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Termodinaˆmica e F´ısica Estat´ıstica 2006/2 Monica Bahiana Departamento de F´ısica dos So´lidos Instituto de F´ısica Universidade Federal do Rio de Janeiro Conteu´do 1 Conceitos ba´sicos de termodinaˆmica 2 1.1 Macro × micro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2 1.2 Equil´ıbrio, extremos e escalas de tempo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 1.3 Varia´veis de estado, equac¸o˜es de estado e processos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 1.4 Paredes e reservato´rios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 1.5 Leis da Termodinaˆmica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.5.1 Lei Zero - Equil´ıbrio te´rmico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.5.2 Primeira Lei - Conservac¸a˜o de energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.5.3 Segunda Lei - Irreversibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 1.5.4 Teceira Lei - Sobre o zero absoluto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1.6 Limite termodinaˆmico e extensividade de energia e entropia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.7 Equac¸a˜o de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.8 Potenciais termodinaˆmicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.9 Func¸o˜es de resposta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1 Cap´ıtulo 1 Conceitos ba´sicos de termodinaˆmica Tendo sido desenvolvida primeiro, a mecaˆnica serviu como ponto de partida para a formulac¸a˜o da ter- modinaˆmica, que estendeu as poderosas te´cnicas de minimizac¸a˜o a sistemas sob efeito da temperatura. A estrutura matema´tica da termodinaˆmica e´ fascinante mas ter´ıamos que dedicar um semestre inteiro ao as- sunto para poder aprecia´-lo devidamente. Recomendo fortemente a refereˆncia [1] para quem se interessar por um estudo mais profundo. Seguindo uma tendeˆncia mais moderna, estaremos o tempo todo transitando entre a descric¸a˜o microsco´pica da f´ısica estat´ıstica e a macrosco´pica, da termodinaˆmica. Embora na˜o siga a sequ¨eˆncia histo´rica, a f´ısica estat´ıstica desenvolveu-se bem depois da termodinaˆmica, esta abordagem reflete melhor a maneira com que trabalha com o assunto atualmente. O objetivo deste cap´ıtulo e´ estabelecer e revisar elementos e ide´ias que usaremos na formulac¸a˜o ter- modinaˆmica, ale´m de desenvolver algumas das ferramentas ba´sicas que sera˜o usadas ao longo do per´ıodo. 1.1 Macro × micro A termodinaˆmica fornece uma descric¸a˜o macrosco´pica dos sistemas, quer dizer, as varia´veis usadas na sua formulac¸a˜o matema´tica sa˜o bem definidas apenas para sistemas cujo nu´mero de part´ıculas seja da ordem de 1023. Esses sistemas tambe´m apresentam variac¸o˜es temporais muito lentas quando comparadas aos tempos de variac¸a˜o das part´ıculas que os copo˜em. Assim, qualquer medida realizada em um sistema macrosco´pico necessariamente envolvera´ me´dias espaciais e temporais de grandezas microsco´picas. Desta forma estaremos substituindo uma enorme quantidade de informac¸o˜es (necessa´rias para a descric¸a˜o cada part´ıcula), por grandezas me´dias, reduzindo drasticamente o nu´mero de varia´veis utilizadas. Por exemplo, considere a observac¸a˜o de um recipiente contendo um determinado ga´s. Vamos supor que as mole´culas estejam separadas o suficiente para que seja razoa´vel desprezar a interac¸a˜o entre elas. A` temperatura ambiente essas mole´culas tem um movimento que combina translac¸a˜o do centro de massa e rotac¸a˜o em torno de diversos eixos de simetria molecular. Dentro do recipiente que conte´m o ga´s as mole´culas esta˜o constantemente colidindo umas com as outras e colidindo com as paredes do reservato´rio. Imagine que desejemos entender o comportamento desse ga´s pelo conhecimento da trajeto´ria das cerca de 1023 part´ıculas. Seja o caso mais simples, um ga´s monoatoˆmico sem energia cine´tica de rotac¸a˜o, neste caso precisar´ıamos de 6 varia´veis reais para cada part´ıcula, treˆs para definir a posic¸a˜o ~r e treˆs para a velocidade ~v. Enta˜o, apenas para armazenar a informac¸a˜o de um determinado estado do ga´s precisar´ıamos de cerca de 5×1018Mb! Supondo que temos essa quantidade de memo´ria dispon´ıvel, imagine quanto tempo levar´ıamos para calcular as trajeto´rias. O pior de tudo e´ que toda essa informac¸a˜o de nada serviria para o entendimento do comportamento macrosco´pico do ga´s. Por outro lado, se utilizamos a descric¸a˜o macrosco´pica da termodinaˆmica, estaremos trabalhando com 3 varia´veis independentes, por exemplo