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A VIAGEM - PARTES 2 (O MITO) E 3 (O NASCIMENTO DA FILOSOFIA)

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FILOSOFIA GERAL E JURÍDICA – ROTEIRO/SÍNTESE PARA ESTUDO
A VIAGEM – PARTE 2 
O MITO
(Tempos homéricos ou mitológicos: de 1200 a 800 a.c)
 O pensamento mítico antecede, na cultura grega, o pensamento filosófico. Antes da filosofia não se utilizava a habilidade de pensar racionalmente; acreditava-se em sonhos, presságios; o mundo era encantado, habitado por espíritos; a comunicação se fazia através de “iniciados”;a realidade era interpretada através do mito. 
A palavra mito
vem do grego, MYTHOS, e deriva de dois verbos: mytheyo = contar, narrar, falar alguma coisa para outro e mytheo= conversar, contar, anunciar, nomear, designar.
O mito é uma narrativa na qual a palavra é usada para transmitir e comunicar coletivamente a tradição oral, preservando sua memória e garantindo a continuidade da cultura. A narrativa é feita em público e os ouvintes a consideram verdadeira pois o narrador tinha autoridade e confiabilidade.
Função do mito: 
Explicar a realidade; acalmar o homem diante de um mundo assustador; fixar os modelos exemplares dos ritos e atividades primitivas.
Perplexo diante da natureza que o cerca, sem entender o dia e a noite, o calor e o frio, a vida e a morte, o bem e o mal, o homem fabrica os mitos como fonte de explicação para aquilo que vê e não compreende.
O narrador - Os mitos eram narrados pelos poetas, aedos e rapsodos . A palavra do narrador era considerada sagrada, inquestionável e incontestável, vinda de uma revelação divina. 
Rapsodo famoso: Homero, autor de dois poemas épicos, a Ilíada (que trata da Guerra de Troia) e a Odisséia (que trata do retorno de Ulisses a Ítaca após a guerra). 
Elemento central do mito: Apelo ao sobrenatural, ao mistério, ao sagrado e à magia. 
Características da consciência mítica: ingênua; não problematizava (o mito constitui a visão de mundo dos indivíduos pertencentes a uma determinada sociedade; ou o indivíduo é parte dessa cultura e aceita e adere ao mito como visão de mundo ou não pertence a ela; a aceitação se fazia pela crença ou pela fé); comunitária (o indivíduo se adapta sem crítica às normas da tradição; o coletivo tinha preponderância sobre o individual)
A consciência filosófica: cria uma nova forma de abordar e explicar o mundo; busca no próprio mundo e no próprio homem explicações racionais.
As narrativas míticas: são as GENEALOGIAS, que podem ser cosmogonias ou teogonias. 
COSMOGONIAS – são narrativas que tratam da origem do mundo, gerado por forças divinas.
TEOGONIAS – são narrativas que tratam da origem dos deuses, gerados or pais ou antepassados.
Atenção: a filosofia nasce como COSMOLOGIA.
COSMOLOGIA é uma palavra que vem de 2 termos gregos: KOSMOS e LOGOS:
KÓSMOS - significa ordem, beleza, harmonia, universo (daí a palavra cosmético) . Em filosofia, kosmos significa universo ordenado, organizado. 
LOGOS, LOGIA – discurso racional, pensamento racional
COSMOLOGIA é o CONHECIMENTO RACIONAL DA ORDEM DO MUNDO, CONJUNTO DAS TEORIAS QUE TRATAM DAS LEIS DO UNIVERSO. É a explicação do mundo natural baseado em causas naturais e não na realidade misteriosa e exterior ao próprio mundo. SUPÕE A POSSIBILIDADE DO CONHECIMENTO DO MUNDO COMO SISTEMA E DE SUA EXPRESSÃO NUM DISCURSO SISTEMÁTICO. 
Diferença entre mito e filosofia:
	Mito:
Volta-se para o passado
não se importa com contradições
 narra através de genealogias (cosmogonias e teogonias)
a natureza é considerada sagrada, encantada
a inteligibilidade é dada
	Filosofia
As coisas são explicadas na totalidade do tempo
A explicação é coerente, lógica, racional
Explica por causas naturais e impessoais
A natureza é desencantada, dessacralizada
a inteligibilidade é procurada
nasce como cosmologia.explicação do mundo natural baseado em causas naturais
O mito está presente em todas as culturas do mundo. É um equívoco pensar que são lendas e que nada têm a ver com a existência real dos indivíduos.
 Expressam uma verdade intuída, isto é, que não se refere a coerência lógica, rigor na argumentação, apresentação de provas. 
Têm sua verdade, mas precisam ser interpretados pelo pensamento livre dos homens. Seu poder não está em ser verdadeiro ou falso, mas em ser efetivo (em confirmar uma proposta). 
Uma leitura dogmatizada do mito faz com que ele perca seu valor metafórico.
Ao tratar do mito deve- se evitar uma perspectiva etnocêntrica. 
A filosofia não pretende desmentir o mito; ela nega os falsos mitos:
O MITO DO CIENTIFICISMO – Augusto Comte, fundador do positivismo, opõe radicalmente mito e razão. Inferioriza o mito, afirmando que é uma tentativa fracassada de explicação da realidade.O positivismo explica a evolução da espécie humana em três estádios: o mítico, o filosófico e o científico, sendo este último superior aos outros e considerado como o único válido para se chegar à verdade. Ao fazer isso, exalta a ciência criando um novo mito: o “mito do cientificismo”, que é a crença na ciência como único saber possível, como única interpretação válida do real.. O mito do cientificismo dá origem a outros mitos, como o mito do progresso, da objetividade e da neutralidade científica.
O MITO DA RAÇA ARIANA – teoria de superioridade racial aproveitada pelo programa político do nazismo, que identificava os alemães como raça superior.
O MITO HOJE
Negar o mito é negar uma das expressões fundamentais da vida humana. O mito é a primeira forma de dar significado ao mundo: fundada no desejo de segurança, a imaginação cria histórias que nos tranquilizam, que dão exemplos e nos guiam no dia a dia. Independente do nosso desenvolvimento intelectual, nós continuamos a criar mitos pela vida afora. Os meios de comunicação de massa estimulam os desejos e anseios que existem na nossa natureza inconsciente e primitiva. 
No campo político certas figuras são transformadas em heróis, pregando um modelo de comportamento que promete privilegiar a ética, combater privilégios e levar o país ao desenvolvimento.
Artistas e desportistas também são mitificados: são considerados modelos de saúde, de sucesso profissional, excelentes pais, filhos, vivem num mundo pleno de luxo, beleza, glamour e riqueza.
As novelas de TV também lidam com valores míticos: os temas refletem a luta entre o Bem e o Mal, os astros são transformados em mito; o casamento é o grande anseio dos enamorados, solução de todos os problemas, apaziguamento de todos os conflitos. 
As festas de 15 anos, formatura, Ano Novo, os trotes de calouros etc são recheadas de conteúdo mítico e em tudo semelhantes aos rituais de passagem da consciência primitiva. 
O mito de hoje, embora ainda tenha força para inflamar paixões, não se apresenta mais com o caráter existencial que tinha no mito primitivo; os mitos modernos não abrangem mais a totalidade do real. As pessoas escolhem seus mitos sem que haja coerência entre eles. É preciso refletir criticamente para aceitar ou rejeitar os mitos que nos são oferecidos e os valores sobre os quais estão fundados.
LEITURA E INTERPRETAÇÃO de mitos presentes na filosofia platônica: MITO DA CAVERNA (Livro VII de A REPÚBLICA) E O AMOR (BANQUETE)
EXEMPLO DE NARRATIVAS MÍTICAS (PROMETEU, SÍSIFO, PANDORA, NARCISO, DÉDALO E ÍCARO)
 
THEMIS E DIKÉ: A SIGNIFICAÇÃO MITOLÓGICA DA JUSTIÇA. 
Primeiras manifestações do pensamento jurídico: Poemas de Homero e Hesíodo. O direito surge impregnado de religiosidade. Provinha da divindade e fazia parte da ordem divina
1.600 ac: sociedade micênica – sociedade feudal, hierarquizada, girando em torno da figura do rei divino. 
Não existia um estado jurídico e legal.
O rei recebia diretamente de Zeus “cetro e themis”. Themis era a conselheira de Zeus e dava as instruções necessárias para que fossem comunicadas ao soberano. As instruções eram as themistes. 
O rei administrava a justiça porque era considerado o representante de Zeus na terra
O rei e os nobres criavam livremente segundo os costumes e seu próprio saber as normas a serem aplicadas.
A palavra THEMIS etimlogicamente significa leiou regulamento e dá a ideia de normatividade e legalidade do direito.
Hesíodo introduz a palavra DIKÉ, que expressa uma nova consciência social face às transformações sociais. Um enorme fosso separava os nobres dos cidadãos livres e enriquecidos e era notório o abuso do rei ao fazer valer a themis . Surgia a necessidade de leis escritas.
Enquanto THEMIS se referia mais à legalidade e normatividade do direito, DIKÉ se referia à realidade mesma do direito: ao processo legal, à reparação do dano e à própria penalidade. 
O culpado dá diké, o lesado recebe Diké, o juiz reparte diké (significação fundamental: dar a cada um o que lhe é devido)
Tudo isso acontece segundo uma certa igualdade , então DIKÉ aspira também a igualdade de todos perante a lei.
Representa uma nova consciência DO DIREITO que vai instaurar no seio da comunidade política a necessidade de leis escritas e também de se nomear uma outra realidade que permita que os limites da DIKÈ não sejam violados: a DIKAOSYNE.
O NOMOS GRAPHOS, a lei escrita concretiza essa aspiração do homem grego.
A Queda de Ícaro – Tela do pintor Peter Paul Rubens.
Para Pensar: Pesquise sobre o mito de Dédalo e Ícaro e elabore uma interpretação atual relacionando-o com a trajetória de um operador do Direito. 
VEJA, AGORA DOIS EXEMPLOS DE NARRATIVAS MÍTICAS. O PRIMEIRO, É DE AUTORIA DO POETA GREGO HESÍODO: 
Primeiro que tudo surgiu o Caos, e depois Geia (terra) de amplo peito, para sempre firme alicerce de todas as coisas, e o brumoso Tártaro, num recesso da terra de largos caminhos, e Eros, o mais belo entre os deuses imortais, que amolece os membros e, no peito de todos os deuses e de todos os homens, domina o espírito e a vontade ponderada. Do Caos nasceram o Érebo e a negra Noite; e da Noite, por sua vez, surgiu o Éter e o Dia, que ela concebeu e deu à luz depois de sua ligação amorosa com Érebo. E a Terra gerou primeiro Urano ( o céu) constelado, igual a ela própria, para a cobrir em toda a volta, e para ser eternamente a morada segura dos deuses bem-aventurados. Deu à luz, em seguida, as altas montanhas, retiros aprazíveis das Ninfas divinas, que habitam nas montanhas arborizadas. Também deu à luz o mar estéril, que se agita com as sua vagas, o Ponto, sem deleitoso amor; e, seguidamente, tendo partilhado o leito com Urano, gerou o Oceano dos redemoinhos profundos, e Coió e Crio e Hipérion e Japeto. 
