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Catálogo Darcílio Lima

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darcílio lima 
um universo fantástico
apresenta
caiXa cultural São Paulo 
26 de setembro a 6 de dezembro de 2015
Curadoria Guilherme Gutman
darcílio lima
um universo fantástico
apresenta
A CAIXA é uma das principais patrocinadoras da cultura 
bra sileira e destina, anualmente, mais de R$ 60 milhões de 
seu orçamento para patrocínio a projetos culturais em espa­
ços próprios e de terceiros, com ênfase em mostras ci ne­
ma tográficas, exposições de artes visuais, peças de tea tro, 
espetáculos de dança, shows musicais, festivais de teatro 
e dança em todo o território nacional, e também em arte­
sanato brasileiro.
Os projetos são escolhidos por meio de seleção pública, uma 
opção da CAIXA para tornar mais democrática e acessível a 
participação de produtores e artistas de todas as unidades 
da federação, e mais transparente para a sociedade o in­
vestimento dos recursos da empresa em patrocínio.
A exposição Darcílio Lima – um universo fantástico, com 
idea lização e coordenação de Afonso Costa e curadoria do 
psicanalista Guilherme Gutman, é uma iniciativa de resgate, 
valorização e divulgação completa do trabalho do artista 
plás tico Darcílio Lima, um dos maiores representantes do 
surrealismo no Brasil.
Ao trazer mais esta mostra para o público carioca, a CAIXA 
reafirma sua política cultural de estimular a discussão e a 
disseminação de ideias, promover a pluralidade de pensa­
mento, mantendo viva sua vocação de democratizar o a ces so 
à produção artística.
Caixa Econômica Federal
7 lembrançaS e reSgateS...
 Afonso Henrique Costa
13 darcílio lima e o labirinto da grande SerPente
 Guilherme Gutman
21 SurrealiSmo FantáStico
 Mário Pedrosa
25 dePoimento antonio manuel
33 dePoimento YveS SerPa
127 cronologia
139 engliSH verSion
6
7
lembrançaS e reSgateS...
afonso Henrique costa
Idealizar e trabalhar na coordenação da retrospectiva de 
Darcílio Lima está se revelando para mim uma volta ao 
passado.
Sempre me interessei por arte. Recordo que, desde me­
nino, nas visitas que fazia à casa de amigos e colegas, pri­
meiro eu cumprimentava os presentes para em seguida ir 
ver os quadros pendurados pelas paredes. A arte sempre 
esteve presente na curiosidade do foco do meu olhar, algo 
inato que não sei justificar. Nasceu comigo.
Por volta de 1966/67, decidi frequentar as aulas que 
eram oferecidas pelo Departamento de Cursos do MAM­RJ. 
Muitos as ministravam; estavam lá, entre outros, Aluísio 
Carvão, Domenico Lazzarini e, sobretudo, Ivan Serpa, de 
quem me tornei aluno.
É para mim indiscutível que o grande aprendizado que 
Ivan Serpa me legou foi aprender olhar a arte. Ele afinou o 
meu olhar, libertou­o, tornando­o mais sábio, claro e objetivo. 
Serpa sempre ensinou a seus alunos a liberdade de fazerem 
o que desejassem, encorajando­os. Ele dizia ape nas que tra­
balhassem e, cada vez mais, muito mesmo. Cobrava isso.
Suas aulas eram concorridas e, de alguma forma, todo 
mundo aparecia por lá. Foi dessa forma que conheci muita 
gente. Afinal, o MAM­RJ era, naquele momento, o coração 
pulsante do cenário artístico na cidade. E desde então pas­
sei a frequentar galerias e exposições – eram muito poucas 
na época – e centros culturais que realizavam mostras ins­
titucionais, como a Galeria do Ibeu em Copacabana, palco 
de antológicos eventos de artes plásticas.
