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C3 UnB c3txt Mattuck Aproximação.Tangente

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A Aproximac¸a˜o Tangente∗
Arthur Mattuck
Massachusetts Institute of Technology – MIT
1 Derivadas Parciais
Seja w = f(x, y) uma func¸a˜o de duas varia´veis. Seu gra´fico e´ uma super-
f´ıcie no espac¸o Oxyz, conforme a figura.
Figura 1: Gra´fico de func¸a˜o de duas varia´veis
Fixe um valor y = y0 e deixe x variar. Com isso obtemos uma func¸a˜o de
uma varia´vel
w = f(x, y0), a func¸a˜o parcial para y = y0 (1)
Seu gra´fico e´ uma curva no plano vertical y = y0 cuja inclinac¸a˜o no ponto
x = x0 e´ dado pela derivada
d
dx
f(x, y0)
∣∣∣
x0
, ou
∂f
∂x
∣∣∣
(x0,y0)
. (2)
∗Traduc¸a˜o livre, por Mayra Madeira, do texto The Tangent Approximation
1
2. O Plano Tangente 2
Chamamos (2) de derivada parcial de f com respeito a x no ponto (x0, y0);
o lado direito de (2) e´ a notac¸a˜o mais usada para representa´-la. A derivada
parcial e´ apenas a derivada ordina´ria da func¸a˜o parcial – ela e´ calculada man-
tendo uma varia´vel fixa e derivando com respeito a` outra. Outras notac¸o˜es
para a derivada parcial sa˜o
fx(x0, y0) ,
∂w
∂x
∣∣∣
(x0,y0)
,
(
∂f
∂x
)
0
,
(
∂w
∂x
)
0
;
a primeira e´ conveniente para incluir o ponto espec´ıfico; a segunda e´ mais
usada nas cieˆncias e engenharias, onde lidamos somente com a relac¸a˜o entre
as varia´veis, e na˜o mencionamos a func¸a˜o expl´ıcitamente; a terceira e a quarta
indicam o ponto usando um u´nico sub´ındice.
Analogamente, fixando x = x0 e deixando y variar, obtemos a func¸a˜o par-
cial w = f(x0, y), cujo gra´fico esta´ no plano vertical x = x0 e cuja inclinac¸a˜o
em y = y0 e´ a derivada parcial de f com respeito a y ; as notac¸o˜es sa˜o
∂f
∂y
∣∣∣
(x0,y0)
, fy(x0, y0),
∂w
∂y
∣∣∣
(x0,y0)
,
(
∂f
∂y
)
0
,
(
∂w
∂y
)
0
.
As derivadas parciais ∂f/∂x e ∂f/∂y dependem do ponto (x0, y0) e sa˜o,
portanto, func¸o˜es de x e y.
Escrita como ∂w/∂x, a derivada parcial da´ a taxa de variac¸a˜o de w com
respeito apenas a x no ponto (x0, y0): nos diz o qua˜o ra´pido w esta´ aumenta
a´ medida que x aumenta, quando y e´ mantido constante.
Para uma func¸a˜o de treˆs ou mais varia´veis, w = f(x, y, z, ...), na˜o podemos
mais desenhar gra´ficos, mas a ide´ia de derivadas parciais permanece a mesma:
para definir a derivada parcial com respeito a x, por exemplo, mantemos
todas as outras varia´veis constantes e calculamos a derivada ordina´ria com
respeito a x; as notac¸o˜es sa˜o as mesmas que as acima:
d
dx
f(x, y0, z0, ...) = fx(x0, y0, z0, ...) ,
(
∂f
∂x
)
0
,
(
∂w
∂x
)
0
.
2 O Plano Tangente
Para uma func¸a˜o de uma va´ria´vel, w = f(x), a reta tangente ao seu
gra´fico no ponto (x0, w0) e´ a reta por esse ponto com inclinac¸a˜o
(
dw
dx
)
0
.
Para uma func¸a˜o de duas varia´veis, w = f(x, y), o ana´logo natural e´ o
plano tangente ao gra´fico no ponto (x0, y0, w0). Qual a equac¸a˜o desse plano
tangente? Olhando de novo a Figura 1 da pa´gina anterior vemos que o plano
tangente
3. A Fo´rmula de Aproximac¸a˜o 3
(i) deve passar por (x0, y0, w0), onde w0 = f(x0, y0);
(ii) deve conter as retas tangentes aos gra´ficos das duas func¸o˜es parciais –
isso vai acontecer se o plano tiver as mesmas inclinac¸o˜es nas direc¸o˜es i
e j que a superf´ıcie.