(Kirk, G S e Raven, J E. Os filósofos pré-socráticos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3ª ed.) 
 ESTE SEGUNDO EXEMPLO DE NARRATIVA MÍTICA se encontra no diálogo de Platão intitulado O Banquete, que é o diálogo platônico sobre o amor. O Banquete consiste numa série de discursos em que o amor é apresentado sobre diferentes aspectos. Esta passagem, uma das mais famosas dos diálogos de Platão, é a apresentação, por sócrates, de um discurso de Diotima, sacerdotisa de mantinéia, sobre o amor como desejo de beleza, de imortalidade, de sabedoria. o amor como processo de elevação da alma em busca da perfeição.
A ORIGEM DO AMOR
	Quando Afrodite nasceu, os deuses fizeram uma grande festa e entre os convivas estava Poros, o deus da Riqueza, filho do Engenho (Metis). No final do banquete, veio a Penúria (Penia), mendigar, como sempre faz quando há alegria, e ficou perto da porta. Então, embriagado de néctar – pois vinho não existia ainda – Poros, o deus da Riqueza, entrou no jardim de Zeus e ali, vencido pelo torpor, adormeceu. Então Penúria, tão sem recurso de seu, arquitetou um plano de ter um filho de Poros e, deitando-se ao seu lado, concebeu Amor. Assim sucedeu que desde o início Amor serviu e assistiu Afrodite, por ter sido gerado no dia em que ela nasceu, e ser , além disso, por natureza, um amante do belo, e bela é Afrodite. Ora, como filho de Poros e da Penúria, Amor está numa situação peculiar. Primeiro é sempre pobre e está longe da suavidade e beleza que muitos lhe supõem: ao contrário, é duro e seco, descalço e sem teto; sempre se deita no chão nu, sem lençol, e descansa nos degraus das portas, ou à margem dos caminhos, ao ar livre; fiel à natureza da mãe, vive na penúria; mas herdou do pai os esquemas de conquista de tudo o que é belo e bom; porque é bravo, impetuoso, muito sensível, caçador emérito, sempre tramando algum estratagema; desejoso e capaz de sabedoria, a vida toda perseguindo a verdade; um mestre do malabarismo, do feitiço e do discurso envolvente. Nem imortal, nem mortal de nascimento, no mesmíssimo dia está cheio de vida quando a sorte lhe sorri, para logo ficar moribundo e em seguida renascer de novo por força da natureza paterna, mas os recursos que obtém sempre se perdem; de modo que o Amor nunca é pobre ou rico e, além disso, está sempre a meio caminho da sabedoria e da ignorância. A questão é que nenhum deus deseja tornar-se sábio porque já o é; e ninguém mais que seja sábio persegue a sabedoria. Nem o ignorante persegue a sabedoria ou deseja ser sábio; nisso, aliás, a ignorância é confrangedora: estar satisfeita consigo mesma sem ser uma pessoa esclarecida nem inteligente. O homem que não se sente deficiente não deseja aquilo de que não sente deficiência. 
Confrangedora – que aflige, angustia, constrange
Estratagema – ardil.
DIÁLOGOS: DIREITO, FILOSOFIA E ARTE. O sentido da JUSTIÇA na escultura de Jens Galschiot “Survival of the Fattest”(Sobrevivência do mais Gordo)
 
Obra do escultor dinamarquês contemporâneo Jens Galschiot intitulada Survival of the Fattest. Trata-se de uma imensa escultura em cobre, onde se vê uma justiça representada como uma senhora obesa montada sobre um tipo esquálido de aparência pobre. O artista sublinha a indiferença e o alheamento social da justiça, expresso pelo desequilíbrio da diminuta balança que porta em sua mão direita.
FILOSOFIA GERAL E JURÍDICA – ROTEIRO/SÍNTESE PARA ESTUDO
A VIAGEM – PARTE 3 
OS PRIMEIROS FILÓSOFOS
(Aristóteles, Metafísica, livro I, 3)
A maior parte dos que primeiro filosofaram pensaram que os princípios de todas as coisas fossem apenas materiais. Com efeito, afirmam que aquilo de que todos os seres são constituídos e aquilo de que derivam originariamente e em que terminam por último, é elemento e é princípio de todos os seres, enquanto é uma realidade que permanece idêntica mesmo com a transmutação de suas afecções. E por esta razão, crêem que nada se gere e que nada se destrua, pois tal realidade sempre se conserva. E como não dizemos que Sócrates gera-se em sentido absoluto quando se torna belo ou músico, nem dizemos que perece quando perde tais modos de ser, pelo fato de que o substrato – ou seja, o próprio Sócrates – continua a existir, também devemos dizer que não se corrompe, em sentido absoluto, nenhuma das outras coisas: deve haver, pois, alguma realidade natural ( uma só ou mais de uma) da qual derivam todas as outras coisas, enquanto ela continua a existir imutável. 
Todavia, estes filósofos não estão todos de acordo sobre o número e a espécie de tal princípio. Tales, iniciador deste tipo de filosofia, diz que tal princípio é a água (por isso afirma também que a terra navega sobre a água), deduzindo sua convicção indubitavelmente da constatação de que o alimento de todas as coisas é úmido. Ora, aquilo de que todas as coisas são geradas é, justamente, o princípio de tudo. Ele deduz, portanto, sua convicção deste fato e do fato de que as sementes de todas as coisas têm natureza úmida e a água é o princípio da natureza das coisas úmidas. 
Há ainda alguns que crêem que também os antiqüíssimos que por primeiro trataram dos deuses, muito antes da presente geração, tenham tido esta mesma concepção da realidade natural. Com efeito, puseram oceano e Tétis como autores da geração das coisas e disseram que aquilo pelo que os deuses juram é a água, a qual é chamada por eles Estige. Com efeito, o que é mais antigo é também mais digno de respeito, e aquilo sobre o qual se jura é, justamente, o que é mais digno de respeito. Todavia, que tal concepção da realidade natural tenha sidoassim originária e assim antiga, não aparece de modo claro; ao contrário, afirma-se que Tales foi o primeiro a professar esta doutrina a respeito da causa primeira. 
O NASCIMENTO DA FILOSOFIA:
“A filosofia grega parece começar com uma idéia absurda, com a proposição: a água é a origem e a matriz de todas as coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e por três razões: em primeiro lugar porque essa proposição enuncia algo sobre a origem das coisas; em segundo lugar porque o faz sem imagem e sem fabulação; e, enfim, em terceiro lugar, porque nela, embora apenas em estado de crisálida, está contido o pensamento: Tudo é Um. A razão citada em primeiro lugar deixa Tales ainda em comunidade com os religiosos e supersticiosos, a segunda o tira dessa sociedade e no-lo mostra como investigador da natureza, mas, em virtude da terceira, Tales se mostra o primeiro filósofo grego”. (Nietzsche. A filosofia na época trágica dos gregos)
A filosofia é um dos acontecimentos mais decisivos na história do homem. Ela se encontra na base de todo desenvolvimento e de todas as formas da civilização ocidental.
Nasce no século VI aC. 
Não pretende negar o mito, mas propor uma nova interpretação da realidade. Surge como uma nova opção de conhecimento. 
Nasce como COSMOLOGIA – explicação do mundo natural baseado em causas naturais e não na realidade misteriosa e exterior ao próprio mundo.(Diferente das genealogias míticas que eram as cosmogonias e as teogonias.
CARACTERÍSTICAS DA COSMOLOGIA:
Explicação racional sobre a origem e as transformações da natureza
Afirmação de que o mundo é eterno. Nada vem do nada e nada volta ao nada.
Aquilo de onde tudo nasce e para onde tudo volta é invisível aos olhos do corpo
O que é real, imortal, eterno em todas as coisas é a physis, força material original. Os seres são mortais mas a physis é imortal
O mundo está em movimento permanente. O movimento do mundo se chama devir.
O devir obedece leis rigorosas e o pensamento conhece essas leis.
OS PERÍODOS DA FILOSOFIA GREGA
PERÍODO –Se define pelo conteúdo das investigações, ou seja, pelas indagações e interesses que dizem respeito a certo momento histórico.
Período pré-socrático, naturalista ou cosmológico – Final do século VII ao final do V.
Preocupação central: A Natureza e o cosmos. Origem do mundo e transformações da natureza. 
Jônios, pitagóricos, eleatas e pluralistas. 
Período socrático, humanista ou antropológico – (final do século V e todo o século IV.
Preocupação central: as questões humanas – Ética, política, técnica.
Os sofistas e Sócrates.
Período sistemático(Final do século IV e século III) 
Período das grandes sínteses de Platão e Aristóteles. 
Tudo pode ser objeto do pensamento filosófico desde que se estabeleçam as leis do pensamento e de suas demonstrações para oferecer os critérios da verdade e da ciência. 
Período helenístico ou greco-romano – Final do século III aC até VI dC. 
Preocu pação central: Questões da ética, do conhecimento, relações entre o homem e a natureza, ambos e Deus.
Surgimento das grandes escolas morais: estoicismo e epicurismo
Nascimento do pensamento cristão que tenta formular racionalmente o dogma da religião cristã e defini-lo à luz da razão, com categorias derivadas dos filósofos gregos. 
 SÓCRATES COMO REFERENCIAL DOS DOIS PRIMEIROS PERÍODOS 
OS DOIS PRIMEIROS PERÍODOS TÊM COMO REFERÊNCIA SÓCRATES – porque ele introduz uma nova problemática na discussão filosófica: as questões ético-políticas e a problemática humana e social 
A Mudança do eixo naturalista para o antropológico
Heráclito e Parmênides: a problemática da mudança. 
