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FENÔMENO RELIGIOSO Aula do Prof. Dr. Clóvis Ecco As pessoas, nas diferentes comunidades, elegem um local privilegiado onde o sagrado se concentra. Pode ser uma pessoa, um lugar, uma árvore, um rio, um objeto ou outro símbolo qualquer que evoque uma experiência religiosa primordial, e onde as pessoas crêem que o sagrado ali permanece. É nesses locais que o sagrado se manifesta, se revela, onde ocorre a hierofania. A hierofania pode ir desde a manifestação do sagrado num objeto qualquer, uma pedra ou uma árvore, até a hierofania suprema para um cristão, que é a encarnação de Deus em Jesus Cristo. As almas, os deuses e os demônios, isto é, os poderes sobrenaturais na maioria das vezes são concebidos desta forma. A regulação entre estes seres sobrenaturais e as pessoas humanas é que constitui o domínio da ação religiosa, surgindo então o que denominamos como o fenômeno religioso. A palavra fenômeno vem do grego “tò phainòmenon”, significa “aquilo que aparece”, “aquilo que se mostra”. Portanto, fenômeno religioso significa um sagrado que se mostra, que se revela. Ao conjunto de concepções do sagrado, dos mitos que explicitam como se dá a presença do sagrado no mundo e dos rituais criados para favorecer as relações das pessoas com o sagrado é que se denomina “religião” Muitas pessoas: benzedeiras, pajés, curandeiros, pais e mães de santo, pregadores populares, puxadores de rezas etc. acreditam ser eles próprios os objetos da hierofania. A compreensão de que Deus se serve deles para se manifestar lhes dá a certeza de legitimidade e de exclusividade ao realizar sua missão. Uma vez entendendo-se como objetos da hierofania, as pessoas passam a desenvolver formas de conduzir outras pessoas a fazer parte de seu sistema de crenças. Para isto, criam uma série de gestos, palavras e objetos sagrados, ou seja, criam ritos que possam favorecer a experiência religiosa das outras pessoas e levá-las a alcançar as graças esperadas. Muitas vezes estas pessoas que se acreditam como objetos da hierofania e criam ritos para favorecer a experiência religiosa de outras pessoas acabam por criar novas religiões. Weber denomina estas pessoas como carismáticas, ou seja, pessoa dotada de carisma. Segundo Weber (1991, 158-167), carisma se refere a qualidade pessoal, considerada extracotidiana, em virtude da qual se atribuem a uma pessoa poderes ou qualidades sobrenaturais, sobre-humanos ou, pelo menos, poderes extracotidianos específicos, ou então se a toma como enviada de Deus, como exemplar, portanto, como líder. O reconhecimento de uma pessoa como carismática pode resultar em uma entrega crente e inteiramente pessoal, nascida do entusiasmo ou da miséria e esperança da pessoa que o reconhece como tal. Weber (1991, 158-167) afirma ainda que, em sua forma genuína, a relação entre a pessoa carismática e seus seguidores é de caráter especificamente extracotidiano. É uma relação estritamente pessoal, ligada à validade carismática de determinadas qualidades pessoais do carismático e à prova destas. Quando esta relação assume o caráter de uma relação permanente, formando uma comunidade de correligionários, é necessária uma modificação substancial: institucionaliza-se o carisma. A institucionalização do carisma se torna necessária, uma vez que há um interesse ideal e material dos seguidores, em continuar a existência da relação. A continuidade do exercício do carisma exige que este seja colocado sobre fundamentos cotidianos duradouros: organizado juridicamente e economicamente. Esta necessidade se torna mais nítida quando desaparece a pessoa portadora do carisma e surge a necessidade da sucessão. O resultado da rotinização do carisma pode desembocar em instituições de tipo igrejas. Ou seja, os discípulos do carismático institucionalizam o carisma: criam um corpo doutrinal, práticas cultuais e uma organização sacerdotal, isto é, uma igreja. A doutrina se distingue do mito por ser mais orgânica, argumentativa e racional, além de estar voltada para a interpretação da realidade. A passagem de mito à doutrina segue vários estágios: coletas dos mitos espalhados num único ciclo, formação de ciclos de mitos homogêneos, consolidação de um verdadeiro e próprio corpo doutrinal: a teologia. Este discurso racional sobre o divino, a teologia, é guardada em livros sagrados. Os sacerdotes têm a função tanto de compor o discurso racional sobre a divindade como a de guardiões da tradição teológica. Os textos sagrados passam por um processo de interpretação e comentários, a fim de se tornarem mais compreensíveis mesmo nas mudanças de condições históricas. Este processo de interpretações e comentários dos textos sagrados é realizados por diversas escolas teológicas, às vezes em forte conflito devido à preferência dada a uma ou outra das três questões principais da teologia: Deus, o mundo e o homem. Este fator muitas