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Texto 12 2005 Astley e De Ven Debates e perspectivas na teoria das organizações

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RAE-CLÁSSICOS • DEBATES E PERSPECTIVAS CENTRAIS NA TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES
52 • RAE • VOL. 45 • Nº2
DEBATES E PERSPECTIVAS CENTRAIS NA TEORIA
DAS ORGANIZAÇÕES
RESUMO
Diversas escolas do pensamento organizacional são classificadas de acordo com os níveis micro e macro
de análise organizacional e com premissas deterministas em oposição a voluntaristas acerca da natureza
humana, gerando, assim, quatro perspectivas básicas: a visão organizacional sistêmico-estrutural, a visão
da escolha estratégica, a da seleção natural e a da ação coletiva. Essas quatro visões representam
qualitativamente diferentes conceitos sobre a estrutura, o comportamento, a mudança e os papéis gerenciais
nas organizações. São identificados seis debates teóricos por meio da sobreposição dessas quatro visões,
sendo assim alcançada uma reconciliação parcial, levando os pontos de vista opostos a um entendimento
dialético. Os seis debates, que tendem a ser individualmente tratados e isolados pela literatura, são então
reintegrados, num nível metafórico. O modelo apresentado tenta transcender os problemas associados a
uma fragmentação excessiva, focando a interação entre perspectivas teóricas divergentes, mas procurando
também preservar a autenticidade de pontos de vista distintos, preservando, dessa forma, as vantagens
associadas ao pluralismo teórico.
W. Graham Astley
University of Pennsylvania
Andrew H. Van de Ven
University of Minnesota
ABSTRACT The diverse schools of organizational thought are classified according to micro and macro levels of organizational analysis and
deterministic versus voluntaristic assumptions of human nature to yield four basic perspectives: system-structural, strategic choice, natural
selection, and collective-action views of organizations. These four views represent qualitatively different concepts of organizational structure,
behavior, change, and managerial roles. Six theoretical debates are then identified by systematically juxtaposing the four views against each other,
and a partial reconciliation is achieved by bringing opposing viewpoints into dialectical relief. The six debates, which tend to be addressed singly
and in isolation from each other in the literature, are then integrated at metatheoretical level. The framework presented thus attempts to overcome
the problems associated with excessive theoretical compartmentalization by focusing on the interplay between divergent theoretical perspectives,
but it also attempts to preserve the authenticity of distinctive viewpoints, thereby retaining the advantages associated with theoretical pluralism.
PALAVRAS-CHAVE Voluntarismo, ação coletiva, níveis de análise micro e macro, ambiente, teoria das organizações.
KEYWORDS Voluntarism, collective action, micro and macro levels of analysis, environment, organizational theory.
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ABR./JUN. 2005 • RAE • 53
W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
Nos últimos anos tem surgido um pluralismo teórico cres-
cente na literatura organizacional, refletindo em parte a
crescente conscientização acerca das complexidades or-
ganizacionais e em parte o refinamento dos interesses e
preocupações dos teóricos da área. De um lado, esse plu-
ralismo teórico deve ser encorajado, para que os pesqui-
sadores descubram novos aspectos da vida organizacio-
nal e aprofundem suas indagações críticas. De outro lado,
esse pluralismo encoraja uma fragmentação teórica ex-
cessiva, ficando fácil perder de vista as formas com que
as várias escolas de pensamento se relacionam. A intera-
ção entre as diferentes perspectivas permite que se ad-
quira um entendimento mais abrangente da vida organi-
zacional, uma vez que qualquer escola de pensamento,
invariavelmente, oferece uma explicação parcial da rea-
lidade. Além disso, a sobreposição das diferentes escolas
de pensamento põe em destaque as visões de mundo con-
trastantes que motivam os maiores debates que caracte-
rizam a teoria organizacional contemporânea.
Por conseguinte, este artigo examina seis debates so-
bre a natureza e a estruturação organizacionais que per-
meiam atualmente a literatura. Os debates circundam as
seguintes questões:
1. As organizações são sistemas funcionalmente racionais
e tecnicamente determinados ou são materializações
de ações individuais socialmente construídas e subje-
tivamente significativas?
2. As mudanças nas formas organizacionais são explica-
das pela adaptação interna ou pela seleção ambiental?
3. A vida organizacional é determinada por limitações
ambientais ou é criada ativamente por meio de deci-
sões gerenciais estratégicas?
4. O ambiente deve ser visto como um agregado simples
de organizações, governado por forças econômicas
externas, ou como uma coletividade de organizações
integradas e governadas por suas próprias forças polí-
ticas e sociais internas?
5. O comportamento organizacional está principalmen-
te preocupado com a ação individual ou com a ação
coletiva?
6. As organizações são instrumentos técnicos neutros,
programados para atingir metas, ou são manifestações
institucionalizadas de interesses adquiridos e estrutu-
ras de poder da sociedade?
Apesar de essas pendências terem sido debatidas em
certo grau pela literatura, nenhuma análise satisfatória
surgiu – nem se tornou provável. O problema é que as
diferentes escolas de pensamento tendem a focar ques-
tões apenas unilateralmente, além de utilizarem lógicas
e vocabulários bastante diferentes para não dialogarem
diretamente entre si. Como afirmou Poggi (1965, p. 284),
“uma forma de ver é uma forma de não ver”. Então, al-
guma integração deve ser desejável, mas que preserve,
ao mesmo tempo, a distinção entre as diferentes pers-
pectivas analíticas envolvidas. Estamos convencidos de
que essa integração é possível se reconhecermos que as
diferentes perspectivas podem apresentar quadros mui-
to diversos do mesmo fenômeno organizacional sem que
se anulem. Isso é alcançado por meio do uso de diferen-
tes lentes analíticas no exame dos lados opostos e con-
traditórios de uma mesma questão. Neste artigo, em vez
de proclamarmos certos pontos de vista como “corre-
tos”, reconciliamos as contradições entre as teorias con-
trastantes ao juntarmos uma variedade de interpretações
dialéticas acerca da vida organizacional. Essas reconcilia-
ções preservam a autenticidade das “incompatíveis” teo-
rias, mas alcançam ao mesmo tempo um meio de inte-
gração ao destacarem as fontes de tensões dialéticas en-
tre as teorias.
Essa abordagem é aplicada a cada um dos debates
acima, no contexto de um esquema metateórico amplo
o bastante para unir os diferentes debates. Tratar os seis
debates como interdependentes deixa em acordo am-
bos os pontos de contraste e tangência entre a maior
parte das principais abordagens teóricas dos estudos or-
ganizacionais. A intenção não é apenas refinar e apro-
fundar a teoria atual, mas também entender melhor as
estruturas de apoio dos pensamentos geradores de teo-
rias particulares. Procuramos uma integração não so-
mente dentro dos debates, mas entre os debates, em um
nível metateórico. A esse respeito a principal meta é
análoga ao pedido de Rank (1941) para que as compa-
rações entre as “diferentes psicologias” sejam substitu-
ídas por uma “psicologia das diferenças”. Enquanto dis-
tinguimos as diferenças no interior das teorias organi-
zacionais, esperamos contribuir com uma teoria que
explique as diferenças entre elas. Isso apoiando-nos
numa consciência explícita das premissas metateóricas
contrastantes que as apóiam. Colocando de forma dife-
rente, procuramos identificar os alicerces paradigmáti-
cos das metáforas teóricas existentes no campo (Morgan,
1980).
PERSPECTIVAS CENTRAIS
DA TEORIA ORGANIZACIONAL
A Figura 1 esboça um esquema metateórico de classifi-
cação das principais escolas de pensamento da teoria or-
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ganizacional e gerencial em quatro visões básicas. Elas
são baseadas em duas dimensões analíticas: 1) o nível de
análise organizacional, e 2) a relativa ênfase dada às pre-
missas deterministas da natureza humana contra as pre-
missas voluntaristas.
Alguns autores recentemente distinguiram as teorias
organizacionais utilizando a clássica dualidade entre o
determinismo e o livre-arbítrio – a visão de que os seres
humanos e suas instituições são determinados por for-
ças externas ou são dotados de autonomia e criados por
seres humanos (Weeks, 1973; Driggers, 1977; Burrell e
Morgan, 1979; Van de Ven e Astley, 1981). Do ponto de
vista da orientação voluntarista, indivíduos e instituições
são agentes autônomos, proativos e autodirigidos; os in-
divíduos são vistos como a unidade básica de análise e
fonte de mudança da vida organizacional. Já a orienta-
ção determinista não focaliza os indivíduos, mas sim as
propriedades estruturais do contexto em que a ação se
desenrola, e um comportamento individual é visto como
determinado por restrições estruturais que proporcionam
estabilidade e controle absoluto à vida organizacional, e
a elas reativo.
Figura 1 – Quatro visões da organização e da gestão
Nível macro
(populações e
comunidades
organizacionais)
VISÃO DA SELEÇÃO NATURAL
Escolas: Ecologia populacional, economia industrial, his-
tória econômica.
Estrutura: A competição ambiental e a capacidade de ma-
nutenção predefinem os nichos. A estrutura da indústria é
econômica e tecnicamente determinada.
Mudança: Uma evolução natural das variações, seleções e
manutenções ambientais. O contexto econômico circunscre-
ve a direção e a amplitude do crescimento organizacional.
Comportamento: Seleção ambiental aleatória, natural ou
econômica.
Papel do gestor: Inativo
VISÃO SISTÊMICO-ESTRUTURAL
Escolas: Teoria dos sistemas, funcionalismo estrutural, teo-
ria da contingência.
