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Artigo de revisão | review Article 241 Autores Eduarda Savino Moreira de Oliveira1 Aline Silva de Aguiar1 1 Universidade Federal de Juiz de Fora. Data de submissão: 20/06/2014. Data de aprovação: 09/03/2015. Correspondência para: Aline Silva de Aguiar. Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)/Instituto de Ciências Biológicas (ICB) - Departamento de Nutrição. Cidade Universitária, São Pedro, Juiz de Fora, MG. CEP: 36036-900. E-mail: aline.aguiar@ufjf.edu.br Tel: + 55 (32) 2102-3234. Introdução A carambola (Averrhoa carambola) per- tence à família das oxalidacea, é uma fruta encontrada nas regiões tropicais, sendo originária da Ásia.1,2 Fatias corta- das transversalmente possuem a forma de estrela, que lhe dá o nome na literatura inglesa de “star fruit”. Ela pode ser ama- rela ou esverdeada com sabor variando do ácido ao doce1. Na literatura, são encontrados estudos mostrando os efeitos tóxicos da carambo- la. No entanto, o primeiro relato no Brasil desses efeitos foi em 19933 e até 2013 ainda não se sabia ao certo o motivo pelo qual o consumo da fruta causa efeitos tóxicos.4 A carambola possui uma neurotoxina capaz Por que a ingestão de carambola é proibida para pacientes com doença renal crônica? Why eating star fruit is prohibited for patients with chronic kidney disease? Novos estudos têm mostrado o meca- nismo pelo qual a carambola (Averrhoa carambola) torna-se tóxica para indiví- duos com doença renal crônica (DRC). O objetivo deste trabalho foi revisar a litera- tura atual sobre o tema. Trata-se de arti- go de revisão, com publicações de 2000 a 2014 disponíveis em bases de dados cien- tíficas. Há relatos de que a neurotoxicida- de ocorre devido à presença de oxalato na carambola; porém, achados recentes mos- tram que o efeito neurotóxico se dá pela toxina caramboxina, que parece inibir o sistema GABAérgico, que é o principal sis- tema inibitório do sistema nervoso central (SNC), envolvendo alterações como solu- ços e confusão mental, até quadros mais sérios como convulsões e morte. É impor- tante a ação multiprofissional para alertar os pacientes com DRC quanto à proibição do consumo da carambola. resumo Palavras-chave: alimentos; ciências da nutrição; neurotoxinas; rim. New studies have shown the mechanism by which the star fruit (Averrhoa carambola) becomes toxic to individuals with chronic kidney disease (CKD). The aim of this study was to review the current literature on the topic. This is a review article, with publications from 2000 to 2014 available in scientific database. There are reports that neurotoxicity is due to the presence of oxalate in star fruit, but recent findings show that the neurotoxic effect of the toxin is by caramboxin, which appears to inhibit the GABAergic system which is the major inhibitory system in the central nervous system (CNS), involving changes as sobs and confusion, to more serious conditions such as seizures and death. It is important to multidisciplinary action to alert patients with CKD as the prohibition of the star fruit consumption. AbstrAct Keywords: food; kidney; neurotoxins; nutritional sciences. de provocar alterações neurológicas em pa- cientes com doença renal crônica (DRC), envolvendo alterações como soluços e con- fusão mental, até quadros graves como convulsões e morte.2,4 Essa neurotoxina parece apresentar inibição sobre o sistema GABAérgico,3 que é o principal sistema ini- bitório do Sistema Nervoso Central (SNC), formado por neurônios que contém ácido gama-aminobutírico (GABA). As membra- nas celulares da maioria dos neurônios e astrócitos do SNC expressam receptores de GABA, que diminuem a excitabilidade neuronal através de vários tipos de meca- nismos. Em virtude de sua distribuição