Página anterior | 
PREVIOUS PAGE
Sem título | 
Untitled, 1972
Litografia | 
Lithograph, 13/40
61,3 x 46cm
Coleção | Collection 
Guilherme Gutman
[DetaLHe | DETA IL ]
Sem título | 
Untitled, 1972
Litografia | 
Lithograph, 07/25, 
79,4 x 59,4cm
Coleção | Collection 
Jorge Eduardo 
Lima Figueiredo
[DetaLHe | DETA IL ]
8
Havia um ecletismo entre os alunos de Ivan Serpa. Ti­
nha de tudo. Desde pessoas muito jovens, o que era o meu 
caso, a pessoas idosas, como Grauben do Monte Lima, que 
começou a pintar já em idade avançada, e realizava uma 
pin tura naïf pontilhista, ilustrada por uma magia de flo­
res, plantas, pássaros e pavões e incontáveis borboletas. 
Lembro ainda de Zama e de Sônia von Brüsky, promissoras 
desenhistas com imagens rasgadas e dilaceradas que mar­
geavam o surrealismo.
Aparecia sempre muita gente. Desde Hélio Oiticica, 
Lygia Pape, Antonio Manuel e, claro, Darcílio Lima, cujo tra­
balho fantástico e obsessivo em bico de pena me deixa va 
fascinado. Tornei­me amigo de muitos deles; de alguns ga­
nhei e até consegui comprar trabalhos, sobretudo gravuras, 
com os parcos tostões da curta mesada de um adolescente. 
Isso marca o início da minha coleção, que passou a ser uma 
das metas da minha vida, até eu me dedicar to talmente à 
arte, trabalhando no mercado, associando­me a galerias, for­
mando coleções, lançando e representando artistas, e pro­
duzindo exposições, inclusive no exterior.
Ivan Serpa enforcando 
Darcílio Lima, s/d | 
Ivan Serpa hanging 
Darcílio Lima, undated
Ivan Serpa e Darcílio Lima 
trabalhando juntos na 
residência Serpa, s/d | 
Ivan Serpa and Darcílio 
Lima working together 
at the Serpa’s house, 
undated 
9
Frequentar o MAM­RJ passou a ser uma rotina na mi­
nha vida. Era um oásis de liberdade em um cenário de di­
tadura militar, quando a censura reinava no país. O museu 
pulsava com sua fabulosa cinemateca onde assisti a tudo 
que era relevante, e não perdia as exposições e eventos que 
gerava no seu entorno. Recordo dos Resumos JB, do Salão 
da Bússola, e dos Domingos da Criação, estes realizados 
em 1971 por Frederico Morais, verdadeiros happenings que 
atraíam multidões e eram notícia na mídia.
Rememoro o especial carinho de Serpa por Darcílio. Serpa, 
inclusive, generosamente abrigou, em sua casa, Darcílio, 
após permanência deste na Casa das Palmeiras, onde Nise 
da Silveira realizava um trabalho memorável. Ivan Serpa 
adorava Darcílio; certamente um de seus alunos prediletos, 
o incentivava e o apoiava ao máximo. É indiscutível que foi 
seu pai artístico, com todo empenho e desvelo possíveis. 
Ele afirmava que Darcílio não precisava frequentar aulas, 
precisava, sim, trabalhar, e assim, a cada dia, ele se tor­
nava mais obsessivo construindo sua obra notável.
Passei a encontrar Darcílio com alguma frequência e 
me lembro bem dele, sempre com uma pasta da Papelaria 
União cheia de obras, algumas ainda em execução, e nas 
quais ia trabalhando em qualquer lugar, quando o tempo e 
a ocasião permitiam.
Seus desenhos eram obsessivos, com milhares de pon­
tos e traços, que demandavam muito tempo para sua execu­
ção. Ele era mesmo perfeccionista e virtuoso. Darcílio tinha 
prazer em mostrar sua obra, revelando o conteúdo da pasta, 
e numa dessas ocasiões terminei por adquirir uma gravura.
Resgatar sua obra, vendo colecionadores abrindo pas­
tas com seus trabalhos, me causou a mesma sensação. Não 
foi fácil, pois além de Darcílio ter, na verdade, nos legado 
uma obra pequena, já que seus trabalhos demandavam mui to 
tempo para serem executados, com tamanho virtuosismo e 
obsessão, nada localizamos dele em museus e ins tituições, 
a não ser um desenho da Coleção Gilberto Chateaubriand 
que se encontra em comodato no MAM­RJ, e que está par­
ticipando da retrospectiva. Os trabalhos, de fato, estão dis­
persos em coleções particulares, e graças à generosidade e 
ao entusiasmo de seus proprietários estamos conseguindo 
reunir um conjunto tão relevante.