N (nu´mero de mole´culas), T (temperatura) e P (pressa˜o), tornando poss´ıvel o estudo do sistema. O papel da f´ısica estat´ısca e´ justamente possibilitar a passagem da descric¸a˜o microsco´pica para a ma- crosco´pica. A mecaˆnica quaˆntica e´ usada para calcular as energias das part´ıculas que formam o sistema, e postulados pro´prios permitem o ca´lculo de valores me´dios, que por sua vez obedecera˜o a`s leis da ter- modinaˆmica se a conexa˜o entre as duas descric¸o˜es for feita corretamente. Por hora estamos interessados apenas na visa˜o macrosco´pica, supondo que, de alguma forma, sabemos como definir as varia´veis necessa´rias para o entendimento do sistema em questa˜o. E´ importante lembrar que a termodinaˆmica foi formulada numa 2 CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 3 e´poca em que a visa˜o atomı´stica ainda na˜o existia, sendo uma descric¸a˜o genuinamente macrosco´pica. 1.2 Equil´ıbrio, extremos e escalas de tempo Todo curso de f´ısica te´rmica deve comec¸ar discutindo o conceito de equil´ıbrio, afinal o objetivo original da termodinaˆmica e da f´ısica estat´ıstica e´ a descric¸a˜o desse estado. Embora seja bastante simples definir o equil´ıbrio matematicamente, no mundo real este e´ um conceito bastante subjetivo, que so´ tem sentido quando vem associado a alguma escala de tempo definida pelas observac¸o˜es experimentais. Intuitivamente um estado de equil´ıbrio e´ algo imuta´vel, permanente, se deixado fora de influeˆncias externas. Na pra´tica tudo esta´ sempre mudando, o eterno simplesmente e´ algo que dura muito mais do que o tempo dispon´ıvel para as medidas que se desejam fazer. O equil´ıbrio na mecaˆnica A definic¸a˜o de equil´ıbrio na mecaˆnica esta´ relacionada a` de energia potencial, Ep. Um movimento conserva- tivo, para o qual a energia total e´ constante no tempo, permite definir forc¸as a partir de variac¸o˜es de energia potencial [2]. Com isso uma forc¸a conservativa pode ser escrita como ~F = −∇Ep. (1.1) Imediatamente vemos que • A forc¸a se opo˜e a` variac¸a˜o de energia potencial. • Nos pontos de extremo de Ep as forc¸as sa˜o nulas. Os pontos de extremo sa˜o enta˜o pontos de equil´ıbrio, se preparado inicialmente num desses estados, o sistema permanece nele para sempre, ja´ que a forc¸a sobre ele sera´ nula. Vamos examinar melhor esta questa˜o, considerando um sistema muito simples, que e´ o oscilador harmoˆnico, descrito pela energia potencial Ep(x) = 1 2 ax2, (1.2) onde a e´ um paraˆmetro relacionado com a frequ¨eˆncia natural de oscilac¸a˜o e x, o deslocamento [3]. A figura 1.1 mostra a forma desse potencial. No ponto x = 0 temos Figura 1.1: Exemplo do potencial quadra´tico (1.2) com a = 2. Se a energia total do oscilador e´ E1, e inicialmente ele esta´ parado, o movimento estara´ limitado entre x1 e −x1. ~F = −xˆ dEp dx ∣∣∣∣ x=0 = 0, CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 4 assim, se inicialmente o corpo for colocado nessa posic¸a˜o, ele simplesmente ficara´ nela. Podemos tambe´m escolher uma condic¸a˜o inicial correspondendo a x = x1 > 0 e Ep = E1. Neste caso, de acordo com (1.1),atua sobre o corpo a forc¸a ~F = −xˆ dEp dx ∣∣∣∣ x=x1 = −xˆax1. Sendo uma forc¸a na direc¸a˜o de −xˆ que atua sobre o corpo, ela faz com que o mesmo se desloque em direc¸a˜o a x = 0. Dizemos que essa forc¸a e´ restauradora, porque ela tenta restaurar a posic¸a˜o de equil´ıbrio. Como ja´ sabemos, a auseˆncia de atrito faz com que o corpo mantenha um movimento oscilato´rio em torno de x = 0 sem nunca de fato parar nesse ponto. Vamos prosseguir com esse tipo de ana´lise, mas agora para um oscilador sujeito a um potencial um pouco diferente, contendo um termo qua´rtico da forma Ep(x) = 1 4 a4x4 + 1 2 a2x2 , a4 > 0 (1.3) cuja forma para a2 < 0 esta´ esboc¸ada na figura 1.2(b). Uma realizac¸a˜o de movimento sujeito a esta forma de potencial pode ser vista na figura 1.2(a). O sistema que evolui de acordo com esta energia potencial e´ conhecido como oscilador de Duffin invertido [4]. Quais sa˜o os pontos com F = 0? Sa˜o aqueles que satifazem a` condic¸a˜o de extremo, neste caso dada por x(a4x2 + a2) = 0. (1.4) Temos assim treˆs possibilidades x = 0, x = ± √ −a2 a4 . (1.5) A situac¸a˜o mostrada na figura 1.2 corresponde a a2 < 0, portanto leva a treˆs valores reais para x, ou treˆs pontos de equil´ıbrio xeq = 0, xeq = ± √ |a2| a4 . (1.6) Se tive´ssemos a2 > 0, o sistema teria apenas um ponto de equil´ıbrio, em x = 0 (Veja o problema ??). Figura 1.2: Exemplo de oscilac¸a˜o num potencial qua´rtico. (a) Uma laˆmina de ac¸o e´ montada de forma a ser atra´ıda por dois