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Noções preliminares de Cristologia

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INTRODUÇÃO À TEOLOGIA II 
 
1º MÓDULO 
NOÇÕES BÁSICAS DE CRISTOLOGIA 
Pe. Adenilson S. Ferreira 
Apostila Ad usum scholarum 
1
o
. Semestre/2015
 
 
NOÇÕES BÁSICAS DE CRISTOLOGIA 
 
 
1. NOÇÕES PRELIMINARES 
 
 
Abre-se o presente curso com um estudo elementar de “Cristologia”. A referida 
disciplina compõe o vasto universo da Teologia. A partir da etimologia, é possível depreender 
que esta seja o “estudo ou o discurso (lógos) sobre Jesus Cristo”. 
Na verdade, a Cristologia é considerada o tratado central da Teologia cristã. 
Afinal de contas, Jesus Cristo é o revelador do Pai e do Espírito Santo, redentor da 
humanidade e modelo para o qual todos os homens são convidados a tender. 
A Teologia cristã é essencialmente cristocêntrica. Isso quer dizer que as diversas 
disciplinas da ciência teológica (eclesiologia, teologia Moral, escatologia, antropologia 
teológica, teologia fundamental, dogmática etc.) são diferentes partes de uma construção que 
busca sua unidade e coerência, seu sentido e sua chave hermenêutica na pessoa e no 
acontecimento de Jesus Cristo
1
. 
 
 
2. A FÉ CRISTÃ 
 
 
Etimologicamente, o nome “Jesus” significa “Javé Salva”. Trata-se de uma 
adaptação para o português de um nome hebraico que aparece na Bíblia em duas formas: 
Yehoshua e Yeshua. No caso, Yeshua é uma forma abreviada do nome Yehoshua. Por sua vez, 
nas línguas europeias, o nome “Jesus” deriva do grego Iesous.2 
Atualmente, sob o ponto de vista histórico, pode-se dizer tranquilamente que 
Jesus foi um judeu do século I. Porém, chamá-lo de “Cristo” é um pouco mais delicado, pois, 
nem todos podem ou querem dizer que Jesus é o Cristo
3
. Na verdade, essa afirmação traz no 
seu bojo o núcleo mais íntimo da fé cristã, ou seja, aquilo que, desde o tempo dos apóstolos, a 
Igreja tem proclamado. 
No dia de Pentecostes, quando Pedro se levantou com os onze para dirigir aos 
judeus a mensagem considerada como a primeira pregação cristã, o ponto alto de suas 
palavras foi: “Que toda a casa de Israel saiba com certeza: a esse Jesus que vós crucificastes, 
 
1
 DUPUIS, Jacques. Introdução à Cristologia. São Paulo: Loyola, 1999, p. 9. 
2
 Cf. PAGOLA, José Antônio. Jesus: aproximação histórica. Petrópolis: Vozes, 2010, p. 29. 
3
 Cf. LOEWE, William P. Introdução à Cristologia. São Paulo: Paulus, 2000, p. 7. 
2 
 
Deus o fez Senhor e Cristo” (At 2,36). 
Dessa forma, nasceu a confissão de fé “Jesus é o Cristo” que só mais tarde 
evoluiria, semanticamente, para o nome composto “Jesus Cristo”. Parte-se de uma confissão 
de fé da Igreja Primitiva que consiste em atribuir ao homem Jesus um título particular 
emprestado à terminologia do Antigo Testamento: Masiah. Esse termo foi traduzido para o 
grego Chistós e, em português, significa “ungido”. Com ele, a Igreja apostólica reconheceu e 
anunciou Jesus como salvador universal
4
. 
Portanto, chamar Jesus de Cristo, para os cristãos, significa dizer que ele é muito 
mais do que o fundador de sua religião. Significa aceitar aquilo que o anjo anunciou aos 
pastores sobre o seu nascimento: “nasceu-vos hoje um Salvador, que é Cristo-Senhor, na 
cidade de Davi” (Lc 2,11). Significa também aderir à profissão de fé que Jesus havia aceitado 
de Pedro: “Tu és o Cristo” (Mc 8,29) ou “Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo” (Mt 16,16). 
Simão Pedro, além de chamar Jesus de “Cristo”, chama-o também “Senhor” e o “Filho de 
Deus”. 
Note-se que ao lado do título “Cristo”, mais dois títulos aparecem e ajudam a 
entender o núcleo central da fé cristológica. Evidenciam claramente o lugar central que essa 
confissão ocupou, desde o início, na fé da Igreja cristã.
5
 O Catecismo da Igreja Católica 
explica o sentido deles ao tratar da Profissão de fé cristã: 
 
Filho de Deus, no Antigo Testamento, é um título dado aos anjos, ao povo 
da Eleição, aos filhos de Israel e a seus reis. Significa então uma filiação 
adotiva que estabelece entre Deus e sua criatura relações de uma intimidade 
especial. Quando o Rei-Messias prometido é chamado “filho de Deus” isso 
não implica necessariamente, segundo o sentido literal desses textos, que ele 
ultrapasse o nível humano. Os que designaram Jesus como Messias de Israel 
talvez não tenham tido a intenção de dizer mais do que isto. Não acontece o 
mesmo com Pedro, quando confessa Jesus como “o Cristo, o Filho do Deus 
vivo”, pois este lhe responde com solenidade: “Não foi a carne e o sangue 
que te revelaram isso, e sim meu Pai que está nos Céus” (Mt 16,17).6 
Se Pedro pôde reconhecer o caráter transcendente da filiação divina de Jesus 
Messias foi porque este o deu a entender claramente. Diante do Sinédrio, à 
pergunta de seus acusadores: “Tu és o Filho de Deus?”, Jesus respondeu: 
“Vós dizeis que eu sou” (Lc 22,70). Já bem antes, Ele se designara como “o 
Filho” conhece o Pai e que é diferente dos “servos” que Deus enviou 
anteriormente a seu povo, superior aos próprios anjos. Distinguiu sua 
filiação daquela de seus discípulos, não dizendo nunca “nosso Pai”, a não ser 
para ordenar-lhes: “Portanto, orai desta maneira: Pai Nosso” (Mt 6,9); e 
sublinhou este distinção: “Meu Pai e vosso Pai” (Jo 20,17).7 
 
4
 Cf. DUPUIS, J. Introdução, op. cit., p. 8-9. 
5
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 8. 
6
 Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000, p. 125, n. 441. 
7
 Ibidem, n. 443. 
3 
 
E ainda: 
 
Na versão grega dos livros do Antigo Testamento, o nome inefável com o 
qual Deus se revelou a Moisés, Iahweh, é traduzido por “Kyrios” [“Senhor”]. 
Senhor torna-se desde então o nome mais habitual para designar a própria 
divindade do Deus de Israel. É neste sentido forte que o Novo Testamento 
utiliza o título de “Senhor” para o Pai, e também – e aí está a novidade – 
para Jesus reconhecido assim como o próprio Deus. Jesus mesmo atribui-se 
de maneira velada este título quando discute com os fariseus sobre o sentido 
do Salmo 110 (cf. Mt 22,41-46), mas também de modo explícito dirigindo-se 
a seus apóstolos (cf. Jo 13,13). Ao longo de toda a sua vida pública, seus 
gestos de domínio sobre a natureza, sobre as doenças, sobre os demônios, 
sobre a morte e o pecado demonstravam sua soberania divina.
8
 
 
Portanto, a fé cristã, desde a Igreja Apostólica, reconhece a Jesus como Cristo, 
como o Filho de Deus encarnado para a salvação da humanidade. Isso quer dizer que, em 
Jesus Cristo, Deus assumiu a natureza humana sem deixar de ser Deus. Essa verdade da nossa 
fé católica foi reafirmada no Concílio de Calcedônia (451) com as seguintes palavras: “Ele se 
fez verdadeiramente homem permanecendo verdadeiro Deus. Jesus Cristo é verdadeiro Deus 
e verdadeiro homem”.9 
 
 
3 A VIDA DE JESUS CRISTO E SUA CREDIBILIDADE HISTÓRICA 
 
 
A pessoa, a vida, a obra, a paixão, a morte e a ressurreição de Jesus constituem a 
fonte, o centro e o fim de tudo o que o Cristianismo anuncia ao mundo. Se fosse eliminado o 
fato da encarnação do Filho de Deus na história para salvação da humanidade, seria eliminada 
a essência do cristianismo! O cristianismo é Cristo! 
Mas, o que se pode saber sobre a vida histórica de Jesus Cristo? Em princípio, os 
cristãos não precisam recorrer à investigação histórica. Pela fé, conhecem o mistério de 
Cristo. Porém, como em Jesus Cristo confessam o Filho de Deus encarnado na história, seria 
um grande contrassenso não usar dos meios que estejam ao alcance para conhecer melhor sua 
dimensão histórica e sua vida humana concreta
10
. 
Sobre ele existe especialmente o testemunho dos evangelhos, mas também algum 
conhecimento seu em fontes não cristãs. Existem vários testemunhos extrabíblicosque, desde 
o ponto de vista histórico, descrevem a Jesus de Nazaré de quem os Evangelhos falam. Trata-
 
8
 Ibidem, n. 446-447. 
9
 Ibidem, n. 464. 
10
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 13-14. 
4 
 
se de escritores romanos, de personagens famosos do mundo judeu, como também achados 
arqueológicos que confirmam situações descritas nos evangelhos. 
 
3.1 Fontes pagãs (escritores romanos) 
 
Entre as fontes pagãs, no que se refere a Jesus de Nazaré, aparecem referências 
nos escritos de quatro personalidades romanas: o escritor Suetônio (por volta de 120); o 
historiador Tácito (50-120); o legado do imperador Trajano na Bitínia, Plínio o Jovem (61-
120); e, finalmente, o imperador Adriano
11
. 
Por um lado, admite-se que esses testemunhos são muito áridos. Por outro lado, 
essa “aridez” pode ser considerada garantia de sua imparcialidade12. De qualquer forma, suas 
referências têm um valor documental muito importante, pois fornecem dele uma imagem 
esquemática: “Jesus é oriundo da Judeia, foi executado sob Tibério pelo governador Pôncio 
Pilatos e, no momento em que escrevem, é venerado por seus seguidores como um deus”13. 
Suetônio alude ao Cristianismo, e quase certamente ao seu fundador, ao descrever 
a política estrangeira de Cláudio. O cronista narra que Cláudio “expulsou de Roma aos judeus 
que eram causa permanente de desordens sob o impulso de Crestus”14. Essa notícia se refere 
aos anos 51-52, e nela, atribui às desordens a “Cresto”. Em outra passagem, o mesmo autor 
diz que se “infligiam suplícios aos cristãos, gente entregue a uma superstição nova e 
maléfica”15. 
Sem dúvida, o testemunho de Tácito é o mais importante com relação às 
coordenadas históricas de Cristo. Em seus Anales, pelo ano 115-117, elucida o grande 
incêndio de Roma (64 d.C.), que Nero atribuiu aos cristãos, pois a voz popular atribuía a ele o 
incêndio. Tácito diz o seguinte: 
 
Este nome lhes vem de Cristo, a quem, no reinado de Tibério, o procurador 
Pôncio Pilatos havia condenado à morte; reprimida de momento esta 
detestável superstição retornava outra vez, não somente na Judeia, onde o 
mal teve sua origem, mas também em Roma, de onde aflui tudo o que há de 
horrível de vergonhoso, e encontra inúmeros seguidores
16
. 
 
