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IV AS ESPÉCIES DOMÉSTICAS E SUA ORIGEM Esquisser rapidement l'histoire de ces animaux c'est tracer les premiers linéaments de la civilisation – H.HOEFER. The knowledge of the evolution of animals in its historical development enables the breeder to reform and improve animal breeding according to the agricultural needs of the country. The problem does not restrict itself merely to questions of the origin and the time of the wild animals domestication; it deals, too, with those of the formation of new productive races and their evolution. - S. N. BOGOLJUBSKY. 1 Nomenclatura das espécies domésticas Foi estudado como e porque se deu a domesticação dos animais. A partir daqui serão estudadas as espécies domésticas, e sua, provável origem. Provável porque, como se verá adiante, essa origem é muito difícil de ser determinada com precisão, porquanto se trata de fatos da pré-história ou dos primeiros tempos da vida da humanidade, dos quais muito pouco ou quase nada se sabe com segurança. As espécies animais domésticas distribuem-se por três, senão quatro, Classes zoológicas: 1. Mammalia - 2. Aves- 3. Insecta. E ainda a dos Pisces, que para alguns autores não devem ser considerados, em nenhum caso, como animais domésticos, embora possam ser criados pelo homem. Na primeira Classe acham-se as espécies mais importantes e o maior número delas. Nas Aves, estão algumas poucas espécies domésticas, sendo a Galinha a principal. Na Classe dos Pisces, têm-se a Carpa e a Tilápia como representantes, mas que ainda não se pode admitir estarem em domesticidade franca. Por fim, entre os Insecta estão os maravilhosos obreiros que são o Bicho-da-seda e a Abelha. Dentre as que mais interessam, têm-se ao todo 32 espécies, no mínimo, incluindo dois Insetos, dois Peixes, onze Aves e dezessete Mamíferos, distribuídos como se verá a seguir. Nesta lista não foram incluídas algumas espécies de Bovinae como o Iaque, o Gaial e o Batengo, bem como o Elefante, pelas razões explicadas a seguir. As espécies de Bovinae não incluídas são as seguintes: Os Bisões constituídos por duas espécies distintas: Bison bonasus (europeu) e o Bison bison (americano). Embora já existam animais domesticados e até raças formadas a partir do cruzamento com bovinos, o Bisão americano vive ainda em bandos, nos parques florestais a eles reservados, nos Estados Unidos e Canadá, oficialmente protegidos contra extinção. É muito comum se confundir o Bisão com o Búfalo, nos Estados Unidos, o que parece impossível visto tratar-se de espécies de gêneros diferentes, uma vivendo no continente americano e a outra na Ásia, originária da índia. O Iaque, Bos (Poephagus) grunniens do Tibé, é uma espécie parcialmente vivendo em domesticidade, pois ainda há uma população de Iaque em estado selvagem; e seu valor como espécie doméstica se restringe ao Tibé. Os três Bibos - o Bantengo, o Gaial e o Gaur - ou são de domesticidade restrita (Bantengo, Gaial) ou permanecem em estado selvagem, tendo falhado as tentativas de domesticação do Gaur. Quanto ao Elefante, cuja espécie mais importante é o Elephas maximus, da Asia (de orelhas reduzidas), é de remota utilização pelo homem (muito antes da era cristã) como animal de trabalho, e como meio de transporte, e ainda como animal de guerra. Os Elefantes africanos pertencem a outras espécies, mesmo a outro gênero - Loxodonta, 36 e apresentam-se bem diferentes, na dimensão das orelhas, por exemplo, que são muito desenvolvidas. O Elefante não deve ser considerado uma espécie doméstica porque sua reprodução e criação não são conduzidas pelo homem, a não ser excepcionalmente. Isto em face das dificuldades provenientes da própria fisiologia desses animais. Sua gestação varia de 18 a 24 meses. A fêmea pare a cada três ou quatro anos. Sua cria mama pelo menos durante um ano, e acompanha a mãe até os cinco anos de idade, atingindo o estado adulto aos 16 anos. Somente depois dos 14 anos é que o elefante é utilizado no trabalho, e esta utilização só aos 30 para 40 anos é que tem sua maior eficiência. Não é para admirar-se, diz ZEUNER (1963), que o homem prefira não ter o encargo de tudo isto, uma vez que é mais econômico deixar que a espécie viva livremente, e capturar e amansar os indivíduos quando necessários para o trabalho. Seu amansamento e treinamento para o trabalho são tarefas fáceis. Conclui-se então que o Elefante não é doméstico, mas é perfeitamente domesticável. O obstáculo ê a grande soma de esforços, de tempo e de despesas para mantê-los em domesticidade. Seria demais antieconômico. Assim o número muitíssimo maior de indivíduos, que levam vida selvagem, em comparação com aqueles em domesticidade não permite classificar a espécie como doméstica. Além de sua criação e reprodução não serem conduzidas pelo homem. Classe MAMMAI.IA Ordem PERlSSODACTYLA I - Família Equidae1 Espécies: Equus caballus Cavalo 1 Equus asinus Jumento 2 Ordem ARTIODACTYLA Sub-ordem Suiformes II - Família Suidae Espécie: Sus scrofa Porco 3 Sub-ordem Tylopoda III – Família Camelidae Espécies: Camelus bactrianus Camelo 4 Camelus dromedarius Dromedário 5 Lama glama Lhama 6 Lama pacos Alpaca 7 Sub-Ordem Ruminantia IV - Família Cervidae Espécie: Rangifer tarandus Rena 8 V - Família Bovidae Sub-Família Caprinae Espécies: Capra hircus Cabra 9 Ovis aries Carneiro 10 1 Deve-se pronunciar équidae, pois o i é breve ou átono, e em português tem-se Équidas ou Eqüídeos. O mesmo para Bovidae (bovidae) e em português, Bóvidas ou Bovídeos (Codificação da Nomenctatura Zoológica). 37 Sub-Família Bovinae Espécies: Bos taurus taurus Boi 11 Bos taurus indicus Zebu 12 Bubalus bubalis Búfalo 13 Ordem CARNIVORA VI - Família Felidae Espécie: Felis domestica Gato 14 VII - Família Canidae Espécie: Canis familiaris Cão 15 Ordem LAGOMORPHA VIII - Família Leporidae Espécie: Oryctolagus cuniculus Coelho 16 Ordem RODENTIA IX - Família Cavidae Espécie: Cavia cobaya Gmlin Cobaia 17 Classe AVES Sub-Classe Neornithes Ordem ANSERIFORMES X - Família Anatidae Espécies: Anser domesticus Ganso 18 Anas boschas Marreco 19 Cairina moschata Pato 20 Cygnus olor Cisne 21 Ordem GALLIFORMES XI - Família Phasianidae Espécies: Gallus domesticus Auct. Galinha 22 Phasianus colchicus Faisão 23 Numida galeata Pallas Galinhola 24 Pavo cristatus Pavão 25 XII - Família P.enelopidae Espécie: Meleagris gallopavo Peru 26 Ordem COLUMBIFORMES XIII - Família Columbidae Espécie: Columba livia domestica Gm Pombo 27 Ordem STRUTHIONIFORMES XIV - Família Struthionidae Espécie: Struthio camelus Avestruz 28 38 Classe PISCES (ACTINOPTERYGII) Ordem OSTARIOPHYSI XV - Família Cyprinidae Espécie: Cyprinus carpio Carpa 29 ClasseINSETA (HEXAPODA) Ordem LEPIDOPTERA XVI - Família Bombycidae Espécie: Bombyx mori Bicho-da-seda 30 Ordem HYMENOPTERA XVII - Família Apidae Espécie: Apis mellifera mellifera Apis mellifera ligustica Abelha 31 Apis mellifera adansonii 2 Origem das espécies domésticas A domesticação das espécies foi um acontecimento por demais remoto, no tempo, para a maioria das espécies que o homem cria. Daí não ter havido nem mesmo tradição oral, que explicasse como ele procedeu nessa tarefa extraordinária, de domesticar os animais. Por isso se torna difícil, senão impossível, determinar a origem precisa dos animais domésticos, na maioria das vezes. Em muitos casos se apresenta como uma empreitada na qual faltam elementos suficientemente seguros, capazes de oferecerem conclusão livre de qualquer dúvida. Mas as hipóteses são inúmeras, e com estas é que se deve trabalhar e ficar contente, na maioria das vezes. De modo geral, a doutrina mais aceita é a de que os animais domésticos são originários das regiões onde se processou sua domesticação. Não é permitido mais acreditar-se que todos eles se originaram da Ásia, como certos autores pretendiam. Os povos asiáticos, emigrando para a Europa e para África, e talvez para a América, levaram consigo certos animais seus auxiliares, e introduziram nas regiões, que iam invadindo, não só esses novos animais, em alguns casos, como introduziram também o uso de se aproveitar o animal selvagem, criando-o para dele tirar proveito maior. Ou seja, domesticando-o. Disso deve ter resultado ainda, certamente, também, uma mistura entre as espécies introduzidas pelos invasores e as locais, de possível domesticação, como é o caso do Porco, o que se verá adiante. Um fator, que pode ajudar a esclarecer a origem de uma espécie doméstica, é o estudo paleontológico dessa espécie. Como diz GROMOVA (1933), "há uma série inteira de problemas que não podem ser resolvidos sem a paleontologia"1. E afirma que por vezes a incerteza no determinar o antepassado selvagem de certa espécie doméstica resulta da “insuficiência do material paleontológico.” 