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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS RURAIS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS FLORESTAIS SECAGEM DE MADEIRA SERRADA Princípios, métodos e controle do processo Prof. Elio José Santini Santa Maria – RS 1999 SANTINI, Elio José 2 1.INTRODUÇÃO 2. RAZÕES DA SECAGEM DE MADEIRAS 3. IMPORTÂNCIA DA ESTRUTURA ANATÔMICA DA MADEIRA 4. ASPECTOS FÍSICOS DO PROCESSO 4.1. Movimento capilar da água na madeira 4.2. Difusão da água na madeira 4.3. Secagem da madeira como um fenômeno de difusão 4.4. Fatores que influem na secagem da madeira 4.4.1. Fatores inerentes à madeira 4.4.2. Fatores inerentes ao ambiente 5. MÉTODOS DE SECAGEM DE MADEIRAS 5.1. Secagem ao ar livre 5.2. Secagem a baixa temperatura 5.2.1. Desumidificação 5.2.2. Secagem solar 5.2.3. Pré-secadores 5.3. Secagem convencional 5.4. Secagem a alta temperatura 5.5. Secagem a vácuo 6. DEFEITOS RESULTANTES DA SECAGEM: CAUSAS E CONTROLE 6.1. Rachaduras 6.2. Empenamentos 6.2.1. Encanoamento 6.2.2. Arqueamento 6.2.3. Encurvamento 6.2.4. Encurvamento complexo 6.2.5. Torcimento 6.3. Encruamento 6.4. Colapso celular 6.5. Mancha marron 7. CONTROLE DO PROCESSO DE SECAGEM 7.1. Controle das condições da estufa de secagem 7.1.1. Medição da temperatura 7.1.2. Medição da umidade relativa do ar 7.1.3. Medição da umidade de equilíbrio 7.1.4. Medição da velocidade do ar 7.2. Controle do teor de umidade da madeira 7.2.1. Pesagem de amostras 7.2.2. Pesagem da carga de madeira 7.2.3. Medidores elétricos resistivos 7.2.4. Medidores dielétricos capacitivos 7.2.5. Medidores dielétricos tipo perda de potência 8. PROGRAMAÇÃO DA SECAGEM DA MADEIRA 8.1. Tipos de programas 8.2. Linhas gerais do programa de secagem 8.3. Fases do programa de secagem 8.3.1. Fase de aquecimento 8.3.2. Fase de secagem 8.3.3. Fase de tratamento de vapor 9. REFERÊNCIAS 3 3 4 5 6 6 7 8 8 9 10 10 11 11 12 12 13 14 15 15 16 17 17 18 19 20 20 21 23 25 25 25 25 26 26 27 27 27 29 30 31 32 32 32 33 34 34 34 34 34 SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 3 1. INTRODUÇÃO A importância da secagem para o processamento da madeira pode ser avaliada basicamente pelo consumo energético e pela qualidade do produto final. É geralmente aceito, que a energia total requerida nas diversas fases de produção, em torno de 70% é consumida durante a secagem. Embora técnicas de conservação de energia possam ser utilizadas, o controle na qualidade do material seco é uma medida prática que pode ser adotada para compensar o alto custo do processo de secagem. Nesse sentido, o método de secagem desempenha um papel importante e sua escolha é definida em função da espécie, da disponibilidade tecnológica e do uso final do material. Dentre os métodos tradicionalmente utilizados, aqueles conduzidos em câmaras de secagem possibilitam um controle mais eficiente da qualidade da madeira. Além disso, permitem o uso de sistemas de controle modernos, os quais possibilitam a obtenção de produtos mais adequados às exigências do mercado consumidor. Neste trabalho, são apresentados os princípios físicos relativos a movimentação da água na madeira, os métodos usualmente utilizados, as causas dos principais defeitos resultantes da secagem, as alternativas de controle do processo, bem como a programação da secagem de madeiras. 2. RAZÕES DA SECAGEM DE MADEIRAS A secagem é um processamento indispensável na industrialização da madeira serrada. A influência da água presente no lenho sobre a maioria de suas propriedades impõe significativas limitações no uso da madeira para os mais diversos fins. Dentre as principais razões para proceder a secagem da madeira, destacam-se as seguintes: ♦ Proteção contra fungos: certas madeiras quando úmidas, são atacadas por fungos manchadores e apodrecedores, principalmente. A redução do teor de umidade a valores inferiores ao ponto de saturação das fibras (PSF) diminui consideravelmente a susceptibilidade da madeira ao desenvolvimento de manchas, bolores, podridões, etc. ♦ Redução dos custos de transporte: esses custos são estipulados em função do peso e volume da carga de madeira, bem como da distância envolvida, o que representa um acréscimo significativo no custo da matéria prima. O transporte da madeira seca, por outro lado, resulta mais econômico, pois a água pode representar em alguns casos um aumento superior a 50% do peso do material. ♦ Melhoria nas propriedades de resistência: de uma maneira geral, abaixo do PSF, a resistência mecânica da madeira aumenta a medida que o seu teor de umidade é reduzido. No caso da resistência a flexão estática da madeira de Araucaria angustifolia, por exemplo, o módulo de ruptura aumenta em torno de 40%, considerando valores acima do PSF e a 15% de umidade. ♦ Melhoria na trabalhabilidade: o beneficiamento da madeira, executado por meio de plainas, tupias, tornos, lixas, etc., deve ser realizado após a sua secagem para não afetar a qualidade do produto no que tange ao acabamento e dimensionamento. Da mesma forma, nos processos de industrialização de painéis de madeira, como compensados e aglomerados, é requerida matéria-prima com baixo teor de umidade, não apenas para se tornar compatível com os adesivos, mas também para possibilitar acabamentos posteriores com seladores, vernizes, tintas etc. SANTINI, Elio José 4 ♦ Condicionamento ao ambiente de uso: a secagem controlada da madeira até um teor de umidade compatível com ambiente de uso, além de diminuir os riscos de defeitos, evita as indesejáveis variações dimensionais provocadas por perdas e ganhos eventuais de água. ♦ Melhoria nas propriedades de isolamento: a madeira seca não conduz eletricidade nem transmite calor, devido sua alta resistência a passagem de corrente elétrica ( Ω), baixa condutividade (cal/cm.°C.s) e baixo calor específico (cal/g.°C). Nessas condições, portanto, a madeira pode ser empregada na confecção de sistemas de isolamentos térmicos e elétricos. 3. IMPORTÂNCIA DA ESTRUTURA ANATÔMICA DA MADEIRA Para compreender melhor os princípios da secagem, é necessário o conhecimento da estrutura anatômica da madeira, que abrange as características dos diferentes tipos celulares, bem como as funções que desempenham no lenho. Sob o ponto de vista tecnológico, as madeiras são classificadas em duas grandes subdivisões: as angiospermas, onde se incluem as dicotiledoneas conhecidas comercialmente como folhosas (hardwood), e as gimnospermas, onde se encontra a ordem coniferales, consideradas “madeira macia” (softwood). Os adjetivos “duro” e “macio” não estão diretamente relacionados com a dureza ou maciez da madeira, mas são denominações aceitas internacionalmente. As folhosas são estruturalmente mais complexas que as coníferas, uma vez que possuem uma maior variabilidade de tipos celulares. A diferença mais notável é que as folhosas possuem células de grande diâmetro (entre 0,05 e 0,25 mm) espalhadas entre as fibras, conhecidas como elemento vasculares, que possuem extremidades mais ou menos abertas e estão arranjados uns sobre os outros, formando longos tubos verticais conhecidos como vasos. Em algumas espécies, especialmente no cerne, os vasos podem estar bloqueados pela expansão das células parenquimáticas – tiloses -, dificultando o movimento da água. A ocorrência de tilose é muito comum em carvalho europeu, cuja madeira é freqüentemente empregada na confecção de móveis e barris. Aproximadamente 1/3 do volume de uma peça de madeira é composto de fibras, que em comparação com os elementos de vasos são mais longas (entre 0,8e 2,0 mm) e de menor diâmetro, cuja função é de suporte mecânico. As células parenquimáticas situadas radialmente no tronco, possuem duas funções principais: armazenamento e condução transversal de nutrientes. Desempenham um papel importante na secagem uma vez que exercem uma influência marcante na contração e no aparecimento de rachaduras na madeira. São mais pronunciados nas folhosas que nas coníferas, sendo que em algumas espécies são grandes e visíveis radialmente, e noutras, pequenos e pouco freqüentes. Em média, em torno de 17% do volume da madeira nas folhosas é constituído de raios. As coníferas são madeiras estruturalmente mais simples, já que mais de 90% do seu volume é constituído de traqueídeos axiais. Essas células, que possuem as funções de condução e suporte mecânico, são tipicamente grandes, com comprimento variando entre 1,3 e 6,4 mm, e com diâmetro inferior a 0,05 mm Os raios nas coníferas são menos freqüentes, tipicamente estreitos, e correspondem, em média, a 7% do volume total da madeira. Embora representem apenas 2% do volume de espaços vazios disponíveis, os raios são responsáveis pela movimentação transversal da umidade na madeira. Além deles, deve-se considerar também os canais resiníferos presentes nas coníferas, que quando desobstruídos podem servir de caminhos para o fluxo transversal e axial de umidade. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 5 As folhosas, sendo estruturalmente mais complexas, possuem maior diversidade de estrutura celular entre espécies e, consequentemente, apresentam um comportamento de secagem mais variável do que as coníferas. Estas, por serem dotadas de uma estrutura mais simples, apresentam menos problemas de secagem, e peças de pequenas dimensões podem ser submetidas a temperaturas de secagem mais elevadas. 