dis- seminada, os receptores de GABA influen- ciam muitos circuitos e funções neurais.5DOI: 10.5935/0101-2800.20150037 J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 242 Entretanto, novos estudos têm sido realizados a fim de esclarecer o mecanismo pelo qual a carambola tor- na-se tóxica para indivíduos com DRC, havendo ne- cessidade de realizar esse artigo de revisão para discutir e divulgar novas evidências sobre o tema. É importante que os profissionais da área da saúde conheçam os re- ais efeitos e mecanismos pelo qual a carambola possa ser letal aos pacientes nessa situação clínica. O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão so- bre o efeito tóxico da carambola em pacientes com DRC, visto que a neurotoxicidade induzida pela fruta tem sido relatada tanto em pacientes submetidos a tratamento dia- lítico quanto em pacientes sem necessidade de diálise. métodos Trata-se de uma revisão sistemática, contendo arti- gos publicados entre os anos de 2000 e 2014, sobre a influência da ingestão de carambola para pacien- tes com DRC. Os critérios de inclusão e exclusão dos artigos foram previamente estabelecidos. Critérios de elegibilidade englobaram: artigos de revisão, relato de casos e artigo experimental publicados nos idiomas português e inglês. Os critérios de exclusão foram: ar- tigos que falavam sobre cultivo de carambola, uso da carambola em outras doenças, estudos com crianças, tratamento e abordagem terapêutica na intoxicação. Além desses, foram excluídos também os estudos não disponíveis para acesso pela internet e que não eram nos idiomas português e inglês. As bases de dados consultadas foram Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Literatura Internacional em Ciências da Saúde (PubMed), Scientific Electronic Library Online (SCIELO) e Google Acadêmico. A definição das palavras-chave foi realizada mediante consulta aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Utilizou-se o cruzamento das palavras-chave star fruit, intoxica- tion; kidney; chronic kidney diseases e neurotoxic, em inglês; e carambola; intoxicação; rins; doença renal crônica e neurotoxina, em português. Foram selecio- nados 56 artigos, sendo excluídos 24 artigos dupli- cados. Após a aplicação dos critérios de inclusão, 20 artigos foram excluídos por abordarem o cultivo de carambola (n = 3), uso da carambola em outras do- enças (n = 1), estudo com crianças (n = 1), tratamen- to e abordagem terapêutica na intoxicação (n = 7), não conseguir acesso pela internet (n = 7) e não ser nos idioma português e inglês (n = 1). Com isso, 13 artigos foram selecionados para compor o presente artigo. Sete referências não se enquadram no critério de inclusão, mas foram utilizadas para a descrição de conceitos e etiologia. resultAdos Dos estudos incluídos, a maioria (67%, n = 8) se refe- ria a relato de casos envolvendo indivíduos de ambos os sexos, dois artigos incluídos são de revisão (16%, n = 2) e 25% (n = 3) são estudos experimentais reali- zados em roedores. Dos 110 pacientes relatados nos estudos, 75,45% dos pacientes (n = 83) sobreviveram e 24,55% (n = 27) foram a óbito após apresentarem manifestações clíni- cas após o consumo de carambola, sendo o soluço e a confusão mental os sintomas mais relatados. relAto de cAsos A partir do primeiro relato de neurotoxicidade por carambola em 1980, quando o extrato de carambola foi injetado intraperitonealmente em ratos normais resultando em convulsões, iniciou-se os relatos de ca- sos sobre a neurotoxicidade em pacientes que haviam consumido a fruta. A partir daí, pensou-se que a res- ponsável por aqueles sintomas era uma neurotoxina excitatória, mas ainda de natureza desconhecida.3 O primeiro surto de neurotoxicidade por carambo- la em pacientes urêmicos foi descrito em 1993, quando oito