o halotano, o enfluorano e o isofluorano. Quadro 2: Classificação dos principais anestésicos gerais inalatórios. Fonte: SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI (2011). 9 6 FARMACOCINÉTICA, ABSORÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E ELIMINAÇÃO O estado anestésico é obtido quando se consegue alcançar, no cérebro, a concentração adequada de uma droga anestésica. Segundo Braz (2000), a concentração do SNC leva a depressão variável, que se convencionou dividir em estágios e planos anestésicos. Para que alcance o SNC, o anestésico inalatório deve ser administrado através de aparelhos apropriados, tais como vaporizadores e sistemas de anestesia adequados, para que em forma de gás ou vapor seja absorvido pelos pulmões, destes, passe ao sangue arterial e finalmente atinja o SNC e outros tecidos. A absorção ou captação dos anestésicos inalatórios é dividida classicamente em cinco fases: 1ª fase – mobilização dos gases ou vapores do aparato de anestesia até os alvéolos pulmonares; 2ª fase – distribuição dos gases ou vapores no ar alveolar; 3ª fase – difusão dos gases do alvéolo para o sangue e sua dissolução neste veículo; 4ª fase – transporte no sangue até os capilares; 5ª fase - difusão a partir dos capilares até o tecido (célula). A captação é regida pela seguinte fórmula: Captação = λ . Q. (Pa – Pv)/PB em que: λ= solubilidade do anestésico Q= débito cardíaco Pa = pressão parcial do gás no alvéolo Pv= pressão parcial do gás no sangue venoso PB = pressão barométrica. (BRAZ, 2000, p.119) Além das propriedades físico-químicas dos anestésicos (peso molecular ou densidade do gás, solubilidade em água, sangue e gorduras), a absorção está diretamente ligada a princípios físicos (NATALINI, 2007). Outras propriedades, importantes em um anestésico inalatório ideal, são: baixo ponto de ebulição, baixo calor de vaporização, alta pressão de vapor, adequada solubilidade em lipídios, boa potência anestésica, baixo índice de metabolização, grande margem de segurança, baixa toxicidade, indução e regressão rápidas e agradáveis, boa estabilidade e pureza, não ser inflamável e apresentar condições de ser facilmente armazenado (BRAZ, 2000, p.119). As principais características físico-químicas dos anestésicos inalatórios atualmente mais utilizados podem ser observadas no quadro 3. Quadro 3: Características físico-químicas dos principais agentes anestésicos inalatórios. Fonte: BRAZ (2000) O nível de anestesia é determinado diretamente pela concentração de anestésico no cérebro, que por sua vez depende da concentração no sangue arterial e esta depende da 10 concentração alveolar (SOARES, 2015). Desse modo, existe relação proporcional entre a concentração cerebral e a alveolar (BRAZ, 2000). Como não se pode determinar a concentração cerebral do anestésico, considera-se a relação de proporcionalidade anteriormente mencionada e a concentração alveolar passa a espelhar o q ocorre em nível de sistema nervoso central. Segundo Muir et al. (2008), a concentração alveolar não é idêntica à concentração inspirada do anestésico, pois ao atingir os pulmões o anestésico desloca a fração nitrogênica do ar alveolar, expande-se com o aquecimento e a adição de vapor de água proporciona diminuição de sua pressão parcial. Para se obter adequada concentração alveolar de anestésico, depende-se fundamentalmente da concentração inspirada, da ventilação alveolar e da captação do agente anestésico pelo sangue (SOARES, 2015). Os mesmos fatores que afetam a captação dos anestésicosinalatórios alteram também a velocidade de eliminação (YOUNG; APFELBAUM, 2000). A solubilidade no tecido adiposo tem grande influência na eliminação dos agentes inalatórios, pois, devido à vascularização deficiente, há lenta liberação do agente para a corrente circulatória e, portanto, para o trato respiratório, acarretando recuperação anestésica tardia (NATALINI, 2007). Por muitos anos os anestésicos inalatórios foram tidos como gases quimicamente inertes e resistentes à biotransformação no organismo (BRAZ, 2000). Atualmente, sabe-se que os anestésicos inalatórios apesar de serem eliminados a priori pelo sistema respiratório, sofrem graus diversos de biotransformação, que varia de acordo com cada agente (BRAZ, 2000). A biotransformação ocorre