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C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 10 www.ulbra.br/ead CONHECIMENTO E MÉTODO Conhecimento e informação são coisas bem distintas Em sala de aula quando pergunto aos alunos: O que é o conhecimento? Normalmente, se instaura o silêncio. De- pois, só vejo caretas e olhares inquietos. Certamente, na mente da maioria deles surge uma dúvida, ao mesmo tempo que exclamam: que pergunta estranha! Isso porque conforme vou instigando para que manifestem suas idéias, eles vão se expressan- do, dizendo que conhecimento: “é saber”; “é aprender”; “é estu- dar”; “são informações recebi- das”; “é aquilo que aprendemos”. Neste capítulo, desejamos ampliar a compreensão sobre o significado do conhecimento e como ele é produzido e, a partir dessa abordagem, introduzir o mé- todo científico. O Pensador: Escultura de Augusto Rodin. Essa es- cultura nos remete a uma posição de reflexão, alguém que está concentrado em um problema a ser desven- dado. Provavelmente está questionando sobre o que é o conhecimento? O que é conhecimento? Na verdade, num primeiro momento a pergunta “o que é conhecimento?” pa-rece muito estranha, isso porque na nos- sa vida o conhecimento está presente de modo muito natural, desde muito cedo somos insisten- temente alertados por nossos pais, parentes, pro- fessores... sobre a importância e a necessidade de conhecermos, isto ou aquilo. Convivemos com recomendações do tipo: “você precisa conhecer isso”. “é necessário ter consciência de...”. Desse modo, ao longo de nossa vida vamos recebendo informações e adquirindo compreensões sobre as coisas do mundo, sobre as relações huma- nas, sobre as questões sociais e culturais. Quer dizer, estamos permanentemente conhecendo, mas dificilmente questionamos sobre isso. O que significa conhecer? Qual a origem dos conheci- mentos? Como eles foram produzidos? Quem, Fi gu ra : 1 : S to ck .x ch ng ® Por Prof. Ms. Cosme Luiz Chinazzo 10 C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 11 www.ulbra.br/ead por que e quando foram produzidos? O que co- nhecemos é verdadeiro ou falso? Podemos dizer que a grande maioria dessas compreensões são informações, não conhecimento propriamen- te dito. Conhecimento e informação são coisas bem distintas. Acontece que dificilmente proble- matizamos sobre o conhecimento. Mas na ver- dade, desde a Antigüidade muitos pensadores se pre- ocuparam com o problema do conhecimento humano, impondo-se questionamen- tos em torno das seguintes perguntas*: a. O que é o conhecimento? b. É possível o conhecimento? Pode o su- jeito conhecer o objeto? c. O que é a verdade? Qual o critério para dizer que o conhecimento é verdadeiro ou não? d. Qual é o fundamento do conhecimen- to? Ou seja, de onde se originam os conteúdos do sujeito conhecedor? Da consciência ou da experiência? Para muitas pessoas de nossos tempos, essas e outras perguntas semelhantes, parecem estra- nhas, mas são elaboradas e reelaboradas há mais de vinte séculos. Etimologicamente, da língua francesa te- mos connaissance que quer dizer conhecimento: con quer dizer com e naissance significa nascer. Logo, conhecimento = nascer com. Assim, no ato Conhecimento e informação são coisas bem distintas. Discussão noite adentro: William Blades. Há muitos anos a ques- tão do conhecimento humano tem provocado profundas e calorosas discussões. Fi gu ra 2 : W iki pe di a cc de conhecer, o sujeito conhecedor nasce como ser pensante e, concomitantemente com ele, nasce o objeto que ele pensa e conhece. O pro- cesso de produção do conhecimento mostra aos homens que eles jamais são alguma coisa pron- ta, na medida em que estão sempre nascendo de novo, quando têm coragem de se mostrarem abertos diante da realidade. Para que exista o ato de conhecer, é indispen- sável o relacionamento de dois elementos básicos, conforme é demonstrado na Figura 1, a seguir: Dependendo da corrente filosófica, será dada maior ênfase ao SUJEITO ou ao