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Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 1 www.medresumos.com.br INFECÇÃO EM CIRURGIA Infecção, por definição, é a colonização de um organismo hospedeiro por uma espécie estranha. Em uma infecção, o organismo infectante procura utilizar os recursos do hospedeiro para se multiplicar (com evidentes prejuízos para o hospedeiro). O organismo infectante, ou patógeno, interfere na fisiologia normal do hospedeiro e pode levar a diversas consequências. A resposta do hospedeiro é a inflamação. A infecção em cirurgia é um importante assunto para se estudado, desde seu histórico aos meios de prevenção. São doenças graves como a fasceíte necrotizante (Síndrome de Fournier), um tipo de infecção que leva a uma extensa necrose da fáscia muscular abdominal e lombar e de músculos adjacentes que nos mostra a importância e magnitude da seriedade deste assunto. Se não tratada precocemente, o paciente vai a óbito. HISTÓRICO Hipócrates (460 a.C) e Galeno (157 a.C), desde os seus tempos, já se mostravam preocupados com o controle da infecção cirúrgica. Galeno, por exemplo, já dizia uma frase válida até os dias atuais e bastante funcional: “Onde houver pus, drene!”, isto é, não há nenhum tratamento mais efetivo para um abscesso que não seja a drenagem. Semmelweis, em 1847, descobriu e relatou a infecção puerperal, isto é, a infecção que acontece nas mulheres pós-parto. Semmelweis, depois de uma minuciosa investigação, associou a alta incidência de infecção puerperal com bactérias trazidas pelos anatomistas das salas de demonstração anatômica, uma vez que os mesmos anatomistas eram os obstetras responsáveis pelo parto naquela instituição. Com isso, Semmelweis recomendou a lavagem das mãos para aqueles que se deslocavam dos laboratórios de anatomia para os blocos cirúrgicos e salas de parto, reduzindo, assim, os índices de infecção da instituição. Pasteur (1862) foi responsável por estudar e desenvolver os processos de putrefação e fermentação. Lister (1865), por sua vez, descobriu o ácido carbólico, primeira substância utilizada para a antissepsia da ferida operatória. Koch (1877) descobriu o bacilo álcool-ácido resistente (BAAR), o bacilo da tuberculose. Alexander Fleming (1929) descobriu e isolou do fungo Penicillum notatum a penicilina, antibiótico que foi vastamente utilizado em seu tempo e que reduziu amplamente os índices de infecção hospitalar. Seu vasto uso, entretanto, predispôs ao desenvolvimento de germes resistentes e hoje, já quase não é mais utilizada. Ainda no estudo de infecção cirúrgica, temos uma importante participação de Haslted (1877), fundador da residência médica em cirurgia geral e criador de um tipo de pinça hemostática bastante utilizada, foi o responsável por elaborar os parâmetros básicos da técnica cirúrgica. CONTEXTO ATUAL DA INFECÇÃO CIRÚRGICA Nos EUA, 500.000 pacientes por ano desenvolvem infecção pós-cirúrgica. Para estes, os gastos são em média 5 vezes maiores que um paciente sem infecção. Logo de cara, o tempo de hospitalização para pacientes com infecção se prolonga em mais de 20 vezes. De acordo com a literatura vigente, os fatores mais importantes na sua prevenção são: Técnica cirúrgica adequada Integridade da resposta anti-infecciosa do paciente Antibiótico-profilaxia (coadjuvante) Procedimento SEM INFECÇÃO COM INFECÇÃO Permanência Custo (US$) Permanência Custo (US$) Apendicite 6,3 dias 705.51 12,3 dias 1394,48 Vesicula 11,4 dias 2139,12 18,5 dias 2582,13 Colectomia 12,2 dias 2823,58 26,0 dias 4417,7 Histerectomia 6,8 dia 1096,44 13,3 