 
11
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 591. 
12
 Cf. GRANDMAISON, Léonce de. Jesucristo. Madrid: EDIBESA, 2002, p. 17. 
13
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 591. 
14
 “Iudaeos, impulsore Chresto, assidue tumultuantes Roma expulit” [Vita Claudii, n. 25 apud 
GRANDMAISON, L. Jesucristo, op. cit., p. 18]. 
15
 “Afflicti supplicis christiani, genus hominum superstitionis novae ac maleficae” [Vita Neronis, n. 6 apud 
GRANDMAISON, L. Jesucristo, op. cit., p. 18]. 
16
 Tácito, Annales, t. III, lib. Xv, p. 44 apud GRANDMAISON, L. Jesucristo, op. cit., p. 18. 
5 
 
Essa referência histórica tem uma importância enorme, pois reflete o estilo 
próprio de Tácito. O contexto, o estilo e o tom a tornam totalmente crível a juízo dos críticos. 
Nela se dá o dado inquestionável do julgamento de Cristo por parte de Pilatos no tempo de 
Tibério. Note-se ainda que tal referência está em perfeita concordância com a de outro 
historiador, nesse caso cristão, o evangelista Lucas: 
 
No ano quinze do império de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos procurador 
da Judéia, Herodes tetrarca da Galiléia; Filipe, seu irmão, tetrarca de Ituréia 
e Traconítide; e Lisânias, tetrarca de Abilene; no pontificado de Anás e 
Caifás, foi dirigida a palavra de Deus a João, filho de Zacarias, no deserto 
(Lc 3,1-2). 
 
O imperador romano Trajano havia enviado um comandante de legião a uma 
província da Ásia menor (Bitínia): Plínio o Jovem. Esse dirigiu uma carta ao Imperador, entre 
111 e 113, interrogando-o sobre o tipo de conduta que deveria assumir para com os cristãos. 
Plínio diz que chegara à conclusão de que o cristianismo era uma grande superstição. Pelo que 
diz respeito às práticas cristãs, há um único ponto significante: “reúnem-se antes do 
amanhecer, cantam a Cristo, como se fosse deus…”. Assim, o texto testemunha o culto a 
Cristo
17
. 
Consta ainda a existência de uma carta do imperador Adriano enviada por volta de 
125 ao procônsul da Ásia (atual Turquia), Minúcio Fundano. Essa carta, conservada pelo 
historiador Eusébio, dava instruções para atuar contra os cristãos. Há também uma segunda 
carta, atribuída ao mesmo Adriano, agora dirigida ao cônsul Serviano, na qual acidentalmente 
se mencionam Cristo e os cristãos
18
. 
Segundo Pagola, essas referências “têm um valor documental importante, pois 
eles são observadores neutros e inclusive hostis ao movimento cristão. Não duvidam nenhum 
momento da existência de Jesus”19. 
 
3.2 Flávio Josefo: um escritor judeu fala de Jesus 
 
O historiador judeu, Flávio Josefo
20
, alude a Cristo em duas ocasiões na obra 
Antiguidades judaicas, escrita em Roma pelos anos 90: ao falar do apedrejamento de Tiago, 
 
17
 Cf. GRANDMAISON, L. Jesucristo, op. cit., p. 19. 
18
 Cf. CASCIARO, José Maria. Jesus de Nazaré. Lisboa: Instituto Superior Politécnico de Viseu, 1999, p. 97. 
19
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 591. 
20
 Flávio Josefo, nascido entre 37 e 38 d.C., foi primeiro sacerdote em Jerusalém. No ano 70 esteve presente no 
cerco e destruição de Jerusalém pelas legiões de Tito. Sem dúvida soube arranjar-se e entrou na gens Flavia 
em Roma, onde conseguiu a profissão de cronista da corte. Entre os anos 75 e 79, escreveu sua célebre 
“Guerra judaica” onde conta a história dessa guerra contra Roma. Pouco mais tarde, escreveu a obra 
6 
 
em Jerusalém em 62, refere-se ao apóstolo como “irmão de Jesus, a quem chamam o 
Cristo”21. Esse testemunho é fidedigno: trata-se de uma afirmação nitidamente neutra sobre 
Tiago, chefe da Igreja de Jerusalém. 
A passagem que mais diretamente alude a Cristo é o chamado Testimonium 
Flavianum. Trata-se de um breve texto que fala de Jesus em sua obra “Antiguidades dos 
judeus” (18, 3,3): 
 
Naquele tempo apareceu Jesus, um homem sábio. Foi autor de feitos 
admiráveis, mestre de pessoas que recebem com gosto a verdade. E atraiu 
muitos judeus e muitos de origem grega. E, quando Pilatos, por causa de 
uma acusação feita pelos homens principais dentre nós, o condenou à cruz, 
os que antes o haviam amado não deixaram de fazê-lo. E até o dia de hoje a 
tribo dos cristãos, chamados assim por causa dele, não desapareceu
22
. 
 
A crítica moderna encontra dificuldades em alguns elementos desse texto. Alguns 
veem nele uma interpolação (alteração do texto) de copistas cristãos na Idade Média. 
Atualmente, a maioria dos críticos opina que, sobre um texto original, pode-se ter interpolado 
certos dados. Porém, não há dúvidas de que o texto faça uma clara referência à atividade 
didático e taumatúrgica de Jesus, como também à intervenção de Pilatos em sua morte. 
 
3.3 Principais dados arqueológicos 
 
José Antônio Pagola enumera, em síntese, as descobertas e escavações de maior 
interesse sobre a investigação atual sobre Jesus: os manuscritos de Qumran; os códices de 
Nag Hammadi; a inscrição de Pilatos; o ossário do sumo sacerdote Caifás; Yehohanan, o 
crucificado de Jerusalém; a localização do pretório e do Gólgota; as escavações de Séforis e 
Tiberíades; as aldeias de Jodefat e Gamla; escavações na Galileia; restos em Nazaré e a 
embarcação da pesca do lado de Galileia
23
. 
 
3.4 Os Evangelhos 
 
A fonte principal sobre a vida de Jesus se encontra nos Evangelhos. 
Etimologicamente, a palavra“Evangelho” vem do grego “Euangélion” e significa “boa 
 
“Antiguidades judaicas”, história completa do povo hebreu, desde as origines até a queda de Jerusalém em 70 
d.C. [CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 98]. 
21
 IDEM. Ibidem, p. 591. 
22
 IDEM. Ibidem, p. 591. 
23
 IDEM. Ibidem, p. 599-603. 
7 
 
nova”, particularmente, anúncio de vitória24. Trata-se de um gênero literário que apareceu 
depois das Cartas autênticas de Paulo e propôs-se transmitir fatos e palavras da vida de Jesus 
de Nazaré, que as Cartas não tinham ainda referido
25
. 
Portanto, não se trata de uma biografia no sentido moderno da palavra. Na 
realidade, os Evangelhos são uma recopilação da mensagem e dos fatos fundamentais da vida 
de Cristo que foram escritos com o fim de comunicar a fé nele. 
Sabe-se que as palavras de Cristo e os fatos de sua vida, antes de serem postos por 
escrito, foram transmitidos pela comunidade cristã primitiva em sua liturgia e em sua 
pregação. Os Evangelhos são, na realidade, catequese testemunho de fé de pessoas que creram 
em Cristo e que quiseram comunicar a fé nele. Foram escritos à luz da Páscoa, o que permitiu 
aos redatores ver os feitos de Jesus com uma nova luz. Claro, isso não quer dizer que deixem 
de ser históricos. Quanto à sua redação, pode-se distinguir três momentos: 
 
Momento de fato – Jesus de Nazaré, o filho do carpinteiro e de Maria; sua 
vida, ação, junto aos pobres, sua pregação, seu grupo, as controvérsias com 
as autoridades políticas e religiosas, sua condenação e morte e mais a sua 
ressureição; 
Momento da pregação oral – Jesus é o Cristo vindo de Deus que nos salva. 
O plano de Deus realizou-se, pois ele ressuscitou e enviou o seu espírito. 
Jesus foi poderoso em gestos e palavras, foi condenado e morto na cruz, é o 
filho de Deus, deixou a lei do amor, deixou o memorial de sua morte e 
ressurreição, vai voltar, envia seus seguidores a serem testemunhas e 
anunciadores da Boa nova; 
Momento da fixação por escrito – Primeiros escritos: as cartas que já 
nascem prontas e os rascunhos dos ditos, dos feitos, da vida e morte de 
Jesus... Redação final: a montagem dos blocos das tradições orais e escritas 
compondo os evangelhos como temos hoje
26
. 
 