4. ASPECTOS FÍSICOS DO PROCESSO A madeira em seu estado natural contém substancial quantidade de água, que varia em função da espécie, entre toras e dentro da própria tábua. As variações na quantidade de água, em tábuas produzidas da mesma tora, são principalmente devido à posição das mesmas na tora da qual foram serradas. Em muitas espécies, o alburno contém muito mais umidade do que o cerne. Além disso, a presença de lenhos diferentes na madeira pode significar diferença de teor de umidade (MACKAY & OLIVEIRA, 1989). A quantidade de água existente na madeira é conhecida como teor de umidade (TU), o qual é definido como a relação entre a massa de água e a massa de madeira, expresso como uma percentagem da massa de madeira completamente seca. Entretanto, para algumas utilizações como combustível (SIMPSON, 1991), e para a indústria de polpa celulósica (KOLLMANN & CÔTÉ, 1968), é mais importante o conhecimento do teor de umidade baseado na massa úmida original. Os teores de umidade na base seca (TUseca) e base úmida (TUúmida) são expressos em %, e podem ser determinados através das seguintes equações: 100 Ms MsMu TU asec − = 100Mu MsMu TUúmida − = Onde, Mu = massa de madeira úmida, g; Ms = massa de madeira seca, g; A relação entre essas duas formas de determinação do teor de umidade é estabelecida por meio das seguintes equações: úmida úmida asec TU100 TU100 TU − = asec asec úmida TU100 TU100 TU + = A compreensão do mecanismo de secagem requer conhecimentos a cerca de alguns aspectos físicos envolvidos na relação água/madeira, como a movimentação interna da umidade e sua evaporação para o ambiente. A água existente na madeira pode ser classificada de duas maneiras (BROWN et al., 1952; KOLLMANN, 1959; CECH & PFAFF, 1977): ♦ água livre ou capilar, aquela localizada nos lúmens celulares e espaços intercelulares, retida por forças capilares; ♦ água de adesão, impregnação ou higroscópica, aquela que se encontra em camadas polimoleculares nos espaços submicroscópicos da parede celular, ligada por forças elétricas. Estes dois tipos de água desempenham funções diferenciadas no processo de secagem da madeira. Enquanto que a água capilar é mais importante para as propriedades térmicas e elétricas, a água higroscópica exerce influência principalmente sobre as propriedades SANTINI, Elio José 6 mecânicas e algumas propriedades físicas da madeira, como massa específica, contração e inchamento. Por ocasião da secagem, a primeira água a ser removida é aquela contida nas cavidades celulares, já que as forças que as retém são apreciavelmente menores que aquelas que mantém a água na parede celular (CECH & PFAFF, 1977). A retirada dessa água, além de ocasionar uma diminuição no peso da madeira (RASMUSSEN, 1961), pode provocar também o aparecimento de defeitos, como o colapso, em madeiras propensas (MACKAY & OLIVEIRA, 1989). O ponto de saturação das fibras (PSF) é o teor de umidade referente ao estado em que, teoricamente, apenas as paredes celulares estão saturadas, ao passo que toda a água capilar já foi eliminada, estando os lúmens e espaços intercelulares sem o líquido. Durante o processo de secagem, água capilar e água de impregnação são removidas, respectivamente, acima e abaixo deste ponto (STEINMANN et al., 1986). De acordo com SKAAR (1972) o PSF varia normalmente entre 25 e 35% de umidade, enquanto que KOLLMANN (1959) afirma que o mesmo pode ser considerado genericamente como sendo 28%. Entretanto, em razão dos inúmeros fatores influentes, KOLLMANN & CÔTÉ (1968) citam que o PSF varia desde 22 a 24% para coníferas com alto conteúdo de resina e folhosas com cerne distinto e porosidade em anel circular, até 32 a 35% para folhosas com porosidade difusa, cerne indistinto, alburno com porosidade em anel circular, e para folhosas com cerne distinto e porosidade em anel semicircular. O PSF tem grande importância prática para a utilização e industrialização da madeira, uma vez que as variações dimensionais começam a se manifestar abaixo do mesmo, e e valor pode ser determinado por meio de diferentes métodos. Qualquer movimento de água na madeira envolve a permeabilidade de sua estrutura microscópica e submicroscópica. Acima do ponto de saturação das fibras, o interior dos capilares contém água livre, e as moléculas de água adjacentes às paredes do capilar não estão livres, mas impregnadas. O movimento da água livre acima do PSF é causado por forças capilares. Abaixo do PSF, a água higroscópica movimenta-se através das paredes celulares devido a gradientes de umidade estabelecidos transversalmente a elas, e gradientes de pressão de vapor (KOLLMANN & CÔTÉ, 1968). 4.1. Movimento capilar da água na madeira (free water flow in wood) O movimento capilar, que ocorre acima do ponto de saturação das fibras, é um fenômeno totalmente diferente do movimento realizado abaixo do PSF (HART, 1965). A força capilar provoca um fluxo de água livre através das cavidades, espaços e pontoações, de uma célula para outra. À medida que a água das cavidades celulares é progressivamente removida, outras forças de secagem começam a operar. A força capilar age no centro da madeira e diminui gradualmente a medida que o teor de umidade das células internas aproxima-se do PSF (CECH & PFAFF, 1977). De acordo com STAMM (1967), o movimento da água acima do PSF é altamente dependente da temperatura, da presença de ar no sistema e do tamanho máximo da abertura da pontoação. HART (1965) afirma que a existência de uma bolha de ar dentro da cavidade celular, devido a pressão do ar mais a pressão de vapor d’água produzidas pelo aquecimento, pressiona a água através das pontoações das células adjacentes, provocando o seu movimento. Assim, o fluxo da água ocorre simplesmente dos lúmens de pressão mais elevada para os de pressão mais baixa. SIAU (1971) menciona que o movimento de água acima do PSF seguea lei de Poiseuille, que considera o fluxo através dos capilares como uma função do raio do capilar elevado na quarta potência. As leis capilares consideram ainda que quanto maior o raio do capilar, menor é a tração da coluna d’água no mesmo, e consequentemente, menor a tensão capilar, o que resulta numa redução do fluxo. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 7 O fluxo capilar é aproximadamente 50 vezes maior na direção longitudinal que na transversal (radial e tangencial), porque neste sentido existe um menor número de obstáculos e menos presença de substâncias que possam obstruir a passagem da água. 4.2. Difusão da água na madeira (bound water diffusion) A secagem da madeira abaixo do PSF é considerada como um processo de pura difusão (KOLLMANN & CÔTÉ, 1968; STAMM, 1967). As moléculas de água movem-se através da parede celular por um gradiente de umidade, através da cavidade celular por um gradiente de pressão de vapor, e novamente através da parede celular mais seca por um gradiente de umidade, e assim sucessivamente, até atingir a superfície da madeira (HART, 1965; CECH & PFAFF, 1977). O fenômeno de difusão é considerado complexo, porque a difusão do vapor d’água através da estrutura vazia e a difusão da água de impregnação através das paredes celulares, ocorrem simultaneamente (STAMM, 1962; KOLLMANN & CÔTÉ, 1968). O gradiente de pressão de vapor é estabelecido quando grande parte das forças capilares cessam, ficando na maioria das cavidades celulares apenas ar e vapor d’água. O gradiente de pressão, então, faz com que o vapor d’água se movimente das áreas de alta pressão (interior da madeira) para as áreas de baixa pressão de vapor (superfície da madeira), passando através das cavidades celulares, câmaras de pontoações, abertura da membrana de pontoação e espaços intercelulares (CECH & PFAFF, 1977; STAMM, 1967). O gradiente de umidade entre as paredes das células mais externas e internas se desenvolve a medida que a umidade começa evaporar das paredes das células próximas à superfície da peça de madeira. Como a madeira é um material higroscópico, as paredes celulares mais secas da superfície absorvem umidade das paredes mais úmidas, criando um fluxo de água das células internas da madeira para as externas. Além da massa específica e permeabilidade da madeira, a temperatura também exerce influência na difusão (HART, 1965). A velocidade com que a difusão ocorre do interior para a superfície das tábuas, influi diretamente na taxa de secagem (BROWN & BETHEL, 1975). 4.3. Secagem da madeira como um fenômeno de difusão (wood drying as a diffusion process) Os perfis de umidade em qualquer estágio de secagem, i.e. depois que a mesma proporção de umidade tenha sido perdida, depende da permeabilidade da madeira. No caso de alburno altamente permeável, o movimento de umidade é dominado pelo fluxo de massa, enquanto que uma madeira impermeável precisa secar apenas por difusão. Quanto mais permeável for a madeira mais rápida ela seca acima do PSF, uma vez que o fluxo de massa é possível. Com uma madeira permeável o fluxo de líquido pode manter a superfície acima do PSF durante algum tempo, e enquanto a superfície da madeira estiver úmida, a taxa de secagem é controlada pela taxa de transferência de calor do ar para a madeira. A taxa de secagem é proporcional a taxa de transferência de calor, que por sua vez é proporcional à velocidade do ar (a transferência de calor e a taxa de evaporação aumentam com o aumento da velocidade do ar) e a depressão do bulbo úmido (a transferência de calor e a taxa de evaporação são proporcionais a depressão do bulbo úmido). A quantidade de água a ser transportada para a superfície e evaporada é proporcional à densidade e a espessura da madeira, pois um material de alta densidade tem lúmens menores e, deste modo, pode ter um teor de umidade menor do que uma madeira de baixa densidade. Neste caso, a quantidade de umidade na madeira é definida em termos de sua densidade SANTINI, Elio José 8 básica. O tempo de secagem é, assim, proporcional a quantidade de