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Sistemas de Equac¸o˜es Diferenciais no Plano Sistemas autoˆnomos Queremos estudar o comportamento das soluc¸o˜es do sistema escrito na seguinte forma:{ x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) (1) onde x = x(t) e y = y(t). Tal sistema e´ chamado de sistema autoˆnomo, ou seja, a varia´vel independente t na˜o aparece explicitamente no lado direito das equac¸o˜es. Uma soluc¸a˜o desse sistema possui a seguinte forma: X(t) = ( x(t) y(t) ) (2) Ale´m disso, podemos provar que: Lema 1: Se x(t) e y(t), com a < t < b, e´ uma soluc¸a˜o do sistema (1), enta˜o para qualquer nu´mero real k as func¸o˜es x1(t) = x(t+ k) e y1(t) = y(t+ k) tambe´m sa˜o soluc¸o˜es do sistema (1). Demonstrac¸a˜o: Aplicando a regra da cadeia temos x′1 = x ′(t+ k) = f(x(t+ k), y(t+ k)) = f(x1, y1) y′1 = y ′(t+ k) = g(x(t+ k), y(t+ k)) = g(x1, y1) Portanto, x1 e y1 sa˜o soluc¸o˜es de (1), as quais esta˜o definidas em a− k < t < b− k. O vetor soluc¸a˜o X(t) nos diz como o ponto (x, y) se move no plano-xy de acordo com a variac¸a˜o do tempo t. O movimento do ponto (x, y) determina uma curva, chamada de trajeto´ria da soluc¸a˜o X(t), como mostra a Figura 1. Observe que pelo Teorema de Existeˆncia e Unicidade podemos concluir que: Lema 2: Por qualquer ponto do plano-xy passa no ma´ximo uma trajeto´ria do sistema (1). Em outras palavras, duas trajeto´rias do sistema (1) na˜o se interceptam. 1 x y X(t) Figura 1: Trajeto´ria da soluc¸a˜o X(t) Demonstrac¸a˜o: Considere duas trajeto´rias distintas C1 e C2 com um ponto em comum (x0, y0) e representadas, respectivamente, por (x1, y1) e (x2, y2). Sendo assim, existem t1 e t2 tais que (x1(t1), y1(t1)) = (x0, y0) (x2(t2), y2(t2)) = (x0, y0) Pelo Teorema de Existeˆncia e Unicidade temos que t1 6= t2, pois caso contra´rio a unicidade de soluc¸o˜es seria contrariada. Agora pelo Lema 1, temos que x(t) = x1(t+ t1 − t2) y(t) = y1(t+ t1 − t2) e´ uma soluc¸a˜o do sistema (1). Agora observe que (x(t2), y(t2)) = (x1(t1), y1(t1)) = (x0, y0) ou seja, (x(t2), y(t2)) = (x0, y0) (x2(t2), y2(t2)) = (x0, y0) Portanto, pelo Teorema de Existeˆncia e Unicidade temos que (x(t), y(t)) = (x2(t), y2(t)) para todo t, pois caso contra´rio a unicidade de soluc¸o˜es seria contrariada. Logo, C1 e C2 devem ser a mesma trajeto´ria. Tambe´m, podemos pensar na derivada de uma soluc¸a˜o X ′(t) = ( x′(t) y′(t) ) como representante do vetor velocidade do ponto (x, y) que se move de acordo com a soluc¸a˜o (2). Dessa forma, podemos interpretar geometricamente o sistema (1) como um 2 x y Figura 2: Campo de Velocidades campo de velocidade onde para cada ponto (x0, y0) no plano-xy esta associado um vetor velocidade tendo sua calda em (x0, y0), como mostra a Figura 2. Como uma soluc¸a˜o do sistema (1) e´ um ponto movendo no plano-xy temos que em cada ponto da sua trajeto´ria, ele possui a velocidade descrita pelo campo de velocidades, como mostra a Figura 1. x y X(t) Figura 3: Trajeto´ria no campo de velocidades 3 Classificac¸a˜o de Sistemas Lineares Hiperbo´licos no Plano Sistemas lineares autoˆnomos Queremos estudar o comportamento das soluc¸o˜es do sistema linear escrito na seguinte forma: { x′ = ax+ by y′ = cx+ dy (3) onde x = x(t) e y = y(t). Tal sistema e´ chamado de sistema autoˆnomo, ou seja, a varia´vel independente