OBJETO, assim, sabemos que os racionalistas dão maior importância ao sujeito, enquanto que os empiris- tas dão maior importância ao objeto. *Esta parte foi desenvolvida tendo como base bibliográfica Cotrim (1993) e Hühne (1992). Um SUJEITO conhecedor X Um OBJETO conhecido CONHECIMENTO FIGURA 1 – RELAÇÃO SUJEITO OBJETO NO ATO COGNISCITIVO C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 12 www.ulbra.br/ead “O ato de conhecer envolve o dualismo sujeito e objeto” O ato de conhecer envolve o dualismo sujeito e objeto onde encontram-se frente a frente. Nes- te dualismo encontramos a essência do conheci- mento. Este é o resultado da relação entre os dois elementos. É relação e ao mesmo tempo correla- ção, porque o sujeito só é sujeito para um objeto e o objeto só é objeto para um sujeito. Mas tal correlação não é reversível, pois ser sujeito é algo completamente distinto de ser objeto. E a função do sujeito é a de apreender o objeto, e a função do objeto é de ser apreendido pelo sujeito. O sujeito, no caso que nos interessa aqui, é o ser humano que construiu a faculdade da inteligibilidade, construiu um interior capaz de apropriar-se simbólica e repre- sentativamente do exterior, conseguindo, inclusive, operar de forma abstrata com seus símbolos e representações. O objeto é o mundo exterior ao sujeito, que é re- presentado em seu pensamento a partir da manipulação que executa com eles.1 A pergunta que se impõe é: é possível ao su- jeito apreender o objeto? Respondendo a essa questão, Cotrim2 distin- gue duas correntes filosóficas básicas e antagô- nicas: a. Ceticismo – Esta corrente filosófica defende a idéia de que o ser humano não tem possibilidades de conhecer a verdade. b. Dogmatismo Gnosiológico – Esta cor- rente filosófica defende a idéia de que o ser humano tem possibilidades de co- nhecer a verdade. Ainda segundo Cotrim, o ceticismo se divi- de em duas modalidades: absoluto e relativo. a. Ceticismo absoluto: a palavra ab- soluto, por si só, já diz tudo, ou seja, nega qualquer forma total de conhecer a verdade. O argumento é, nas palavras do filósofo pré-socrático Protágoras, que “o homem nada pode afirmar, pois nada pode conhecer”3. Os céticos abso- lutos se fixam em duas características do ser humano que podem conduzir ao erro, quais seja: os sentidos e a razão. Os sentidos porque nos enganam com muita freqüência, não são confiáveis; a razão, por sua vez, também não é confiável, pois é ela que proporciona diferentes concepções teóricas, sobre um mesmo tema, que são superadas de tempos em tempos. b. Ceticismo relativo: nega parcialmente nossa possibilidade de conhecer, é mais moderada e se divide em duas modali- dades: • fenomenalismo, pelos pressu- postos da fenomenologia no qual só se conhece a aparência dos seres; não conhecemos a essên- cia das coisas; não conhecemos a coisa em si; conhecemos a ex- teriorização das coisas. • probabilismo, em que podemos alcançar uma verdade provável, nunca provada ou comprovada. Nunca chegaremos ao nível da plena certeza, da verdade abso- luta. Fi gu ra 3: G ra ss -la nd Protágoras de Abde- ra (480 a.C. - Sicília, 410 a.C.) foi quem cunhou a frase “o homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são.”, tendo como base para isso o pensamento de Herácli- to. Tal frase expressa bem o relativismo tanto dos Sofistas em geral quanto o relativismo do próprio Protágoras. 12 C onhe ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 13 www.ulbra.br/ead Por outro lado, existem os pensadores que acreditam que o ser humano (sujeito) pode co- nhecer o objeto e chegar à verdade. A estes Co- trim denomina de dogmatismo e divide em duas visões: a. ingênuo – acredita plenamente na pos- sibilidade de o ser humano conhecer a verdade. Para estes, o ser humano não tem dificuldades no ato de conhecer a verdade. b. crítico – acredita na capacidade do ser humano de conhecer a verdade, mas mediante o esforço conjunto dos sentidos e da inteligência. “Confia que através de um