Estrutura: Papéis e posições ordenados hierarquicamente
para atingir a função do sistema eficientemente.
Mudança: Divisão e integração de papéis para adaptar os
subsistemas às mudanças de ambiente, tecnologia, tama-
nho e necessidades de recursos.
Comportamento: Determinado, restrito e adaptativo.
Papel do gestor: Reativo.
VISÃO DA AÇÃO COLETIVA
Escolas: Ecologia humana, economia política, pluralismo.
Estrutura: Comunidades e redes de grupos semi-autôno-
mos e partidários que interagem para criar ou modificar os
ambientes, regras e opções da coletividade.
Mudança: Barganha, conflito, negociação e compromis-
sos coletivos por meio de ajustes partidários mútuos.
Comportamento: Ordens racionais coletivamente construí-
das e politicamente negociadas.
Papel do gestor: Interativo.
VISÃO DA ESCOLHA ESTRATÉGICA
Escolas: Teoria da ação, teoria de decisão contemporâ-
nea, gestão estratégica.
Estrutura: As pessoas e seus relacionamentos são organi-
zados e socializados para servir às escolhas e propósitos
daqueles que estão no poder.
Mudança: O ambiente e a estrutura são ordenados e
incorporam os significados das ações dos que estão no
poder.
Comportamento: Construído, autônomo e ordenado.
Papel do gestor: Proativo.
Nível micro
(organizações
individuais)
Q1
Q4Q3
Q2
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Orientação determinista Orientação voluntarista
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W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
Historicamente, o intercâmbio das visões entre as abor-
dagens voluntarista e determinista da análise organiza-
cional tem sido relacionado à maior distinção entre os
níveis utilizados. Tradicionalmente, as organizações in-
dividuais têm sido o principal foco. No entanto, um nú-
mero recente de teóricos expandiu o nível de análise para
o estudo de populações organizacionais inteiras sob a
premissa de que as populações exibem características e
dinâmicas próprias e distintas, não discerníveis em or-
ganizações individuais. A principal razão para fazermos
a distinção micro–macro é focar as relações entre as par-
tes e o todo existentes em qualquer fenômeno organiza-
cional. Discussões sobre os níveis de análise apropriados
têm englobado o debate voluntarista-determinista, mas
isso não apaga a distinção analítica entre as duas dimen-
sões em que os debates se baseiam.
A classificação das escolas de pensamento nessas duas
dimensões produz quatro perspectivas básicas: as visões
sistêmico-estrutural, da escolha estratégica, da seleção
natural e da ação coletiva. Afirmamos que a maioria das
escolas de pensamento, senão todas, podem ser classifi-
cadas em termos dessas dimensões, refiram-se ou não os
autores explicitamente a elas. Como indica a Figura 1, as
quatro perspectivas representam, qualitativamente, dife-
rentes visões de estrutura, comportamento, mudança e
papéis da gestão organizacional. Elas oferecem um re-
pertório de formas de abordagem e entendimento da teo-
ria organizacional.
A visão sistêmico-estrutural
No nível organizacional individual, o funcionalismo es-
trutural e a teoria de sistemas são as escolas dominantes
do pensamento organizacional (Silverman, 1970). Essas
escolas influenciaram a teoria clássica da gestão (Gulick
e Urwick, 1937; Fayol, 1949) e a teoria da burocracia
(Merton, 1940; Blau e Scott, 1962), que, por sua vez,
precederam o desenvolvimento das teorias estruturais das
contingências (Woodward, 1965; Lawrence e Lorsch,
1967; Thompson, 1967).
Apesar da diversidade e dos consideráveis debates
entre essas escolas, elas compartilham uma orientação
determinista na qual o comportamento organizacional é
como que moldado por uma série de mecanismos im-
pessoais que atuam como restrições externas sobre os
agentes. Consideram-se os elementos estruturais de tal
forma inter-relacionados, que instrumentalmente servem
ao alcance de metas organizacionais e são, portanto, “fun-
cionais”. Os componentes básicos da estrutura são os
papéis. Os papéis predeterminam um conjunto de ex-
pectativas comportamentais, obrigações e responsabili-
dades associadas a uma determinada posição. São os pa-
péis, e não os indivíduos, que são estruturados; os seres
humanos ocupam tais papéis, e devem ser cuidadosa-
mente selecionados, treinados e controlados para aten-
derem às exigências das posições que ocupam. Metas
organizacionais compartilhadas impõem a necessidade
de conformidade e coerência. Os indivíduos são, portan-
to, absorvidos como componentes de uma coletividade
interdependente – um sistema estruturado e engrenado,
que molda e determina o comportamento deles.
De acordo com a visão sistêmico-estrutural, o papel
básico do gestor é reativo. Trata-se de um papel técnico de
ajuste fino da organização, de acordo com as exigências
de tal papel. A mudança assume a forma de “adaptação”;
ocorre como produto de alterações exógenas ao ambien-
te. O gestor deve perceber, processar e responder ao ambi-
ente instável, e se adaptar por meio do rearranjo da estru-
tura organizacional interna, para garantir-lhe a sobrevi-
vência ou a efetividade. O foco da tomada de decisão ge-
rencial, portanto, não está na escolha, mas no acúmulo de
informações corretas sobre as variações ambientais, e na
utilização de critérios técnicos para examinar as conse-
qüências das respostas a demandas alternativas.
A visão da escolha estratégica
As críticas à abordagem sistêmico-estrutural surgiram sob
a forma de um “quadro de referência da ação” defendido
por aqueles que aderiram a uma orientação mais volun-
tarista (Silverman, 1970). Este ponto de vista é utilizado
para atacar as abordagens sistêmicase estrutural-funcio-
nalistas, e para inferir a existência de mecanismos de auto-
regulação que atendam às “necessidades” e “funções” do
sistema. Trata-se do problema da reificação. Em contras-
te, de acordo com a teoria da ação, as organizações são
continuamente construídas, mantidas e alteradas pelas
definições situacionais dos agentes – os significados sub-
jetivos e as interpretações que os agentes imputam ao
seu mundo quando negociam e ordenam aquilo que na-
turalmente os cerca. Foi nesse sentido que surgiu uma
variedade de abordagens – de intercâmbio (Blau, 1964),
simbólica (Feldman e March, 1981), de interação
(Goffman, 1961), de ordem negociada (Strauss et al.,
1963), fenomenológica (Weick, 1979) e etnometodológica
(Bittner, 1965).
A teoria da ação em análise organizacional tem sido
aplicada principalmente à “escolha estratégica” em situa-
ções de tomadas de decisões (Child, 1972). De acordo
com esta visão, a escolha está disponível para a delineação
da estrutura organizacional, que pode ser modelada de
acordo com considerações políticas, mais do que com
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critérios técnicos. Os teóricos da decisão têm enfatizado
que a ambigüidade está suficientemente difundida nas
organizações para permitir com freqüência a oportuni-
dade de construção de tal resultado (March e Olsen,
1976). A escolha estratégica também se estende ao am-
biente organizacional. Assim, os teóricos da gestão es-
tratégica e da dependência de recursos argumentam que
o ambiente não deve ser visto como um conjunto de res-
trições inflexíveis; ele pode ser mudado e manipulado por
meio de negociações políticas para ajuste dos objetivos da
alta gestão (Pfeffer e Salancik, 1978; Lorange, 1980).
Como mostra a Figura 1, a visão da escolha estratégi-
ca chama a atenção para os indivíduos e suas interações,
construções sociais, autonomia e escolhas, em oposição
às restrições da incumbência de seus papéis e inter-rela-
ções funcionais no sistema. Tanto o ambiente quanto a
estrutura são ordenados para incorporar os significados
e ações dos indivíduos – particularmente daqueles que
estão no poder. Os gestores são considerados represen-
tantes de um papel proativo; suas escolhas são vistas como
autônomas e seus atos, como forças de ação enérgica que
moldam o mundo organizacional.
A visão da seleção natural
Contrastando com as abordagens sistêmico-estrutural e
da escolha estratégica, uma visão mais macro das rela-
ções entre organização e ambiente desenvolveu-se sob a
forma da seleção natural, que não enfoca as organiza-
ções individualmente, mas sim as características estru-
turais e demográficas de populações completas de orga-
nizações ou indústrias. Dentre os que adotam essa pers-
pectiva, estão os ecologistas populacionais, os economis-
tas industriais e os historiadores econômicos.
O modelo da ecologia populacional é baseado na no-
ção de que os recursos ambientais são estruturados em
forma de “nichos”, cuja existência e distribuição pela so-
ciedade são relativamente refratárias à manipulação de
organizações individuais. Em conseqüência, esta visão
enfatiza deterministicamente que há limites definidos para
o grau de disponibilidade da escolha estratégica autôno-
ma (Aldrich, 1979). Ao mesmo tempo, vê as organizações
como severamente limitadas na habilidade de adaptar suas
“formas” internas a diferentes nichos. Em resultado, as
organizações estão à mercê do ambiente, e ou bem “se
ajustam” fortuitamente a um nicho, ou dele são “excluí-
das” e se extinguem (Hannan e Freeman, 1977). Esta vi-
são também implica um nível populacional de análise, visto
que espécies inteiras de organizações estão sujeitas a so-
breviver ou perecer, quaisquer que sejam as ações toma-
das individualmente por suas organizações.
Um paralelo ao conceito de nichos da ecologia popu-
lacional pode ser encontrado na noção de estrutura da
economia industrial, definida como as dimensões eco-
nômicas e técnicas relativamente estáveis de uma indús-
tria, que provêm o contexto em que ocorre a competi-
ção. A estrutura industrial inibe o movimento entre os
mercados por meio das “barreiras de entrada”, e delimita
severamente a exeqüibilidade e conveniência de diferen-
tes alternativas estratégicas em certos contextos indus-
triais (Caves e Porter, 1977). A “conduta de mercado”,
tradicionalmente compreendida, ou a estratégia de uma
firma, simplesmente reflete o ambiente (Porter, 1981).