vezes gera rupturas e a formação de outras igrejas. Quanto as formas organizadas de ação na sociedade, as organizações religiosas se compõem em: Igreja, seita e misticismo. As igrejas se caracterizam mais por uma atitude de tolerância para com as estruturas do mundo que são “consequências do pecado”, por tentativas de remediá-las, sem, contudo, deixar de rejeitá-las intimamente. As igrejas tendem à universalidade, isto é, ter a mesma extensão da sociedade; acolhem todas as pessoas e lhes distribui os meios da graça. Esta função integradora das igrejas exige que estas mantenham um compromisso com as diversas formas de comportamento existentes numa dada sociedade e a aceitar os principais elementos presentes na estrutura social existentes. As igrejas caracterizam-se ainda por uma estruturação hierárquica interna. As seitas apresentam-se como grupos que adotam atitudes de intransigências para com o “mundo”, isto é, rejeitam comportamentos e instituições das sociedades às quais pertencem, julgando-os corruptos. Os membros das seitas se propõem à obediência literal dos textos sagrados, desprezando as adaptações aceitas pelas igrejas. Por não aceitarem compromissos com o mundo, chegam a se isolarem da sociedade, permanecendo na expectativa do iminente reino de Deus. Os membros da seita visam à perfeição individual e ao ascetismo. A seita é hostil ou indiferente ao Estado e contrária à ordem eclesiástica. O Misticismo representa o polo da religiosidade de tipo individual; designa a procura de uma experiência religiosa de tipo íntimo que acontece frequentemente em grupos bem pequenos, os quais se distanciam abertamente, bem mais que a seita, da tradição religiosa eclesial. O misticismo é a tradição individual do protesto contra a redução da experiência religiosa a formalismos nos ritos, a racionalismos nas doutrinas, a burocracias na organização eclesial. BIBLIOGRAFIA BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. Trad. Sergio Miceli et al. São Paulo: Perspectiva, 1974. DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. Trad. Joaquim Pereira Neto. São Paulo: Paulinas, 1989. ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano, a essência das religiões. Trad. Rogério Fernandes. São Paulo: Martins Fontes, 1992. MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna: entre a secularização e a dessecularização. Trad. Euclides Martins Balancin. São Paulo: Paulinas, 1995. O’DEA, Thomas F. Sociologia da religião. Trad. Dante Moreira Leite. São Paulo: Pioneira, 1969. OTTO, Rudolf. O sagrado. Trad. Prócoro Velasques Filho. São Bernardo do Campo, Imprensa Metodista & Ciências da Religião, 1985. WEBER, Max. Economia e sociedade. Trad. Regis Barbosa e Karen Barbosa. Brasília: Universidade de Brasília, 1991. Proposta de atividade complementar Leia a seguinte reportagem e responda: 1. As atitudes relatadas são próprias de uma igreja, de uma seitaou de um misticismo? Por quê? DIÓGENES MUNIZ - da Folha Online - 28/04/2006 - 17h49 Dalai-lama recusa fama de "milagreiro" Se vocês vieram aqui com a expectativa de que o dalai-lama possua algum tipo de poder, bem, isso é uma bobagem". Foram estas as palavras iniciais de Tenzin Gyatso, 70, o dalai-lama, líder máximo do budismo, no seminário ministrado nesta sexta-feira (28) em São Paulo, no Palácio das Convenções do Anhembi (zona norte). Considerado por sua religião como a própria reencarnação de Buda da Compaixão, Gyatso falou sobre a relação de sua crença com a ciência e a educação para mais de 2.500 pagantes. A pedido de Gyatso, as luzes da plateia ficaram acesas, para que ele pudesse "olhar nos olhos de cada um" enquanto falava. Mas nem todos que pagaram viram o monge presencialmente. Algumas pessoas desembolsaram R$ 70 para assistir ao evento via telão ou telas de plasma colocados em três auditórios menores do Anhembi. Quem pagou R$ 120 viu dalai-lama de perto. O evento teve também a presença de pesquisadores da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e de José Gregori, ex-ministro da Justiça e presidente da Comissão Municipal de Direitos Humanos de São Paulo. Na palestra, o mestre tibetano fez questão de se destituir de alguns valores. "Não sou dotado de poderes miraculosos e sou muito cético quanto a isso." Ele comentou também a "aproximação da ciência com a religião". "A ciência de hoje não é a mesma de anos atrás, ela está cada vez mais próxima da espiritualidade", afirmou. Gyatso também falou de política, mostrando-se bastante otimista quanto à conjuntura internacional. "Ainda que tenhamos começado o século 21 de forma conturbada, acredito que este será o século do diálogo", disse. Por fim, o mentor do povo tibetano criticou o hedonismo, dizendo ser "impossível pensarmos apenas no prazer a curto prazo". Profa. Dra. Carolina Teles Lemos, texto preparado para fins didático/ material publicado.
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