trabalho metódico, racional e científico, o homem torna- se capaz de decifrar a realidade do mundo”4. O processo de produção do conhecimento Na metafísica, Aristóteles já afirmava que “todos os homens têm, por natureza, o desejo de conhecer” (ARISTÓTELES apud ZILLES, 1994, p. 15). Tal desejo se mani- festa desde os primeiros anos de vida. Observa-se nas crianças, uma ânsia em buscar compreender o mundo ao seu redor, esse desejo vai se adequando às diferentes fases do ciclo vital. Na medida em que o homem vai aprofundando seus co- nhecimentos, necessariamen- te aprimorará os métodos e técnicas de investigação, para facilitar a compreensão do mundo. O conceito explicativo da realidade nunca está pronto; ele é uma construção que o sujeito faz a partir da lógica que encontra nos fragmentos da realidade. Para tanto, utiliza-se de recursos metodológicos, de meios e processos de investigação. Ele se constrói por meio de longa busca, por meio de esforço de desvendamento. A elucida- ção do mundo exterior exige imaginação investida, busca disciplinada e metodoló- gica, tendo em vista captar os meandros do real.5 Muitos autores referem-se ao conhecimento dizendo que ele é a “elucidação” da realidade. Elucidar na língua latina é derivada do verbo “lucere”, que significa “trazer a luz”, “iluminar”, assim, elucidar é iluminar, tornar claro. Outros autores se referem ao conhecimento como o ato de desvelamento, ou seja, conhecer é desvelar a realidade. “Desvelar” quer dizer “tirar o véu”. Também é muito usado o ter- mo “desvendar” que significa “tirar a venda”. Quem está com olhos vendados, não pode ver. Então, conhecimento é o ato de tirar a venda, tirar o véu, iluminar, clarear, para po- der dizer o que a realidade é, como é, porquê é, que elemen- tos a constituem... Os conceitos não nascem de dentro do sujeito, mas sim da apropriação adequa- da que ele faz do exterior. Deste modo, a iluminação da realidade não é um ato exclusivo do sujeito, mas um ato que se processa dialeticamente com e a partir da realidade exterior. O sujeito ilumina a re- alidade com sua inteligência, mas a partir dos fragmentos de “luz”, dos sinais que a própria realidade lhe oferece. O sujeito, no nível da teoria, explica um objeto, não porque ele voluntariamente queira que a explicação seja esta e não outra, mas sim porque os fragmentos da realidade com os quais ele trabalha lhe oferecem uma lógica Conhecer é sempre um ato desafiador em busca de sentidos e significados das coisas C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 14 www.ulbra.br/ead de compreensão, lhe permitem descobrir uma inteligibilidade entre eles, formando, assim, um conceito que nada mais é que a expressão pensada de um objeto.6 Conhecer é sempre um ato desafiador em busca de sentidos e significados das coisas, é es- clarecer o que estava duvidoso, é clarear o que estava obscuro, é iluminar o que estava na escu- ridão... A função primordial do conhecimento deve ser a de possibilitar a compreensão da realidade, para permitir a ação e adequação do ser humano sobre essa mesma realidade. Para o homem penetrar nas diversas áreas da realidade ele precisa aprender. Adquirir conhe- cimentos, aprender a refletir, pensar, eis o início para a compreensão do conhecimento. O conhecimento tem uma dimensão social e uma dimensão histórica. Sob o enfoque social o conhecimento ilumina outras consciências. A dimensão histórica significa que ele é produzido e germinado num determinado tempo. Por isso o conhecimento sempre é novo. Necessariamente temos que admitir que o ser humano é um sujeito produtor de conhecimentos. E que basicamente temos duas atitudes diante do conhecimento, quais sejam: usar o conhecimento já existente e/ou produzir novos conhecimentos. Finalmente, em se tratando de produzir co- nhecimento, necessitamos ter um posicionamen- to crítico diante do conhecimento. O posicionar- se criticamente implica colocar a relação do fazer e do usar de maneira dialética, porque o