3 Os cães O Cão deve ter sido o primeiro animal domesticado pelo homem, que nele encontrou auxiliar insubstituível na caça, e talvez mesmo na apreensão de outras espécies. São palavras de CORRÊA (1926): "O período neolítico corresponde à aparição da agricultura e dos animais domésticos, o primeiro dos quais foi o Cão, que surge nos kjökkenmöddings de Muge, talvez ainda no estado selvagem, e nos da 1 Part of Paleontology in the study of the origin of domestic animals. 39 Dinamarca já por certo como animal doméstico. O Cão teria sido o auxiliar do Homem na domesticação sucessiva de outros animais". Os detritos fósseis de uma espécie canina, encontrados na Dinamarca, de época anterior àquela das habitações lacustres, constituem prova dessa prioridade do Cão, como animal de domesticação anterior à das outras espécies. "A anterioridade da domesticação do Cão à de todos os outros animais – diz CORNEVIN (1897)- não desperta qualquer objeção; ele foi aprisionado no começo do período neolítico, na época dos kjökkenmöddings, que QUATREFAGES (1891) chamou algures, época do Cão Ele foi primeiramente utilizado como alimento, o que não se deve estranhar, pois, consoante CORNEVIN (1897), os indígenas da Nova Guiné faziam de espécies caninas autóctones, seu alimento principal. Sua primeira domesticação deve ter sido realizada pelos homens do Norte, porquanto nos fósseis da Península Ibérica são raros os ossos de cães, assim como na Itália, onde não se encontrou traço algum dessa espécie nos palafitas, nem no fundo das cabanas neolíticas de origem ibero-ligúrica. Para I. G. SAINT-HILAIRE, entretanto, "é no Oriente que vemos o cão mais remotamente domesticado (1861)." Os autores, a respeito da origem do Cão, dividem-se em dois grupos. Uns com BLAINVILLE, QUATREFAGES, HUNTER e ZIMMERMANN, são propensos a acreditar que uma espécie selvagem única deu origem ao Canis familiaris. As expressões de DIFFLOTH (1915), a esse propósito, são claras: "Em resumo - conclui ele - é bem esta última espécie - Canis pallipes Sykes (pequeno lobo indiano), que deve ser considerada como fonte principal, senão única, de todas as raças européias e asiáticas do Cão doméstico". Para BLAINVILLE, essa espécie única procurada já estaria extinta. Para QUATREFAGES (1891) seria o Chacal, enfim HUNTER e ZIMMERMANN consideravam o Lobo como a fonte dos nossos Cães. Em favor desta hipótese, citam-se dois argumentos. O primeiro seria a esterilidade entre as espécies selvagens, que teriam dado origem às raças de cães, e a fecundidade entre estas. Teria a domesticação feito desaparecer a esterilidade entre esses animais? O outro argumento ter-se-ia no hábito de latir, próprio do Cão doméstico, e que falta nas espécies selvagens, das quais se supõe que ele descende. Apesar disso o Canis latrans, da América do Norte, emite certos sons parecidos com o latido, e o Cão doméstico, que passa ao estado selvagem, perde o hábito de ladrar, com exceção dos cães do Prata, citados por AZARA (1800), nos quais persistiu esse hábito, e todos os demais do Cão em domesticidade. Razões mais poderosas levam, entretanto, a maioria dos autores a opinar pela origem múltipla do Cão doméstico. Dentre estes devem ser citados em primeiro lugar GULDENSTADT e PALLAS, aos quais cabe a iniciativa, e depois EHRENBERG, HAMILTON, SMITH, MARTIN, Dr. MORTON, NOTT e GLIDDON, DAVID LOW, GERVAIS, TILESIUS, SAINT-HILAIRE (1861), e ainda DARWIN (1956) que prolixamente discutiu o assunto. As razões principais, que conduzem a esta conclusão, mais de acordo com a história da espécie, são as seguintes. Desde o começo dos tempos históricos, que se depara com a existência de múltiplas e variadas raças de cães. Por documentos valiosos verifica-se que, na era romana clássica, a diversificação da espécie canina, em raças, já constituía um fato. No ano 640 antes de J. C., figurava num monumento assírio um cão, algo semelhante aos que ainda ali existem. Nos monumentos egípcios das 14ª e 12ª dinastia (3400 a 2100 anos a.C.), estão bem representadas diversas variedades de cães, cuja conformação lembra a do Galgo ou ainda a dos Bassés atuais. Ora, sendo tão remota a existência do Cão doméstico, e desde cedo tão diversificada a espécie em raças 40 inúmeras, ocupando quase todas as regiões do globo, é visivelmente insustentável, pelo raciocínio, que tenha havido uma origem única para todos esses cães; e que essa espécie originária se tenha espalhado por todos os recantos, em tão breve espaço de tempo para isso, e ainda diferenciado tão prontamente em tão grande número de raças, bem distintas. Figura 4 – Este é o pequeno Lobo da Índia (Canis pallipes Dykes) menor e mais esbelto do que o Lobo europeu, e que apresenta também pêlos mais curtos e de cor mais avermelhada. Seu porte é o de um cão Pastor de tamanho médio. Em segundo lugar, a notória parecença dos cães domésticos, com as espécies selvagens autóctones, é outra prova favorável. Assim nas Guianas, o Cão doméstico resultou do aproveitamento de duas espécies de Canis selvagens; América do Norte a semelhança dos lobos (Canis lupus occidentalis) com o Cão dos índios é evidente, observa "RICHARDSON (1829); os cães dos esquimós, por sua vez, lembram os lobos pardos das regiões árticas, não somente pela coloração como pelo tamanho e, além disso, quando cruzados, mostram-se fecundos entre si, donde aproveitarem os íncolas a espécie selvagem,para melhorar seus cães; na América do Sul, nos túmulos peruanos, anteriores à conquista espanhola, o Cão dos Incas foi encontrado em estado de múmia, o que permitiu a NEHRING, segundo CORNEVIN (1897), reconstituir três raças, uma análoga aos cães de pastor, outra aos Bassés e outra ao Bull-Dog; na Europa, os Cães lembram o Lobo pela conformação e pelagem; os Chacais, ali, segundo SAINT- HILAIRE (1861), têm os mesmos hábitos do Cão, quando mansos, se chamados pelo dono, abanam a cauda, murcham as orelhas, lambem-lhe as mãos, deitam-se, tal como se fossem cães domésticos. Sabe-se ainda que os índios das regiões, que o homem civilizado foi descobrindo, serviam-se ou se servem ainda de cães semidomésticos ou quase, que relembram, em geral, espécies de Canis selvagem da mesma região. Demais, a facilidade de reprodução entre o Cão e o Canis selvagem muito fortalece a hipótese em exame. Segundo a afirmação de PALLAS (1780) o Chacal reproduz-se fàcilmente com o Cão no Oriente e igual fato foi observado na Argélia. PLÍNIO refere o costume dos pastores gauleses, que deixavam, nas florestas, suas cadelas em cio, para serem fecundadas pelos lobos. O acasalamento do lobo com a cadela, ou inversamente, da loba com o cão, opera-se sem dificuldade, seja com a intervenção do homem, seja livremente. As experiências que foram feitas, nesse sentido por BUFFON, CUVIER, FLUORENS, e KUHNE provaram a formação fácil de mestiços entre as duas espécies; isto é, de 41 híbridos fecundos de Lobo com o Cão doméstico. A reprodução do Cão com o Chacal também foi obtida experimentalmente, por FLOURENS, durante quatro gerações de descendentes, assim como por KUHNE. A fecundidade entre essas espécies e o paralelismo de formas e de hábitos apresentados por elas é que levam a concluir-se que os Lobos e Chacais são espécies que originaram certas raças de cães domésticos. Acrescente-se a estas mais uma ou duas espécies caninas da América do Sul, e ainda outras espécies de Lobo da América do Norte, da África e da Ásia, e teremos as estirpes selvagens, que certamente formaram, por domesticação, através de cruzamentos ou não, as inúmeras e variadas raças de Cão hoje conhecidas. As diferentes raças, hoje reunidas sob a denominação de Canis familiaris, têm portanto como espécies originárias, provàvelmente, as seguintes: Canis pallipes Sykes da índia; o Canis lupus ou Lobo comum europeu; o Canis aureus, que é o Chacal, talvez origem dos cães de menor porte; o Canis simensis Rüppel da Abissínia, que parece haver produzido certas raças cães Galgos; o Canis lupus occidentalis de Kay, ou Lobo americano,que parece ter dado certos cães dos índios, e que se mostra tão semelhante a estes, que RICHARDSON confessa tê-los confundido, mais de uma vez, deixando de atirar num, bando de lobos americanos, pensando que fossem cães domésticos; o Canis latrans Kay, chamado Cão dos prados, e que deu outra forma de Cão dos íncolas americanos; e ainda espécies de influência muito secundária, mas que mostram essa facilidade do Canis selvagem ser domesticado, aqui e ali, tais como: o Canis ingae Tschudi. dos Incas; o Canis cancrivorus Desmarest, das Guianas; o Canis mesomelas Schreber, África meridional, e outras. 