A Igreja Católica reconhece como inspirados quatro narrações do Evangelho, os 
chamados Evangelhos Canônicos: Mateus, Marcos, Lucas e João
27
. Os três primeiros são 
chamados “Evangelhos Sinóticos”, porque podem ser lidos em “sinopse”. O quarto 
Evangelho pertence à tradição “joaneia” ou “joanina”, compreendida como independente da 
 
24
 Cf. MOLLAT, Donatien. “Evangelho”. In: LÉON-DUFOUR, Xavier (dir.). Vocabulário de Teologia Bíblica. 
Tradução de Frei Simão Voigt, OFM. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 319. 
25
 Paulo de Tarso iniciou seus escritos com a 1ª Carta aos Tessalonicenses. Depois, outras foram escritas pelo 
próprio apóstolo ou por discípulos seus (estas com certeza foram escritas a próprio punho:1 e 2 Cor, Gl, Fl, 
Fm, Rm; as outras tem autoria atribuída a seus discípulos: 2Ts, Cl, Ef, 1 e 2 Tm e Tt) e outros teólogos do 
primeiro século (1,2,3 Jo, Hb, 1 e 2 Pd, Tg, Jd, Ap).[Cf. MILANI, André Luis; PASSOS, João Décio [et al.]. 
Introdução ao Segundo Testamento: Eu vim para que todos tenham vida em plenitude. São Paulo: Paulus, 
2007, p. 75]. 
26
 MILANI, A. L.; PASSOS, J. D. [et al.]. Introdução ao Segundo Testamento, op. cit., p. 75-76. 
27
 Cf. CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum, n. 19. In: Documentos do Concílio 
Vaticano II [Organização geral Lourenço Costa; tradução Tipografia Poliglota Vaticana]. São Paulo: Paulus, 
1997, p. 361-362. 
8 
 
tradição sinótica; “o quarto evangelista tem seu estilo próprio de narração e formulação, e não 
mostra tendência alguma de corrigir ou substituir os sinóticos”28. 
Quanto à autoria, a Tradição da Igreja sempre entendeu que os Evangelhos de 
Mateus e de João pertencem aos respectivos Apóstolos. O Evangelho de Lucas atribuiu a 
Lucas, um companheiro de Paulo, e o Evangelho de Marcos, a um companheiro de Pedro que 
se chamava João Marcos. 
Sobre a questão da historicidade, a Constituição Dogmática sobre a Revelação Dei 
Verbum insiste que a Igreja, 
 
firme e constantemente, manteve e mantém que estes quatro Evangelhos, 
cuja historicidade afirma sem hesitar, transmitem com fidelidade o que 
Jesus, Filho de Deus, realmente operou e ensinou para a salvação eterna dos 
homens, durante a sua vida terrena até ao dia em que foi elevado ao céu (At 
1, 1-2)
29
. 
 
Com toda a garantia, é possível concluir que os Evangelhos contêm uma 
verdadeira história. A fé que tiveram os primeiros discípulos de Jesus e aqueles que lhes 
seguiram, a mesma que professavam os evangelistas, não era uma fé ingênua ou infantil. 
Assentava-se em exigências de veracidade histórica, salvando-se as devidas proporções, 
iguais às da atualidade. Os primeiros cristãos fizeram um juízo crítico sobre a veracidade dos 
Evangelhos. Tanto é verdade que muitos “evangelhos” foram rejeitados, como por exemplo, 
os “apócrifos”30 que não possuíam nenhum valor para a fé31. 
A respeito da redação, atualmente, entende-se que os evangelistas se serviram de 
documentos escritos anteriormente, numa primeira recopilação, e investigações pessoais, ao 
mesmo que tempo que davam aos seus escritos uma intencionalidade teológica. Tudo isso 
pode ser deduzido do início do Evangelho de Lucas (1, 1-4): 
 
 
28
 Cf. HARRINGTON, Wilfrid J. Chave para a Bíblia: a revelação, a promessa, a realização. São Paulo: 
Paulus, 1985, p. 594. 
29
 CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum, op. cit., p. 361. 
30
 Etimologicamente, a palavra apókryphon significa “oculto”. Tais escritos são assim considerados não por se 
tratar de livros secretos, mas porque seu conteúdo doutrinal não conseguiu se impor (ainda que neles existam 
algumas verdades históricas). Começaram a circular rapidamente, pois são citados na segunda metade do séc. 
II; porém, não gozavam da garantia apostólica como os quatro que tinham sido reconhecidos (ainda que 
normalmente fossem apresentados com o nome de algum apóstolo). Além do mais, muitos deles continham 
doutrinas que não estavam conformes com os ensinamentos apostólicos. Quando o cânon das Escrituras 
Sagradas foi fixado no século IV, a partir daí se precisa a noção de apócrifo “como aqueles escritos que não 
fazem parte do cânon bíblico”. Entre as informações dos Santos Padres, considerando aqueles que foram 
conservados pela piedade cristã e os que eram atestados de uma ou outra maneira em papiros, o número dos 
“evangelhos apócrifos” conhecidos é algo superior a cinquenta. [Para aprofundamento: ZILLES, Urbano 
(introdução e tradução). Evangelhos Apócrifos. 3. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.] 
31
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 165-168. 
9 
 
Visto que muitos já tentaram compor uma narração dos fatos que se 
cumpriram entre nós – conforme no-los transmitiram os que, desde o 
princípio, foram testemunhas oculares e ministros da Palavra – a mim 
também pareceu conveniente, após acurada investigação de tudo desde o 
princípio, escrever-te de modo ordenado, ilustre Teófilo, para que verifiques 
a solidez dos ensinamentos que recebeste. 
 
Logo após a primeira guerra mundial, entre 1919 e 1922, na Alemanha, foi 
desenvolvido um novo enfoque ou método para a análise dos Evangelhos sinóticos. A 
explicação das relações entre os evangelhos levara à teoria das duas fontes. Marcos seriao 
Evangelho mais antigo e, os outros, dependentes dele e de uma coleção de ditos do Senhor 
designada por “Q” (do alemão Quelle = “fonte”)32. Essa teoria é defendida por um grande 
número de exegetas
33
. 
Pode-se dizer que a exegese católica (e a de grande parte de outras confissões 
cristãs) afirma a existência de critérios válidos, criticamente elaborados, que permitem 
escutar, se não as “mesmas palavras de Jesus”, pelo menos a sua mensagem autêntica, e ainda 
alcançar alguns fatos de sua vida “acontecidos de verdade”. 
 
 
4. DADOS FUNDAMENTAIS SOBRE A HISTÓRIA DE JESUS DE NAZARÉ 
 
 
Depois da exposição de alguns elementos importantes do testemunho histórico 
acerca de Jesus Cristo, apresentam-se alguns dados que, segundo a maioria dos 
investigadores, oferecem alto grau de solidez histórica
34
. 
 
4.1 Nascimento 
 
Embora muitos admitam que Jesus tenha nascido em Nazaré, segundo os 
Evangelhos de Mateus (2,1) e Lucas (2,1-20), teria nascido em Belém, durante o reinado do 
Imperador romano Augusto, certamente antes da morte de Herodes o Grande, ocorrida na 
primavera do ano 4 a.C. 
Ainda que não seja possível precisar a data de seu nascimento, os historiadores 
coincidem em situá-lo entre os anos 6 e 4 antes de nossa era
35
. 
 
32
 Cf. HARRINGTON, W. J. Chave para a Bíblia, op. cit., p. 432. 
33
 IDEM. Ibidem, p. 449. 
34
 Esses dados estão baseados principalmente no texto “Breve perfil histórico de Jesus” [PAGOLA, J. A. Jesus, 
op. cit., p. 577-582]. 
35
 O monge Dionísio o Exíguo († 556), com os dados históricos de que dispunha, situou o nascimento de 
Jesus no ano 753 da fundação de Roma e assinalou o ano de 754 como o primeiro da era cristã. Este 
10 
 
4.2 Língua materna 
 
A língua materna de Jesus foi o aramaico. Segundo José Antônio Pagola, não se 
sabe com certeza se sabia ler e escrever. Em todo caso, o Evangelho de São Lucas narra que 
ele, “conforme seu costume, no dia de sábado, foi à Sinagoga e levantou-se para fazer a 
leitura” (Lc 4,16). 
Jesus conhecia certamente o hebraico que, nessa época, era uma língua literária 
empregada na liturgia do templo e nas sinagogas. Antes de serem traduzidas para o aramaico, 
as Escrituras eram lidas em hebraico. 
Segundo alguns autores, Jesus pode ter falado também um pouco de grego, porém 
desconhecia o latim. 
 
4.3 Vida em Nazaré 
 
Jesus viveu sua infância, a juventude e os primeiros anos da vida adulta em 
Nazaré (Lc 2, 39.51s; Mt 2,19-23), um pequeno povoado que se erguia sobre uma encontras 
na região montanhosa da Galileia, longe das grandes rotas comerciais. 
Segundo Pagola, Jesus era um homem de mentalidade mais rural que urbana. O 
conhecimento do contexto sociocultural e religioso permite reconstruir de maneira plausível 
alguns aspectos sobre seu ofício de artesão e sua educação no seio de uma família judaica. 
 
4.4 Encontro como Batista 
 
Em determinado momento, Jesus ouviu falar de João Batista, que movia um 
movimento de conversão numa região desértica junto ao rio Jordão. Deixou sua aldeia de 
Nazaré, ouviu a mensagem de João e recebeu seu batismo (Cf. Mt 3,13-17; Mc 1,9-11; Lc 
3,21s). 
4.5 Atividade itinerante 
 
Por volta do ano 27-28, Jesus iniciou uma atividade itinerante que o levou da 
Galileia a Jerusalém, onde foi executado provavelmente a 7 de abril do ano 30. Trata-se, 
portanto, de uma atividade que não chegou há três anos. 
Embora não seja possível reconstruir com exatidão os lugares de sua atividade e 
 
cômputo, ainda que esteja atrasado em alguns anos, é o que continua em vigor. Jesus nasceu 
provavelmente no ano 748 da fundação de Roma (6.° antes da era cristã), ou quando muito no ano 746 da 
fundação de Roma (8.° antes da era cristã) [Cf. Bíblia Sagrada: Anotada pela Faculdade de Teologia da 
Universidade de Navarra. Braga: Edições Theologica, 1994, pp. 77-86]. 
11 
 
suas rotas de viagem, certamente exerceu seu ministério público nas proximidades do lago da 
Galileia e, durante algum tempo, em Cafarnaum. 
Sempre acompanhado por um grupo de discípulos e discípulas, sua atividade 
concentrava-se em duas tarefas: curar enfermos de diversos males e anunciar sua mensagem 
sobre o “Reino de Deus”. 
Sua fama cresceu rapidamente e as pessoas se mobilizavam para encontrar-se com 
ele. Jesus tinha o costume de retirar-se de noite a lugares afastados para rezar. 
 
4.6 Profeta do reino de Deus 
 
Jesus empregava uma linguagem característica e sugestiva. Seus ditos breves e 
penetrantes, seus aforismos e, sobretudo, suas belas parábolas são inconfundíveis. Sua 
pregação concentra-se no anúncio do “Reino de Deus”. 
Sua mensagem parte da tradição judaica que ele procura comunicar através de 
uma linguagem simbólica e poética, extraída da vida. Sua pregação ocupa um lugar central a 
experiência de um Deus Pai que “faz nascer seu sol sobre bons e maus” e acolhe e busca os 
filhos perdidos. 
É essencial sua exortação a “entrar” no Reino de Deus e seu chamado a ser 
“compassivos” como o é o Pai do céu. O perdão aos inimigos constitui o ponto culminante 
deste chamado. 
 