água a ser removida e inversamente proporcional a taxa de evaporação. Desta maneira, o tempo de secagem também é proporcional à densidade da madeira (a quantidade de água a ser removida é definida em termos de teor de umidade inicial), à espessura da peça (pela mesma razão), e à velocidade do ar. Quando da secagem de madeiras altamente impermeáveis pode não haver fluxo de massa acima do PSF para manter evaporação. A difusão é lenta e o teor de umidade superficial cai rapidamente abaixo do PSF. Neste caso, a taxa de secagem é proporcional à densidade (mais material de parede celular é atravessado por unidade de distância, e isso oferece resistência a difusão), à espessura (em madeiras mais espessas, mais suave é o gradiente de secagem, pelo menos durante os últimos estágios de secagem) e à pressão de saturação de vapor, que está estreitamente relacionada com o coeficiente de difusão. Mesmo com uma madeira permeável, a difusão assume importância a medida que o teor de umidade médio se aproxima do PSF. De fato, naquelas partes da madeira onde o teor de umidade se aproxima do PSF, a secagem é controlada por difusão. Madeiras permeáveis e impermeáveis, de densidades semelhantes, deveriam secar a partir do PSF a aproximadamente uma mesma taxa. 4.4. Fatores que influem na secagem da madeira (Factors affecting wood drying) Existem vários fatores que influem na taxa de secagem ou no tempo que a madeira demora para secar. Esses fatores podem ser reunidos em dois grupos: inerentes a madeira e ao ambiente de secagem. 4.4.1. Fatores inerentes à madeira ♦ Massa específica: madeiras com baixa massa específica, e em conseqüência com grande volume de espaços nas cavidades celulares, normalmente secam mais rápido do que madeiras com alta massa específica, com pequeno volume de espaços vazios. O motivo pelo qual o coeficiente de difusão é maior em madeiras leves, é o pequeno volume de parede celular através da qual a água move-se lentamente como um líquido, e o grande volume de lúmens por onde a água passa rapidamente na forma de vapor (BROWN et al., 1952). Por outro lado, HART (1965) cita que o tempo de secagem normalmente é diretamente proporcional à massa específica quando da evaporação da umidade superficial, e diretamente proporcional ao quadrado da mesma por ocasião da difusão da umidade para a superfície da madeira. ♦ Estrutura anatômica: o movimento de água na direção longitudinal, em madeiras de massa específica média, sob gradientes de pressão de vapor normais, temperaturas superiores a 50oC e no limite higroscópico, é 5 a 8 vezes maior que na direção transversal (KOLLMANN & CÔTÉ, 1968). Abaixo do PSF este valor aumenta, e o fluxo axial pode ser 10 a 15 vezes mais elevado (RASMUSSEN, 1961). No sentido radial, para temperaturas comuns, a velocidade de secagem é aproximadamente 20 a 50% maior que no sentido tangencial. KOLLMANN & CÔTÉ, (1968) atribuem o fato ao efeito dos raios, e afirmam que em folhosas com grande proporção de células radiais, a difusão neste sentido pode ser até mais que o dobro da tangencial. Porém, deve-se considerar que dependendo da massa específica, as células de raio contribuem com apenas 2% dos espaços disponíveis para o fluxo de água na madeira, o que é praticamente insignificante. A taxa de secagem em madeiras de estrutura simples como as coníferas, geralmente é maior do que em madeiras que apresentam grande diversidade de tipos celulares. A complexidade SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 9 estrutural das dicotiledoneas, aliada a eventuais obstruções dos vasos por tiloses, provavelmente é a causa da baixa taxa de secagem em madeiras dessas espécies. ♦ Teor de umidade: em regrageral, quanto maior a diferença entre os teores de umidade inicial e final, maior é o tempo requerido para a secagem da madeira. HART (1965) afirma que o tempo total de secagem aumenta com o aumento do teor de umidade inicial, tanto para madeiras altamente permeáveis, onde o fluxo de massa e a remoção da umidade superficial é o fator limitante, como para madeiras impermeáveis em que a difusão é o fator controlante. Por ocasião da secagem de duas peças de madeira com teor de umidade inicial diferente, o tempo de secagem é diferente até o PSF ser atingido, porém quando o centro das peças alcançam este ponto, ambas necessitam o mesmo tempo adicional para secar. ♦ Espessura da madeira: a taxa de difusão é proporcional ao gradiente de pressão de vapor, e inversamente proporcional a espessura da madeira. Assim, o tempo de secagem de um material espesso é maior do que o de um fino. Uma aproximação teórica sugere que o tempo de secagem, sob condições idênticas ou semelhantes, é uma função do quadrado da espessura, sendo o efeito desta levemente menor no caso da secagem em estufa. Por exemplo, o tempo de secagem de uma peça de 50 mm é três a quatro vezes maior do que o de uma peça de 25 mm (McMILLEN & WENGERT, 1978). HART (1965) confirma que, considerando o fluxo de massa, o tempo necessário para uma certa redução no teor de umidade é diretamente proporcional a espessura da madeira. Com relação a difusão do interior para a superfície, o tempo de secagem é diretamente proporcional ao quadrado da espessura. 4.4.2. Fatores inerentes ao ambiente ♦ Temperatura: o calor é a fonte energética da qual as moléculas de água adquirem a energia cinética necessária para provocar a evaporação, que depende tanto da quantidade de energia fornecida por unidade de tempo como da capacidade do ar em absorver umidade (CECH & PFAFF, 1977). Como a secagem se processa do interior para a superfície, se a temperatura for mantida constante, a medida que diminui o teor de umidade da madeira diminui a taxa de evaporação e aumenta a pressão de vapor do ar. Assim, para manter uma taxa de secagem constante, as moléculas de água necessitam de energia adicional ou a pressão de vapor na câmara precisa ser reduzida. Isso se consegue aumentando a temperatura (mais energia) ou reduzindo a umidade relativa do ar (menor pressão de vapor). Normalmente, quanto maior a temperatura menor o tempo de secagem, mas certos limites devem ser observados para que não ocorra a degradação térmica da madeira. ♦ Umidade relativa do ar: refere-se a relação entre a quantidade real de vapor d´agua contida no ar e a quantidade máxima do mesmo vapor que o ar pode conter a uma certa temperatura e pressão, expressa em percentagem. Com a elevação da temperatura, sem adicionar umidade, a umidade relativa do ar diminui porque aumenta a capacidade do ar em reter umidade (HILDEBRAND, 1964), diminuindo assim o tempo de secagem. O controle da umidade relativa em uma câmara fechada é realizado por meio das aberturas de ventilação, em que as trocas com o ambiente externo possibilitam diminuir o valor, e pelo sistema de vaporização, que introduz vapor saturado na câmara quando se deseja aumentá- la. ♦ Velocidade do ar: o movimento suficientemente potente e homogêneo do ar através da pilha de madeira possibilita uma secagem rápida e uniforme. A circulação do ar dentro de SANTINI, Elio José 1 uma câmara de secagem tem duas funções principais: a) transferir para a superfície da madeira o calor produzido pelo sistema de aquecimento, e b) transportar a massa de vapor de água desta superfície para o ambiente. A taxa de transferência de calor é afetada principalmente pelo diferencial de temperatura (fluxo de ar e superfície da madeira), o qual é razoavelmente influenciado pela taxa de evaporação. Se a velocidade do ar é mantida constante, a taxa de transferência de calor do ar em movimento para a superfície da madeira é aproximadamente proporcional a diferença de temperatura entre eles (CECH & PFAFF, 1977). De uma maneira geral, quanto maior a velocidade do ar menor é o tempo de secagem, mas a escolha do valor deve considerar outros fatores envolvidos no processo. Em função do método de secagem empregado, os seguintes valores são recomendados: baixa temperatura, entre 1,0 a 2,0 m/s; convencional, entre 2,0 a 3,0 m/s, e alta temperatura, entre 3,0 a 5,0 (até 10,0) m/s. ♦ Potencial de secagem: se refere a relação entre a umidade atual da madeira e a umidade de equilíbrio do ambiente de secagem, sendo portanto, influenciado pelas condições de temperatura e umidade relativa do ar. É uma variável importante na elaboração de programas de secagem, pois é usada para conservar uma relação constante entre o teor de umidade da madeira e a umidade de equilíbrio durante todo o processo de secagem. Deste modo, quanto maior o potencial de secagem utilizado, menor será o tempo de secagem. Em razão disso, deve-se tomar cuidado por ocasião da escolha do valor, podendo-se adotar um potencial alto (maior que 3) para madeiras de fácil secagem, e moderado (menor que 2) para as madeiras consideradas refratárias. 5. MÉTODOS DE SECAGEM DE MADEIRAS 5.1. Secagem ao ar livre (air drying) Caracterização Constitui-se num dos métodos de secagem mais comuns, que exige um investimento relativamente baixo e longo tempo de secagem. As peças de madeira são reunidas em pilhas no pátio, e permanecem expostas às condições ambientais durante um período variável, de acordo com a espécie, espessura, clima local e umidade desejada. O principal objetivo da secagem ao ar livre é retirar o máximo possível de água da madeira, ficando em segundo plano a necessidade de se obter baixos teores de umidade. Pátio de secagem O pátio de secagem, local plano, seco, arejado, desprovido de vegetação e livre de qualquer obstáculo que dificulte a circulação do ar, geralmente está localizado próximo a serraria ou da fábrica que usa a madeira na manufatura de produtos acabados. Suas dimensões variam de acordo com a demanda de madeira seca, e área livre necessária para caminhos e circulação do ar. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 1 FIGURA 1 – Distribuição das pilhas de madeira no pátio de secagem ao ar livre Fonte: Rietz e Page (1971) As pilhas de madeira devem ser preferencialmente confeccionadas sobre uma base ou fundação, para minimizar a influência da umidade do solo e possibilitar a passagem de ar (Figura 1). O uso de uma cobertura individual com telhas de amianto, zinco, plástico, ou mesmo de madeira, protege a pilha das precipitações pluviométricas e da ação direta dos raios solares. FIGURA 2 – Empilhamento da madeira ao ar livre (Fonte: Rietz e Page, 1971). SANTINI, Elio José 1 Para separar as camadas de tábuas em secagem são utilizadas peças de madeira conhecidas como tabiques ou sarrafos separadores, que permitem o espaço necessário a passagem do ar e, consequentemente, a retirada da umidade da madeira. Os sarrafos separadores devem ser confeccionados preferencialmente de madeiras duras, estáveis e secas, de grã reta e, tanto quanto possível, isentas de defeitos. Eles devem ser distribuídos entre as camadas de tábuas a uma distância regular, e alinhados verticalmente entre si com o objetivo de permitir uma distribuição uniforme do peso da pilha e previnir o surgimento de defeitos. Embora os tradicionalmente usados tenham uma seção de 25 x 25 mm, é recomendável o uso de tabiques mais largos para madeiras macias, e mais altos para madeiras espessas. O espaçamento entre sarrafos também é variável, admitindo-se um maior número por ocasião do empilhamento de madeiras duras e de difícil secagem, e um menor número, com maior distância entre eles, no caso de madeiras macias. FIGURA 3 – Distribuiçãoe orientação dos sarrafos separadores na pilha de madeira Taxa de secagem e fatores influentes A taxa de secagem, percentagem de água evaporada da madeira por unidade de tempo de exposição ao ar livre, é influenciada por uma série de fatores relacionados com a própria madeira, com a pilha e sua distribuição no pátio, e com as condições climáticas. Sabe-se que, de uma maneira geral, madeiras duras de folhosas secam mais lentamente que as macias ou madeiras de coníferas, basicamente devido a sua estrutura anatômica. Além disso, independente do tipo de madeira, o tempo de secagem aumenta com a espessura da peça. Com referência ao empilhamento, a taxa de secagem esta estreitamente relacionada com a área disponível para a circulação de ar. Para melhorar a eficiência do método, pode-se aumentar o espaçamento entre as pilhas e entre as tábuas que as compõem, usar cobertura sobre as pilhas, bem como organizar sua disposição de forma a aproveitar melhor a ação dos ventos. É importante lembrar, contudo, que por ocasião da confecção das pilhas no pátio de SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 1 secagem, deve-se levar em conta outros aspectos, como a orientação geográfica e os caminhos existentes. Vantagens e limitações A principal vantagem da secagem ao ar livre sobre os demais métodos é seu baixo custo inicial. O investimento se resume na preparação do pátio, confecção dos sarrafos separadores e fundações apropriadas. Aliado a este fato, as necessidades de energia, requeridas principalmente por ocasião do empilhamento, são muito baixas. As limitações da secagem ao ar livre estão geralmente associadas a sua dependência das condições atmosféricas. Particularmente na região sul do país, o processo é mais favorável no período de primavera/verão, quando a temperatura e insolação são maiores, e ocorre uma menor umidade relativa do ar e baixas precipitações. Nos períodos menos favoráveis, o longo tempo de secagem favorece o desenvolvimento de fungos, principalmente em madeiras propensas a manchas. Todavia, as principais limitações deste método estão relacionadas ao seu custo na forma de juros sobre capital, e a dificuldade de se obter madeira com teor de umidade suficientemente baixo para algumas utilizações. 5.2. Secagem a baixa temperatura (low temperature drying) A secagem a baixa temperatura abrange os processos que utilizam temperaturas inferiores a 50°C (ARGANBRIGHT, 1979). Embora esta denominação seja empregada com freqüência para identificar diferentes técnicas, ela está associada principalmente ao uso de desumidificadores, disponíveis comercialmente na Europa, América do Norte e do Sul, aos pré-secadores de grande capacidade, e às estufas solares. 5.2.1. Desumidificação (drying by dehumidification) A secagem por desumidificação é operada geralmente entre 30 e 40°C e constitui-se de uma câmara, um sistema de aquecimento, um sistema de circulação de ar e um desumidificador (CECH & PFAFF, 1977). Este último é o equipamento mais importante utilizado no método, pois tem a função de retirar a umidade do ar circulante na câmara. Para que isso aconteça, o ar saturado passa num sistema de serpentinas refrigeradas por gás freon, onde é resfriado. Este resfriamento provoca a condensação da umidade do ar nas serpentinas e a água precipita numa bandeja instalada na base do equipamento, de onde é drenada para o exterior. O ar seco é a seguir aquecido e impulsionado pelos ventiladores para o interior da câmara. Ao atravessar as pilhas de madeira, o ar é reumidecido e retorna ao sistema de desumidificação, onde sofre reciclagem para manter as condições da câmara. SANTINI, Elio José 1 a) câmara de secagem por desumidificação b) sistema de desumidificação FIGURA 4 – funcionamento de uma típica câmara de secagem e sistema de desumidificação. O processo de secagem é controlado por meio de um termostato e de um umidostato, os quais proporcionam algum controle sobre as condições do ambiente interno da câmara. A temperatura é a única variável com controle perfeito neste processo. A umidade adicionada ao ambiente é apenas aquela resultante da evaporação da água da madeira, ao contrário das estufas convencionais que possibilitam aumentar ou diminuir a umidade relativa do ar através das aberturas de ventilação e sistema de vaporização. A secagem por desumidificação é um método recomendado para madeiras refratárias e espessas, devido a baixa degradação resultante. O controle das condições internas e o menor tempo em secagem são vantagens dos desumidificadores em comparação com a secagem ao ar livre. Entretanto, em razão dos custos energéticos, principalmente, o emprego deste método é mais apropriado para madeiras valiosas. 5.2.2. Estufa solar (solar drying) Uma outra alternativa de secagem a baixa temperatura é a estufa solar, que consiste basicamente de uma estrutura de madeira e uma cobertura translúcida ou transparente, a qual permite a passagem da energia solar incidente para o seu interior e minimiza as perdas de calor por irradiação (WENGERT, 1971). As superfícies internas da câmara, pintadas de preto, absorvem a energia solar de ondas curtas, e transforma-a em calor, o qual é transferido para o ar principalmente por convecção (SHARMA, 1975). A estufa solar necessita, basicamente, de um sistema de coleta da energia para o aquecimento do ar e da distribuição do ar aquecido (BANKS, 1969). A secagem em estufa solar também é considerada um processo intermediário entre a secagem ao ar livre, em que os fatores envolvidos no processo não são totalmente controlados, e a secagem em estufa convencional, onde o aquecimento é artificial e os fatores de secagem podem ser perfeitamente controlados (VITAL & COLLOM, 1974). De acordo com SIMPSON (1991), a energia solar de baixa intensidade geralmente limita a temperatura de operação da estufa a aproximadamente 55�C, a menos que coletores solares especiais de custo relativamente alto sejam utilizados. Entretanto, em estudos conduzidos no Brasil foi observada uma temperatura de 62°C nos estágios finais da secagem, SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 1 quando a diferença máxima entre as temperaturas interna e externa foi de 44°C (SANTINI, 1983). As principais características da secagem solar são a boa qualidade do material seco particularmente de madeiras de folhosas refratárias; a capacidade de obtenção de teores de umidade menores do que a umidade de equilíbrio requerida para o uso final; baixo custo de capital; baixo consumo de energia e custo operacional; de fácil operação e controle para obter adequada qualidade de secagem; e a construção simples pode ser realizada por pessoal não especializado (PLUMPTRE, 1985). 