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HERMENÊUTICA DWORKIN

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OLHARES PLURAIS – Revista Eletrônica Multidisciplinar, Vol. 1, Nº. 8, Ano 2013 ISSN 2176-9249 
142 OLHARES PLURAIS - Resenhas 
A CRÍTICA DE DWORKIN AO POSITIVISMO (E AS CRÍTICAS A DWORKIN)1 
 
Felipe Ivo Albuquerque2 
 
 O objetivo de Ronald Dworkin com a publicação do artigo “The model of rules”, em 
1967, depois integrado ao livro “Taking Rights Seriously” (aqui se utiliza a edição brasileira: 
DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002, 568p.), 
foi, conforme suas próprias palavras, “lançar um ataque geral contra o positivismo” 
(DWORKIN, 2002, p. 35). Para atingir tal intento, ele tomou como referência básica, ou 
melhor dizendo, alvo, a obra de Herbert L. Hart, The Concept of Law (O conceito de direito). 
Aduziu Dworkin (2002) que o positivismo jurídico teria como “esqueleto” três 
preceitos chaves: i) o direito de uma comunidade corresponderia a um conjunto de regras 
coativas, regras essas reconhecidas através de um teste de pedigree, de caráter formal (não 
substancial), que seria apto a distinguir regras válidas de inválidas e regras jurídicas de não 
jurídicas (morais, em sentido amplo); ii) o conjunto de tais regras seria coextensivo ao direito, 
de modo que se um caso concreto relativo a alguém não tivesse previsão de uma regra dentro 
daquele conjunto, ao aplicador (juiz) caberia julgar discricionariamente, criando uma nova 
regra ou complementando alguma já existente; iii) afirmar que alguém teria uma obrigação 
jurídica equivaleria a dizer que seu caso se subsumiria em uma regra jurídica válida, 
inexistindo obrigação (jurídica) na ausência de uma regra. 
Considerando que o positivismo seria, então, “um modelo de e para um sistema de 
regras”, Dworkin (2002, p. 36) aduz sua insuficiência por não incorporar outros padrões como 
princípios e políticas, que comparecem mais veementemente nos casos difíceis (hard cases), 
vinculando o julgador e evitando a adoção da tese da discricionariedade. 
 Embora diferenciando política (“padrão que estabelece um objetivo a ser alcançado, 
em geral uma melhoria em algum aspecto econômico, político ou social da comunidade”) de 
princípio (“padrão que deve ser observado, não porque vá promover ou assegurar uma 
situação econômica, política ou social considerada desejável, mas porque é uma exigência de 
justiça ou equidade ou alguma outra dimensão da moralidade”) num sentido estrito 
(DWORKIN, 2002, p. 36), é utilizando este último termo em um sentido genérico – 
abrangendo, portanto, a política – que Ronald Dworkin procura distinguir das regras. 
 
1
 Este trabalho foi apresentado como resenha crítica do artigo “O modelo de regras I”, de Ronald Dworkin, como 
requisito parcial de avaliação na disciplina Filosofia do Direito, do Mestrado em Direito Público da UFAL, 
ministrada pelo prof. Dr. Adrualdo Catão, em 2009. 
2
 Mestre em Direito Público pela UFAL, professor da SEUNE e do IBET. Email: felipeivo@hotmail.com. 
 
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 Dworkin (2002, p. 39) aponta qual seria, para ele, a distinção entre princípios e regras, 
numa formulação que já se tornou clássica: 
 
 
A diferença entre princípios jurídicos e regras jurídicas é de natureza lógica. 
Os dois conjuntos de padrões apontam para decisões particulares acerca da 
obrigação jurídica em circunstâncias específicas, mas distinguem-se quanto à 
natureza da orientação que oferecem. As regras são aplicáveis à maneira do 
tudo-ou-nada. Dados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é 
válida, e neste caso a resposta que ela fornece deve ser aceita, ou não é 
válida, e neste caso em nada contribui para a decisão. (DWORKIN, 2002, p. 
39) 
 
 
 Assim, para Dworkin (2002, p.41), a diferença explica como funciona a aplicação dos 
princípios: como, ao contrário das regras, nas quais são imputadas consequências jurídicas a 
determinadas condições (hipóteses), o princípio apenas “enuncia uma razão que conduz o 
argumento em uma certa direção” e, ainda mais, pode haver outro ou outros princípios que 
conduzam em outra direção, muitas vezes contrária a do primeiro princípio em questão. 
O que interessa, na argumentação desenvolvida por Dworkin (2002, p. 42), é que se 
um princípio for relevante para o caso, ele deve ser levado em consideração pelo aplicador 
como constituindo “uma razão que inclina numa ou noutra direção”, ou seja, algo que vincula, 
porém, não determina finalmente. 
 E prossegue o autor com uma outra afirmação que igualmente já se tornou clássica a 
respeito do assunto, demasiadamente citada: 
 