dias 1885,29 Cesárea 5,7 dia 775,30 11,5 dias 1302,80 Safena 14,6 dias 4939,82 26,0 dias 7542,50 GREEN, JW; WENZEL, RP Ann.Surg. 185:264, 1987. PRINCÍPIOS GERAIS DA INFECÇÃO CIRÚRGICA Os princípios básicos de controle da infecção modificaram radicalmente a resposta ao tratamento cirúrgico. Este se transformou, de um evento temido, com infecção quase universal e morte esperada, em outro que fornece grande alívio do sofrimento e prolongamento da vida. Infecção: invasão do organismo por microrganismos patogênicos e reação dos tecidos aos germes Arlindo Ugulino Netto. TÉCNICA OPERATÓRIA 2016 Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 2 www.medresumos.com.br o Risco de infecção (Altemeier): depende diretamente do número de microrganismos (carga bacteriana) e da virulência destes; depende inversamente da resistência do hospedeiro N.V/R o Infecção cruzada: maioria dos tipos de infecção hospitalar. Significa a infecção que se transmite de um doente para o outro. É por esta razão que se procura separar ou isolar, dentro das enfermarias cirúrgicas, os doentes de acordo com o potencial de contaminação da ferida operatória que cada um oferece. Pacientes que foram submetidos a uma hernioplastia inguinal (considerada uma cirurgia limpa), por exemplo, devem ser separados daquelas que foram submetidas a uma. o Autoinfecção: ocorre quando a infecção se desenvolve em um certo sítio do doente e, depois de um procedimento cirúrgico, a infecção se manifesta ou se desenvolve em outro sítio, no mesmo hospedeiro. o Infecção hospitalar x Infecção comunitária: são conceitos epidemiológicos e pouco interferem do ponto de vista terapêutico. A infecção comunitária é a que acontece na residência do portador; a infecção hospitalar é a adquirida dentro do ambiente hospitalar. É evidente que todas as infecções cirúrgicas são infecções hospitalares. Infecção cirúrgica: infecção que ocorre em consequência de um ato cirúrgico, seja ela no sítio cirúrgico ou distante deste. Portanto, não haverá infecção cirúrgica se não tivermos um ato cirúrgico prévio. Ferida limpa: é aquela decorrente de operações eletivas, com fechamento por primeira intenção, não- traumáticas, sem desvio de técnica operatória asséptica, sem contato com cavidades corporais habitual ou frequentemente colonizadas por microrganismos. Ex: feridas decorrentes de herniorrafias, tireoidectomias, safenectomias, etc. Ferida potencialmente contaminada (ou limpo-contaminada): ferida não-traumática, decorrente de penetração de cavidade corporal habitual ou frequentemente colonizada por microrganismos (sem presença de inflamação aguda), acarretando ínfima contaminação. Ex: feridas decorrentes de gastrectomias, colecistectomias, histerectomias. Ferida contaminada: ferida traumática tratada com menos de 6 horas após o trauma, com extensa contaminação advinda de cavidade corporal habitual ou frequentemente colonizada com microrganismos ou da manipulação de inflamação aguda não-supurativa. Incluem-se nesta categoria feridas crônicas abertas para enxertia. Ex: feridas decorrentes de colecistectomias (em vigência de quadro de colecistite aguda), colectomias, enxertias para úlceras de pressão, etc. Ferida infectada (ou suja): decorrente de manipulação de afecções supurativas, como abscessos; advinda de perfuração pré-operatória de cavidade corporal habitual ou frequentemente colonizada com microrganismos; aquela decorrente de ferida traumática penetrante ocorrida há mais de seis horas. Ex: feridas decorrentes de perfurações de cólon e intestino delgado, drenagem de abscessos em