Usando essas duas condic¸o˜es, e´ fa´cil encontrar a equac¸a˜o do plano tan-
gente. A equac¸a˜o geral de um plano por (x0, y0, w0) e´
A(x− x0) + B(y − y0) + C(w − w0) = 0.
Assuma que o plano na˜o e´ vertical; logo C 6= 0 e podemos resolver para
w − w0, obtendo
w − w0 = a(x− x0) + b(y − y0) , a = A/C , b = B/C . (3)
O plano passa enta˜o por (x0, y0, w0); quais os valores dos coeficientes a e
b para que o plano seja tambe´m tangente ao gra´fico? No´s temos
a = inclinac¸a˜o do plano (3) na direc¸a˜o i (colocando y = y0 em (3));
= inclinac¸a˜o do gra´fico na direc¸a˜o i (por (ii) acima);
=
(
∂w
∂x
)
0
(pela definic¸a˜o de derivada parcial).
De maneira ana´loga obte´m-se que b =
(
∂w
∂y
)
0
. Portanto, a equac¸a˜o do
plano tangente a w = f(x, y) em (x0, y0) e´
w − w0 =
(
∂w
∂x
)
0
(x− x0) +
(
∂w
∂y
)
0
(y − y0) (4)
3 A Fo´rmula de Aproximac¸a˜o
O uso mais importante do plano tangente e´ dar uma fo´rmula de aproxi-
mac¸a˜o que e´ ba´sica no estudo de func¸o˜es de va´rias varia´veis – quase tudo, de
uma forma ou de outra, segue desta fo´rmula.
A ide´ia intuitiva e´ que, se ficarmos pro´ximos de (x0, y0, w0), enta˜o o plano
tangente (4) sera´ uma boa aproximac¸a˜o para o gra´fico de w = f(x, y). Por-
tanto, se o ponto (x, y) esta´ pro´ximo de (x0, y0), enta˜o
f(x, y) ≈ w0 +
(
∂w
∂x
)
0
(x− x0) +
(
∂w
∂y
)
0
(y − y0)
altura do gra´fico ≈ altura do plano tangente
(5)
3. A Fo´rmula de Aproximac¸a˜o 4
A func¸a˜o do lado direito de (5), cujo gra´fico e´ o plano tangente, tambe´m e´
chamada de linearizac¸a˜o de f(x, y) em (x0, y0): ela e´ a func¸a˜o linear que da´
a melhor aproximac¸a˜o de f(x, y) para valores de (x, y) pro´ximos de (x0, y0).
Uma forma equivalente da aproximac¸a˜o (5) e´ obtida usando a notac¸a˜o ∆;
se colocamos
∆x = x− x0 , ∆y = y − y0 , ∆w = w − w0,
enta˜o (5) fica
∆w ≈
(
∂w
∂x
)
0
∆x +
(
∂w
∂y
)
0
∆y, se ∆x ≈ 0, ∆y ≈ 0. (6)
Essa fo´rmula nos da´, aproximadamente, a mudanc¸a que w sofre se fizermos
pequenas variac¸o˜es em x e y. Essa fo´rmula sera´ usada frequentemente.
O ana´logo da fo´rmula de aproximac¸a˜o para uma func¸a˜o w = f(x, y, z) de
treˆs varia´veis seria
∆w ≈
(
∂w
∂x
)
0
∆x +
(
∂w
∂y
)
0
∆y +
(
∂w
∂z
)
0
∆z, se ∆x, ∆y, ∆z ≈ 0 (7)
Infelizmente, para func¸o˜es de treˆs ou mais varia´veis, na˜o podemos usar
um argumento geome´trico para a fo´rmula de aproximac¸a˜o (7); por essa raza˜o,
e´ melhor reformular (6) de maneira a na˜o utilizar planos ou argumentos
geome´tricos, e que portanto possa ser generalizado para va´rias dimenso˜es.
Isso esta´ feito no final dessa sec¸a˜o; por hora, vamos assumir a veracidade de
(7) e sua generalizac¸a˜o para dimenso˜es maiores.
Seguem dois exemplos t´ıpicos de utilizac¸a˜o da fo´rmula de aproximac¸a˜o.
A fo´rmula de aproximac¸a˜o sera´ usada, no restante do estudo de derivadas
parciais, para deduzir outras importantes fo´rmulas e teoremas.