ı´ma˜s simetricamente posicionados. As oscilac¸o˜es podem ocorrer ao redor de uma ou outra posic¸a˜o de equil´ıbrio lateral. No ponto do centro, entre os ı´ma˜s, a forc¸a resultante horizontal e´ nula, mas o equil´ıbrio e´ insta´vel. (b) A forma da energia potencial correspondente a este oscilador, dada pela expressa˜o (1.3) com a4 = 4 e a2 = −4. Precisamos agora entender a diferenc¸a f´ısica entre os pontos de equil´ıbrio. Antes da ana´lise matema´tica, vamos realizar uma experieˆncia mental, em que preparamos o sistema representado na figura 1.2 para ficar inicialmente em uma de suas posic¸o˜es de equil´ıbrio. Certamente sera´ muito dif´ıcil prepara´-lo para ficar em x = 0, qualquer pequeno deslocamento lateral vai favorecer a atrac¸a˜o para um dos ı´ma˜s e levar a laˆmina CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 5 G x x 1 x 2 x 3 δG 23 δG 32 Figura 1.3: Perfil de energia livre para um sistema qualquer, descrito pela varia´vel x. Os pontos x1, x2 e x3 correspondem a equil´ıbrio esta´vel, do ponto de vista da mecaˆnica. Do ponto de vista da termodinaˆmica, x1 e x2 sa˜o pontos d eequil´ıbrio metaesta´vel. para aquele lado. Entretanto, nenhum esforc¸o e´ necessa´rio para colocar a laˆmina em suas posic¸o˜es de equil´ıbrio laterais, ela naturalmente ira´ para uma ou outra. Matematicamente essa situac¸a˜o e´ expressa pela concavidade de Ep em cada um dos pontos de extremo. A concavidade e´ dada pela segunda derivada, assim, para o potencial (1.3) temos d2Ep dx2 = 3a4x2 + a2. Assim, sendo a2 < 0, para xeq = 0 a concavidade e´ negativa e xeq e´ um ma´ximo. Para xeq 6= 0 a concavidade e´ positiva, e os pontos correspondem a mı´nimos. Desta forma, se podemos formalizar matematicamente um sistema a ponto de ter uma expressa˜o para sua energia potencial, podemos imediatamente encontrar e classificar seus pontos de equil´ıbrio: Equil´ıbrio esta´vel: dEp dx = 0 e d2Ep dx2 > 0. (1.7) Equil´ıbrio insta´vel: dEp dx = 0 e d2Ep dx2 < 0, (1.8) O papel da temperatura Na visa˜o da mecaˆnica o conhecimento de Ep faz com que, pelo menos em princ´ıpio, toda a dinaˆmica do sistema possa ser desvendada. De posse da expressa˜o matema´tica para Ep podemos encontrar todos os pontos de equil´ıbrio esta´vel e insta´vel, e saberemos como sera´ o comportamento do sistema seja qual for a condic¸a˜o inicial. Queremos estender essas ide´ias a` termodinaˆmica, definindo o equivalente a Ep para sistemas em que a temperatura tenha um papel importante. Veremos mais adiante que os potenciais termodinaˆmicos fara˜o o papel de energia potencial, e aprenderemos como calcula´-las, mas por enquanto vamos apenas afirmar que e´ poss´ıvel encontrar essa func¸a˜o do tipo energia, que chamaremos de G. Do ponto de vista da termodinaˆmica, a visa˜o do sistema escorregando sobre seu perfil de energia ate´ atingir um mı´nimo, deve ser incrementada pela agitac¸a˜o te´rmica. O sistema agora estara´ constantemente sofrendo variac¸o˜es de energia de forma aleato´ria. A amplitude me´dia dessas flutuac¸o˜es dependera´ da temperatura, quanto mais alta, maior a chance de ocorrer uma grande variac¸a˜o de energia. Essas flutuac¸o˜es tornara˜o necessa´ria uma distinc¸a˜o entre os pontos de equil´ıbrio esta´vel. Seja um sistema descrito pela energia mostrada na figura 1.2. Existem 3 pontos de equil´ıbrio esta´vel, sendo um correspondendo a um mı´nimo global (x3), e os outros a mı´nimos locais. Se o sistema esta´ inicialmente em x = x2, e sofre uma flutuac¸a˜o de energia δG23, ele consegue ultrapassar a barreira de energia que separa os mı´nimos, e relaxa para o estado de equil´ıbrio x = x3. Se ao contra´rio, o sistema esta´ inicialmente em CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 6 x = x3, uma flutuac¸a˜o que o leve para x = x2 deve ser da ordem de δG32. A lei de Arrhenius [5] diz que a probabilidade de uma dessas flutuac¸o˜es de energia ocorrer e´ dada por exp(δG/κBT ), onde T e´ a temperatura e κB a constante de Boltzmann. Na figura 1.2 temos δG32 � δG23, assim, a chance de ocorrer a transic¸a˜o 3 → 2 e´ muito menor do que a de ocorrer a 2 → 3. De uma forma geral, para sair do mı´nimo global sempre sera´ necessa´rio transpor uma barreira de energia maior, tornando o processo de sair do mı´nimo pouco prova´vel. Dependendo do tamanho da barreira entre os mı´nimos, pode ser que a energia te´rmica na˜o seja suficiente para promover a transic¸a˜o. Num sistema assim, o tempo de vida de um estado metaesta´vel pode ser bastante longo, sendo necessa´ria que uma quantidade de energia finita seja entregue (energia de ativac¸a˜o) ao sistema, ou