4.7 Atividade curadora 
 
Embora seja difícil precisar o grau de historicidade de cada relato transmitido 
pelas tradições evangélicas, não há dúvida de que Jesus levou a cabo curas de diversos tipos 
de enfermos, que foram consideradas milagrosas por seus contemporâneos. 
Praticou também exorcismos, libertando pessoas do mal. Naquela cultura, elas 
eram consideradas possuídas por espíritos malignos. Tais prodígios eram entendidos como 
sinais da chegada do reino de Deus. 
Porém, Jesus sempre se opôs a executar os sinais espetaculares que alguns setores 
críticos provavelmente lhe pediam fazer ver a todos, de maneira plástica, que o Reino de Deus 
está aberto a todos, sem excluir ou marginalizar ninguém. 
 
4.8 Rodeado de discípulos 
 
Jesus aparece sempre convocando seu povo a entrar no reino de Deus (cf. Mt 
12 
 
3,17; Mc 1,15). Por isso, formou-se em torno a Jesus um grupo reduzido de seguidores 
itinerantes (cf. Lc 10,1), entre os quais havia também certo número de mulheres. 
Além desse grupo reduzido, houve um setor mais amplo de simpatizantes que 
continuaram vivendo em suas casas, mas que se identificavam com sua mensagem e acolhiam 
Jesus e seu grupo quando chegavam à sua aldeia. Segundo os evangelhos, Jesus chamou para 
junto de si um grupo mais próximo, os “Doze” (Mc 3,13-19; Mt 10,1-4; Lc 6,12-16), que 
simbolizava seu desejo de conseguir a restauração de Israel. 
 
4.9 Reações diante de Jesus 
 
Fora do grupo reduzido de discípulos e do círculo de simpatizantes, Jesus 
alcançou uma popularidade bastante grande na Galileia e regiões vizinhas. Jesus mobilizava 
massas relativamente importantes (cf Mt 5,1; Mc 3,7; Lc 6,17), e isso o transformava 
precisamente em personagem perigoso perante as autoridades. 
Jesus provocou também a rejeição de setores que procuraram estigmatizá-lo e 
desacreditá-lo para impedir sua influência. 
De fato, Jesus não foi bem recebido entre seus convizinhos e despertou a oposição 
de escribas e dirigentes religiosos tanto na Galileia quanto em Jerusalém. Foi criticado por 
comer com pecadores e acusado de estar possuído pelo demônio. Jesus defendeu-se com 
firmeza de ambas as acusações. 
 
4.10 Execução 
 
Na primavera do ano 30, Jesus subiu a Jerusalém, no território da Judeia, que, ao 
contrário da Galileia, era regida por um prefeito romano. A cidade de Jerusalém eragovernada diretamente naquele momento pelo sumo sacerdote Caifás. Jesus realizou um gesto 
hostil para com o templo, gesto que provocou sua detenção. 
Parece que não houve propriamente julgamento de Jesus perante as autoridades 
judaicas. Antes, em vista do que aconteceu no templo, a aristocracia sacerdotal ficou ainda 
mais convencida da periculosidade que Jesus representava e confabularam para fazê-lo 
desaparecer. 
De fato, Jesus morreu crucificado provavelmente no dia 7 de abril do ano 30 e foi 
o prefeito romano Pôncio Pilatos quem ditou a ordem de sua execução. 
 
13 
 
4.11 Fé em Jesus ressuscitado 
 
É possível verificar historicamente que, entre os anos 35 e 40, os cristãos da 
primeira geração confessavam com diversas fórmulas uma convicção compartilhada por todos 
e que rapidamente foram propagando por todo o Império: “Deus ressuscitou Jesus dentre os 
mortos”. 
 
 
5 A MENSAGEM DE JESUS 
 
 
Um amplo número de exegetas está de acordo em afirmar que a missão e a 
atividade de Jesus estão centradas no tema da vinda do “Reino de Deus”. Os evangelhos 
narram que, nas aldeias da Galileia, Jesus anunciava a boa nova do Reino (Mt 4,23; 9,35)
36
. 
São Marcos resume assim sua pregação: “Cumpriu-se o tempo e o reino de Deus está 
próximo, convertei-vos e crede na boa-nova” (Mc 1,15). 
 
Uma indicação estatística pode sublinhar isto: a expressão “Reino de Deus” 
ocorre no conjunto do Novo Testamento 122 vezes; destas, encontra-se 99 
vezes nos três Evangelhos sinópticos e, destas, de novo, 90 pertencem às 
palavras de Jesus. No Evangelho de S. João e nos restantes escritos do Novo 
Testamento a expressão representa um papel muito limitado. Pode-se dizer: 
enquanto o eixo da pregação pré-pascal de Jesus é a mensagem do Reino de 
Deus, a cristologia constitui o centro da pregação apostólica pós-pascal
37
. 
 
Porém, esse fato deixa aberta uma questão central: ao falar do “Reino”, do que 
Jesus estava falando? Sabe-se que a monarquia é um regime político entre os muitos que os 
seres humanos criam: trata-se de um sistema em que o monarca cumpre certos deveres, goza 
de certos privilégios e em certas ocasiões usa determinadas insígnias. Certamente, nada disso 
se aplica a Deus. Aqui, parte-se de uma linguagem que não é literal e sim metafórica, 
simbólica
38
. 
 Para saber em que consiste essa realidade misteriosa que Jesus veio instaurar na 
terra, faz-se mister saber que o referido tema, presente também na pregação de João Batista, 
provém do Antigo Testamento que lhe havia esboçado as grandes linhas enquanto o 
anunciava e preparava a sua chegada. Na verdade, a realeza divina era uma ideia comum a 
todas as religiões do antigo Oriente. Consta que as mitologias se serviam dessa ideia para 
 
36
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 57. 
37
 BENTO XVI. Jesus de Nazaré: primeira parte: do batismo do Jordão à Transfiguração. São Paulo: Planeta do 
 Brasil, 2007, p. 58.
38
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 58-59. 
14 
 
conferir um valor sagrado a rei-humano, lugar-tenente terrestre do deus-rei. Porém, o Antigo 
Testamento assume essa ideia, mas com um conteúdo diferente, peculiar. A ideia aparece 
relacionada com o seu monoteísmo, sua concepção do poder político, sua escatologia. Israel é 
o Reino de Deus. Ele reina sobre Israel (Jz 8,23; 1Sm 8,7). Ele reina para sempre no céu (Sl 
11,4; 103,19), na terra (Sl 47,3) no universo inteiro que ele criou (Sl 93,1s; 95,3ss), reina 
sobre todas as nações (Jr 10,7.10). Mesmo quando a estrutura política evolui (quando o povo 
resolve ter um rei – 1 Sm 8,1-9), a instauração da realeza humana deve subordinar-se à 
realeza divina (1Sm 10,24; 16,12; 2Sm 7,14)
39
. 
Quando a realeza israelita desmorona, entendem que a causa principal da queda é 
a ruptura dos reis humanos com o Rei do qual recebiam seu poder (Jr 10,21). A partir daí, os 
profetas iniciam o anúncio do Rei futuro, o Messias filho de Davi. O próprioDeus, como um 
pastor, irá se ocupar de seu rebanho para congregá-lo e salvá-lo (Miq 2,12s; Ez 34,11;Is 40, 
9ss). O povo viverá então a expectativa do reinado de Deus: um reino que se instaurará sobre 
as ruinas dos impérios humanos (Dn 2,44; Sb 3,8). Muitas vezes essa espera se configurará 
numa forma política: espera-se a restauração do reino de Davi pelo Messias
40
. 
Como se pode notar, o tema do Reino de Deus correspondia perfeitamente à 
expectativa do povo judeu. Jesus dirigiu-se a seus compatriotas numa linguagem tirada de sua 
herança comum
41
. Esse fato trouxe algumas dificuldades: para os ouvintes de Jesus, a vinda 
do Reino de Deus endireitaria tudo, traria ao mesmo tempo, a resolução do problema do mal. 
Talvez alguns dos contemporâneos de Jesus pensassem que o reino seria instaurado pela 
revolução. Outros, quem sabe, no cenário apocalíptico
42
. Porém, o Reino de Deus é uma 
realidade misteriosa, cuja natureza só Jesus pode dar a conhecer. A pedagogia dos Evangelhos 
consiste em grande parte na revelação progressiva dos mistérios do Reino, notadamente nas 
parábolas
43
 e nos atos de Jesus, ou seja, seus milagres e exorcismos
44
. 
 
39
 Cf. DEVILLE, Raymond; GRELOT, Pierre. Reino. In: LÉON-DUFOUR, Xavier (dir.). Vocabulário de 
Teologia Bíblica, op. cit., p. 871-872. 
40
 IDEM. Ibidem, p. 873. 
41
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 60. 
42
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 63. 
43
 Todos estão de acordo que as parábolas formam, sem dúvida, o núcleo essencial da pregação de Jesus. O uso 
pedagógico das parábolas servia para transmitir os ensinamentos para o maior número de pessoas possíveis, 
em diversos níveis culturais: para que todos compreendessem. Era mais fácil usar as imagens do cotidiano 
para transmitir os grandes ensinamentos da vida de modo que o ouvinte pudesse interagir e aplicar à própria 
vida os novos conhecimentos trazidos por Jesus. Por outro lado, a pedagogia do Senhor se torna original, 
diferenciando-se do método dos mestres da religião da época, pois o ouvinte deveria passar da passividade 
para um movimento de abertura frente a realidade que o levasse a uma livre escolha de seguir ou não seguir o 
Senhor. Bento XVI fala do assunto: “ ... cada educador, cada mestre que queira transmitir conhecimentos aos 
seus ouvintes sempre há de servir-se também de exemplos, de parábolas. Por meio do exemplo, o mestre 
aproxima do seu pensamento uma realidade que até então permanecia longe do ângulo de visão dos seus 
interlocutores. Ele quer mostrar como algo transparece numa realidade que pertence ao seu campo de 
15 
 