4 A Cabra e o Carneiro Depois do Cão é possível colocar a Cabra, em ordem de antiguidade, no estado doméstico. Seus detritos fósseis, da mesma época que os do Carneiro, são mais abundantes, o que denuncia pelo menos maior generalização de seu uso. É o ponto de vista de CORNEVIN (1891). Participando dessa mesma opinião, CRÉPIN (1906) imagina ter sido ela o primeiro animal leiteiro, que o homem conheceu e utilizou. Em apoio disso, é possível lembrar certa coluna existente no Museu de Hal, Bélgica, onde se descobre uma cena formada por pastores, que se entregam à ordenha de diversas cabras. Essa coluna remonta a quatro mil anos antes de Cristo. BRANDT (1885), que exclusivamente estudou a etnografia dos Caprinae, pôs fora de dúvida o ponto de vista de GULDENSTADT, PALLAS (1780), A. WAGNER, CUVIER de que a Cabra provém de uma espécie única asiática, a Capra aegagrus Pall, ou Cabra-bezoar, dos planaltos mais ocidentais da Ásia. Para 'BRANDT (1885) houve a colaboração provável da Capra talconeri A. Wagner, da área geográfica já mais oriental do que aquela, ou melhor, indiana, e cujos chifres são em espiral. A Cabra-bezoar ainda sobrevive em certos pontos da Ásia menor, no maciço do Cáucaso e nas montanhas da antiga Pérsia. Entretanto, com a descoberta fóssil, de mais um tipo remotíssimo de Capra, por ADAMETZ (1926), pensa-se ser esta a mais primitiva. A Capra prisca, de ADAMETZ, extinta, parece então ser o tronco primitivo procurado. 42 Figura 5 - Capra aegragus Pall, ou Cabra-bezoar (Cópia tomada em Kronacher - Allgemeine Tierzucht), é uma das formas primitivas que originaram a Cabra doméstica. No decorrer dos tempos pré-históricos ainda, acredita-se que a Capra aegagrus diversificou-se em duas formas: uma, a Capra hirdus das turfeiras (Rütimeyer), de chifres médios e pouco torcidos para fora, e outra, a Capra hircus de Keller, ou da idade do bronze, de grandes chifres espiralados e de porte maior. Quanto ao Carneiro, sabemos que ele foi companheiro do Homem, já nas habitações lacustres da Suíça, mas deve ter sido domesticado primitivamente na Ásia, de onde passou à África e ao sul da Europa, já em domesticidade. Nesta questão da origem do Carneiro, o ponto de vista de KELLER (1902-1905), parece ser o mais aceitável, porque com ele é possível explicar, até certo ponto, a grande variação que apresentam as raças ovinas. Assim, três seriam as fontes das modernas raças de carneiro: o Ovis musimon Schreber, o Ammotragus tragelaphus Gray e o Ovis arkal. Figura 6 – Crânio de Muflon (Ovis musimon Schereber) visto de frente (Nathusius, 1872). 43 . Figura 7 – Crânio de Ammotragus tragelaphus Gray visto de frente (Nathusius, 1872). O primeiro é o Mouflon (carneiro selvagem da Europa), ainda hoje encontrado ali, e que fundou o grupo de ovinos europeus, propriamente ditos. O segundo é um Pseudovino, e originou os carneiros africanos. O terceiro e último citado, Ovis arkal, deverá ser o mais antigo e ainda o mais importante: asiático de origem emigrou já domesticado. Depois, certamente cruzando-se com aqueles dois outros, constituiu a maioria dos ovinos domésticos conhecidos. Sua cauda longa é característica. Chamam- no Carneiro das estepes da Ásia. E o Carneiro das turfeiras (Ovis aries palustris Rütimeyer) seria, então, um derivado desta espécie. 44 Figura 8 – Capra falconeri A. Wagner, do Tibé (Parque zoológico de Hagenbeck) – Da Zootecnia de Kronacher – É considerada um dos antepassados da Cabra doméstica. A hipótese de NEHRING é semelhante a esta. Para ele, três foram também os troncos originários do ovino doméstico: o Mouflon, o Carneiro das estepes da Ásia, de cauda longa, e algumas raças selvagens da Ásia central. 45 Figura 9 – Mouflon (Ovis musimon Schreber) que é o Carneiro selvagem da Europa, e uma das formas primitivas do Ovis aries ou Carneiro doméstico ( Da “Vida dos Animais “de Brehm). JULIUS KUHN (1919) é de opinião, porém, que o Mouflon (Ovis musimon) é o tronco de onde partiram as raças domésticas, de hoje. Opinião esta a menos aceita pelos autores. 5 Os Bovinos Todos os Bovidae (Gray, 1821), domésticos ou não, descendem de um tronco filogênico comum: o Antilope do mioceno e plioceno, o qual originou, aliás, todos os cavicórneos também: Ovis, Capra, Antílope, Bos, etc. Três são as espécies de Bovinae (Gill, 1872) citadas, nomapa das espécies domésticas, normalmente exploradas pelo homem: o Boi - Bos taurus, o Zebu, Bos indicus: e o Búfalo, Bubalus bubalis. Além destas três espécies, existem mais algumas da subfamília Bovinae, que ou são de domesticação restrita ou duvidosa, ou que não são domésticas, sendo reduzida, ou nenhuma, sua importância zootécnica, em face daquelas duas primeiras citadas. São elas: O Bantengo (Bos (Bibos) banteng Wagner), que vive em domesticidade, bem como no estado selvagem na península de Málaca, Java, Borneo, Bali, é o animal mais belo deste grupo, sendo muito apreciado como animal de sela e como animal para corte. O Iaque (Bos (Poephagus) grunniens), chamado "Boi grunhidor" e também "Boi de cauda de cavalo", cuja cabeça se aproxima dos taurinos, e o andar e o corpo se assemelham aos do Cavalo - habita os altiplanos do Tibé, sendo próprio de regiões frias e é muito utilizado como animal de carga. Seu leite é muito apreciado e ainda seus pêlos. Nas regiões sem vegetação,- seu estrume serve de combustível. Ali ele vive também ainda em estado selvagem. O Gaial (Bos (Bibos) frontalis Lambert) ou Boi das selvas da Indochina e índia é criado pela sua carne e pelo seu couro. As espécies consideradas selvagens deste grupo, são os Bisões e o Gaur. 46 Os Bisões: Bison bonasus Wagner (europeu) já está desaparecido ou quase, e o Bison bison L. é criado em liberdade nos Parques Nacionais dos Estados Unidos e do Canadá. O Gaur (Bos (Bibos) gaurus H. Smidt) é um dos maiores bovinos atuais, habitando as montanhas da Índia, na Birmânia, Assam e Málaca. Não pode, de nenhum modo, ser considerado uma espécie doméstica; estando no mesmo caso dos Bisões; todos os ensaios de domesticação, tentados na índia, não deram resultado positivo. E a propósito E. H. BAYNES nega sua domesticidade, embora acredite em uma possível domesticação, erroneamente, aliás, e explica: "Ele é atualmente um park animal", isto é, um animal de vida livre nos parques florestais do governo, selvagem, portanto. DUERST (1886) dividiu esta subfamília em três grupos: 1. Bubalina, subdivididos em Probubalinos: Probubalus depressicornis; e os Bubalinos: Búfalos asiáticos e africanos. 2. Taurina, subdivididos em Protaurinos: Gaur, Gaial, Bantengo; e taurinos: Boi europeu e Zebu. 3. Bisontina, subdivididos em Probisontinos: Iaque; e Bisontinos: Bisão americano e Bisão europeu. Destes, os dois tipos étnicos mais aproximados são o Bos taurus e o B. indicus, isto é, o Boi europeu e o Zebu, ou ainda, o Boi taurino ou europeu, e o Boi zebuíno ou indiano, os quais, alguns pretendem reunir numa mesma espécie, e, então, o Boi giboso seria apenas uma variedade de Bos taurus por causa da fecundidade indefinida dos híbridos (ou mestiços) entre as duas espécies em questão. Dentre os animais primitivamente domesticados, observa SAINT-HILAIRE (1861), são esses dois - Bos taurus e Bos indicus, os de origem mais difícil de determinar, depois do caso da origem do Cão doméstico. Esta observação continua exata, ainda hoje. Consultem-se os autores, e não se encontrará uma harmonia de opiniões, ou coisa que satisfaça. O que, se possa colher a respeito será, sempre, matéria para controvérsias. Os taurinos foram domesticados parece que posteriormente ao Cão, à Cabra e ao Carneiro; todavia na mesma época pré-histórica da pedra polida. Desde os tempos mais remotos da civilização egípcia (antes da 3ª dinastia, 4.000 anos a.C.) admite-se ter havido ali bois de trabalho, utilizados pelo homem nos trabalhos de remoção da terra para mudar o curso do Nilo. Pelo ano de 1550 o único bovino selvagem, ainda encontrado na Europa, e que parece ter responsabilidade na formação das raças atuais, era o Auroque ou Urus, identificado como sendo o Bos primigenius, de Bojanus. Segundo CUÉNOT (1932), o último representante dessa espécie desaparecida teria morrido em 1627, no Jardim Zoológico de Masovia. A domesticação do Boi, animal de grande porte, pode levar a indagar-se, segundo ZEUNER(1963), porque essa preferência do homem primitivo, se ele bem podia dedicar-se à domesticação de espécies menores. Pela necessidade de carne não deve ter sido, argumenta ele, visto que naquela época não deveria esta ter escasseado, em face do recurso da caça e da pesca. Na opinião de ZEUNER, o interesse estava no couro do Boi, material para a confecção de escudos de arma, muito mais resistente, além de poder servir para outras aplicações de enumeração desnecessária. Para ZEUNER, não deve ser considerado exagero, dizer que a domesticação do Boi foi o passo mais importante dado pelo homem, no sentido da exploração dos animais, depois da domesticação do Cão. 47 Figura 10 - Gaial, Iaque e Gaur - respectivamente, Bos frontalis, Bos grunniens e Bos gaurus. O Bos primigenius teria sido criado pelo homem, que habitava as cidades lacustres da Suíça, no período neolítico. LINEU e BUFFON, e também PALLAS (1780), na verdade, foram os primeiros a considerar o Auroque como uma forma do Boi doméstico, sem confundi-lo, porém, com o primigenius, pois somente em 1825 é que BOJANUS imaginaria a existência deste. VUVIER (1834), discordando, com DAUBENTON, desse ponto de vista, achava que a fonte remotamente primitiva, de todas as raças bovinas, devia ser alguma espécie já extinta, que se encontraria entre os fósseis de bovinos tirados dos terrenos de aluvião. BOJANUS, então, naquele ano atrás citado, classificou com a designação de Bos primigenius, certa forma bovina fóssil, que foi achada em vários pontos da Europa: Suíça, Grécia, Itália e ainda na África (Argélia) e na Ásia. Como se vê, numa área geográfica enorme. Figura 11 - Manada de Búfalos pretos, leiteiros e mansos no curral da Fazenda São Joaquim, Marajó. O Auroque era um bovino de grandes proporções, com 2 m garrote, e 3 m a 3½ de comprimento. Os animais, vistos por CÉSAR, segundo sua própria descrição no De bello galico, e que viviam aos bandos, livres, na imensa floresta herciniana daqueles tempos, parece que não seriam outra coisa que o Auroque, forma sobrevivente provável do Bos primigenius. DARWIN (1879) é um dos que assim pensam. Eram pouco menores do que um elefante, porém com os característicos de um touro, explica CÉSAR. 