10
Quero agradecer a todos eles e em especial aos filhos 
de Ivan Serpa, que nos receberam tão afetuosamente, nos 
franqueando o acesso ao importante acervo legado por seu 
pai, que acabou sendo o principal núcleo dos trabalhos ex­
postos. Agradeço ainda a Guilherme Gutman queaceitou 
com tanto entusiasmo o meu convite para essa corajosa em­
preitada de fazer a curadoria da mostra, e que fez questão 
de partilhar comigo a seleção das obras apresentadas.
Com esse resgate, afinal sua obra ainda é tão pouco co­
nhecida, fico feliz e orgulhoso em ver reunido, pela primeira 
vez desde seu falecimento, o maior e mais importan te con­
junto de obras de Darcílio Lima, artista notável e virtuoso, 
na construção de um universo fantástico!
Afonso Henrique Costa atua como produtor, curador, marchand e 
con sultor no mercado de arte, tendo sido associado a diversas ga­
lerias, com as quais realizou antológicas exposições. Participou – e 
ainda é integrante – da diretoria e do conselho de diversos mu seus 
e instituições culturais. Foi responsável pela formação de impor­
tantes coleções, entre as quais a Coleção João Sattamini, em co­
modato no MAC/Niterói, na qual desenvolveu, sobretudo, seu fa­
buloso núcleo concreto. Produziu numerosas exposições no Brasil 
e no exterior, e foi responsável pelo lançamento de diversos reno­
mados artistas. Nasceu e reside no Rio de Janeiro.
Sem título | Untitled, 1968
Intervenção (desenho) com nanquim sobre 
envelope impresso, postado e selado | 
Intervention (drawing) with Indian ink 
on printed, posted and sealed envelope, 
33,6 x 32,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
11
12
13
darcílio lima e o labirinto da grande SerPente
Guilherme Gutman
Existe uma antiga lenda sobre a fundação da cidade de Cas­
ca vel, no Ceará. Sob o seu solo, viveria uma enorme e dia­
bólica serpente; venenosa cascavel da qual a cidade teria, 
então, recebido o seu nome; uma nomeação em sua acep­
ção forte: algo que ao mesmo tempo marca o mito de ori­
gem, em torno da qual um povoado começa a se enovelar.
Nomeados pela serpente e vivendo sob o jugo do mito, 
os citadinos construíram uma torre – que mais parece um 
altíssimo e robusto bastão fincado na terra –, que impediria 
a grande serpente de sair dos subterrâneos que habita e de 
avançar, inclemente, voraz e veraz, sobre a cidade e sobre 
a sua gente, tão temerosa de sua fúria quanto fervorosa­
mente crente dos poderes de proteção atribuídos à imagem 
de uma Nossa Senhora do Ó, postada no alto desse pedes­
tal sui generis. A torre fálica, totêmica, na mesma medida 
em que contém o monstro, faz recordar a todos que ele está 
lá. Adormecido ou espumando de raiva, não se sabe, mas 
decerto com ferocidade ímpar, com a força de legiões, com 
a potência trágica e com a estranha beleza dos malditos.
O bastão constrange a besta, mas, ainda assim, ela en­
controu uma forma de derramar a sua peçonha sobre as ci­
da des. Ela encontra o seu veio, pelo qual, flui. É possível 
imaginá­la, percorrendo canais escuros, roçando a sua pele 
pelas paredes terrosas ou aninhada no buraco no qual foi for­
çada a estar, com os olhos bem vivos, rutilantes, atenta aos 
sons e às vibrações do terreno, e aos sons daquilo que por ci­
ma da terra, para além da Terra, de algum modo ela alcança.
Sem título | 
Untitled, 1972
Litografia | 
Lithograph, 07/25
64,9 x 55,7cm
Coleção | Collection 
Família Ivan Serpa
[DetaLHe | DETA IL ]
14
Seu rasto é misterioso e sinuoso – como cabe às co­
bras –, e os sulcos que deixa por onde rasteja não marcam 
o chão da pequena cidade brasileira, posto que referidos a 
outra geografia; seu caminho é o dos giros cerebrais – dos 
corações e mentes – daqueles que se deixam afetar pelo 
traço fantástico de Darcílio Lima. O seu tracejado é o dos 
mistérios cósmicos e das constelações de decifração difí­
cil, mas na mesma medida, e paradoxalmente, a sua arte é 
pedestre: ela não fala apenas a língua dos anjos – celestes 
ou decaídos – também fala a língua dos homens, tocando 
as coisas da carne, da violência e da paixão.