Heráclito: 
 Tudo flui
As transformações são constantes
Os opostos impregnam o mundo
As impressões dos sentidos são confiáveis
Parmênides:
Nada pode se transformar em algo diferente do que é
Nada pode mudar e os sentidos nos enganam quando admite isso
A razão não nos permite considerar possível qualquer transformação
O primeiro grande conflito de paradigmas da tradição filosófica se encontra na polêmica entre monismo e mobilismo, presente nas doutrinas de Heráclito e Parmênides e que indica uma preocupação dos primeiros filósofos com o conhecimento. Esse conflito de paradigmas dá origem a duas grandes correntes que, de uma forma ou de outra, sempre encontraremos no desenvolvimento da tradição do pensamento ocidental. A primeira corrente valoriza a pluralidade do real, a contribuição de nossa experiência concreta para o conhecimento dessa realidade. A segunda corrente busca aquilo que é único, permanente, estável, eterno, perfeito; o que não se dá imediatamente aos nossos sentidos, só se revelando ao nosso pensamento após uma longa experiência de reflexão. 
AS FONTES PARA O ESTUDO DOS PRÉ-SOCRÁTICOS: A DOXOGRAFIA E OS FRAGMENTOS.
O conhecimento da filosofia dos pré-socráticos envolve uma grande dificuldade, pois suas obras se perderam na Antiguidade e só as conhecemos por meios indiretos. As principais fontes de que dispomos para estudar os pré-socráticos são a doxografia e os fragmentos. 
A doxografia consiste em sínteses e comentários dos pensamentos desses filósofos elaboradas por pensadores posteriores a eles. Isto significa que a doxografia é a apresentação do pensamento de um pré-socrático nas palavras de outro filósofo.
Os fragmentos são citações de passagens dos próprios filósofos pré-socráticos encontradas em obras posteriores. Esclarecendo melhor, o fragmento apresenta a palavra do próprio filósofo pré-socrático. 
O PERÍODO PRÉ-SOCRÁTICO OU COSMOLÓGICO
Final do século VII ao final do século V aC. Também conhecido como período Naturalista. 
Primeiros filósofos: PHISIKOY (físicos) – Estudiosos ou teóricos da natureza (Physis)
Preocupação central: A natureza e o cosmos; a origem do mundo e a causa das transformações da natureza.
Queriam entender os processos naturais sem recorrer aos mitos.
Afirmavam que o mundo é eterno. Nada vem do nada e nada volta ao nada. O mundo sempre existiu.
Escolas
jônica: Interesse pelas teorias sobre a natureza. Procura o elemento primordial das coisas. Tales, Anaximandro, Anaxímens, Heráclito
italiana ou pitagórica: Visãode mundo mais abstrata, menos voltada para a explicação da realidade. Pitágoras põe o elemento primordial das coisas no número.. 
eleática: Fundada por Xenófanes. Principal representante: Parmênides. Com ele a comologia se transforma em Ontologia, Teoria do Ser. O princípio primordial das coisas é o Ser. 
PLURALISTA: Combina várias escolas mas privilegia uma concepção de mundo natural como múltiplo e dinâmico. Anaxágoras, Leucipo e Empédocles
TRAÇOS FUNDAMENTAIS DA FILOSOFIA :
O SENTIDO DA VERDADE - Os gregos são os primeiros a evocar o sentido da verdade. Surge a idéia de um saber irrefutável, que não pode ser negado nem por homens, nem por deuses, nem por mudança dos tempos. Irrefutável não porque a sociedade tenha fé nele ou viva sem duvidar dele, mas porque é ele próprio que é capaz de rebater todos os seus adversários. Os primeiros pensadores designaram esse saber com palavras da língua grega: Sophia (saber), logos ( razão), aletéia (verdade), episteme (ciência). 
O INTERESSE PARA O TODO – A evocação do sentido inaudito da verdade é também um dirigir-se à totalidade das coisas. A filosofia não privilegia uma parte, uma dimensão particular da realidade; com ela se dá a emergência do Todo na verdade. “Com o nascimento da filosofia o pensamento atravessa, sem se deixar distrair, a infinita riqueza das coisas: dirigir-se ao Todo significa percorrer o confim extremo, para lá do qual nada existe, e conseguir vislumbrar a reunião em conjunto das coisas mais diferentes e mais antitéticas (presente, passado futuro, coisas visíveis e invisíveis, corpóreas e incorpóreas, as coisas reais e possíveis, sonhos, fantasias, ilusões, vigília, todos os acontecimentos de mundos e universos etc), a sua reunião numa suprema unidade”. O NÚCLEO PRESENTE NA HISTÓRIA DA FILOSOFIA NÃO É CONSTITUÍDOSOMENTE PELA IDÉIA DA VERDADE MAS PELA RELAÇÃO ENTRE A EMERGÊNCIA DA VERDADE E A EMERGÊNCIA DA TOTALIDADE DAS COISAS. O SENTIDO FILOSÓFICO DA VERDADE IMPLICA QUE NOS DIRIJAMOS NÃO A UMA DIMENSÃO PARTICULAR DA REALIDADE, MAS AO TODO; SE PRIVILEGIARMOS UMA PARTE PODE SER QUE A IRRUPÇÃO DE OUTRAS PARTES VENHA DESMENTIR O SABER CONSTITUÍDO AO OBSERVAR A PRIMEIRA PARTE PRIVILEGIADA. 
PORTANTO, É NA EMERGÊNCIA DO TODO NA VERDADE que se constitui o NÚCLEO DA FILOSOFIA. A ideia de um saber irrefutável nega toda forma de conhecimento,toda forma de saber 
 toda forma de vida que possa ser negada, ultrapassada, desmentida. Com o seu nascimento, a filosofia coloca todas as coisas perante a verdade.. 
A IDENTIDADE DO DIFERENTE – Um outro traço essencial da filosofia é a busca da identidade no seio da diferença. Ao atravessar a infinita variedade das coisas, ela vê que cada coisa, se bem que diferente das outras , possui em comum com as outras o fato de ser habitante do Todo. As coisas, apesar de diferentes possuem uma identidade, por isso podem se revelar para a filosofia. Se esta identidade não se revelasse, as coisas diferentes não poderiam se revelar como “totalidade das coisas” , de cada vez se revelaria como uma parte do Todo, mas não como o Todo que em si as conserva reunidas.
A ARCHÉ – As coisas que nascem não provêm de uma dimensão para lá do TODO, assim como as que morrem também não vão acabar para além dos confins do TODO. As coisas não habitam o Todo somente porque se encontram, nele, mas no sentido de que a origem da qual provêm e o termo final que, ao partirem, atingem, também se encontram nele. As plantas nascem e se estendem pelo ar vindas da terra, e quando de sua morte retornam à terra. De algum modo elas existem já na terra antes de despontar, e continuam a existir na terra mesmo depois de terem apodrecido. A terra já tem reunidas e continua a manter reunidas em si própria todas as plantas que são visíveis no ar; mantém todas reunidas numa unidade que estando a superfície do terreno não se deixa ver. Essa metáfora ajuda a esclarecer em que sentido as coisas que habitam o Todo provêm de uma unidade e regressam a uma unidade, a qual não apenas se encontra no Todo mas é mesmo o centro do Todo, da mesma maneira que a terra é o centro de onde irradiam para o ar todas as ramificações arbóreas. Centro de irradiação, origem, princípio, são termos que servem para expressar o sentido da palavra ARCHÉ. Nessa medida podemos dizer que o Todo inclui tanto o “uno” como todas as coisas. 
O importante é saber como pensaram os primeiros filósofos e não o que pensaram.
COMO PENSARAM OS PRIMEIROS FILÓSOFOS: 
No seu primeiro momento, a filosofia grega é, antes de tudo, FILOSOFIA DA NATUREZA. Os pré-socráticos se preocupavam quase exclusivamente com a questão de saber de onde veio o universo e para onde volta depois de dissoluto – qual ou quais os elementos que o explicam radical e fundamentalmente. Hoje em dia nós acreditamos que tudo surgiu do nada, mas para os gregos antigos nada vem do nada e nada volta ao nada. O universo é eterno. O mundo sempre existiu. Tudo se transforma em outra coisa, mas não desaparece jamais. A forma particular desaparece, mas não a sua matéria. Aquilo de onde tudo nasce e para onde tudo volta é a physis (do verbo phyein, que significa emergir, brotar, nascer, crescer). A physis é a força material original, o fundo imortal de onde tudo brota. A physis é o que é real, imortal, eterno em todas as coisas. É um princípio gerador e dá origem a todos os seres. 
O mundo está em permanente mudança, mas não perde a estabilidade, a ordem. Embora a physis seja imutável, os seres físicos ou naturais gerados por ela estão em permanente mudança, em contínua transformação. Mudam de qualidade e quantidade, por exemplo: o novo envelhece, o frio esquenta, o dia se torna noite, o pequeno cresce etc. Os gregos usavam a palavra kinesis (movimento) para expressar toda e qualquer mudança, quantitativa ou qualitativa de um ser, e também seu nascimento e perecimento.O movimento do mundo era chamado devir. O devir, portanto, é a passagem contínua de uma coisa a outra (dia-noite, claro-escuro, pequeno-grande etc) e essa passagem obedece a leis rigorosas, determinadas pela physis ou princípio fundamental do mundo, e que o pensamento pode conhecer.
Partindo do pressuposto de que sempre existiu alguma coisa, e, vendo as transformações que ocorriam no meio ambiente, indagavam-se como aquilo era possível. Então, acreditavam que havia uma substância básica que subjazia a todas essas transformações. É preciso salientar que o mais importante não é saber as respostas que esses filósofos encontraram. O mais importante é perceber não o que eles pensavam, mas COMO eles pensavam. Todos eles buscavam encontrar a identidade no seio das diferenças! Eles acreditavam que havia uma substância básica por trás de todas as transformações. Vejamos, de forma resumida: Os primeiros filósofos
Voltaram-se para o TODO (totalidade dos entes, realidade, seja corpórea, biológica ou psíquica)
Viram que apesar de diversas todas as coisas se encontravam reunidas no TODO.
Sol é diferente de lua, mas se encontram reunidos no TODO. Ocupamo-nos com distrações, trabalho, coisas visíveis e invisíveis, reais e possíveis, sonhos, tudo reunido no TODO.
Ao se voltarem para o TODO, perceberam a diversidade, mas distinguiram a sua identidade.
Foram investigar em que consiste o elemento que permite essa identificação.
Esse elemento (a identidade do diferente) era também o princípio (ARCHÉ), fonte e origem de todas as coisas, a matéria de que são constituídos..
O elemento que era também o princípio de todas as coisas os gregos chamaram PHYSIS.