48 Em DARWIN (1897), encontrar-se-á a afirmação de que certos bovinos semi- selvagens, ainda em seu tempo (segunda metade do século dezenove) existentes no parque de Chillingham, na Inglaterra, devem ser considerados como formas muito aproximadas dos Auroques. RÜTIMEYER (1861), examinando o crânio de um desses animais, opinou serem eles os que mais deviam se assemelhar ao Bos primigenius Bojanus, dentre todas as raças conhecidas. Em 1907, descendentes desses animais ainda viviam, segundo contou o LOISEL, ao narrar a visita, que fizera, a Chillingham, e ainda ao parque e Cadzow, do duque de HAMILTON, onde também deparou bovinos semelhantes àqueles. A extensa área geográfica, na qual parece ter vivido esta espécie pré-histórica de bovinos, a julgar pelas ossadas encontradas até na Ásia, e ainda a existência de bois domésticos na Assíria e no Egito, absolutamente não confundíveis com o Zebu, segundo o testemunho das gravações em monumentos muito anteriores à civilização ocidental, levam à convicção de que o Bos primigenius deve ter sido domesticado na Ásia, e dali trazido, já como auxiliar do homem, para a Europa e África. Esta hipótese é ainda defendida pela filologia, como o provaram JOLY e PICTET, escreveu DARWIN (1879): "Segundo estes dois sábios, os nomes dados ao Boi, ao Touro e à Vaca, nos diversos povos europeus,são de origem asiática, particularmente zenda e sânscrita, e, por conseguinte ariana, segundo PICTET". Cabe agora a citação daquela forma bovina, imaginada por MEYER, o Bos trochoceros. Trata-se, porém, de uma espécie mais do que duvidosa, porquanto RÜTIMEYER determinou como sendo a de uma fêmea do próprio Bos primigenius. Outro bovino, que se presume ter existido na Europa, caracterizado pelos seus cornos, seu tamanho reduzido, suas, pernas finas, cujos detritos ósseos foram descobertos na Suíça, no Tirol, na Silésia, na Inglaterra, é o Bos brachyceros ou "Boi das turfeiras", segundo a nomenclatura de RÜTIMEYER, ou Bos longifrons de Owen, conforme a sinonímia proposta por WILKENS. Constitui uma espécie anterior ao Bos primigenius, e não tem representantes selvagens ou precursores europeus. Deve, pois, ter vindo da Ásia já com uma forma definida. E segundo DAWKINS (1866), teria sido levado para a Inglaterra, já doméstico, onde serviria de vitualha aos legionários romanos. A última forma de bovinos primitivos aparecida foi o Bos frontosus de Nilsson, um dos tipos naturais mais bem definidos, segundo DECHAMBRE (1914). Ela parece ser o resultado de um cruzamento entre as duas primeiras: Bos primigenius e Bos brachyceros. Fósseis de Bos frontosus foram encontrados na Suíça, no último período geológico, ao lado do Bos longifrons, por NILSSON (1911), assim como nos palafitas da Suíça, por RÜTIMEYER. Caracteriza-se por uma marrafa alta, en toit demaison, como diz ZWAENEPOEL (1920), e de porte maior do que o Bos longifrons. Finalmente, deve ser citado ainda o Bos akeratos ou boi sem chifres, de Arenander, que o considerou o Boi pré-histórico mais remoto. Este ponto de vista do eminente professor de zootecnia sueco é insustentável, em face do que sabemos hoje a respeito da mutação mocha, nos bovinos modernos. Aliás, bem balanceadas as coisas, talvez não se deva levar tanto a rigor essa classificação em três ou quatro tipos bovinos pré-históricos. A franca fecundidade entre elas, a possibilidade de se misturarem umas com as outras, a grande variabilidade do característico fundamental considerado - o crânio, que não apresenta, de nenhum modo, a extrema fixidez suposta pelos naturalistas classificadores - são os motivos suficientes, para isso. Tanto é assim que alguns autores reduzem essas formas a duas apenas, ou até a uma única, por não encontrarem elementos bastante convincentes de diferenciação. 49 Figura 12 – Bison bison ou Bisão da América. DAWKINS (1866), autoridade indiscutível na matéria, identifica o Bos frontosus, de Nilsson, com o Bos longifrons de Owen. Por outro lado o Bos longifrons, já passou à sinonímia do Bos bracyceros de Rütimeyer, para quase todos os paleontologistas, Enfim, DAWKINS, NEHRING e WERNER acham que o Bos longifrons não passa de uma variação do Bos primigenius, operada na Europa. MORSE (1910), depois de citar essas formas fósseis, fortemente relacionadas com o Bos primigenius, remata: "De fato elas são tão estreitamente aproximadas que algumas ou talvez todas elas possam ser consideradas com variedades do Bos primigenius". Figura 13 – Urus ou Boi selvagem primitivo europeu, e suposto antepassado do Boi doméstico, identificado como Bos primigenius Bojanus. Cópia de uma pintura estampada por primeiro no livro de Cuvier “Reino animal”, editado em 1827 – Essa pintura presume-se datar de 1500 (indicações de Nehring) – Da Cycl. Of Am. Agric.). Outro problema a resolver é quando se procura filiar as raças bovinas atuais às formas primitivas. O Bos primigenius, por exemplo, teria dado o tipo retilíneo da classificação de BARON (1888), segundo DECHAMBRE (1914), ou o Bos taurus ligeriensis de Sanson; ou o Bos taurus batavicus, raça dos Países-Baixos, e o Bos taurus asiaticus, grande raça parda das estepes, conforme RÜTIMEYER e outros. O Bos brachyceros, para RÜTIMEYER, seria a fonte do Schwyz, autóctone do sudoeste da Suíça, ou em geral do gado cinzento da Europa central e do sul, consoante o ponto de vista de DECHAMBRE (1914); e ainda das raças Tarantesa, da Gasconha, da 50 Córsega, de Aubrac e outras afins; enquanto SANSON (1907) já vê nele o tronco do Bos taurus alpinus, o que se harmoniza com as opiniões anteriores. O Bos longifrons, ou tipo concavilíneo de DECHAMBRE (1914), é para OWEN a forma primitiva do gado Highland e da raça do País de Gales, e segundo outros sê-lo- ia também da raça dos Países-Baixos (DECHAMBRE, 1914). O Bos frontosus teria dado, para DECHAMBRE, os tipos convexilíneos atuais; segundo NILSSON, o gado montanhês da Escandinávia; e para SANSON, o Bos taurus jurassicus, ou seja, as raças Simental, Friburguesa, Pinzgau e mais outras afins. Certos autores suíços acham que o gado melhorado, da Suíça, não é autóctone; deve ter vindo com os Burgôndios, quando invadiram aquela região. O gado dos invasores deveria ser de fonte escandinávica, daí pretender-se filiar aqueles bois malhados aos Bos frontosus, que NILSSON (1911) encontrou em estado fóssil naquela península. SANSON opinava, entretanto, que havendo os Burgôndios partido do norte da Germânia, onde não foram encontrados fósseis do Bos frontosus, é bem provável que essa raça de bovino pré-histórico tenha sido levada para a Suíça de outra parte da Europa e não da Escandinávia. A seu ver, provavelmente do planalto da Bresse, na França, no extremo sul do Jura, donde o nome de Bos taurus jurassicus dado por ele. Quanto à forma bovina sem chifres, ARENANDER (1898) ao depará-la nos palafitas, considerou-a um tipo étnico distinto, denominando-o Bos akeratos. Para ele, esta seria a fonte e origem das outras formas bovinas. SANSON (1907), inspirando-se em HERÓDOTO (500 anos a.C.), achou que o gado mocho deve ser originário da Cítia, sudoeste da Rússia asiática, pelo que lhe deu nome de Bos taurus scythicus. Dali ter-se- ia espalhado pela Europa e por toda a parte. A forma mocha é das mais encontradiças, em todos os países, acentuadamente nas regiões européias do Norte. Gado mocho existiu na Suíça palafita, nas turfeiras na Irlanda, na Holanda, no Egito das primeiras dinastias, na Cítia, no Turquestão, na Arábia, nas índias Ocidentais. Sua existência remota, entre os Citas, foi denunciada não somente por HERÓDOTO, mas também por TÁCITO, ESTRABÃO, HIPÓCRATES. Presentemente existe em quase todos os países, onde se criam raças bovinas. Até na África há raças mochas. Por tudo isso se torna pouco aceitável admitir-se um tipo étnico único, a servir de tronco a todo o gado mocho. Este o ponto de vista de BARON (1888), embora sua explicação, sobre o aparecimento do mocho, seja por demais imaginosa. Achava ele que a perda dos chifres devia ter-se operado a partir da forma mais chifruda que, de repente, apresentaria variação em seus descendentes. Para DUERST (1886) seria antes um dos resultados da domesticidade. Para prová-lo, chama a atenção para o fato de serem Cabras de chifres enormes as que se acham figuradas nos monumentos egípcios, enquanto que os atuais representantes são de corpos reduzidos ou sem chifres. E lembra ainda que, no tempo dos Faraós, todos os Carneiros eram armados, o que hoje já não é regra geral. HERÓOOTO (500 anos a.C.) ao registrar a existência de um gado sem chifres, entre os Citas, procura explicar o fato atribuindo-o ao rigor do frio, que reprimia o crescimento ou a formação deles, do mesmo modo que o calor o aceleraria. 