Guardemos essa imagem simbólica, sabendo que os sím­
bolos – astrológicos, de línguas mortas e de um alfabeto 
fan tástico – abundam na obra de Lima: um enorme “mas tro­
falo” no qual numa ponta se eleva a santidade e na outra, 
se enrosca a grande cascavel. No seu trabalho, essas duas 
forças antagônicas tensionam enormemente as figuras em 
cena, fazendo com que gritem de muitas formas a violência 
experimentada por esse artista inquieto.
Lembremos que a própria imagem sagrada de Nossa 
Senhora do Ó, presidindo do alto um embate entre o bem 
e o mal, carrega com ela a marca de uma ambivalência es­
sencial: na história iconográfica da santa, ela foi muitas 
vezes representada com o ventre intumescido pela imacu­
lada conceição. Mas exatamente um ventre de uma gravidez 
em estado adiantado que, a uma dada moral cristã, se pa­
recerá, escandalosamente, com o ventre gravídico da mu­
lher co mum; de todas as mulheres que “pecaram” ruidosa­
mente, talvez gostosamente, e cujo gozo terreno a igreja 
pas sou a não querer ver associado a um de seus dogmas.
Essa mesma ambivalência está presente em Darcílio: 
na obra e na vida. De educação religiosa, os seus trabalhos 
deixam entrever, numa frequência que certamente não é ca­
sual, os restos transformados e revistos de sua formação 
cristã. No que tange à sua vida pessoal, pouco nos foi dado 
a saber, posta a sua elegante discrição quando o assunto 
po deria ser o modo como resolveu ele mesmo as relações 
entre pecado e luxúria. Em sua obra, todavia, o bem e o mal 
se entrelaçam de muitas formas. Por exemplo, pela presença 
insistente da serpente, remetendo­nos ao pecado original, 
ou nas muitas referências a elementos dos rituais litúrgicos.
As criaturas estão por todo lado na obra de Darcílio: há 
felinos de olhares enigmáticos e sedutores ou francamente 
15
ameaçadores, com a sua bocarra aberta e os seus dentes 
afiados; há aves antropomorfizadas, enlaçadas a todo ti po 
de ser incomum; há rabos de peixe, asas e garras e, sem pre, 
as cobras, inteiras ou metamorfoseadas em outras cria turas; 
às vezes, apenas sugeridas em sua textura escamosa, mar ca 
de muitos desenhos e gravuras do artista.
São seres que se mostram terríveis, selvagemente an­
dró ginos, atravessados por dores excruciantes e, talvez 
por isso, igualmente dispostos à imposição da dor. Eles 
se entredevoram, copulam, interpenetram­se, mastigam­se 
orgias ticamente. Há outros em sua acepção forte: algo que 
ventres ingurgitados de gravidezes múltiplas, mamas de 
ma milos salientes, vaginas e pênis que recebem e pene­
tram, línguas insinuantes e sedentas. Não são seres passi­
vos: há muito movimento.
E sobre cada um desses seres que compõem um besti­
ário fabuloso há, tal como vestes profanas, outros seres, às 
vezes pequeníssimos, tal qual alucinações liliputianas, que 
se relacionam com erotismo. Há, também, outras camadas 
sobre esses corpos: são como tecidos de padronagens varia­
das – como havíamos dito, talvez escamas de serpente – que 
Darcílio realiza obsessivamente e com grande apuro técnico.
De onde virão os seres dessa “fauna darciliana”? Aqui 
se chega a um dos pontos mais delicados no que tange a 
uma possível chave para a interpretação de sua obra.
A crítica nunca deixou de apontar que as motivações 
de Lima são profundas, geradas e gestadas em seu ventre 
pulsional. A crítica brasileira – por exemplo, com Mário Pe­
drosa, que soube entregar ao mundo os talentos de Hélio 
Oiticica (1937–1980) e de Lygia Clark (1920–1988), ou com 
Frederico Morais, que apresentou ao Brasil e ao mundo a 
obra de Arthur Bispo do Rosário (1909–1989), e também a 
crítica internacional, em especial a inglesa e a francesa, sou­
beram ver na obra de Darcílio esse componente instintual, 
que dribla a racionalidade consciente para obter em seus 
trabalhos uma verdade sugeridaexatamente pela sensação 
de que a sua produção brotaria como a água cristalina brota 
virgem, da rocha.
