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MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 1 Aula 1: Mecanismos de Solução de Conflitos: jurisdição, negociação, conciliação, mediação e arbitragem Introdução ............................................................................................................................. 2 Conteúdo ................................................................................................................................ 3 Solução de conflitos .......................................................................................................... 3 Conceitos básicos em solução de conflitos ................................................................. 3 Ferramentas para solução de conflitos ......................................................................... 6 Negociação ......................................................................................................................... 6 Mediação – evolução legislativa brasileira ................................................................... 9 A medição prévia e a mediação incidental ................................................................ 10 Arbitragem ........................................................................................................................ 13 Distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado ........................................... 14 Atividade proposta .......................................................................................................... 16 Referências........................................................................................................................... 16 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 18 Notas .......................................................................................................................................... 21 Chaves de resposta ................................................................................................................. 22 Aula 1 ..................................................................................................................................... 22 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 22 MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 2 Introdução Nesta aula vamos apresentar o panorama geral da matéria, enfocando a evolução histórica dos meios alternativos e as principais semelhanças e diferenças entre eles. Falaremos um pouco sobre a negociação, conciliação, mediação e arbitragem, demonstrando suas características e peculiaridades. Objetivo: 1. Apresentar uma visão geral dos mecanismos alternativos de solução de conflitos no direito brasileiro; 2. Examinar as principais ferramentas a partir de um exame comparativo entre elas. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 3 Conteúdo Solução de conflitos Um conflito pode ser solucionado pela via estatal (jurisdição) ou pelas vias chamadas alternativas. Classificamos as vias alternativas em puras e híbridas. Chamamos puras aquelas em que a solução do conflito se dá sem qualquer interferência jurisdicional; ao passo que nas híbridas, em algum momento, mesmo que para efeitos de mera homologação, há a participação do Estado- Juiz. São formas puras a negociação, a mediação e a arbitragem. São meios híbridos, no direito brasileiro: a conciliação, obtida em audiência ou no curso de um processo já instaurado; a transação penal; a remissão prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente e o termo de ajustamento de conduta celebrado em uma ação civil pública. Atenção Com efeito, é cada vez mais comum o uso dos meios alternativos durante o processo judicial. Como veremos nas aulas seguintes, tanto o novo CPC como a Lei n° 13.140/15 tratam das figuras da conciliação e da mediação judicial e preveem regras específicas para o seu uso. No intuito de registrar as principais diferenças entre os meios puros de solução alternativa, apresentamos, a seguir, alguns conceitos básicos. Conceitos básicos em solução de conflitos Por negociação entende-se o processo pelo qual as partes envolvidas no litígio, diretamente e sem a interveniência de uma terceira pessoa, buscam chegar a uma solução consensual. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 4 A negociação envolve sempre o contato direto entre as partes ou entre seus representantes; não há aqui um terceiro, um neutro, um mediador, um árbitro ou um juiz. Por meio de processos de conversação as partes procuram fazer concessões recíprocas, reduzindo suas diferenças, e através delas chegam à solução pacificadora. Obviamente, em razão do comprometimento emocional e, muitas vezes, da falta de habilidade dessas partes para chegar a uma solução, a negociação acaba se frustrando, razão pela qual se passa à segunda modalidade de solução alternativa: a mediação. Na mediação insere-se a figura de um terceiro, o qual, de alguma maneira, vai atuar no relacionamento entre as partes envolvidas de forma a tentar obter a pacificação do seu conflito. A forma e os limites que vão pautar a atuação desse terceiro vão indicar a modalidade da intermediação. Hoje, entende-se que essa intermediação pode ser passiva ou ativa. Trata-se apenas de uma diferença de método, mas com um mesmo fim: o acordo. Na primeira modalidade, passiva, aquele terceiro vai apenas ouvir as versões das partes e funcionar como um agente facilitador, procurando aparar as arestas sem, entretanto, em hipótese alguma, introduzir o seu ponto de vista, apresentar as suas soluções ou, ainda, fazer propostas ou contrapropostas às partes. Sua ação será, portanto, a de um expectador/facilitador. Função típica de um mediador. Numa segunda postura, encontramos o intermediador ativo que no direito brasileiro, recebe o nome de conciliador. Por conta da tênue diferença de método para se chegar ao acordo é que há, muitas vezes, a discussão terminológica entre mediação e conciliação. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 5 A conciliação ocorre, portanto, quando o intermediador adota uma postura mais ativa: ele vai não apenas facilitar o entendimento entre as partes, mas, principalmente, interagir com elas, apresentar soluções, buscar caminhos não pensados antes por elas, fazer propostas, admoestá-las de que determinada proposta está muito elevada ou de que uma outra proposta está muito baixa; enfim, ele vai ter uma postura verdadeiramente influenciadora no resultado daquele litígio a fim de obter a sua composição. Nunca é demais lembrar que a conciliação, no seu aspecto processual, é um gênero do qual são espécies a desistência, a submissão e a transação, conforme a intensidade da disposição do direito efetivada pela(s) parte(s) interessada(s). E, finalmente, temos a figura da arbitragem. [...] a prática alternativa, extrajudiciária, de pacificação antes da solução de conflitos de interesses envolvendo os direitos patrimoniais e disponíveis, fundada no consenso, princípio universal da autonomia da vontade, através da atuação de terceiro, ou de terceiros, estranhos ao conflito, mais de confiança e escolha das partes em divergência. A arbitragem, como se costuma dizer, é um degrau a mais em relação à mediação (conciliação), especificamente à intermediação ativa, pois o árbitro, além de ouvir as versões das partes, tentar uma solução consensuada, interagir com essas partes, deverá proferir umadecisão de natureza impositiva, caso uma alternativa conciliatória não seja alcançada. Vemos, desta forma, que a crucial diferença entre a postura do árbitro e a postura do mediador é que o árbitro tem efetivamente o poder de decidir, ao passo que o mediador pode apenas sugerir, admoestar as partes, tentar facilitar o acordo, mas não pode decidir a controvérsia. E em relação à conciliação, apesar da intermediação mais incisiva do terceiro, mesmo assim, o objetivo é fazer com que os interessados empreguem suas forças para uma solução MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 6 amigável do conflito, enquanto que o árbitro pode ir além e, ultrapassada essa fase conciliatória, não se chegando ao acordo, pode impor uma solução. Ferramentas para solução de conflitos Agora que você já conheceu conceitos básicos da solução de conflitos, é hora de conhecer as principais ferramentas que podem ser utilizadas para a solução de conflitos de forma alternativa à jurisdição. São elas: negociação, mediação e arbitragem. Negociação A negociação é um processo bilateral de resolução de impasses ou de controvérsias, no qual existe o objetivo de alcançar um acordo conjunto, através de concessões mútuas. Envolve a comunicação, o processo de tomada de decisão (sob pressão) e a resolução extrajudicial de uma controvérsia. A negociação tem como principais vantagens evitar as