pacientes desenvolveram soluços após a ingestão de carambola.6 Em 2002, foram publicados artigos refor- çando esta correlação entre a carambola e a neurotoxici-dade.6,7 Estudos seguintes, mostraram que tanto pacien- tes com DRC submetidos a tratamento dialítico quanto pacientes sem necessidade de diálise apresentaram sinto- mas de intoxicação por carambola6 e foi observado que o consumo de carambola causa declínio da função renal independentemente do estágio da doença.8 Mais recen- temente, em 2010, outros estudos também com paciente sem necessidade de diálise, reforçaram a ideia de que há uma pobre correlação entre o grau de função renal subjacente e a taxa de mortalidade pela intoxicação por carambola, e que o consumo da fruta causa rápida de- terioração da função renal e morte, sugerindo o efeito convulsivante da neurotoxina presente na fruta.3,9 Entre os sintomas apresentados pelos pacientes intoxicados, o mais relatado foi o soluço, geralmen- te incontrolável e que não responde às medicações convencionais, confusão mental e crises convulsivas (Tabela 1). As crises convulsivas são significativamen- te associadas com o mau prognóstico do paciente.10 J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 243 t A b e lA 1 r e s u m o d o s c A s o s d e in to x ic A ç ã o in d u z id A p o r c A r A m b o lA A u to r Te m p o N ú m er o d e p ac ie n te s S ex o Id ad e Fa se d a d o en ça r en al cr ô n ic a (D R C ) D o sa g em in g er id a S in to m as Te m p o m éd io p ar a o in íc io d o s si n to m as R es u lt ad o s C ha ng et a l., 14 2 00 2 10 d ia s 1 M 64 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o 2 ca ra m bo la s D or lo m ba r, so lu ço s, ná us ea s, v óm ito s, c on fu sã o e ag ita çã o 1 di a M el ho ra a pó s tr at am en to co m h em od iá lis e W u et a l., 7 20 02 5 di as 2 M e F 62 e 7 5 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o 4 pe da ço s de d oc e de c ar am bo la S ol uç os e c on sc iê nc ia al te ra da 12 h or as , 8 ho ra s M el ho ra a pó s tr at am en to co m h em od iá lis e Ts e et a l., 6 20 03 10 m es es 7 M (5 ) e F (2 ) E nt re 3 9 e 77 D R C e m t ra ta m en to di al íti co (5 ) e s em ne ce ss id ad e de t ra ta m en to di al íti co (2 ) - C on fu sã o ag ud a e hi pe rc al em ia (4 ). S up or te ve nt ila tó rio (1 ). S in to m as le ve s (2 ). 8 ho ra s R ec up er aç ão e sp on tâ ne a (2 ). M el ho ra c om tr at am en to d ia lít ic o (5 ). H un g et a l., 8 20 04 5 di as 1 F 65 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o 1 ca ra m bo la Vô m ito s, s ol uç os , d ia rr ei a e do rm ên ci a no s m em br os in fe rio re s, p ro gr ed in do p ar a es ta do d e m al e pi lé pt ic o. 2 ho ra s A h em od iá lis e fo i r ea liz ad a, m as a p ac ie nt e fo i a ó bi to . Ts ai e t a l., 10 20 05 7 di as e 23 d ia s 2 M e F 84 e 7 4 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o 3 fr ut as a o lo ng o de t rê s di as e 3 fr ut as a o lo ng o de d oi s di as . S ol uç os , v ôm ito s, c on fu sã o e ag ita çã o, e vo lu in do p ar a es ta do d e m al e pi lé pt ic o. - A pe sa r do t ra ta m en to c om he m od iá lis e, o s pa ci en te s fo ra m a ó bi to . N et o et a l., 11 20 09 - 5 M (4 ) F (1 ) E nt re 3 4 e 67 Fu nç ão r en al n or m al an te rio r 15 f ru ta s em 7 h or as , 1 li tr o de su co e m 3 h or as , 1 ,5 li tr os d e su co e m 3 h or as , 1 2 fr ut as e m 1 ho ra e 3 00 m l d e su co e m 3 0 m in ut os c om o e st ôm ag o va zi o. To do s os p ac ie nt es tiv er am s ol uç os . D or n as co st as , v ôm ito s, in sô ni a e in su fic iê nc ia re na l a gu da (4 ). 3- 8 ho ra s M el ho ra s em n ec es si da de de d iá lis e. M ar tin s et a l., 9 2 01 0 5 di as 1 F 53 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o S uc o de c ar am bo la N áu se as , v ôm ito s, s ol uç os , co nf us ão , a gi ta çã o, co nv ul sõ es , d is pn ei a e ta qu ip ne ia . 