Essa primeira diferença entre regras e princípios traz consigo uma outra. Os 
princípios possuem uma dimensão que as regras não têm – a dimensão do 
peso ou importância. Quando os princípios se intercruzam [...], aquele que 
vai resolver um conflito tem de levar em conta a força relativa de cada um. 
Esta não pode ser, por certo, uma mensuração exata e o julgamento que 
determina que um princípio ou política particular é mais importante que outra 
frequentemente será objeto controvérsia. Não obstante, essa dimensão é uma 
parte integrante do conceito de um princípio, de modo que faz sentido 
perguntar que peso ele tem ou quão importante ele é. (DWORKIN, 2002, p. 
42-43). 
 
 Adiante, Dworkin (2002, p. 57) resume asseverando que “somente regras ditam 
resultados. Quando se obtém um resultado contrário, a regra é abandonada ou mudada”. Os 
princípios, ao contrário, “inclinam a decisão em uma direção, embora de maneira não 
conclusiva. E sobrevivem intactos quando não prevalecem”. 
 No tocante à tese do poder discricionário do juiz, especialmente nos chamados casos 
difíceis (hard cases), Dworkin (2002, p. 51-54), após distinguir a locução “poder 
discricionário” num sentido fraco e num sentido forte, passa a objetar a tese positivista do 
poder discricionário em sentido forte, com o seguinte argumento básico: 
 
 
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A não ser que pelo menos alguns princípios sejam reconhecidos como 
obrigatórios pelos juízes e considerados, no seu conjunto, como necessários 
para chegar a certas decisões, nenhuma regra ou muitas poucas regras 
poderão ser então consideradas como obrigatórias para eles. (DWORKIN, 
2002, p. 59). 
 
 
 Afinal, complementa Dworkin (2002, p. 59), “se os tribunais tivessem o poder 
discricionário para modificar as regras estabelecidas, essas regras certamente não seriam 
obrigatórias para eles e, dessa forma, não haveria direito nos termos do modelo positivista”. 
 Depois, Dworkin (2002, p. 65) fixa sua atenção – e, obviamente, sua crítica – na regra 
de reconhecimento, que se manifestaria, segundo Hart, no apoio institucional, defendendo 
(Dworkin) que seria inconcebível um teste de pedigree relacionado a “quanto e que tipo de 
apoio institucional é necessário para transformar um princípio em princípio jurídico. E menos 
ainda de atribuir uma certa ordem de grandeza à sua importância”. 
 Por último, após contestar as duas primeiras teses fundamentais daquilo que constitui 
– segundo ele – o esqueleto do positivismo jurídico, ou seja, a da regra de reconhecimento e a 
da discricionariedade judicial, Dworkin passa a objetar a terceira, qual seja, a de que só existe 
obrigação jurídica se uma regra preexistente impunha tal obrigação. 
 Por consequência, continuando o raciocínio, Dworkin (2002, p. 70-71) afirma que, 
para o positivismo, nos casos difíceis (quando não há regra prevendo a obrigação) o juiz cria 
discricionariamente uma nova regra, gerando uma obrigação ex post facto. Contudo, sempre 
segundo ele, 
 
[...] uma vez que abandonemos tal doutrina (do positivismo jurídico) e 
tratemos
os princípios como direito, colocamos a possibilidade de que uma 
obrigação jurídica possa ser imposta por uma constelação de princípios, bem 
como por uma regra estabelecida. Poderemos então afirmar que uma 
obrigação jurídica existe sempre que as razões que sustentam a existência de 
tal obrigação, em termos de princípios jurídicos obrigatórios de diferentes 
tipos, são mais fortes do que as razões contra a existência dela. (DWORKIN, 
2002, p. 71). 
 