que o perfil de energia seja modificado, em geral pela aplicac¸a˜o de um campo externo. Note que numa transic¸a˜o de um estado metaesta´vel para um esta´vel (como a 2 → 3), o resultado final e´ o de diminuir a energia ja´ que G(x23) > G(x32), mas primeiro o sistema deve receber energia para superar a barreira, assim o meio externo vai receber na˜o so´ a a diferenc¸a entre as energias finais, mas tambe´m a energia de ativac¸a˜o. Em resumo, do ponto de vista da termodinaˆmica, definimos treˆs tipos de equil´ıbrio: esta´vel, metaesta´vel e insta´vel. Dizemos que um sistema esta´ num ponto de equil´ıbrio esta´vel (na pra´tica dizemos simplesmente que o sistema esta´ no equil´ıbrio) quando, se deixado como esta´ permanece para sempre nesse estado, e se e´ perturbado, volta a` situac¸a˜o inicial. O equil´ıbrio metaesta´vel e´ semelhante ao esta´vel para perturbac¸o˜es menores que um dado tamanho. Ele pode ser modificado por uma perturbac¸a˜o finita, e se observado durante um tempo longo o suficiente, decai para outro estado metaeste´vel ou esta´vel. No equil´ıbrio insta´vel, qualquer perturbac¸a˜o infinitesimal leva o sistema para outro ponto de equil´ıbrio que pode ser esta´vel ou metaesta´vel. A termodinaˆmica que estudaremos aqui refere-se aos estados de equil´ıbrio esta´vel e metaesta´vel, na sua formulac¸a˜o original. O equil´ıbrio insta´vel esta´ longe de ser algo sem importaˆncia, ele e´ responsa´vel pela evoluc¸a˜o temporal dos sistemas [6]. Embora ainda na˜o existam formulac¸o˜es para a termodinaˆmica dos sistemas fora do equil´ıbrio, no mesmo pe´ de igualdade com a dos sistemas em equil´ıbrio (na˜o existem princ´ıpios de minimizac¸a˜o que determinem como sera´ a evoluc¸a˜o de um determinado sistema), este e´ o principal interesseda f´ısica te´rmica atual. Daqui pra frente, usaremos o termo equil´ıbrio, ou equil´ıbrio termodinaˆmico, para refereˆncia ao estado de equil´ıbrio esta´vel que corresponde ao mı´nimo global. 1.3 Varia´veis de estado, equac¸o˜es de estado e processos Como discutido ate´ agora, buscamos uma descric¸a˜o macrosco´pica de um sistema no equil´ıbrio termodinaˆmico. Este estado deve ser homogeˆneo em termos de densidade, temperatura, pressa˜o, concentrac¸a˜o de constituintes etc. Na˜o-uniformidades geram forc¸as internas que causam evoluc¸a˜o temporal, o que na˜o e´ poss´ıvel se o sistema esta´ em equil´ıbrio. Veremos mais sobre isso no estudo dos processos de transporte, no cap´ıtulo ??. As varia´veis usadas para caracterizar o sistema dependem apenas do estado do mesmo, e na˜o de como chegamos a ele, por isso mesmo sa˜o chamadas varia´veis de estado. Ale´m das varia´veis de estado o´bvias, como pressa˜o, volume, entropia e temperatura, temos todas as func¸o˜es de resposta (ex: calor espec´ıfico, compressibilidade, coeficiente de dilatac¸a˜o etc) ale´m de todas os potenciais termodinaˆmicos. Seja F uma func¸a˜o que depende de varia´veis de estado ηi. Temos que dF = ∑ i ( ∂F ∂ηi ) dηi se F e suas varia´veis sa˜o cont´ınuas, 1. ∫ B A dF = F (B)− F (A) ou seja, a integral so´ depende dos estados final e inicial. 2. ∮ dF = 0 3. Se conhecemos apenas dF , enta˜o F fica definida a menos de uma constante. CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 7 A equac¸a˜o de estado e´ uma func¸a˜o que relaciona as varia´veis de estado do sistema. O exemplo mais simples e´ a equac¸a˜o dos gases ideais cla´ssicos, que relaciona pressa˜o (P ), volume (V ), temperatura (T ) e nu´mero de part´ıculas (N) como PV = NκBT. (1.9) Chamamos de processo, o caminho percorrido pelo sistema no espac¸o definido pelas suas varia´veis de estado. Por exemplo, se estudamos um ga´s, podemos acompanhar os valores de pressa˜o e volume, como na Fig 1.4. O valor da temperatura, em cada ponto, pode ser calculado pela equac¸a˜o de estado. V P A B Figura 1.4: O diagrama PV mostra dois estados A e B, para um ga´s dentro de um cilindro provido de eˆmbolo. O fundo do cilindro pode ser isolado ou posto em contacto te´rmico com um reservato´rio. A linha cont´ınua entre os estados representa um processo quasi-esta´tico hipote´tico, ao longo do qual os valores de P e V sa˜o bem definidos e conhecidos. O conjunto de pontos corresponde um processo real entre A e B. Neste caso primeiro a pressa˜o foi mantida constante e o volume foi variado em passos finitos. Depois o sistema foi evacuado e de novo o volume foi aumentado descontinuamente a pressa˜o constante. Cada variac¸a˜o de volume gera regio˜es de baixa pressa˜o imediatamente atra´s do eˆmbolo, o que cria correntes no ga´s. A medida da pressa˜o deve ser feita apo´s um