incertezas e os custos de um processo judicial, privilegiando uma resolução pessoal, discreta, rápida e, dentro do possível, preservando o relacionamento entre as partes envolvidas, o que é extremamente útil, sobretudo em se tratando de negociação comercial. Quanto ao momento, a negociação pode ser prévia ou incidental, tendo por referencial o surgimento do litígio; quanto à postura dos negociadores e das partes, pode ser adversarial (competitiva) ou solucionadora (pacificadora). A Escola de Harvard tem-se notabilizado por pregar uma técnica conhecida como principled negotiation ou negociação com princípios, fundada nos seguintes parâmetros: Em primeiro lugar, é importante diferenciar o interesse da posição. Normalmente as partes expõem sua posição, que não necessariamente coincide com seu interesse. Por falta de habilidade, não raras vezes, fala-se em números, valores ou situações concretas, em vez de dizer o que se pretende ao final, permitindo que a barganha se dê quanto aos meios necessários a se MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 7 atingir aquele fim. FISCHER, Roger and William Ury, Getting to Yes: Negotiating Agreement without Giving In, Boston: Houghton Mifflin Co., 1981. Para isso, é preciso que ambas as partes (e seus negociadores) encarem o processo de negociação com uma solução mútua de dificuldades, na qual o problema de um é o problema de todos. Nessa linha de raciocínio é preciso separar o problema das pessoas, de modo a deixar claro que uma divergência de opinião não deve afetar o sentimento pessoal ou o relacionamento, que sempre são mais valiosos. Ademais, na busca da solução do problema, é preciso estar atento a três parâmetros: a percepção, a emoção e a comunicação. As atitudes dos negociadores, em relação a esses tópicos, podem ser assim sistematizadas: 1) Percepção: (i) coloque•-se no lugar do outro e procure entender seu ponto de vista; (ii) não presuma que o outro irá sempre prejudicá-lo; (iii) não culpe o outro pelo problema; (iv) todos devem participar da construção do acordo; (v) peça conselhos e dê crédito ao outro por suas ideias; (vi) não menospreze as demandas do outro; e (vii) procure dizer o que a outra parte gostaria de ouvir. 2) Emoção: (i) os negociantes sentem-se ameaçados ‒ a emoção pode levar as negociações a um impasse; (ii) identifique suas emoções e o que as está causando; (iii) deixe que o outro expresse suas emoções e evite reagir emocionalmente a seus desabafos ‒ não as julgue como inoportunas; e (iv) gestos simples podem ajudar a dissipar emoções fortes. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 8 3) Comunicação: (i) fale ao seu oponente; (ii) não faça apresentação para o cliente; (iii) ouça o seu oponente; (iv) não planeje sua resposta enquanto o outro fala; (v) seja claro na transmissão da informação; (vi) utilize•se da escuta ativa (active listening); (vii) repita e resuma os pontos colocados ‒ mostre que está compreendendo; e (viii) compreender o oponente não significa concordar com ele. Observando esses conceitos, será possível identificar o real interesse, desenvolver diversas opções e alternativas e criar soluções não cogitadas até então, por meio de um procedimento denominado “brainstorming”. A partir daí, torna-se necessário utilizar critérios objetivos e bem definidos para avaliar as alternativas. Nesse momento, é preciso evitar a disputa de vontades, utilizar padrões razoáveis, baseados em descobertas científicas, precedentes legais ou judiciais e recorrer a profissionais especializados. O critério deve ser debatido a fim de gerar um procedimento justo e aceito por ambos os interessados. Importante, por último, ter sempre em mente que a negociação é apenas uma das formas de se compor o litígio. Normalmente é a primeira a ser tentada, até porque dispensa a presença de terceiros, mas, também por isso, possui forte vinculação emocional das partes que, nem sempre, conseguem se desapegar do objeto do litígio para refletir de forma racional sobre ele. As partes devem ter sempre em mente o limite do que é negociável. É o que a Escola de Harvard denomina BATNA – Best Alternative to a Negotiated Agreement. Se a negociação não sai como o esperado, é possível deixar a mesa, a qualquer momento, e partir para outra forma alternativa ou mesmo para a jurisdição tradicional. Em outras oportunidades, uma das partes simplesmente não colabora. Não faz propostas