t na˜o aparece explicitamente no lado direito das equac¸o˜es. Podemos reescrever o sistema (3) na forma matricial, ou seja, X ′ = AX onde A = [ a b c d ] e X = ( x y ) Autovalores e Autovetores Como ja´ foi estudado anteriormente, λ se diz um autovalor da matriz A = [ a b c d ] se existe um vetor na˜o nulo v ∈ R2 tal que Av = λv (4) Neste caso, o vetor v e´ chamado de autovetor e podemos escrever a equac¸a˜o (4) como (A− λI2)v = 0 (5) Como v = (0, 0) satisfaz a equac¸a˜o (4) para todo λ, estaremos interessados em v 6= (0, 0) que satisfac¸a tal equac¸a˜o. Em outras palavras, a matriz A deve ser na˜o invers´ıvel, ou seja, det(A− λI2) = 0 Calculando o referido determinante encontramos a equac¸a˜o do segundo grau a seguir, a qual e´ chamada de polinoˆmio caracter´ıstico, λ2 − (a+ d)λ+ (ad− bc) = 0 4 Observe que tr(A) = a + d e que o det(A) = ad− bc, ou seja, o polinoˆmio caracter´ıstico pode ser reescrito como λ2 − tr(A)λ+ det(A) = 0 Ale´m disso, observe que se λ1 e λ2 sa˜o ra´ızes do polinoˆmio caracter´ıstico, enta˜o λ2 − tr(A)λ+ det(A) = (λ− λ1)(λ− λ2) = λ2 − (λ1 + λ2)λ+ λ1λ2 ou seja, tr(A) = λ1 + λ2 det(A) = λ1λ2 Na sequeˆncia enuciaremos o pro´ximo teorema o qual na˜o demonstraremos. Teorema 3: Seja A uma matriz quadrada 2× 2 e denote o discriminante ∆ da matriz A por: ∆ = [ tr(A) ]2 − 4det(A) Sendo assim, existem treˆs possibilidades para os autovalores da matriz A, que podem ser descritas em termos do discriminante: a) Se ∆ > 0, enta˜o os autovalores sa˜o reais e distintos. b) Se ∆ < 0, enta˜o os autovalores sa˜o um par de complexos conjugados. c) Se ∆ = 0, enta˜o os autovalores sa˜o reais e iguais. Classificac¸a˜o dos sistemas lineares hiperbo´licos no plano Definic¸a˜o 1: Seja o sistema X ′ = AX, os pontos (x, y) ∈ R2 para os quais AX = ( 0 0 ) sa˜o chamados de pontos de equil´ıbrio do sistema. Admitindo que det(A) 6= 0, enta˜o A e´ invers´ıvel. Logo X = (0, 0) e´ o u´nico ponto de equil´ıbrio do sistema X ′ = AX. Definic¸a˜o 2: O sistema de equac¸o˜es diferenciais X ′ = AX e´ um Poc¸o se os autovalores da matriz A teˆm ambos parte real negativa. O sistema X ′ = AX de equac¸o˜es diferenciais e´ uma Fonte se os autovalores da matriz A teˆm ambos parte real positiva e uma Sela se os autovalores da matriz A forem reais sendo um positivo e o outro negativo. Teorema 4: Se os autovalores de A tiverem parte real negativa, enta˜o a origem e´ um ponto de equil´ıbrio assimptoticamente esta´vel para X ′ = AX. Definic¸a˜o 3: O sistema X ′ = AX de equac¸o˜es diferenciais diz-se hiperbo´lico se todos os autovalores de A teˆm parte real na˜o nula. 5 Sendo X ′ = AX, podemos usar o determinante, o trac¸o e o discriminante da matriz A para classificar os sistemas lineares hiperbo´licos no plano, nas proximidades da origem. Vejamos: (1) det(A) = 0: A matriz A tem pelo menos um autovalor real igual a zero, sendo o sistema na˜o hiperbo´lico. (2) det(A) < 0: A matriz A tem um autovalor positivo e outro negativo, sendo a origem, o ponto de equil´ıbrio, uma Sela como mostra a Figura 4. Por exemplo, considere o seguinte sistema X ′ = [ −1 3 3 −1 ] X (6) Observe que det(A) = −8 < 0 e que os autovalores sa˜o λ1 = −4 e λ2 = 2. y x v1 v2 Figura 4: Plano de fase do sistema (6) (3) det(A) > 0: A matriz A tem dois autovalores reais com o mesmo sinal ou um par de