PHYSIS ( do verbo PHYEIN – emergir, nascer, crescer, brotar, surgir, vir a ser) é o que é real, eterno, imortal em todas as coisas . Força material original, fundo imortal de onde tudo brota. O mundo é eterno, a physis é eterna. Tudo se transforma em outra coisa mas não desaparece jamais. A forma particular desaparece, mas não a sua matéria. Conforme já foi dito, quando os primeiros filósofos chamam physis aquilo que pensam , não se referem à natureza compreendida como uma parte ou um aspecto do Todo, ou seja, ao mundo em devir, mas se referem ao próprio SER, na medida em que este é o TODO que envolve todas as partes, e todos os aspectos. Referem-se ao que se ilumina, que surge e se mostra, e que nesta sua luminosidade é inegável. 
Os seres são gerados , mortais e estão em mudança contínua. O mundo está em mudança contínua mas não perde a ordem, a estabilidade. 
A mudança se chama MOVIMENTO
O MOVIMENTO DO MUNDO SE CHAMA DEVIR.O DEVIR É REGIDO POR LEIS RIGOROSAS. 
CADA FILÓSOFO PROCUROU DIZER QUAL ERA O PRINCÍPIO ETERNO, A PHYSIS.
Hoje nós nunca refletimos acerca do TODO. Nossa reflexão se dirige para coisas e âmbitos particulares. (o ambiente físico, as distrações, os afetos, o trabalho etc).Todas essas coisas se encontram reunidas no TODO, numa única região que contém o presente, o passado e o futuro, coisas visíveis e invisíveis, corpóreas e incorpóreas, reais e possíveis, mundo humano e o divino, sonhos, fantasias, ilusões, desilusões, todos os acontecimentos do mundo, nossas esperanças!.. COM O NASCIMENTO DA FILOSOFIA O PENSAMENTO ATRAVESSA A INFINITA RIQUEZA DAS COISAS. DIRIGIR-SE AO TODO SIGNIFICA PERCORRER O CONFIM EXTREMO PARA ALÉM DO QUAL NADA EXISTE E CONSEGUIR VISLUMBRAR A REUNIÃO EM CONJUNTO DAS COISAS MAIS DIFERENTES E MAIS ANTITÉTICAS NUMA SUPREMA UNIDADE. 
OS PRIMEIROS PENSADORES : A ESCOLA JÔNICA
(TALES, ANAXIMANDRO, ANAXÍMENES, HERÁCLITO)
O PROBLEMA DOS PRIMEIROS PENSADORES : EM QUE CONSISTE O ELEMENTO IDENTIFICADOR DE TODAS AS COISAS?
ERA O PROBLEMA DA DETERMINAÇÃO DA ARCHÉ, DO PRINCÍPIO E DO ELEMENTO. 
TALES: A ÁGUA. 
A GRANDEZA DE TALES RESIDE NO INTERESSE PELO TODO, MOSTRANDO-SE COMO A SUPREMA UNIDADE DO DIFERENTE.
A ÁGUA É UMA METÁFORA. EQUIVALE A AFIRMAR QUE AS COISAS SÃO CONSTITUÍDAS POR UMA SUBSTÂNCIA COMUM. O DE ONDE ELAS SE GERAME PARA ONDE RETORNAM; É ALGO DE UNITÁRIO.
“A filosofia grega parece começar com uma idéia absurda, com a proposição: a água é a origem e a matriz de todas as coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e por três razões: em primeiro lugar porque essa proposição enuncia algo sobre a origem das coisas; em segundo lugar porque o faz sem imagem e sem fabulação; e, enfim, em terceiro lugar, porque nela, embora apenas em estado de crisálida, está contido o pensamento: Tudo é Um. A razão citada em primeiro lugar deixa Tales ainda em comunidade com os religiosos e supersticiosos, a segunda o tira dessa sociedade e no-lo mostra como investigador da natureza, mas, em virtude da terceira, Tales se mostra o primeiro filósofo grego”. (Nietzsche. A filosofia na época trágica dos gregos)
ANAXIMANDRO : O APEIRON.
Três coisas precisam ser compreendidas no pensamento de Anaximandro:
 1. O apeíron como a arché de todas as coisas
2. a explicação do devir e 
3. a concepção de justiça (diké), conforme expressa na sua famosa sentença. 
1) A arché de todas as coisas é o ÁPEIRON ,o INFINITO, POIS se nada vem do nada,tudo que se gera deve pré-existir na substância originária, então a água não pode ser a substância originária porque é finita, limitada. Essa dimensão que deve envolver tudo e sustentar tudo é o INFINITO, o apeíron. Um diferente não pode ser aquilo que existe de idêntico em toda diferença. 
2) O DEVIR
NO ÁPEIRON TODAS AS COISAS SE ENCONTRAM REUNIDADS E GUARDADAS. O apeíron contém em si toda oposição. A CRIAÇÃO DO UNIVERSO É A CRIAÇÃO DOS CONTRÁRIOS: do dia, da noite, da guerra, da paz. No processo de criação cósmica a criação de um dos contrários impede a criação do outro ou provoca a sua dissolução. A NOITE DISSOLVE O DIA; A GUERRA DISSOLVE A PAZ; A VIDA A MORTE. Tudo que nasce leva outras coisas ao desaparecimento. Enquanto na dimensão eterna do apeíron todas as coisas e todas as oposições se encontram reunidads, guardadas, NA ORDEM DO TEMPO, O NASCIMENTO DE CADA COISA É UMA PREVARICAÇÃO CONTRA OUTRAS, uma injustiça; o prevaricador paga o preço sendo a seguir destruído por outros prevaricadores, regressando à unidade originária do apeíron.Anaximandro explica o DESENVOLVIMENTO DO UNIVERSO como UM PROCESSO DE SEPARAÇÃO DA UNIDADE ORIGINÁRIA, separação sempre governada pelo apeíron, por essa UNIDADE ORIGINÁRIA, de onde as coisas provem e para onde retornam.
O governo do apeíron é o TODO, que contém e unifica a separação do universo em relação à unidade originária; essa unidade é o que mantém sob seu governo todas as coisas que na criação do universo dela vão se separando. 
3)A SENTENÇA DE ANAXIMANDRO ( a concepção de justiça): 
“TODAS AS COISAS SE DISSIPAM ONDE TIVERAM SUA GÊNESE, CONFORME A NECESSIDADE; POIS PAGAM UMAS ÀS OUTRAS CASTIGO E EXPIAÇÃO PELA INJUSTIÇA, CONFORME A DETERMINAÇÃO DO TEMPO”. 
Anaximandro nos diz que o mundo é composto de substancias contrárias que pagam castigo e expiação uns aos outros pela sua injustiça. Essas substancias são iguais na ordem do universo e quando qualquer delas para sobreviver sacrifica outra, deve lhe pagar retribuição, desse modo a estabilidade do universo fica preservada. É importante compreender que Anaximandro se apropria do termo diké (justiça), reservado para a convivência política e social, para justificar o equilíbrio da natureza, a harmonia do universo. As desarmonias que ocorrem são compensadas por diké. Assim os contrários se pagam retribuição.Se um tirasse do outro mais do que o devido devia-lhe reparar para que a harmonia do cosmo fosse restabelecida. A harmonia existente no mundo social é traduzida para o mundo da natureza. Anaximandro funda a comunidade jurídica das coisas. Ele traz o direito para o próprio ser do mundo. O direito é parte do universo e está inserido nele. Ainda, O CASTIGO E EXPIAÇÃO PELA INJUSTIÇA, SERÁ PAGO “CONFORME A DETERMINAÇÃO DO TEMPO”. Aqui é o tempo que ocupa a figura do juiz ao dizer o direito. O tempo fixa o montante do castigo e da retribuição e o prazo em que devem ser realizados. Anaximandro estabelece um tribunal no universo. 
ANAXÍMENES: O AR. 
A questão de Anaxímenes: O QUE É O ÁPEIRON? O CONCEITO DE ÁPEIRON É APENAS NEGATIVO, É O NÃO FINITO, O NÃO LIMITADO; MAS QUE COISA É ESSA QUE É O NÃO LIMITADO, O NÃO FINITO? 
ANAXÍMENES BUSCA ESTABELECER O QUE É O ÁPEIRON. A CAUSA QUE DETERMINA AS TRANSFORMAÇÕES DO ÁPEIRON EM TODAS AS C0ISAS DO MUNDO É, SEGUNDO ELE, A CONDENSAÇÃO E RAREFAÇÃO DO AR. O AR ABARCA TUDO NO MESMO SENTIDO QUE A NOSSA ALMA NOS SUSTENTA.
Vale observar que até aqui o princípio do diferente acaba sendo uma das diferentes coisas, ou seja, O UNIVERSAL CONTINUA SENDO CONFUNDIDO COM O PARTICULAR. TALES, ANAXIMANDRO E ANAXÍMENES PENSAM A IDENTIDADE DOS OPOSTOS, MAS É HERÁCLITO QUE VAI REFLETIR EXPLICITAMENTE SOBRE ISSO.
HERÁCLITO: 
 É HERÁCLITO QUE VAI REFLETIR EXPLICITAMENTE SOBRE A IDENTIDADE DOS OPOSTOS.O pensamento de Heráclito encontra-se em constante diálogo com o de Anaximandro. 
“Todas as coisas são o uno”, quer dizer, na sua diversidade e oposição possuem algo de idêntico.
Essa identidade não pode ser algo de particular e limitado, é APEIRON (O ILIMITADO); mas é preciso dizer o que é o apeíron (de acordo com a necessidade avançada por Anaxímenes).
Heráclito então torna claro que a identidade das coisas é o próprio fato de serem diferentes e opostas. Q que existe de idêntico em cada coisa é a própria contraposição de cada coisa às outras; cada coisa é , precisamente um “diferente”. A identidade de cada coisa, portanto, é o seu “não ser as outras”, é o “não ser o outro de si”. 
Esse “não ser o outro de si” não é algo particular,NÃO DIZ RESPEITO A ALGUMAS COISAS, é constituinte de todas as coisas. Então, à pergunta de Anaxímenes “O QUE É O ÁPEIRON?” Heráclito responde: “é o não ser o outro de si”, é a oposição de cada coisa às outras. Cada coisa só é o que é pela relação de oposição que mantém com as outras. O QUE EXISTE DE IDÊNTICO EM CADA COISA É A OPOSIÇÃO DE CADA COISA ÀS OUTRAS. A essa oposição em que cada coisa consiste e da qual é criada Heráclito chama guerra, pólemos.Aquilo que é comum a cada coisa é o desacordo, no qual todas as coisas podem se tornar e permanecer o que são: se a vida não estivesse em desacordo e se opusesse à morte, o calor ao frio, o dia à noite, a saciedade à fome, não existiriam vida, nem calor, nem dia, nem saciedade.