Há certamente fortes motivações inconscientes na re­
pe tição de certos temas em Darcílio, mas ao contrário do 
artista comum – no sentido específico de alguém que cria, 
por assim dizer, tendo como apoio, o solo mínimo de esta­
bilidade que a neurose supõe, em contraponto à estrutura 
16
psicótica –, ele é compelido a retecer a fina matéria de um 
mundo em que possa viver. A sua obra poderia ser encai­
xada no grande e heterogêneo conjunto da outsider art, da 
arte visionária ou da art brut? Difícil responder... Ele não 
tra balha apenas por premências internas e, embora haja 
muito de intuitivo no que produziu, não se pode dizer que 
tenha passado ao largo do sistema de arte. Foi como se 
a boa crítica houvesse dito: “ele tem monstros secretos, 
guardados, prontos para serem colocados para fora...” Mas 
há certamente outras certezas que também o impulsionam 
a criar e algumas de suas imagens talvez serpenteiem em 
sua direção, o encontrem e até o surpreendam, porque vêm 
de fora, como as alucinações, ou misturem­se a ele, como 
os delírios.
Do mesmo modo, também pode haver dúvida quanto 
à pertinência de classificá­lo como um surrealista. Suas fi­
guras, não há dúvida, são surreais, mas ele não as repas sa 
sob o molde das formações do inconsciente. Não são exa­
tamente figurações, em tinta sobre papel, de sonhos, como 
no caso de certo segmento da proposta surrealista. Um so­
nho, como se sabe, tem um conteúdo latente e um conteúdo 
manifesto, sendo este último aquilo que se pode recordar 
no dia seguinte. Embora os conteúdos oníricos pos sam ser 
tomados como “notícias de outro lugar” – notícias que nos 
chegam fragmentadas, feitas de deslocamentos e de subs­
tituições, obedecendo a uma temporalidade única, produ­
tora da estranheza que reconhecemos como tão carac te­
risticamente dos sonhos –, esse “outro lugar” deve ser 
concebido como um extrato de nosso psiquismo, um regis­
tro de nosso funcionamento mental ou um determinado lo­
cus de nosso aparelho psíquico. Colocar os sonhos e as fan­
tasias nas obras plásticas é o que muitos artistas – os bons 
e os ruins – se sentem fazendo quando criam. No ca so de 
Darcílio Lima, o terreno é outro; os labirintos pelos quais a 
grande serpente se move não estão localizados em algum 
recôndito de sua alma que ele, numa espécie de movimento 
catártico, procuraria exteriorizar. Darcílio é movido por ou­
tros imperativos que, embora o atinjam em cheio no corpo 
e no espírito, são de outra ordem e vêm com a força de um 
Deus. Darcílio, como Bispo do Rosário, não tinha escolha: 
não criava apenas por impulsos artísticos ou pela neces­
sidade de expressão de suas questões; criava por que era 
17
forçado a responder, de alguma forma, a uma solicitação 
que só ele pôde ver ou escutar.
É difícil estabelecer a conexão entre o universo supra r­
realista pelo qual Darcílio parecia transitar e o Brasil dos 
anos 60 e 70, onde ele viveu e criou: um país subdesen­
volvido, sob um regime político totalitário e que aparece 
na obra de muitos artistas do período, como o já citado Oi­
ticica e tantos outros como, por exemplo, Antonio Manuel 
(1947) ou Cildo Meireles (1948). A temporalidade de Lima 
parece mais transcendental, no sentido de que combina re­
ferências culturais contemporâneas, como uma garrafa de 
coca­cola, a outras de muitas épocas, latitudes e longitu­
des. Havia de sua parte, eventualmente, posicionamentos 
políticos de irreverência crítica, como quando foi vestido 
com uma casaca de general à sua vernissage.