51 Figura 14 – Bos primigeiuns Bojanus (Cornevin – Zootechnie Générale). Nenhuma dessas hipóteses é aceitável. O aparecimento do caráter mocho pode ser, hoje, convenientemente explicado, tendo-se como base a teoria da mutação. Trata- se certamentede uma variação do gênero das mutações. Variação de que a espécie é capaz, sem consideração de tempo ou de espaço. Não constitui, entretanto, apanágio do Bos taurus, pois surge também em caprinos e ovinos. Seu aparecimento só pode, então, ter-se operado posteriormente à formação da espécie provida de chifres, como todas as espécies do mesmo gênero, e da mesma família, as quais têm, no Antílope do mioceno e do plioceno (armado de chifres), o seu antepassado remoto e comum. E isso tanto se deu antes da domesticação, como já no estado de domesticidade. Certamente quando a variação ocorreu em domesticidade, ela deve ter sido mais facilmente insulada e fixada pelo homem, que viu nela talvez uma vantagem, ou, no mínimo, uma novidade. Figura 15 – Bos frontosus Rt., Nilsson; Bos trochocheros Meyer (Cornevin – Zootechnie Générale). Os Zebuínos, como ficou explicado, devem ser considerados como espécie diferente dos Bos taurus, obedecendo-se à classificação de LINEU, e tendo em vista o esquema de CUÉNOT (1936): diferenças morfológicas e fisiológicas, e de natureza ecológica. Essas diferenças são, em síntese, as seguintes: o Zebu é uma espécie tipicamente tropical, contrariamente aos taurinos, que são de clima temperado; possui uma giba típica, que já está presente no feto de poucas semanas; seu frontal fica quase ao nível dos parietais; tem a menos uma vértebra sacra e três coxigianas, e suas 52 vértebras dorsais apresentam a apófise espinhosa muito desenvolvida, mormente a primeira, além de voltada para trás; suas orelhas são desenvolvidas e pendentes, e a barbela é característica pelo seu desenvolvimento, estendendo-se até ao "prepúcio ou umbigo"; pele ampla e provida de maior número de glândulas sebáceas (das observações de NAY e HYMAN (1956), sabe-se que em média os zebuínos apresentam 1.300 glândulas sudoríparas por cm2 e os taurinos 994, apenas; gestação geralmente um pouco mais longa (290 dias); voz distinta e inconfundível; aparelho digestivo de maior atividade assimiladora; pronunciada resistência ao calor e à insolação. Como se vê, não se trata de um ou dois caracteres distintos, mas sim de alguns e de vária natureza, que tornam as duas espécies inconfundíveis. A domesticação do Zebu deve ter-se operado muito remotamente, pois os Babilônios, Assírios, Egípcios deixaram em seus monumentos provas de que criavam esta espécie. A demonstração mais positiva, porém, de sua remota domesticidade, devemos aos Egípcios, cujos monumentos, de 2.100 anos a.C. (1ª dinastia), apresentam bois com giba inconfundíveis, ao lado de outros sem ela. Segundo DASGUPTA (1945) deve ser um acontecimento dos mais remotos - uns 3.000 anos a.C. É o que se pode depreender do famoso sinete Mahenjodaro, que data dessa antiguidade, e no qual se depara um Zebu com chifres em lira alta. Sua origem parece ser asiática, e indiana, pois é na Ásia onde se encontram as diversas formas selvagens de Bovinos, sobreviventes. Mas se assim é, houve uma diversificação na espécie, donde ser aceitável a classificação de WERNER (1902) em Bos zebu variedade indicus (Zebu asiático ou indiano) e Bos zebu variedade africanus (Zebu africano). O que nos interessa, porém, é o Bos zebu indicus Werner, ou simplesmente Bos indicus L. É o mais importante economicamente e é a espécie que criamos no Brasil, vitoriosamente. Sua área geográfica é imensa, maior do que a do Bos taurus taurus, considerando as duas subespécies de WERNER, conjuntamente: Índia, Indochina, Pérsia, Arábia, China, Austrália, Africa, Brasil, Antilhas, Estados Unidos, México e países sul-americanos, com exceção do Chile e Uruguai. Qual será sua origem étnica? Não se conhece. Segundo a hipótese de KELLER (1909-1913), o Bos sondaicus, Mull ou Bantengo seria o suposto antepassado do Bos indicus. Donde sua classificação: Bos sondaicus indicus, para o Zebu da índia, e Bos sondaicus africanus para o Sanga ou Zebu africano. A semelhança na conformação craniana foi o que levou a essa hipótese de parentesco direto entre o Zebu e o Bantengo. LYDEKKER (1898) vê no Bos namadicus Falconeri uma das formas primitivas de Bovino indiano. O Bos namadicus ou Bos acutifrons foi um Bovino selvagem do pleistoceno, cujos fósseis abundantes no vale do Nerouda (Índia), Falkner e Lydekker tanto estudaram. Tais fósseis apresentam enorme variabilidade, indo desde sua aproximação com o Bos primigenius de um lado, até com o gênero Bibovino, de outro – diz Adametz (1926), e podem ser considerados com segurança como descendentes do Boi selvagem asiático, aproximado do Bos primigenius europeu, e procedente direto do Bos namadicus. 53 Figura 16 - O Zebu, na expressão artística da remota civilização egípcia (De Saint- Hilaire- Acclimatation et Domestication). Por outro lado verifica-se a presença, na Ásia, de um Bovino pequeno, cornicurto, provido, em algumas regiões, de pequena giba de gordura, cujo crânio se aproxima do Bos brachyceros europeu, mas que não pode ser com este confundido, o que faz crer que a forma namadicus originou certamente, por mutação, as duas formas: Bos asiático primigeniforme, e Bos asiático braquícero. Nenhuma forma selvagem do Zebu se conhece. ZEUNER (1963) acha admissível que o Zebu é o "descendente direto" daquela forma selvagem, encontrada através de todo o Pleistoceno, na índia, e que não é outro que o Bos namadicus. O Búfalo (Bubalus bubalis Lyd.) é criado em todo o sul da Ásia (Índia, Paquistão), no Japão, China, arquipélago malaio; no sudoeste da Europa (sul da Rússia, Balcans, Hungria, Itália meridional); na África (Egito); e na América (Antilhas, e principalmente no Brasil em todos os estados). Originário da Ásia, sua introdução na Europa data dos meados do primeiro milênio de nossa era, e na Itália parece que desde o ano 595 depois de Cristo, vem sendo utilizado nas regiões pantanosas meridionais. No Brasil, os primeiros rebanhos se estabeleceram em Marajó, no começo deste século. O Búfalo doméstico descende do Bubalus Arni. 6 O Porco Este é o único artiodátilo monogástrico, vivendo em domesticidade. Pertence ao gênero Sus, aparecido no velho mundo durante a época quaternária. A América não possuía nenhum representante desse grupo, entretanto nela vive o Dicotyles, gênero que dele se avizinha, mas que não é absolutamente domesticável (nossos porcos do mato), como não o são os animais pertencentes ao gênero Babirussa Cuv. (Porco-cervo, de Celebes, Malucas, Índia), Phacochoerus Cuv. (Porco-de-verruga, da África) e Potamochoerus Gray (da África) todos da família dos Suidae. Durante muito tempo discutiu-se a respeito das espécies constituintes do gênero Sus, espalhado numa extensa área geográfica, e apresentando grande variabilidade de forma. Isto deu margem a multiplicar-se o número de espécies, o que, em vez de simplificar a questão, mais a tem dificultado. CORNEVIN (1897), pondo esse fato em evidência, chegou a organizar um pequeno quadro, no qual estão arroladas as opiniões de alguns dos principais naturalistas, que cuidavam do assunto, naquele tempo (1891). Esse quadro é o seguinte: 54 Classificação segundo vários autores De Claus De Brehm De Chenu De Forsyth Major De Nathusius Major Sus scrofa Lineu Sus scrofa Lineu Sus scrofa Lineu Sus scrofa Lineu Sus scrofa Lineu Sus indicus Pallas Sus leucomystax Br. Sus papuensis Lesson Sus vittatus Temmink Sus indicus Pallas Sus verrucosus Muller & Sechlegel Sus vittatus Wagner Sus verrucosus Muller & Sechlegel Sus verrucosus Muller & Sechlegel » » » Sus pliciceps Gray Sus andamanensisSus cristatus Temmink Sus barbatus » » » Sus vittatus Temmink — — — » » » Como se vê, o único ponto no qual há concordância é quanto ao Sus scrofa, que aparece em todas as classificações. No mais, reina visível desarmonia. Ora, isto é uma prova de fragilidade de tais diferenciações específicas, quando elas se esmeram em criar sempre espécies novas, em face de cada forma que aparece para ser identificada. O ponto de vista de NATHUSIUS (1872), partilhado por grande número de autores, é que todas as raças conhecidas de porcos podem ser filiadas a dois grandes grupos específicos: Sus scrofa, de Lineu, e o do Sus indicus de Pallas. Na verdade, a maioria dos paleontologistas chegou à conclusão de que só podem ser aceitas como espécies distintas, duas formas fósseis do período neolítico, exatamente o Sus scrofa, representado pelo Javali, atual, da Europa, e o Sus indicus de Pallas, pois o Sus palustris de Rütimeyer deve ser filiado ao grupo indicus e o Sus vittatus Temmnik (de Java) está equiparado, por NATHUSIUS, ao porco oriental (Sus indicus). Figura 17 - Javali ou Sus scrofa, que é o Porco selvagem europeu, e uma das espécies que deram origem ao Porco doméstico. A única sobrevivente, aliás. Estas duas formas fósseis foram encontradas, não apenas nos pala fitas da Suíça, mas ainda nas turfeiras do Lonato (Itália), e na estação lacustre de Ripac (Bósnia). A mais abundante, contudo, é a do Sus indicus, cuja freqüência é esmagadoramente maior do que a do Sus scrofa. Esta é uma forma mais desenvolvida do que o Sus indicus, e para alguns a primitiva e originária. Sua área geográfica é extensa. Possui hoje ainda representantes selvagens na Europa na Ásia. "O Sus scrofa da Europa e os Javalis orientais assemelham-se tanto - escreve I.G. SAINT-HILAIRE (1861)- que não é possível ainda determinar exatamente as diferenças específicas entre eles". 