Além disso, historiadores econômicos, como Chandler
(1977), e economistas institucionais, como Williamson
(1975), sustentam que a estrutura industrial evolui de
determinadas maneiras. A tese geral é a de que uma eco-
nomia competitiva, conduzida por transações de merca-
do entre muitas empresas pequenas e tradicionais, tem
evoluído para uma economia regulada e dominada por
transações internas e hierárquicas de grandes negócios.
Isso tem ocorrido como resposta às forças ambientais
variáveis sobre as quais as organizações individuais exer-
cem pouco controle. Na visão desses autores, as trans-
formações estruturais do ambiente industrial moderno
são governadas por leis e imposições econômicas impes-
soais de eficiência administrativa, e não produzidas pela
estratégia de gestão. Os grandes negócios prevalecem não
por terem prosperado no acúmulo e exploração do po-
der de mercado, mas por serem instrumentos mais eficien-
tes do que o mercado para minimizar os custos das tran-
sações (Williamson, 1975), ou por coordenarem os flu-
xos de bens e serviços na economia (Chandler, 1977).
Em resumo, de acordo com a visão da seleção natural,
a evolução da sociedade corporativa e sua infra-estrutu-
ra econômica é conduzida por forças ambientais. A mu-
dança é explicada em termos da movimentação natural
de recursos pela economia, mais do que em termos de
ações gerenciais internas. Nesse sentido, o papel geren-
cial pode ser descrito como inativo (veja a Figura 1) ou,
no máximo, simbólico (Pfeffer e Salancik, 1978, p. 263).
A visão da ação coletiva
Em vez de conceber a sociedade corporativa como sujei-
ta a uma evolução ambientalmente determinada, é pos-
sível concebê-la como construída e guiada por escolhas
e propósitos coletivos. Essa observação é feita por ecolo-
gistas sociais (Emery e Trist, 1973), humano-ecologistas
(Hawley, 1950, 1968) e teóricos de planejamento social
(Vickers, 1965; Schon, 1971; Michael, 1973; Ackoff,
1974; Warren, Rose e Bergunder, 1974). Eles sustentam
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W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
que as condições sociais contemporâneas são ou deveriam
ser reguladas por ações propositais (voluntárias) e ocor-
rem num nível coletivo. Em vez de ver as organizações
lançadas em uma batalha de sobrevivência competitiva
por meio do confronto direto com o ambiente natural e
exógeno, esses autores enfatizam a sobrevivência coleti-
va alcançada pela colaboração entre organizações por
meio da construção de um ambiente social, regulado e
controlado, mediador dos efeitos do ambiente natural.
A noção-chave envolvida na idéia de sobrevivência
coletiva é a de uma rede interorganizacional. Uma rede é
um sistema conector de relações de intercâmbio, negocia-
do entre os membros de diferentes organizações, confor-
me moldam seus ambientes em conjunto (Cook, 1977).
Essa rede consiste em um sistema de ação social de orga-
nizações interdependentes em simbiose, que ao longo do
tempo assumem papéis especializados, num modelo de
expectativas normativas, que definem direitos e condu-
tas (Van de Ven, Emmett e Koenig, 1974; Benson, 1975).
Essas normas – que Commons (1950) descreveu como
“regras de funcionamento da ação coletiva” – permitem
à rede atuar como uma unidade, e tomar decisões que
alcancem os interesses individuais e coletivos das orga-nizações que a compõem.
A estrutura política externa das redes interorganiza-
cionais tem sido representada de diferentes formas: como
um sistema pluralista de interação (Schon, 1971;
Metcalfe, 1974; Trist 1979) e também como uma econo-
mia política (Benson, 1975), incorporada a estruturas de
dominação e “controle hegemônico” (Clegg, 1981;
Perrow, 1981). Mas, em ambos os casos, a mudança é
vista como ativamente produzida por negociações polí-
ticas e definições sociais, em vez de determinada por for-
ças econômicas e ambientais neutras.
A visão da ação coletiva enfoca simbioticamente as redes
interdependentes, e também organizações semi-autônomas
que interagem para construir ou modificar seus ambientes
coletivos, suas regras de trabalho e alternativas. O papel do
gestor é interativo; ele transaciona com os outros por meio
de barganhas coletivas, de negociações, comprometimen-
tos, manobras políticas e afins. Movimentos em direção a
soluções são orientados por normas, costumes e leis, que
são regras de funcionamento da ação coletiva.
DEBATES CENTRAIS NA
TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES
Cada uma das quatro perspectivas representa apenas uma
visão parcial da realidade, para que juntas possam pro-
ver um repertório de formas complementares com o in-
tuito de tornar quadrangular o conjunto dos fenômenos
organizacionais. Isso sugere o desejo de se sobreporem
as quatro perspectivas para prover um entendimento or-
ganizacional mais abrangente. Ao mesmo tempo, cada
perspectiva contradiz as demais em aspectos-chave, pois
cada uma apresenta sua própria interpretação distinta da
realidade. Isso sugere o desejo de se contraporem as qua-
tro perspectivas para levar os pontos de divergência ao
desfecho de uma solução dialética. Conseqüentemente,
direcionamos agora a análise para os seis debates gera-
dos na interação das quatro perspectivas.
Sistema versus ação: Q1 vs. Q21
Serão as organizações sistemas funcionalmente racionais
e tecnicamente restritos, ou são incorporações socialmen-
te construídas, subjetivamente significativas da ação in-
dividual? Esse debate se preocupa com a interação do
que Dawe (1970) chamou de “as duas sociologias”: uma
que vê a ação individual como derivada do sistema social,
outra que vê o sistema social como derivado da ação in-
dividual.
Na teoria organizacional, Crozier e Friedberg (1980)
tratam esse debate contrastando um “argumento sistêmico”
(visão sistêmico-estrutural) e um “argumento estratégi-
co” (visão da escolha estratégica). O argumento sistêmico
inicia a análise a partir da organização como um todo e
aloca a ação individual de acordo com seu lugar e função
dentro do sistema. O indivíduo é apenas um componente
sistêmico, uma irritação que deve ser controlada para que
uma integração funcional absoluta possa ser mantida (veja
Howton, 1969).
A argumentação estratégica, por outro lado, inicia a
partir do indivíduo e prossegue encontrando o sistema
apenas como um resultado agregado das ações individu-
ais. Critica a explicação funcional, atestando que ela busca
considerar indiretamente os comportamentos, reportan-
do suas supostas conseqüências, e não diretamente, re-
portando as ações específicas que os causam (Silverman,
1970). Para evitar a reificação da organização, a argu-
mentação estratégica trata a ação individual subjetiva-
mente significativa como a principal força do comporta-
mento organizacional. De acordo com essa visão, a orga-
nização não é mais um monólito funcionalmente coeso;
torna-se uma coalizão mutável (March, 1962; Georgiou,
1973; Keeley, 1980), um sistema frouxamente acoplado
(Weick, 1976), ou mesmo uma anarquia organizada
(Cohen, March e Olsen, 1972).
Uma reconciliação dialética, que escapa ao subjetivis-
mo unilateral da teoria da ação e ao mesmo tempo resis-
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te ao determinismo funcional, deve reconhecer que a ação
individual sempre está, de alguma forma, limitada a evitar
a desintegração total do sistema. Entretanto, o sistema
nunca está totalmente integrado a um corpo perfeitamen-
te coeso. As organizações mantêm um grau de coesão, mas
este deve sempre ser conquistado por meio de uma su-
pressão parcial do antagonismo interno. Para Crozier e
Friedberg (1980), equilibrar e gerir complexas tensões
internas é jogar um “jogo”. O jogo possui regras que de-
vem ser obedecidas para que a associação coletiva conti-
nue. Com essas regras, entretanto, muitas estratégias dife-
rentes sempre são possíveis. Ademais, as regras podem ser
quebradas, mas apenas até certo ponto. O jogador perma-
nece livre, mas, se quiser vencer, deve adotar uma estraté-
gia em razoável conformação às regras, pois o abandono
completo do jogo é incapaz de atender a seus interesses.
Um debate paralelo surgiu das discussões acerca da
racionalidade na tomada de decisão. As abordagens es-
trutural-funcionais convencionais afirmam que a toma-
da de decisão é predominantemente racional visto que
apresenta um comportamento funcional orientado para
resultados. A lógica objetiva de efetividade, baseada na
“racionalidade técnica” (Thompson, 1967, p. 14), é con-
siderada funcional. O processo de tomada de decisão é
representado como um exercício de engenharia; gover-
nado por leis inferidas de uma relação custo–beneficio,
de uma “lógica de custo e eficiência” (Roethlisberger e
Dickson, 1939), subjacente à ação gerencial.
Para os teóricos contemporâneos da decisão, que em-
pregam modelos de ação como referência, tal “racionali-
dade” é apenas uma falsa aparência exterior,
mistificadora, que obscurece os elementos irracionais
difundidos na tomada de decisão. March e Olsen (1976)
e Weick (1979) sugeriram que a tomada de decisão não
é concebida como algo racionalmente elaborado para o
alcance instrumental dos objetivos organizacionais, mas
como eventos que se desenvolvem simplesmente por uma
ou outra razão, seja por acaso, pelo hábito, seja por pre-
ferências ou conveniências pessoais. Na realidade, a ação
pode preceder o objetivo. Os objetivos podem ser recons-
truções imaginárias, que imputam ordem e racionalida-
de às ações e às decisões depois que elas já ocorreram.