certo tempo de estabilizac¸a˜o. A turbuleˆncia, um fenoˆmeno tipicamente dissipativo, e´ a responsa´vel pelo aumento da entropia a cada variac¸a˜o de volume. O resultado e´ que nada se conhece sobre o sistema entre os pontos indicados. O sistema desaparece em um ponto e surge no outro, do ponto de vista da termodinaˆmica. Matematicamente isso faz com que as derivadas fiquem mal definidas ao longo do processo, o que impede o uso da formulac¸a˜o matema´tica da termodinaˆmica. Para tornar o processo real mais pro´ximo do correspondente ideal, as variac¸o˜es de volume devem ser bem menores, no caso limite de variac¸o˜es infinitesimais, o processo torna-se quasi-esta´tico. E´ importante ressaltar que, ao desenharmos uma linha cont´ınua num espac¸o definido por varia´veis de estado, estamos dizendo que os valores dessas varia´veis sa˜o bem definidos ao longo de toda a linha. Isso significa que o sistema manteve-se homogeˆneo, sem qualquer tipo de gradiente durante todo o tempo, e que a evoluc¸a˜o temporal se deu como uma sequ¨eˆncia de processos infinitesimais e quasi-esta´ticos, que podem ser revertidos. Todos os processos que ocorrem de forma espontaˆnea fogem a essas especificac¸o˜es, e sa˜o irrevers´ıveis. Um processo irrevers´ıvel na˜o pode ser representado graficamente porque as varia´veis de estado na˜o sa˜o bem definidas a cada momento. Na pra´tica todos os processos sa˜o irrevers´ıveis, mas para que possamos formular alguma teoria matema´tica, torna-se necessa´ria a idealizac¸a˜o de um processo revers´ıvel. Ao contra´rio das grandezas descritas pelas varia´veis de estado, calor e trabalho sa˜o grandezas que so´ podem ser definidas com relac¸a˜o a um processo, nunca a um estado, ja´ que se referem a energia sendo trocada. Por exemplo, devemos dizer que Q foi o calor trocado pelo sistema ao realizar uma expansa˜o desde V1 a V2 isotermicamente, ou isobaricamente etc. Para diferenciar uma pequena quantidade de calor trocado ou de trabalho realizado, da diferencial exata, costuma-se usar um s´ımbolo diferente como d′W . A estrutura matema´tica da termodinaˆmica esta´ baseada na existeˆncia de varia´veis de estado intensivas e extensivas. As varia´veis intensivas, que sera˜o chamadas genericamente de Y , na˜o dependem do tamanho do sistema. Um exemplo simples e´ a pressa˜o. Se temos um ga´s com N mole´culas, a uma dada temperatura, dentro de um recipiente com volume V , teremos um certo valor para a sua pressa˜o. Se dividimos ao meio CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 8 o sistema, ou seja, se confinamos N/2 mole´culas em um volume V/2, a pressa˜o sera´ a mesma. Alia´s a temperatura, que tambe´m e´ intensiva, permanecera´ tambe´m inalterada. Por outro lado, V e N sa˜o varia´veis extensivas, que sa˜o proporcionais ao tamanho do sistema. As varia´veis extensivas sera˜o simbolizadas pela letraX . O tempo todos teremos pares de varia´veis termodinamicamente conjugadas, do tipo XY e o trabalho revers´ıvel associado a elas sera´ sempre da forma −Y dX (ou Y dX , dependendo da convenc¸a˜o de sinal que sera´ discutida na sec¸a˜o 1.5.2. Assim, o produto XY tera´ sempre dimensa˜o de energia. Alguns outros exemplos sa˜o: extensivas: V (volume), A (a´rea), L (comprimento), ~m (momento magne´tico), S (entropia), N (nu´mero de part´ıculas) intensivas associadas: −P (-pressa˜o), σ (tensa˜o superficial), J (forc¸a), ~B (campo magne´tico), T (tem- peratura), µ (potencial qu´ımico) A definic¸a˜o de X e Y deve ser tal que dY/dX seja sempre uma quantidade positiva, por isso a varia´vel intensiva associada ao volume V e´ Y = −P . De um modo geral, todo sistema sera´ descrito por um conjunto de pares XY . Os pares TS e µN esta˜o sempre presentes, e costumamos escreveˆ-los explicitamente. Os outros pares dependera`o de especifidades dos sistemas. 1.4 Paredes e reservato´rios Sempre sera´ necessa´rio especificar o tipo de parede que separa o sistema e o meio que o circunda. Essas paredes podem permitir a troca de calor, de trabalho, ou de part´ıculas, inclusive podemos ter paredes que permitem a passagem de um tipo de part´ıcula e na˜o de outro. O sistema pode ser limitado por va´rios tipos de parede ao mesmo tempo. Por exemplo podemos ter um ga´s contido em um cilindro de paredes fixas e isolantes, que na˜o permitem passagem de part´ıculas, neste caso ter´ıamos um sistema fechado. Ou, podemos substituir uma das paredes por um eˆmbolo, tambe´m isolante. Neste caso, uma das paredes (o eˆmbolo) permite que o sistema (o ga´s) se expanda ou contraia, trocando energia mecaˆnica (ou seja, realizando trabalho), com