razoáveis, tem o ímpeto de conduzir o processo a seu bel-prazer e inviabiliza qualquer chance de solução MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 9 pacífica. Ou pior, lança mão de truques sujos, omite ou mente sobre dados concretos, simula poder para tomar decisões, utiliza técnica agressiva e constrangedora, faz exigências sucessivas e exageradas, ameaça etc. Ainda que se tente, ao máximo das forças, por vezes, é preciso reconhecer que um dos interessados não está preparado para uma solução direta negociada ou parcial (por ato das partes) dos seus conflitos. É o momento de “subir um degrau” na escada da solução das controvérsias e partir para a mediação. Mediação – evolução legislativa brasileira Entende-se a mediação como o processo por meio do qual os interessados buscam o auxílio de um terceiro imparcial que irá contribuir na busca pela solução do conflito. Esse terceiro não tem a missão de decidir (nem a ele foi dada autorização para tanto). Ele apenas auxilia as partes na obtenção da solução consensual. O papel do interventor é ajudar na comunicação através da neutralização de emoções, formação de opções e negociação de acordos. Como agente fora do contexto conflituoso, funciona como um catalisador de disputas, ao conduzir as partes às suas soluções, sem propriamente interferir na substância destas. No Brasil, a partir dos anos 90 do século passado, começou a haver um interesse pelo instituto da mediação, sobretudo por influência da legislação argentina editada em 1995. Por aqui, a primeira iniciativa legislativa ganhou forma com o Projeto de Lei nº 4.827/98, oriundo de proposta da Deputada Zulaiê Cobra, tendo o texto inicial levado à Câmara uma regulamentaçãoconcisa, estabelecendo a definição de mediação e elencando algumas disposições a respeito. Na Câmara dos MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 10 Deputados, já em 2002, o projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e enviado ao Senado Federal, onde recebeu o número PLC nº 94, de 2002. Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004 (conhecida como “Reforma do Judiciário”), apresentou diversos Projetos de Lei modificando o Código de Processo Civil, o que levou à um novo relatório do PL 94. Foi aprovado o Substitutivo (Emenda nº 1-CCJ), ficando prejudicado o projeto inicial, tendo sido o substitutivo enviado à Câmara dos Deputados no dia 11 de julho. Em 1º de agosto, o projeto foi encaminhado à CCJC, que o recebeu em 7 de agosto. Desde então, dele não se teve mais notícia até meados de 2013 quando voltou a tramitar, provavelmente por inspiração dos projetos que já tramitavam no Senado. O Projeto, em sua última versão, logo no Artigo 1º, propunha a regulamentação da mediação paraprocessual civil que poderia assumir as seguintes feições: prévia; incidental; judicial e extrajudicial. A medição prévia e a mediação incidental A mediação prévia poderia ser judicial ou extrajudicial (Artigo 29). No caso da mediação judicial, o seu requerimento interromperia a prescrição e deveria ser concluído no prazo máximo de 90 dias. A mediação incidental (Artigo 34), por outro lado, seria obrigatória, como regra, no processo de conhecimento, salvo nos casos: a) De ação de interdição; b) Quando for autora ou ré pessoa de direito público e a controvérsia versar sobre direitos indisponíveis; c) Na falência, na recuperação judicial e na insolvência civil; d) No inventário e no arrolamento; e) Nas ações de imissão de posse, reivindicatória e de usucapião de bem imóvel; f) Na ação de retificação de registro público; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 11 g) Quando o autor optar pelo procedimento do juizado especial ou pela arbitragem; h) Na ação cautelar; i) Quando na mediação prévia não tiver ocorrido acordo nos cento e oitenta dias anteriores ao ajuizamento da ação. A mediação deveria ser realizada no prazo máximo de noventa dias e, não sendo alcançado o acordo, dar-se-ia continuidade ao processo. Assim, a mera distribuição da petição inicial ao juízo interromperia a prescrição e induziria a litispendência. Ademais, caso houvesse pedido de liminar, a mediação só teria curso após o exame desta questão pelo magistrado, sendo certo que eventual interposição de recurso contra a decisão provisional não prejudicaria o processo de mediação. Em 2010 o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 125, com base em algumas