55 O Sus indicus só é conhecido atualmente por suas formas domésticas, pois dele não existe nenhuma forma selvagem, salvo uma, muito aproximada, que é o Sus vittatus, de Java, e outros tipos próximos. Daí o Sus vittatus ser citado como a espécie asiática que, com o Sus scrofa deu origem ao Porco doméstico. A coexistência das duas espécies fósseis, nas mesmas regiões exploradas, a grande área geográfica onde se acha disperso o gênero Sus, a extrema maleabilidade que ele apresenta e mais a fecundidade franca entre todas as formas porcinas, selvagens ou domésticas, hoje conhecidas, permitem concluir que se trata de duas formas, uma derivada da outra, mais remota. Para CORNEVIN (1897), o Sus indicus seria anterior: "As descobertas dos paleontologistas impõem esta conclusão" (1891). Aliás, esse é o ponto de vista de SAINT-HILAIRE, NATHUSIUS e KARL VOGT. CUVIER, BUFFON e NEHRING são pela unidade específica de todas as raças de Porcos. O primeiro e o último, pelo menos, são partidários de dar prioridade ao Sus scrofa, do qual todos os outros seriam derivados, inclusive o Sus indicus, espécie considerada não legítima. SANSON (1907), mais Zootecnista do que etnólogo, colocou-se nesta questão em posição unilateral e solitária, negando parentesco direto entre os porcos domésticos e o Sus scrofa. São palavras suas: "Quanto ao seu parentesco com o Javali da Europa, cremos ter há muito demonstrado não ser admissível tal coisa, baseando-nos ao mesmo tempo sobre os caracteres essenciais da fórmula vertebral, sobre os do crânio e sobre os outros caracteres exteriores". Adiante, referindo-se à opinião de CUVIER e à de SAINT-HILAIRE (1861), escreve que nem uma nem outra podem ser admitidas, após o que suas pesquisas provaram, isto é, a existência de uma diferença numérica de vértebras, entre os porcos domésticos da Europa ocidental e meridional, da Ásia oriental e o Javali europeu. "Como não é permitido supor que, tornando-se doméstico, o Javali tenha ganhado uma vértebra na Europa e perdido outra na Ásia, é-se forçado a concluir que todas essas espécies de Suídeos são igualmente naturais, e que tiveram origens distintas". E não querendo entrar na filogenia remota das espécies, appartenant ou domaine de la pure imagination, divide os suínos atuais nos três tipos clássicos: Sus asiaticus, Sus ibericus e Sus celticus, de acordo com o perfil craniano e as orelhas1. Asiático: perfil ultra-côncavo e orelhas pequenas, em pé, Ibérico: perfil côncavo e orelhas médias, semi-eretas. Céltico: perfil subcôncavo e orelhas grandes cabanas. Esta classificação pode servir como elemento de trabalho, em zootecnia. Falta- lhe, contudo, rigor, porquanto se propõe estabelecer distinções e firmar grupos dentro de uma população que, certamente, sofreu cruzamento apreciável, e cuja variabilidade é tida como uma das mais extensas entre as espécies domésticas. DARWIN (1879), por outro lado, aceitando a conclusão a que chegou HERMAN VON NATHUSIUS (1872), opina pela dualidade de espécies. "Depois de ter lido as descrições e as observações de NATHUSIUS - escreveu ele - parece-me que seria fazer jogo de palavras, por em dúvida a distinção específica do Sus indicus, pois as diferenças assinaladas (na largura do crânio, nos ossos lacrimais e palatinos, e na dentição) são mais.fortemente acentuadas do que as que se apontariam, por exemplo, entre o Lobo e a Raposa ou entre o Jumento e o Cavalo." É preferível, pois, considerar dois grupos específicos, um scrofa e outro indicus (ou melhor, asiático, pois este nome é apenas uma deferência feita por NATHUSIUS a PALLAS, que primeiro assim classificou esta forma do gênero Sus). Isto seria, aliás, aceitar o critério não só de NATHUSIUS e de DARWIN, seu comentarista, mas ainda o de PALLAS (1800) e BLAINVILLE. 1 Asiático: Perfil ultracôncavo e orelhas pequenas, em pé. Ibérico: perfil côncavo e orelhas médias, semi- eretas. Céltico: perfil subcôncavo e orelhas grandes cabanas. 56 Sus scrofa e Sus indicus (Sus vittatus, forma sobrevivente) misturando-se em domesticidade, certamente é que deram origem a esse grande número de raças porcinas, hoje exploradas em todas as partes do mundo. As raças napolitanas, andaluzas, húngaras, krause de NATHUSIUS, etc. são raças grandemente cruzadas com o Sus indicus, o que se descobre pelos caracteres cranianos. Diz NATHUSIUS que a infusão de 1/32 de sangue indicus, numa variedade tipicamente scrofa, será o bastante para modificar o crânio desta. A aptidão à engorda foi um dos característicos trazidos pelo porco oriental, nos seus cruzamentos com o porco europeu no qual esse atributo não se apresentava tão acentuadamente, ou talvez mesmo estivesse ausente. O porco foi o último, na ordem cronológica, dos animais domesticados na Europa, no período neolítico, ou então, ali existentes. RÜTIMEYER chegou a supor, examinando certas particularidades dos fósseis por ele encontrados, que o Porco das turfeiras (Sus palustris) deveria ser ainda selvagem na primeira parte da idade da pedra polida, e só entrou em domesticidade para o fim do mesmo período. Na Ásia, sua domesticação é antiqüíssima, parecendo que há 5.000 anos os chineses já o criavam em domesticidade. Na verdade, a diversificação intensa, por que ele passou, leva a aceitar-se essa remota domesticação para uma espécie, cuja forma selvagem é considerada como já tendo desaparecido, acreditando-se ainda que o Porco asiático só foi conhecido dos europeus quando já doméstico e, em tal estado, trazido e espalhado pela extensíssima área geográfica, que veio a ocupar. Os Árias, vindos da Ásia, pelo sul da Europa, introduziram, provavelmente, nas regiões invadidas, seus animais domésticos, inclusive o Porco; ou pelo menos ensinaram osmeios de o domesticar. Assim, na Europa, sua domesticação começou, então, no sul, com a vinda dos Árias. Convém não esquecer, entretanto, que alguns povos asiáticos não aprenderam a tirar proveito do porco, considerando sua carne nociva à saúde. Tal é o caso dos Hindus, dos Israelitas e dos Maometanos de hoje, e ainda dos antigos Egípcios, entre os quais o Porco não figurava em seus baixos-relevos ou pinturas, como fizeram com outras antigas espécies domésticas. Chegaram ao extremo de ver, na sua criação, um ofício dos mais vis1. Nem HERÓDOTO, nem ESTRABÃO, lembra CORNEVIN (1891) citam o Porco como animal da Arábia. 7 O Cavalo e o Jumento Paleontologicamente a história do Cavalo se tornou das mais conhecidas. OSBORN, LEIDY e, sobretudo MARSH, estudando os fósseis de Pré-Eqüídeos americanos, oferecem elementos facilmente convincentes, para que fosse abandonada, de modo definitivo, a concepção de uma origem paleontológica asiática do Cavalo, e se formasse a convicção de que os Eqüídeos são formas, cuja evolução se processou na América, e não na Ásia. Do novo continente é que, por sucessivas migrações, passaram à Ásia, à Europa e África, onde foram encontradas formas fósseis, mostrando sua extensa área geográfica. Daí a síntese de GUYÉNOT (1947): "O gênero Equus, 1 Essa superstição, contra o Porco, passou, modificada e atenuada, aos nossos antigos sertanejos, que não pronunciavam o nome do porco sem pedir licença, e mesmo assim utilizando-se de uma alcunha, que contorna o embaraço. A alcunha, de sua invenção, é "o cabeça baixa"... A origem dessa ojeriza ao suíno foi explicada para o caso dos Egípcias, por ELLIEN, que escreveu: "O Porco é de tal modo voraz que não poupa nem seus filhos, e devora os cadáveres humanos. Eis porque os Egípcios têm-lhe tanto horror". Enquanto isso, os gregos, parece, gostavam muito dele, "a julgar pelo epíteto de divino, que Homero deu ao primeiro porqueiro de Ulysses" - (HOEFER). 