Os arranjos organizacionais, portanto, não deveriam ser
mal interpretados como tendo uma demanda lógica ou
funcional. Eles se tornam indispensáveis apenas em vir-
tude de nossas reflexões conscientes, que sobrepõem a
lógica a uma ordem já estabelecida. Eis aqui a dialética:
será o sistema racionalmente planejado e construído, ou
é a ação que simplesmente surge para em seguida ser
racionalizada?
O debate sistema/ação também está presente na ten-
são entre a teoria da contingência, de um lado, e as teorias
da gestão estratégica e da dependência de recursos, de
outro. A teoria da contingência presume que as restri-
ções contextuais apresentam efeitos obrigatórios nas
operações organizacionais. Em outras palavras, o con-
texto possui uma primazia causal; a gestão responde sim-
plesmente de maneira tecnicamente adequada. Em con-
trapartida, os teóricos da gestão estratégica e da teoria da
dependência dos recursos apontam para o aumento de
liberdade que a gestão possui para criar e definir o con-
texto organizacional. Os gestores selecionam de maneira
proativa o que será importante e que contexto operacio-
nal será relevante para eles em seu ambiente. Podem ar-
car com custos por ignorarem determinados fatores con-
textuais, mas são apenas custos a serem ponderados em
relação aos custos alternativos; não são custos determi-
nantes.
Child (1972) tentou reconciliar essas visões indican-
do que, enquanto a “qualidade do ajuste” entre o con-
texto e a estrutura das organizações pode apresentar im-
plicações de desempenho restritivo aos gestores, essas
próprias limitações são definidas socialmente; elas po-
dem ser determinadas em níveisbaixos o bastante para
permitirem a busca de outros objetivos, não relaciona-
dos ao desempenho. Em outras palavras, o desempenho
econômico pode ser apenas um dos múltiplos pontos de
referência que influenciam a tomada de decisão. Enquan-
to os gestores continuam experimentando restrições, fa-
zem-no apenas no sentido de terem escolhido o que para
eles será uma limitação. Novamente, vemos que os dois
lados da argumentação são ao mesmo tempo complemen-
tares, contraditórios e convergentes.
Adaptação versus seleção: Q1 vs. Q3
Serão as mudanças nas formas organizacionais explica-
das pela adaptação interna ou pela seleção ambiental? A
primeira dessas explicações, a visão da adaptação inter-
na, tem dominado historicamente a teoria organizacional.
Valendo-se de teóricos de sistemas que analisaram as or-
ganizações sociais como “sistemas adaptativos complexos”
(Buckley, 1968), os teóricos da contingência têm enfatiza-
do que as organizações respondem às mudanças elabo-
rando ou modificando suas estruturas internas para man-
ter uma relação isomórfica com o ambiente. Por exemplo,
a heterogeneidade ambiental deve ser combinada com a
diferenciação e a integração internas para que o desempe-
nho organizacional não padeça (Lawrence e Lorsch, 1967).
Os ecologistas populacionais reagiram a essa perspec-
tiva de adaptação argumentando que ela exagera o grau
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W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
de flexibilidade que os gestores das organizações têm para
ajustar suas formas estruturais (Aldrich e Pfeffer, 1976).
Há uma “inércia estrutural” induzida por custos irrecu-
peráveis, precedentes históricos e resistências políticas a
mudanças (Hannan e Freeman, 1977). Dada essa inér-
cia, se o nicho ocupado por uma organização não puder
mais atrair recursos que sustentem uma forma particu-
lar de organização, essa forma se tornará obsoleta e será
“extinta”. Simultaneamente, os recursos são transferidos
para novas áreas, criando nichos novos demais para que
as adaptações limitadas de organizações existentes con-
sigam se ajustar adequadamente. Assim, devem ser “in-
cluídas” formas organizacionais completamente novas.
A seleção ambiental substitui, dessa forma, a adaptação
interna na condição de maior instrumento de mudança.
Tanto a perspectiva da seleção como a da adaptação
compartilham uma orientação determinista segundo a
qual a origem absoluta das mudanças é o ambiente. Mas
diferem em relação ao nível da análise (McKelvey, 1979).
Na visão da adaptação, as organizações respondem às
mudanças refinando seus próprios ajustes às contingên-
cias de seu ambiente de trabalho. A análise é estritamen-
te baseada na unidade. Mas na visão da seleção não exis-
te uma quantidade de ajuste fino adequada aos limites
locais de um nicho organizacional, pois a longo prazo o
nicho de um tipo particular de organização pode desa-
parecer completamente. Assim, o foco muda para espé-
cies ou populações de organizações que vêm e vão em
“ondas” como indústrias inteiras nascem e se extinguem
(Aldrich, 1979).
Entretanto, os ecologistas populacionais admitem que
o modelo da seleção natural funciona bem melhor para
organizações pequenas e desprovidas de poder, que ope-
ram em ambientes com recursos dispersos, do que para
organizações grandes e politicamente bem relacionadas,
que operam em ambientes com recursos concentrados
(Aldrich, 1979, p. 111-112). Isso sugere uma possível
reconciliação entre as perspectivas da seleção e da adap-
tação. O problema aqui é que as grandes organizações
raramente são excluídas (Edwards, 1979, p. 84-85).2 Por
essa razão, Lawrence (1981) afirmou que a perspectiva
da seleção natural precisa ser complementada por uma
perspectiva de adaptação pelo aprendizado. Ele argumen-
tou que, se uma organização sobrevive à seleção natural
nos primeiros estágios de crescimento, e se expande em
qualquer direção – por exemplo, pela variedade de pro-
dutos ou por área geográfica –, ela pode conseguir se
adaptar a mudanças ambientais subseqüentes, que seriam
fatais em um estágio anterior.
A explicação para isso pode ser o fato de que as pe-
quenas organizações experimentam maior risco de ex-
clusão por estarem tipicamente presas a um único ni-
cho, ao passo que grandes organizações se espalham gra-
dativamente por muitos nichos e, por isso, fortalecem
suas posições por meio da expansão e diversificação geo-
gráfica (Pennings, 1980). Dado que as forças da institu-
cionalização induzem invariavelmente à inércia estrutu-
ral (Kimberly, 1980), permanece sem explicação, no en-
tanto, como pequenas organizações conseguem se tor-
nar grandes empresas de sucesso sem ser antes excluí-
das. Isso pode ocorrer visto que a institucionalização inibe
a adaptação em pequena escala e a curto prazo, e conduz
a um acúmulo de tensões quando a organização se torna
gradativamente desajustada ao seu ambiente. Então, essa
tensão é posteriormente resolvida não pela “mudança no
sistema”, mas pela “mudança do sistema” (Parsons,
1961). Isso explica as transformações “metamórficas”
(Starbuck, 1965, 1968) que as organizações empreen-
dem quando suas operações se espalham, abrangendo
novos produtos ou posições de mercado (Chandler,
1962). Uma vez estabelecida em um ou mais nichos, a
organização consegue evitar a exclusão ao ajustar sua li-
nha de produtos ou serviços, e transferir recursos de áreas
declinantes para esferas de operações mais pródigas.
Mesmo que uma fraca atuação ainda induza à inércia es-
trutural as subunidades de um determinado nicho, a or-
ganização conseguirá manter sua vitalidade e seu vigor
no nível corporativo.
Conquanto essa explicação da adaptabilidade das gran-
des organizações complemente a visão da ecologia po-
pulacional, superando uma das maiores deficiências desta
última, pouco contribui para desafiar a adequação de
outra perspectiva que foca especialmente as grandes or-
ganizações, ainda que se mantenha consistente com a
visão da seleção natural. Trata-se do modelo de “falhas
de mercado”, oferecido por Williamson (1975). Esse
modelo é classificado como uma visão da seleção natural
no sentido em que trata da forma como o ambiente eco-
nômico “seleciona” uma espécie nova e importante de
organização,– que Chandler (1977) descreveu como “a
empresa multiunitária moderna”.
A tese geral é de que os “mercados” são suplantados
por “hierarquias” quando param de funcionar adequa-
damente devido à “concentração de informação”, uma
distribuição assimétrica da informação que interfere na
alocação ótima de recursos nas transações de mercado.
A monitoração superior da organização e sua capacidade
de controle superam esse problema: reduzem os “custos
de transação” e restauram a eficiência. O crescimento das
grandes organizações hierárquicas é, portanto, determi-
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nado economicamente no sentido de que a organização
interna restabelece a operação natural da racionalidade
econômica quando os mercados não conseguem mais
executar suas funções. Ao mesmo tempo, essa racionali-
dade econômica opera no nível populacional de análise,
pois governa a operação de todo o mercado ou indústria.
A mudança dos mercados para as hierarquias é explicada
como um triunfo dos interesses do “sistema” econômico
como um todo sobre as tendências oportunistas de seus
membros constituintes (Willamson, 1975, p. 27). A oti-
mização da eficiência em alocar recursos por toda a eco-
nomia é uma notável força em operação.