2 di as A pe sa r do t ra ta m en to c om he m od iá lis e, a p ac ie nt e fo i a ób ito . M or ei ra et a l., 2 01 0 4 di as 1 M 56 D R C s em n ec es si da de d e tr at am en to d ia lít ic o 4 ca ra m bo la s M al -e st ar , c ef al ei a, n áu se as e vô m ito s, s eg ui do s de co nv ul sõ es . 24 h or as A pe sa r do t ra ta m en to c om he m od iá lis e o pa ci en te fo i a ób ito . Ya m am ot o et a l., 12 2 01 1 31 d ia s 1 M 59 Fu nç ão r en al n or m al an te rio r 30 m l d e ch á oo lo ng m is tu ra do co m á ci do o xá lic o. D or d e ga rg an ta , ta qu ip ne ia , q ue im aç ão pr ec or di na l, ná us ea s, in su fic iê nc ia r en al a gu da e ac id os e m et ab ól ic a. 4 ho ra s H ou ve m el ho ra a pó s tr at am en to c om he m od iá lis e. S ca ra ne llo et a l., 13 2 01 4 1 F 44 Fu nç ão r en al n or m al an te rio r 30 c ar am bo la s + s uc o co m 2 0 ca ra m bo la s D ia rr ei a ha vi a 4 di as , ac om pa nh ad ade n áu se as , vô m ito s, d or a bd om in al em c ól ic a e di m in ui çã o do vo lu m e ur in ár io 24 h or as M el ho ra a pó s du as se ss õe s de h em od iá lis e M : M as cu lin o; F : F em in in o. J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 244 Apenas três artigos relataram casos de pessoas (n = 7) que, apesar de terem a função renal normal, apresen- taram sintomas de intoxicação após o consumo da ca- rambola11,12 e presença de insuficiência renal aguda.13 De acordo com Neto et al., cinco pacientes com função renal normal apresentaram sintomas como soluço, dor nas costas, vômito e insônia após consumirem a fruta. De acordo com os autores, a quantidade de carambola ingerida por pessoa variou, sendo que a maior quantida- de foi 15 frutas in natura e a menor quantidade foi 300 mL de suco, porém com o estômago vazio. Esse estudo demostrou que, mesmo a ingestão de grande quantidade de carambola como a ingestão de pequena quantidade, com o estômago vazio, pode provocar insuficiência re- nal aguda, formação de cristais de oxalato e neuroto- xicidade, devido ao grande teor de oxalato presente na fruta.11 Outros estudos reforçam essa questão, ao relatar que pacientes com função renal normal apresentaram insuficiência renal aguda após consumir chá contendo ácido oxálico (30 mL de chá oolong)12 ou a própria fru- ta in natura e na forma de suco (30 carambolas + suco com 20 frutas).13 Os dois casos relatados apresentaram melhora após tratamento com sessões de hemodiáli- se.12,13 A melhor opção de tratamento para a intoxicação induzida pela carambola é a hemodiálise, que deve ser realizada o mais rapidamente possível, pois está relacio- nada com melhor sobrevida do paciente.7,14 ArtIgo de revIsão Os dois artigos de revisão incluídos neste artigo abor- dam relato de casos sobre o aparecimento de manifes- tações clínicas após o consumo de carambola em pa- cientes com DRC (Tabela 2). Foi observado que esta neurotoxina apresenta um efeito convulsivante e que a crise epiléptica está significativamente relacionada com o mau prognóstico do paciente.6,10 O oxalato presente na fruta foi mencionado como sendo um possível candidato para causar nefropatia aguda e neurotoxicidade.10 De acordo com os artigos de revisão, o consumo de carambola deve ser evitado devido às complicações que ela causa no paciente com DRC.6,10 estudos experImentAIs Três estudos experimentais foram selecionados pa- ra compor este artigo. Os estudos foram realizados em roedores da linhagem Wistar e Sprague Dawley e mostraram que a ingestão de carambola esta associa- da à neurotoxicidade e lesão renal aguda em pacientes com DRC (Tabela 3). Em 2001, Fang et al.15 correlacionaram o alto