No Evangelho de São Mateus, no décimo terceiro capítulo, estão reunidas sete 
parábolas seguidas de Jesus sobre o Reino de Deus. São as chamadas parábolas do Reino: (1) 
a parábola do semeador (que aparece nos três sinóticos com sua explicação: Mt 13,1-9.18-23; 
Mc 4,1-9.13-20; Lc 8,4-8.11-15); (2) a parábola do joio (Mt 13, 24-30); (3) a parábola do grão 
de mostarda (Mt 13, 31-32); (4) a parábola do fermento (Mt 13, 33, cfr. Lc 13,20-21); (5) a 
parábola do tesouro escondido (Mt 13, 44); (6) a parábola da pérola (Mt 13, 45) e (7) a 
parábola da rede (Mt 13, 47-50). 
Essa parábolas são “comparações” por meio das quais Jesus ilustra e, aos poucos, 
revela os mistérios do Reino ou do Reinado de Deus. São notas e características desse 
reinado: (1) a pequenez e a humildade das origens, mas, ao mesmo tempo, o seu progressivo 
crescimento; (2) a força regeneradora para o homem, mediante a qual Deus convida a todos à 
salvação (porém só a alcançarão aqueles que corresponderem ao chamamento com abertura 
de alma e perseverarem nele)45
; (3) o juízo divino, que discernirá a reta intenção dos homens 
ao seguirem Jesus Cristo; (4) a misteriosa ligação entre os aspectos terrestre e celeste e a 
tensão para a plenitude final, isto é, rumo ao tempo escatológico
46
. 
Embora se tenha destacado aqui as parábolas do décimo terceiro capítulo de São 
Mateus, como “parábolas do Reino”, atualmente admite-se que todas as parábolas acabam por 
anunciar algum aspecto do Reino de Deus e a sua proximidade iminente
47
. E ainda mais: nas 
parábolas de Jesus sempre se desvenda, junto com alguma dimensão do Reino de Deus, algum 
aspecto do modo divino de agir: “o ‘Reino dos Céus’ não é uma realidade, digamos, estática, 
 
experiência, de que até então se não tinham apercebido. Por meio da parábola, aproxima dos ouvintes o que 
estava longe, de tal modo que chegam até o desconhecido através da ponte da parábola. Trata-se aqui de um 
duplo movimento: por um lado, a parábola traz o que está longe para a proximidade dos ouvintes. Por outro 
lado, o ouvinte é ele mesmo, deste modo, posto a caminho. A dinâmica interior da parábola, a interior 
autossuperação da imagem escolhida, convida-o a confiar-se a esta dinâmica e a avançar para além do seu 
anterior horizonte, a aprender e a compreender o até agora desconhecido. Mas isto significa que a parábola 
exige a colaboração do aprendiz, ao qual não somente se traz alguma informação, mas ele mesmo deve 
acolher o próprio movimento da parábola e seguir com este movimento. Neste momento surge também a 
problemática da parábola: pode dar-se a incapacidade de descobrir a sua dinâmica e de se deixar conduzir por 
ela. Pode dar-se, principalmente se se trata de parábolas que tocam a existência e a mudam, a falta de vontade 
de se deixar entrar no movimento exigido” [RATZINGER, J. (Bento XVI). Jesus de Nazaré, op. cit., p. 171-
172.] 
44
 Cf. DEVILLE, R.; GRELOT, P. Reino. In: LÉON-DUFOUR, X. Vocabulário, op. cit., p. 874. 
45
 O Reino de deus é dom por excelência. Mas para recebe-lo é preciso cumprir certas condições (se tudo é 
graça, os homens devem responder à graça): os pecadores endurecidos no mal “não herdarão o Reino de 
Cristo e de Deus” (1Co 6,9s; Gl 5,21; Ef 5,5; cf. Ap 22,14s); é preciso ter uma alma de pobre (Mt 5,3); uma 
atitude de criança (Mt 18,1-4; 19,14); uma ativa busca do Reino e da sua justiça (Mt 6,33), o suportar das 
perseguições (Mt 5,10; At 14,22; 2 Tl 1,5), o sacrifício de tudo que se possui (Mt 13,44ss; cf. 19,23), uma 
perfeição maior que ados fariseus (Mt 5, 20); uma palavra, o cumprimento da vontade do Pai (Mt 7,21), 
especialmente em matéria de caridade fraterna (Mt 25,34) [Cf. DEVILLE, R.; GRELOT, P. Reino. In: 
LÉON-DUFOUR, X. Vocabulário, op. cit., p. 875-876]. 
46
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 275. 
47
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 302. 
16 
 
mas dinâmica, na qual se projeta o modo divino de agir”48. 
Como enunciado anteriormente, o Reino de Deus não se manifesta somente nas 
parábolas de Jesus, mas também no agir de Cristo. Os quatro Evangelhos mencionam 
quarenta e um milagres diferentes feitos por Jesus. Deve-se observar que o Senhor se recusa a 
fazer milagres espetaculares para benefício próprio (Mt 4,3-6); em compensação, fá-los para 
manifestar a chegada do Reino que inaugura (Mt 11,4-6; 12,22-30), para testemunhar que foi 
enviado por Deus Pai (Jo 5,36; 10,25); para mostrar a sua condição de Filho de Deus (Jo 
10,31-38; 11,3-4), etc. Os seus milagres são de índole muito variada: curas repentinas; 
exorcismos, três ressurreições de mortos e vários prodígios na natureza. Os seus 
contemporâneos jamais colocaram em dúvida (At 10,37-38), nem mesmo seus inimigos 
declarados, que tentavam atribuí-los ao demônio (Mc 3,22)
49
. Historicamente, é muito 
.provável que Jesus tenha curado pessoas e realizado exorcismos
50
. 
Quando se pergunta por que algo aconteceu, geralmente há uma resposta. Pode-se 
recorrer a uma disciplina ou a uma combinação de disciplinas em busca de explicação. 
Começa a chover, nasce uma criança, políticos assinam um tratado de redução de armas, uma 
família sai de férias: para cada um desses acontecimentos há uma explicação. Porém, quando 
ocorre algo que é inexplicável, algo que interrompe o curso normal das coisas e suspende as 
leis da natureza, pode-se deduzir a existência de um milagre. Esse critério parece muito 
simples: se o evento não pode ser explicado é milagre. Porém, há uma diferença muito grande 
entre dizer “algo é inexplicável” e atribuir esse fato a Deus. Por isso, alguns biblistas 
católicos, já há algumas décadas, sugeriram uma compreensão alternativa do termo milagre, 
mais de acordo com o testemunho do Novo Testamento. Significa dizer que só é milagre se 
for um evento portador de um significado religioso
51
. As curas e os exorcismos feitos por 
Jesus são mais positivos: são sinais do Reino. Sob o ponto de vista funcional, a vinda do 
Reino significa a resposta, uma solução para o problema do mal. Ao curar as doenças das 
pessoas, Jesus oferece uma experiência antecipada da realidade vindoura. Ao realizar 
exorcismos, mostra que o Reino de Deus traz a vitória sobre Satanás. Essa vitória sobre o 
maligno também é constatada nas curas, pois, na antiguidade, as doenças eram atribuídas aos 
espíritos maus. Em síntese: as curas e os exorcismos de Jesus indicam que há uma realidade 
que cura e liberta tudo o que precisa ser libertado e curado. A proximidade do Reino de Deus 
 
48
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 306. 
49
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 315-316. 
50
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 83. 
51
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 77-78. 
17 
 
traz plenitude e liberdade
52
. Portanto, o significado teológico dos milagres de Jesus é o 
seguinte: “são testemunho do começo dos tempos finais da salvação, em que Satanás começa 
a ser derrotado, ainda que não o será definitivamente até à segunda vinda de Cristo”53. Os 
milagres confirmam a verdade de suas palavras, são ajudas exteriores para a fé nele
54
. 
Embora a maior parte dos textos digam que o Reino é objeto de desejos e 
esperanças, alguns textos fazem supor que ele já chegou. Alega o seus exorcismos de que o 
Reino já veio (Mt 12,28). Quando os fariseus perguntam quando é que o Reino vem, recebem 
uma dupla resposta: de um lado sua vinda não poderá ser calculada e, de outro, já está no 
meio deles (Lc 17,20s). Essa aparente contradição resolve-se, quando se entende que Jesus é o 
próprio Reino. Na sua atividade, na sua pessoa, o Reino se faz presente (Mt 12,28; Lc 
17,20s.). Observe-se que São Mateus (16,28) descreve a gloriosa manifestação do Reino 
como a vinda do Filho do Homem em seu reino
55
. 
 
A partir da leitura das suas palavras, Orígenes caracterizou Jesus como a 
autobasiléia, isto é, como o Reino de Deus em pessoa. Jesus mesmo é o 
“Reino”; o Reino não é uma coisa, não é um espaço de domínio como um 
reino do mundo. É pessoa: o Reino é Ele
56
. 
 
Em síntese, pode-se dizer, que o tema do “Reino de Deus” penetra toda a 
pregação de Jesus e só poderá ser compreendido a partir da totalidade da sua pregação. Ao 
falar do Evangelho do Reino de Deus, diz o Papa Bento XVI que “Jesus anuncia, à medida 
que fala do Reino de Deus, simplesmente Deus e precisamente o Deus vivo, que é capaz de 
agir de modo concreto no mundo e na história e que já está exatamente agora em ação”57. 
 
 
6 O MISTÉRIO PASCAL 
 
 
O Novo Testamento associa indissoluvelmente a redenção e a salvação esperadas 
desde o Antigo Testamento à pessoa e a história de Jesus Cristo.Por exemplo, nos relatos dos 
sofrimentos do “Servo de Javé”, Isaías (52,13–53,12; cf. 42,6;49,6.8) já anunciava que 
“alguém” assumiria e pagaria voluntariamente a culpa do povo de Israel e de todos os outros 
 
52
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 84. 
53
 CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 317. 
54
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 318. 
55
 Cf. NELIS, J. Reino de Deus. In: VAN DEN BORN, A. (org.). Dicionário enciclopédico da Bíblia. 6. ed. 
Tradução de Frederico Stein. Petrópolis: Vozes, 2004, p. 1289-1295. 
56
 RATZINGER, Joseph (Bento XVI). Jesus de Nazaré: da entrada em Jerusalém até a Ressurreição. São Paulo: 
Planeta do Brasil, 2007, p. 59. 
57
 IDEM. Ibidem, p. 64. 
18 
 
povos no seu lugar e por sua salvação
58
. Os cristãos sempre aplicaram essas profecias de 
Isaías a Jesus. Há na literatura neotestamentária diversas citações e alusões em que se dá uma 
clara associação de Jesus à essa figura, dentre elas: Mt 8,17 (Is 53,4); Mt 12,18 (Is 42,1-4); 
Mc 10,45 (Is 53,10); Lc 22,37 (53,12); Jo 12,38 (Is 53,1) e At 8,32s (Is 57,7s)
59
 . 
Portanto, como transparece no símbolo Niceno-constantinopolitano, os cristãos 
sempre professaram a sua fé em 
 
... um só Senhor Jesus Cristo, unigênito Filho de Deus e nascido do Pai antes 
de todos os séculos, [...] o qual em prol de nós (grifo nosso), homens, e de 
nossa salvação, desceu dos céus, e se encarnou, do Espírito Santo, <do seio> 
de Maria Virgem, e se fez homem; que também foi crucificado por nós 
(grifo nosso), sob Pôncio Pilatos, padeceu e foi sepultado, e ressuscitou no 
terceiro dia segundo as Escrituras e, e subiu ao céu, está sentado a direito do 
pai e virá novamente para julgar os vivos e os mortos, cujo reino não terá 
fim
60
. 
 