A posição de Ronald Dworkin foi objeto de inúmeros ataques: desde juspositivistas 
(incluindo o próprio Hart) de mais variadas matizes até pragmatistas, passando por teóricos 
vinculados à hermenêutica filosófica e à teoria da argumentação, lançaram fortes objeções às 
suas teses, podendo-se dizer que ele, em grande medida, passou a despender a maior parte de 
seus subsequentes esforços teóricos em responder às críticas levantadas e aclarar pontos de 
sua teoria. 
Senão todas, mas a grande maioria das críticas, para além de atacarem pontos 
específicos, dirige-se na base à sua concepção objetivista, ao seu cognitivismo ético e a sua 
 
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postura teórica pré-giro linguístico, em especial quanto à defesa de uma única resposta 
correta. 
Como, porém, sua teoria se consubstanciou num ataque direto e frontal ao positivismo 
jurídico, foi deste que logo vieram respostas e contracríticas; por outro lado, as testes 
dworkinianas provocaram mudanças e adaptações no positivismo, surgindo inclusive aquilo 
que passou a ser denominado “positivismo inclusivo”. 
O positivismo inclusivo, ou “soft positivism”, visa não apenas a demonstrar a 
compatibilidade, mas mesmo a complementariedade entre a versão hartiana do positivismo 
jurídico e as críticas a ele dirigidas por Dworkin (POZZOLO, 1999, p. 229), e o que o 
caracteriza, “differenziandolo dal ‘positivismo esclusivo’ di Joseph Raz, è la tesi secondo cui 
la morale può giocare un ruolo nella determinazione dell’esistenza, del contenuto e del 
significato delle norme valide” (POZZOLO, 1999, p. 229). 
Dito de outro modo, o positivismo inclusivo, tal como teorizou Wilfrid J. Waluchow, 
constitui uma reformulação da versão hartiana do positivismo precipuamente quanto à regra 
de reconhecimento, que passa a ter entre seus critérios também a moral (POZZOLO, 1999, p. 
230). 
Inobstante e paralelamente à teorização do positivismo inclusivo, contudo, houve 
reações nas fileiras do(s) positivismo(s), digamos assim, então em voga. Como dito, o próprio 
Hart foi um dos que buscaram redarguir Dworkin. No Post Sciptum ao seu O Conceito de 
Direito, Hebert Hart assim se manifestou: 
 
 
Dworkin, ao atribuir-me a doutrina do "positivismo meramente factual", 
tratou erroneamente a minha teoria enquanto exige não só (como, na 
realidade, o faz) que a existência e a autoridade da regra de reconhecimento 
devam depender da sua aceitação pelos tribunais, mas também enquanto 
exige (como, de facto, não o faz) que os critérios de validade jurídica que a 
regra fornece devam consistir exclusivamente no tipo específico de mero 
facto que ele designa como questões de pedigree e que respeitam ao modo e à 
forma de criação do direito ou de sua adopção. Isto está duplamente errado. 
Em primeiro lugar, ignora o meu reconhecimento explícito de que a regra de 
reconhecimento pode incorporar, como critérios de validade jurídica, a 
conformidade com princípios morais ou com valores substantivos; por isso, a 
minha doutrina é aquilo que tem sido designada como "positivismo 
moderado" e não, como na versão de Dworkin, positivismo "meramente 
factual". Em segundo lugar, não há nada no meu livro que sugere que os 
critérios meramente factuais fornecidos pela regra de reconhecimento devam 
ser unicamente questões de pedigree; podem ser, em vez disso, 
constrangimentos materiais sobre o conteúdo da legislação, tais como os 
Décimo-Sexto ou Décimo-Nono Aditamentos à Constituição dos Estados 
Unidos, respeitantes ao estabelecimento da religião ou às restrições ao direito 
de voto. (HART, p. 312, apud TAVARES, 2007). 
 
 
Também Carrió (1990, p. 217 e ss), no estudo denominado Principios jurídicos y 
positivismo jurídico, objetou aduzindo que o modelo “anti-positivista” de Dworkin “cancela 
 
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la útil distinción entre fuentes formales y materiales de aquél (direito) y lo disuelve em um 
continuo de factores e ingredientes sociales” (CARRIÓ, 1990, p. 223). 
Carrió (1990, p. 224-231) enumera não poucos argumentos contra a crítica de 
Dworkin ao positivismo jurídico, representado por Hart, dos quais sobressaem os seguintes: o 
sistema de regras hartiano inclui pautas (standards) genéricas e variáveis como aquelas que 
Dworkin chama de princípios; não há diferença lógica entre regras e princípios; conflitos 
entre regras nem sempre se resolvem negando-se validade a uma delas, de modo a que pode 
haver, no caso concreto, uma solução de compromisso equiparável à noção de “peso” que 
Dworkin atribui aos princípios; a regra de reconhecimento, como toda regra jurídica, possui 
textura aberta, sendo “perifericamente indeterminada”, o que afeta a identificação de regras 
primárias; não há nenhum óbice a que princípios e políticas componham o direito positivo por 
meio da regra de reconhecimento. 
Com relação à discricionariedade judicial, um dos principais alvos de Dworkin no 
positivismo, Carrió (1990, p. 231) assevera: 
 
 
No se ve cómo la existencia de principios que, se admite, entran 
frecuentemente en conflicto com otros de “peso” semejante, puede bastar 
para eliminar la discreción de los jueces. A menos que se postule la 
existencia de otros principios de un nivel superior que indicarán cuándo debe 
darse preferencia a un principio respecto de otro, y así hasta el infinito. 
 