conhe- cimento é feito pelos homens e é utilizado pelos homens e, fatalmente, de qualquer maneira, utili- zado em função dos homens. Fundamentos do conhecimento Historicamente encontramos várias cor-rentes filosóficas e pensadores que se empenharam em explicar os fundamen- tos do conhecimento. Passamos a expor alguns pressupostos de três, dessas correntes, que con- sideramos as correntes principais, isto quer dizer que não são as únicas existentes. Racionalismo Usamos este termo para designar a corrente filosófica que deposita “total e exclusiva confian- ça na razão humana como instrumento capaz de conhecer a verdade”7. Ao trabalhar com os prin- cípios lógicos, a razão humana pode atingir o co- nhecimento verdadeiro. O racionalismo moderno teve início com René Descartes que, na verdade, é considerado o fundador da filosofia moderna. O racionalismo de Descartes é também conhecido como pensa- mento cartesiano. O ponto de partida de Descartes é a teoria René Descartes: foi filósofo, físico e matemático francês. Notabilizou-se sobretudo por seu trabalho revolucionário na filosofia. Institui o método da dúvida: só se pode dizer que existe aqui- lo que possa ser provado, sendo o ato de duvidar in- dubitável. Baseado nisso, Descartes busca provar a existência do próprio eu (que duvida, portanto, é sujeito de algo - cogito ergo sum, penso logo existo) e de Deus. Fig ur a 4 : W iki pe di a CC 14 C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 15 www.ulbra.br/ead de que tudo pode ser analisado e explicado pela RAZÃO. A razão é o instrumento por excelên- cia na construção do conhecimento em busca da verdade. Atribui à razão humana a capacidade exclusiva de conhecer e estabelecer a verdade. Proclama que a razão é independente da experi- ência sensorial e que é inata, é imutável e é igual em todos os homens. Empirismo A palavra empirismo significa experiência. O empirismo surge como uma reação natural ao racionalismo. Enquanto o racionalismo defen- dia o primado da razão, no empreendimento de conhecermos a verdade, os empiristas aparecem defendendo o primado da experiência sensorial, ou seja, o conhecimento e as idéias só se formam em nossa mente a partir dos nossos sentidos, das nossas experiências sensoriais, das percepções que nossos sentidos apreendem do mundo exte- rior. Não existe nada em nossa mente que não tenha antes passado pelos sentidos. Para apresentar o empirismo vamos nos con- centrar no pensamento de John Locke, que com- bate a concepção da existência de idéias inatas. O ponto de partida de John Locke é de que o ser humano, ao nascer, tem a mente como uma folha de papel em branco (tabula rasa), quer dizer, não nascemos com idéias prontas em nossa cabeça. As idéias vão sendo escritas com as experiências que faremos ao longo de nossa vida. A teoria de Locke é fundamentada na argu- mentação de que nada existe na mente do ser hu- mano que não tenha sua origem nos sentidos, na percepção sensorial. Asidéias que adquirimos e armazenamos durante nossa vida são o resultado do exercício da experiência sensorial. Dialética Representa um meio-termo entre empiristas e racionalistas aqui, “tanto os sentidos como a John Locke (1632-1704): filósofo inglês, pre- cursor do Iluminismo. Participou da Revolução In- glesa, em 1688. Passa vários anos na França e na Holanda. Voltou à Inglaterra quando Guilherme de Orange subiu ao trono. Representante do individu- alismo liberal, em sua principal obra, Ensaio sobre o entendimento humano, de 1690, propõe que a experiência é a fonte do conhecimento, que depois se desenvolve por esforço da razão. Ele é considera- do o representante principal do empirismo naquele país, e ideólogo do liberalismo. razão humana têm participação determinante na origem de nossos conhecimentos”8. Na concepção dialética o conhecimento hu- mano se processa a partir da experiência sensí- vel, e se complementa na lógica racional, isto é, o ser humano só produz conhecimentos a par- tir de sucessivas