primariamente no fígado, mas também, em menor grau, nos pulmões, rins e sistema digestivo, que será visto mais adiante. A biotransformação não altera a taxa ou velocidade de indução da anestesia, no entanto, sabe-se que a biotransformação influencia de maneira qualitativa a recuperação da anestesia, especialmente em se tratando de anestésicos muito solúveis no sangue e/ou gorduras (NATALINI, 2007). Os anestésicos inalatórios halogenados são biotransformados principalmente pelas oxidases de função mista, responsáveis pelas reações de oxidação caracterizadas por desalogenação e O-desalquilação (SOARES, 2015). Segundo Muir et al. (2008) a farmacocinética da biotransformação de cada anestésico e o destino de seus metabólitos são determinados por sua estabilidade química e suscetibilidade ao ataque enzimático; por sua solubilidade no sangue e na gordura; pelas concentrações usadas durante a exposição; pela 11 exposição anterior ao agente anestésico; e pelos padrões de ventilação e de fluxo sanguíneo do indivíduo durante o período de excreção do agente e seus metabólitos. 6.1 Captação do anestésico pelo sangue Quanto maior a captação de um agente anestésico pelo sangue, mais demorado será o aumento da concentração alveolar, isto é, menor será a concentração alveolar relativamente a uma dada concentração inspirada (SOARES, 2015). A captação do agente anestésico inalado depende fundamentalmente de três fatores: solubilidade no sangue, rendimento cardíaco e gradiente de tensão do anestésico entre o alvéolo e o sangue venoso pulmonar (BRAZ, 2000). 6.2 Coeficiente de partição Coeficiente de partição é a proporção de um número de moléculas de um gás anestésico presente em dois compartimentos. Desta forma, podem-se ter vários tipos de coeficiente de partição (SOARES, 2015). Neste, tratar-se-á do coeficiente de partição sangue/gás também chamado de coeficiente de solubilidade. Ele indica a solubilidade de um gás anestésico em um determinado tecido ou sangue, quando um anestésico volátil detém um baixo coeficiente de partição, satura rapidamente o sangue e tecidos, de modo que a indução e a recuperação são mais rápidos que outros com coeficientes altos (GRAY, UTTING, NUNN, 1980). Segundo SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI (2011), outros coeficientes também refletem a solubilidade dos anestésicos. O coeficiente de solubilidade de Ostwald é essencialmente idêntico ao coeficiente de partição, no qual o denominador da fração equivale sempre aos valores da fase gasosa e o numerador aos do tecido ou sangue, obtidos a 37ºC. Dessa forma, quanto maior a solubilidade, maior a captação e, portanto, menor a concentração alveolar, quanto mais solúvel for o anestésico no sangue, maior será a captação, menor será a concentração alveolar e, consequentemente, a concentração cerebral; portanto, mais demorada será a indução. O contrário acontece com os agentes anestésicos pouco solúveis no sangue (BRAZ, 2000, p. 120). Quanto menor o coeficiente de solubilidade, menos solúveis serão os anestésicos e mais rapidamente estabelecer-se-á o equilíbrio entre a concentração alveolar e a concentração no SNC, correspondendo, a um menor tempo de indução da anestesia. 6.3 Mecanismo de ação O mecanismo pelo qual os agentes anestésicos inalatórios produzem anestesia é, até os dias de hoje, controvertido. Algumas teorias, agrupadas como clássicas, tentam explicar 12 o fenômeno por meio das propriedades físico-químicas dos anestésicos, ao passo que as chamadas teorias modernas ocupam-se com os efeitos destes anestésicos sobre as propriedades bioquímicas e biofísicas das células (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Todas as teorias clássicas relatam propriedades importantes dos anestésicos inalatórios, porém não explicam o mecanismo pelo qual o anestésico interrompe a transmissão do estimulo nervoso (MUIR et al., 2008). A ideia geral é de que as moléculas do anestésico primeiro se dissolveriam nos lipídios da membrana celular, mudando suas propriedades físico-químicas e alterando proteínas importantes como os receptores e canais iônicos (YOUNG; APFELBAUM, 2000). As teorias modernas, em suma, propõe que os alvos do anestésico inalatório seriam as próprias proteínas das membranas, estas se ligariam a porções hidrofóbicas das proteínas e modificariam sua conformação (SOARES, 2015). 