Desde o início do Cristianismo, há uma nítida consciência de que existe uma obra 
salvífica realizada por Deus na pessoa de Jesus Cristo. Isso quer dizer que os seguidores de 
Jesus aprenderam a ver a morte dele como o sofrimento do justo que conquista a justificação 
de Deus como morte por seus pecados
61
. 
Em síntese, este é o chamado mistério pascal: o mistério da Cruz e da 
Ressurreição de Cristo que ocupa o “centro da Boa Nova que os apóstolos e a Igreja, na 
esteira deles, deve anunciar ao mundo”62 . 
 
6.1 A liberdade de Jesus diante de sua morte iminente 
 
Da leitura dos textos do Novo Testamento, transparece claramente que Jesus 
Cristo entregou-se voluntariamente a sua morte cruz. Encontrava-se em Cesareia de Filipo, 
antes dos sérios enfrentamentos que tivera com os judeus, quando tomou a decisão de abraçar 
a cruz. Depois da confissão de Pedro, diz o evangelho: “E começou a ensinar-lhes que o filho 
do homem tinha que sofrer muito e ser reprovado pelos anciãos, os sumos sacerdotes e os 
escribas, ser morto e ressuscitar ao terceiro dia” (Mc 8,31). 
 
58
 Cf. KESSLER, Hans. Redenção/Soteriologia. In: EICHER, Peter (dir.). Dicionário de Conceitos 
Fundamentais de Teologia. São Paulo: Paulus, 1993, p. 745. 
59
 Cf. BOUWMAN. Servo de Javé. In: BORN, A. Van Den (org.). Dicionário enciclopédico da Bíblia. 6. ed. 
Tradução de Frederico Stein. Petrópolis: Vozes, 2004, p. 1425. 
60
 DENZINGER, Heinrich. Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral. São Paulo: 
Paulinas, Loyola, 2007, p. 66, n. 150. 
61
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 116. 
62
 Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 161, n. 571. 
19 
 
É possível admitir que a experiência de seu ministério e as inúmeras oposições 
que enfrentou por parte dos fariseus e das autoridades religiosas o levariam a prever a sua 
morte como um destino inevitável
63
. 
Os fariseus formavam um grupo de homens letrados, familiarizados com as 
tradições e os costumes de Israel e, muitos deles possuíam cargos administrativos ou 
burocráticos, sobretudo em Jerusalém. Dedicavam-se ao estudo da Torá, cuidavam de 
observar todas as prescrições como a observância do sábado, o pagamento dos dízimos ao 
Templo ou a pureza ritual. Ainda que as curas que Jesus realizava os atraíssem como atraiam 
a todos e ainda pudessem considera-lo um grande profeta como Isaías ou Jeremias, eram seus 
adversários por excelência: faziam-lhe perguntas capciosas e procuravam tirar a sua 
credibilidade diante do povo. De sua parte, Jesus lançava sobre eles diversas ameaças e 
condenações: disse que não entrariam no Reino dos Céus, que estavam cheios de hipocrisia e 
de maldade, que se preocupavam das minúcias, mas descuidavam-se da justiça, da 
misericórdia e da fé. Jesus chegou a compará-los com sepulcros caiados, bonitos por fora, mas 
cheios de podridão. Contudo o que mais irritava aos fariseus, era que Jesus falava diretamente 
em nome de Deus, com autoridade própria, sem respeitar aquilo que os outros mestres 
ensinavam. Apesar de tudo, ainda que tomassem parte, como grupo, em sua condenação ou 
execução, não foram os fariseus os instigadores da sua morte
64
. 
As autoridades religiosas, que também fizeram oposição a Jesus, constituíam uma 
aristocracia formada por uma minoria de cidadãos ricos e importantes, muitos deles 
sacerdotes e alguns membros do grupo saduceu. Consta que, naquele tempo, o sumo sacerdote 
tinha poder de governo tanto nem Jerusalém como na Judeia. Talvez não vissem com bons 
olhos as curas e os exorcismos que davam popularidade a Jesus e ameaçavam o seu poder de 
intermediários exclusivos do perdão e da salvação de Deus em Israel. 
Em linhas gerais, pode-se dizer que a atividade de Jesus questionava o templo 
como fonte exclusiva de salvação para o povo. Além disso, a tradição cristã conservou uma 
parábola que parecia dirigida às autoridades religiosas do Templo: a “parábola dos vinhateiros 
homicidas” (Mc 12,1-8; Lc 20,9-15 e Mt 12,33-39 e ainda no apócrifo de Tomé 65) que, 
provavelmente, afirmava que não sabiam cuidar do povo que lhes fora confiado, mas 
somente pensavam em seus próprios interesses. Além disso, a parábola deixa entender que 
eles se sentiam proprietários de Israel, quando eram apenas administradores e que não foram 
capazes de acolher os enviados de Deus. 
 
63
 Cf. DUPUIS, J. Introdução, op. cit., p. 72. 
64
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 400-405. 
20 
 
Em outras passagens, ainda há outros ecos da critica que Jesus fez aos dirigentes 
religiosos do Templo, como por exemplo, o lamento profético que feito por ele sobre 
Jerusalém no estilo dos profetas como Amós ou outros (Lc 13,34-35; Mt 23,37-39). No caso, 
parece evidente que se referia não a toda Jerusalém, mas aos lideres religiosos que a 
governavam. Por tudo isso, a sua vida corria perigo, pois, os sumos sacerdotes não poderiam 
aceitar tamanha agressão
65
. 
Aos conflitos com as autoridades religiosas, inclua-se a sua comunhão com 
pessoas que, naquela sociedade, eram consideradas “dignas de desprezo”. Essa atitude era 
também considerada uma verdadeira afronta aos líderes religiosos. 
 
O fato de ele – para além de todos os limites estabelecidos contra a impureza 
– anunciar o incondicional amor paterno e a disposição ao perdão de Deus a 
todos podia ser entendido pelos guardiões mesquinhos da doutrina oficial 
como ataque aos fundamentos da fé e como traição da causa sagrada de 
Israel. “Certamente muitos críticos de Jesus eram de opinião que tinham de 
defender a Deus contra Jesus”66. 
 
Além das questões religiosas, pode-se apontar o receio do poder romano surgido 
da desconfiança de que ele tornara-se um profeta inquietante e perigo de subversão. O seu 
anúncio da implantação do Reino de Deus era fonte de preocupação para as autoridadese, por 
isso, poderia ser executado em qualquer território controlado por Roma. Deve tê-los 
inquietado muito a postura de Jesus sobre o imposto (Mc 12,13-17). 
Quando lhe perguntaram se era lícito ou não pagar imposto a César, a formulação 
não poderia ser mais delicada para Jesus. Se respondesse negativamente, poderia ser acusado 
de rebelião contra Roma. Se aceitasse a tributação dos impostos, ficaria desacreditado diante 
das pessoas exploradas pelo Império Romano. Diante da cilada, com uma imensa liberdade 
proclamou: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mc 12,17). Nesse caso, 
a hábil postura de Jesus driblou seus adversários. Porém, mais tarde, conforme diz São Lucas, 
foi acusado diante de Pilatos de alvoraçar o povo a não pagar impostos a César (Lc 23,2)
67
. 
De qualquer forma, 
 
Jesus contou com a possibilidade de um final violento. Não era ingênuo. 
Sabia do perigo a que se expunha se prosseguisse sua atividade e continuasse 
na irrupção do Reino de Deus. Mais cedo ou mais tarde sua vida poderia 
desembocar na morte. O perigo o ameaçava a partir de diversas frentes. [...] 
Provavelmente Jesus contou desde cedo com a possiblidade de um desenlace 
 
65
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 405-409. 
66
 KESSLER, Hans. Cristologia. In: SCHNEIDER, Theodor (org.). Manual de Dogmática. V. I. 3. ed. 
Petrópolis: Vozes, 2008, p. 253. 
67
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 410-416. 
21 
 
fatal. Primeiro era só uma possibilidade; mais tarde transformar-se-ia num 
final bastante provável; por fim numa certeza
68
. 
 
Há ainda outros textos que expressam a consciência de Jesus a respeito de sua 
morte: o sinal de Jonas (Mt 12,39-39; Mc 8,11-12; Lc 16,29-32), as metáforas do Batismo, do 
cálice, da hora e do pastor ferido mostram também a consciência de que paulatinamente se 
aproxima o sofrimento da Paixão. Transparece a convicção de estar numa crescente tensão 
que culminará no sacrifício de sua vida
69
. 
Tudo isso para dizer que Jesus não era ingênuo e sabia do perigo que corria. 
Poderia ter mudado de conduta, poderia ter fugido... No entanto, Jesus Cristo dirigiu-se 
voluntariamente à Cruz, pois, ele mesmo o dirá: “Ninguém me tira a vida, eu a dou 
voluntariamente” (Jo 10,18). São sinais claros que Cristo pôde prever a sua morte. Com muita 
frequência Jesus falava de sua morte (cf. Mc 2,19-20; 14,21). No total encontramos oito 
solenes predições de sua crucifixão! 
 
6.2 O sentido redentor dado por Jesus a sua morte 
 
Se Jesus pode prever a sua morte como um “destino inevitável”, é certo que Jesus 
lhe conferira um sentido preciso. A tradição dos Evangelhos guardou diversas alusões com 
referência ao sentido redentor dado por ele à própria morte. Por exemplo, no Evangelho de 
São Marcos, depois do terceiro anúncio de sua paixão, ao exortar os apóstolos do perigo da 
ambição, afirmou claramente que “o Filho do homem não veio para ser servido, mas para 
servir e dar a vida em resgate de muitos” (Mc 10,45)70. 
Contudo, somente na última ceia Jesus expressou “explicitamente” o sentido 
redentor de sua morte: “Tomai, comei, isto é o meu corpo… Este é meu sangue da aliança que 
vai ser derramado por muitos para remissão dos pecados” (Mt 26,26-28). Jesus se serviu aqui 
da profecia do servo do SENHOR (cf. Is 53,11-12) para dar a entender que sua vida se entrega 
em expiação dos pecados da humanidade. Assim, Jesus entendia que, como outrora no Sinai o 
sangue das vítimas selou a aliançado SENHOR com o seu povo (Ex 24,4-8; Gn 15,1), sob a 
cruz, o seu sangue iria selar a “nova aliança” entre Deus e os homens (Cf. Lc 22,20). Trata-se 
da mesma aliança que os profetas tinham anunciado (Jr, 31,31)
71
. Desse modo, ao cear com 
 
68
 IDEM. Ibidem, p. 416-417. 
69
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 518. 
70
 Cf. DUPUIS, J. Introdução, op. cit., p. 72. 
71
 Cf. A Bíblia de Jerusalém. 7ª impressão. São Paulo: Paulus, 1995, nota c, p. 1889. 
22 
 
seus discípulos, às vésperas de sua paixão, Jesus sabia que sua morte iminente seria para a 
remissão dos pecados
72
. 
 