repetições de experiências que conduzem da realidade concreta em direção à consciência, e reciprocamente da consciência em direção à realidade concreta. Em outras palavras o conhecimento se processa prática para a teoria, reciprocamente da teoria em direção à prática. Nesta concepção, o conhecimento é pro- dução humana, ele é resultante da necessidade de interação do homem com o mundo e com os outros homens, onde no processo de produção de sua vida individual e social, os homens pro- duzem suas idéias, representações, teorias, reli- giões e ciências. Fig ur a 5 : W iki pe di a CC C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 16 www.ulbra.br/ead A questão do método O ser humano desde os primórdios se pre-ocupou em entender e explicar as forças da natureza que agem sobre ele. Para desvendar essas forças foram surgindo diferentes tentativas, ou seja, diferentes métodos e técni- cas de investigação, e consequentemente foram sendo elaboradas diferentes explicações, umas de ordem mitológica, outras de ordem religiosa, outras filosóficas e científicas. Etimologicamente método significa cami- nho. Então, método é algo que viabiliza a busca de um fim, é meio para se atingir um objetivo. De modo geral podemos dizer que o método é a or- dem que se deve impor aos diferentes processos necessários para atingir um resultado desejado. Normalmente na área das ciências método é o conjunto de processos que o espírito humano deve empregar na investigação e demonstração da verdade. Existe a necessidade de distinguirmos o mé- todo em relação a técnica. Método é a estratégia da ação, indica o que fazer, é o orientador geral da atividade, ou seja, o dispositivo ordenador, o procedimento sistemático, um plano geral.Técni- ca é o modo, o processo de fazer de forma mais hábil, mais segura, mais perfeita algum tipo de atividade. Esclareça-se que via de regra a técnica necessita do método para ser executada, pois a técnica é a aplicação específica do plano metodo- lógico e a forma especial de o executar. No dizer de Cervo e Brevian9: Existe, pois, um método fundamental idên- tico para todas as ciências, que compre- ende um certo número de procedimentos ou operações científicas levadas a efeito em qualquer tipo de pesquisa. Estes pro- cedimentos (...), podem ser resumidos da seguinte maneira: a) formular questões ou propor problemas e levantar hipóteses; b) efetuar observações e medidas; c) registrar tão cuidadosamente quanto possível os da- Assim como a bússola está para o navegador; o méto- do está para o pesquisador dos observados com o intuito de responder às perguntas formuladas ou comprovar a hipótese levantada; d) elaborar explicações ou rever conclusões, idéias ou opiniões que estejam em desacordo com as observações ou com as respostas resultan- tes; e) generalizar, isto é, estabelecer con- clusões obtidas a todos os casos que envol- vem condições similares; a generalização é tarefa do processo chamado indução; f) prever ou predizer, isto é, antecipar que, dadas certas condições, é de se esperar que surjam certas relações. Entretanto, o método pode e deve ser adaptado às diver- sas ciências, à medida que a investigação de seu objeto impõe, ao pesquisador, lan- çar mão de técnicas especializadas. É evidente a importância do método na construção das ciências, pois ele tem a função de disciplinar o processo investigatório, bem como de auxiliar na exclusão do acaso e, ainda, de en- caminhar o esforço no sentido de adequação ao objeto de estudo determinando formas de inves- tigação segura na pesquisa. Mas o método não se basta por si só, na verdade, para ser produtivo exige empenho, inteligência e talento. Neste tópico abordaremos a dedução e a in- dução que representam, antes de qualquer coisa, formas de raciocínio ou de argumentação e, como tais, são formas de reflexão, e não de simples pensamento. Freqüentemente, prefere-se pensar os problemas em vez de raciocinar sobre eles, e quando isso acontece, via de regra, provocam-se