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57 Ruth Guinsburg Transporte do Recém-Nascido 99 INDICAÇÕES DO TRANSPORTE A melhor maneira de transportar o concepto continua sendo a intra-uterina, tornando imperiosa a identificação pré- natal das situações de risco e o encaminhamento adequado das gestantes. Entretanto, mesmo em países com excelente atendimento pré-natal, só 70-80% dos conceptos criticamente doentes nascem em centros que dispõem de UTI neonatal. Os outros nascimentos ocorrem em locais sem infra-estrutura e o transporte neonatal se faz necessário. As principais indica- ções para o transporte de recém-nascidos são: PREMATURIDADE De modo geral, devem estar sob cuidados intensivos to- dos os neonatos com idade gestacional menor que 32 sema- nas e peso ao nascer inferior a 1.500g. DOENÇAS RESPIRATÓRIAS Os neonatos portadores de insuficiência respiratória, com necessidade de concentrações de oxigênio acima de 40-60% ou de qualquer tipo de ventilação assistida devem ser trans- portados para centros de terapia intensiva. Os principais pro- cessos mórbidos que necessitam de algum suporte em termos de oxigenação ou de ventilação durante o transporte são: • Síndrome do desconforto respiratório: A indicação de se transportar o paciente depende do peso ao nascer, da gravi- dade da doença, da necessidade de reposição de surfactan- te exógeno e do suporte ventilatório indicado para a sua es- tabilização. • Pneumonias: O transporte desses pacientes está indica- do quando seu estado clínico está deteriorado ou quando houver necessidade de suporte ventilatório. • Hipertensão pulmonar: O transporte para o centro terciá- rio está sempre indicado, em razão da difícil manipulação ven- tilatória e metabólica desses pacientes. • Síndrome de escape de ar: O enfisema intersticial grave e o pneumotórax de difícil esvaziamento são indicações de transferência do recém-nascido para uma UTI neonatal. • Síndrome do pulmão úmido: A indicação de se transpor- tar o recém-nascido depende do estado clínico e do suporte ventilatório necessário para a sua estabilização. • Apnéia da prematuridade: A indicação de transferência desses pacientes depende da gravidade do quadro, da mo- nitorização necessária e da agressividade terapêutica. • Hérnia diafragmática: O transporte está sempre indica- do, sendo fundamental o cuidado intensivo para a sobrevi- da dos recém-nascidos. • Malformações pulmonares: Hipoplasia pulmonar, enfise- ma lobar congênito, cistos pulmonares, quilotórax e linfan- giectasia pulmonar congênita são algumas das raras malfor- mações pulmonares, presentes no período neonatal, que po- dem ser indicação de transferência do recém-nascido para um centro especializado. • Obstrução de vias aéreas: Atresia bilateral de coanas, síndrome de Pierre Robin e outras alterações que ponham em risco a permeabilidade das vias aéreas e que necessitam de procedimentos cirúrgicos ou não para estabelecer e manter a via aérea são indicação de transporte do recém-nascidos para unidades de terapia intensiva. ALTERAÇÕES CARDIOVASCULARES • Cardiopatias congênitas: A realização de exames subsi- diários para o esclarecimento anatômico da malformação, a necessidade de correção cirúrgica do defeito e de estabiliza- 58 ção hemodinâmica são indicações de transporte para esses pacientes. • Choque: As alterações hemodinâmicas podem modificar a permeabilidade da vasculatura pulmonar, comprometendo a ventilação. A diminuição da perfusão tecidual e os distúrbios metabólicos associados aumentam a gravidade do quadro. Dessa maneira, os cuidados terciários podem ser fundamen- tais para a sobrevida dos neonatos em choque. • Insuficiência cardíaca congestiva: Há indicação de trans- porte quando existir necessidade da ventiloterapia ou do uso de drogas vasoativas. DOENÇAS INFECCIOSAS A síndrome séptica, com instabilidade de múltiplos órgãos e/ou sistemas, as meningites, especialmente as de difícil tra- tamento e aquelas que evoluem com hidrocefalia, e a entero- colite necrosante, quando há pneumatose intestinal e/ou pneumoperitônio, são indicações de transporte neonatal para centros terciários. ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS Convulsões, hemorragias intracranianas graves e a pre- sença de síndromes hipertônicas ou hipotônicas podem re- querer os recursos existentes em hospitais terciários. ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS Doenças hemolíticas graves e anemias e coagulopatias que necessitam de elucidação diagnóstica têm indicação de transporte. ALTERAÇÕES METABÓLICAS Acidose metabólica refratária ou recidivante, hipoglicemia de difícil controle e uso materno de drogas também são indi- cações de transporte do recém-nascido para a realização de abordagem diagnóstica e terapêutica apropriadas. MALFORMAÇÕES CONGÊNITAS MAIORES E SÍNDROMES GENÉTICAS Tais neonatos necessitam de atendimento multidisciplinar para diagnóstico, tratamento cirúrgico, reabilitação e orienta- ção familiar, indicando-se o seu transporte para centros com esses recursos. INFRA-ESTRUTURA PARA O TRANSPORTE EQUIPE A equipe de transporte deve sempre contar com pelo me- nos dois profissionais, sendo um médico treinado para a exe- cução de todos os procedimentos necessários para o cuida- do do paciente criticamente doente. A habilidade em proce- dimentos como intubação traqueal, reanimação neonatal e um bom conhecimento sobre as técnicas de ventiloterapia e me- didas de suporte hemodinâmico devem ser pré-requisitos para incluir o profissional na equipe de transporte. Uma en- fermeira ou uma auxiliar com habilidade para a punção vas- cular, conhecimento para o manuseio das medicações e para o controle de sinais vitais, além de vivência com o equipa- mento de transporte, é fundamental para o êxito do trans- porte. VEÍCULOS • Transporte Terrestre: a ambulância é indicada para lo- comoções de até 150km, podendo chegar até 300-400km. Suas vantagens incluem a ampla disponibilidade do meio, o custo econômico relativamente baixo e a facilidade para a acomo- dação de todo o material necessário, além da segurança para o paciente e para a equipe de transporte. Os pré-requisitos mínimos para a utilização da ambulância no transporte neo- natal são: — Altura do compartimento de pacientes suficiente para acomodar a incubadora e local seguro para a sua fixação, com espaço interno mínimo para a incubadora e a equipe, per- mitindo a manipulação do paciente; — O compartimento dos pacientes deve dispor de ilumi- nação adequada, fonte de calor, fonte de oxigênio e ar com- primido, com estoque dos gases e tomadas de 110 e 220V; — Cintos de segurança para a equipe de transporte. • Transporte aéreo: — Helicópteros: são indicados em locais de acesso difí- cil ou de trânsito muito intenso, apresentando uma autono- mia de vôo de 3-4 horas. Como vantagem, destaca-se a rapi- dez do veículo, quando o hospital de destino dispõe de heliponto. No entanto, os custos muito elevados, o espaço limitado e o alto nível de ruído e vibração limitam seu uso. — Aeronaves: ideais para o transporte de grandes dis- tâncias. Os seus inconvenientes referem-se ao alto custo, ao fato de não se poder utilizar aeronaves para o transporte ur- bano e, ainda, à necessidade da ajuda de ambulâncias ou helicópteros para o transporte do hospital ao aeroporto e vice-versa. EQUIPAMENTOS, MATERIAIS E MEDICAÇÕES PARA O TRANSPORTE O equipamento necessário para o transporte deve estar sempre pronto e disponível para uso exclusivo do transpor- te. Os pré-requisitos para o seu emprego no transporte são: • Materiais leves, portáteis, e de fácil manutenção. • Equipamentos elétricos alimentados por corrente contí- nua de 12V ou corrente alternada 110/220V, além de possuí- rem bateria própria e recarregável, com autonomia de funcio- namento, no mínimo, pelo dobro do tempo do transporte. • O material não deve sofrer interferência eletromagnéti- ca e deve ser capazde suportar mudanças de temperatura, vi- bração e descompressão aguda. • O equipamento deve passar pelas portas de tamanho padrão dos hospitais. O material mínimo, ideal para o transporte neonatal, é o seguinte: 59 Para manutenção térmica — Incubadora de aquecimento por convecção, semitrans- parente ou transparente e com fonte de luz e bateria recarre- gável. A incubadora deve possuir, em suas paredes, orifícios que possibilitem a entrada dos circuitos do ventilador e dos monitores; — Invólucro de PVC (Magipack), importante para o equilíbrio térmico do prematuro. Para oxigenoterapia