Um aspecto particular da interpretação que Jesus faz da morte, e que ocorreu 
durante a última ceia, consiste em havê-la associado à oferta de um dom, o 
dom do pão e de um cálice de vinho. Na verdade, numa refeição festiva 
judia, o consumo de pão e vinho é natural, mas aqui isto é visto sob uma luz 
diferente, a luz de sua interpretação da morte. [...] No início da refeição 
Jesus tomou um pão, pronunciou uma bênção, partiu-o e distribuiu os 
pedaços aos discípulos enquanto interpretava o que estava fazendo. No fim, 
depois de uma oração de ação de graças, ele fez circular o (seu?) cálice de 
vinho, dando também a interpretação. Por causa da dificuldade para 
reconstituir as palavras de interpretação pronunciadas por Jesus, poderíamos 
renunciar a isto e falar de uma ceia de despedida que apontava para o 
banquete escatológico, ou, com maior reserva ainda, falar misteriosamente 
de uma ceia cheia de significado. Poderíamos também apontar para o gesto 
de oração presente na entrega do pão e do cálice que foram abençoados, e 
unicamente neste gesto ver manifestada a bênção a salvação realizada por 
Jesus ao dirigir-se para a morte. Certamente esse ato está orientado para essa 
vontade. Mas ainda podemos dar um outro passo adiante, uma vez que 
contamos com a interpretação salvífica da morte de Jesus
73
. 
 
Note-se que esse sentido redentor dado por Jesus à sua morte também aparece 
após sua ressurreição. Quando Jesus Ressuscitado aparece em Jerusalém aos onze apóstolos, 
retoma os diálogos acontecidos antes da Paixão: 
 
44
Depois disse-lhes: “São estas as coisas que eu vos falei quando ainda 
estava convosco: era necessário que se cumprisse tudo o que está escrito 
sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos”. 45Então ele abriu a 
inteligência dos discípulos para entenderem as Escrituras, 
46
e disse-lhes: 
“Assim está escrito: o Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro 
dia, 
47
e no seu nome será anunciada a conversão para o perdão dos pecados, 
a todas as nações começando por Jerusalém. 
48
Vós sois as testemunhas 
destas coisas” (Lc 24,44-45). 
 
Portanto, Jesus era consciente de um projeto divino de salvação anunciado 
antecipadamente pelas Escrituras e que se realizaria mediante a morte de um “Servo, o Justo”. 
Esse projeto, na verdade, consistia no mistério da redenção universal em que se dá o resgate 
que liberta os homens da escravidão do pecado
74
. 
 
 
 
72
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 73-74. 
73
 GNILKA, Joaquim. Jesus de Nazaré: mensagem e história. Petrópolis: Vozes, 2000 , p. 263-264. 
74
 Cf. Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 171, n. 601. 
23 
 
6.3 A paixão e a morte de Jesus 
 
A Paixão de Jesus Cristo é o momento de sua vida mais minuciosamente narrado 
pelos quatro evangelistas. Essas narrativas coincidem em tudo o que é fundamental
75
. 
Apresentam passagens próprias que, de modo algum, são contraditórias, mas se 
complementam entre si. Por isso, qualquer um dos quatro relatos da Paixão constitui um 
legítimo relato
76
. Muitos consideram que, na formação dos Evangelhos, a narração da Paixão 
parece ser a primeira parte de toda a história de Jesus tecida em forma contínua. Sob ponto de 
vista cristão, cada evangelista escreveu com o objetivo de comunicar o significado religioso 
dos últimos dias de Jesus
77
. 
Na noite da Última Ceia, começou-se a desenrolar uma série de acontecimentos 
que parecem ter ocorrido de forma bemrápida. Depois que cantaram o hino, Jesus e os 
apóstolos saíram para o Monte das Oliveiras (Mc 14,26), o local em que Jesus foi preso. 
Nesse lugar, Judas e a tropa encarregada da prisão entraram em cena. Depois do beijo da 
traição, Jesus foi preso e os discípulos fugiram. Segundo o Evangelho de São Marcos (15,1), 
“logo de manhã, os sumos sacerdotes, com os anciãos, os escritas e o sinédrio inteiro, 
reuniram-se para deliberar. Depois, amarraram Jesus, levaram-no e o entregaram à Pilatos”. 
Perante o tribunal romano, ele fora julgado. 
Quanto ao processo do julgamento de Jesus, não consta a presença de jurados nem 
de assistentes judiciais. Tribunais de jurados não eram usuais na Judeia. Não se sabe se 
Pilatos que o julgou recorreu a um conselho e, certamente, isso não poderá ser esclarecido. 
Seu processo consistiu basicamente em uma acusação apresentada pelos sumos sacerdotes (ou 
por seus representantes) e de uma audiência realizada por Pilatos. Enquanto o governador da 
Judeia o interrogava, Jesus respondia ou silenciava (Mc 15,2-5). Sem entrar em outros 
detalhes
78
, pode-se dizer que esse processo terminara com uma sentença de morte formal: a 
crucifixão
79
. Como forma de execução romana, nunca poderia ser aplicada aos cidadãos 
romanos, exceto em casos excepcionais e para manter a disciplina entre os militares
80
. 
 
A crueldade da crucificação tinha a intenção de aterrorizar a população e 
servir assim de escarmento geral. Sempre era um ato público. As vítimas 
permaneciam totalmente nuas, agonizando na cruz, num lugar visível: uma 
encruzilhada concorrida, uma pequena elevação não longe das portas de um 
 
75
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 517. 
76
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 519-521. 
77
 Cf. LOEWE, W. P. Introdução, op. cit., p. 113. 
78
 Por exemplo, poderia se falar da cena de Barrabás (Mc 15,6; Mt 27,15; Lc 23,18 e Jo 18,39). 
79
 Cf. GNILKA, Joaquim. Jesus de Nazaré, op. cit., p. 273-278. 
80
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 465. 
24 
 
teatro ou o próprio lugar onde o crucificado havia cometido seu crime. Não 
era fácil esquecer o espetáculo daqueles homens retorcendo-se de dor entre 
gritos e maldições. [...] O escritor romano Plauto (apr. 250-184 a.C.) 
descreve com quanta facilidade crucificavam-se escravos para mantê-los 
aterrorizados, cortando pela raiz qualquer tentativa de rebelião, fuga ou 
roubos. Por outro lado, era o castigo mais eficaz para os que se atreviam a a 
erguer-se contra o Império. Durante muitos anos foi o instrumento mais 
comum para “pacificar” as províncias rebeldes. O povo judeu o havia 
experimentado repetidas vezes. Só num período de setenta anos, próximos à 
morte de Jesus, o historiador Flávio Josefo nos informa de quatro 
crucificações em massa: no ano 4 a.C., Quintílio Varo crucifica dois mil 
rebeldes em Jerusalém; entre os anos 48 e 52, Quadrato, legado da Síria, 
crucifica todos os capturados por Cumano num enfrentamento entre judeus e 
samaritanos; no ano 66, durante a prefeitura do cruel Floro, são flagelados e 
crucificados um número incontável de judeus, na queda de Jerusalém 
(setembro do ano 70), números defensores da cidade santa são crucificados 
brutalmente pelos romanos
81
. 
 
Condenado à morte, Jesus foi flagelado pelos soldados encarregados de sua 
execução. Na verdade, a flagelação era o começo da execução. Só poderia ser feita em 
peregrinos, pois, naquela época, era proibido flagelar cidadãos romanos. Além disso, César 
punia a flagelação de cidadãos romanos com violência grave. Para essa, os soldados usavam 
uma correia de couro que muitas vezes continham fragmentos de ossos ou grumos de chumbo. 
O flagelado era despido, atirado ao chão ou amarrado em uma coluna. O número dos golpes 
ficava a critério dos carrascos
82
. 
Depois de ser torturado, Jesus foi levado ao Gólgota para ser crucificado. Era a 
forma de morte mais dolorosa e horrenda que se podia dar a um delinquente. Como castigo 
público, era colocado como exemplo para sociedade e, por isso, acontecia num lugar bem 
visível, onde o corpo do justiçado ficava exposto durante alguns dias.
83
 A morte para um 
crucificado sobrevinha após uma dolorosíssima agonia, para a que contribuíam conjuntamente 
a perda de sangue, a febre produzida pelas feridas, a sede, a asfixia
84
. Assim morre Jesus. 
Segundo os evangelistas, morreu, rezando, à hora nona, ou seja, às três horas da tarde. A sua 
última oração fora tirada do Salmo 31: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23,46; 
cf. Sl 31,6)
85
. 
Segundo Mateus (27,55-56) e Marcos (15,40-41), ao pé da Cruz se encontram 
quatro mulheres: Maria Madalena, Maria a mãe de Tiago, a mãe de José e uma quarta, a mãe 
dos filhos de Zebedeu (Mateus) ou Salomé (Marcos). São João (19,25-27) é o único a 
 
81
 IDEM. Ibidem, p. 465-466. 
82
 Cf. GNILKA, Joaquim. Jesus de Nazaré, op. cit., p. 282-283. 
83
 PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 465-466. 
84
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 520. 
85
 Cf. RATZINGER, J. (Bento XVI). Jesus de Nazaré, op. cit., p. 202. 
25 
 
registrar o episódio de forma completa: diz que no Calvário também estavam a “Mãe de 
Jesus” e o “discípulo amado”86. 
Na parte superior de sua cruz, colocada pelos soldados, estava certamente uma 
pequena placa de cor branca na qual, com letras negras ou vermelhas bem visíveis, indicava-
se a causa pela qual fora crucificado. O hebraico (língua sagrada mais utilizada no templo), o 
latim (a língua oficial do Império Romano) e o grego (a língua comum dos povos do Oriente e 
mais falada pelos judeus da diáspora) indicavam o delito de Jesus: “rei dos judeus” (Mt 
15,27). Fora executado com outros condenados, como um delinquente qualquer
87
. 
 