Quando o modelo de falhas de mercado plausivelmente
estende a visão da seleção natural às grandes organiza-
ções, abre-se também para a reinterpretação dialética pela
visão sistêmico-estrutural. Thompson explicou de um
modo muito diferente como os mercados são suplanta-
dos pelas hierarquias,ou seja, “organizações sob normas
de racionalidade procuram limitar-se a atividades que,
se deixadas por conta da ação ambiental, representariam
contingências cruciais” (Thompson, 1967, p. 39). De
acordo com a explicação de Thompson para tal fenôme-
no, não são os trabalhos racionais de um sistema econô-
mico que importam, mas as normas da racionalidade téc-
nica que governam as operações internas das organiza-
ções particulares. São os interesses da organização em
foco que representam demarcações, e não os interesses
do mercado econômico. As hierarquias não são
subprodutos das falhas de mercado agindo simplesmen-
te como mecanismos alternativos para alocação de re-
cursos econômicos em beneficio da sociedade; ao con-
trário, são instrumentos gerenciais para controle, redu-
ção e remoção de contingências que ameacem o funcio-
namento técnico das organizações. De acordo com essa
visão, a interiorização representa uma absorção das ame-
aças externas, e não uma falha de mercado. Incorpora-
se, assim, a lógica da adaptação organizacional, e não a
lógica da evolução ambiental. Trata-se do determinismo
tecnológico aplicado às organizações individuais, e não
do determinismo econômico aplicado às populações or-
ganizacionais em um sistema de mercado.3 Vemos aqui
novamente uma tensão dialética; a essência do assunto é
a mesma, o que se altera é o ângulo da câmera.
Nichos restritos versus domínios
ordenados: Q2 vs. Q3
Será a vida organizacional determinada por restrições am-
bientais inflexíveis ou criada ativamente por escolhas ge-
renciais estratégicas? Esse debate foi recentemente des-
tacado na discussão de Porter (1981) acerca da relação
entre a economia industrial e a gestão estratégica. Em
contraste sistemático entre os dois campos, Porter apon-
ta diferenças de orientação, que pertencem a duas di-
mensões da Figura 1. Primeiro, enquanto os economis-
tas industriais conseguem tomar a indústria como um
todo como unidade de análise, ao imaginarem que todas
as firmas da indústria reagirão de maneira idêntica aos
mesmos contextos econômicos, os teóricos da gestão es-
tratégica se interessam pelos problemas de firmas indivi-
duais, como entidades únicas, dotadas de forças e de fra-
quezas únicas. Segundo, os economistas industriais apre-
sentam, preferencialmente, uma visão determinista, por
causa de suas análises industriais estáticas e estruturais,
ao passo que o “campo da política possui uma ampla
tradição em enfatizar a perspicácia, a criatividade, e até
mesmo vislumbra que algumas firmas demonstram ter
encontrado formas únicas de mudar as regras do jogo
em suas indústrias” (Porter, 1981, p. 613).
Dadas essas contrastantes orientações, não é surpreen-
dente que Aldrich (1979) tenha confiado na literatura
da economia industrial para delimitar até que ponto a
escolha estratégica está disponível para as organizações.
Esse argumento circunda a premissa da existência de ni-
chos, ou combinações distintas de recursos e outras res-
trições no ambiente. O conceito de nicho implica enfo-
que nas populações organizacionais em vez de nas orga-
nizações individualmente, pois a distribuição dos recur-
sos econômicos e de outros tipos, que formam os nichos,
provê suporte a espécies completas de organizações. O
destino de cada organização individual está atrelado ao
fato de pertencer a um tipo particular de população, pois
as organizações não conseguem se adaptar facilmente a
nichos diferentes. As forças macroeconômicas, sociais e
políticas que apóiam o surgimento e a dissolução de ni-
chos subjugam a ação gerencial estratégica a longo pra-
zo, pois apenas algumas poucas organizações, poderosas
e politicamente bem relacionadas, conseguem reagir de
forma significativa a essas forças.
Em contrapartida, os teóricos da escolha estratégica
vêem o ambiente como um “domínio”, que os gestores
ordenam, definem e influenciam (Levine e White, 1961).
Rumelt (1979) reagiu então à posição da seleção natural
argumentando que a capacidade de adaptação a novos
nichos é refletida numa postura estratégica particular,
adotada individualmente pelos gestores das organizações.
A presença de estratégias idiossincráticas produz varia-
ções de desempenho entre as organizações que perten-
cem às mesmas espécies, mas que conseguem criar seus
próprios nichos de mercado e produtos distintos. Assim,
são as transações particulares com as quais os gestores
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das organizações se comprometem que alteram suas po-
sições no ambiente, “sem alterar o próprio ambiente”
(Rumelt, 1979). Outros teóricos têm argumentado que
mesmo a macroestrutura do ambiente se altera em res-
posta às estratégias corporativas. Caves e Porter (1977)
e Salop (1979), por exemplo, mostraram como os gesto-
res podem influenciar ou mesmo impedir a entrada de
suas firmas em indústrias escolhendo cuidadosamente
suas estratégias. Tais observações requerem que a pre-
missa tradicional da economia industrial – de que a es-
trutura da indústria é relativamente constante, além de
ser o principal determinante da estratégia – seja
contrabalançada por uma “teoria de estruturas industri-
ais dinâmicas”, que, em vez de considerar a indústria
somente como uma variável independente que determi-
na o comportamento da firma, também trate a estrutura
de mercado como uma variável dependente, que venha a
refletir as estratégias passadas das firmas na indústria,
através do tempo (Brock, 1981).
O contraste entre as visões da seleção natural e da es-
colha estratégica cristaliza-se na modificação feita por
Weick (1979) do modelo de variação, seleção e reten-
ção, utilizado pelos ecologistas populacionais (e.g
Aldrich, 1979) e reclassificado como um modelo de “or-
denação, seleção e retenção”. A substituição feita por
Weick da ordenação pela variação serve para enfatizar
que “os gestores constroem, rearranjam, selecionam e
destroem muitas ‘características’ objetivas que os cercam”,
quando definem e criam literalmente suas próprias res-
trições (Weick, 1979, p. 164). Os critérios de seleção não
são tão incorporados às condições ambientais externas
quanto fixados nos membros organizacionais. A seleção
conquista espaço quando os indivíduos impõem signifi-
cados e dão sentido a seus dados brutos ordenados. Es-
ses padrões de dados que se ajustam a seus esquemas de
interpretação e a seus repertórios cognitivos são seleci-
onados por eles, enquanto o resto é eliminado. Os critérios
de seleção são específicos para os indivíduos particula-
res nas espécies organizacionais, em vez de serem trans-
mitidos a espécies completas de organizações, como res-
trições dos nichos. Mais uma vez, o processo de retenção
não pertence às características do ambiente, mas a “ma-
pas causais”, construídos a partir das experiências pas-
sadas dos indivíduos. Esses mapas causais reforçam pro-
cessos de ordenação e seleção, provendo-os com suges-
tões, padrões de observações e processos de exame e
monitoramento, que desempenham papel ativo na cons-
trução de um ambiente “artificial” a partir do ambiente
objetivo. Conseqüentemente, Weick insiste em que am-
bientes significativos são produtos da organização, e não
insumos para ela, como afirmariam os ecologistas popu-
lacionais. O modelo da variação, seleção e retenção pa-
rece assim igualmente compatível com ambas as visões,
da seleção natural e da escolha estratégica.
O fato de não haver algo pertencente ao modelo da
variação, seleção e retenção que tenda para a orientação
determinista sugere que o sucesso dos ecologistas popu-
lacionais em atribuir a primazia causal ao ambiente se
apóia mais na adoção característica de um nível de análi-
se populacional do que em qualquer outra coisa. A ação
de organizações individuais parece contar pouco em face
das tendências demográficas de longo prazo que afetam
populações inteiras.Se for verdade, contudo, que a apli-
cação bem-sucedida do modelo de ecologia populacio-
nal à seleção ambiental se apóia nos seus níveis de análi-
se (Aldrich, 1979, p. 107), então as conclusões teóricas
da ecologia populacional que enfatizam a importância
de restrições ambientais externas são baseadas em uma
combinação analítica das duas dimensões da Figura 1.
Em outras palavras, o modelo de ecologia populacio-
nal atribui ao ambiente o que o nível de análise popula-
cional realmente alcança. Se focarmos populações de
organizações, as escolhas estratégicas das organizações
individuais devem assumir importância mínima. É as-
sim simplesmente porque a troca do nível de análise está
destinada a alcançar apenas aquele efeito. Ao procurar
entender as dinâmicas que sustentam as distribuições de
organizações agregadas pelas condições ambientais, ado-
tamos um foco macro na população, antecedendo auto-
maticamente, assim, uma visão micro das atividades de
organizações individuais. Mas concluir, a partir de enfo-
ques restritos, que o ambiente possui uma primazia, e
que é “o ambiente que seleciona” (Hannan e Freeman,
1977), menospreza incorretamente o papel do
voluntarismo na vida organizacional. Apesar de ainda ser
verdade que as ações de pequenas organizações indivi-
duais pouco importam para as tendências de longo pra-
zo identificadas com o nível populacional, não se deve
sucumbir à sedução de representar esse fato em termos
de forças naturais vagas e de restrições externas localiza-
das num ambiente anônimo. Isso é confirmado pelo fato
de que é possível usar um nível de análise populacional
ligado a uma orientação voluntarista, como ilustra, a se-
guir, o contraste entre as visões da seleção natural e da
ação coletiva.
Agregados econômicos versus
coletividades políticas: Q3 vs. Q4
Deve o ambiente ser visto como um simples agregado de
organizações governadas por forças econômicas exter-
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RAE-CLÁSSICOS • DEBATES E PERSPECTIVAS CENTRAIS NA TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES
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nas, ou como uma coletividade de organizações integra-
da e governada por suas próprias forças sociais e políti-
cas internas? No nível da análise populacional, a dialéti-
ca do voluntarismo-determinismo entre as teorias ecoló-
gicas enfoca duas questões: 1) a definição de “popula-
ção” propriamente dita; e, 2) se as populações organiza-
cionais são conduzidas por dinâmicas econômicas ou
dinâmicas sociais e políticas. Essas duas questões inter-
relacionadas serão separadas por conta de uma clarifica-
ção analítica.