confusões com a reflexão sistemática. O raciocí- nio é algo ordenado, coerente e lógico. Fi gu ra 6 : S to ck .X ch ng ® 16 C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 17 www.ulbra.br/ead Dedução O processo argumentativo lógico dedutivo se desenvolve a partir de premissas gerais1* e busca uma conclusão particular2**. A expressão principal do processo argu- mentativo lógico dedutivo é o silogismo. Silogismo é um raciocínio ou uma operação do pensamento realizado por meio de juízos3*** ou enunciados lingüísticos lógicos pelas propo- sições encadeadas, pelo qual, de um anteceden- te que une dois termos a um terceiro, tira-se um conseqüente que une estes dois termos entre si. Exemplo: Todo homem é mortal Premissa Maior Ora, Pedro é homem Premissa Menor (mediador) Logo, Pedro é mortal → Conclusão Normalmente afirma-se que a dedução é o pro- cesso lógico por excelência, pois atende as exigên- cias dos rigores condicionantes da lógica. O proces- so argumentativo dedutivo pressupõe a necessidade da conclusão. Se as premissas forem verdadeiras, a conclusão sempre será verdadeira, pois premissas verdadeiras conduzem a uma conclusão verdadeira. 1 * Premissas gerais – Quer dizer, o conceito ou termo é geral, ou universal, ou total, isto é, quando o termo diz ou faz referência à totalidade dos elementos de uma espécie, gênero, fenômeno. 2** Conclusão particular – Quer dizer, o conceito ou termo diz ou faz referência a um indivíduo determinado ou a alguns indivíduos. 3*** Juízo – É o ato pelo qual a inteligência diz algo do outro afirmando ou negando. No caso de premissas falsas pode-se condu- zir tanto para o falso como para o verdadeiro. Como já referimos a dedução lógica é a li- gação de dois termos mediados por um terceiro. Vejamos: Se A = B, e B = C, então A = C. Existe o termo mediador (B), que determina a ligação entre os termos extremos A e C, assim a conclu- são se evidencia como necessária, em outra pa- lavras, a conclusão só pode ser esta e não outra. Chamamos atenção para o fato de que o conteú- do da conclusão não vai além do conteúdo das premissas, ou seja, na conclusão não se afirma mais do que já foi afirmado. Mais um exemplo para clarear as idéias: Toda a Ciência tem um método. Ora, biologia é uma ciência. Logo, biologia tem um método. O termo mediador desse exemplo é CIÊNCIA que aparece nas duas premissas, porém não está presente na conclusão. Neste argumento dedutivo, para que a con- clusão “biologia tem um método”fosse falsa, uma das premissas deveria ser falsa, isso se nem toda ciência tem método ou se a biologia não fosse ciência. Observe que a dedução é um modelo de ri- gor, porém, há os que a consideram estéril, isso porque num certo sentido não nos ensina nada de novo, e apenas organiza o conhecimento já adquirido. Mas isso não significa que a dedução Cooperação (cooperation). Se os pontos colori- dos representam idéias gerais que se interligam, logo o ponto central nos indica que chegou-se a dedução de uma idéia particular. Fig ur a 7 : A rq ui vo U lb ra Ea d ATENÇÃO: Necessariamente no silogismo ou pro- cesso dedutivo aparece o termo Mediador, que tem a função de ligar a Premissa Maior (tem ex- tensão maior), com a Premissa Menor (tem ex- tensão menor) e de forma alguma com a conclu- são. Conforme o exemplo acima. Se dizemos que todo homem é mortal e afirmamos que Pedro é homem. Portanto, o termo Mediador é a palavra HOMEM (está presente nas duas premissas). Porém não estará presente na conclusão. C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 18 www.ulbra.br/ead não tenha valor algum. Vejamos no exemplo acima. A conclusão ao dizer que “biologia é uma ciência”, está afirman- do algo que, na verdade, já foi dito nas premissas. A conclusão está contida de forma virtual ou de forma implícita na premissa maior. Veja que a conclusão acrescenta algo novo, ou seja, realiza um progresso no conhecimento, qual seja, o pro- gresso que consiste em descobrir em uma idéia que nela está