geral, etc. FATORES DE RISCO Os fatores de risco para desenvolvimento de infecção pós-operatória podem ser gerais ou específicos: Fatores de risco gerais: Extremos da idade; Obesidade/Desnutrição; Choque (má perfusão tecidual); Arteriosclerose; Câncer; Imunossupressão; Corticosteroides; Diabetes mellitus descompensado. Fatores de risco específicos: Contaminação; Tecidos desvitalizados (daí a importância de desbridar qualquer tecido desvitalizado); Corpos estranhos; Hematoma/Seromas; Irrigação sanguínea precária. o Perfusão tecidual é definida pelo produto dos seguintes parâmetros: Volemia x Hb x O2. Qualquer fator que interfira em um dos três fatores, teremos problemas na cicatrização e uma eventual infecção. o Corpos estranhos:sempre que possível, devem ser retirados. FONTES DE CONTAMINAÇÃO E MICROBIOLOGIA DA INFECÇÃO CIRÚRGICA Quanto à natureza ou origem dos processos infecciosos temos: Infecção exógena (30%): Mãos, Objetos, Instrumental cirúrgico, Ar e Líquidos. Infecção endógena (70%): Flora própria do espaço nasofaríngeo e estômago, Flora própria do TGU e Flora própria da pele. De acordo com a microbiologia das infecções estudadas ao longo de 10 anos nos EUA, observamos que os principais agentes causadores de infecção são o S. aureus e o S. epidermidis, bactérias residentes naturais da pele. Mais recentemente, houve um surto de infecção com micobactérias. Entre 2003/2004 foram notificados infecções por M. fortuitum em mamoplastias Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 3 www.medresumos.com.br no estado de São Paulo e por M. abscessus em videocirurgia no estado do Pará; Foram registrados um total 2.102 casos notificados de 2003 até o dia 13 de agosto de 2008. Os componentes epidemiológicos da infecção são: Videocirurgias (laparoscopias, artroscopias); Videoescopias como endoscopias do aparelho digestivo e geniturinário; Broncoscopias ou outros procedimentos que utilizem cânulas e fibras óticas; Implantes de próteses ou órteses, oftalmológicos, ortopédicos ou cardíacos; Procedimentos estéticos invasivos, lipoaspiração, cirurgia plástica Os componentes clínicos da infecção são: presença de lesões eritematosas de difícil cicatrização, nodulares com ou sem secreção, fístulas, ulcerações, abscesso quente ou frio. Não responsivo aos tratamentos antimicrobianos convencionais. CLASSIFICAÇÃO DAS FERIDAS QUANTO À CONTAMINAÇÃO Especificamente em relação à ferida operatória, o grau de contaminação permite a sua divisão em quatro classes principais: (1) limpa, (2) potencialmente contaminada, (3) contaminada e (4) infectada. As infecções da ferida operatória também podem ser classificadas como superficiais (comprometendo pele e tecido celular subcutâneo) e profundas (comprometendo o espaço subaponeurótico das feridas). FERIDA LIMPA Decorrente de cirurgia eletiva, não traumática. Não há infração ás regras de assepsia Não atravessa tecidos infectados. Não há penetração dos tratos digestivo, respiratório superior ou gênito-urinário. Ex: feridas decorrentes de herniorrafias, hernioplastias inguinais, tireoidectomias, safenectomias, mastectomia radical, etc. Taxa de infecção: 2 – 5% O uso de antibióticos não é necessário, salvo em situações especiais. FERIDA POTENCIALMENTE CONTAMINADA (LIMPO-CONTAMINADA) Ferida decorrente de cirurgia em tecidos colonizados por flora pouco numerosa (100.000 colônias/ml) Tecido de difícil descontaminação Ausência de processo infeccioso local Pequena infração ás regras de assepsia (como um simples gotejar de suor no campo cirúrgico) Penetração dos tratos digestivo, respiratório ou geniturinário, mas