Na visão da ecologia populacional, uma população é
definida como um “agregado” de organizações “relativa-
mente homogêneas” (Hannan e Freeman, 1977). Todas
as organizações da população compartilham certos “ele-
mentos-chave” que constituem sua “forma comum” e,
conseqüentemente, uma vulnerabilidade recíproca ao
ambiente. Essa vulnerabilidade comum explica a ocor-
rência e a distribuição de diferentes espécies organiza-
cionais em diferentes condições ambientais.
Em contrapartida, os humano-ecologistas (Hawley,
1950, 1968; Duncan, 1964; Boulding, 1978) não defi-
nem uma população em termos de sua suscetibilidade
comum ao ambiente, mas em termos da padronização
interna das relações entre os membros que a constitu-
em. Para os humano-ecologistas, a população não é uma
aglomeração incoerente, mas sim uma organização coe-
rente – um “sistema integrado, com algum grau de ca-
ráter unitário” (Hawley, 1968). A “organização” inter-
na é o grande atributo que transforma o grupo de orga-
nizações em uma coletividade, com suas características
próprias e distintivas.
A concepção de comportamento coletivo dos huma-
no-ecologistas se estende além da noção de Hannan e
Freeman de populações de espécies únicas. Essas popu-
lações consistem em um conjunto homogêneo de orga-
nizações que compartilham uma relação competitiva e
“intra-específica”, conhecida como “comensalismo”. Para
os humano-ecologistas, uma população surge somente
quando a qualidade de unidade corporativa ou de coe-
são interna pode ser a ela atribuída. Tal coesão deriva de
uma interdependência funcional, que se desenvolve à base
de diferenças complementares entre unidades heterogê-
neas, especialmente as que compartilham uma “relação
interespecífica”, conhecida como simbiose.
Na visão da ecologia humana, a adaptação obtém es-
paço por um mecanismo de formação de redes fechadas.
A simbiose resulta do fato de que algumas organizações
se tornam funcionalmente especializadas na obtenção de
recursos diretamente do ambiente, enquanto outras ga-
rantem seus recursos ao organizar a demarcação de limi-
tes. Dessa forma, o funcionamento interno da população
é protegido dos efeitos ambientais, representando um
esforço criativo e coletivo da população para gerenciar e
controlar sua existência, parcialmente livre da necessi-
dade de reagir às intrusões do ambiente. “A união
simbiótica aumenta a eficiência da produção, ou do es-
forço criativo; a união comensal, já que suas partes são
homogêneas, pode apenas reagir, e o faz, portanto, so-
mente em ações protetoras e conservadoras” (Hawley,
1968, p. 332).
Por seu enfoque nas populações de organizações ho-
mogêneas, relacionadas de forma comensalística – ou seja,
indiretamente relacionadas devido à dependência comum
do ambiente –, a visão da seleção natural chama a aten-
ção para a condição de sistema aberto, em que cada mem-
bro da população interage diretamente com o ambiente
e, por isso, é por ele diretamente influenciado. A influên-
cia ambiental é destacada ao se definir a população em
termos de sua vulnerabilidade ambiental compartilhada.
Por definição, quanto maior essa vulnerabilidade, maior
o efeito populacional.
Por seu enfoque na interdependência simbiótica e do
movimento em direção às redes fechadas, removendo a
maior parte da população do contato direto com o am-
biente, a visão da ecologia humana diminui automati-
camente os efeitos do ambiente, enquanto destaca as
construções sociais da ação coletiva. Por definição,
quanto maior for o isolamento da influência do ambien-
te com o fechamento do sistema, maior será o efeito
populacional.
Em resumo, a ecologia populacional foca sua atenção
no ambiente “natural”, constituído por forças fora de al-
cance do controle organizacional. As organizações po-
dem disputar entre si recursos ambientais, em uma con-
corrência competitiva pela sobrevivência, mas enfim seus
destinos são determinados pelo ambiente. Em contra-
partida, a ecologia humana foca a atenção na construção
de um ambiente “social” protetor, que substitui o ambien-
te natural como influência crítica. Com efeito, os grupos
conspiram em simbiose para assegurar a existência con-
tínua das redes interorganizacionais como um todo.
Esse enfoque contrastante entre os ambientes “natu-
ral” versus “social” tem também implicações para a ava-
liação de cada visão constituinte da dinâmica essencial
em que se baseia a atividade organizacional. Assim, para
os ecologistas populacionais, “as pressões ambientais fa-
zem da competição por recursos a força fundamental das
atividades organizacionais” (Aldrich, 1979, p. 27-28), e
o modelo de ecologia populacional deve funcionar me-
lhor em ambientes dotados de “recursos dispersos”
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ABR./JUN. 2005 • RAE • 63
W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
(Aldrich, 1979, p. 111), ou seja, em ambientes que se
aproximam dos mercados de perfeita concorrência.4 Toda
a noção de que os relacionamentos entre as organizações
são indiretamente mediados por processos naturais am-
bientais implica que algo semelhante à “mão invisível”
de Adam Smith (1937) esteja operando. A dinâmica é
essencialmente a mesma da competição econômica.
Por outro lado, a ênfase dos humano-ecologistas em
ambientes socialmente construídos e regulados tende a
destacarmais a importância das forças sociais e políticas
mais do que das econômicas. O poder passa a desempe-
nhar um papel explícito quando as unidades diretamen-
te responsáveis pela obtenção de recursos do ambiente
“natural” conseguem regular as condições essenciais para
o funcionamento de outras unidades da rede, que possuem
relações apenas indiretas com esse ambiente. Ainda que
algum grau de poder seja retido por todas as unidades,
esse poder varia inversamente com o número de estágios
em que cada unidade é removida do contato direto com
o ambiente, resultando que as relações de poder entre as
organizações se desenvolvem de forma ainda mais ela-
borada quando as redes interorganizacionais alcançam
um maior grau de fechamento (Hawley, 1968). Quando
isso ocorre, a negociação política desempenha um papel
gradativamente mais importante na regulação de fluxos
de recursos econômicos em toda a rede. Apesar de esses
fluxos de recursos ainda poderem se caracterizar como
trocas econômicas, na medida em que os membros po-
derosos da rede consigam definir seus próprios termos
de troca e os imponham aos demais, exige-se uma análi-
se político-econômica. Benson (1975) afirmou que o pro-
cesso de aquisição de recursos em redes interorganiza-
cionais está inevitavelmente ligado à distribuição de po-
der, e deve ser adequadamente analisado como uma “eco-
nomia política”.
Outro aspecto desse mesmo debate surge entre os
economistas industriais e os economistas políticos, e rela-
ciona-se à crescente dominação dos grandes negócios no
cerne das redes interorganizacionais. A construção de um
ambiente social artificial em uma comunidade de orga-
nizações é uma forma de garantir imunidade às realida-
des da competição no ambiental natural. Uma forma
igualmente importante é controlar o ambiente natural
absorvendo-o nos limites corporativos de empresas in-
dividuais. Galbraith (1967) e Edwards (1979) têm indi-
cado essa eliminação do intercâmbio do mercado como
o principal método de promover o controle econômico
por parte de uma elite de grandes corporações. Edwards
(1979, p. 83) fornece evidências disso, notando que as
fusões de empresas que controlam menos de 50% de seus
mercados falham com freqüência quase três vezes mais
do que as de firmas com maior controle do mercado,
enquanto estas últimas recebem aproximadamente lucros
30% maiores que as primeiras.
Enquanto esses autores destacam mais a importância
política desse fenômeno do que a econômica, outros o
têm incorporado ao modelo de seleção natural. Como
notamos anteriormente, Williamson (1975) argumentou
que os grandes negócios crescem quando os mercados
falham na alocação eficiente de recursos, tanto que é
necessário um monitoramento hierárquico das transa-
ções para restaurar a racionalidade econômica pela re-
dução de custos. Similarmente, Chandler (1977) argu-
mentou que a eficiência administrativa auxilia o cresci-
mento de grandes negócios porque estes têm planejamen-
to e coordenação de produtos padronizados, em indús-
trias de grande escala. Em outras palavras, as forças eco-
nômicas – especialmente as vantagens econômicas da
integração vertical – levaram ao surgimento de grandes
empresas, pois as firmas que não se ajustaram às condi-
ções das mudanças mercadológicas e tecnológicas por
meio da interiorização do ambiente não conseguiram
competir e foram excluídas.
Perrow (1981) criticou essa explicação de eficiência
neutra por não considerar a possibilidade de que a inte-
gração vertical ganha espaço com o propósito um tanto
abominável de cortar os suprimentos dos competidores
ou de dominar os meios de distribuição, em vez de sim-
plesmente reduzir os custos econômicos. Ainda que ele
tenha concordado que os fatores econômicos fornecem as
condições necessárias para a integração vertical ganhar
espaço – já que nem todas as indústrias realizam ou po-
dem realizar a integração vertical –, é o controle do poder
e do mercado e não a eficiência econômica que dá a moti-
vação essencial para tal crescimento. Assim, surge nova-
mente a dialética: a concentração industrial é um poder
hegemônico; o sucesso econômico é uma dominação po-
lítica; a organização corporativa é um controle social.