autovalores complexos conjugados. (a) det(A) > 0 e tr(A) = 0: Enta˜o os autovalores sa˜o complexos conjugados imag- ina´rios puros, sendo o sistema na˜o hiperbo´lico. (b) det(A) > 0 e tr(A) < 0: Como o trac¸o de A e´ a soma dos autovalores, se tr(A) e´ negativo obtemos um Poc¸o. E´ o caso do sistema (7), onde det(A) = 2 > 0 e tr(A) = −3 e do sistema (8) onde det(A) = 26 > 0 e tr(A) = −2. X ′ = [ −2 0 0 −1 ] X (7) X ′ = [ −1 −5 5 −1 ] X (8) 6 Os dois sistemas (7) e (8) distinguem-se analisando, de acordo com o Teorema 3, o discriminante ∆ = [ tr(A) ]2 − 4 det(A). (*) ∆ > 0: Os autovalores da matriz A sa˜o reais distintos e ambos negativos, como e´ o caso do exemplo (7) em que ∆ = 1. Neste caso, temos um No´ (esta´vel), como mostra a Figura 5. y v1 v2 x Figura 5: Plano de fase do sistema (7) (*) ∆ < 0: E´ o caso de (8), em que ∆ = −100, sendo os autovalores complexos conjugados com parte real negativa. Assim, a origem designa-se por Poc¸o espiral, como mostra a Figura 6. x y Figura 6: Plano de fase do sistema (8) (*) ∆= 0: Os autovalores de A sa˜o reais e iguais, sendo necessa´rio analisar se a matriz e´ mu´ltipla da identidade ou na˜o. 7 • A e´ multipla da identidade: Neste caso a origem e´ um Foco (esta´vel), pois existem dois autovetores linearmente independentes, como mostra a Figura 7. Este e´ o caso do exemplo (9) a seguir, onde temos que det(A) = 4, tr(A) = −4 e ∆ = 0, e os autovalores sa˜o λ1 = λ2 = −2. X ′ = [ −2 0 0 −2 ] X (9) x y v1 v2 Figura 7: Plano de fase do sistema (9) • A na˜o e´ multipla da identidade: Neste caso a origem e´ um No´ im- pro´prio (esta´vel), existindo so´ um autovetor linearmente independente, como mostra a Figura 8. Este e´ o caso do exemplo (10) a seguir, onde temos que det(A) = 4, tr(A) = −4 e ∆ = 0, e os autovalores sa˜o λ1 = λ2 = −2. X ′ = [ 1 −1 9 −5 ] X (10) Note-se que em ambos os exemplos (9) e (10) se tem det(A) = 4, tr(A) = −4 e ∆ = 0. O que os distingue e´ o fato de A ser ou na˜o mu´ltipla da identidade. (c) tr(A) > 0: Neste caso a classificac¸a˜o e´ semelhante ao caso (b). A u´nica diferenc¸a e´ que aqui os sistemas sa˜o insta´veis. Os diagramas de fase sa˜o ideˆnticos aos do (b), mas as setas esta˜o invertidas. Sendo assim, se: (*) ∆ > 0: Os autovalores da matriz A sa˜o reais distintos e ambos positivos e, portanto, temos um No´ (insta´vel). (*) ∆ < 0: Sendo os autovalores complexos conjugados com parte real positiva, a origem designa-se por Fonte espiral. (*) ∆ = 0: Os autovalores de A sa˜o reais e iguais, sendo necessa´rio analisar se a matriz e´ mu´ltipla da identidade ou na˜o. 8 x y v1 Figura 8: Plano de fase do sistema (10) • A e´ multipla da identidade: Neste caso a origem e´ um Foco (insta´vel). • A na˜o e´ multipla da identidade: Neste caso a origem e´ um No´ impro´prio (insta´vel). Esta classificac¸a˜o dos sistemas lineares hiperbo´licos no plano pode ser resumida no seguinte (veja Figura 9): (1) det(A) = 0: Sistema na˜o hiperbo´lico. (2) det(A) < 0: Ponto de Sela, pois os autovalores sa˜o reais de sinais contra´rios. (3) det(A) > 0: Dois autovalores reais de mesmo sinal ou um par de complexos conjugados. (a) tr(A) = 0: Sistema na˜o hiperbo´lico, pois os autovalores sa˜o complexos imagina´rios puros. (b) tr(A) < 0: Autovalores com parte real negativa. (*) ∆ = 0: • A e´ multipla de I2: Foco esta´vel. • A na˜o e´ multipla de I2: No´ impro´prio esta´vel. (*) ∆ < 0: Espiral esta´vel. (*) ∆ > 0: No´ esta´vel. (c) tr(A) > 0: Autovalores com parte real positiva. (*) ∆ = 0: • A e´ multipla de I2: Foco insta´vel. • A na˜o e´ multipla de I2: No´ impro´prio insta´vel. (*) ∆ < 0: Espiral insta´vel. (*) ∆ > 0: No´ insta´vel. 9 Figura 9: Classificac¸a˜o de sistemas lineares hiperbo´licos no plano em coordenadas (tr(A), det(A)). 