sem extravasamento de conteúdo Ex: feridas decorrentes de gastrectomias, colecistectomias, histerectomias. No geral, cirurgias de esôfago, estômago ou intestino delgado. Taxa de infecção: 9 – 11% Antibioticoprofilaxia com cefalosporinas: Cefalotina (Keflin®) 1g EV 6/6h ou Ceftriaxona (Rocefin®) 1-2g EV. FERIDA CONTAMINADA Tecidos com flora maior que 100.000 colônias/mL Tecidos de impossível descontaminação Extravasamento de conteúdo gastrointestinal (secreções gastro-entéricas). Isto é, cirurgias entéricas até a região íleo-terminal. Abertura dos tratos geniturinário e biliar na presença de infecção Grande infração às regras de assepsia Ferida traumática com menos de 6h de evolução Ex: feridas decorrentes de colecistectomias (em vigência de quadro de colecistite aguda), colectomias, enxertias para úlceras de pressão, desbridamentos. Taxa de infecção: 16 – 22% Antibioticoprofilaxia com esquema tríplice: Cefalosporinas: Cefalotina 1g EV 6/6h para cobrir bactérias Gram-positivas Aminoglicosídeos (Gentamicina 80mg EV diluído em 100ml de SF) ou Quinolonas (Ciprofloxacino 400mg EV) para cobrir Gram-negativos Metronidazol (500mg EV 8/8h) ou Clindamicina (600mg EV) para cobrir anaeróbios. FERIDA INFECTADA Presença de infecção local Operação sobre área com infecção bacteriana sem pus Quando se atravessa tecido são para acessar coleção purulenta Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 4 www.medresumos.com.br Extravasamento de fezes durante o procedimento (pode ocorrer em abertura do íleo-terminal e ceco até o reto). Ferida traumática aberta com tecidos desvitalizados ou corpos estranhos Ferida traumática por agente sujo Contaminação fecal de cavidade abdominal Ferida traumática com mais de 6 h de evolução. Por esta razão, não se sutura feridas traumáticas com mais de 6h de duração (salvo em caso de feridas extensas para auxiliar a cicatrização). Ex: feridas decorrentes de perfurações de cólon e intestino delgado, drenagem de abscessos em geral, apendicectomia (com apendicite aguda com pus), etc. Taxa de infecção: 29 – 38% Preconiza-se o uso de Antibioticoterapia intra-operatória e pós-operatória com esquema tríplice BIOMATERIAIS E INFECÇÃO Os biomateriais também são associados, em alguns estudos, com a infecção. Quando estes equipamentos produzem infecção, devem ser retirados imediatamente. As vias de contaminação de cateteres vasculares, principalmente aqueles do tipo implantáveis, pode ocorrer pela manipulação devido ao contato com a mão do profissional; contaminação pela microflora da pele do paciente; colonização do canhão; contaminação pelo fluido presente no cateter; propagação da via hematogênica; contaminação durante a inserção; etc. Próteses (como a mamária, oculares, ortopédica, etc.) também são comumente causadores de infecções. SÍTIOS DE INFECÇÃO CIRÚRGICA Em resumo, temos como principais sítios de infecção cirúrgica: Local da Infecção % Trato urinário 37,0 Sítio cirúrgico 35,0 Ap. respiratório 16,0 Corrente sanguínea 8,0 Infecção associadas a DIV 3,0 Ap. cardiovascular 1,0 Infecção do trato urinário: são determinadas quando alcançam 10 5 microrganismos/ml. Os fatores predisponentes mais importantes são: cateterismo vesical; sistema aberto de coleta de urina; irrigação vesical em sistema aberto; falha técnica de cateterização vesical. Infecção do sítio cirúrgico (ISC): são infecções que ocorrem na incisão cirúrgica ou infecções que ocorrem em tecidos manipulados durante a operação. Deve ser diagnosticada em até 30 dias após a cirurgia. As infecções do sítio cirúrgico podem ser classificadas