5.2.3. Pré-secadores (predryers) Os pré-secadores são equipamentos de grandes dimensões, usados para secar grandes volumes de madeira, desde verde até aproximadamente 25%, antes da secagem em estufa até um teor de umidade final mais baixo. Eles são construídos com capacidade desde 100 até mais de 2000 m³, em estruturas de aço, com isolamento de espuma rígida de 25 a 50 mm, e possuem piso de concreto. A temperatura e a umidade relativa do ar são controladas com pontos de ajuste, o de temperatura tipicamente variando de 25 a 40°C e a umidade relativa mantida entre 60 e 90%. Pré-secadores que controlam as condições de secagem ao ar tem sido usados com êxito a mais de 25 anos por algumas companhias das latitudes norte dos Estados Unidos, onde as condições de secagem ao ar livre são desfavoráveis durante muitos meses, tanto do ponto de vista de desenvolvimento de defeitos como do tempo de secagem. Contudo, nos últimos anos os altos preços da madeira e as altas taxas de juros produziram incentivosfinanceiros fortes o suficiente para atrair produtores de madeira em outras áreas, especialmente produtores de folhosas que secaram ao ar sua madeira durante 60 a 90 dias ou mais antes da secagem final em estufa convencional. As vantagens da pré-secagem sobre a secagem ao ar livre são produção de madeira mais clara, com teor de umidade mais uniforme e redução dos defeitos de secagem, todos aproximadamente três vezes menores. Consequentemente, o estoque pode ser reduzido de 1/3 a ½, liberando o capital e o espaço no pátio. Freqüentemente são misturados no pré-secador madeiras de várias espécies, com diferentes espessuras e teores de umidade. Madeiras mais secas normalmente são transferidas para as estufas, da mesma forma que madeira verde recém adquirida pode ser introduzida no secador. A madeira é usualmente empilhada de forma similar, em grupos, por espécie, espessuras e níveis de teor de umidade. As desvantagens dos pré-secadores em relação a secagem ao ar livre, estão principalmente associadas com os custos de construção, energia e manutenção. Os pré-secadores são tipicamente aquecidos com vapor, por meio de trocadores de calor. A umidade relativa interna é controlada através de aberturas externas quando está muito alta, e pelo uso da umidade evaporada da madeira para manter a umidade tão alta quanto necessária. Devido às suas dimensões, os pré-secadores são divididos em duas ou três zonas, sendo que em cada uma delas as condições são controladas separadamente. A circulação do ar é usualmente realizada por ventiladores situados superiormente, arranjados em filas horizontais entre duas fileiras de pilhas de madeira. Um aspecto desfavorável dos pré-secadores tem sido a distribuição desuniforme de ar que resulta numa secagem desigual do topo para a base das pilhas. Várias formas de sistemas defletores tem sido sugerido para melhorar a distribuição e uniformidade do fluxo de ar. O uso de pré-secadores em detrimento da secagem ao ar livre, tem ganho grande aceitação na indústria de madeira de folhosas, embora não seja uma técnica adequada e vantajosa para todas as operações e instalações. SANTINI, Elio José 1 5.3. Secagem convencional (conventional kiln-drying) É um método de secagem completamente controlado, que opera a temperaturas inferiores a 100°C. A literatura menciona que perdas de calor e deficiências na sua transferência, geralmente limitam a temperatura máxima a valores entre 80 e 90°C (CECH & PFAFF, 1977). Câmaras de alvenaria ou de metal pré-fabricadas, com capacidade de secagem entre 20 e 40 m³ de madeira serrada, são as mais freqüentemente encontradas nas condições brasileiras (TOMASELLI, 1974). A principal distinção entre as estufas convencional e baixa temperatura, contudo, está na temperatura de operação, no grau de instrumentação e nas técnicas de construção (KININMONTH, 1975). O funcionamento da estufa basicamente ocorre da seguinte maneira: ventiladores reversíveis impulsionam o ar, que depois de passar por radiadores ou trocadores de calor atinge a pilha transversalmente, aquecendo a superfície da madeira e transferindo sua umidade para o ambiente. O número de ventiladores deve possibilitar a distribuição uniforme do ar à uma velocidade entre 2 e 3 m/s. Embora o vapor produzido por caldeiras seja a fonte de calor mais comum nas estufas convencionais, sistemas de aquecimento elétricos também são utilizados. A umidade relativa pode ser controlada por um sistema de produção de vapor ou por válvulas vaporizadoras de água, e por um sistema de renovação do ar. A manutenção das condições desejadas, fornecidas por estes mecanismos é comandada por programas de secagem previamente elaborados e regulados por meio de controladores automáticos, semi-automáticos ou manuais. As pilhas de madeira normalmente são confeccionadas sobre carrinhos, fora da estufa, os quais são tracionados para o interior da estufa deslocando-se sobre trilhos. Amostras de secagem previamente distribuídas na pilha ou medidores contínuos tipo resistência elétrica, são comumente usados para controlar o teor de umidade da carga de madeira. A principal vantagem da secagem convencional sobre os processos a baixa temperatura é a redução no tempo de secagem. Além disso, a existência de um sistema controlado de produção de vapor possibilita a realização dos tratamentos de uniformização, que reduz a variação no teor de umidade final entre as peças, e de condicionamento que minimiza o gradiente de umidade da madeira no final da secagem. Estes procedimentos são necessários, respectivamente, quando o teor de umidade inicial da carga é desigual ou a secagem é desuniforme, e quando a madeira precisa ser resserada. Uma das limitações do método é a necessidade de pessoal especializado, para fazer as manutenções periódicas do equipamento e controlar o processo de secagem. 5.4. Secagem a alta temperatura (high-temperature kiln-drying) Esta denominação é utilizada para identificar um processo que emprega temperaturas superiores ao ponto de ebulição da água (LOWERY et al., 1968), usualmente entre 115 e 125°C (KININMONTH, 1975). Inicialmente, dois tipos foram desenvolvidos: vapor superaquecido e mistura ar/vapor. No primeiro, a temperatura do bulbo úmido é mantida a 100°C e a presença do ar é excluída, sendo sua circulação realizada por jatos de vapor. No segundo, são mantidas temperaturas de 100°C ou mais, e inferiores ao ponto de ebulição da água, respectivamente, nos termômetros de bulbo seco e bulbo úmido (VERMAAS, 1987). Atualmente, a secagem a alta temperatura é conduzida quase que exclusivamente com a mistura ar/vapor, por causar menor depreciação da madeira e menor deterioração do equipamento. Apesar do método não ser recente, somente nos últimos 20 anos foram alcançados os maiores progressos por pesquisadores americanos, canadenses, alemães, australianos, indianos, SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 1 dentre outros. O emprego do processo em escala comercial começou em 1966, nos Estados Unidos, sendo atualmente utilizado principalmente para madeiras de coníferas (McMILLEN & WENGERT, 1978). A velocidade de circulação do ar é um fator importante na secagem a alta temperatura. Um aumento no seu valor implica num aumento da taxa de transferência de calor para a superfície, bem como uma maior rapidez na remoção da água da madeira. O equilíbrio entre a velocidade do ar e a temperatura de secagem também é importante neste processo. A medida que se aumenta a temperatura, maiores velocidades de ar devem ser utilizadas para que a energia seja melhor aproveitada, racionalizando os custos de secagem. Valores entre 3 e 10 m/s, dependendo da temperatura de secagem, podem ser utilizados (TOMASELLI, 1977). As principais alterações da secagem a alta temperatura em relação às estufas convencionais, são: aumento na velocidade do ar, melhoria nas condições de ventilação, no empilhamento e no sistema de isolamento e proteção do equipamento (TOMASELLI, 1976). Essas diferenças resultam em redução no tempo devido ao aumento na taxa de secagem. Este fato, além de tornar o processo produtivo mais flexível, reduz significativamente o espaço necessário para estocagem de madeira. A diminuição no tempo de secagem provoca uma redução de 25 a 50% no consumo de energia, que aliado a outros fatores como juros, retorno de investimento e taxas, resulta na diminuição dos custos de secagem (McMILLEN & WENGERT, 1978). Outra vantagem importante é a diminuição da umidade de equilíbrio da madeira, resultando num aumento extremamente desejável na sua estabilidade dimensional (TOMASELLI, 1977). Uma das limitações da secagem a alta temperatura esta relacionada com a dificuldade de aplicação para madeiras de folhosas, particularmente as refratárias. Além disso, devido a necessidade de melhor isolamentotérmico, de maior eficiência na transferência de calor e de mais insumos para a sua construção, o investimento inicial para as estufas a alta temperatura é apreciavelmente maior do que para as estufas convencionais. 5.5. Secagem a vácuo (vacuum drying) O método de secagem a vácuo vem sendo estudado desde o início do século 20, mas não foi empregado até a década de 70 por ser considerado antieconômico. A principal atração da secagem a vácuo é que a reduzida temperatura de ebulição da água sob vácuo parcial, permite que a água capilar seja vaporizada e removida da madeira a temperaturas inferiores a 100°C, quase tão rapidamente quanto à temperaturas superiores a 100°C na pressão atmosférica. A taxa de secagem é, deste modo, aumentada sem o risco de ocorrência de defeitos que certamente se desenvolveriam em algumas espécies durante a secagem a alta temperatura (SIMPSON, 1991). As estufas a vácuo constituem-se de cilindros de pressão ou autoclave, com capacidade média para 15 m³ de madeira, confeccionadas de aço especial e isolados externamente com fibra de vidro envolvida em lâminas de alumínio. A madeira é empilhada sobre carrinhos que são introduzidos até o interior da autoclave, deslocando-se sobre trilhos (MASPELL, 1980). O ar impulsionado por ventiladores dispostos superiormente, é aquecido por meio de trocadores de calor e depois conduzidos através da pilha de madeira, provocando a evaporação da umidade. Todas as partes não aquecidas, que entram em contato com o vapor, são feitas de material resistente à corrosão (NEW, 1986). A secagem a vácuo é, essencialmente, uma secagem a alta temperatura conduzida a temperaturas baixas. Durante o início dos anos 70, a perspectiva econômica para a secagem a vácuo tornou-se mais favorável, principalmente devido aos altos custos resultantes de prolongados períodos de secagem dos métodos convencionais. Isto é particularmente SANTINI, Elio José 1 verdadeiro na secagem de madeiras espessas, refratárias, de alto valor, que podem ser secas com segurança em uma estufa a vácuo num tempo menor que a secagem convencional. A literatura compara que, em relação aos sistemas convencionais, na estufa a vácuo a madeira seca quatro vezes mais rápido e com um consumo de energia 50 a 80% menor (NEW, 1986). Alguns sistemas utilizam ciclos repetitivos, cada um consistindo de duas fases: uma de aquecimento e uma de vácuo (MASPELL, 1980). Em outros, a madeira é seca a baixa pressão numa atmosfera de vapor superaquecido (NEW, 1986). A principal diferença entre os vários tipos de estufas a vácuo existentes no mercado é o modo como o calor é transferido para a madeira. A transferência de calor por convecção num vácuo parcial é quase inexistente. Em um tipo comum de estufa a vácuo, existem ciclos alternados de vácuo e pressão atmosférica. O calor é aplicado convectivamente na madeira a pressão atmosférica, e então um ciclo de vácuo é aplicado para remover a água a baixa temperatura. Esses ciclos são alternados durante a secagem. Outro tipo de estufa mantém um vácuo durante todo o processo de secagem, e o calor é transferido para a madeira por contato direto com pratos aquecidos a vapor ou por mantas condutivas aquecidas eletricamente que entram em contato com a madeira. Um terceiro tipo emprega energia elétrica a alta-frequência para aquecer a madeira. Em todos eles, a água é removida da câmara de secagem por meio de bombas. 