contido, mas que não se evidencia de modo espontâneo, então, podemos dizer que o termo mediador tem um poder de fecundidade no processo de conhecer, porque todo o argumento dedutivo se obriga a recorrer a uma idéia media- dora, para concluir. Salienta-se que o objetivo do processo dedu- tivo é de explicar o conteúdo das premissas. Desse modo, podemos dizer que o argumento dedutivo ou é correto ou é incorreto, pois ou as premissas sustentam de modo completo a conclusão ou, não sustentam de forma alguma. O mesmo acontece, por extensão com a produção do conhecimento científico através da pesquisa científica. Passamos a apresentar algumas das mais elementares formas de argumentos dedutivos. Na verdade, a lógica dedutiva é muito desenvolvi- da, mas fica aqui, o desafio de que o estudante, a partir dessas explanações elementares, avance por iniciativa própria para processos mais com- pletos e complexos. Estaríamos cometendo um erro grave se deixássemos a impressão de que a dedução se limita a colecionar argumentos para verificar se são válidos ou não. Assim sabemos que o aqui estudado não é o suficiente para dar uma idéia do alcance abrangente da lógica de- dutiva. Argumentos mais complicados envolvem diversas fases e não se encaminham diretamente das premissas para a conclusão. O que queremos em termos de processos dedutivos, é a compre- ensão de que a conclusão de um argumento pode operar como premissa de outro argumento. A título de curiosidade procure verificar os procedimentos da matemática, e você vai consta- tar que a maior parte dos argumentos matemáti- cos é dedutiva. São muito comuns as observações de que o método dedutivo é próprio das ciências exatas. No entanto, ele não é um método aplica- do exclusivamente por essas ciências, pois outras ciências também se utilizam dos processos de- dutivos. Indução Depois de termos estudado a dedução, pas- samos a dar atenção para a indução, ou seja, ao processo da mente que parte dos singulares para atingir o universal. Indução é um processo mental por intermé- dio do qual, partindo de dados particulares, sufi- cientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nas partes exami- nadas. Portanto, o objetivo dos argumentos indu- tivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas indutivas nas quais se basearam10. Por exemplo, observamos que: A Amilase é uma enzima salivar, que é proteína; A Pepsina é uma enzima gástrica, que é proteína; A Lípase é uma enzima pancreática, que é proteína; Logo, todas as enzimas são proteínas. Todo o argumento dedutivo se obriga a recorrer a uma idéia mediadora, para concluir. O argumento dedutivo ou é correto ou é incorreto. 18 C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 19 www.ulbra.br/ead Os argumentos indutivos, ao contrário do que acontece com os dedutivos, levam a conclu- sões cujo conteúdo excede o das premissas. É esse traço característico da indução que torna os argumentos indutivos indispensáveis para a fun- damentação de muitos dos nossos conhecimen- tos filosóficos, científicos e técnicos. Mas é esse mesmo fato que levanta questões extremamente complicadas, dificultando a análise do conceito de apoio indutivo. O objetivo básico dos argumentos, sejam eles dedutivos ou indutivos, é produzir conclu- sões verdadeiras a partir de premissas verdadei- ras. Em outras palavras, desejamos que os nos- sos argumentos tenham conclusões verdadeiras quando as suas premissas são verdadeiras. Con- forme já estudamos, os argumentos dedutivos satisfazem esse requisito. No entanto, com os ar- gumentos indutivos não acontece o mesmo, estes são elaborados com o fim de estabelecer conclu- sões cujo conteúdo é muito mais amplo que o conteúdo das premissas. Costuma-se dizer que para conseguir esse objetivo, os argumentos in- dutivos sacrificam o caráter de necessidade que têm os argumentos dedutivos. Ao contrário do que acontece com um argumento dedutivo, um argumento indutivo pode, perfeitamente, aceitar uma conclusão