ní- vel de oxalato na carambola com o desenvolvimento de nefropatia aguda em ratos. Em 2008, eles repro- duziram as alterações neurológicas encontradas em pacientes intoxicados pela carambola em ratos ne- frectomizados alimentados com extrato dessa fruta, contendo naturalmente 0,2 M de oxalato, e grupos alimentados com 0,2 M ou 0,4 M solução de oxala- to sendo administradas por gavagem, a uma dose de 2 mL/100 g de peso corporal.16 Nesse estudo, ficou claro o importante papel do oxalato no surgimento da neurotoxicidade, ao se observar que esses dois grupos apresentaram lesão renal aguda, devido efeito obstrutivo de cristais de oxalato de cálcio, e indução de apoptose de células epiteliais renais.16 Em estudo recente publicado em 2013, foi desco- berta uma toxina que seria a responsável pelos efeitos neurotóxico da carambola. Nesse estudo isolou-se a neurotoxina presente na fruta que atua especifica- mente inibindo o sistema GABAérgico. Os pesquisa- dores denominaram a neurotoxina de caramboxina, uma molécula não proteica, que difere do oxalato. Quando misturada em água e armazenada em tem- peratura ambiente, a caramboxina sofre uma reação que a torna inativa. Nesse estudo foram feitos testes com extrato bruto de carambola em ratos Wistar. O extrato bruto de carambola a partir de frutas fresca foi dado por gavagem para os ratos para induzir lesão renal aguda, e depois, o extrato bruto liofilizado de carambola (20 mg/mL) e caramboxina (0,1 mg/mL) solubilizado em solução salina foi aplicado por via intracerebral, sendo observadas as convulsões e even- tuais óbitos.4 dIscussão A ingestão de carambola pode ser fatal para pacientes com DRC, pois ela contém uma neurotoxina que não é devidamente eliminada pela via renal. Em indiví- duos sem nefropatias, a neurotoxina presente na ca- rambola é absorvida, distribuída e excretada pela via renal, sem comprometimentos ao organismo. Já em pacientes com DRC, a neurotoxina não é devidamen- te excretada, ocorrendo elevação de seus níveis séri- cos, o que permitiria sua passagem pela barreira he- matoencefálica e consequente ação sobre o SNC.2,3,17 Alguns estudos demonstram que a neurotoxicida- de da fruta é decorrente da ação do oxalato, porém, achados recentes mostram que o efeito neurotóxico J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 245 t A b e lA 2 r e v is ã o s is t e m á t ic A d A l it e r A t u r A A u to r O b je ti vo Te m p o N ú m er o d e p ac ie n te s Id ad e D o sa g em in g er id a S in to m as Tr at am en to R es u lt ad o / so b re vi vê n ci a Ts e et a l., 6 20 03 D em on st ra r re la to s de c as os d e in to xi ca çã o po r ca ra m bo la e d is cu tir ev id ên ci as p ar a o ca nd id at o da ne ur ot ox in a. A rt ig os d o an o de 1 99 3, 1 99 8, 20 00 e 2 00 1. 35 - - S ol uç o, v ôm ito s, co nf us ão , f ra qu ez a, di sp ne ia , i ns ôn ia , pa re st es ia . Tr at am en to di al íti co (3 4) e se m n ec es si da de de t ra ta m en to di al íti co (1 ). D os 3 5 pa ci en te s, 9 m or re ra m . Ts ai e t a l., 10 20 05 E lu ci da r a re la çã o de c on vu ls õe s e ne ur ot ox ic id ad e da c ar am bo la . Ve rifi ca r se a t ax a de m or ta lid ad e es tá a ss oc ia da c om a o co rr ên ci a de co nv ul sõ es . E nt re o a no de 1 96 7 e fe ve re iro d e 20 05 53 E nt re 39 e 8 4 E nt re 3 00 m L de s uc o a 4 fr ut as C on fu sã o, a gi ta çã o, so lu ço , v ôm ito s, pa re si a, d or d e ca be ça , i ns ôn ia . C ris es e pi lé tic as (1 6) . D iá lis e e m ed ic am en to s an tie pi lé pt ic os . D os 1 6 pa ci en te s qu e ap re se nt ar am cr is es e pi lé tic as , 12 m or re ra m . t A b e lA 3 p r in c ip A is r e s u lt A d o s e n c o n t r A d o s p e lo s es t u d o s e x p e r im e n tA is q u e A v A li A r A m o e fe it o d o c o n s u m o d e c A r A m b o lA n A d o e n ç A r e n A l c r ô n ic A ( d r c ) A u to r Li n h ag em N Te m p o (d ia s) O b je ti v d o e st u d o M et o d o lo g ia R es u lt ad o s Fa ng e t a l., 15 20 01 R at os m ac ho s S pr ag ue -D aw le y Q ua tr o gr up os c om 6 a 9 ra to s (g ru po c on tr ol e, ex pe rim en ta l, je ju m e pr iv aç ão d e ág ua ). 