6. DEFEITOS RESULTANTES DA SECAGEM: CAUSAS E CONTROLE Os defeitos responsáveis pela depreciação da madeira serrada surgem durante o processamento e armazenamento dos produtos. Perfurações de insetos, manchas de fungos e madeira ardida são produzidas durante a fase de armazenamento; desbitolamento, presença de medula e esmoado por ocasião do desdobro; e grã irregular, lenhos de reação e juvenil, bolsa de resinas e exsudações são defeitos inerentes à própria madeira. De outro lado, a remoção da água durante o processamento de secagem provoca o desenvolvimento de esforços na madeira, que afetam a sua qualidade. O conhecimento da madeira e das causas dos defeitos de secagem, permite a adoção de medidas preventivas e curativas, que contribuem para uma maior qualificação do produto final. Os principais defeitos resultantes da secagem da madeira, suas causas e controle, são apresentados a seguir: 6.1. Rachaduras (racha, fenda, split, check, checking) Rachaduras são separações dos elementos constituintes da madeira, provocadas por esforços produzidos durante a secagem, usualmente nos estágios iniciais. Esses esforços resultam da diferença de umidade normalmente existente entre a periferia e o centro da madeira, que dependendo da intensidade, podem ocasionar a separação das células. A partir do momento que a madeira começa a secar, o teor de umidade na superfície da peça torna-se menor que no centro, estabelecendo-se um gradiente de umidade. À medida que a secagem progride, o teor de umidade superficial cai abaixo do PSF, e a madeira começa a contrair-se. Ao mesmo tempo, o teor de umidade no centro da peça é consideravelmente superior ao PSF, e por isso não ocorre contração e nem se verifica alteração dimensional. Deste modo, o centro úmido tende a evitar a contração na superfície, provocando nesta o desenvolvimento de um esforço de tração perpendicular à grã, o qual é acompanhado de um esforço de compressão igual e contrário no centro da peça. Durante a secagem da madeira, as fibras localizadas na superfície se distendem para favorecer a contração, sendo que os diâmetros das células não são apreciavelmente afetados SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 1 pelo fenômeno. Contudo, se a superfície da madeira seca muito rápido em relação ao centro, as altas forças de tração causadas pela contração podem exceder à resistência a tração perpendicular à grã. Nesse caso, para aliviar o esforço, as células distendidas diminuem repentinamente de diâmetro, separando-as e provocando as rachaduras superficiais. Essas rachaduras ocorrem na superfície tangencial das peças, estendendo-se perpendicularmente aos anéis de crescimento em direção ao interior da peça (Figura 1). Figura 1 – Rachaduras superficiais Em razão dos principais elementos de condução se encontrarem orientados paralelamente à grã, o movimento da água é consideravelmente maior nesse do que no sentido transversal. Como a madeira seca mais rapidamente nos seus extremos do que no centro, o gradiente de umidade estabelecido provoca o desenvolvimento de esforços de tração, que quando suficientemente altos, causam rachaduras nas extremidades ou rachaduras de topo. As fendas resultantes desses esforços de secagem usualmente ocorrem no plano dos raios da madeira e nos extremos de peças serradas ou roliças. Algumas espécies são propensas ao desenvolvimento de rachaduras internas, que são separações das fibras no interior da madeira (Figura 2), usualmente ao longo das interfaces fibra-raio. É um tipo de defeito que se manifesta nos últimos estágios da secagem, quando a parte interna da madeira está se contraindo e sob tração em relação aos esforços de compressão da superfície. Freqüentemente estão associadas às rachaduras superficiais, que prolongam-se para o interior e fecham-se gradualmente na superfície. Em geral, essas rachaduras não são visíveis externamente, sendo detectadas apenas quando peças espessas são resseradas, e por isso representam uma das mais caras formas de degradação da madeira. Figura 2 – Rachaduras internas As rachaduras ocorrem com mais freqüência em material espesso, onde os gradientes de umidade são mais severos, e em espécies que possuem raios grandes (altos e largos), os quais são menos resistentes aos esforços de secagem. Surgem principalmente na área de contato entre as células axiais e radiais, e na zonade transição entre os lenhos inicial e tardio, porque esses locais apresentam baixa resistência a tração perpendicular as fibras. Nas espécies propensas ao desenvolvimento de rachaduras, o controle do defeito pode ser feito utilizando-se condições de secagem moderadas nos estágios iniciais, especialmente no caso de madeiras espessas, de modo a manter o gradiente de umidade em níveis toleráveis. SANTINI, Elio José 2 A combinação de baixas temperaturas e umidade de equilíbrio relativamente alta nas fases iniciais do processo resulta numa diminuição da taxa de secagem, o que reduz o surgimento de rachaduras. O mercado geral permite madeira serrada com rachaduras nos extremos, desde que o comprimento cumulativo delas não ultrapasse 10% do comprimento da peça, para 1a, 2a e 3a classe, e 20% para a 4a classe. Com base nas medidas apresentadas na Figura 1, a percentagem de rachaduras é calculada da seguinte maneira: L L L L L n1 2 3 100 10 20% + + + ≤ − ... . onde, L1...Ln = comprimentos parciais das rachaduras, mm L = comprimento da peça de madeira, mm FIGURA 3 – Rachaduras de topo Ex.: Numa peça de 3,0 m, o Σ das rachaduras medidas pode atingir um máximo de 30 cm. 6.2. Empenamentos (warp) São distorções que ocorrem na peça de madeira, em relação aos planos originais de sua superfície. De uma maneira geral, originam-se das diferenças inerentes às contrações radial, tangencial e axial. São influenciados também pela irregularidade da grã, presença de lenho de reação e lenho juvenil. Os empenos são classificados como encanoamento, arqueamento, encurvamento, encurvamento complexo e torcimento. 6.2.1. Encanoamento (cup) Se manifesta na forma de uma curvatura através da largura da peça de madeira (Figura 4). Ocorre comumente em tábuas tangenciais de madeira de folhosas, principalmente nas peças cortadas próximo a periferia das toras. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 2 FIGURA 4 – Defeito tipo encanoamento O encanoamento pode ser causado pela diferença entre as contrações transversais, pela presença de lenhos diferentes na peça (lenho normal e lenho juvenil/de reação), pela exposição de apenas uma das faces às condições de secagem, e pela aplicação de revestimento em apenas um dos lados. Nas últimas duas situações, o encanoamento ocorre devido a secagem muito rápida de uma das faces da tábua. A norma brasileira admite a presença de encanoamento desde que a redução na espessura da peça, obtida pela operação de aplainamento, seja no máximo 4,0 mm menor que a espessura nominal, ou seja: Ea ≥ [En – 4,0mm] Onde, Ea = espessura aplainada, mm En = espessura nominal, mm A ocorrência do encanoamento pode ser minimizada e, eventualmente evitada, adotando-se algumas das seguintes medidas: ♦ confeccionar a pilha com tábuas de espessura uniforme ♦ usar tábuas com largura inferior a 25 cm ♦ colocar as tábuas largas e tangenciais embaixo da pilha ♦ produzir tábuas orientadas radialmente 6.2.2.Arqueamento (crook) É uma curvatura ao longo do comprimento da peça de madeira, num plano paralelo à face (Figura 5). FIGURA 5 – Defeito tipo arqueamento Este defeito se manifesta principalmente em peças orientadas radialmente, em que uma das margens é constituída de lenho anormal. O surgimento de uma concavidade na borda da peça é resultado da presença de lenho de reação ou lenho juvenil, que possuem uma contração axial aproximadamente 20 vezes maior do que o lenho normal. SANTINI, Elio José 2 A presença de lenhos diferentes na peça, é a principal causa do arqueamento. É um defeito difícil de ser controlado durante a secagem, uma vez que numa pilha de madeira não há restrição lateral, a não ser aquela imposta pelo próprio peso da carga. Este defeito é particularmente prejudicial em madeiras de coníferas utilizadas para fins estruturais, e o problema só pode ser evitado quando técnicas especiais são adotadas por