Vale lembrar que Anaximandro pensa a injustiça como a pretensão da coisa particular de se desligar de toda relação e ligação com as outras. Heráclito, entretanto, mostra que cada coisa só pode ser o que é quando se encontra ligada às outras pela relação de oposição. De maneira que, em Heráclito, justiça é desacordo, precisamente porque no contraste da oposição, na guerra universal, é negada a arrogância das coisas isoladas. 
Novidade da perspectiva de Heráclito:
A substância a partir da qual as coisas são criadas e para onde regressam é o FOGO.(permanece na perspectiva anterior)
Mas a constituição e o processo de nascer e perecer são determinados pela oposição entre as coisas, que é a LEI de cada coisa. 
A lei e a ordem do todo são uma palavra perpétua que deve ser escutada: O LOGOS
A MAIORIA OUVE O LOGOS MAS NÃO QUER ESCUTAR, NÃO COMPREENDE QUE O CONTRASTE É A CONDIÇÃO DE HARMONIA.
RETOMA O CONCEITO DE JUSTIÇA E INJUSTIÇA (COMO PREVARICAÇÃO) PRESENTE EM ANAXIMANDRO.
MOSTRA QUE CADA COISA SÓ PODE SER O QUE É QUANDO LIGADA A OUTRAS PELA OPOSIÇÃO. 
A JUSTIÇA É DESACORDO, É OPOSIÇÃO, PORQUE NO CONTRASTE DA OPOSIÇÃO É NEGADA A ARROGÂNCIA DAS COISAS ISOLADAS. 
Heráclito é o principal representante do mobilismo, concepção segundo a qual a realidade natural se caracteriza pelo movimento, todas as coisas estando em fluxo perpétuo. Esse seria o sentido da famosa frase atribuída a ele: “Panta rei”( tudo passa) . O mais famoso fragmento de Heráclito é, talvez, o de número 91, no qual ele diz: “Não podemos banhar-nos duas vezes no mesmo rio, porque orio não é mais o mesmo”. Esse fragmento sintetiza exatamente a idéia da realidade em fluxo, simbolizada pelo rio que representa o movimento encontrado em todas as coisas. A realidade, para Heráclito, é a harmonia dos contrários, que não cessam de se transformar uns nos outros. Em outro dos seus fragmentos ele afirma que “todas as coisas são o uno”. Isso significa que embora diferentes e opostas, todas as coisas se reúnem numa suprema unidade, ou seja, na sua diversidade e oposição elas são idênticas. Ele torna claro que a identidade das coisas é o próprio fato de serem diferentes e opostas, o próprio fato de se diversificarem das outras e se oporem às outras. O que existe de idêntico em cada coisa é a própria contraposição de cada coisa às outras. Aquilo que é “comum”a cada coisa é esta espécie de desacordo: se a vida não se opusesse à morte, o calor ao frio, a saciedade à fome, não existiriam nem vida, nem calor nem saciedade. Cada coisa só pode ser aquilo que é quando se encontra ligada às outras pela relação de oposição. O devir ( movimento, transformação) das coisas tem uma importância particular para Heráclito, porque no universo visível é a ligação que une os opostos: a paz nasce da guerra, a guerra da paz, as coisas frias se aquecem, as quentes se arrefecem. No devir cada coisa se torna o seu contrário: basta que algo se realize, por exemplo, a juventude, para que logo o seu contrário se lhe junte e a juventude se precipite para a velhice e com ela se identifique; isso é, para ele, a expressão da “harmonia escondida” em que o Deus consiste enquanto unidade originária de opostos. 
O sentido de justiça - Aqui vale salientar o sentido de “justiça” para Heráclito: como cada coisa só pode ser o que é quando se encontra ligada às outras pela relação de oposição, a justiça é “desacordo”, porque no contraste da oposição é negada a “a arrogância das coisas isoladas”. A tensão entre os opostos, o conflito do devir das coisas é a causa da justiça no mundo. Contra uma velha tradição da filosofia que busca compreender a justiça como o estável, o inabalável, eterno, Heráclito a compreende como o conflito e a discórdia. No fluxo da luta, segundo ele, está o justo. “Contra a tradição dos poemas de Homero e contra a posição de Anaxímenes, nas quais a discórdia e a guerra são injustiça, enquanto a concórdia e a paz são justiça, Heráclito afirma que a guerra é a comunidade, isto é a guerra é o que põe as coisas juntas para formar um mundo em comum, e, portanto, a luta dos contrários é harmonia e justiça. 
Passemos agora a outros pensadores pré-socráticos: 
ESCOLA PITÁGORICA
 Pitágoras introduz um novo elemento para explicar o universo: o número. Para ele os fenômenos mais significativos acontecem segundo regularidade mensurável e exprimível com números (as harmonias musicais, os fenômenos astronômicos, climáticos e biológicos). 
ESCOLA ELEÁTICA
Parmênides e os eleatas são adversários dos mobilistas. Ele introduz uma das distinções mais básicas do pensamento filosófico, a distinção entre realidade e aparência. Para ele o movimento era aparente, apenas uma característica superficial das coisas. Se formos além da experiência imediata das coisas, descobriremos, pelo pensamento, que a realidade é única, imóvel, sem princípio nem fim, contínua e indivisível. Para ele, nada podia vir do nada e nada que existisse poderia se transformar em outra coisa. Era extremamente racionalista e não confiava nos sentidos. Não acreditava nem quando via, embora soubesse que a natureza se transformava. Colocava-se na posição oposta à de Heráclito. Dizia que só podemos pensar sobre aquilo que permanece sempre idêntico a si mesmo, isto é, que o pensamento não pode pensar sobre coisas que são e não são, que ora são de um modo e ora de outro, que são contrárias a si mesmas e contraditórias. Para ele, movimento e mudança não possuem verdade. Não são. Deixou de ser o que era e ainda não é o que virá a ser, portanto não são. Só o permanente e imutável podem ser. Conhecer é alcançar o idêntico, o imutável. Nossos sentidos nos oferecem o mundo em incessante mudança, num fluxo perpétuo, onde nada permanece idêntico a si mesmo: o dia vira noite, o pequeno vira grande, o grande diminui, o líquido vira vapor ou sólido. Como pensar o que é e não é ao mesmo tempo? Como pensar o instável? Como pensar o que se torna oposto e contrário a si mesmo? Não é possível, dizia Parmênides. Pensar é dizer o que o ser é em sua identidade profunda e permanente. Para ele “a mudança não é, pois deixou de ser o que era, e não veio a ser ainda o que será, portanto não é nada”.O texto fundamenTal da filosofia de Parmênides é o poema Da Natureza, em que ele apresenta o caminho da verdade e o caminho da opinião. 
Melisso de Samos – Foi discípulo de Parmênides e ficou conhecido pelos argumentos que formulou contra as noções de movimento e pluralidade. Um desses argumentos tem a seguinte forma: “ O que é não pode ter começo, pois se tivesse começo deveria provir do que é ou do que não é. Não pode ter vindo do que é, porque o que é já é;também não pode ter vindo do que não é, porque o que não é não é e não pode vir a ser.” 
Zenão de Eléia – Também formulou celebres argumentos, conhecidos como paradoxos, em defesa da filosofia monista e contra a noção de movimento. Dois deles foram apresentados em sala de aula: o de Aquiles ( demonstra a impossibilidade de um corpo se mover de um ponto para outro, pois este deveria percorrer antes a metade da distância entre eles, mas antes a metade desta e assim ao infinito, o que é impossível num tempo finito. É impossível Aquiles alcançar a tartaruga) , e o da flecha (a flecha em movimento aparente nunca sai do ponto inicial). 
Ora, para Parmênides movimento e mudança não possuem verdade. “O ser é, o não-ser não é”, afirma ele em seu Poema, o mais extenso texto dos pré-socráticos que chegou até nós. 
Mas a manifestação do universo múltiplo e em devir é inegável e não pode ser desmentida. Isso também é verdade. 
Assim, a verdade entra em confronto consigo mesma, em antítese:
Enquanto RAZÃO – negação de que o ser seja nada - exige a imutabilidade e a não multiplicidade. 
Enquanto experiência – manifestação do mundo – revela o devir e a multiplicidade do ser. 
Fica então levantada a questão da antinomia entre RAZÃO e EXPERIÊNCIA. Por antinomia se compreende um conflito da razão consigo mesma diante de duas proposições contraditórias, cada uma podendo ser demonstrada separadamente. Desse modo, vem para o primeiro plano a questão: 
O HOMEM É CAPAZ DE CONHECER A VERDADE?
Até este momento, os pensadores gregos preocupavam-se exclusivamente em conseguir uma compreensão global do universo, da natureza, através da descoberta de seu elemento primordial, fundamental, de sua origem. A partir daqui a filosofia se volta para outra problemática: o homem, sua capacidade de conhecer, suas preocupações vivenciais. Há uma mudança do eixo naturalista para o antropológico. Passa-se, então, para o período socrático, humanista ou antropológico, que terá como expoentes os SOFISTAS e SÓCRATES. 
ESCOLA PLURALISTA
Empédocles e Anaxágoras – Alguns pensadores consideraram insuficiente a explicação dos monistas, visto que a realidade do universo era muito complexa. Em vez de apresentar um só elemento para explicar esta mesma realidade , concebem vários elementos. 
Empédocles propõe 4 elementos: terra, ar fogo e água e tudo existente era produto da junção disso, em proporções diferentes. Achava também que o amor e a disputa eram duas forças que atuavam na natureza. O amor une e a disputa separa as coisas. 
Anaxágoras - declarava que as coisas eram constituídas por pequenas partículas invisíveis a olho nu. Estas podiam se dividir, mas mesmo na pequena parte existia o todo, ou seja , há um pouco de tudo em todas as coisas. Segundo ele, no mesmo ente coexistem contrários. Se uma coisa branca se torna preta e se o preto não se cria do nadaentão deve se afirmar que que o preto preexiste já na coisa branca, a qual, portanto, é simultaneamentebranca e preta! Todavia, cada coisa se caracteriza pelo elemento predominante. Ele denominava estas partes minúsculas de sementes ou gérmens. Também imaginou uma força superior, a inteligência, razão, espírito, intelecto, o “Nous” , responsável pela criação das coisas.
A JUSTIÇA NO PERÍODO PRÉ-SOCRÁTICO
A passagem do Mito à Filosofia se processa aos poucos e para se compreender o sentido de justiça dentro da cultura pré-socrática é preciso retomar a tradição mítica, pois é dela que os primeiros filósofos partiram para formular seus problemas e indagações. 
Três vocábulos nos permitem acompanhar o desenvolvimento do sentido de Justiça: THEMIS, DIKÉ e DIKAIOSYNE.