13 7 EFEITOS GERAIS DOS ANESTÉSICOS INALATÓRIOS 7.1 Sistema nervoso central Segundo Braz (2000), o óxido nitroso é anestésico muito pouco potente, podendo, no máximo, levar ao estágio II de anestesia, por outro lado, quando associado ao halotano, enfluorano ou isofluorano, é muito útil, pois colabora com a redução da concentração destes agentes, diminuindo, portanto, os efeitos cardiodepressores dos anestésicos inalatórios. O óxido nitroso é rapidamente captado pelo sistema nervoso central e as concentrações necessárias para produzir anestesia estão em torno de 50 a 75%. Como este agente é pouco solúvel no sangue, quando eliminado de forma brusca pode causar redução da concentração alveolar do oxigênio, ocasionando hipóxia e lesões irreversíveis do cérebro (BRAZ, 2000). Para evitar este efeito, normalmente institui-se a interrupção da administração do óxido nitroso 10 min antes do término da cirurgia, realizando-se a ventilação do paciente com oxigênio a 100% (MUIR et al., 2008). Por possuir pressão de vapor extremamente alta e coeficiente de partição sangue/gás baixo, este anestésico se difunde para espaços que contém gás de maneira muito mais rápida que o nitrogênio (YOUNG; APFELBAUM, 2000). Há, consequentemente, aumento do volume destes espaços, que se traduz em distensão excessiva das vísceras abdominais. Assim sendo, em equinos e nos herbívoros em geral, não se recomenda esse agente, pois, além do risco de promover hipoxemia grave, há relatos da ocorrência de cólica no pós-operatório (YOUNG; APFELBAUM, 2000). O óxido nitroso apresenta metade da potencia anestésica em equinos, quando comparados ao homem, porém, a associação deste agente a outros anestésicos inalatórios pode ser utilizada com sucesso em pequenos animais, principalmente em procedimentos cirúrgicos de longa duração (GRAY, UTTING, NUNN, 1980). Os anestésicos voláteis causam redução do metabolismo cerebral, sendo o isofluorano o mais depressor e o halotano o menos. Promovem também aumento do fluxo sanguíneo cerebral, por vasodilatação, causando um estado de hiperperfusão, neste aspecto, o halotano é o mais potente e o isofluorano o menos (GRAY, UTTING, NUNN, 1980). Em planos profundos de anestesia, o isofluorano aumenta o fluxo sanguíneo cerebral e, consequentemente, a pressão intracraniana, mas ainda assim em menor extensão do que a observada com o halotano (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). Todos os anestésicos inalatórios modernossão potentes depressores do sistema nervoso central, sendo capazes de produzir todos os planos de anestesia de forma similar ao éter, porém, ocasionam grau de anestesia leve. 14 7.2 Sistema cardiovascular Todos os anestésicos inalatórios alteram a função cardiovascular, a magnitude de tal alteração dependerá, sobretudo do agente em questão e da dose empregada (BRAZ, 2000). Vários outros fatores contribuem para observação de maior depressão cardiovascular durante a anestesia inalatória, como, por exemplo, a concentração anestésica, a ventilação mecânica, o tempo de anestesia, a volemia e o uso concomitante de outros agentes (NATALINI, 2007). Dos anestésicos inalatórios, o oxido nitroso é o que causa menos efeitos adversos no sistema cardiovascular, possuindo atividade adrenérgica moderada (BRAZ, 2000). Os anestésicos halogenados diminuem a pressão arterial de maneira dose-dependente, o mecanismo responsável pela hipotensão inclui vasodilatação, queda do débito cardíaco e diminuição do tônus do sistema nervoso autônomo simpático (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). No caso do halotano e do enfluorano, a diminuição do débito cardíaco é o principal fator contribuinte para a queda da pressão arterial. O halotano, o enfluorano, o isofluorano e o óvido nitroso deprimem a sensibilidade dos barroreceptores; portanto, a frequência cardíaca sofre pouca alteração na vigência de hipo ou hipertensão. O halotano pouco altera a frequência cardíaca, o enfluorano causa bradicardia e o isofluorano, taquicardia (BRAZ, 2000). Todos estes agentes causam, ainda, sensibilização do miocárdio aos efeitos das catecolaminas, ou seja, no transcorrer da anestesia inalatória, menores concentrações de epinefrina podem desencadear arritmias, em comparação aos animais que não recebem os anestésicos inalatórios; na prática, o que se observa é a maior incidência de arritmias cardíacas quando o halotano é empregado. 