10 Sistemas na˜o-Lineares Autoˆnomos, Retrato de Fase, Ciclos Limite, Teorema de Poincare´-Bendixson e Equac¸o˜es de Lienard Sistemas na˜o-lineares autoˆnomos e retrato de fase Queremos estudar o comportamento das soluc¸o˜es do sistema na˜o-linear escrito na seguinte forma: { x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) (11) onde x = x(t) e y = y(t). Antes de pensarmos como desenhar o comportamento das soluc¸o˜es de um sistema da forma (11), precisamos primeiro pensar em pontos de equil´ıbrio, tambe´m chamados de pontos cr´ıticos ou pontos estaciona´rios. Definic¸a˜o 4: Um ponto (x0, y0) e´ um ponto de equil´ıbrio para o sistema{ x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) se { f(x0, y0) = 0 g(x0, y0) = 0 Em outras palavras, para encontrarmos os pontos de equil´ıbrio do sistema acima, basta resolver o seguinte sistema { f(x, y) = 0 g(x, y) = 0 Estamos interessados aqui em discutir um sistema 2×2 autoˆnomo de modo geral, ou seja, na˜o-linear. Enta˜o suponhamos que o sistema (11) e´ na˜o-linear. Para estudarmos este tipo de sistema podemos pensa´-lo como um sistema linear da forma X ′1 = AX1 11 nas pro´ximidades dos pontos de equil´ıbrio, ou seja, a linearizac¸a˜o do sistema (11) em torno de (x0, y0). Em geral, e principalmente quando existem va´rios pontos de equil´ıbrio ou quando as func¸o˜es f(x, y) e g(x, y) na˜o sa˜o simples, para encontrar o sistema linearizado, ou fazer a linearizac¸a˜o do sistema, usamos a matriz Jacobiana dada por J(x, y) = ∂f(x, y) ∂x ∂f(x, y) ∂y ∂g(x, y) ∂x ∂g(x, y) ∂y O resultado e´ que nas proximidades do ponto de equil´ıbrio (x0, y0), a linearizac¸a˜o do sistema { x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) e´ x′1 = ∂f(x, y) ∂x x1 + ∂f(x, y) ∂y y1 y′1 = ∂g(x, y) ∂x x1 + ∂g(x, y) ∂y y1 ou na forma matricial X ′1 = AX1 onde X1 = ( x1 y1 ) e A = J(x0, y0) 12 Retrato de fase A seguir apresentamos um procedimento geral para desenhar, do ponto de vista qualita- tivo, as trajeto´rias de um sistema na˜o-linear autoˆnomo{ x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) Em outras palavras, apresentamos um procedimento para esboc¸ar o retrado de fase do sistema na˜o-linear dado. 1. Encontre todos os pontos de equil´ıbrio resolvendo o seguinte sistema:{ f(x, y) = 0 g(x, y) = 0 2. Para cada ponto de equil´ıbrio (x0, y0) encontre a matriz A do sitema linearizado, ou seja, aplique a matriz Jacobiana no ponto (x0, y0). A = J(x0, y0) = ∂f(x, y) ∂x (x0, y0) ∂f(x, y) ∂y (x0, y0) ∂g(x, y) ∂x (x0, y0) ∂g(x, y) ∂y (x0, y0) 3. Determine o tipo geome´trico de cada ponto de equil´ıbrio do sistema linearizado, ou seja, se sa˜o pontos de sela, no´s ou espirais esta´veis ou insta´veis. 4. No plano-xy, marque os pontos de equil´ıbrio e desenhe as trajeto´rias nas proximidades dos pontos de equil´ıbrio (x0, y0), incluindo a direc¸a˜o do movimento. 