o meio, e dizemos que o sistema tem acoplamento mecaˆnico com o meio. Podemos substituir o fundo do cilindro por um feito de um material com boa condutividade te´rmica, nesse caso, ter´ıamos uma que parede diate´rmica, permite troca de calor, e o sistema teria acoplamento te´rmico com o meio. Finalmente podemos furar uma das paredes, permitindo que mole´culas do ga´s dentro do sistema saiam, ou que mole´culas externas entrem. Nesse caso, temos acoplamento difusivo com o meio.Toda a vez que a parede que limita o sistema permite alguma troca com o meio, a troca se dara´ de forma a manter o sistema e o meio com o mesmo valor da varia´vel intensiva relativa a` troca. Por exemplo, se o ga´s esta´ num cilindro isolante com um eˆmbolo, o que determina a posic¸a˜o de equil´ıbrio do eˆmbolo, especificando o volume do sistema, e´ o equil´ıbrio entre as presso˜es interna e externa. No caso do acoplamento te´rmico, a entropia do sistema varia de modo a` que a temperatura do sistema seja igualada com a do meio. Essa ide´ia de troca com o meio traz a necessidade da definic¸a˜o de reservato´rio. Um reservato´rio e´ um sistema descrito por uma varia´vel intensiva que permanece constante, mesmo quanto o contato e´ estabelecido com o sistema. No nosso exemplo, se o ga´s esta´ no cilindro com o eˆmbolo isolante, em contato com a atmosfera, a expansa˜o ou contrac¸a˜o do ga´s na˜o afeta a pressa˜o atmosfe´rica, sendo a atmosfera um reservato´rio com pressa˜o fixa. Um copo com a´gua fervendo, se colocado em cima de uma mesa, esfriara´ ate´ que a a´gua chegue a` temperatura ambiente. A temperatura da sala na˜o e´ afetada pela troca de calor, e o ar da sala funciona como um reservato´rio te´rmico. Na pra´tica, os reservato´rios sera˜o sistemas muito maiores que o que queremos estudar (como nos exemplos citados), ou que sa˜o reajustados de forma a manter o valor da varia´vel intensiva. Um exemplo desse segundo caso e´ um forno provido de um termostato, ou uma caˆmara pressurizada. Para todos os efeitos, na˜o daremos muita importaˆncia a` forma com que a varia´vel intensiva e´ mantida constante no reservato´rio. Mais uma vez devemos lembrar que a discussa˜o acima envolve o conceito de equil´ıbrio, portanto, nos remete a` necessidade de definic¸a˜o de escala de tempo. Por exemplo, na˜o ha´ material que seja um perfeito isolante te´rmico, mas sim materiais com baixa condutividade te´rmica, de forma a tornar poss´ıvel se dizer que o sistema esteja isolado te´rmicamente, contanto que a nossa observac¸a˜o seja curta o suficiente para que possamos desprezar a troca de calor pelas paredes. CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 9 1.5 Leis da Termodinaˆmica 1.5.1 Lei Zero - Equil´ıbrio te´rmico Um sistema macrosco´pico esta´ isolado se na˜o tem qualquer interac¸a˜o com sua vizinhanc¸a. Se um sistema isolado na˜o for perturbado por um longo tempo, ele deve chegar ao estado de equil´ıbrio. Na verdade essa afirmativa e´ uma parte da Lei Zero, ela garante que o estado de equil´ıbrio existe. Se dois sistemas A e B esta˜o em contacto te´rmico, e esta˜o em equil´ıbrio como um sitema composto, enta˜o A e B esta˜o em equil´ıbrio individualmente. Tambe´m, se sistemas A e B esta˜o em equil´ıbrio, e o mesmo ocorre para os sistemas B e C, enta˜o A e C esta˜o em equil´ıbrio. Esta segunda afirmativa implica na existeˆncia de uma grandeza escalar, chamada empiricamente de temperatura, que assume o mesmo valor para todos os sistemas que estiverem em equil´ıbrio atrave´s de contato te´rmico. 1.5.2 Primeira Lei - Conservac¸a˜o de energia O princ´ıpio da conservac¸a˜o de energia parece o´bvio e natural, mas na˜o foi sempre assim. Ele foi reconhecido por Leibniz em 1693, aplicado especificamente a`s energias cine´tica e gravitacional. Nos se´culos seguintes, a` medida que outras formas de energia eram identificadas, o princ´ıpio foi sendo estendido a elas. A inclusa˜o do calor, como uma forma de transfereˆncia de energia, seguiu um caminho tortuoso entre 1800 e 1850, quando Joule esclareceu a equivaleˆncia entre trabalho mecaˆnico e energia te´rmica com sua famosa experieˆncia [3]. A primeira lei da termodinaˆmica pode ser considerada como a definic¸a˜o de calor, que e´ o que sobra quando se faz a contabilidade entre variac¸a˜o de energia e trabalho realizado em sistemas com dissipac¸a˜o de energia. Na mecaˆnica, partindo da equac¸a˜o (1.1) temos ~F · d~`= −(∇Ep) · d~` → dW = − dEp , ou dEp = −dW (1.10) onde d~` e´ o vetor deslocamento infinitesimal, ao longo de uma dada trajeto´ria. Assim, num sistema conser- vativo, a realizac¸a˜o de