5 E st ab el ec er u m a lig aç ão e nt re ca ra m bo la e n ef ro pa tia a gu da po r ox al at o e in ve st ig ar o s fa to re s pr ed is po ne nt es p ar a o se u de se nv ol vi m en to . 4 m L/ 10 0 g de p es o co rp or al de s uc o de c ar am bo la a ze da co m 2 ,4 6 g/ dL d e ox al at o, ce rc a de 1 g /k g. O g ru po e xp er im en ta l ap re se nt ou a lto n ív el d e cr ea tin in a sé ric a e cr is ta is d e ox al at o de c ál ci o no s rin s. A ca ra m bo la , d ev id o ao t eo r de ox al at o, p od e ca us ar n ef ro pa tia ag ud a na s co nd iç õe s de je ju m e pr iv aç ão d e ág ua . Fa ng e t a l., 16 20 08 R at os m ac ho s S pr ag ue -D aw le y Q ua tr o gr up os c om 8 ra to s (g ru po c on tr ol e, gr up o de c ar am bo la , e do is g ru po s de o xa la to ). - In ve st ig ar o s m ec an is m os pe lo s qu ai s a ca ra m bo la e st a as so ci ad a a ca us ar n ef ro pa tia ag ud a po r ox al at o, e xa m in ar o ef ei to n ef ro tó xi co d a ca ra m bo la . G ru po d e ca ra m bo la : s uc o de ca ra m bo la c on te nd o 0, 2 M d e ox al at o. G ru po s de o xa la to : 0, 2 M o u 0, 4 M d e so lu çã o de o xa la to . A s so lu çõ es fo ra m ad m in is tr ad as p or g av ag em , a um a do se d e 2 m L/ 10 0 g de pe so c or po ra l. O s uc o de c ar am bo la o u so lu çã o de o xa la to in du z ap op to se d e cé lu la s ep ite lia is re na is , c ris ta is d e ox al at o de cá lc io e le sã o re na l a gu da , q ue po de m s er c au sa da s pe lo t eo r de o xa la to n a fr ut a. G ar ci a- C ai ra sc o et a l., 4 2 01 3 R at os W is ta r 14 -3 0 30 Id en tifi ca r a to xi na d a ca ra m bo la e a le rt ar p ar a os pe rig os d e su a in ge st ão p or pa ci en te s co m D R C . E xt ra to d e ca ra m bo la , d ad o po r ga va ge m p ar a in du zi r le sã o re na l a gu da . E e xt ra to lio fil iz ad o de c ar am bo la (2 0 m g/ m L) e c ar am bo xi na 0, 1 m g/ m L) s ol ub ili za do e m so lu çã o sa lin a ap lic ad o vi a in tr ac er eb ra l. A m ic ro in je çã o de c ar am bo xi na in tr ac er eb ra l i nd uz iu o e st ad o de m al e pi lé pt ic o, c on fir m an do se u ef ei to n eu ro tó xi co . J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 246 não está relacionado somente ao alto conteúdo de oxalato, mas sim a uma toxina encontrada nela cha- mada de caramboxina, descartando a hipótese de que o causador da neurotoxicidade é exclusivamen- te o oxalato presente na fruta.4 Além disso, grande conteúdo de oxalato pode ser encontrado também no espinafre (180-730 mg/100 g) e em alguns tipos de ce- reais, dentre eles o farelo de trigo (457,4 mg/100 g).17 Porém, até o momento, não há relatos de que esses alimentos sejam tóxicos para pacientes com DRC. A toxina presente na carambola apresenta um po- der excitatório, convulsivante e neurodegenerativo.4 Essa toxina parece apresentar especificamente inibição sobre o sistema de condução GABAérgico.3 Das duas classes principais de aminoácidos neuroativos, o GABA é o principal aminoácido inibitório do SNC, enquanto o glutamato é o principal aminoácido excitatório.5 A caramboxina inibe discretamente a captação de glutamato pelos transportadores de alta afini- dade presentes nos astrócitos adjacentes à sinapse, e altera a ligação do GABA aos seus receptores.18 Além disso, a caramboxina atua sobre os principais receptores glutamatérgicos envolvidos no mecanis- mo da excitotoxicidade neuronal, o