Mas se há um encontro com um outro, que foi central e 
catalisador para ele, esse encontro foi com o artista plás­
tico e professor Ivan Serpa (1923–1973), que o acolheu em 
sua singularidade (Darcílio era uma figura de grande sin­
gularidade), recebendo­o durante dois ou três anos em sua 
casa­ateliê e não propriamente ensinando­lhe algo, mas 
colocando­o ao seu lado para, em paralelo, desenvolverem as 
suas respectivas obras que, de algum modo, se relacionavam.
É preciso não esquecer a importância de Nise da Silveira 
e de sua Casa das Palmeiras, que Darcílio frequentou em 
1966. Antes disso, levados por Mário Pedrosa, Ivan Serpa, 
Abraham Palatnik e Almir Mavignier travaram contato com 
a obra dos loucos internados no Hospital Psiquiátrico Pedro 
II, no Engenho de Dentro. É possível que essa experiência 
tenha ampliado ainda mais a sensibilidade de Serpa à lou­
cura e a sua possibilidade de produções incomuns.
Para Darcílio, o período na Casa das Palmeiras foi como 
uma etapa necessária para o grande encontro com Serpa 
e para a explosão criadora daquilo que se deve reconhe­
cer como o seu trabalho mais característico e, talvez, mais 
forte também.
Talvez a relação transferencial estabelecida entre Serpa 
e Lima possa ajudar a que se entenda um pouco mais de 
seus mecanismos criativos. Diz ele:
18
Então conheci Ivan Serpa, que me disse: “Você não precisa 
estudar, só trabalhar”. Não procurei mais professor [...]. À me­
dida que vou trabalhando, sinto que o tema se concretiza. O 
Serpa me obriga a trabalhar e me dá o exemplo do trabalho. 
Muitas vezes eu paro, exausto, ele começa, é como um exor­
cismo, então eu sinto como se o ritmo não parasse.
Alguma coisa que já está lá toma forma e se põe em 
mo vimento a partir da presença magnetizante de Serpa. É 
como se todo o trabalho da tessitura de seu mundo – tal­
vez de seu próprio Eu – obtivesse, através de Serpa, uma 
ancoragem na Terra.
Como apreciar em toda a sua magnitude, a experiência 
estética que Darcílio Lima deixa com a sua obra? Talvez, 
aproximando­se com suavidade de cada um de seus traba­
lhos e, como quem cola o ouvido na terra, escutar o sibilo e 
o chacoalhar da grande cascavel em seu labirinto.
Guilherme Gutman cursou medicina na Universidade Federal Flu­
minense, fez residência médica em psiquiatria, quando iniciou sua 
formação em psicanálise. Fez mestrado e doutorado no Instituto de 
Medicina Social/Uerj. Trabalhou em muitas instituições psiquiátri­
cas, onde pôde aprofundar a sua compreensão das relações entre 
arte e loucura. É professor adjunto do Departamento de Psicologia 
da PUC­Rio, psicanalista e autor de vários artigos e capítulos de li­
vro. Nasceu, vive e trabalha no Rio de Janeiro.
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68 x 51cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
[DetaLHe | DETA IL ]
19
20
21
SurrealiSmo FantáStico
mário Pedrosa
Eis aí uma expressão arcaica num mundo contemporâneo. 
Quero dizer, fora de moda. Mais ainda, – inatual. Seu autor 
é, porém, jovem, muito jovem.
Se ele fosse apenas um desatualizado, ou mais um “pri­
mitivo”, era de se passar adiante, sem comentários. Mas 
não é esse o caso de Darcílio Paula Lima. O caso não está 
nos seus desenhos. O caso está nele.
Um desenho a bico de pena, finíssimo, de estrutura 
di ga mos acadêmica, não tem, entretanto, procedência em 
ne nhum figurino, daqui ou de alhures. O desenho é instru­
mento, meio para um fim: a mensagem que Darcílio traz e 
espera comunicar, com graves cogitações de uma ordem 
que transcende a “beleza” ou “habilidade” (aliás extraor­
dinária) de seu traço sutil, preciso, com impulso próprio 
e certeiro que vai de uma textura a outra, sem hesitação, 
sem interrupção. Essa certeza de “tiro” está a indicar que 
Darcílio está lendo lá dentro, de seu ego, algo muito claro 
e que o impele a transcrever no papel. Ele tem de dizer o 
que diz e o faz da maneira que faz, por ser artista, isto é, 
não só um talentomas um súdito do mundo interior com 
uma mensagem, uma terrível mensagem.