Exemplo 1 Construa um quadrado razoa´vel, centrado em (1, 1), sobre o
qual o valor de w = x3y4 na˜o varie mais que ±0, 1.
Soluc¸a˜o. Usaremos (6). Para isso, calculamos as derivadas parciais
wx = 3x
2y4 wy = 4x
3y3
e portanto, avaliando essas derivadas em (1, 1) e usando (6), obtemos
∆w ≈ 3∆x + 4∆y
Enta˜o, se |∆x| ≤ 0, 01 e |∆y| ≤ 0, 01, devemos ter
|∆w| ≤ 3|∆x|+ 4|∆y| ≤ 0, 07
4. Cr´ıtica a` Fo´rmula de Aproximac¸a˜o 5
que esta´ dentro dos limites. Enta˜o a resposta e´ um quadrado com centro em
(1, 1) dado por
|x− 1| ≤ 0, 01 , |y − 1| ≤ 0, 01 .
�
Exemplo 2 Os lados a, b e c de uma caixa retangular devem medir 1, 2 e
3, respectivamente. Para qual dessas medidas o volume V e´ mais sens´ıvel?
Figura 2: Caixa retangular de dimenso˜es a,b e c.
Soluc¸a˜o. V = abc, e enta˜o, usando a fo´rmula de aproximac¸a˜o (7),
∆V ≈ bc∆a + ac∆b + ab∆c
≈ 6∆a + 3∆b + 2∆c em(1, 2, 3).
Assim, o volume e´ mais sens´ıvel a pequenas mudanc¸as no lado a, uma vez
que ∆a possui o maior coeficeinte. (Isto e´, se separadamente cada lado fosse
mudado por exemplo de 0, 01, enta˜o a mudanc¸a em a e´ a que produziria a
maior mudanc¸a no volume, de 0, 06.) �
O resultado pode parecer paradoxal – o valor de V e´ mais sens´ıvel ao com-
primento do menor lado – mas e´ de fato intuitivo, como pode ser percebido
pela forma da caixa.
Princ´ıpio da Sensibilidade O valor de w = f(x, y, . . . ), calculado em
algum ponto (x0, y0, . . . ), sera´ mais sens´ıvel a pequenas mudanc¸as para a
varia´vel em que a correspondente derivada parcial wx, wy, . . .tiver o maior
valor absoluto no ponto.
4 Cr´ıtica a` Fo´rmula de Aproximac¸a˜o
Primeiramente, a fo´rmula de aproximac¸a˜o na˜o e´ uma afirmac¸a˜o matema´-
tica precisa, ja´ que o s´ımbolo ≈ na˜o diz o qua˜o perto esta˜o as quantidades
4. Cr´ıtica a` Fo´rmula de Aproximac¸a˜o 6
envolvidas. Para sermos exatos, ter´ıamos que especificar qual o erro na apro-
ximac¸a˜o. (Isso pode ser feito, mas e´ de pouco uso.)
Uma objec¸a˜o mais fundamental e´ a de que nossa discussa˜o foi baseada
na suposic¸a˜o de que o plano tangente e´ uma boa aproximac¸a˜o da superf´ıcie
perto de (x0, y0, w0). Isso e´ de fato verdade?
Olhemos da seguinte forma. O plano tangente foi determinado como o
plano que tem as mesmas inclinac¸o˜es que a superf´ıcie nas direc¸o˜es i e j. Isso
significa que a aproximac¸a˜o (6) sera´ boa se o afastamento em relac¸a˜o a (x0, y0)
for na direc¸a˜o i (tomando ∆y = 0), ou na direc¸a˜o j (tomando ∆x = 0). Mas
sera´ que o plano tangente tem as mesmas inclinac¸o˜es que a superf´ıcie em
todas as outras direc¸o˜es?
Intuitivamente, esperamos que isso ocorra se o gra´fico de f(x, y) e´ uma
superf´ıcie “suave” em (x0, y0) – na˜o tem bicos, saltos ou algo peculiar. A
hipo´tese matema´tica que garante isso e´ a seguinte.
Hipo´tese de Suavidade Dizemos que f(x, y) e´ suave em (x0, y0) se
fx e fy sa˜o cont´ınuas em algum retaˆngulo centrado em (x0, y0) (8)
Podemos mostrar que, se (8) vale, enta˜o (6) tambe´m vale.