THEMIS - Themis é considerada a deusa da lei, esposa e conselheira de Zeus. Com ele, Themis engendrou as Horas ( três divindades: a Eunomia (Disciplina), a Diké (justiça) e Irene (a paz); as Parcas (deusas implacáveis, carrascos enviados pelas Moiras – personificação do destino de cada um. As Moiras encarnam uma lei que nem mesmo os deuses podem transgredir. São três Moiras: Atropos, Cloto e Laquesis. Elas regulam a duração da vida de cada um por um fio que uma fia, outra enrola e outra corta) e as Ninfas do Eridano. Esquilo se refere a uma tradição que dá Themis como mãe de Prometeu. Aquela que inventou os oráculos, os ritos, as leis. Ela é das raras divindades da primeira geração que partilha da vida e das honras do Olimpo. É representada com uma venda nos olhos e uma balança na mão, para simbolizar a imparcialidade nos julgamentos. 
Zeus dava aos reis homéricos “cetro e Themis”. As decisões pronunciadas pelos reis ( as “temistes”) eram consideradas inspiradas na vontade divina. Toda justiça tem sua origem em Zeus. Themis refere-se principalmente à autoridade do Direito, a sua legalidade e validez.Vejamos o que nos diz Werner Jager:
“Enquanto Themis refere-se principalmente à autoridade do Direito, à sua legalidade e validade, Diké significa o cumprimento da justiça. Assim se compreende que a palavra Diké se tenha convertido necessariamente em grito de combate de uma época em que se batia pela consecução do direito uma classe que até então recebera como Themis, quer dizer, lei autoritária. O apelo à Diké tornou-se dia para dia mais frequente, mais apaixonado, mais premente”. 
DIKÉ - Os pré-socráticos vão encontrar no termo Diké a palavra adequada para expressar a justiça, compreendida como expressão da ordem cosmológica, daí ser possível afirmar , de modo geral, que o período se caracteriza por um jusnaturalismo cosmológico. Esse jusnaturalismo é um avanço com relação à concepção homérica de Themis, na medida em que não possui os traços mitológicos e sagrados da concepção anterior. DIKÉ, personificação da justiça, filha de Zeus e de Themis, refere-se à decisão e cumprimento da pena, ao cumprimento da justiça. O culpado dá diké (idenização ou compensação); O lesado recebe Diké (seu direito é reconduzido pelo julgamento).O juiz reparte Diké. Significa ao mesmo tempo processo, decisão e pena. “Dar a cada um o que lhe é devido”. Também guarda o sentido de igualdade: pagar igual com igual, devolver exatamente o que se recebeu, dar compensação equivalente ao prejuízo causado. A progressiva intensificação do sentimento de justiça deu origem a um novo termo;
DIKAIOSYNE – Justiça como virtude. Vai aparecer no período socrático. “Dar a cada um o seu”. Consiste na obediência às leis do Estado. 
O primeiro fragmento que faz menção à justiça é a sentença de Anaximandro, que já comentamos anteriormente.
 Período socrático, ou antropológico
Final do século V e todo o século IV a.C. Quando a Filosofia investiga as questões humanas, isto é, a ética, a política e as técnicas (em grego ântropos quer dizer homem, por isso o período recebeu o nome de antropológico). Coincide com a última fase da filosofia naturalista e a sua dissolução e tem como protagonistas os Sofistas e , sobretudo, Sócrates, que pela primeira vez procura determinar a essência do homem.
OS SOFISTAS
Com os SOFISTAS (de SOPHOS, sábios – 450-400 A C) a filosofia se volta para o homem que conhece e o valor do seu conhecimento. Para os Sofistas, se a verdade é um conhecimento que não pode ser desmentido, então o conhecimento da realidade não pode se tornar verdade porque esta se encontra em conflito consigo mesma. Eles se apresentavam como “professores de sabedoria” e ensinavam, por dinheiro, aos jovens abastados. Diziam que para ser bem sucedido na vida é preciso satisfazer os desejos; para isso, é preciso um máximo de riqueza; mas, a riqueza somente não basta. É preciso poder sobre os outros e, sendo assim, faz-se necessário convencer os outros a lhe confiar o poder. Portanto, é necessário aprender a arte de falar bem, a RETÓRICA. O importante é saber convencer. Os Sofistas diziam ainda que os valores morais são invenções dos fracos, que por não terem força para resistir às agressões dos fortes, imaginam uma solução para dominá-los: educa-os. Para eles não há bem nem mal absoluto, apenas interesses entre fortes e fracos. De maneira sucinta podemos dizer que três aspectos caracterizam o pensamento sofista: humanismo – valorização da percepção sensorial, “o homem é a medida de todas as coisas”; relativismo – isto é, o conhecimento depende das circunstâncias; e imoralismo , ou seja, negação dos valores morais. 
No regime democrático que vigorava em Atenas, o exercício da política dependia do bom uso da palavra e os sofistas foram mestres da arte de falar bem. Platão via, no ensino dos sofistas, um perigo para a cidade, pois a retórica sofística era, para ele, apenas uma técnica de persuasão. O bom orador, segundo os sofistas, é aquele que sabe persuadir qualquer um de qualquer coisa. Para Platão, aquele que realmente sabe não pode persuadir do contrário; o sofista nega que exista a verdade, ou pelo menos a possibilidade de acesso a ela. Para os sofistas só existem opiniões: boas e más, melhores e piores, úteis ou prejudiciais, mas jamais falsas e verdadeiras. 
Os sofistas abandonam a verdade para alcançar o poder sobre as coisas e utilizam a linguagem como técnica de persuasão para obtenção de fins. Górgias, um sofista, dirá que a razão tem um caráter antinômico e contraditório e que “o homem é a medida de todas as coisas”. Não existe, para ele, uma verdade absoluta e válida para todos. A verdade é a experiência de cada um, é o conjunto de fenômenos e das coisas que se manifestam a cada homem. Exemplo: Se a comida parece amarga para o doente, é amarga; se parece doce para o saudável é doce. O sofista não é o sábio que tem a verdade, porque todas as experiências são verdadeiras. Radicalizando ainda mais os resultados alcançados pela filosofia, Górgias dirá: “Nada existe; se existe é incognoscível; se é cognoscível não é comunicável.” Com isto ele quer dizer: Nada existe - isto é, a antinomia razão e experiência é inultrapassável. Se existe é incognoscível - Com base na razão não se pode afirmar a verdade da experiência. A vista não pode afirmar a verdade do ouvido; uma percepção visual não pode afirmar a verdade de uma percepção auditiva. Se é cognoscível, não é comunicável – A verdade não pode ser comunicada porque a linguagem é diferente das coisas. 
Górgias aponta ainda para o caráter antitético da vida e do conhecimento: a verdade é inútil porque nas decisões humanas entra a preferência. Sábio não é o que escolhe o verdadeiramente bom ou justo, mas o mais oportuno em determinada situação. A escolha é determinada pelos instintos e pela força. Justiça é, segundo eles, o domínio dos fortes sobre os fracos.
 A crítica de Platão aos sofistas pode ser melhor compreendida considerando a diferença que ele estabelece entre os sofistas e Sócrates:
O sofista é um professor ambulante. Sócrates é alguém ligado aos destinos da sua cidade, tanto que mesmo condenado à morte recusa-se a fugir, acatando a decisão dos seus concidadãos.
O sofista cobra para ensinar. Para Sócrates, filosofar não é profissão, é a atividade do homem livre. 
O sofista “sabe tudo”. Parapersuadir alguém de qualquer coisa é preciso saber tudo, mas saber tudo é impossível, logo, o saber sofístico é somente uma aparência, a retórica dos sofistas é a arte do engodo e o sofista, segundo Platão, é um grande charlatão. Sócrates, ao contrário, afirma nada saber e colocando-se no nível do seu interlocutor, dirige uma aventura dialética em busca da verdade, que está no interior de cada um.
O sofista faz retórica. Sócrates faz dialética. Na retórica o ouvinte é persuadido por uma enxurrada de palavras que não transmitem conhecimento algum. Na dialética, que trabalha com perguntas e respostas, a pesquisa procede passo a passo e não é possível ir adiante sem deixar esclarecido o que ficou para trás. 
O sofista refuta por refutar, para ganhar a disputa verbal. Sócrates refuta para purificar a alma de sua ignorância. 
A justiça – Com os sofistas a justiça é relativizada.De acordo com a tradição literária e filosofica grega, a natureza faria com que as leis fossem idênticas em toda parte. Mas não é assim que pensam os sofistas. Segundo eles, a lei natural (physis) é diferente da lei artificial (nomos), cujo conteúdo é deliberado pelos homens, cabendo a estes definir o justo e o injusto. Se o que é justo é o que está na lei e se a lei é convencionada pelos homens a justiça é relativa, o que é justo hoje pode não ser amanhã. A justiça, como nos diz Trasímaco em A República (ver Livro I) é a vantagem do mais forte. 
SÓCRATES
Exatamente porque a crítica dos sofistas à verdade se torna radical, Sócrates estabelece uma relação positiva com a verdade. Ele afirma não saber: “Só sei que nada sei”. Com isto ele quer dizer que nada ao seu redor lhe permite saber: nem leis, nem hábitos sociais, nem crenças religiosas, nem princípios morais, nem doutrinas filosóficas. Isto porque, para ele, o saber é a verdade e esses conhecimentos, quando são examinados se revelam gratuitos, afirmados e praticados sem que se saiba por quê , ou então se revelam contraditórios, acabam negando o que afirmam. Declarar não saber significa que nenhuma das convicções humanas que se conhece se apresenta como verdade. Sócrates sabe que não sabe; os outros, não. Sabe que a sociedade e a cultura não correspondem à idéia de verdade que os primeiros pensadores haviam revelado. Saber que nada sabe é ter presente a idéia de verdade e estar na verdade. A verdade nasce num plano diferente, quando nos damos conta de não possuí-la: a verdade é a verdade da crítica. É uma verdade pobre, mas que se dispõe a se tornar rica, no sentido de se lançar à procura do verdadeiro saber que se sabe não possuir. Sócrates defende a reflexão livre, independente da autoridade e da tradição. Procurava o CONCEITO, a definição daquilo que uma coisa, um valor, ou uma idéia verdadeiramente é. A OPINIÃO é instável, varia, depende de gostos e preferências. Os sofistas aceitavam a validade das opiniões e trabalhavam com elas para produzir argumentos. A diferença entre eles e Sócrates é que para este último as percepções do sentido são fonte de erro e falsidade. A verdade está em nós mesmos, na dimensão da consciência. Conhecer é passar da aparência a essência, da opinião ao conceito, do ponto de vista individual à idéia universal de cada um dos seres e de cada um dos valores da vida social e política.