 
Em defesa da existência da discricionariedade também se manifestou Guastini (2009), 
argumentando que ela ocorre em vários momentos no que toca aos princípios: ao se atribuir a 
qualificação de princípio a uma disposição que não se autoqualifica expressamente como tal; 
na interpretação das disposições que – se supõe - exprimem princípios; na concretização 
(aplicação aos casos concretos); na construção de princípios não expressos; no 
balanceamento3; entre outros. 
Em outro contexto, Guastini, referindo-se expressamente a Dworkin, fala que a 
distinção, que ele chama de forte, entre normas (regras) e princípios dá a impressão de que 
seja uma distinção ideológica (em sentido lato), empregada com finalidades de política do 
direito, sendo os princípios, nesse sentido, valores pré-jurídicos, e, em última instância, 
morais, de modo que um conflito entre uma norma e princípio seria, na verdade, um conflito 
entre uma norma de direito positivo e uma norma de direito natural ou de direito 
jurisprudencial (GUASTINI, 1998, p. 272-274). 
 
3
 Veja-se, contudo, que, para o autor, “bilanciare non significa contemperare, conciliare, o alcunché del genere 
[...]. Il bilanciamento consiste piuttosto nel sacrificare o scartare un principio, applicando l’altro”. (GUASTINI, 
2009, p. 6). 
 
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Mas, como afirmado antes, não foi apenas do(s) positivismo(s) que Dworkin recebeu 
críticas. Além das escolas de pensamento referidas (pragmatismo(s), teoria(s) da 
argumentação etc.), certamente uma das críticas mais famosas – o que não significa uma das 
mais profundamente feitas – foi a de Habermas, que define a teoria dworkiniana como uma 
“teoria pretensiosa, a qual permite, especialmente em casos
difíceis, fundamentar as decisões 
singulares a partir do contexto coerente do direito vigente racionalmente reconstruído” 
(HABERMAS, 2003, p. 262). 
Habermas, no entanto, concentra sua crítica na noção dworkiniana do direito como 
integridade e principalmente na figura do juiz Hércules, “criado” por Dworkin no artigo Hard 
Cases4: 
Segundo Dworkin, princípios jurídicos e determinações de objetivos políticos 
do legislador que combinam com tais princípios, põem à disposição os meios 
argumentativos para se reconstruir a massa do direito vigente durante o 
tempo que for preciso para que ele valha como normativamente justificado 
[...]. Dworkin sabe que, para desempenhar essa tarefa, é preciso pressupor um 
juiz cujas capacidades intelectuais podem medir-se com as forças físicas de 
um Hércules. O ‘juiz Hércules’ dispõe de dois componentes de um saber 
ideal: ele conhece todos os princípios e objetivos válidos que são necessários 
para a justificação; ao mesmo tempo, ele tem uma visão completa sobre o 
tecido cerrado dos elementos do direito vigente que ele encontra diante de si, 
ligados através de fios argumentativos. Ambos os componentes traçam 
limites à construção da teoria. (HABERMAS, 2003, p. 263). 
 
Como sua crítica, entretanto, diversamente das demais já citadas, não se dirige à 
construção dworkiniana específica do “modelo de regras”, objeto deste trabalho, descabe 
explicitá-la mais detidamente aqui, ficando apenas a referência. 
Aliás, ressalvadas as respostas dadas pelas correntes do positivismo jurídico, as 
grandes críticas que são feitas a Ronald Dworkin têm por alvo aqueles aspectos mencionados 
(cognitivismo ético, pensamento metafísico etc.), referentes à sua doutrina e à sua postura 
filosófica como um todo. 
Por essa razão, e como o objetivo do presente estudo é a descrição e análise crítica do 
capítulo 2 (“O Modelo de Regras I”) do seu Levando os Direitos a Sério, tais ordens de 
críticas transcendem o âmbito do que aqui interessa, e que se relaciona com o ataque que 
Dworkin fez contra o positivismo, questionando-o como um modelo que entende o direito 
como um sistema formado exclusivamente por regras e propugnando por um modelo que 
albergue a noção de princípios. 
No Brasil, a distinção entre regras e princípios também foi objeto de críticas por Ávila. 
Referindo-se à tese dworkiniana da referida distinção com base no critério distintivo do modo 
final de aplicação, Ávila afirma que esse modo não se determina pelo texto que está sendo 
 
4
 Referente ao capítulo 4 (p. 127-203) do livro Levando os Direitos a Sério. A figura (metafórica) do juiz 
Hércules é descrita a partir da página 165. 
 