Enquanto os romanos, como intimidação, deixavam propositadamente 
pender do instrumento de tortura depois da morte os crucificados, estes, 
segundo o direito judaico, deviam ser tirados no mesmo dia (Dt 21,22-23)”. 
Por isso, era tarefa do pelotão de execução acelerar a morte quebrando-lhes 
as pernas. Aconteceu assim também no caso dos crucificados no Gólgota. 
Aos dois “bandidos” foram quebradas as pernas. Chegados a Jesus, porém, 
veem que ele já está morto; então renunciaram a quebrar-Lhe as pernas; em 
vez disso, um deles trespassa o lado direito – o coração – de Jesus e “logo 
saiu sangue e água” (Jo 19,34). [...] Saíram sangue e água do coração 
traspassado de Jesus. Em todos os séculos, a Igreja segundo a palavra de 
Zacarias, olhou para esse coração traspassado e nele reconheceu a fonte de 
bênção indicada antecipadamente no sangue e na água
88
. 
 
Com o passar do tempo, a Igreja nascente, sob a guia do Espírito Santo, foi 
lentamente penetrando no sentido mais profundo da cruz. Em primeiro lugar, os cristãos 
entenderam que os antigos sacrifícios do templo estavam completamente superados. A crítica 
dos profetas, que também ganhara expressão nos salmos, dizia que Deus não queria ser 
glorificado por meio de sacrifícios de touros e de cabritos, cujo sangue não pode purificar o 
homem nem fazer expiação por ele. Jesus é o “Cordeiro de Deus” que carregara sobre si o 
pecado da humanidade. Parece estranho que um Deus, anunciado como amor e misericórdia, 
exija uma expiação infinita? Não se trata de uma ideia indigna de Deus
89
? Bento XVI observa 
que acontece exatamente o contrário: 
 
Ora, acontece não que um Deus cruel venha pedir algo de infinito, mas 
precisamente o contrário: o próprio Deus coloca-Se como lugar de 
reconciliação e, no seu Filho, carrega o sofrimento sobre Si. O próprio Deus 
introduz no mundo, sob a forma dedom, a sua pureza infinita. O próprio 
Deus “bebe o cálice” de tudo aquilo que é terrível e, assim, restabelece o 
 
86
 Cf. CASCIARO, J. M. Jesus, op. cit., p. 528. 
87
 Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 472-473. 
88
 RATZINGER, J. (Bento XVI). Jesus de Nazaré, op. cit., p. 203-204. 
89
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 208-209. 
26 
 
direito por meio da grandeza do seu amor, o qual, através do sofrimento, 
transforma a escuridão
90
. 
 
O referido pontífice interpreta a paixão de Cristo de outra forma, como o 
momento em que o Puro entra em contanto com imundície do mundo: 
 
Na Paixão de Jesus, toda a imundície do mundo entra em contato com o 
imensamente Puro, com a alma de Jesus Cristo e, desse modo, com o próprio 
Filho de Deus. Se habitualmente a realidade suja, através do contato, 
contagia e mancha a realidade pura, aqui temos o contrário: onde o mundo, 
com toda a sua injustiça e as crueldades que o mancham, entra em contato 
com o imensamente Puro, aí ele, o Puro, revela-se o mais forte. Neste 
contato, a imundice do mundo é realmente absorvida, anulada transformada 
por meio do sofrimento do amor infinito
91
. 
 
Como observa o Catecismo da Igreja Católica, é o “amor até o fim” (Jo 15,13) 
que confere o valor de redenção e de expiação e de satisfação ao sacrifício de Cristo
92
. Essa 
perspectiva do amor também se encontra nos escritos de São Paulo. O apóstolo diz que em 
Cristo já existe a garantia do amor do Pai: “Quem não poupou seu próprio Filho, mas por nós 
o entregou, como não nos dará todas as coisas juntamente com ele?” (Rm 8,32). Ou ainda: “a 
prova que Deus nos ama é que Cristo, sendo nós ainda pecadores, morreu por nós” (Rm 5,8). 
 
O que dá valor redentor ao suplício da cruz é o amor e não o sofrimento. O 
que salva a humanidade não é algum “misterioso” poder salvador contido no 
sangue derramado diante de Deus. Por si mesmo, o sofrimento é mau, não 
tem nenhuma força redentora. Não agrada a Deus ver Jesus sofrendo. A 
única coisa que salva no Calvário é o amor insondável de Deus, encarnado 
no sofrimento e na morte de seu filho. Não há nenhuma outra força 
salvadora a não ser o amor
93
. 
 
De qualquer forma, aparentemente, tudo terminava num espantoso fracasso. 
Ainda que seus discípulos tivessem o ouvido anunciar a sua morte, não o podiam crer. 
Esperavam que ao final algo acontecesse. Aquele que fizera tantos milagres não podia 
terminar assim. Pelo que se podia ver, venceram seus inimigos. No entanto, nessa morte 
espantosa há algo que fala. O soldado que o viu morrer, estremecido pelo que havia visto, 
exclama: “Verdadeiramente este homem era o filho de Deus” (Mc 15,39). 
 
 
 
90
 IDEM. Ibidem, p. 211. 
91
 IDEM. Ibidem, p. 210. 
92
 Cf. Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 176, n. 616. 
93
 PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 520. 
27 
 
6.4 A ressurreição 
 
Se todos os evangelistas narram a história da paixão e da morte de Jesus, o mesmo 
acontece com a ressurreição. O que é perfeitamente compreensível, porque a ressurreição de 
Jesus é o fato que justifica o Cristianismo. Nela está o ponto de partida da fé cristã e o seu 
núcleo central. Como diz São Paulo, “se Cristo não ressuscitou, a nossa pregação é sem 
fundamento, e sem fundamento também é a vossa fé” (1Cor 15,14). 
 
Se Jesus não tivesse ressuscitado dos mortos, o cristianismo seria apenas um 
grupo de amigos de Jesus, unidos na recordação de seus ensinamentos e na 
melhor reprodução possível de seus exemplos. Nesse caso, embora seja um 
dos grandes gênios religiosos da humanidade, Jesus não teria sido o 
“Senhor” e o cristianismo não constituiria uma Boa Notícia para a 
humanidade de hoje, mas simplesmente uma moral elevada
94
. 
 
Segundo os evangelistas, no primeiro dia da semana, bem cedo, algumas mulheres 
se aproximaram do sepulcro em que o corpo de Jesus havia sido depositado e o encontraram 
aberto e vazio (Mc 16,1-8; Mt 28, 1-8; Lc 24,1-12; Jo 20,1-18). São Marcos conta que um 
“jovem vestido de branco”95 tirou-as da perplexidade com as seguintes palavras: “Não vos 
assusteis! Procurais Jesus, o nazareno, aquele que foi crucificado? Ele ressuscitou! Não está 
aqui! Vede o lugar onde o puseram! Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro: ‘Ele vai à 
vossa frente para a Galileia. Lá o vereis, com ele vos disse’” (Mc 16,6-7). Do anúncio desse 
jovem, poderia ser captada a grande mensagem: “é um erro procurar o crucificado no sepulcro 
vazio; ele não está ali, não pertence ao mundo dos mortos”96. 
O fato de ter encontrado o sepulcro vazio, a princípio, deve ter-lhes causado 
grande perplexidade! É claro que um túmulo vazio não significa que um morto tenha 
ressuscitado. E, por isso, como essas mulheres não eram tão ingênuas, fizeram logo a 
pergunta: “será que levaram o corpo do Senhor?” (Jo 20,13). 
Porém, de acordo com os relatos evangélicos, o túmulo vazio não é o principal 
fundamento para a Ressurreição. A fé em Cristo ressuscitado se apoia no fato de que seus 
seguidores o encontraram e o testemunharam cheio de vida depois de sua morte. De fato, seria 
um erro pensar que o sepulcro vazio foi a grande prova da ressurreição de Jesus. 
 
94
 DUPUIS, J. Introdução, op. cit., p. 76. 
95
 São Mateus (28,2) diz que no sepulcro do Senhor estava um anjo. São Lucas (24,4) fala de dois homens com 
vestes resplandecentes. São João (20,12), por sua vez, fala que Maria Madalena enxergou dois anjos vestidos 
de branco. Ainda que haja algumas diferenças nesses relatos, a historicidade desse relato pode ser 
comprovada pelo fato de que seria difícil imaginar que os evangelistas criassem essa história para reforçar 
com realismo a narrativa da ressurreição. Não seria oportuno escolher mulheres como protagonistas de um 
testemunho que seria pouco valorizado na sociedade judaica [Cf. PAGOLA, J. A. Jesus, op. cit., p. 511-512]. 
96
 IDEM. Ibidem, p. 513-514. 
28 
 
Somente a partir da experiência do encontro com o Ressuscitado, entenderam que 
o túmulo vazio era o primeiro sinal, mas não o mais importante. Ao encontra-lo vazio, talvez 
pudessem se lembrar de que Jesus afirmara que sofreria muito, morreria e ressuscitaria depois 
de três dias (Mc 8,31), mas, mesmo assim, ficariam muitas dúvidas... 
Sendo assim, só o encontro pessoal com Cristo foi capaz de dissipar as dúvidas e 
enchê-las de alegria. Mesmo os discípulos não acreditaram logo. Num primeiro momento, 
espantaram-se com o anúncio das mulheres. Também para eles, só o encontro com Cristo 
dissiparia as dúvidas e incertezas. As aparições do Senhor redivivo são sinais dados aos 
discípulos para suscitar a fé. Mas, na verdade, eles creram porque viram Jesus vivo
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 . 
Por isso, o Ressuscitado apareceu a Pedro, aos dois discípulos que iam a caminho 
de Emaús e aos outros apóstolos. Assim, ao lado do sepulcro vazio, que por si só não podia 
dar garantias de que Cristo ressuscitara, apresentam-se as aparições do Jesus Ressuscitado. 
Um estudo dessas aparições mostra que ele se fez reconhecer como pessoa viva e presente. As 
narrativas das aparições sempre se desdobram em três momentos: (1) Jesus se manifesta vivo, 
(2) os discípulos o reconhecem e (3) dele recebem a missão de anunciá-lo
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. 
Porém, não seriam essas aparições visões ou imaginações interiores dos 
discípulos? 
Primeiramente, ao analisar os relatos na língua original, em grego, nota-se 
imediatamente que o verbo empregado para falar das aparições é opthé. Em 1Cor 15,5-8, o 
referido verbo costuma ser traduzido por “apareceu”. Porém, segundo os peritos, é mais

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