	Toda a vida de Sócrates foi dedicada à procura desse saber do qual ele se sabia destituído. Ele estabeleceu condições fundamentais para que o pensamento filosófico pudesse se colocar no bom caminho para o encontrar. Em primeiro lugar, a verdade não pode nos ser transmitida por outros, ou vir do exterior. Já Górgias havia demonstrado a incapacidade da linguagem para revelar e transmitir aquilo de que ela fala. Sócrates aceita esta crítica e leva-a mais longe. Ele adverte a seus interlocutores que nada tem a ensinar. Se eles anseiam por descobrir a verdade é porque a têm em si e são, portanto, eles mesmos a gerá-la: ele apenas os pode ajudar nesta geração, repetindo com eles o mesmo que a sua mãe, parteira, fazia com as parturientes. A MAIÊUTICA (que significa, ao pé da letra, arte da obstetrícia) é o modo como Sócrates se relaciona com quem não está ainda na verdade. A eles pergunta o significado e a justificação daquilo que ele crê saber. Mas o interlocutor, que exprime uma vez após outra, as várias instâncias da cultura e da sociedade do seu tempo, acaba por não saber responder, porque Sócrates exige dele uma resposta que não possa ser contraditada e, muitas vezes é a própria resposta que se encontra em contradição consigo mesma. Sócrates questiona a verdade das convicções do seu interlocutor. E a verdade nasce deste último precisamente quando se dá conta de que todo o saber que pensava possuir não tem qualquer verdade – quando, portanto, atinge o ponto de saber que nada sabe. Este saber, ou reconhecimento, somos exatamente nós que o devemos realizar: a verdade apenas existe para nós quando a reconhecemos e este reconhecimento não pode outra pessoa efetuá-lo em nosso lugar, do mesmo modo que não nos pode ser ensinado ou transmitido. 
	A tese de Górgias da incomunicabilidade da verdade serve a Sócrates não para demonstrar que a verdade está ausente do homem, mas para afirmar que a verdade reside numa dimensão exterior da linguagem e do ensino. Essa dimensão somos nós mesmos, enquanto consciência. Nesse sentido, Sócrates reconhece o valor essencial do convite inscrito no frontão do templo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”.Vale dizer, ainda, que com Sócrates se estabelece uma verdadeira revolução na história da filosofia, pelo menos por três razões: 
 Razões antropológicas: A origem do cosmos deixa de ser um das questões mais importantes. A sua preocupação é o homem , sobretudo do ponto de vista político e moral.
Razões intelectuais – Claramente se dá importância ao papel desempenhado pela razão, já que no homem esta é indispensável na busca da verdade.
Razões morais – Coloca a ética em primeiro lugar. Os conceitos de verdade que o homem deve tentar alcançar – para alcançar a sabedoria – são essencialmente morais. Assim, acredita que a bondade depende da sabedoria. 
 A justiça - Contra a idéia da correspondência da lei com os designios divinos, os sofistas ressaltaram o caráter meramente convencional, humano da lei. Sócrates recusava tanto a concepção tradicional que hauria da mitologia de Themis e Diké uma espécie de direito religioso como a concepção sofista do caráter meramente convencional das normas. Ele não aceitava o direito como expressão de um mundo intermediado pela religião, mas também não aceitava resvalar pelo caráter meramente convencional da lei e da justiça. Para ele o justo não é uma imposição do mais forte, nem da maioria, nem de alguns contra os outros, mas antes uma busca efetuada pela razão. 
AGORA CONVIDO VOCÊ PARA UM CAFEZINHO FILOSÓFICO. O BATE-PAPO É SOBRE A CAVERNA DE PLATÃO.
Segundo Platão, vivemos, de certa forma, uma vida de ilusão, aprisionados por sombras e correntes que não foram criadas por nós. Vivemos presos a preconceitos, idéias prontas, crenças e valores pré-estabelecidos. E tendemos a nos acomodar às nossas ilusões, sentindo-nos ameaçados por qualquer relato de realidades maiores! 
 O primeiro a sair da caverna da ilusão é o filósofo, aquele que, dentre nós, consegue perceber as falsas suposições nas quais estamos enredados.
 Como primeiro a escapar da caverna da ilusão, ele tenta libertar os companheiros cativos para que vivam nas realidades mais amplas e brilhantes, que estão muito além dos limites do que habitualmente percebemos. Mas, ao voltar à caverna para convocar os companheiros, ele é aclamado por uns e vaiado por outros! Claro, é assim porque nem todos têm coragem para se libertar. Pensar é um desafio, implica abertura de novos horizontes que podem levar a mudanças, exige decisão, e muitos preferem a acomodação. 
Platão nos oferece uma imagem viva da verdadeira tarefa da filosofia: Sua meta é nos libertar da ilusão e nos ajudar a captar as realidades mais fundamentais. Ela nos auxiliaa desatar os “nós mentais”! Ela nos ensina a atingir o núcleo de uma questão! Ela nos ajuda a alcançar o essencial! 
No dia a dia de todos surgem questões que precisam ser avaliadas. Vemos especialistas dizendo que as crianças precisam de mais liberdade; outros afirmando que elas precisam de mais disciplina e rigor! Uns dizem que o homem tem livre-arbítrio, outros que nossas ações são fruto do meio-ambiente, da hereditariedade. No mundo de hoje, onde tudo é logo alardeado e exagerado, somos bombardeados todos os dias por um arsenal de opiniões conflitantes. A caverna de Platão está maior e mais funda do que nunca: todos têm algo para vender, para dizer, e os diversos pontos de vista competem para serem aceitos! Como separar o aproveitável do lixo? A filosofia nos auxilia a avaliar as questões e a tomar decisões.
Na verdade, nós não temos opção quanto a termos ou não uma filosofia, quanto a sermos ou não filósofos. Todos nós, inevitavelmente, já agimos a partir de uma certa visão filosófica de mundo. Há uma filosofia implícita, embutida nos nossos valores, crenças, idéias, hábitos etc. Mas nós podemos escolher entre uma filosofia absorvida irrefletidamente da cultura à nossa volta, dos preconceitos de nossa época, e uma outra, baseada no questionamento crítico, no pensamento sustentado. Eis a questão! Ser ou não ser bom pensador! 
Platão esboça, na sua alegoria da caverna, o doloroso processo pelo qual passa aquele que caminha para a luz do sol! Ilustra a peregrinação do homem das trevas das sombras para o clarão da verdade. 
Àqueles que pensam que o mais importante é estar “bem informado”, mergulhado até o nariz nas “novidades” de rotina, é bom lembrar “que quem menos sabe da água é o peixe!”
Bom, o “Café Filosófico” de hoje termina com algumas questões inspiradas na narrativa de Platão sobre a caverna. É pra você refletir. 
Sob que ilusões você está vivendo agora?
As coisas que você considera importantes têm realmente o valor que você lhes atribui?
Que coisas realmente valiosas você está ignorando?
Que suposições você faz sobre sua vida que podem se basear em aparências em vez de realidade?Sua filosofia de vida o aprisiona ou liberta?Bom, espero que tenham gostado do “Café Filosófico”. Breve nós nos encontraremos aqui de novo. Até a prova, terão tempo para “saborear” tudo que foi oferecido na primeira unidade! 
O MITO DA CAVERNA
1ª PARTE – Descrição da caverna, metáfora da realidade em que vivemos. 
2ª PARTE - Exame do processo de libertação do prisioneiro. O processo de libertação acontece por um conflito interno entre as forças do hábitoe da acomodação e a força do Eros, do impulso e da curiosidade que o estimula para fora. A do hábito faz com que ele se sinta confortável; a do Eros faz com que ele se sinta infeliz e frustrado e busque uma situação nova. Esse conflito é o motor da dialética, processo de mudança e de transformação que resulta da oposição de duas forças e faz com que o prisioneiro saia da situação em que se encontra. O processo é difícil porque o prisioneiro prefere a situação à qual está adaptado. 
3ª PARTE – Volta à caverna. Caracteriza a missão político-pedagógica do filósofo que deve mostrar a seus antigos companheiros a existência da realidade superior. E motiva-los a percorrer o caminho até ela mesmo que tenha de morrer como Sócrates. 
Caverna – mundo em que vivemos
Sombras – coisas materiais e sensoriais que percebemos
Prisioneiro que se liberta – o filósofo
Luz do sol – luz da verdade
Mundo exterior – Mundo da verdadeira realidade
Instrumento que liberta o filósofo – a dialética
A visão do mundo iluminado – a filosofia
Por que os prisioneiros zombam e espancam o filósofo? Porque pensam que o mundo sensível é o mundo verdadeiro. 
 DIÁLOGOS : DIREITO E ARTE
“O momento preciso em que arte e Direito se entrecruzam é o complexo momento da compreensão/interpretação: como objetos culturais que são arte e Direito reinventam, recriam, reveem e reinterpretam o mundo constantemente e só fazem algum sentido se são interpretados/ compreendidos pelos seus destinatários. Arte e Direito são inventores e invenções do mundo, expondo continuamente o diálogo do homem com a realidade. Assim, tanto a obra de arte como a norma jurídica nascem para ser interpretadas/compreendidas e como um modo de interpretar e compreender o mundo em redor. (...) Registre-se, para além disso, que essa compreensão/interpretação está longe de ser estática: ela é inesgotável, dinâmica, viva, plural, reinventando-se, revendo-se e atualizando-se a cada instante.”(Franca, M. A Cegueira da Justiça. Diálogo Iconográfico entre Arte e Direito.Porto Alegre:Fabris Editor, 2011. P.83)
 Napoleão coroado pelo tempo esboçando o código civil. Obra do pintor francês Jean-Baptiste Mauzaisse (1784-1844)
O primeiro grande marco do modo contemporâneo de elaborar normas jurídicas foi o Código Civil francês de 1804, cuja história revela bastante de como o desenvolvimento de novos padrões de legalidade colaborou para o surgimento de uma mentalidade positivista. Com a publicação do Código Napoleão criou-se uma outra realidade jurídica. O direito, que antes deveria ser buscado nos costumes de cada região ou no direito romano, foi unificado em cada país por meio de uma legislação organizada em códigos que deveriam regular exaustivamente as relações sociais. O movimento de codificação marcou o início da derrocada do naturalismo jurídico, pois foi estimulada a mentalidade segundo a qual “os códigos nada deixam ao arbítrio do intérprete; este não tem por missão fazer o direito, que já está feito. Não há mais incertezas; o direito está escrito em textos autênticos”.