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interpretado, mas decorre de “conexões axiológicas” construídas ou intensificadas pelo 
intérprete (ÁVILA, 2003, p. 36). 
Ademais, a consideração de circunstâncias relacionadas ao fato concreto não diria 
respeito à estrutura da norma (regra ou princípio), mas à sua aplicação, o que leva a que tanto 
os princípios como as regras podem perfeitamente vir a exigir a consideração quanto a 
circunstâncias específicas do caso (ÁVILA, 2003, p. 39). Assevera, por conseguinte, que “a 
afirmação de que as regras são aplicadas ao modo tudo ou nada só tem sentido quando todas 
as questões relacionadas à validade, ao sentido e à subsunção final dos fatos já estiverem 
superadas” (ÁVILA, 2003, p. 39)5. 
 Ávila (2003, p. 42) também critica afirmação de Dworkin pela qual os princípios 
seriam aplicados de forma gradual: 
 
[...] não são os princípios que são aplicados de forma gradual, mais ou menos, 
mas é o estado de coisas que pode ser mais ou menos aproximado, 
dependendo da conduta adotada como meio. Mesmo nessa hipótese, porém, o 
princípio é ou não aplicado: ou o comportamento necessário à realização ou 
preservação do estado de coisas é adotado, ou não é adotado. Por isso, 
defender que os princípios sejam aplicados de forma gradual é baralhar a 
norma com os aspectos exteriores, necessários à sua aplicação. 
 
 
 Como se pode perceber, são muitas as objeções levantadas contra a tese de Dworkin 
acerca do que caracteriza o positivismo jurídico, da distinção entre regras e princípios, da 
discricionariedade judicial e da regra de reconhecimento. Em que pese, contudo, a 
procedência de muitas dessas objeções, observa-se que, a bem da verdade, o positivismo 
jurídico teve que ser, de certa forma, reformulado, mais do que simplesmente defendido. 
 Mas é nesse sentido - e nesses limites - que o texto de Dworkin deve ser visto: como 
uma oposição a uma determinada forma de positivismo feita há mais de quarenta anos. O que 
se quer dizer é que muito já foi teorizado de lá para cá (inclusive o positivismo de hoje não é 
aquele contra o qual se insurgiu Dworkin) de modo a tornar em grande medida insustentáveis 
ou no mínimo diacrônicos os paradigmas teóricos e filosóficos sobre os quais o autor 
desenvolveu suas ideias. 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da Definição à Aplicação dos Princípios 
Jurídicos. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2005. 
 
 
5
 “A única diferença constatável continua sendo o grau de abstração anterior à interpretação (cuja verificação 
também depende de prévia interpretação)” (ÁVILA, 2003, p. 40). 
 
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149 OLHARES PLURAIS - Resenhas 
CARRIÓ, Genaro R. Notas Sobre Derecho y Lenguaje. 4 ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 
1990. 
 
DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 
 
GUASTINI, Riccardo. Teoria e Dogmatica Delle Fonti. Milano: Giuffrè Editore, 1998. 
 
______. Principi di diritto e discrezionalità giudiziale. Ambiente Diritto. Disponível em: 
<http://www.ambientediritto.it/dottrina>. Acesso em: 27 jun. 2009. 
 
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: Entre Facticidade e Validade. 2 ed. Rio de 
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, v. I. 
 
POZZOLO, Suzanna. Riflessioni su Inclusive e Soft Positivism. In: Analisi e Diritto. Torino: 
G. Giappichelli Editore, 1999. Disponível 
em:<http://www.giuri.unige.it/intro/dipist/digita/filo/testi/analisi_1998/>. Acesso em: 22 nov. 
2008. 
 
TAVARES, Rodrigo de Souza. Neoconstitucionalismo e positivismo inclusivo: uma análise 
sobre a reformulação da teoria do positivismo jurídico hartiano. Jus Navigandi, Teresina, ano 
11, n. 1418, 20 maio 2007. Disponível em: 
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9897>. Acesso em: 29 jun. 2009.

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