5. Finalmente, para finalizar o desenho, desenhe algumas trajeto´rias compat´ıveis com o comportamento das trajeto´rias que foram desenhadas no passo anterior. Se foi cometido algum erro na ana´lise anterior em qualquer ponto de equil´ıbrio, ele vai aparecer agora. Em outras palavras, sera´ imposs´ıvel desenhar de forma plaus´ıvel qualquer trajeto´ria que complete o desenho. Exerc´ıcio 1: Para cada sistema a seguir, a origem e´ claramente um ponto de equil´ıbrio. Deˆ o tipo, a estabilidade, e apresente o comportamento de algumas trajeto´rias (plano de fase) do sistema em torno de tal ponto. 1. { x′ = x− y + xy y′ = 3x− 2y − xy 2. { x′ = x+ 2x2 − y2 y′ = x− 2y + x3 Exerc´ıcio 2: Para cada sistema a seguir, encontre os pontos de equil´ıbrio de cada sistema, e fac¸a o plano de fase em torno de cada ponto e adicione algumas trajeto´rias compat´ıveis com as as outras que voceˆ desenhou. 1. { x′ = 1− y y′ = x2 − y2 2. { x′ = x− x2 − xy y′ = 3y − xy − 2y2 13 Ciclos limite Ate´ agora, nossa ana´lise dos sistemas na˜o-lineares no plano-xy se resumiu em encontrar os pontos de equil´ıbrio do sistema e analizar as trajeto´rias nas proximidades de cada um destes pontos. Isto nos da´ uma ideia de como as outras trajeto´rias se comportam, pelo menos aquelas que passar nas proximidades dos pontos de equil´ıbrio. Uma outra possibilidade importante, a qual pode influenciar no comportamento das tra- jeto´rias e´ se uma destas trajeto´rias for uma curva fechada C. Se isto acontecer, a soluc¸a˜o associada X(t) sera´ geometricamente determinada por um ponto que vai e volta sobre a curva C com um certo per´ıodo T . Isto e´, a soluc¸a˜o X(t) = (x(t), y(t)) sera´ um par de func¸o˜es perio´dicas com per´ıodo T , ou seja, x(t+ T ) = x(t) e y(t+ T ) = y(t), para todo t Se tal curva (trajeto´ria) fechada existir, as trajeto´rias nas suas proximidades devem se comportar de maneira parecida com C. Assim temos as seguintes possibilidades: nas prox- imidades de C as curvas podem ser espirais se aproximnando de C, elas podem ser espirais se afatando de C, ou elas podem ser tambe´m curvas fechadas,como mostra a figura a seguir. Se o u´ltimo caso na˜o acontece, ou seja, a curva C e´ uma curva isolada, enta˜o C e´ chamada de ciclo limite, o qual pode ser esta´vel, insta´vel ou semi-esta´vel, respectivamente, se as curvas espirais se aproximam de C, ou se afastam de C, ou ambas. C CC C Ciclo limite instavel Ciclo limite semi−estavel Neutro − Centro estavelCiclo limite estavel Figura 10: Classificac¸a˜o dos ciclos limite O ciclo limite mais importante e´ o ciclo limite esta´vel, onde nas suas proximidades as curvas (trajeto´rias) espirais aproximam de C de ambos os lados. Processos perio´dicos na natureza podem frequentemente ser representados como ciclos limite esta´veis, assim existe um grande interesse em encontrar tais trajeto´rias se elas existem. Infelizmente, pouco se sabe sobre como fazer isto, ou como mostrar que um sistema na˜o possui ciclos limite. 