Ação individual versus ação coletiva: Q2 vs. Q4
Estará o comportamento organizacional preocupado prin-
cipalmente com a ação individual ou com a coletiva? Essa
questão enfoca a tensão básica entre os modelos de refe-
rência individuais e coletivos, quando são apresentados
em níveis micro e macro de análise organizacional. Es-
sencialmente, as teorias organizacionais e de gestão as-
sumiram uma orientação de interesse individual, aderin-
do ao modelo racional de comportamento administrati-
vo. Em contrapartida, o problema do interesse coletivo
permanece em grande medida ignorado.
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RAE-CLÁSSICOS • DEBATES E PERSPECTIVAS CENTRAIS NA TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES
64 • RAE • VOL. 45 • Nº2
O axioma básico do comportamento racional é “ma-
ximizar” ou, ao menos, “satisfazer” interesses individuais
(Simon, 1976). Aceita-se uma ordem de preferência con-
sistente, em que os indivíduos ou as organizações têm
uma função objetiva e claramente específica, com a qual
conseguem selecionar a melhor de uma série de alterna-
tivas. “Se aceitarmos que as organizações possuem me-
tas e que tais metas têm algumas propriedades clássicas
de estabilidade, precisão e consistência, podemos tratar
a organização como um tipo de ator racional” (March,
1981, p. 215). De fato, toda a teoria do comportamento
racional nas organizações se apóia na premissa de que
seus participantes compartilham objetivos comuns, sem
a qual o “trabalho cooperativo em equipe” não seria pos-
sível (Simon, 1976).
Mas os stakeholders organizacionais com freqüência
possuem objetivos conflitantes, particularmente em si-
tuações de escassez. Então, o modelo racional não se
transforma em uma teoria competitiva dos jogos, com
matrizes de retornos probabilísticas para cada participan-
te, nem são realizadas tentativas de alterar as preferências
de partes discordantes em um consenso de que o “traba-
lho em equipe” prevaleça novamente. As teorias clássi-
cas da firma lidam com esse problema em dois estágios.
Primeiro, as demandas conflitantes são convertidas em
preços, tendo cada indivíduo negociado os termos ne-
cessários para concordar em procurar as preferências do
outro. Segundo, os gestores e empreendedores impõem
seus objetivos à organização em troca de salários nego-
ciados e pagos aos empregados (March, 1981). Além
dessas negociações salariais, as organizações utilizam
elaborados sistemas de motivação, promoção, recom-
pensas e controles, para manter a ordem e o consenso
entre os participantes organizacionais. Assim, o con-
trato de trabalho é reforçado por um sistema de incen-
tivos que fornece aos administradores meios de assegu-
rar o consenso dos empregados em prol dos objetivos
organizacionais.
É nesta linha que Olson (1965) argumentou que, por
ser sempre possível aproveitar-se do esforço alheio (free
rider problem), não há justificativa racional para que in-
divíduos contribuam para os “bens coletivos”. Em pe-
quenos grupos, ou oligarquias, os indivíduos podem
querer contribuir voluntariamente para obter bens cole-
tivos por uma norma comum de reciprocidade, confian-
ça interpessoal, amizade, pressão social, ou uma preocu-
pação altruísta com o bem-estar do grupo como um todo.
Entretanto, para grandes grupos esses incentivos dimi-
nuem, e o problema de geração da ação coletiva cresce
de modo agudo. Para Olson (1965, p. 51), “apenas um
incentivo individual e ‘seletivo’ estimulará um individuo
racional em um grupo latente a agir de forma orientada
pelo grupo”.
Reagindo a esse ímpeto individualista dos economis-
tas clássicos, para quem “o indivíduo humano age de certa
forma como um átomo” (Commons, 1950, p. 36),
Commons (1950, p. 14) argumentouque “os indivíduos
não são entidades independentes nem auto-suficientes;
e a sociedade não é a soma dos membros individuais”. A
liberdade individual não é um direito inato; é uma con-
quista coletiva. A única forma de a liberdade individual
ser obtida é pela aderência coletiva às “regras” que defi-
nem e protegem os “direitos” individuais de todos. Os
direitos e regras não são determinados individualmente;
vêm de normas, costumes e leis impostos por uma sobe-
rania. Commons se referiu a essas normas, costumes e
leis como “regras de funcionamento da ação coletiva”,
uma noção baseada no conceito legal do “homem razoá-
vel”. O homem razoável segue uma lógica bem diferente
daquela do homem racional (Van de Ven e Freeman,
1983). No direito, o homem razoável deve atender a um
padrão de conduta uniforme e coletivo. Este é determi-
nado por uma avaliação comunitária e deve ser o mesmo
para todas as pessoas, “pois a lei não deve apresentar
favorecimentos” (Prosser, 1971, p. 150).
Porém, o comportamento razoável não nega o com-
portamento racional e proporciona um modelo institu-
cional em que ele consegue atuar. Os indivíduos buscam
claramente seus próprios objetivos, tentando maximizar
seus interesses da melhor maneira possível em determi-
nadas condições. Conseqüentemente, o conflito e a rup-
tura são tão presentes e importantes quanto o consenso
e a ordem, fato reconhecido pela perspectiva pluralista
de Lindblom (1965), Wilson (1973), e Dahl e Lindblom
(1976). Esses autores analisam a ação coletiva como um
processo incremental, que surge de ajustes mútuos entre
grupos de múltiplos interesses partidários. Ainda que os
atores partidários persigam seus próprios interesses, fa-
zem-no, no entanto, dentro de limites, necessitando ne-
gociar com os demais para estabelecer compromissos
coletivamente aceitáveis. Essa é a função desempenhada
pelas regras da ação coletiva: incorporam uma ordem
institucional, que define o limite em que os indivíduos
conseguem realizar sua própria vontade.
Esse debate da ação individual versus a coletiva fica
evidente na literatura sobre os relacionamentos entre as
organizações e o ambiente. Prevalece novamente a pers-
pectiva do indivíduo como ator racional, fato refletido
pela tendência de autores a adotar o ponto de vista da
organização em foco. Por exemplo, a teoria da depen-
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ABR./JUN. 2005 • RAE • 65
W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
dência de recursos (Pfeffer e Salancick, 1978) atesta que
os gestores perspicazes procuram aumentar seu poder
em relação às fontes limitadas de dependência do ambien-
te, alcançando, de um lado, barganhas favoráveis junto
aos parceiros de troca, e de outro, evitando desacordos
custosos. Os recursos necessários precisam ser adquiri-
dos, mas apenas de forma defensiva, evitando a reden-
ção da organização a uma autonomia excessiva, ou a uma
grande dependência de grupos externos (Thompson e
McEwan, 1958). A interação resultante é vista como um
tipo de jogo: os gestores reagem estrategicamente às
manobras dos outros. Mesmo os casos de colaboração
aparente são analisados do ponto de vista da teoria dos
jogos. Assim, parcerias, coalizões e acordos informais são
vistos como jogos de causas mistas. Trata-se de alianças
com propósitos convenientes, porém temporárias, feitas
somente para atenderem ao próprio interesse de cada
parceiro da coalizão, e enquanto puderem fazê-lo.
Por outro lado, uma orientação genuinamente coleti-
va também aparece na literatura organizacional-ambien-
tal. Benson (1975) e Pefeffer e Salancick (1978, p. 147)
têm esboçado algumas normas – ou regras de funciona-
mento da ação coletiva –, que operam nas redes interor-
ganizacionais. Tais normas estabilizam o funcionamen-
to coletivo de sistemas de organizações interdependen-
tes e, ainda assim, não suplantam completamente a au-
tonomia, a busca de interesses localizados ou o surgi-
mento de conflitos entre organizações. Em vez disso, fa-
cilitam ajustes mútuos entre os múltiplos interesses par-
tidários, em um sistema pluralista que não é nem indivi-
dualista e anárquico, nem totalitário. Como indicaram
Metcalfe (1974) e Van de Ven (1980), a participação
pluralista pode reconciliar tanto os interesses seccionais
quanto o bem-estar coletivo nas relações interorganiza-
cionais.
Mas um problema permanece: se as organizações re-
presentam interesses secionais, por que aderem volunta-
riamente às regras coletivas de funcionamento – particu-
larmente às que não são legalmente impostas –, em vez
de tentar explorar inexoravelmente as dependências das
outras? A resposta está na compreensão de que, ao
interagir, os representantes das organizações comparti-
lham valores que transformam os interesses secionais em
orientações coletivas. Quando os padrões de atuação
convenientes são descobertos por tentativa e erro, ten-
dem a se repetir. Posteriormente, os gestores que intera-
gem continuamente passam a compartilhar a idéia de que
“essa é a forma como as coisas devem ser feitas”. Com
tal desdobramento, as normas se dissociam das situações
específicas em que surgiram no início, e passam a ser
generalizadas, cobrindo boa parte da atividade coletiva.
Assim, assumem o papel de forças sociais autônomas,
conduzindo e regulando a ação coletiva. Essa é a função
desempenhada pelas “estruturas de pensamento institu-
cionalizadas” de Warren, Rose e Bergunder (1974), e pela
racionalidade de classe de Useem (1982), nas redes inte-
rorganizacionais.
Assim se interiorizam os padrões normativos de inte-
ração interorganizacional, constituindo o que Durkheim
(1933) chamou de “base moral dos contratos sociais”.
Isto é, as normas adquirem um senso de moralidade em
vez de uma inclinação pragmática, de modo que os res-
ponsáveis por decisões organizacionais são impelidos a
aceitá-las e executá-las. No entanto, a obrigação moral
não deve ser interpretada como uma limitação externa,
pois para Commons e Durkheim é uma força libertadora.
Ao criar padrões estáveis de associações coletivas, livra
as organizações da necessidade de criar novos padrões
de atuação para cada situação enfrentada. A complacên-
cia com as normas é mais voluntária do que coercitiva.