Embora exemplos patolo´gicos possam ser constru´ıdos, a maneira usual
em que uma func¸a˜o deixa de ser suave (e portanto (6) na˜o vale) e´ quando as
derivadas parciais na˜o existem em (x0, y0). Isso, e´ claro, signifca que na˜o e´
poss´ıvel nem escrever a fo´rmula (6), a menos que se esteja distra´ıdo. Vejamos
um exemplo simples.
Exemplo 3 Onde w =
√
x2 + y2 e´ suave? Discuta.
Soluc¸a˜o. Calculando formalmente, temos
∂w
∂x
=
x√
x2 + y2
,
∂w
∂y
=
y√
x2 + y2
.
As derivadas parciais sa˜o cont´ınuas em todos os pontos exceto em (0, 0), onde
elas na˜o esta˜o definidas. Enta˜o a func¸a˜o e´ suave a menos da origem, e (6)
deve valer em todo lugar exceto na origem.
Alia´s, em relac¸a˜o ao gra´fico dessa func¸a˜o, observe que
w =
√
x2 + y2 significa que
altura do gra´fico em (x, y)
= distaˆncia de (x, y) ao eixo w.
Assim, o gra´fico da func¸a˜o e´ um cone circular reto,
com ve´rtice em (0, 0) e eixo ao longo do eixo w.
5. Um Argumento Na˜o-Geome´trico 7
Geometricamente, o gra´fico tem um bico na origem, enta˜o na˜o deve ter
plano tangente la´, e na˜o vale a fo´rmula de aproximac¸a˜o (6) – na˜o existe
func¸a˜o linear que aproxime um cone em seu ve´rtice.
�
5 Um Argumento Na˜o-Geome´trico
Prometemos anteriormente uma abordagem na˜o-geome´trica da fo´rmula
de aproximac¸a˜o (6) que pudesse ser estendida para dimenso˜es maiores, em
particular para o caso tridimensional (7). Essa abordagem tambe´m ira´ mos-
trar porque a hipo´tese (8) e´ necessa´ria. O argumento continua impreciso, ja´
que ainda usa o s´ımbolo ≈, mas pode ser tornado rigoroso.
Usaremos a fo´rmula de aproximac¸a˜o unidimensional para uma func¸a˜o di-
ferencia´vel w = f(u):
∆w = f ′(u0)∆u , se ∆u ≈ 0. (9)
Queremos justificar – sem usar o raciocinio espacial – a fo´rmula (6).
Estamos tentando calcular a mudanc¸a de w
quando vamos de P a R, onde P = (x0, y0) e
R = (x0 + ∆x, y0 + ∆y), conforme figura ao
lado. Essa mudanc¸a pode ser pensada como
sendo feita em duas etapas:
∆w = ∆w1 + ∆w2. (10)
O primeiro e´ a mudanc¸a em w quando se muda de P para Q, e o segundo
quando se muda de Q para R, onde Q = (x0 + ∆x, y0). Usando a fo´rmula de
aproximac¸a˜o unidmensional (9):
∆w1 ≈ d
dx
f(x, y0)
∣∣∣
x0
·∆x = fx(x0, y0)∆x. (11)
Analogamente, se fy e´ cont´ınua (isto e´, f e´ suave (8)), temos
∆w2 ≈ ddyf(x0 + ∆x, y)
∣∣∣
y0
·∆y = fy(x0 + ∆x, y0)∆y
≈ fy(x0, y0)∆y
(12)
uma vez que, por continuidade, a diferenc¸a entre os termos fy(x0 + ∆x, y0) e
fy(x0, y0) e´ insignificante perto dos pro´prios termos. Substituindo os valores
aproximados (11) e (12) em (10), obtemos a fo´rmula de aproximac¸a˜o (6).
5. Um Argumento Na˜o-Geome´trico 8
Para fazer disso uma demonstrac¸a˜o, dever´ıamos analisar os erros das apro-
ximac¸o˜es, ou, mais simplesmente, trocar o s´ımbolo de ≈ por igualdades ba-
seadas no Teorema do Valor Me´dio do ca´lculo unidimensional.
Esse argumento pode ser facilmente extendido para linearizac¸o˜es de di-
menso˜es maiores, como (7); mais uma vez a hipo´tese essencial e´ a da suavi-
dade: as treˆs derivadas parciais wx, wy, wz devem ser cont´ınuas numa vizi-
nhanc¸a do ponto (x0, y0, z0).
	1 Derivadas Parciais
	2 O Plano Tangente
	3 A Fórmula de Aproximação
	4 Crítica à Fórmula de Aproximação
	5 Um Argumento Não-Geométrico

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