trabalho leva a` variac¸a˜o da energia potencial, ou vice-versa. O que acontece se forc¸as dissipativas esta˜o presentes? A variac¸a˜o de energia potencial pode ser transformada apenas parcialmente em trabalho, o resto da energia vira calor de alguma forma. Vamos reescrever (1.10) incluindo essa possibili- dade. Tambe´m, passamos a usar o s´ımbolo U para a energia, que daqui para a frente sera´ chamada energia interna. A conservac¸a˜o pode ser escrita como dU = d′Q− d′W. (1.11) Algumas explicac¸o˜es tornam-se necessa´rias. Os s´ımbolo d′ significa que estamos nos referindo a uma pequena quantidade da grandeza em questa˜o, e na˜o a` sua diferencial. Por exemplo, na˜o podemos integrar d′Q para encontrar a func¸a˜o Q. Em outras palavras, d′Q e d′W sa˜o diferenciais inexatas, a quantidade de calor trocado, ou de trabalho realizado, para passar de um determinado estado a outro, depende do processo realizado. Outro ponto e´ a convenc¸a˜o de sinal. Na forma como esta´ escrita a primeira lei, na equac¸a˜o (1.11), temos que d′W e´ o trabalho realizado pelo sistema. Assim, • d′Q > 0 → o sistema recebe calor (a energia interna aumenta) • d′Q < 0 → o sistema cede calor (a energia interna diminui) • d′W > 0 → o sistema realiza trabalho (a energia interna diminui) • d′W < 0 → o meio realiza trabalho sobre o sistema (a energia interna aumenta) Muitos livros usam d′W para designar o trabalho realizado sobre o sistema. Nesse caso, se d′W > 0 a energia interna deve aumentar, ja´ que o meio esta´ entregando energia, na forma de trabalho, ao sistema. Com essa convenc¸a˜o a primeira lei fica escrita como dU = d′Q+ d′W . E´ importante escolher uma das convenc¸o˜es e usa´-la consistentemente. Ale´m de trocar calor e trabalho com o meio, um sistema pode tambe´m trocar part´ıculas. Vamos adiantar essa possibilidade definindo a varia´vel intensiva µ, chamada potencial qu´ımico. Veremos mais sobre este assunto adiante, por hora precisamos ter em mente que o fluxo de part´ıculas sera´ determinado pelos valores CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 10 de µ, as part´ıculas sempre va˜o para onde µ for menor. Como U e´ a energia total do sistema, ela aumenta se o nu´mero de part´ıculas N aumenta. Incluindo essa contribuic¸a˜o temos dU = d′Q− d′W + µdN. (1.12) A convenc¸a˜o de sinal e´ • dN > 0 quando o sistema recebe part´ıculas (a energia interna aumenta) • dN < 0 quando o sistema cede part´ıculas (a energia interna diminui) Finalmente podemos usar (1.11) ou (1.12) como uma definic¸a˜o para d′Q. Por exemplo, se N e´ constante, d′Q = dU + d′W, (1.13) ou seja, o calor trocado e´ a variac¸a˜o de energia interna, descontando o que foi usado para realizar trabalho. 1.5.3 Segunda Lei - Irreversibilidade A segunda lei e´ a mais poleˆmica, por estabeler uma diferenc¸a fundamental entre mecaˆnica e termodinaˆmica, o sentido no eixo do tempo. A equac¸o˜es que regem a mecaˆnica dos sistemas conservativos leva a processos que sempre podem ser revertidos, a troca de t por −t na˜o altera as equac¸o˜es de movimento. Na ter- modinaˆmica existe a possibilidade de um processo ser irrevers´ıvel, e e´ justamente a irreversibilidade dos processos espontaˆneos a principal ferramenta de trabalho. Quando enunciada no contexto das ma´quinas te´rmicas [3], a Segunda Lei tem duas formas: Enunciado de Clausius - Na˜o pode existir um processo cujo u´nico resultado seja a transformac¸a˜o de calor em trabalho, ou, na˜o existe o motor perfeito. Enunciado de Kelvin - Calor na˜o pode fluir espontaneamente do corpo mais frio para o mais quente, ou, na˜o existe o refrigerador perfeito. A segunda lei pode ser enunciada matematicamente com a definic¸a˜o da varia´vel extensiva entropia, usualmente representada por S. O calor trocado reversivelmente, entre dois corpos a` temperatura T, pode ser escrito como d′QR = TdS. (1.14) A desigualdade de Clausius diz que, para um processo qualquer, dS ≥ d′QR T , (1.15) sendo a igualdade para processos revers´ıveis. Para sistemas fechados (ja´ que d′QR = 0) dS ≥ 0 . (1.16) Consequ¨eˆncia: num sistema fechado, qualquer processo espontaˆneo faz com que a entropia aumente, logo, o estado de equil´ıbrio para um sistema fechado deve ser aquele para o qual a entropia e´ ma´xima. Variac¸a˜o intr´ınseca de entropia E expressa˜ (1.14) define a variac¸a˜o revers´ıvel de entropia, aqueka que vem da troca de calor isote´rmica com o meio externo. Num processo irrevers´ıvel qualquer a entropia aumenta por outras razo˜es, por exemplo formac¸a˜o de turbuleˆncia em gases que sofrem variac¸o˜es de pressa˜o muito ra´pidas. Dizemos