14 Existeˆncia de ciclos limite A principal ferramenta que vem sendo historicamente usada para mostrar que sistemas da forma { x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) (12) possui ciclo limite esta´vel e´ o seguinte: Teorema 5 [Teorema de Poincare´-Bendixson]: Suponha que R e´ uma regia˜o finita do plano entre duas curvas simples fechada D1 e D2, e que F e´ campo de velocidades para o sistema (12). Se (i) se em cada pode de D1 e D2, o campo F aponta para o interior da regia˜o R, e (ii) R na˜o conte´m nenhum ponto de equil´ıbrio, enta˜o o sistema (12) possui uma trajeto´ria fechada (ciclo limite) contido em R. Na˜o daremos uma demonstrac¸a˜o formal deste teorema, mas de certa forma tal teorema e´ intuitivo. De fato, se comec¸armos em uma das curvas de contorno D1 ou D2, a soluc¸a˜o entrara´ na regia˜o R, pois, os vetores velocidades apontar para o interior de R. De acordo com o avanc¸ar do tempo, a soluc¸a˜o na˜o pode nunca deixar R, pois quando a soluc¸a˜o se aproxima de uma de contorno, tentando sair de R, os vetores velocidade sempre apontam para dentro de R, forc¸ando a soluc¸a˜o a ficar dentro de R. Desde que a soluc¸a˜o na˜o pode sair de R, a u´nica coisa que a soluc¸a˜o pode fazer quando t→∞ e´ ou se aproximar de um ponto de equil´ıbrio - mas na˜o existe nenhum em R por hipo´tese - ou se aproximar em forma de espiral em direc¸a˜o a uma trajeto´ria fechada. Logo, existe uma trajeto´ria fechada (ciclo limite) em R, o qual na˜o pode ser insta´vel, ou seja, pode ser qualquer uma das outras treˆs possibilidades. D2 D1 Figura 11: Teorema de Poincare´-Bendixson 15 Na˜o-Existeˆncia de ciclos limite Vejamos agora o outro lado da moeda. Aqui apresentamos dois resultados que sa˜o usados para mostrar que um ciclo limite na˜o existe. Teorema 6 [Crite´rio de Bendixson]: Se ∂f(x, y) ∂x e ∂g(x, y) ∂y sa˜o cont´ınuas em uma regia˜o R a qual e´ simplesmente conexa (isto e´, sem buracos), e ∂f(x, y) ∂x + ∂g(x, y) ∂y 6= 0 em todo ponto de R, enta˜o o sistema { x′ = f(x, y) y′ = g(x, y) na˜o possui trajeto´rias fechadas dentro de R, ou seja, na˜o possui ciclos limite. Demonstrac¸a˜o: Suponhamos por contradic¸a˜o que existe um ciclo limite C em R. Denote por S o interior da curva fechada C. Vamos calcular a integral de linha no sentido positivo (o interior da curva C fica sempre a` esquerda), ou seja, vamos aplicar o Teorema de Green no plano, que e´: ∮ C f(x, y)dy − g(x, y)dx = ∫∫ S ( ∂f ∂x + ∂g ∂x ) dxdy Observe que o lado direito da igualdade e´ diferente de zero por hipo´tese. Do sitema podemos obter dx dy = f(x, y) g(x, y) ou f(x, y)dy = g(x, y)dx Logo, a integral do lado esquerdo da igualdade anterior deve ser igual a zero, o que nos leva a uma contradic¸a˜o. Note que o teorema na˜o nos leva a concluir nada se ∂f(x, y) ∂x + ∂g(x, y) ∂y = 0 Exemplo 1: O sistema { x′ = −x+ y2 y′ = x2 − y2 possui ciclos limite? Soluc¸a˜o: Observe que ∂f(x, y) ∂x = −1 e ∂g(x, y) ∂y = −3y2. Sendo assim, para todo (x, y) ∂f(x, y) ∂x + ∂g(x, y) ∂y = −1− 3y2 < 0. Portanto, pelo Crite´rio de Bendixson, o sistema na˜o possui ciclos limite. 16 Exemplo 2: O sistema { x′ = x2 + y2 + 1 y′ = x2 − y3 possui ciclos limite? Soluc¸a˜o: Observe que ∂f(x, y) ∂x = 2x e ∂g(x, y) ∂y = −2y. Portanto, ∂f(x, y) ∂x + ∂g(x, y) ∂y = 2x− 2y = 0 se, e somente se, x = y. x y x=y Sem ciclo limite Sem ciclo limite ? Figura 12: Teorema de Poincare´-Bendixson Como vimos antes, o teorema de Poincare´-Bendixson diz que qualquer trajeto´ria descrita por um sistema na˜o-linear que entra ou esta´ contida e nunca sai de uma regia˜o fechada e limitada sem a existeˆncia de um estado de equil´ıbrio, e´ um ciclo limite ou esta´ se aproximando de