e ventilação — Cilindros de oxigênio e ar comprimido: na incubadora, são necessários pelo menos dois cilindros do tipo G, com ca- pacidade para 1.000 litros. Eles permitem o uso do gás por aproximadamente três horas, quando o fluxo usado for 5 li- tros/minuto. Tratam-se de cilindros de alta pressão e peque- na dimensão, com altura de 46cm, diâmetro de 16cm e peso vazio de 11kg. Estes cilindros devem ser utilizados exclusiva- mente nos trajetos dentro do hospital. Cilindros de oxigênio e ar comprimido com maior capacidade devem estar disponí- veis no veículo de transporte. Na ambulância, pode-se usar os cilindros do tipo T ou K. O cilindro tipo T, mais usado para o oxigênio, tem capacidade para 9.300 litros, o que permite seu uso por 32 horas, quando o fluxo for 5 litros/minuto. Trata- se de um cilindro grande, com altura de 148 cm, diâmetro de 23cm e peso vazio de 64kg. Já o cilindro K é mais usado para o transporte de ar comprimido. Ele possui capacidade 7.700 litros, o que permite seu uso por 24 horas, quando o fluxo for 5 litros/minuto. Suas dimensões são: altura — 130cm, diâme- tro — 23cm e peso vazio — 57kg. Os cilindros devem estar equipados com válvulas redutoras. — Halo para oxigênio inalatório. — Material para a intubação traqueal: laringoscópio com lâminas retas números 0 e 1, pilhas e lâmpadas reservas, câ- nulas de tamanho 2,5/3,0/3,5/4,0 e fio-guia esterilizado. — Sistemas de ventilação manual: balão auto-inflável com reservatório, máscaras de tamanho para prematuro e para RN a termo e manômetro acoplável ao balão ou sistema de ven- tilação manual com fluxo contínuo e regulagem de pressão. — Ventilador acoplado a incubadora: de preferência cicla- do a pressão ou a tempo. Nesse último caso, uma bateria re- carregável com autonomia de tempo elevada é fundamental. Embora o ventilador não seja imprescindível para o transporte do paciente ventilado, a sua presença pode ser de grande uti- lidade e vantajosa, principalmente em neonatos instáveis do ponto de vista clínico. — Filtros de ar que se conectam à cânula traqueal para a umidificação e aquecimento da mistura gasosa ou do oxigê- nio inalado pelo recém-nascido intubado. — Material para drenagem torácica: pinças; porta-agulhas; tesoura reta; lâmina de bisturi; fio mononáilon 3-0; dreno to- rácico (sonda de aspiração traqueal números 10/12 ou Trocar Torácico números 8/10) e a válvula de Heimlich. Para infusão de líquidos — Recomenda-se o emprego de bomba de infusão de se- ringa, com bateria de duração mínima de uma hora e capaz de trabalhar em velocidades de até 0,1mL/hora. A movimentação do veículo de transporte torna inviável o controle manual do gotejamento. — Material para obtenção de acesso venoso. — Material para cateterização umbilical é opcional, deven- do constar de pinças; porta-agulhas; lâmina de bisturi; tesou- ra reta; cadarço estéril; fio mononáilon 5-0 e cateter umbilical números 3 e 5. Para a monitorização — Estetoscópio e termômetro digital de mercúrio. — Oxímetro de pulso, sempre com mostrador que indique a forma da onda de pulso, além da saturação de oxigênio pro- priamente dita, sendo visível de ângulos e alturas variáveis. — Fitas para controle de glicemia capilar — Idealmente, as unidades de transporte neonatal tam- bém devem dispor de monitor cardíaco e respiratório, moni- tor de pressão arterial invasivo ou não-invasivo, monitor da concentração de oxigênio e um aspirador a vácuo portátil com bateria. Materiais Variados e Soluções Para assepsia Para coleta de exames Álcool a 70% Microlancetas e agulhas Clorexidina aquosa Seringas de 1, 3, 5 e 10mL Para venóclise Frascos (Secos, EDTA, Cultura) Abbocath 22 e 24 Diversos Escalpe 23, 25 e 27 Luvas estéreis e de procedimento Equipo com bureta Sondas traqueais e gástricas 6/8/10 Para fixação Torneira de 3 vias Microporo de 1,2 e 2,5cm Coletor de urina Benzina Eletrodos cardíacos Tintura de benjoim Gazes, algodão Medicamentos Aporte Efeito cardiovascular Antibióticos hidroeletrolítico Soro fisiológico Dobutamina Gentamicina ou amicacina Soro glicosado Dopamina Ampicilina ou (5 e 10%) penicilina Glicose a 50% Furosemide Diversos KCl a 19,1% Digoxina endovenosa Dexametasona NaCL a 20% Prostaglandina E1 Pancurônio Gluconato de Efeito neurológico Vitamina K1 cálcio a 10% Água destilada Morfina ou fentanil Heparina Reanimação Midazolam Lidocaína a 0,5% Adrenalina 1/10.000 Hidrato de cloral NaHCO3 a 4,2% Fenobarbital sódico Naloxone Difenilidantoína Recomenda-se que material e medicamentos sejam ade- quadamente identificados e que a equipe de transporte tenha familiaridade com o local onde estão guardados. Após cada transporte, todo o material deve ser verificado para repor o que foi utilizado e substituir o que não funcionou adequada- mente. Dessa maneira, a estrutura necessária estará pronta e disponível para o próximo transporte. 