falsa, ainda que as suas premissas sejam verdadeiras. Porém, mesmo não podendo garantir que a conclusão de um argumento indutivo será verda- deira quando as premissas são verdadeiras, pode- mos afirmar que as premissas de um argumento indutivo sustentam ou atribuem certa verossimi- lhança à sua conclusão. Quando as premissas de um argumento de- dutivo são verdadeiras, a sua conclusão deve ser verdadeira; quando as premissas de um argu- mento indutivo são verdadeiras, o máximo que podemos dizer é que a sua conclusão é provavel- mente verdadeira. É importante ficar claro que diferentemente da dedução, na indução em muitos casos, a con- clusão poderá ser falsa, mesmo que as premissas sejam verdadeiras, porém na maioria dos casos a conclusão será verdadeira. Evidencia-se neste exemplo, o conteúdo da conclusão excede o conteúdo das premissas. Por- tanto, só temos uma probabilidade de a indução estar correta. Desse modo, cabe a quem trabalha com a indução dispensar o máximo de atenção em ana- lisar os enunciados das premissas, se essas ofe- recem condições favoráveis para considerar a in- dução correta ou com apenas probabilidades de conduzir à conclusão verdadeira11. Segundo Cervo e Brevian12: A indução científica é o raciocínio pelo qual se chega à conclusão de alguns ca- sos observados a partir da espécie que os compreende e a lei geral que os rege. Ou, ainda, é o processo que generaliza a rela- ção de causalidade descoberta entre dois fatos ou fenômenos e da relação causal que conclui a lei. Verifica-se, por exemplo, certo número de vezes, que o óxido de car- bono paralisa os glóbulos sanguíneos; des- sa observação infere-se que, sempre dadas as mesmas condições, o óxido de carbono paralisará os glóbulos sangüíneos. Os argumentos indutivos levam a conclusões cujo conteúdo excede o das premissas. Exemplos: Observamos que: O cobre é condutor de eletricidade. O ouro é condutor de eletricidade. O ferro é condutor de eletricidade. Ora, o cobre, o ouro e o ferro são me- tais. Logo,todo metal é condutor de eletricidade. C on he ci m en to e m ét od o Instrumentalização Científica 20 www.ulbra.br/ead Esse tipo de indução é o fio condutor das ci- ências experimentais. Sem ela a ciência não seria outra senão um repositório de observações sem alcance. A indução cientifica pode ser formal ou virtual, dependendo de como forem enu- merados os fatos, fenômenos (singulares), ou, apenas alguns enquanto estejam repre- sentando todos. O que, realmente interes- sa é atingir a universalização, através da experiência. Isto nem sempre e fácil e re- quer muito espírito de observação e pers- picácia. Se conseguirmos enumerar. Um por um, todos os sujeitos (singulares), que apresentam certa característica, podemos formar, a partir desta experiência de um por um, um juízo universal.13 Caro estudante perceba que na indução cien- tífica, o termo mediador é a experiência. A base está no princípio analítico que possibilita a pas- sagem de juízos particulares (singulares) para atingir um juízo universal, em outras palavras, 1 LUCKESI, 1995, p.16. 2 COTRIM, 1993. 3 COTRIM, 1993, p. 71. 4 COTRIM, 1993, p. 73. 5 LUCKESI, 1995, p.18. 6 LUCKESI, 1995, p.16-17. 7 COTRIM, 1993, p. 74. 8 Id. 9 CERVO; BREVIAN, 2002, p. 27. 10 LAKATOS; MARCONI, 2005, p. 86. 11 ARANHA; MARTINS, 1997. 12 CERVO; BREVIAN, 2005, p. 33. 13 GRINGS, 1986. p.82. Exemplos: Observamos que: A água do poço ferve a cem graus. A água da lagoa ferve a cem graus. A água do rio ferve a cem graus. Conclusão: Toda água ferve a cem graus. da experiência de casos particulares partimos em busca de uma lei geral. Assim, o que é dito de um enquanto tal poderá ser dito de todos, isto é, podemos elaborar juízos particulares e através desses, de um a um chegarmos legitimamente a uma lei universal. No exemplo acima verificamos que existe uma relação entre “água” e “cem graus”; e disso podemos generalizar que todas as águas fervem a cem graus.
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