um. Considerando uma regia˜o S delimitada pelo ciclo limite, sem a exclusa˜o de pontos de equil´ıbrio, pode-se concluir a partir o teorema de Poincare´-Bendixson que uma condic¸a˜o necessa´ria para existeˆncia de um ciclo limite e´ que N = S + 1 onde N e´ o nu´mero de espirais, no´s ou centros, e S e´ o nu´mero de pontos de sela. Como corola´rio do teorema de Poincare´-Bendixson temos o seguinte: 17 Teorema 7 [Crite´rio do Ponto de Equil´ıbrio]: Um ciclo limite envolve pelo menos um ponto de equil´ıbrio. Demonstrac¸a˜o: Se S = 0, enta˜o N = 1. Ou seja, um ciclo limite envolve necessariamente pelo menos um ponto de equil´ıbrio. Note que de acordo com esse crite´rio, se uma regia˜o R do plano na˜o conte´m pontos de equil´ıbrios, enta˜o R na˜o conte´m ciclos limite. Exemplo 3: Olhando novamente o Exemplo 2, vemos que x2 + y2 + 1 6= 0 para todo (x, y), ou seja, o sistema na˜o possui pontos de equil´ıbrio. Portanto, o sistema na˜o possui ciclos limite. Exemplo 4: Para quais valores de a e d o sitema { x′ = ax+ by y′ = cx+ dy possui trajeto´rias fechadas? Soluc¸a˜o: E´ fa´cil verificar que ∂f(x, y) ∂x = a e ∂g(x, y) ∂y = d. Pelo crite´rio de Bendixson, ∂f(x, y) ∂x + ∂g(x, y) ∂y = a+ d 6= 0 implica a na˜o existeˆncia de trajeto´rias fechadas. Se a+d = 0 o crite´rio de Bendixson na˜o nos diz nada. Enta˜o, o que acontece se a+d = 0? Como o sistema dado e´ linear podemos escrever sua equac¸a˜o caracter´ıstica que e´ λ2 − (a+ d)λ+ (ad− bc) = 0 Agora assumindo que a+ d = 0, temos que: 1. se ad−bc < 0 enta˜o os autovalores sera˜o reais distintos, como sinas opostos, e o sistema e´ um ponto de sela. 2. se ad− bc > 0 enta˜o os autovalores sa˜o complexos, imagina´rios puros, e o sistema e´ um centro, os quais sa˜o trajeto´rias fechadas. Portanto, o sistema possui trajeto´rias fechadas se, e somente se, a+ d = 0 e ad− bc > 0. Exerc´ıcio 3: Considere sistema { x′ = −y + x(1− x2 − y2) y′ = x+ y(1− x2 − y2) . 1. Mostre que o ponto (0, 0) e´ o u´nico ponto de equil´ıbrio do sistema. (Sugesta˜o: mostre que se (x, y) e´ um ponto de equil´ıbrio na˜o nulo, enta˜o y x = −x y e derive uma contradic¸a˜o) 2. Mostre que (cos(t), sen(t)) e´ uma soluc¸a˜o do sistema e que ela e´ perio´dica. Qual e´ a sua trajeto´ria? 18 Exerc´ıcio 4: Mostre que cada um dos sistemas a seguir na˜o possui trajeto´rias fechadas na regia˜o R, que e´ todo o plano-xy, exceto o terceiro no qual a regia˜o R e´ considerada como a regia˜o do plano-xy onde x < −1. No quarto, encontre as condic¸o˜es que as seis constantes devem satisfazer para o sistema na˜o possuir trajeto´rias fechadas no plano-xy. 1. { x′ = x+ x3 + y3 y′ = y + x3 + y3 2. { x′ = x2 + y2 y′ = 1 + x− y 3. { x′ = 2x+ x2 + y2 y′ = x2 − y2 4. { x′ = ax+ bx2 − 2cxy + dy2 y′ = ex+ fx2 − 2bxy + cy2 Equac¸a˜o de Lienard A Equac¸a˜o de Lienard e´ dada por x′′ + f(x)x′ + g(x) = 0. As equac¸o˜es de Lienard modelam o sistema f´ısico de um circuito ele´trico RLC, ou seja, um circuito ele´trico consistindo de um resistor (R), um indutor (L), e um capacitor (C), conectados em se´rie ou em paralelo. Fazendoy = x′ + F (x), onde f(x) = F ′(x) podemos reescrever a Equac¸a˜o de Lienard como o sistema de primeira ordem{ x′ = y − F (x) y′ = −g(x) (13) o qual e´ chamado de Sistema de Lienard. O Teorema de Poincare´-Bendixson e´ usualmente utilizado para