60 ESTABILIZAÇÃO CLÍNICA PRÉ-TRANSPORTE O transporte neonatal é geralmente inter-hospitalar, não havendo necessidade de pressa para a remoção do pacien- te. O sucesso do transporte de recém-nascidos criticamente doentes está na estabilização clínica antes do início do trans- porte. Os principais cuidados a serem tomados são os se- guintes: MANUTENÇÃO DA TEMPERATURA CORPORAL A temperatura deve ser medida na axila, quando a men- suração é manual, ou sobre o fígado, quando o paciente es- tiver em servo-controle, já que a perda de calor da pele pre- cede à do core, possibilitando assim o aquecimento do recém- nascido antes do aparecimento de níveis importantes de hi- potermia. Só iniciar o transporte quando o neonato estiver normotérmico. Caso contrário, aquecê-lo lentamente antes de começar o transporte, já que o aquecimento rápido pode de- sencadear apnéia. A manutenção da temperatura corporal pode ser atingida por meio de: • Incubadora de Transporte: deve-se deixar a incubadora ligada à rede elétrica até o momento do transporte propriamente dito e só aí ligar a bateria. É importante manter as portinholas da incubadora fechadas sempre que possível, preferindo-se as coberturas plásticas às portinholas acrílicas, por permitirem a manipulação do recém-nascido no interior da incubadora com menor perda de calor. Recomenda-se manter a temperatura, de acordo com o peso de nascimento, conforme Tabela 9.1. de leve extensão do pescoço, ideal para a manutenção da permeabilidade das vias aéreas nessa faixa etária. Indica-se também aspirar o excesso de secreções da boca e da farin- ge do neonato, antes do início do transporte. Na suspeita de atresia bilateral de coanas, micrognatia ou outras causas de obstrução de vias aéreas superiores, pode-se empregar a sonda de Guedel com a finalidade de manter a boca do re- cém-nascido aberta e a via aérea patente durante o transpor- te. Se houver qualquer dúvida quanto à permeabilidade das vias aéreas, é preferível intubar o neonato antes do início do transporte a ter que realizar o procedimento durante a sua locomoção. SUPORTE RESPIRATÓRIO É obrigatória a observação do ritmo respiratório, da pre- sença de cianose e da monitorização dos gases sangüíneos antes do início do transporte. Se o recém-nascido apresentar respiração rítmica e regular, com PO2 e PCO2 normais, em con- centração de oxigênio inferior a 40%,pode-se transportá-lo somente com oxigênio inalatório. Este pode ser oferecido por meio do cateter nasal, da nebulização em incubadora ou do halo. O halo apresenta como vantagem o fato de oferecer uma concentração de oxigênio fixa, o que não ocorre com os outros métodos. O halo pode ser de acrílico ou plástico. Em- bora o de plástico seja dobrável e portátil, ele não está dis- ponível no mercado brasileiro. O halo acrílico deve ter uma altura mínima de 13cm e um diâmetro de 20cm, além de apre- sentar a entrada dos gases em “T”. Nas situações descritas a seguir, é preferível intubar e transportar o paciente sob ven- tilação assistida, a correr o risco de uma deterioração aguda durante o transporte, com necessidade de intervenção em condições longe das ideais: — Ritmo respiratório irregular ou superficial; — Necessidade de concentrações de oxigênio acima de 60% para manter a PO2 normal; — PCO2 superior a 45mmHg; — Pacientes com peso ao nascer inferior a 1.500g com desconforto respiratório, pois o risco de estafa e apnéia é muito grande. A ventilação assistida pode ser realizada, durante o trans- porte do recém-nascido, utilizando-se aparelhos próprios para a ventilação manual ou de ventiladores mecânicos. O balão auto-inflável com reservatório é o sistema