7.3 Sistema respiratório Segundo Braz (2000) todos os anestésicos inalatórios deprimem a função respiratória de forma significativa, sendo o óxido nitroso o agente com menor efeito, o volume-minuto diminui em 20% com o oxido nitroso, em 28% com o halotano, em 34% com o isofluorano e em 71% com o enfluorano. 7.4 Sistema neuromuscular O óxido nitroso não produz efeitos significativos na fisiologia da musculatura esquelética e o fluxo sanguíneo para o musculo não se modifica (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). O halotano provoca relaxamento da musculatura esquelética por mecanismos centrais e na placa miconeural, relaxa também a musculatura uterina, sendo útil 15 nas manobras de parto (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). No entanto, este agente pode inibir contrações eficazes e, por isso, prolongar o tempo de trabalho de parto. 7.5 Fígado e outros órgãos O óxido nitroso não interfere de forma importante no trato gastrintestinal, fígado e rins; ocorrem vômitos e náuseas em pequena proporção. O óxido nitroso é capaz de inibir a síntese da metionina, substância importante para a síntese de DNA e de varias proteínas (NATALINI, 2007). O halotano é associado a aumento na ocorrência de lesões hepáticas, evidenciando-se dois tipos de síndrome; estas ocorrem eventualmente após anestesia e cirurgia, sem aparente relação tempo-efeito (YOUNG; APFELBAUM, 2000). De acordo com Braz (2000), o primeiro tipo caracteriza-se apenas por moderado aumento nas transaminases do fígado, sendo a taxa de mortalidade baixa. A segunda síndrome é mais rara, sendo associada à exposição repetida ao anestésico, em geral em curtos intervalos, havendo desenvolvimento de disfunção hepática fatal com alto índice de mortalidade. 7.6 Outros sistemas Segundo Soares (2015), tremores pós-operatórios são frequentemente observados após a anestesia com os agentes anestésicos inalatórios e devem-se à diminuição da temperatura corporal, que provavelmente está relacionada a vasodilatação periférica causada pelo anestésico ou ao efeito da anestesia sobre o sistema termorregulador. No quadro 4 apresenta-se um resumo das principais propriedades de alguns anestésicos inalatórios. 16 Quadro 4: Principais propriedades dos anestésicos inalatórios. PROPRIEDADE ÓXIDO NITROSO HALOTANO DESFLUORANO ISOFLUORANO Indução rápida média muito rápida rápida Recuperação rápida média muito rápita muito rápida CAM* (cão) 105 0,87 7,20 1,41 Pressão de vapor (mm Hg a 20ºC) gás 243 664 38 Coeficiente de partição gás/sangue 0,47 2,3 0,45 1,4 Coeficiente óleo/gás 1,4 224 18,7 97,8 Estabilidade estável decompõe-se pela luz estável estável Inflamável não não não não Explosivo não não não não Metabolismo não ocorre 15 a 20% 0,02% 0,2% Sistema nervoso central ação excitatória aumenta fluxo sanguíneo, depressor aumenta fluxo sanguíneo aumenta fluxo sanguíneo depressor Sistema cardiovascular efeitos sutis diminuição do débito cardíaco e da pressão arterial similar ao isofluorano pouca depressão do débito cardíaco Sistema respiratório pequenos efeitos depressão depressão depressão Sistema neuromuscular sem efeitos relaxamento moderado relaxamento moderado relaxamento moderado Sistema gastrointestinal poucos efeitos poucos efeitos - - Fígado baixa toxicidade poucos efeitos baixa toxicidade sem efeitos Rim baixa toxicidade ausência de efeitos tóxicos sem efeitos sem efeitos Fonte: SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI (2011). 