ocasião do desdobro. O arqueamento é permitido até uma deformação (flecha) máxima de 5,0 mm/m, medida na metade do comprimento da peça de madeira. %5,0100. L F oArqueament ≤= onde, F = concavidade medida na metade do comprimento da peça, mm L = comprimento total da peça, mm 6.2.3. Encurvamento (bow) Curvatura ao longo do comprimento da peça de madeira, num plano perpendicular à face (Figura 6). FIGURA 6 – Defeito tipo encurvamento Este defeito se manifesta comumente em peças orientadas tangencialmente, e como no caso anterior, é causado principalmente pela presença de lenhos anormais em uma de suas faces. A presença de lenho juvenil ou de reação com sua elevada contração axial em relação ao lenho normal, produz durante a secagem uma concavidade na face formada por lenho anormal, o que resulta na deformação da madeira. O encurvamento é permitido em peças com comprimentos superiores a 3,0 m, até uma deformação (flecha) máxima de 5,0 mm/m, medida na metade da peça. A tolerância do defeito é avaliada através da seguinte equação: %5,0100. L F toEncurvamen ≤= onde, F = concavidade medida na metade do comprimento da peça, mm L = comprimento total da peça, mm O controle do encurvamento pode ser feito reduzindo-se a distância entre os sarrafos separadores, de modo a distribuir melhor o peso sobre as peças. Além disso, a aplicação de pesos sobre a pilha de madeira, ou a distribuição das peças propensas ao defeito na parte de baixo da mesma, pode ser uma alternativa viável para minimizar o problema. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 2 6.2.4 Encurvamento complexo (complex cup) Tipo de empeno em que a peça de madeira apresenta mais de uma curvatura perpendicular à face, ao longo de seu comprimento (Figura 7). FIGURA 7 – Defeito tipo encurvamento complexo. As causas desse defeito são as mesmas mencionadas para o encurvamento, onde os lenhos anormais ocorrem descontinuamente na peça. Para minimizar sua manifestação pode- se adotar os mesmos procedimentos recomendados para o defeito anterior. 6.2.5. Torcimento (twist) É um empenamento helicoidal ou espiral no sentido do eixo da peça de madeira (Figura 8). Colocando-se a peça sobre uma superfície plana, a presença do defeito é constatada quando os cantos da madeira permanecerem em planos diferentes. FIGURA 8 – Defeito tipo torcimento. Além da diferença entre as contrações transversais, o torcimento é causado pela ocorrência de grã irregular na madeira, particularmente pelos tipos de grã espiralada e inclinada. Como estas são características inerentes a determinadas espécies, este tipo de defeito é de difícil controle. Este defeito, juntamente com o encurvamento complexo, não é admitido pelas normas de classificação de madeira serrada adotadas no país. 6.3. Encruamento (casehardening) O encruamento é uma condição de tensão que se manifesta na madeira seca, em que as fibras da superfície estão submetidas a esforços de compressão e as internas sob esforços de tração. Este termo é usado para identificar a distribuição de esforços encontrados na madeira após a secagem. Para compreender melhor suas causas e conseqüências, é importante saber como esses esforços se desenvolvem na madeira durante sua secagem. Quando peças finas de madeira (espessura inferior a 12 mm) são submetidas a secagem, a saída da água e a contração ocorrem quase que simultaneamente, e não se manifestam os problemas decorrentes de gradientes de umidade. Entretanto, com madeiras espessas a secagem ocorre mais ou menos camada a camada, e a água evaporada das faces e SANTINI, Elio José 2 extremos criam uma zona seca na seção transversal da peça, a qual se move gradualmente em direção ao centro.Um estágio importante da secagem é alcançado quando toda a água capilar da periferia da madeira foi eliminada e começa a ser removida a água higroscópica, enquanto que o centro ainda contém água capilar. Nesse ponto, a superfície tenta se contrair, mas é impedida de faze-lo pelo centro, que ainda está úmido. A secagem da periferia continua, mas a madeira não se contrai, e o resultado é uma camada superficial seca mas com dimensões maiores do que teria se ocorresse a contração normal. Deste modo, a superfície está numa condição distendida, conhecida como tração. O centro, em contrapartida, que está sendo oprimido pela periferia que tenta se contrair, encontra-se sob compressão. A superfície da madeira seca conserva sua condição distendida, e embora possa se contrair ou inchar de acordo com as mudanças nas condições ambientais, sua dimensão geralmente será maior do que seria se tivesse sofrido a contração normal. Nesta condição, esta peça de madeira apresenta uma deformação semi-permanente, sendo sua periferia submetida a esforços de tração. De forma semelhante, o centro úmido da madeira que está sendo comprimido recebe esforços de compressão. Este defeito se manifesta principalmente quando madeiras espessas e de baixa permeabilidade são submetidas a uma secagem muito rápida, resultando uma distribuição de umidade e contração desuniformes. As tensões internas na madeira surgem como resultado normal da secagem em estufa, mas a intensidade das mesmas pode ser influenciada pelas condições de secagem utilizadas. Se uma tábua nessas condições é resserada longitudinalmente, as duas metades resultarão encanoadas em suas faces internas, o que ocorre devido a expansão das faces externas e a contração das novas faces produzidas pelo corte. A presença de tensões internas na madeira seca pode ser detectada no final da secagem por meio do teste de garfo ou de tensão. O método usualmente empregado para avaliar o equilíbrio entre os esforços existentes na periferia e no centro da peça consiste na extração de um pequeno corpo de prova de aproximadamente 12 a 25 mm ao longo da direção da grã, de um local relativamente afastado da extremidade. O corpo de prova, confeccionado a partir de peças componentes da carga de madeira em secagem, deve ser submetido a cortes especiais, conforme seqüência mostrada na Figura 9. Para madeiras com espessura nominal de 50 mm, recomenda-se a realização de um maior número de cortes para uma verificação mais acurada da ocorrência de esforços dentro da peça. FIGURA 9 - Preparação da amostra para teste de garfo. Para eliminar esforços residuais de contração devidos exclusivamente às diferenças de umidade entre a periferia e o centro, as amostras devem permanecer dentro de uma sala de climatização (warm room) por aproximadamente um dia, para que ocorra a igualização do teor de umidade da madeira. Após isso, as amostras estão em condições de serem avaliadas, e a presença de esforços na madeira é verificada pelo comportamento dos garfos, como indicado na Figura 10. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 2 FIGURA 10 – Comportamento da madeira com relação a presença de esforços (a=livre de esforços; b=com encruamento; c=com encruamento reverso). A verificação da existência de esforços nas amostras é visualizada pela posição assumida pelos garfos após sua climatização. Sabe-se que madeira submetida a esforços de tração se retrai, enquanto que madeira sob compressão se expande, dilata. Assim, garfos perfeitamente retos indicam a ausência de esforços, o que permite que a madeira seja resserada e industrializada sem o risco de surgir empenamentos. Por outro lado, se os garfos assumirem um encurvamento para dentro, em direção ao centro da peça, indica a existência de encruamento, o qual precisa ser removido antes da madeira ser processada. O desenvolvimento de encruamento pode ser minimizado mantendo-se o teor de umidade superficial suficientemente alto sem diminuir excessivamente a taxa de secagem. Essa é uma situação controvertida, pois significa que a secagem deveria ser conduzida sob condições moderadas, ou seja, num ambiente mais úmido do que seco. Se no final do período de secagem for detectada uma condição de encruamento que poderia dificultar o processo de industrialização, é possível aplicar um tratamento visando o alívio dos esforços presentes na madeira. Esse tratamento consiste em aumentar a temperatura e a umidade relativa dentro da estufa de secagem, mantendo-se essas condições durante um período de tempo suficiente para que os esforços de tração e compressão se anulem. O procedimento torna a madeira mais plástica (macia), de modo que os esforços presentes possam, por si próprios, anular-se. Entretanto, se o processo de recuperação do defeito for muito prolongado, o TU na superfície da peça pode torna-se maior do que no centro, provocando uma inversão dos esforços. Em outras palavras, a periferia adquire esforços de tração e o centro compressão, e a madeira nestas condições apresenta encruamento invertido (Figura 8). Esta situação é muito séria porque o defeito não pode ser revertido, a menos que a madeira seja reumidecida e novamente submetida a secagem. 