que esta e´ essa contribuic¸a˜o intr´ınseca ao sistema. A variac¸a˜o dessa entropia fica enta˜o definida como ∆Si = ∆S − Q T . (1.17) A Segunda Lei pode enta˜o ser reescrita como ∆Si ≥ 0. (1.18) CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 11 Exemplo 1.1 Um litro de a´gua a 100oC e´ jogado numa piscina. Qual a variac¸a˜o de entropia dessa massa de a´gua, da piscina e do universo? Claramente a a´gua, inicialmente a Ti = 100oC, vai esfriar de forma espontaˆnea e irrevers´ıvel. Para calcular a sua variac¸a˜o de entropia imaginamos um processo revers´ıvel em que tenhamos os mesmos estados inicial e final. Podemos fazer isso porque S e´ uma varia´vel de estado, enta˜o, ∆S = Sf −Si, independente do processo que leva o sistema do estado i ao f . Podemos considerar que a a´gua da piscina na˜o tem sua temperatura alterada, afinal uma piscina pequena tem cerca de 20000 litros de a´gua, assim, a temperatura final da a´gua quente sera´ Tf que e´ a pro´pria temperatura da a´gua piscina. Esse processo pode ser o seguinte: colocamos o litro de a´gua em contato com um reservato´rio te´rmico a temperatura Ti, e muito lentamente aumentamos a temperatura do reservato´rio ate´ que chegue a Tf . Cada vez que o litro de a´gua se equilibra com o reservato´rio, ele recebe uma quantidade infinitesimal de calor d′Q = mcdT . Assim, para a a´gua quente ∆Saq = ∫ f i d′Q T = mc ∫ Tf Ti dT T = mc ln ( Tf Ti ) < 0. Esse processo imaginado e´ revers´ıvel, e deve levar a uma variac¸a˜o de entropia nula para o universo. De fato, cada vez que o litro de a´qua recebe d′Q, o reservato´rio libera d′Q, e a troca e´ feito na mesma temperatura do litro de a´gua. No resfriamento irrevers´ıvel em contato a piscina, a troca de calor se da´ a temperaturas diferentes, o litro de a´gua resfria, enquanto que a piscina se mante´m a` mesma temperatura. A troca de calor entre sistemas a temperaturas diferentes e´ sempre irrevers´ıvel. Para a piscina temos enta˜o ∆Sp = − Qaq Tf = −mc(Tf − Ti) Tf > 0. O universo e´ composto por todas as partes que trocam calor, no caso o litro de a´gua e a piscina, assim ∆Su = ∆Saq +∆Sp = mc ln ( Tf Ti ) − mc(Tf − Ti) Tf . Sejam Tf = 300K, c = 1cal/g.K, como m = 1kg e Ti = 373K, ∆Su = 103 ln ( 300 373 ) + 103 73 300 = 25 cal/K. Primeira e Segunda Leis combinadas Se o processo em considerac¸a˜o e´ revers´ıvel, podemos escrever d′Q = TdS e d′W = −Y dX, (1.19) A expressa˜o final para a Primeira Lei para processos revers´ıveis fica dU = TdS + Y dX + µdN. → (1.20) A expressa˜o (1.20) e´ independente da convenc¸a˜o de sinal adotada para d′W . Podemos agora combinar Segunda e Primeira Leis, substituindo d′Q pela forma da desigualdade de Clausius, ou seja, d′Q ≤ TdS. d′Q = dU − Y dX − µdN ≤ TdS ⇒ dU ≤ TdS + Y dX + µdN (1.21) Desta forma, vemos que num processo espontaˆneo a volume (ou outra varia´vel extensiva) e entropia con- stantes, dU ≤ 0, ou seja, o sistema evolui de forma a minimizar a sua energia interna. 1.5.4 Teceira Lei - Sobre o zero absoluto Esta lei tambe´m tem va´rios enunciados. CAPI´TULO 1. CONCEITOS BA´SICOS DE TERMODINAˆMICA 12 1. A entropia tende a um valor constante (=0) para sistemas cristalinos puros) quando T → 0. 2. A diferenc¸a de entropia entre sistemas em equil´ıbrio te´rmico se anula quando T → 0. Esse e´ o primeiro enunciado, devido a Nernst. 3. E´ imposs´ıvel atingir o zero absoluto com um nu´mero finito de processos. Vemos assim que a entropia tem um zero bem definido, ou seja, o seu valor absoluto e´ relevante, diferente da energia interna e dos outros potenciais termodinaˆmicos. Bibliografia [1] H. B. Callen. Thermodynamics and an Introduction to Thermostatistics. John Wiley & Sons, 1985. [2] H. Moyse´s Nussenzveig. Curso de Fı´sica Ba´sica 1 - Mecaˆnica. Edgard Blu¨cher, 1983. [3] H. Moyse´s Nussenzveig. Curso de Fı´sica Ba´sica 2 - Flu´ıdos, Oscilac¸o˜es e Ondas, Calor. Edgard Blu¨cher, 2002. [4] E. A. Jackson. Perspectives of nonlinear dynamics, volume 1. Cambridge, 1989. [5] O cientista sueco Svante Arrhenius (1859-1927), ganhou o preˆmio Nobel em 1903 pela teoria da dissociac¸a˜o dos eletro´litos. Entre outras coisas ele estudou a dependeˆncia da taxa de reac¸a˜o em func¸a˜o da temperatura e propos a lei fenomenolo´gia que atualmente leva o seu nome. Sua formulac¸a˜o original foi em func¸a˜o da energia de ativac¸a˜o, ou energia necessa´ria para iniciar um reac¸a˜o qu´ımica. [6] P. Collet and J. P. Eckmann. Instabilities and Fronts in Extended Systems. Princeton University, 1990. [7] C. Tsallis. Possible generalization of Boltzmann-Gibbs statistics. J. Stat. Phys., 52:479, 1988. 20