17 8 USO CLÍNICO E ESPECIALIDADES FARMACÊUTICAS O emprego dos anestésicos inalatórios em medicina veterinária é plenamente justificável pelas características que possuem e, sobretudo, pela qualidade da anestesia que promovem (SOARES, 2015). Em anestesia inalatória, a preocupação com a duração da cirurgia não existe; a adequação do plano de anestesia é muito mais fácil do que quando se utilizam apenas anestésicos injetáveis (YOUNG; APFELBAUM, 2000). Atualmente, na realização de determinados procedimentos cirúrgicos, principalmente aqueles em que não há previsão da duração da cirurgia, torna-se fundamental a utilização da anestesia inalatória. O halotano, devido ao seu baixo custo em comparação aos outros agentes, foi, durante muitos anos, o anestésico volátil mais utilizado na medicina veterinária, entretanto, esta situação esta se modificando e, a cada dia, o emprego do isofluorano está aumentando gradativamente (BRAZ, 2000). Apesar de o isofluorano estar em uso há mais de três décadas, a recente mudança de atitude deve-se a queda do custo deste anestésico, tornando-o mais acessível, e também, ao aumento do número de profissionais especialistas em anestesiologia (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). O halotano ainda é empregado amplamente em pequenos e grandes animais, sua utilização, no entanto, não é destituída de riscos, sendo a hipotensão o principal efeito adverso (GRAY, UTTING, NUNN, 1980). Em cavalos, a hipotensão está associada à ocorrência de miopatia pós-operatória e recuperação anestésica tardia (SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI, 2011). O isofluorano é o agente de eleição nos pacientes de alto risco, principalmente nos portadores de nefropatias ou hepatopatias; a indução e a recuperação da anestesia são particularmente rápidas com este agente. No quadro 5 estão citadas as vantagens e desvantagens de alguns anestésicos inalatórios mais empregados em medicina veterinária. 18 Quadro 5: Vantagens e desvantagens do uso de alguns anestésicos inalatórios. ANESTÉSICOVANTAGENS DESVANTAGENS Óxido nitroso rápida indução e recuperação; analgesia moderada baixa potência, uso associado a outros compostos; -anemia e leucopenia -distensão vísceras/cólica -hipoxemia Halotano potente; não irritante hipotensão; pode causar arritmias; risco de lesão hepática Isofluorano ausência de toxicidade hepática e renal; rápida indução e recuperação custo elevado Desfluorano tempo de indução semelhante ao do isofluorano; recuperação mais rápida; pouco metabolizado custo elevado Fonte: SPINOSA; GÓRNIAK; BERNARDI (2011). 19 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS É notório como os estudos relacionados ao uso dos anestésicos é algo bem antigo, isso porque é de extrema importância saber a composição química, a farmacocinética, as reações obtidas pelos pacientes, assim como, quem pode ser induzido a anestesia geral usando tais fármacos. Dessa forma, hoje sabemos que os anestésicos inalatórios são obtidos por meio da absorção de um princípio ativo através das vias respiratórias, fazendo com que ocorra a anestesia geral. Assim, a mesma é dividida em quatro estágios, que vai da analgesia a paralisia respiratória, isso nos permite fazer todo o controle do uso do anestésico no momento do ato cirúrgico. Ademais, temos anestésicos inalatórios que são mais empregados na medicina veterinária, sendo eles: óxido nitroso, halotano, enfluorano e isofluorano, sendo mais usados devido as suas vantagens de potência analgésica, não irritante, rápida indução e recuperação, entre outras. Portanto, dentre os anestésicos gerais, o uso dos inalatórios é plenamente justificável, pois o mesmo permite uma qualidade de anestesia, a preocupação com a duração da cirurgia não existe e a adequação do plano anestésico é mais fácil. Porém, seu custo elevado ainda limita a sua ampla utilização. 20 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRAZ, J. R. C. Temas de anestesiologia. 2. ed. São Paulo: Unesp Artes Médicas, 2000. 316 p. GRAY, T. C., UTTING, J. E., NUNN, J. F. General anestesia. 4. ed. London: Butterwords, 1980. 1785 p. MUIR, W. M. et al. Manual de anestesia veterinária. 4. ed. Columbus: Elsevier, 2008. 643 p. NATALINI, C.C. Monitoração do paciente anestesiado. In: NATALINI, C.C. Teoria e técnicas em anestesiologia veterinária. Porto Alegre: Artmed, 2007. Cap.13, p.249-274. NUNES, N. Monitoração da anestesia. In: CORTOPASSI, S. R. G.; FANTONI, D. T. Anestesia em cães e gatos. 2. ed. São Paulo: Roca, 2009. 83-101 p. SOARES, A. V. Anestesiologia veterinária. 3. ed. Santa Maria: UFSM, 2015. 86 p. SPINOSA, H. de S.; GÓRNIAK, S. L.; BERNARDI, M. M. Farmacologia aplicada à Medicina Veterinária. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. 807 p. YOUNG, C. J., APFELBAUM, J. L. Pharmacology of outpatient anestesia in the year 2000. Acta Anaesthesiol. Scand., v.39, p.75-83, 1995.
Compartilhar