de ven- tilação manual mais utilizado nos transportes em nosso meio. O balão com reservatório, ligado a uma fonte de oxigênio a 5 litros/minuto, permite a oferta de concentrações de oxigênio entre 90 e 100%. Sem o reservatório, mas ligado à fonte de oxigênio, o balão oferece concentrações de oxigênio próximas a 40%. Entre as desvantagens do balão, destacam-se: — Não se consegue controlar com exatidão as pressões inspiratórias, a menos que esteja conectado a um manômetro, aumentando os riscos de barotrauma e hipoventilação. — O balão auto-inflável não mantém uma pressão expira- tória final positiva. — O esforço empregado pelo profissional para ventilar manualmente o paciente causa variação importante das pres- sões e das freqüências utilizadas durante o transporte. Tabela 9.1 Temperatura da Incubadora de Transporte e Peso do Recém-nascido ao Transporte Peso Temperatura da Incubadora < 1001g 36-37°C 1.001-2.000g 35-37°C 2.001-3.000g 34-35°C > 3.000g 32-34°C • Secagem adequada do líquido amniótico e outras secre- ções da superfície corporal. • Medidas Coadjuvantes: — Manter o paciente sob fonte de calor radiante até o iní- cio do transporte; — Envolver o corpo, mas não a cabeça do recém-nasci- do, em filme transparente de PVC (Magipack). — Colocar em local próximo ao neonato bolsa ou luvas com água quente. Deve-se evitar o contato destes materiais com a pele do paciente, pois pode causar queimaduras. MANUTENÇÃO DA PERMEABILIDADE DAS VIAS AÉREAS Durante o transporte, devido ao movimento da incuba- dora e do veículo, é interessante manter um coxim sob as espáduas do recém-nascido para auxiliar a manter a posição 61 O continuous flow reviver (CFR) é um equipamento de- senvolvido em Brasília, liberado para uso comercial em 1990 e disponível no mercado. Este aparelho de ventilação ma- nual possibilita o controle da pressão inspiratória e expiratória, aumentando a segurança da ventiloterapia no transporte e protegendo o paciente do barotrauma e da hipoventilação. Trata-se de um aparelho de metal pequeno, portátil, resisten- te, lavável em água e sabão e que apresenta um custo relati- vamente baixo, quando comparado aos ventiladores mecâni- cos. Como desvantagem, além da falta de experiência dos profissionais com a manipulação do equipamento, pode ocor- rer variação da freqüência respiratória, controlada manual- mente pelo profissional que opera o CFR. O respirador mecânico é o método de eleição para o trans- porte, pois, por meio dele, pode-se manter constantes as pressões, a freqüência respiratória, a concentração de oxigê- nio e os tempos inspiratório e expiratório. A maior desvanta- gem desses ventiladores, entretanto, relaciona-se ao seu cus- to muito elevado. Os respiradores mais usados para o trans- porte do paciente ventilado são aqueles ciclados a tempo e limitados à pressão. Durante o transporte, de maneira geral, utiliza-se a ventilação mecânica convencional, a menos que exista uma indicação precisa de outras técnicas ventilatórias. Isso significa que se emprega a menor pressão inspiratória possível para elevar a caixa torácica em cerca de 0,5cm; PEEP ao redor de 4-6cmH2O; freqüência entre 30 e 40 ciclos/minu- to; tempos inspiratório e expiratório que respeitem as cons- tantes de tempo do pulmão do paciente transportado, além de fluxos relativamente baixos. É fundamental estar atento para evitar a hipoventilação, que pode desencadear hipoxemia e acidose durante o transporte, e para evitar também a hiper- ventilação, que pode levar à diminuição do débito cardíaco e síndrome do escape de ar. Deve-se transportar qualquer paciente que apresente des- conforto respiratório com uma sonda para a descompressão gástrica. Se o recém-nascido não estiver intubado, é preferí- vel que esta sonda seja orogástrica, a fim de evitar a obstru- ção das narinas. Na presença de pneumotórax, é imperativa a realização de drenagem torácica com material adequado e fixação segura, antes do início do transporte, conectando-se o dreno à vál- vula de Heimlich. Essa válvula é portátil, de fácil manuseio e possui um mecanismo unidirecional de fluxo, que impede o retorno do ar à cavidade pleural. É absolutamente contra-in- dicado transportar o paciente sem dreno ou apenas com um escalpe no segundo