Isso representa a adoção de uma orientação coletiva, com
a qual os gestores e as organizações se identificam.
Em resumo, os grupos organizacionais são atores in-
dependentes e também membros envolvidos em uma
coletividade maior. De um lado, agem de maneira autô-
noma para maximizar as chances de conseguir seus ob-
jetivos individuais, alheios aos da coletividade. De outro
lado, aderem aos padrões unificantes de ordens sociais e
culturais, ao assumirem responsabilidades parciais em
uma entidade social maior. Em outras palavras, o gestor
atua como jogador e político. A necessidade de estabele-
cer um equilíbrio entre essas pressões opostas forma a
base do que Thompson (1967, p. 48) descreveu como “o
paradoxo da Administração”. A existência desse parado-
xo produz não apenas contradições na prática da vida
cotidiana das organizações, mas também, como vimos,
uma tensão dialética na teorização.
Organizações versus instituições: Q1 vs. Q4
Serão as organizações instrumentos técnicos, neutros,
construídos para atingir metas, ou manifestações insti-
tucionalizadas dos interesses e da estrutura de poder da
sociedade? O ponto de partida desse debate é a distinção
feita por Selznick (1957) entre “organizações” e “insti-
tuições”. De acordo com Selznick, as “organizações” são
delineadas de acordo com uma “lógica de eficiência”; são
“instrumentos técnicos” da mobilização de atividades em
prol de um conjunto de objetivos. Podem ser considera-
das “ferramentas a ser usadas ou instrumentos racionais,
construídos para a execução de uma tarefa”. Diferente-
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RAE-CLÁSSICOS • DEBATES E PERSPECTIVAS CENTRAIS NA TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES
66 • RAE• VOL. 45 • Nº2
mente, as “instituições” incorporam valores e não ape-
nas os requisitos técnicos para a execução da tarefa em
questão. São “organismos que respondem e são
adaptativos”, produtos das “necessidades e pressões so-
ciais”, que as moldam e formulam. Como tal, incorpo-
ram respostas e interesses próprios dos seus ambientes.
Como indicam Meyer e Rowan (1977), as instituições
são menos significativas por seus atributos técnicos do
que pelo papel que desempenham na sociedade; simples-
mente refletem as estruturas institucionais em que estão
inseridas.
Há pouca dúvida de que a imagem da organização
como ferramenta tem dominado a história da teoria or-
ganizacional, como demonstra o “Modelo Racional” pre-
valecente de Gouldner (1959). Mas há uma reação con-
temporânea a essa escola de pensamento, desde que Child
(1972) atacou a explicação da teoria da contingência acer-
ca do comportamento organizacional por sua referência
a imperativos funcionais, em vez da ação política. Essa
crítica ganhou particularmente força com o trabalho dos
teóricos radicais, dos marxistas e dos teóricos da econo-
mia política (Marglin, 1974; Stone, 1974; Clegg; 1975,
1979, 1981; Benson, 1977a, Goldman e Houten, 1977;
Salaman, 1978; Burawoy, 1979; Edwards, 1979; Clegg e
Dunkerly, 1980; Clawson, 1980). Esses autores rejeita-
ram a idéia de que a estrutura organizacional seja
delineada com base numa lógica neutra de eficácia téc-
nica. Em vez de ver as restrições estruturais como neces-
sidades funcionais, cuja existência se justifica pela refe-
rência aos ideais de “eficiência” e “racionalidade”, cha-
maram a atenção para as funções e vantagens secionais
de elementos organizacionais aparentemente neutros, e
expuseram a eficiência e a racionalidade como ideologias
que estimulam, encobrem e justificam a natureza não
igualitária das estruturas organizacionais. Em vez da efi-
ciência técnica, a dominação política é considerada a base
da delineação da estrutura organizacional.
O argumento convencional de que os métodos de pro-
dução capitalista são mais produtivos que suas formas
anteriores do trabalho organizacional – por serem mais
eficientes – é normalmente contraposto pela questão “efi-
ciente para quem?” (Perrow, 1980). A crítica aqui é de
que a eficiência é definida de forma a atender aos inte-
resses da gestão. Uma definição neutra mediria a eficiên-
cia de um processo de transformação pela razão entre
seus resultados e insumos: quanto maior a razão, mais
eficiente o processo de transformação. Entretanto, con-
sidera-se que, se o capitalismo é mais produtivo que os
modos de produção anteriores, não é porque seu proces-
so de transformação seja tecnicamente superior, mas
porque seu sistema de controle capacitou os gestores, na
aquisição de força de trabalho, a extrair dos trabalhado-
res um valor de produção maior do que precisavam em-
pregar. Em outras palavras, maior produtividade resulta
de maiores insumos de trabalho em vez de um trabalho
de transformação mais eficiente. Certamente, isso faz com
que a produção capitalista pareça mais eficiente para a
gestão, mas é eficiente apenas de seu próprio ponto de
vista (Clawson, 1980). Para os trabalhadores, representa
apenas exploração e dominação.
De acordo com essa visão, a forma de organização ca-
pitalista não é conduzida por leis imutáveis de eficiência
técnica, mas por interesses socialmente moldados das
elites gerenciais. Ademais, tal dominação é considerada
enraizada em fatores que emanam de circunstâncias par-
ticulares de fora da fábrica, na medida em que ocorre em
um contexto social mais amplo. Por exemplo, Edwards
(1979) explicou a exploração capitalista referindo am-
plamente os desdobramentos da força de trabalho: a trans-
formação da força de trabalho em proletariado, o deslo-
camento da agricultura para a indústria, o declínio da
importância das habilidades dos trabalhadores, e a seg-
mentação dos mercados de trabalho. Foi assim que Burrell
(1981) descreveu as condições organizacionais contem-
porâneas, como “epifenômenos” de forças que permeiam
a sociedade. A dominação política nos locais de trabalho
é o reflexo das dinâmicas mais abrangentes do capitalis-
mo. Eventos aparentemente distantes dos locais de tra-
balho propriamente ditos impõem importantes limita-
ções às relações nesses locais. Sob essa luz, o confronto
entre trabalhadores e gerentes nas organizações deve ser
visto como simplesmente um microcosmo da arena mais
abrangente do conflito de classes.
Assim, o foco se desloca da “problemática da estrutu-
ração racional” (Benson, 1979), inerente à visão
sistêmico-estrutural, para os relacionamentos entre re-
des que se definem social e politicamente numa visão da
ação coletiva. A unidade característica de análise passa a
ser a estrutura do ambiente social propriamente dito (M.
Meyer, 1978). A estrutura e o funcionamento organiza-
cional devem ser vistos em termos de prioridades da so-
ciedade hospedeira em vez das conseqüências das for-
mas processuais ou tecnológicas particulares dos proces-
sos de trabalho (Salaman, 1978). A organização vem a
refletir sua própria história (Stinchcombe, 1965; Meyer
e Brown, 1977) por uma assimilação de valores e deman-
das impulsionados por uma série de interesses conferi-
dos pela sociedade (J. Meyer, 1978; Perrow, 1979). O ar-
gumento da dominação política requer, portanto, que
desloquemos o foco analítico do determinismo das con-
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ABR./JUN. 2005 • RAE • 67
W. GRAHAM ASTLEY • ANDREW H. VAN DE VEN
siderações acerca da eficiência, interno às organizações,
para as amplas dinâmicas sociais, que se desenvolvem
no nível coletivo de análise.
DISCUSSÃO
Ao comparar e contrastar quatro visões básicas da teoria
organizacional (veja a Figura 1), abordamos seis debates
presentes na literatura organizacional.5 Eles fornecem es-
clarecimentos importantes para a compreensão de certas
tensões dialéticas da vida organizacional. Por meio dos
debates, as tensões enfocaram as formas estruturais em
oposição à ação pessoal (debates 1 e 4), e as relações
entre a parte e o todo (debates 2 e 5), bem como a intera-
ção entre estas duas fontes de tensão organizacional (de-
bates 3 e 6). Em conclusão, especulamos a importância
dessas duas abrangentes tensões dialéticas para direcio-
nar futuras pesquisas em teoria organizacional. Os “prin-
cípios da análise dialética” de Benson (1977b) são parti-
cularmente relevantes para essa discussão.
O primeiro princípio de Benson (1977b) é a “produ-
ção/construção social”. Resumidamente, o autor defen-
deu que “uma organização, como parte de um mundo
social, está sempre na situação de tornar-se algo”. Con-
seqüentemente, deve-se focar a atenção nos mecanismos
pelos quais uma forma organizacional estabelecida é con-
tinuamente construída, mantida, reproduzida e
reconstruída. Essa é a tarefa com que se comprometem
as teorias situadas do lado direito da Figura 1. Mas Benson
(1977b) também indica que os processos explicativos do
surgimento e da dissolução das organizações ocorrem em
uma estrutura social que restringe as ações organizacio-
nais. A análise dessas forças restritivas distingue as teo-
rias situadas do lado esquerdo da Figura 1. Esses dois
conjuntos oponentes de forças são discutidos abaixo,
como uma interação entre “formas estruturais” e “ação
pessoal”.
O segundo princípio da análise dialética é referido por
Benson (1977b) como o princípio da “totalidade”. Tal
princípio “expressa um comprometimento com o estu-
do de arranjos sociais na condição de complexas totali-
dades inter-relacionadas a partes parcialmente autôno-
mas”. Por outro lado, as organizações são vistas como
intrincadamente atadas ao contexto social em que se in-
serem: são consideradas partes constituintes de padrões
e forças maiores que se desenvolvem na sociedade. Mas
as organizações também são capazes de realizar

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