A certeza, a inevitabilidade de seu traço vem do artis ta, 
mas compulsão sob a qual age vem possivelmente de outras 
profundezas. O artista é, sobretudo, a personificação de um 
cavaleiro andante de outras eras, que traz consigo.
Por coincidência, tem contas a ajustar, atualíssimas. 
Pelo mundo corre uma formidável revolução não política, mas 
de consequências pelo menos tão profundas quanto aquela.
É a já tão celebrada “revolução sexual” que se exprime 
na ação pela transformação dos costumes realizada na prá­
tica sobretudo pelas juventudes do mundo.
Reprodução do cartaz 
de exposição realizada 
na galeria L’Atelier com 
texto de Mário Pedrosa | 
Reproduction of the poster 
of the exhibit staged 
at L’Atelier Art Gallery 
with a text by Mário 
Pedrosa, 1968, 60 x 38cm
Coleção | Collection 
Família Ivan Serpa
22
Começada pelos “beats”, é continuada e aprofundada 
pelos “hippies” e com menos compromissos, ou ao contrá­
rio por vezes com acentos de insuportável mundanismo nas 
chamadas artes plásticas.
Refiro­me ao movimento que alguns no seu incurável 
mundanismo acadêmico chamaram até de “escola de te­
mas eróticos”.
Darcílio estaria também classificado nesse movimento 
ou escola estética dita erótica? É preciso colocar os pontos 
nos ii e ele não está se divertindo com o “tema” para ser 
“atual” ou estar na moda.
Darcílio se debruça sobre o corpo, um esquema de cor po 
de identidade vaga, indefinida, antes quase alegóri ca. Tem, 
por vezes, cabeça de águia ou de serpente, de grifo, com 
os pés em garra, plantas, rabos de centauros. Há aqui os 
elementos simbólicos de uma zoologia fantástica. Os lar­
gos corpos espalhados sobre o papel, às vezes em diagonal, 
como se avançassem numa ciranda, ou, simplesmente, ere­
tos de cabeça em coroa ou plumas, abrem­se sempre nos bu­
racos fatídicos, vagina, ânus, boca. Também sempre se des­
membram nas juntas, nos antebraços, nos joe lhos; dessas 
subaberturas saem anfisbenas, harpias, falos gigantes que 
se enterram orifícios adentro. Há ali uma violenta negação 
da carne que só aparece, aqui ou ali, nos sombreados que se 
aproximam das aberturas genitais. São os raros momentos 
de um desenho realmente sensual. Os corpos são vazios, 
apenas com a pele por fora, e ocos para de lá dentro brota­
rem novas figurações, novos atos de copulação, novas aber­
rações, línguas serpentinas chamejantes ou devoradoras.
Um detalhe significativo que se repete é o do cruci­
fixo, em que a imagem do crucificado, com pregos e tudo, 
aparece sempre em ereção. As cruzes, os emblemas pa­
palinos, inclusive de Pio X, indicam onde se encontra o 
ponto de convergência dessa imaginária que não é tanto 
erótica como herética. Não em vão sua fase anterior con­
sistiu na série O Cristo e a Matéria, em lápis de cera. Então 
descobriu no mistério do Cristo a volúpia desesperada da 
carne. Darcílio passou a combater os dragões da concupis­
cência, que para ele se encarnam no misticismo da Igreja. 
Ele opõe ao misticismo a santidade do amor erótico. Num 
de seus desenhos, é evidente que a entidade impessoal do 
Papa, descarnado, está ali representada com uma máscara 
ao pei to, a tiara à guisa de cabeça, tendo numa garra uma 
23
es pécie de gaiola onde um rato rói a coroa de espinhos 
como ossos e numa ponta de pano há mais um crucificado 
de falo em riste. De um braço enrolado numa serpente sai 
uma cabeça de águia de dentes afiados, em cuja goela uma 
mulher é acariciada e deglutida ao mesmo tempo. Numa 
pata de garras abertas um bruto prego vara­lhe a palma, 
enquanto a outra se termina em seio feminino, que vem 
lamber um grifo de cauda festiva.