espaço intercostal. Nessa última circuns- tância, o escalpe não drena adequadamente o pneumotórax e pode perfurar o pulmão em várias regiões, devido aos so- lavancos do veículo em movimento. Deve-se lembrar que, durante o transporte aéreo em cabines não pressurizadas, por exemplo em helicópteros, as coleções de ar se distendem, sendo imperativo o seu esvaziamento antes da decolagem. ESTABILIZAÇÃO CARDIOVASCULAR No neonato a ser transportado, deve-se verificar a fre- qüência cardíaca, a perfusão periférica, a diurese e monitori- zar a pressão arterial. Quando indicado, inicia-se a infusão de dopamina e/ou dobutamina, de maneira a criar condições he- modinâmicas relativamente estáveis antes do transporte pro- priamente dito. A administração desses medicamentos deve ser feita por meio de bombas de infusão, caso contrário, o gotejamento irregular das drogas pode causar sérios danos ao paciente. Quando há suspeita de cardiopatia congênita cianótica canal-dependente, deve-se iniciar a infusão contínua de pros- taglandina E1 (Prostin). Neste caso, indica-se intubar o re- cém-nascido e transportá-lo sob ventilação mecânica, devi- do aos riscos de apnéia. Além disso, é prudente evitar a ofer- ta excessiva de oxigênio, que pode induzir ao fechamento do canal arterial. Não é indicado o transporte de recém-nascidos bradicár- dicos com freqüência cardíaca inferior a 100bpm, uma vez que o risco iminente de parada cardíaca não será abreviado pelo transporte. Ao contrário, uma parada cardiorrespiratória durante o transporte é quase sempre fatal. ACESSO VENOSO E ESTABILIZAÇÃO METABÓLICA A obtenção do acesso venoso para a correção de possí- veis distúrbios metabólicos e para a infusão de glicose é fun- damental para o sucesso do transporte. Um acesso venoso periférico é freqüentemente adequado para ministrar líquidos, eletrólitos e medicamentos durante o transporte. Nesse caso, pode-se utilizar as veias do dorso da mão e as do couro ca- beludo pela facilidade de fixação, evitando as veias localiza- das em áreas de flexão, uma vez que há maior possibilidade de perda do acesso vascular nessas regiões durante a movi- mentação do paciente. É recomendável sempre a obtenção de um acesso venoso acessório, antes do início do transporte. De maneira geral, é preferível a inserção do cateter central nohospital de destino, a não ser que as condições do paciente obriguem à cateterização imediata. A infusão de glicose durante o transporte é feita, em ge- ral, na velocidade de 4-6 mg/kg/minuto. Se houver hipoglice- mia, deve-se corrigi-la antes do início do transporte, mediante a administração de 2mL/kg de glicose a 10%, seguida de infu- são de glicose na velocidade de 8 mg/kg/minuto, diminuída posteriormente de maneira gradativa. Controla-se a glicemia de modo seriado para evitar hipoglicemia ou hiperglicemia. Procede-se à estabilização das condições ácido-básicas, antes do transporte. De maneira ideal, preconiza-se que o transporte só seja iniciado quando o pH sangüíneo estiver acima de 7,25. Não se recomenda, de modo geral, a infusão de cálcio em veia periférica durante o transporte, pois o seu extravasamen- to pode levar à necrose de partes moles. No entanto, quan- do há indicação de correção da calcemia, esta deve ser reali- zada durante o transporte, tomando-se o cuidado de oferecer o eletrólito por um acesso venoso seguro. ANTIBIOTICOTERAPIA Uma vez que o diagnóstico de sepse é difícil de ser esta- belecido antes da indicação do transporte, em qualquer re- cém-nascido com risco para sepse, indica-se a coleta da he- 62 mocultura e o início imediato da antibioticoterapia de amplo espectro, no contexto da estabilização clínica do paciente para o transporte. Não esperar a chegada à UTI neonatal para o início do tratamento do processo infeccioso. Quando a suspeita clínica de meningite é muito forte, rea- liza-se a punção lombar para a coleta de líquor antes da trans- ferência do paciente. Se, no entanto, a punção liquórica es- tiver indicada como procedimento rotineiro para neonatos com diagnóstico de sepse provável, adia-se a coleta das amostras de líquor até a chegada no hospital de destino. SITUAÇÕES ESPECIAIS • Convulsão neonatal: Se o paciente recebeu dose de ata- que de medicação