premissas: a) o direito de acesso à Justiça, previsto no Artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica acesso à ordem jurídica justa; b) nesse passo, cabe ao Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a mediação e a conciliação; c) a necessidade de se consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 12 d) a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças; e) é imprescindível estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais; f) a relevância e a necessidade de organizar e uniformizar os serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos, para lhes evitar disparidades de orientação e práticas, bem como para assegurar a boa execução da política pública, respeitadas as especificidades de cada segmento da Justiça. O art. 1º da Resolução institui a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, com o objetivo de assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados, deixando claro que incumbe ao Poder Judiciário, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem como prestar atendimento e orientação ao cidadão. Para cumprir tais metas, os Tribunais deverão criar os Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, e instalar os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania. A Resolução trata ainda da capacitação dos conciliadores e mediadores, do registro e acompanhamento estatístico de suas atividades e da gestão dos Centros. Em 2009 foi convocada uma Comissão de Juristas, presidida pelo Ministro Luiz Fux, com o objetivo de apresentar um novo Código de Processo Civil. Na redação atualmente disponível do Projeto do novo CPC, podemos identificar a preocupação da Comissão com os institutos da conciliação e da mediação, especificamente nos Artigos 165 a 175 do novo CPC. Atualmente, tramita na MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 13 Câmara o Projeto de Lei n° 13.140/14 que trata do tema e será examinado mais adiante. Arbitragem A arbitragem surge como uma forma alternativa de resolução de conflitos, colocada ao lado da jurisdição. Sua tônica está na busca de um mecanismo mais ágil e adequado para a solução de conflitos, numa fuga ao formalismo exagerado do processo tradicional e no fato de que o árbitro pode ser uma pessoa especialista na área do litígio apresentado, ao contrário do juiz, que nem sempre tem a experiência exigida para resolver certos assuntos que lhe são demandados. Na arbitragem, as partes maiores e capazes, divergindo sobre direito de cunho patrimonial, submetem o litígio ao terceiro (árbitro), que deverá, após regular procedimento, decidir o conflito, sendo tal decisão impositiva. Há aqui a figura da substitutividade, existindo a transferência do poder de decidir para o árbitro, que por sua vez é um juiz de fato e de direito. A arbitragem pode ser convencionada antes (cláusula compromissória), ou depois (compromisso arbitral) do litígio, sendo certo ainda que o procedimento arbitral pode se dar pelas regras ordinárias de direito ou por equidade, conforme a expressa vontade das partes. Em comparação à arbitragem, na jurisdição, monopólio do Estado e o instrumento ainda mais utilizado na solução dos conflitos no Brasil, não há limites subjetivos (de pessoas) ou objetivos (de matéria). Ademais, ostenta a característica da coercibilidade e autoexecutoriedade, o que não ocorre na arbitragem. Mas, não custa lembrar, jurisdição é apenas monopólio do Estado e não da solução dos conflitos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 14 Mostra-se então a arbitragem como o método mais adequado para a solução e a desformalização de determinados tipos de conflito, bem como para desafogar o Poder Judiciário. Como visto, a arbitragem consiste na solução do conflito por meio de um terceiro, escolhido pelas partes, com poder de decisão, segundo normas e procedimentosaceitos por livre e espontânea vontade das partes. A arbitragem, como se costuma dizer, é um degrau a mais em relação à conciliação, especificamente na intermediação ativa, pois o árbitro, além de ouvir as versões das partes, além de tentar uma solução consensual e de interagir com essas partes, deverá proferir uma decisão de natureza impositiva, caso uma alternativa conciliatória não seja alcançada. Vemos, então, que a crucial diferença entre a postura do árbitro e a postura do mediador é que o árbitro tem efetivamente o poder de decidir, ao passo que