de acordo com a profundidade: Biomaterial Incidência de infecção Catéteres intravasculares 5-25% Próteses ortopédicas 1-6% Implantes cardiotorácicos 1-8% Próteses vasculares 1-5% Shunts neurocirúrgicos 1-5% Prótese ocular 1-3% Prótese mamária 1-4% Telas 1-3% Tipo de cateter Taxa de IPCS relacionada ao cateter Totalmente implantáveis (cateteres para quimioterapia) 0,04 (NEJM, 272, 1965) Semi-implantáveis (Hickman e Broviac) 0,2 Arterial 01 (Am. J. Dis. Child., 145, 1991) Cateter venoso central de curta permanência 03 – 05 Umbilical 05 (Am. J. Dis. Child., 145, 1991) Flebotomia 06 Hemodiálise 10 (J. Infect. Dis. 154, 1986) Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 5 www.medresumos.com.br o Infecção superficial abrange pele e tecido celular subcutâneo o Infecção profunda: abrange fáscia e músculo o Infecção específica abrangendo espaços e órgãos intracavitários O Germe mais comum de infecção do sítio cirúrgico é o Staphylococcus aureus e alguns Gram negativos, Estreptococos e Clostrídeos. Na apendicite, é comum a infecção por Bacteroides fragilis e E. coli. Os fatores predisponentes são: Falha da técnica cirúrgica Antissepsia inadequada da pele Tricotomia na véspera da cirurgia (deve ser feita em até 2 horas antes da cirurgia e na sala de cirurgia) Drenagem aberta de secreções Longo período de internação pré-operatória Indisciplina na SO DIAGNÓSTICO Para um diagnóstico completo de uma infecção cirúrgica, devemos proceder também com o diagnóstico das falências orgânicas e com o diagnóstico microbiológico. Pelo menos um desses critérios deve estar presente para o diagnóstico de infecção cirúrgica: Secreção purulenta no local da incisão (infecção do sitio cirúrgico superficial), drenada de tecidos moles profundos (infecção do sitio cirúrgico profunda) ou de órgão ou cavidade manipulados na cirurgia (infecção do sitio cirúrgico específica); Organismo isolado com técnica asséptica de material teoricamente estéril, de local previamente fechado; Abscesso ou evidência radiológica ou histopatológica sugestiva de infecção (tecidos profundos); Sinais inflamatórios na incisão e febre; Diagnóstico de infecção de sitio cirúrgico pelo médico assistente é necessário exame da ferida para comprovação. A febre que ocorre no pós-operatório induz a atenção do cirurgião para melhor avaliar o paciente e descobrir a causa deste processo. A febre deve ser avaliada de acordo com a cronologia de evolução do paciente 3/4 dos pacientes cursam com febre pós-operatória, sem evidências de infecção. 24h: geralmente é causada pela liberação de pirógenos endógenos (IL-1) da REMIT ou por drogas utilizadas na anestesia. 48h: geralmente está relacionada com a atelectasia. Após o segundo dia de pós-operatório o diagnóstico diferencial de atelectasia deve ser feita com flebite, pneumonia e infecção do trato urinário 4º ou 5º está relacionada com doença pulmonar obstrutiva e infecção do sítio cirúrgico. 7º - 10º: ruptura de anastomose e abcessos intraperitoneais. O diagnóstico da infecção pode ser obtido através dos seguintes meios: Hemograma: leucocitose com aumento de polimorfonucleares Bioquímica: ureia Radiografia de tórax: diagnóstico de pneumonia USG abdômen ou tórax: diagnóstico de peritonite TC abdômen ou tórax DIAGNÓSTICO DAS FALÊNCIAS ORGÂNICAS Pulmonar: necessidade de assistência ventilatória Renal: creatinina > 2mg/dl Hepática: Bb > 2,3mg/dl Gastrointestinal: inabilidade em manter nutrição oral SNC: depressão sensorial ou coma Circulatória: necessidades de drogas para manter pressão arterial Coagulação: incoagulabilidade DIAGNÓSTICO MICROBIOLÓGICO Depois da colheita de secreção (exame direto + Gram/ Cultura), é necessário realizar uma hemocultura e um antibiograma. Caso o resultado não esteja disponível antes do início do tratamento, deve-se iniciar o tratamento com antibiótico de largo espectro, uma forma de antibioticoterapia empírica. No momento em que tivermos o resultado da cultura, voltaremos o tratamento com antibióticos mais específicos. Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 6 www.medresumos.com.br TRATAMENTO O tratamento das infecções cirúrgicas envolvem cirurgia, antibioticoterapia, oxigenioterapia hiperbárica e o eventual tratamento das complicações sistêmicas. TRATAMENTO CIRÚRGICO A abordagem cirúrgica da infecção pós-operatória varia muito, mas está baseada nos seguintes procedimentos: Desbridar tecidos desvitalizados Remoção de corpos estranhos Drenagem dos abscessos SELEÇÃO INICIAL DO ANTIBIÓTICO A antibioticoterapia deve ter início logo que diagnosticada a infecção. De preferência, realizar um tratamento mais voltado para o germe encontrado nos exames microbiológicos. Contudo, caso não se tenha o resultado em mãos, deve-se proceder com um tratamento mais amplo (como, por exemplo, o esquema tríplice que cobre gram-positivos, gram-negativos e anaeróbios) para, só depois da ciência do resultado microbiológico, especificar o tratamento. A tabela abaixo relaciona algumas causas comuns de infecção e seus respectivos tratamentos que trouxeram resultados satisfatórios, bem como sugestões de antibióticos específicos: Tipo de infecção Bactéria mais frequente Antibiótico indicado Observações Erisipela Estreptococos Penicilina procaína IM ─ Linfangite aguda Estreptococos Penicilina ─ Abscessos Estafilococos Oxacilina Drenagem cirúrgica Mastite Estafilococos Oxacilina Drenagem cirúrgica Ferida traumática infectada Estafilococos Estreptococos do grupo A Clostrídeos Oxacilina Penicilina Metronidazol Drenagem cirúrgica + desbridamento Celulite por catéter Estafilococos Pseudomonas Oxacilina Imipenem Retirar cateter Queimaduras Estafilococos Oxacilina Desbridamento + tratamento tópico Peritonite secundária á lesão intestinal Bacilos Gram negativos Cocos Gram positivos Aminoglicoídeos Penicilinas Tratamento cirúrgico Colecistite aguda, Colangite Coliformes Bacteroides Enterococos Proteus Ampicilina + Gentamicina + Metronidazol Colecistectomia + drenagem Abscesso hepático Coliformes Proteus Enterococos Estafilococos Bacteroides Entamoeba Metronidazol + Amicacina Drenagem cirúrgica Abscesso periretal Coliformes Bacteroides Enterococos Proteus Metronidazol + Amicacina Drenagem cirúrgica OXIGÊNIOTERAPIA HIPERBÁRICA A oxigenioterapia hiperbárica consiste no aumento da tensão de O2 no tecido limítrofe da infecção. Este tratamento é aplicado em lesões em que se tem uma alta suspeita de infecção por bactérias anaeróbicas. Além da ativação dos leucócitos, este tipo de tratamento diminuiu a produção de endotoxina (Clostrídeos). O aprimoramento da angiogênese capilar e facilitação da proliferação dos fibroblastos são vantagens deste tipo de tratamento. A recusa de pacientes claustrofóbicos é uma das desvantagens do tratamento. MEDIDAS DE PREVENÇÃO A prevenção da infecção consiste em quatro etapas: ação pré-primária, pré-operatório, centro cirúrgico e pós- operatório. Desta forma, temos: Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 7 www.medresumos.com.br Ação pré-primária Tratar qualquer infecção remota em relação ao sítio cirúrgico Controlar níveis de glicemia Encorajar a suspensão do fumo Ação pré-operatória O tempo de internação