Detalhe do afresco Allegoria della Giustizia, do pintor Antonio Fedi.
A justiça, com os olhos desvendados, testemunha das injustiças do mundo, aparece ao lado de Hermes, o mensageiro do Olimpo. 
Um dos grandes nomes do período de fundação da caricatura é Daumier (1808-1879), que tem especial interesse por caricaturas de profissões, em especial, as profissões jurídicas. A importância da arte de Daumier foi reconhecida por Baudelaire, poeta francês, como uma “arte séria” e ganhou relevo na análise que o jusfilósofo alemão Gustav Radbruch (1878-1949) fez de sua obra. Veja acima uma das caricaturas de Daumier, mostrando a relação entre dois advogados cujos clientes litigam um com o outro.
O Sono da Razão Produz Monstros – Pintura de Francisco de Goya (1746-1828)
Na modernidade, a imagem do filósofo era a de um sentinela alertando com a luz da razão contra os desvios do caminho da racionalidade.
DIÁLOGOS : DIREITO E LITERATURA
Conexão ente Direito e Literatura
Direito na Literatura – temas jurídicos presentes em obras literárias. Ex: Crime Castigo, de Dostoievski
Direito como literatura – Utilização de práticas da crítica literária para compreender o Direito, as instituições jurídicas, os procedimentos jurisdicionais e a justiça. O direito é narrativa e se manifesta literariamente em muitos textos. Ex: As sentenças que os juízes constroem, petições, excertos de doutrina 
Direito da literatura – normatização jurídica das obras literárias. Ex: discussão da autoria, originalidade, responsabilidade etc. 
Importância da abertura de um diálogo entre Direito e Literatura:
O advogado que conhece os textos básicos da tradição literária, que tenham fundo jurídico, conhece mais a história de sua profissão.
Ao ler autores estrangeiros, conhece sistemas jurídicos distintos e elabora uma cultura normativa comparatista (Tolstoi, Balzac, Alexandre Dumas)
A literatura apresenta um desfile de espécies sociais (soldados, clérigos, marinheiros, poetas, mendigos , operários, mercadores etc) e abre a compreensão dos juristas para problemas da natureza humana (Shakespeare, Balzac, Dostoievski, Kafka, Camus etc)
Denuncia o mal estar com a prática judiciária
Denuncia o elitismo e o bacharelismo, presentes na história da educação brasileira bem como a busca da faculdade de direito como adorno ou como porta de entrada para a política)Torna relevante a ideia de narrativa e o papel da interpretação no Direito.
SHYLOCK OU O ABUSO DO DIREITO
Na peça de Shakespeare, O MERCADOR DE VENEZA, encontramos uma personagem caricata de um judeu avarento e vingativo que tendo conseguido fazer um contrato absurdo e iníquo com um honesto mercador , Antônio, pela volubilidade da sorte que a este arruina, fica em posição de exigir em tribunal – imagine-se! – um pedaço de carne junto ao coração do outro contraente. 
Tudo parece correr bem para os seus instintos malévolos, mostrando-se irredutível a todas as alternativas e pedidos do tribunal e dos amigos do pobre Antonio. Mas eis que uma sagaz donzela enamorada, Pórcia, disfarçada de jurisconsulto, vem em substituição de um sábio jurista chamado a opinar: sim senhor – afirma o eloquente causídico – Shilock tem direito à carne, mas não ao sangue, e se fizer verter uma única gota dele , paga-lo-á caro. A partir daí, de dedução em dedução, Pórcia agiganta as consequências do ato de Shilock, e o judeu sai feliz do tribunal, por conservar a pele, embora com idenizações e compensações acabe por perder parte de sua fortuna. Este o argumento da peça bem humorada , mas muito profunda, no que a Shilock diz respeito, (porque o enredo é mais vasto e complexo, com muitas sugestões para outras realidades e problemas jurídicos) . O litigante de má fé Shilock, que começa por induzir um contrato claramente contrário aos bons costumes, e vai ao tribunal agarrado à sua letra para satisfazer a sua raiva pessoal, é um exemplo simbólico não só do querelador judicial que usa o legislativo e a literalidade contra a justiça como sobretudo da atitude intransigente contrária à equidade e à caridade dos secos de alma: faça-se justiça (quer dizer, apliquem-se as fórmulas) ainda que o mundo voe em estilhaços – tal é o lema dos Shilock deste mundo. Fiat iustitia, pereat mundus.
 (Paulo Ferreira da Cunha, em Filosofia do Direito. Primeira Síntese.Editora Almedina, Portugal)
Para Pensar: 
O CASO DO LANÇAMENTO DO ANÃO
(L’arrêt lancer de nain)
O Conseil d’État, a mais alta corte administrativa da França, decidiu, em 1995, o seguinte caso:
O Prefeito de Morsang Sur Orange fechou a Boite L’Embesse Club sob o argumento de que a prática do Lancer de Nain, era atentatória. O dono da Boite recorreu, sob a alegação de que tinha o direito a continuar fazendo o espetáculo. O estabelecimento lhe pertencia, e, conforme depoimento do anão, o trabalho era feito de livre e espontânea vontade. Na primeira instância, ganha. Um novo recurso leva o caso ao Conseil d’Etat (Conselho de Estado), que decide pela proibição da continuidade do Lancer de Nain. Vale dizer que o mesmo argumento implicou na proibição de “No limite”, programa levado ao ar pela Rede Globo de Televisão. 
Identifique os princípios que orientaram as decisões no caso acima.
Submetido o caso a sua decisão qual seria o seu juízo?
Cite outros casos semelhantes.
PARA LEITURA:
A JUSTIÇA
Muitos gregos, incluindo os grandes trágicos e alguns filósofos pré-socráticos, consideraram a justiça num sentido muito geral: algo é justo quando sua existência não interfere com a ordem a qual pertence. Nesse sentido, a justiça é muito semelhante à ordem ou à medida. É justo que cada coisa ocupe seu lugar no universo. Quando não ocorre assim, quando uma coisa usurpa o lugar de outra, quando não se confina a ser o que é, quando há alguma demasia ou excesso (híbris) se produz uma injustiça. A justiça se cumpre somente quando se restaura a ordem originária, quando se corrige e castiga a desmedida. 
Pode chamar-se cósmica a esta concepção da justiça. Toda realidade, incluindo os seres humanos, deve ser regida pela justiça. Esta pode se considerar como uma lei universal – que com freqüência era personalizada. Tal lei mantém ou , quando menos, expressa a ordem e medida do cosmos inteiro e por ela se restabelece tal ordem ou medida tão logo se tenha alterado. 
Logo se destacaram os aspectos sociais da justiça. Uma versão crua da concepção cósmica aplicada aos seres humanos é esta: dada uma ordem social aceita, qualquer alteração da mesma é injusta. Uma versão menos crua é: quando há um intercâmbio de bens de qualquer espécie entre dois ou mais membros de uma sociedade, considera-se que há justiça somente quando não se lhe tira nada do que é devido, quando há equilíbrio no intercâmbio. Se há desequilíbrio e, portanto, injustiça, tem que haver uma compensação, chamada redundantemente de “compensação justa”. Nesse sentido, chegou-se a considerar que é justo vingar-se por um dano infligido e que tem que haver igualdade de danos: “olho por olho e dente por dente”.
A distinção que muitos sofistas estabeleceram entre o que é “por natureza” e o que é “por convenção” afetou, entre outras, a noção de justiça. A tendência, entre os sofistas, foi achar que a justiça é “por convenção”, isto é, que algo é justo quando se concorda que é justo e algo é injusto quando se concorda que é injusto. Que alguém seja feliz ou infeliz não tem, em princípio, nada a ver com que seja justo ou injusto: pode se ser justo e infeliz, e injusto e feliz.
Em oposição aos sofistas, Platão declarou no Górgias que a justiça é a condição da felicidade; contra o sofista Pólo e o cidadão Cálicles, Platão afirmou, pela boca de Sócrates, que o homem injusto não pode ser feliz. A noção de justiça é um dos temas capitais , se não o principal, da Républica, de Platão, que se interessou pela justiça como virtude e como fundamento da constituição – e da estabilidade e ordem sociais – da Cidade-Estado. Na Cidade-Estado ideal deve reinar a justiça.(Pode se dizer também que quando reina a justiça há uma Cidade-Estado ideal).
No primeiro dos dez livros da República, Platão examina e critica diversas concepções da justiça. De início, considera inaceitável que a justiça seja o restabelecimento por qualquer meio – incluindo meios violentos – de algum desequilíbrio produzido por um excesso. A justiça não é mera compensação de danos. Esta era uma idéia própria dos poetas e que foi expressa obscuramente por Simônides. Platão não admite tampouco que a justiça seja fazer bem aos amigos e dano aos inimigos. Em particular, Platão se opõe à concepção do sofista Trasímaco, que afirmava que o que se chama justiça é um modo de servir aos próprios interesses, que são os interesses do que tem ou dos que têm o poder. Os poderosos são os fortes; estes falam de justiça, mas, a rigor, querem reafirmar e justificar seu domínio sobre os demais membros da comunidade. Em suma: a justiça é o encobrimento de interesses particulares; daí a definição de Trasímaco da justiça “como o interesse do mais forte” (o poderoso).
Pela boca de Sócrates, Platão trata de desfazer os argumentos de Trasímaco no segundo livro da República. Considera, para começar, três tipos de coisas ou “bens”: as que são desejáveis por si mesmas, independente dos seus resultados, como sucede com a justiça, e as que não são desejáveis por si mesmas, ainda que o sejam por suas conseqüências, como a cura de enfermidades, quer dizer, “a arte do médico”. Platão trata de fazer ver que o homem justo é feliz. Isso poderia levar a pensar que se alguém quer ser feliz tem que ser justo, mas isso equivaleria a subordinar a justiça à felicidade. A justiça é, sem embargo, uma virtude tão elevada que , levando as coisas a um extremo, cabe inclusive manter que tem-se que ser justo passe o que passar, e inclusive se o exercício da justiça produzir a infelicidade. Com isso teríamos a opinião que se tem expressado com a fórmula: “Faça-se justiça, ainda que pereça o mundo”. Platão parece retroceder ante essa possível extrema consequência. Na realidade, e pelo que diz no resto da República, se pode concluir que o mundo não vai perecer se a justiça for introduzida. Pelo contrário: o mundo poderá salvar-se graças à justiça. É possível e provável que em uma sociedade justa (perfeita) nem todos os cidadãos sejam felizes. Mas a felicidade não se deve medir, segundo Platão, individualmente ou

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