o conciliador tem um limite: ele pode sugerir, ele pode admoestar as partes, ele pode tentar facilitar aquele acordo, mas ele não pode decidir aquela controvérsia. Distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado Qual seria a distinção entre a função do árbitro e a do juiz togado? É certo que o legislador quis transferir ao árbitro praticamente todos os poderes que o juiz de direito detém. O legislador, na Lei nº 9.307/96, chega a afirmar textualmente, no Artigo 18, que o árbitro é juiz de fato e de direito e a sentença que ele proferir não fica sujeita a recurso ou à homologação pelo Poder Judiciário. Esse dispositivo está em perfeita consonância com o Artigo 515, VII do CPC/2015, que diz ser a sentença arbitral um título executivo judicial. Em outras palavras, por força imperativa de lei, um título que originalmente não é oriundo de um processo jurisdicional, passa a ser tratado e equiparado a uma sentença. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 15 Assim se vê que o legislador deixa claro que tudo aquilo que foi examinado e decidido no procedimento arbitral recebe o mesmo tratamento das matérias que foram examinadas e decididas em um procedimento jurisdicional. Uma vez aberto o processo de execução elas não podem ser arguidas pela parte inconformada. Mas, voltemos ao ponto inicial do raciocínio, ou seja, o quantum de poder do juiz e do árbitro. Uma das características principais da jurisdição é a coercibilidade. O juiz, no exercício de seu mister, tem o poder de tornar coercíveis suas decisões, caso não sejam cumpridas voluntariamente. Ele julga e impõe sua decisão. O árbitro, assim como o juiz, julga. Ele exerce a cognição, avalia a prova, ouve as partes, determina providências, enfim, preside aquele processo. Contudo, não tem ele o poder de fazer valer suas decisões. Em outras palavras, se uma decisão do árbitro não é voluntariamente adimplida, não pode ele, de ofício, tomar providências concretas para assegurar a eficácia concreta do provimento dele emanado. Não vamos entrar aqui na discussão política e constitucional do legislador ao não transferir a coertio ao árbitro. É bem verdade que, se, de um lado, a opção legislativa representa um problema à efetivação da decisão arbitral, por outro, mantém o sistema de freios e contrapesos e a própria harmonia entre as funções do Estado, impedindo a transferência de uma providência cogente, imperativa, a um particular, sem uma forma adequada de controle pelos demais poderes constituídos, o que acabaria por vulnerar o próprio Estado Democrático de Direito. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 16 Assim sendo, pelo sistema atual, em sendo descumprida uma decisão do árbitro, deve a parte interessada recorrer ao Poder Judiciário a fim de emprestar força coercitiva àquela decisão arbitral. Atividade proposta Assista à apresentação de slides sobre a técnica de negociação da Universidade de Harvard. Nos slides é possível perceber os pontos mais importantes dos três livros básicos do programa: Getting to Yes, Getting past no e Getting it done. Após assistir ao conteúdo, escreva um resumo de 15 a 20 linhas sobre os fundamentos principais do método desenvolvido por Roger Fischer e seus colegas. Chave de resposta: Você deve apresentar os quatro fundamentos principais do método proposto pela escola de Harvard: 1. Separe as pessoas dos problemas; 2. Foque nos interesses e não nas posições; 3. Invente opções para ganhos mútuos; e 4. Insista no uso de critérios objetivos. Após, deverá discorrer sobre o uso do BATNA - melhor alternativa a um acordo negociado e as ferramentas para enfrentar o chamado jogo sujo do oponente. Referências AZEVEDO, Andre Gomma de. Políticas públicas para formação de mediadores judiciais. Meritum – Revista de Direito da Universidade FUMEC, v. 7, n. 2, julho a dezembro de 2012, Belo Horizonte: FUMEC, 2012, p. 103/140. CAMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. Material Complementar Para saber mais sobre a arbitragem acesse a biblioteca virtual e leia o texto indicado. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 17 DIDIER JUNIOR, Fred. Curso de Direito Processual Civil, 17 ed. v.1. Salvador: Jus Podium, 2015. DIDIER JUNIOR, Fred, BRAGA, Paula Sarmo, OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil, 11 ed. v.2. Salvador: Jus Podium, 2016. DIDIER JUNIOR, Fred, CUNHA, Leonardo Carneiro. Curso de Direito Processual Civil, 13 ed. v.3. Salvador: Jus Podium, 2016. DONIZETTI, Elpidio. Curso didático de direito processual civil. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2016. FLEXA, Alexandre, MACEDO, Daniel, BASTOS, Fabrício. Novo Código de Processo Civil – temas inéditos, mudanças e supressões. 2 ed. Salvador: Jus Podium, 2016. GRECO, Leonardo. Instituições de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1. cap. 01-03. OST, François. Júpter, Hércules, Hermes: tres modelos de juez. DOXA, n. 14, 1993. p. 169-194. Disponível em: http://www.cervantesvirtual.com/buscador/?q=tres+modelos+de+juez#posicio n. Acesso em: 14 nov. 2009. PINHO. Humberto Dalla Bernadina de Pinho. Direito processual civil contemporâneo – teoria geral do processo. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2016. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Teoria geral do processo civil contemporâneo. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. cap. 25. ____. DURCO, Karol. A mediação e a solução dos conflitos no Estado Democrático de Direito. O “Juiz Hermes” e a nova dimensão da função jurisdicional. Disponível em: http://www.humbertodalla.pro.br. RESTA, Eligio (trad. Sandra Vial). O direito fraterno. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004. SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem: mediação e conciliação. 6. Ed. Rio de Janeiro: Gen, 2016. SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Ijuí: Unijuí, 2010. (Coleção direito, política e cidadania; 21). MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 18 TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. 2 ed. Rio de Janeiro: Gen, 2016. THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 56 ed. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2015. THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 50 ed. Vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 2016. Exercícios de fixação Questão 1 (Prova: FCC - 2009 - TJ-AP - Analista Judiciário) O recurso cabível da sentença que julga procedente o pedido de instituição de arbitragem e da sentença que confirma a antecipação dos efeitos da tutela é o de: a) Agravo de instrumento. b) Apelação, só no efeito devolutivo. c) Apelação, no efeito devolutivo e suspensivo e apelação só no efeito devolutivo, respectivamente. d) Apelação, só no efeito devolutivo e apelação, no efeito devolutivo e suspensivo, respectivamente. e) Apelação, no efeito devolutivo e suspensivo. Questão 2 (Prova: FCC - 2006 - BACEN - Procurador) Existindo convenção de arbitragem, o Juiz:a) Extinguirá o processo com apreciação do mérito. b) Suspenderá o processo até que o árbitro apresente seu laudo. c) De ofício, poderá extinguir o processo sem apreciação do mérito. d) Se alegada pelo réu, extinguirá o processo sem apreciação do mérito. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 19 e) Transformará o processo judicial em arbitragem, nomeando árbitro para dirimir o litígio. Questão 3 (Prova: TJ-SC - 2010 - TJ-SC - Juiz) Assinale a alternativa correta: I. O processo civil brasileiro adota a regra da eventualidade ao impor ao demandado o dever de alegar na contestação, a um mesmo tempo, todas as defesas que tiver contra o pedido do autor, ainda que sejam incompatíveis ou contraditórias entre si, pois na eventualidade de o juiz não acolher uma delas, passa a examinar a outra. II. A convenção de arbitragem não é pressuposto processual por ser matéria de direito dispositivo que, para ser examinada, não dispensa a iniciativa do réu. Caso o réu não a alegue o processo prossegue e é julgado perante a jurisdição estatal. A ausência de alegação do réu torna a justiça estatal competente para julgar a lide e, por inexistir qualquer invalidade, o processo não será extinto. III. A competência absoluta do juízo é matéria de ordem pública sobre a qual não se opera a preclusão pois não está ligada ao princípio dispositivo uma vez que não se trata de direito disponível. A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, compreendidos os graus de instâncias ordinárias, a saber, primeiro grau de jurisdição, apelação, embargos infringentes, recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça. IV. Em ação de reparação de danos por ato ilícito permite-se ao autor que formulara pedido de reparação de danos patrimoniais acrescer, até a citação do réu, sem audiência deste, ou depois da citação, com