anticonvulsivante nas seis a 12 horas que precederam o transporte, é prudente transportá-lo intubado, em ventilação assistida. • Atresia de esôfago ou fístula traqueoesofágica: É obri- gatória a colocação de uma sonda sob aspiração contínua no coto proximal do esôfago. Além disso, o paciente deve ser transportado em decúbito elevado. • Defeitos de fechamento do tubo neural: Cobrir a lesão com gaze estéril embebida em solução salina aquecida, sob irrigação contínua. Acima da gaze, colocar filme transparen- te de PVC (Magipack) e transportar o paciente em decúbito ventral. • Defeitos de fechamento da parede abdominal: Cobrir a lesão com gaze estéril embebida em solução salina aquecida, sob irrigação contínua. Acima da gaze, colocar filme transpa- rente de PVC (Magipack) e transportar o paciente em decú- bito dorsal. • Obstrução intestinal: Locar uma sonda orogástrica sob aspiração contínua para evitar a pneumonia aspirativa. • Hérnia diafragmática: O recém-nascido deve estar intu- bado e com uma sonda gástrica bem locada durante o seu transporte, evitando-se a ventilação do paciente com másca- ra facial. Além disso, o recém-nascido deve ser posicionado em decúbito lateral, com o pulmão herniado apoiado sobre o colchão. PREPARO PARA O TRANSPORTE MATERIAL Antes de iniciar a transferência do paciente, deve-se cer- tificar que cópias da anamnese materna e dos dados referentes ao recém-nascido serão encaminhadas ao centro de referên- cia. As amostras de sangue materno devem ser acondiciona- das em tubo seco e em tubo com anticoagulante para a reali- zação dos exames necessários no hospital de destino. CONSENTIMENTO PARA O TRANSPORTE Após a estabilização do recém-nascido, é obrigatório que a equipe de transporte explique à família o estado clínico atual do paciente, as indicações e os riscos do transporte e o prog- nóstico após a chegada à UTI neonatal. Por mais que a equi- pe esteja convencida da necessidade de transferir o pacien- te, os pais são os responsáveis por aquele recém-nascido, havendo necessidade de consentimento por escrito da mãe e/ou do pai para que a transferência seja concretizada. O Con- selho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (janei- ro/1994) recomenda: • É prudente pedir a autorização por escrito do responsá- vel pelo recém-nascido, antes de sua transferência (arts. 41, 46, 48 e 59 — Código de Ética Médica). • A mãe é a legítima responsável pelo recém-nascido (mesmo no puerpério), exceto em situações de patologia psí- quica. • Em caso de risco iminente de vida, o médico está auto- rizado a transferir o recém-nascido sem a autorização do res- ponsável. • Quando ocorrer o óbito do recém-nascido durante o transporte, deve-se retornar ao hospital de origem com o pa- ciente. COMUNICAÇÃO Uma vez estabilizado o paciente e obtido o consentimen- to, antes de iniciar a viagem é recomendável a comunicação telefônica com o hospital de destino. Dessa maneira, a equi- pe da UTI pode se preparar para receber adequadamente o recém-nascido. O TRANSPORTE Só após a estabilização clínica do neonato, este é coloca- do na incubadora de transporte. Nesse momento, desliga-se a incubadora da fonte de energia do hospital, liga-se a bate- ria e conecta-se o paciente aos gases portáteis. Na ambulân- cia, se possível, utilizar a fonte de oxigênio e a rede elétrica do veículo, poupando assim as reservas de bateria e oxigê- nio do equipamento de transporte. A monitorização durante o transporte deve incluir os se- guintes parâmetros: • Monitorização da temperatura axilar a cada 10 minutos. • Verificação contínua da permeabilidade de vias aéreas. • Observação contínua do ritmo respiratório, da expansi- bilidade da caixa torácica, da presença de cianose e da satu- ração de oxigênio. • Verificação dos batimentos cardíacos, de preferência por meio de um monitor, pois o barulho da ambulância impede a ausculta adequada do precórdio. Se não for possível o uso de monitores, verificar o pulso braquial ou femoral. • Observação da permeabilidade do acesso venoso e do funcionamento da bomba de infusão. • Realização da glicemia capilar antes do início do trans- porte e, depois, a cada 20-30 minutos. Nunca deixar qualquer paciente, nem aqueles que pare- cem clinicamente estáveis, sozinho no compartimento traseiro da ambulância. A equipe de transporte deve vigiar o neona- to de maneira constante e contínua. Se houver qualquer in- tercorrência clínica durante o transporte, é preferível parar a ambulância e realizar os procedimentos necessários com cal- ma, a correr o risco de realizá-los em meio aos solavancos do veículo em movimento. 