57 aparecido no fim do plioceno, extinguiu-se no quaternário, em sua pátria de origem (América); emigrou para a América do Sul, onde também desapareceu. Somente as famílias emigradas para a Eurásia persistiram, e é delas que derivam todos os Eqüídeos atuais" Em verdade pode-se dizer que os Eqüídeos, surgidos na América, se espalharam por todas as partes do mundo, com exceção da Austrália (onde, aliás, não foi encontrada nenhuma . forma de Mammalia, a não ser fósseis inferiores) e também Madagáscar e ilhas nipônicas. Se na América foi onde se formou o gênero Equus, não foi ali, entretanto, que o Cavalo passou à domesticação. Nem mesmo formas selvagens lá sobreviveram, desaparecendo o Cavalo, por completo, do Novo Mundo, durante o quaternário. Tanto foi assim que os europeus, ao chegarem à América, não encontraram Eqüídeo algum. Ficaram, todavia, seus fósseis, para revelarem ao paleontologista o que hoje sabemos: ser a América o berço dos pré-Eqüídeos. A conquista do Cavalo, para a civilização, de cujo progresso foi ele um fator inegável, deve-se aos arianos e protomongóis. Foram, não há dúvida, esses povos da Ásia que domesticaram o Cavalo, seja na Ásia mesmo, seja na Europa, onde encontraram Eqüinos, que resultaram de um processo provável de evolução, a partir das formas sucessivamente emigradas de seu berço americano. Evolução paralela àquela que se operou no Novo Continente. Ou senão, Eqüinos inteiramente emigrados do Oriente e da América, como o foram as formas fósseis sucessivas, que não teriam continuado sua evolução, extinguindo-se umas após outras, consoante o ponto de vista de LÉON MOULÉ. "Pergunta-se - escreveu CORNEVIN (1897) - se a filiação foi verificada paralelamente nos dois continentes, ou se um deu ao outro as espécies, à medida que estas foram se formando: As duas hipóteses têm sido defendidas; como as passagens entre as formas americanas apresentam menos hiatos do que as do antigo continente, a hipótese da aparição exclusiva dos pré-Eqüídeos no Novo Mundo conta com partidários muito decididos. Sabe-se que os dois continentes comunicavam-se um com o outro, pelo menos durante boa parte da época terciária" (região do Kantschatka). Sua domesticação, ou pelo menos sua utilização como auxiliar do homem, na Europa, parece ter sido praticada já fora do período neolítico, na idade do bronze. É a opinião de alguns, tendo-se em vista que os fósseis, abundantes do período paleolítico, tornam-se raros durante o neolítico, na Europa central e ocidental, reaparecendo em grande abundância, justamente, quando o homem primitivo entrou a utilizar-se do bronze. Isso não quer dizer que o homem não o conhecesse e não tirasse dele algum proveito, desde a idade da pedra lascada, conhecia-o. Mas, supõe-se que não o houvesse ainda domesticado; pelo menos se presume que, na Europa, não era ele doméstico. Nos fósseis mais remotos de Eqüinos, notam-se indícios, mais ou menos certos, de que a utilização única do Cavalo, nessa época, seria como alimento. Depreende-se isso da ausência quase completa, em tais jazidas, de vértebras e costelas, partes essas mais pobres de carne, denunciando que o homem caçava o animal, e transportava, para sua caverna, apenas as regiões mais carnudas, isto é, os quartos. Demais, as ossadas se mostravam quebradas, em quase todos os casos, com marcas de instrumento cortante, indicando que delas fora retirada, provàvelmente, a porção muscular, e ainda aproveitada a medula ou tutano, dos ossos longos. 58 Figura 18 - O Eohippus, cavalo do Eoceno, considerado o antepassado, provavelmente mais remoto do cavalo do Quaternário. Possuía quatro dedos nos membros anteriores e três nos posteriores. Fotografia do quadro do Museu de Zootecnia da Faculdade de Veterinária de Buenos Aires (CABRERA, 1925). Outro argumento, desfavorável à domesticação mais remota do Cavalo, é a observação feita por TOUSSAINT, sobre grande número de ossadas fósseis, nas quais verificou que as superfícies articulares são mais pronunciadas, e mesmo os ossos se apresentam mais desenvolvidos do que nas espécies domésticas. CORNEVIN, partidário da domesticação mais recente do Cavalo, disse: "Não deve ser motivo para admiração, aliás, que o Cavalo não tenha sido um dos primeiros animais domesticados; o que se sabe de seus hábitos, no estado selvagem, tão afastado de toda a tendência à servidão; do medo que ele inspira aos povos ainda selvagens, também; das dificuldades em domar-se o Cavalo, que se asselvajou – bem o justifica. Mas, se a conquista do Cavalo foi tardia, mostrou-se fecunda em resultados. Com ela, a força e a velocidade do homem foram decuplicadas; ele pode ir, longe, atacar seus inimigos, surpreendê-los pela rapidez de sua chegada ou deles fugir facilmente; transpôs as estepes, contornou as montanhas e os pântanos, espalhou-se em extensões enormes, procurou, para seus rebanhos, as melhores pastagens, e para eles as regiões mais convenientes. Com esse auxiliar, as migrações longínquas e em massa vão começar, e com elas as grandes invasões e as guerras sangrentas!" Como se sabe, o gênero Equus é um grupo zoológico notável pelo fato de se poder acompanhar sua longa evolução através das idades paleontológicas (fala-se em cinqüenta milhões de anos!). E essa evolução foi bem determinada para o Cavalo fóssil americano; da América parece que devem ter partido, periodicamente, algumas formas que chegaram até a Europa, e ali se extinguiram, com exceção da última, do Equus caballus, que foi a única a sobreviver ali, tendo desaparecido no Novo Continente, onde o colonizador não encontrou cavalo algum, como já foi dito. 59 Essa evolução parece ter-se processado assim, a partir do Eoceno inferior,com o Eohippus, cujo tamanho lembrava o de uma raposa (outros dizem de um cão Fox- terrier), e com quatro dedos nos membros anteriores (do 2° ao 5°, já tendo desaparecido o 1°) e três dedos nos posteriores (2°, 3° e 4°, e vestígios do 5°). (Outros dizem que os membros anteriores não guardavam mais vestígio do 1° dedo, mas nos posteriores havia vestígios do 1° e do 5°). A seguir, verifica-se um aumento do porte e a redução dos dedos. Surge a forma Orohippus, ainda no Eoceno, na qual não se encontram mais vestígios do 1° e.do 5° dedos, dos membros posteriores; e o 5° dedo dos anteriores se apresenta menor. A forma Epihippus não foi bem determinada, por ser um fóssil muito incompleto, mas pensa-se ser a última do Eoceno. Vem depois o Mesohippus, já no Oligoceno. Porte mais ou meios de um Carneiro; dedos mais reduzidos, em número de três em cada membro. Segue-se o Miohippus, que é uma forma aproximada e também do Oligoceno. Agora no Mioceno, e então se dá a diversificação do phylum, em quatro formas, que não sobrevivem, com exceção de uma delas, o Merychippus, que continua a evoluir dando o Protohippus. (Uma dessas formas, o Anchitherium, emigrou até a Eurásia, e lá feneceu). Merychippus e Protohippus são as formas que se mostram já altamente especializadas, para a vida das planícies, cobertas de ervas, deixando as florestas. A primeira continua com três dedos, porém o dedo médio é o único a pousar no chão; os dois laterais (2° e 4°) regridem. O Protohippus, forma que se segue, pouco difere da anterior. Seu porte é quase o de um jumento. Diversifica-se, todavia, e dá uma forma que desce para o sul do continente, pouco evoluindo, e extinguindo-se depois (Hippidion, depois Orohippidion, esta no Pleistoceno); e outra, o Hipparion, que passa ao velho continente, e se extingue. No plioceno aparece o Pliohippus, com um porte já grande, quase o Equus, e que continua a apresentar a regressão dos dedos laterais, já sem casco, e o único dedo normal (o 3º) constitui o pé. Esta é a forma mais antiga, com o pé evoluído do solípede. Segue-se o Plesihippus, e depois o Equus, ainda no Plioceno. Este Equus do Plioceno se 60 Figura 19 – Modificações surgidas nos ossos dos membros do gênero Equus através das idades. (Boule e Piveteau). diversifica em mais duas outras formas: uma que passa à América meridional, e a outra, que vão à Eurásia. Desta descende o Equus que vai ao Pleistoceno, forma eurasiática. O Equus eurasiático, do Pleistoceno, por sua vez, parece ter-se diversificado em Equus zebra e Equus asinus, passando para a África; mas continuou a evoluir ainda, originando o Equus do quaternário, que povoou toda a Eurásia. Enquanto isso, o Equus da mesma espécie pleitocênica, que permaneceu na América, extinguiu-se. O Cavalo doméstico é, pois, uma forma que descende de espécies de Equus eurasiático, do quaternário. Na América, nenhuma forma de eqüino foi domesticada. Para CUVIER (1834), para PRIEM e poucos mais, o Equus fossilis, que é uma forma de Cavalo do quaternário europeu, seria a espécie que teria dado todas as raças de cavalo atuais. Essa opinião, contudo, não é fácil de ser sustentada. Para DARWIN (1879) “é duvidoso que a totalidade das diferenças existentes, atualmente, entre as diversas raças, se tenha