a aquiescência deste, o pedido de indenização por dano moral, desde que resultante do mesmo ato ilícito. a) Somente as proposições I e III estão corretas b) Somente a proposição III está correta MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 20 c) Somente as proposições I e IV estão corretas d) Somente as proposições II e IV estão corretas e) Todas as proposições estão corretas Questão 4 (7º Exame para Estagiário – MPF/RJ). Assinale a alternativa correta: a) A jurisdição não é una, sendo dividida em vários órgãos jurisdicionais com competência repartida geograficamente e em razão da matéria. b) Jurisdição voluntária diferencia-se da jurisdição contenciosa porque nesta há sempre lide, enquanto naquela não. c) A arbitragem não é jurisdição, mas é considerada pela lei como sendo um equivalente jurisdicional, um meio alternativo de solução de conflitos. d) O direito de ação só existe se também existir o direito material alegado pelo autor. e) Na jurisdição brasileira, a ação não pode ser considerada um direito subjetivo, porque o juiz não tem qualquer dever em prestar a jurisdição. Questão 5 (Assinale a alternativa correta. I. O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução; II. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 21 III. A convenção de arbitragem é o conjunto formado pela cláusula compromissória e pelo compromisso arbitral; IV. A incompetência absoluta, em razão da matéria ou funcional (hierárquica) é tema passível de arguição como preliminar de contestação; é matéria de ordem pública não sujeita a preclusão; é alegável por qualquer das partes, a qualquer tempo e grau de jurisdição, sob qualquer forma. a) Somente as proposições I e IV estão incorretas. b) Somente a proposição IV está incorreta. c) Somente as proposições II e III estão incorretas. d) Somente a proposição I está incorreta. e) Todas as proposições estão incorretas. Desistência, submissão, transação: Tais figuras são acolhidas pelo nosso Código de Processo Civil nos Artigos 485 (extinção do processo, sem resolução de mérito por desistência do autor), e 487 (extinção do processo com resolução do mérito por reconhecimento, pelo réu, da procedência do pedido, transação das partes e renúncia do autor ao direito sobre o qual se funda a ação). Vias alternativas: Tais vias alternativas são hoje largamente difundidas em diversos países, recebendo nomenclatura variada. No Brasil são chamados MASC – Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Nos Estados Unidos foram batizados de mecanismos de ADR – “Alternative Dispute Resolution”. Na Argentina são identificados como meios de R. A. C. – Resolución Alternativa de Conflictos. MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 22 Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: São hipóteses de apelação desprovida de efeito suspensivo, na forma do Artigo 1012, p.1º incisos IV e V, do CPC/15. Questão 2 - D Justificativa: Na forma do Artigo 485, § 3º, c/c com 337, § 5º, ambos do CPC/15, a chamada "objeção de convenção de arbitragem" deve ser alegada pelo réu (não pode ser conhecida ex officio pelo magistrado), e neste caso leva à extinção do processo sem exame do mérito. Questão 3 - E Justificativa: Todas as alternativas estão corretas e elencam regras adotadas no CPC vigente. Especificamente quanto à assertiva II, que nos interessa mais de perto neste momento, embora alguns autores classifiquem a convenção de arbitragem como pressuposto objetivo extrínseco do processo, e outros como condição genérica negativa para o regular exercício do direito de ação, fato é que se não for alegada a tempo pelo demandado, não pode ser examinada ex officio pelo magistrado. Nesse passo, a não alegação da matéria não gera qualquer nulidade no processo. Questão 4 - C Justificativa: A arbitragem é um meio paraestatal de solução de conflitos. Não é jurisdição, na concepção stricto sensu do termo, embora a sentença arbitral seja considerada como título executivo judicial pelo 515, VII CPC/15. Questão 5 - E Justificativa: A assertiva I está correta na forma do art. 239, p. 1º, CPC/15; A II está correta, em consonância com o art. 332, I, CPC/15; A III está correta, por MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 23 estar de acordo com a Lei de arbitragem (9.307/96); E A IV está correta, na forma dos artigos 63 e seguintes do CPC/15.
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