63 Quando o paciente foi estabilizado de maneira adequada, dificilmente há necessidade de velocidades excessivas. A velocidade de 60km/hora, sem a utilização de vias na con- tramão, ultrapassagens perigosas ou desrespeito aos semá- foros, é mais segura para o recém-nascido e para a equipe de transporte. As principais intercorrências durante o transporte neona- tal são: EXTUBAÇÃO ACIDENTAL A fixação cuidadosa da cânula, antes do início transpor- te, deve ser a regra para prevenir o acontecimento. Caso ocorra a extubação, é imperativa a parada imediata do veícu- lo, de tal modo que o paciente seja reintubado de forma rá- pida e adequada. OBSTRUÇÃO DE VIAS AÉREAS A torção e/ou a obstrução da cânula traqueal são causas, por vezes esquecidas, de deterioração clínica do neonato ventilado. Na maior parte dos casos, a simples retificação da cânula traqueal soluciona o problema. Em relação aos fenô- menos obstrutivos, vale lembrar a orientação de sempre as- pirar a cânula antes do início do transporte propriamente dito. Além disso, deve-se frisar novamente que, no paciente não intubado, a posição de leve extensão da cabeça é fundamen- tal para manter a via aérea do recém-nascido pérvia. PNEUMOTÓRAX É uma complicação temida durante o transporte, podendo levar à rápidapiora clínica do paciente e ao óbito. Em geral, a suspeita do pneumotórax durante o transporte baseia-se na clí- nica. Aparelhos dotados de lâmpada halógena podem ajudar na confirmação do diagnóstico, indicando a drenagem imediata. A punção diagnóstica deve ser realizada quando houver dú- vidas a respeito da existência do pneumotórax, sempre com o veículo parado. Se a punção for positiva, realiza-se a drenagem do tórax, conectando-se o dreno à válvula de Heimlich. Deve- se lembrar que, durante o transporte aéreo em cabines não pressurizadas, as coleções de ar se distendem, sendo impe- rativo o esvaziamento adequado do pneumotórax. PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA A equipe deve agir de maneira rápida e eficiente e, com o veículo parado, iniciar a reanimação neonatal com ventila- ção com pressão positiva, oxigênio a 100% e, se necessário, massagem cardíaca e infusão de drogas. Sempre procurar fa- lhas técnicas na ventilação ou na infusão de drogas vasoa- tivas quando estas estiverem em uso. Um paciente estável, antes do início do transporte, apre- senta menor risco de complicações durante o mesmo. Uma equipe de transporte bem treinada e por isso menos ansiosa e mais consciente sabe o momento correto de realizar a remo- ção do paciente, após a avaliação do seu estado clínico. CHEGADA À UTI NEONATAL Cabe à equipe de transporte transferir o recém-nascido para os cuidados da equipe de terapia intensiva, transmi- tindo-lhes detalhadamente o histórico e o tratamento ado- tado para o paciente até o momento, devendo ser feito um relatório escrito. Concluída a transmissão de responsabi- lidades, o pessoal envolvido no transporte deve repor o material gasto e preparar o equipamento para um novo transporte. É importante lembrar que o transporte de neonatos, den- tro de princípios relativamente simples como os aqui expos- tos, pode contribuir para a diminuição da mortalidade neona- tal em nosso meio. BIBLIOGRAFIA 1. Guinsburg R, Corrêa PPA. Transporte do recém-nascido em insuficiência respiratória. In: Kopelman B, Miyoshi M, Guinsburg R (eds.). Distúrbios respiratórios no período neo- natal. Rio de Janeiro/São Paulo: Atheneu 1998; p. 337-52. 2. Guinsburg R, Kopelman BI, Miyoshi M. Transporte neona- tal. J Pediat 1992; 68:153-8. 3. Jaimovich DG, Vidyiasagar G (eds.). Transport medicine. Pediatr Clin North Am 1993; 40(2). 4. Miyoshi MH, Guinsburg R, Almeida MFB, Kopelman BI. O pediatra na sala de parto. Temas de Pediatria Nestlé 1997; 65:1-52. 5. Nichols VG. Neonatal transport. In: Cloherty JP, Stark AR (eds.). 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