processado inteiramente no estado de domesticidade”. LÉON MOULÉ, por sua vez, opina que: “Todas as pesquisas feitas pelos sábios franceses, alemães, belgas e ingleses, nos fósseis das estações do Salutré, de Vézère, de Cro-Magnon, de Madeleine, etc., autorizam a concluir-se que os cavalos, desde o quaternário, já se achavam muito diferenciados, e que a espécie Equus caballus compreendia certo número de espécies menores, de raças geográficas ou primitivas, que podem ser consideradas como fontes dos cavalos atuais”. “Os antepassados do nosso Cavalo atual, escreve MUMFORD (1908), nem sempre podem ser claramente definidos. De acordo com EWART, RIDGEWAY, OSBORNS e outros (1908), diversas foram as formas selvagens distintas diretamente predecessores do Cavalo de hoje”. E que formas foram essas? Eis uma indagação muito difícil de ser respondida. Em geral os autores estão em desacordo, por via mesmo da impossibilidade de ligar as diferentes formas fósseis às raças atuais, do Cavalo doméstico. Dentre esses autores, DUERST, professor da Universidade de Zurique (Berna, diz DECHAMBRE) que estudou, ujustamente, com particular interesse, a origem dos animais domésticos, é o criador da hipótese mais citada (DECHAMBRE (1914), MASCHERONI, MARTINOLLI). Para DUERST (1908), a forma Equus caballus fossilis, assim classificada por RÜTIMEYER, e considerada por CUVIER como a forma primitiva mesmo, seria o tronco que teria dado os atuais eqüinos, mas através de três espécies: 1 Equus caballus robustus de Nehring, que seria própria das estepes, e corresponderia a um tipo de cavalos grandes, de porte acima da média. Fonte provável dos cavalos de tiro. 2 Equus caballus pumpelli (Duerst) forma de cavalo do deserto. Trata-se de um tronco étnico a que talvez se possa filiar o chamado Cavalo “oriental”. Sua origem deve ser asiática; há mais de três mil a.C. já o Cavalo vivia doméstico na China. 3 Equus caballus Nehringi (Duerst) das florestas da Alemanha, seria o antepassado dos Pôneis da Grã-Bretanha e Irlanda. Para Duerst (1886) o Equus fossilis Rütimeyer teria um representante sobrevivente, habitando as estepes da Ásia Central e Setentrional. Seria aquele Cavalo selvagem, descoberto em 1879, no deserto da Dzungária, por PRZEWALSKI, considerado como um descendente vivo do cavalo fóssil de Rütimeyer, por DUERST, e que não deve ser confundido com aquelas formas de cavalos asselvajados, encontradas em vários lugares, inclusive na América do Sul. Em KRONACHER (1919) depara-se outra explicação sobre a origem dos cavalos domésticos, explicação que se aproxima da de DUERST, e que examinada com 61 atenção, não esclarece melhor o árdua problema, mas que aqui vai exposta para demonstrar como divergem os pontos de vista. Figura 20 – Equus Przewalski, forma de cavalo selvagem primitiva e sobrevivente na Ásia setentrional (de Pusch). Para KRONACHER (1937), três seriam as origens das raças eqüinas domésticas: duas provenientes do Equus fossilis Rütimeyer, que identificou ao Equus caballus Stenonis Chochi, e outra seria aquela forma sobrevivente de Cavalo primitivo, o Equus Przewalski. Então, ter-se-ia a seguinte seriação: 1 Equus caballus Przewalski, forma asiática sobrevivente, a que já foi feita referência, vivendo na Ásia setentrional, em pleno estado selvagem. Cavalo pequeno de porte (1,30 m), porém forte, de perfil ligeiramente acarneirado ou reto, muito difundido pela Europa, no quaternário, e que parece ter sido domesticado dois a três mil anos a.C. 2 Uma forma “ligeira” do Equus Stenonis, ou seja, o Equus Gmelini Ant., que é o Tarpan da Rússia, selvagem, não extinto até o século passado. Forma pequena, difundida no paleolítico, na Europa central e ocidental. Domesticada dois mil anos a.C., deve ter vindo com os Árias, da Ásia. Parece ter sido a fonte do chamado cavalo oriental. 3 Uma forma “pesada” do Equus Stenoni, ou sejam os grandes cavalos do quaternário, de “sangue frio”, também chamados cavalos ocidentais, cujo centro de domesticidade deve ter sido a Europa central, um; e a Península Ibérica, outro. Dos cavalos da Península Ibérica deve descender a forma de cavalo Bérbere, que parece ter- se conservado puro, e em parte mesclado com o Árabe. 62 Figura 21 – Filogenia do Cavalo (Segundo Lull, modificado por Lindsey ) Como se vê, ambasas explicações estão longe de satisfazer completamente, mas não há melhores. 63 ÁFRICA EURÁSIA AMÉRICA AMÉRICA ETIÓPIA PALEÁRTICA DO NORTE DO SUL + NEÁRTICA NEOTRÓPICA ORIENTAL Equus Equus Cavalo das Cavalo das MODERNO florestas florestas Zebras Tarpan Jumentos Jumentos PLEISTOCENO Equus Equus Equus Extinto Extinto Onohippidion Extinto Equus Equus Equus PLIOCENO Hipparion ↑ Extinto Plesihippus Hippidion ↑ Pliohippus Hipparion MIOCENO Protohippus Hipohippus Extinto Anchiteriun Merychippus Extinto Parahippus Extinto Miohippus ↑ OLIGOCENO Mesohippus ? ↑ Epihippus EOCENO ↑ Orohippus ↑ Hyracotheriun Eohippus E, então, pode-se dizer, em resumo, que a origem do Cavalo doméstico é polifilética. E não é uma afirmativa vaga. “A evidência, escrevem BABCOCK e CLAUSEN, é mais fortemente em apoio de uma origem polifilética, das raças de Cavalo moderno. Nos caracteres desses remotos antepassados do Cavalo, pode-se encontrar praticamente representados todos os caracteres dos atuais eqüinos” (1927). Quanto ao Jumento, sabe-se que no período neolítico, período crítico da domesticação das espécies na Europa, não se depara com a presença dele, nem nos palafitas, nem nos depósitos de fósseis da Dinamarca e Escandinávia. Mas o Jumento selvagem, lembra ZWAENEPOEL (1922), foi encontrado nos altiplanos do Tibé por PRZEWALSKI (1887), e na Núbia e Etiópia é ele abundante. Quanto à sua domesticação, prevalece a idéia de que o Jumento, embora de utilização posterior ao Cavalo, na Europa, foi utilizado mais remotamente na África e Ásia. Os mais antigos monumentos egípcios apresentam figuras do Jumento e “a partir da viagem de Abraão, ao Egito, o Jumento é citado em cada página do Gênese, enquanto que sobre o Cavalo, só há referência na época de José (CORNEVIN, 1891)”. Assim prevalece a opinião de PIÉTREMENTE (1883), de que o Jumento foi domesticado anteriormente, ao Cavalo. Do mesmo modo opinaram SAINT-HILAIRE (1861) e GODRON (1858). É que, como descrito acima, sua domesticação se processou na África, e não na Europa (onde não havia e não há Jumento selvagem). Na África, particularmente, no vale do Nilo (ZEUNER, 1963). Figura 22 – Equus taeniopus Huglin, ou Jumento selvagem da Núbia e Abssínia. Parece provir, portanto, da Núbia e Etiópia, e a espécie selvagem que o originou, supõe-se ser o Equus taeniopus de Huglin, ali selvático. Sua utilização, pelos povos europeus, foi bem posterior à do Cavalo, donde a conclusão errônea de que sua domesticação foi também processada depois da deste. Antes de os europeus terem o Cavalo em domesticidade, os povos da Núbia já se utilizavam do Jumento. A filologia nos ajuda a aceitar essa hipótese. Segundo A. PICTET (1853) todos os nomes modernos do Cavalo são de origem sânscrita ou zenda, enquanto que os Jumentos ou Asnos são de fonte semita. Graças ao seu temperamento calmo e sua sobriedade, foi ele um animal que deve ter começado a prestar serviço ao homem assim que este o conheceu. Embora de origem francamente tropical, é o Jumento hoje uma espécie doméstica que vive muito bem nos climas temperados, onde se encontram, aliás, suas raças melhoradas. 64 A grande contribuição do Jumento lembra ZEUNER (1963), à pecuária – foi ter dado origem a esse animal excepcional de trabalho - o Burro. Uma das maiores realizações deste animal, registrado na história, foi o fato de Alexandre, o Grande, ter sido conduzido da Babilônia para Alexandria, nas costas de mulas, em número de 64, que constituíam o elemento de transporte do poderoso rei. No Brasil, seu papel, foi mais extraordinário ainda, pois como sabemos, foi o Burro que ajudou a transportar em dado momento, nossas ingentes riquezas: o ouro das minas, o açúcar dos engenhos e o café das fazendas. É o Onagro (Equus hemionus), que tem sido apontado como o antepassado do Jumento. Trata-se de uma espécie que, segundo ZEUNER (1963), viveu na Mesopotâmia anteriormente à introdução, ali, do Cavalo. O Onagro foi amansado pelo Sumerianos (povo do vale do Eufrates) e largamente utilizado como besta de carga. Com a introdução do Cavalo, muito mais dócil e domesticável, desapareceu da lista dos animais a serviço do homem. Ele nada tem a ver com o Asno africano, do qual descende o nosso prestimoso Jumento, disseminado em toda área tropical da Terra. 8 O Gato O gato é uma espécie cuja vida em domesticidade foi admiravelmente resumida naquele dito italiano: Libertas sine labore. E na sua vida livre, sem trabalho, ele vem acompanhando o homem desde séculos. Assim, é que muito antigos são os vestígios de sua domesticação. BLYTH (1856) cita a referência encontrada em uma obra de sânscrito, mostrando
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