estabelecer a existeˆncia de trajeto´rias fechadas de certos sistemas. Um problema muito mais delicado e´ determinar o nu´mero exato de ciclos limite de um certo sistema ou de uma certa classe de sistemas dependendo de paraˆmetros. Em 1928, Lienard provou que, para F e g satisfazendo certas condic¸o˜es, o sistema de Lienard possui um u´nico ciclo limite, como podemos ver no teorema a seguir. Teorema 8 [Teorema de Lienard]: Suponhamos que (1) as func¸o˜es F e g sa˜o de classe C1 em R, ou seja, possui derivada primeira cont´ınua; (2) as func¸o˜es F e g sa˜o ı´mpares, ou seja, F (−x) = −F (x) e g(−x) = −g(x); (3) xg(x) > 0 para todo x 6= 0; (4) F ′(0) < 0; (5) F possui zeros somente em 0 e em x = ±a, com a ∈ R; (6) F e´ mono´tona crescente para infinito para x ≥ a, quando x→∞. Enta˜o o sistema de Lienard (13) tem exatamente um ciclo limite o qual e´ esta´vel. 19 Omitiremos a prova deste teorema, pois, ale´m de ser longa e´ dif´ıcil e requer conhecimentos em ana´lise. Exemplo 5: Considere a equac¸a˜o de van der Pol x′′ + k(x2 − 1)x′ + x = 0 a qual e´ um caso particular da Equac¸a˜o de Lienard. Observe que F (x) = k ( x3 3 − x ) e g(x) = x. De fato, F ′(x) = k(x2 − 1). Portanto, o sistema de Lienard, neste caso, e´ dado por x′ = y − k ( x3 3 − x ) y′ = −x Soluc¸a˜o: Claramente as func¸o˜es F e g sa˜o ı´mpares e de classe C1 em R. Ale´m do mais, xg(x) = x2 > 0 para todo x 6= 0. Temos tambe´m que F ′(0) = −1 < 0 Ale´m disso, F (0) = 0 e para a = ±√3 temos que F (a) = 0. Para x ≥ √3 F e´ mono´tona e cresce para o infinito quando x → ∞. Assim, as hipo´teses do Teorema de Lienard sa˜o satisfeitas para estas func¸o˜es e, portanto, para todo k > 0, a equac¸a˜o de van der Pol dada anteriormente tem um u´nico ciclo limite esta´vel. Exerc´ıcio 5: Suponha que as func¸o˜es F e g no sistema (13) sejam dadas por F (x) = x3 − x x2 + 1 e g(x) = x e vefique se tais func¸o˜es satisfazem as condic¸o˜es do Teorema de Lineard. Exerc´ıcio 6: Mostre que o sistema de Lienard{ x′ = y y′ = −v(x)− u(x)y na˜o possui soluc¸o˜es perio´dicas (trajeto´rias fechadas) se acontece uma das seguintes: 1. u(x) > 0 para todo x. 2. v(x) > 0 para todo x. 20 O sistema presa-predador: o modelo Lotka-Volterra Suponhamos que x representa a densidade da presa e que y representa a densidade do predador. Sendo assim temos o seguinte sistema de equac¸o˜es presa-predador de Lotka- Volterra: { x′ = ax− bxy y′ = −cy + dxy onde r, a, c e d sa˜o constantes positivas e: 1. a: taxa de crescimentos de presas; 2. b : taxa de mortalidade das presas devido a interac¸a˜o da presa com o predador; 3. c: taxa de mortalidade de predadores; 4. d: taxa de conversa˜o de biomassa de presas capturadas em predadores. Ale´m disso, o termo ax implica que as presas crescera˜o de modo exponencial na auseˆncia de predadores. Por sua vez, o segundo termo da primeira equac¸a˜o, −bxy, esta´ relacionado a` reduc¸a˜o das presas por ac¸a˜o dos predadores. Na segunda equac¸a˜o, o termo −cy indica que a populac¸a˜o de predadores decai exponencialmente na auseˆncia de presas, e dxy indica que a perda de presas leva a` produc¸a˜o de novos predadores. Exerc´ıcio 7: Encontre os pontos de equil´ıbrio do sistema de equac¸o˜es presa-predador de Lotka-Volterra: { x′ = −x+ xy y′ = y − xy 21
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