6.4. Colapso celular (cell collapse) É uma forma de contração anormal que ocorre durante a secagem acima do PSF, produzindo um achatamento, torcimento, esmagamento ou deformação das células. A teoria geralmente aceita para explicar a ocorrência do defeito considera que nas cavidades celulares totalmente preenchidas com água capilar, não há espaço para o ar. A medida que as células secam deveria entrar ar nas cavidades para substituir a água capilar que está saindo. Contudo, a passagem de ar através da madeira úmida é muito lenta e a água capilar pode sair das células saturadas mais rápido do que o ar possa entrar. Quando isso acontece, as paredes celulares são contraídas pelas forças de tensão capilar, sofrendo uma deformação irregular. Percebe-se que não é uma pressão de ar externa sobre a superfície da madeira que é responsável pelo colapso, mas a força de coesão da água aspirando as paredes celulares úmidas simultaneamente. Quando um grupo de células de uma determinada área da madeira sofrem colapso, surgem afundamentos na superfície da madeira (Figura 11), e no caso de madeiras espessas, pode ocorrer também rachaduras internas. SANTINI, Elio José 2 FIGURA 11 – Colapso celular A principal diferença entre colapso e contração normal é que o primeiro se manifesta apenas durante a saída da água capilar das cavidades celulares, e o segundo ocorre somente por ocasião da remoção da água higroscópica existente nas paredes, quando os lúmens celulares já se encontram vazios. Assim, o colapso ocorre apenas acima do PSF, enquanto que a contração normal ocorre apenas abaixo deste ponto. O defeito ocorre principalmente quando altas temperaturas são usadas nas estufas de secagem, porque o aquecimento da madeira úmida torna as paredes celulares plásticas e macias. Por essa razão, a secagem de madeiras propensas a colapso requer o uso de baixas temperaturas até que o PSF seja alcançado, e a partir daí a temperatura pode ser elevada gradualmente, pois não há mais riscos de surgimento do defeito. De uma maneira geral, as principais causas de colapso na madeira são: ♦ Tensão capilar: corresponde a uma pressão ou diferença de pressão exercida por superfícies curvas numa interface líquida. É evidenciada quando a pressão do líquido num tubo capilar for negativa. A tensão capilar é influenciada numa relação diretamente proporcional pela tensão superficial do líquido, pelo raio da interface ar-líquido, e inversamente proporcional, pela abertura das pontoações. Quanto maior a tensão capilar, maior a probabilidade de ocorrência de colapso na madeira. ♦ Tensão hidrostática:se refere a pressão exercida por um fluído em repouso, e quando essa pressão excede à resistência a compressão perpendicular da parede celular, a célula sofre colapso. ♦ Temperatura: altas temperaturas de secagem aumentam a plasticidade da parede celular, enfraquecendo-a. Quando a tensão de sucção produzida pela saída da água capilar for superior à resistência da parede, ocorre o rompimento das mesmas, e em conseqüência, um colapso irrecuperável. Com base nas causas do colapso, algumas alternativas como redução da tensão superficial do líquido, tratamentos de pré-congelamento e o uso de condições de secagem moderadas, são sugeridas para minimizar sua ocorrência. Entretanto, sob o ponto de vista prático, o emprego de temperaturas inferiores a 60 oC até que o PSF seja alcançado, parece ser a alternativa mais indicada e economicamente viável para secagem de madeiras propensas ao defeito. Madeiras que sofreram colapso durante a secagem podem ser recuperadas através de um processo conhecido como recondicionamento, o qual consiste de um tratamento de vapor a 100 oC e 100% de umidade relativa, aplicado a madeira durante um certo período de tempo para permiti-la reabsorver 2 a 6% de umidade. O emprego do tratamento, que faz a madeira voltar a sua forma original, só é possível se o seu teor de umidade estiver entre 10 e 20%, e caso não tenham se desenvolvido rupturas reais nas células durante a secagem normal. SECAGEM DE MADEIRA SERRADA – princípios, métodos e controle do processo 2 6.5. Mancha marrom (brown stain) São manchas de natureza química que se manifestam na madeira durante a secagem em estufa, alterando sua coloração original, sendo mais freqüentes nos processos a alta temperatura. Para explicar o aparecimento das manchas, duas hipóteses são consideradas: a. Acredita-se que os açúcares e os taninos, ambos sujeitos a oxidação com posterior escurecimento quando expostos ao calor em presença de oxigênio, são os principais causadores em Pinus lambertiana. Na medida que a madeira seca, essas substancias são transportadas para a superfície pelo movimento da água, e depositadas na forma sólida conforme a água se evapora; b. Há evidências da participação de uma enzima na formação da mancha. Atribui-se à reação enzimática a formação de leucoprecursores que, através de reações químicas posteriores, como as de oxidação, converter-se-iam na forma final colorida. A ocorrência da mancha marrom é favorecida pelos seguintes fatores: ♦ Pelo tempo decorrido entre o abate e o desdobro, e entre o desdobro e a secagem; ♦ Pelas condições de secagem; e ♦ Pela presença de extrativos na madeira. De uma maneira geral, quanto maior o período de tempo entre o abate e o desdobro, mais freqüentes e pronunciadas são as manchas. Da mesma forma, intervalos de tempo entre o desdobro e a secagem superiores a dois ou três dias, favorecem o surgimento de manchas. Na secagem em estufa, em que o aparecimento de manchas é mais comum, o uso de programas com temperaturas altas nos estágios iniciais favorecem o seu desenvolvimento. Os extrativos solúveis em água, localizados no conteúdo celular, também podem ser causadores. Essas substancias podem estar presentes na árvore ou serem formadas por degradação enzimática ou hidrolítica durante o intervalo entre o abate e a secagem da madeira serrada. O controle da mancha marrom pode ser feito durante a secagem em estufa, através do programa de secagem. A alternativa mais apropriada consiste em realizar a secagem em dois estágios, utilizando-se temperaturas moderadas desde o estado verde até o PSF. Posteriormente, pode-se usar temperaturas mais elevadas até o teor de umidade final ser alcançado. Outra possibilidade de eliminação da mancha marrom, seria através da remoção das camadas superficiais das peças, mas este procedimento resulta em perdas substanciais no volume de madeira serrada. 7. CONTROLE DO PROCESSO DE SECAGEM 7.1. Controle das condições da estufa de secagem 7.1.1. Medição da temperatura (temperature measurement) Durante a secagem, normalmente são medidas variáveis como a temperaturas de bulbo seco, a temperatura do bulbo úmido, a temperatura do ar na entrada e na saída da pilha e, eventualmente, a temperatura da própria madeira. Termômetros elétricos digitais, que usam como sensores termopares ou detetores de temperatura por resistência (RTD), estão se tornando um meio bastante comum de medição de temperatura em estufas de secagem. Dos termopares usados dentro da estufa, o fio tipo T (cobre-constantan) é mais comum, embora o tipo J (ferro-constantan) e o tipo K (chromel- alumel) também sejam empregados. SANTINI, Elio José 2 Os termopares medem a temperatura durante toda a operação e os valores são registrados em intervalos regulares, de acordo com a duração do programa. Isto permite identificar os estágios de um programa que estão operando acima ou abaixo dos níveis de temperatura requeridos. Deve-se salientar que a precisão dos sensores termopares oscila em torno de ± 1°C, e quando usados com termômetros mais baratos, a precisão combinada pode ser tanto quanto ± 2°C. Usando termômetros de melhor qualidade, esta variabilidade pode ser reduzida para aproximadamente ± 0,8°C. Os termômetros de mercúrio com escala graduada na haste de vidro, requerem a entrada do operador na estufa para tomar as leituras de temperatura. Deve-se tomar cuidado por ocasião da definição do local de instalação dos termômetros no interior da estufa, já que eles medem a temperatura mais quente percebida, mesmo para períodos muito curtos. Deste modo, existe uma predisposição para leitura de valores altos. 7.1.2. Medição da umidade relativa do ar (relative humidity measurement) A umidade relativa na estufa de secagem pode ser obtida através de psicrômetros, que são instrumentos constituídos de dois termômetros para medir as temperaturas do bulbo seco e do bulbo úmido. Ambos devem ser colocados em locais por onde circula, com velocidade constante, o ar impulsionado pelos ventiladores. O sensor de bulbo úmido precisa ser continuamente umedecido, e deve estar localizado numa posição na estufa, onde o fluxo de ar sobre a mecha ou pavio de algodão, propicia uma adequada evaporação da água e, desse modo, o seu resfriamento. A mecha do bulbo úmido deve ser trocada após cada carga da estufa, ou mais freqüentemente, caso ela se torne dura ou encrostada. A diferença entre as duas temperaturas, é conhecida como depressão do bulbo úmido ou diferença higrométrica. Com o auxílio de equações, tabelas ou gráficos psicrométricos, as leituras do termômetro de bulbo seco e a depressão do bulbo úmido, possibilitam a obtenção da umidade relativa do ar. No caso de um controlador-registrador, as temperaturas de bulbo seco e bulbo úmido são continuamente medidas, de forma que as condições da estufa sejam registradas num gráfico. Existe, tipicamente, apenas um sensor de temperatura de bulbo úmido numa estufa, porém pode haver múltiplos sensores de bulbo seco. Isto porque a temperatura de bulbo úmido é essencialmente a mesma em toda a estufa, mas a temperatura de bulbo seco pode variar consideravelmente no comprimento e na altura da estufa (SIMPSON, 1991). Higrotermógrafos são instrumentos que medem e registram temperatura e umidade relativa do ar. São úteis em proporcionar o registro escrito contínuo, onde a temperatura não excede a aproximadamente 50°C. 7.1.3. Medição da umidade de equilíbrio (equilibrium moisture content measurement) O controle dos programas de secagem que se baseiam no teor de umidade da carga, especialmente no caso de madeira serrada, pode ser realizado também por meio do teor de umidade de equilíbrio da atmosfera da estufa. De acordo com SIMPSON (1991) e MACKAY & OLIVEIRA (1989), um sensor mede diretamente a umidade
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