ácido-amino-3- -hidroxi-5-metil-isoxazol-4-propiônico (AMPA) e o NMetil-D-Aspartato (NMDA), sendo capaz de ativá-lo.4 A ativação do receptor AMPA determina a entrada de íons sódio no neurônio pós-sináptico, facilitando a despolarização neuronal. Esta facilita a entrada de íons cálcio no neurônio pós-sináptico, através de canais específicos, e também pela atuação do glutamato no receptor NMDA. Concentrações ex- cessivas de glutamato na fenda sináptica resultam na superestimulação de seus receptores e entrada exces- siva de íons cálcio no terminal pós-sináptico, ativan- do os mecanismos intracelulares de excitotoxicidade, que culminam na morte neuronal.5,19,20 Quantidades elevadas deste íon, no espaço intra- celular, resultam na ativação de uma série de enzimas intracelulares, como as fosfolipases, endonucleases e proteases e da óxido-nítrico sintetase, que duran- te uma atividade epiléptica prolongada determinam o desacoplamento da fosforilação oxidativa, uma le- são direta do esqueleto celular, além da formação de radicais livres, que aceleram esse processo. O neurô- nio lesado libera mais glutamato para o extracelular, facilitando a lesão dos neurônios vizinhos.21 Estes efeitos podem explicar a capacidade da caramboxi- na induzir convulsões, podendo ser considerada uma neurotoxina relevante no desencadeamento e evolu- ção dos quadros de intoxicação. Quando a fruta ou seu suco são consumidos por pacientes com DRC, a caramboxina pode induzir crises de soluços, vômito, confusão mental, agitação psicomotora, convulsões prolongadas e até a morte. A estrutura química da caramboxina foi elucidada, sendo um aminoácido não proteinogênico, cuja fór- mula molecular é C11H13NO6 + H, peso molecular iguala 256.08 u.4 Embora a incidência de uma pessoa sem histórico de DRC passar mal após o consumo de carambola ser pequena, não quer dizer que elas não corram riscos. Dois estudos dessa revisão mostraram que o alto teor de ácido oxálico presente na carambola pode eventu- almente produzir insuficiência renal aguda, cálculos renais e neurotoxicidade em indivíduos mais sensíveis. Por isso, recomenda-se evitar o consumo da fruta.11,12 Neste artigo foi observado que há escassez quanti- tativa de estudos que investiguem a relação entre con- sumo de carambola e intoxicação em pacientes com DRC. Entretanto, por meio de dados atuais (71,42% publicados nos últimos 10 anos), esta revisão ajuda a conscientizar os profissionais de saúde quanto aos ris- cos que seus pacientes correm se consumirem caram- bola. Por isso, os profissionais devem estar atentos para alertar os pacientes com DRC que a carambola deve ser excluída de sua dieta. conclusão Os estudos encontraram associação entre consumo de carambola e intoxicação. A fruta possui uma subs- tância tóxica chamada caramboxina, que é a prin- cipal responsável pelos efeitos descritos. Por isso, é importante alertar aos pacientes com DRC a não con- sumirem carambola. Esse papel de advertência deve ser assumido principalmente pelos nutricionistas, mas também por todos os envolvidos no tratamento do paciente. Além disso, recomenda-se que pessoas com função renal normal também evitem a ingestão da fruta, tanto na forma de suco como in natura. referêncIAs 1. Prati P, Nogueira JN, Dias CTS. Avaliação de carambola (Aver- rhoa carambola L.) dos tipos doce e ácido para o processa- mento de fruta em calda. Bol Centro Pesqui Process Aliment 2002;20:221-46. 2. Cuppari L, Avesani CM, Kamimura MA. Terapia nutricio- nal da doença renal crônica. In: Cuppari L, Avesanni CM, Kamimura MA. Nutrição na doença renal crônica. Barueri: Manole; 2013. J Bras Nefrol 2015;37(2):241-247 Consumo de carambola na doença renal 247 3. Martin LC, Caramori JST, Barretti P, Soares VA. 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