hospitalar deve ser minimizado Evitar internação na véspera da cirurgia Exames pré-operatórios em nível ambulatorial A lavagem das mãos é o meio mais eficaz de evitar a ISC Higiene corporal (banho): diminuição da colonização da pele (noite anterior ou manhã) Tricotomia: tem a finalidade de facilitar a realização da operação (tonsuradores elétricos) – Seropian, 1971, Am J Surg (9,3X o risco de ISC). Deve ser feita duas horas antes da cirurgia e restrita á topografia da operação Centro cirúrgico Preparação do ambiente cirúrgico: fluxo adequado, limpo, disciplina (normatização de rotinas e procedimentos básicos); acesso limitado e circulação restrita; Escovação e vestuário cirúrgico adequados; Preparação do paciente cirúrgico e da região a ser operada. Pós-operatório Acompanhamento do doente e da evolução da ferida operatória; Troca de curativos diária; Realizar antibiótico-profilaxia ou antibioticoterapia, se necessário; Controle pós-operatório: Retirada dos fios mais breve possível Drenos: Cruse (1980) afirma que os drenos foram responsáveis por 73% de infecção do sítio cirúrgico (ISC) em seu estudo. Portanto, a sua indicação deve ser restrita e criteriosa. Quando utilizado, deve-se manter em sistema de coleta fechado. Deve ser retirado tão logo tenha cumprido sua finalidade Curativos: deve ser usado por apenas 24 horas, uma vez que depois deste tempo, a ferida já terá sofrido reepitelização e, portanto, protegida de infecção. Caso ela infeccione, o problema foi antes e não depois da retirada do curativo. ANTIBIOTICOPROFILAXIA E ANTIBIOTICOTERAPIA A antibiótico-profilaxiatem por objetivo administrar antimicrobianos ao paciente antes da contaminação ou infecção terem ocorrido e erradicar ou retardar o crescimento de microrganismos para evitar a Infecção Cirúrgica. Não há necessidades de antibiótico-profilaxia em casos de ferida limpa, salvo em algumas situações especiais (como as mostradas logo em seguida). Este parâmetro está restrito apenas para os casos de ferida contaminada e potencialmente contaminada, já no intuito de evitar uma futura proliferação de bactérias. Para os casos de ferida infectada, o uso de antibióticos deve ser feito não de maneira profilática, mas sim, como um regime de tratamento; então, para os casos de ferida infectada, faz-se antibioticoterapia. Portanto, antibioticoprofilaxia não tem indicação para os casos de ferida limpa, sobretudo em pacientes hígidos, com saúde plena e sem fazer uso de medicamentos. Contudo, é ela é indicada nas seguintes situações especiais, mesmo em caso de cirurgias limpas: Indivíduos com mais de 70 anos Desnutridos Imunossuprimidos Urgências Implante de próteses Esplenectomia: uma vez que se retira uma fonte importante de macrófagos teciduais, sugere-se um suporte com antibióticos. Hernioplastia incisional Pacientes portadores de: doença valvular reumática; diabetes descompensado; obesidade mórbida (IMC > 40); hérnias multirecidivadas; pacientes com mais de 3 diagnósticos. A escolha do antibiótico varia de acordo com alguns parâmetros. De preferência, devemos optar por um que atenda os seguintes requisitos: ação contra a maior parte dos germes; administração endovenosa; ser pouco tóxico; ser fraco indutor de resistência; não deve ser o antibiótico de primeira escolha no tratamento de infecções graves; deve aumentar minimamente os custos. Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 8 www.medresumos.com.br Quanto ao início da antibioticoprofilaxia em cirurgias limpo-contaminadas ou contaminadas, devemos seguir a seguinte regra: “Não comece muito cedo; não comece tarde.” Os níveis tissulares do antibiótico devem ser máximos quando “o bisturi iniciar seu trabalho”, isto é, no momento da incisão ou enquanto se faz a indução anestésica. Procedimento cirúrgico Esquema recomendado Cabeça e Pescoço Laringectomia, faringectomia, glossectomia, adenoamigdalectomia Tireoide Penicilina G cristalina 2 M UI Cefazolina 2g Tórax Esternotomia, biópsia ganglionar e pulmonar profunda Lobectomia, pneumectomia Cefazolina 2g Cefazolina 2g Esôfago e Estômago Esofagectomia e Esôfagogastrectomia Gastrectomia Gastroenteroanastomose Enterectomia de jejuno e íleo proximal Enterectomia de íleo terminal Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina + Metronidazol 500mg Pâncreas e Trato hepatobiliar, Baço Pancreatectomia parcial Duodenopancreatectomia Hepatectomia Cirurgia sem colangite Cirurgia com colangite Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cirurgias de cólon, reto e ânus Colectomia Colostomia Fechamento de colostomia Ressecção anterior de reto Amputação abdômino-perineal de reto Exenteração pélvica Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cirurgias ginecológicas Histerectomia abdominal Vulvectomia Anexectomia Estadiamento cirúrgico de tumor de ovário Cirurgia de Wertheim-Meigs Cefazolina 2g Cefazolina 2g + Metronidazol 500mg Cefazolina 2g Cefazolina 2g Cefazolina 2g PROTEÇÃO PROFISSIONAL EM CIRURGIA (EXPOSIÇÃO À MATERIAL BIOLÓGICO) As principais doenças transmitidas por acidente ocupacional e riscos de contágio são Hepatite B / HBV 10 – 30% de risco Hepatite C / HCV 1 – 2% de risco HIV 0,3% PROFILAXIA PARA O HIV EM CASOS DE EXPOSIÇÃO ACIDENTAL 1º Passo: Lavar área contaminada; Comunicar à Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) imediatamente; Colher sangue 24/48 h do doente para realizar ELISA; Controle periódico anti-HIV a cada 30 dias até 6º mês. 2º passo: O material é infectante? São eles: sangue, secreção, líquidos compartimentais (Obs.: Fezes, salivas, suor e lágrimas não são infectantes). 3º passo: Avaliar/Pesquisar os envolvidos: tanto o paciente (fonte) como o profissional (exposto). o Para a fonte Fazer o teste rápido (obrigatório). Se HIV (-) / Paciente desconhecido ou sumido Não se faz nada! Considerar, é claro, as características clínicas e epidemiológicas do exposto. HIV (+) Fazer a profilaxia com antirretrovirais (ARV) até 72 horas. o Para o exposto Fazer o protocolo normal, somente para saber se, eventualmente, ele já tem o vírus. Fazer ELISA Acompanhar sorologia por 6 meses (para acompanhar se houve soroconversão ou não) 4º passo: iniciar profilaxia. A exposição com infecção positiva é considerada uma Emergência Médica Ela deve ser iniciada em 2 horas (no máximo, 72 horas). Tem-se 2 esquemas de profilaxia ARV (com duração de 28 dias). Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● TÉCNICA OPERATÓRIA 9 www.medresumos.com.br Básico: quando o risco de infecção é menor (o acidente acometeu apenas mucosa ou pele não- íntegra). Utilizar: Zidovudina (AZT) + Lamivudina (3TC). Expandido: quando o risco de infecção é maior (acidente com acometimento percutâneo) ou em caso de acidente com mucosa/pele não-íntegra for considerado de maior gravidade (“muito sangue por muito tempo”). Utilizar: AZT + 3TC + (Lopinavir/Ritonavir ou Tenofovir). PROFILAXIA PARA HBV Pesquisar fonte: HBsAg, anti-HBc IgM. Exposto: HBsAg, anti-HBc total e anti-HBs. Profilaxia: Vacina + Imunoglobulina (em até 7 dias). PROFILAXIA PARA HCV Pesquisar fonte e exposto: Anti-HCV. Não há profilaxia indicada.
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