Esse surrealista autêntico do Ceará é um homem de 
hoje. É irresistível sua aproximação com outra figura atua­
líssima em seu formidável arcaísmo. É um profeta, precur­
sor da revolução da liberdade sexual contra os tabus reli­
giosos institucionalizados nas velhas igrejas. Trata­se, é 
cla ro, de Buñuel. Darcílio descende da mesma família. 
Rio, janeiro de 1968.
Mário Pedrosa (1900­1981) foi um importante crítico de arte brasi­
leiro, de atuação e projeção internacional. Intelectual e pensador 
po lítico, acompanhou desde a juventude o movimento de renovação 
cul tural e artística do Brasil. Militante, foi um dos fundadores do Par­
tido Comunista Brasileiro com o qual rompeu. Participou da IV In­
ternacional Trotskista do qual foi desligado. Exilado na era Vargas 
para os Estados Unidos, regressou ao Brasil findo o período ditato­
rial e, sem abandonar o interesse político, passou a dedicar­se pri­
mordialmente à crítica de arte. Publicou ensaios acadêmicos, bem 
como artigos na Tribuna da Imprensa, Correio da Manhã e Jornal do 
Brasil. Colaborou com a criação do MAM­RJ, foi um dos principais 
organizadores da II Bienal de São Paulo (1953/54), diretor do MAM­
­SP e secretário­geral da IV Bienal de São Paulo (1957). Foi vice­
­presidente da Associação Internacional de Críticos de Arte (1957­
70) e presidente da Associação Brasileira de Críticos de Arte, seção 
nacional da AICA (1962). Organizou o Congresso Internacional de 
Crí ticos de Arte (1959) que versou sobre a cidade de Brasília. Par­
ti cipou de numerosos júris de bienais de arte internacionais. Foi 
defensor do abstracionismo, do concretis mo e do neoconcretismo. 
Acompanhou e estimulou o trabalho de influentes artistas brasilei­
ros, como Lygia Clark, Hélio Oiticica, Lygia Pape, Amilcar de Castro, 
Mira Schendel, Alfredo Volpi e muitos outros. Já idoso, foi um dos 
fun dadores do Partido dos Trabalhadores.
24
25
dePoimento antonio manuel
antonio manuel
Guilherme Gutman
afonso costa
afonso costa [ac] Antonio, em primeiro lugar, obrigado por 
você nos atender, dando seu depoimento. Estamos muito 
orgulhosos de fazer este resgate de Darcílio Lima, um ar­
tista que, na verdade, está no ostracismo, numa espécie de 
limbo. Na pesquisa que fizemos, tentamos encontrar tra­
balhos dele em instituições e museus, e não existe nada. 
O único trabalho que achamos é o da coleção Gilberto Cha­
teaubriand, que se encontra em comodato no MAM. Mas 
também encontramos o que era a coleção de Ivan Serpa, 
que hoje pertence a seus filhos, e selecionamos muitos dos 
trabalhos que eles têm de Darcílio. E isso deu corpo à expo­
sição, tornou­se seu núcleo principal, e complementamos 
com outros trabalhos de colecionadores particulares, nesse 
garimpo de encontrar as coisas dele. 
Eu te conheci no MAM, por volta de 1967/68, eu era garoto 
e comecei a frequentar o museu, e tinha aulas com Ivan 
Serpa. Foi nessa época que todos nós nos conhecemos, e 
foi quando eu conheci Darcílio também. Você conheceu o 
Darcílio lá? Como você conheceu o Darcílio?
antonio manuel [am] Não me recordo muito bem, mas com cer­
teza foi por intermédio do Serpa. Eu frequentava a casa 
dele no Meier, na rua Juruviara. Estive lá diversas vezes, 
Serpa recebia nos fins de semana, e eu sempre me encon­
trava com o Darcílio por lá. Muitas vezes a gente voltava 
do Meier para o Centro juntos, no ônibus – acho que o 455, 
e vínhamos conversando, trocando ideias. Essa relação se 
dá, então, pelo Serpa, não aconteceu no museu. Foi na pró­
pria casa do Serpa, acho que em 1967.
Antonio Manuel 
e / and Darcílio Lima
Che Guevara
Serigrafia de Antonio 
Manuel aquarelada 
por Darcílio Lima, 
s/d | Screen­print 
by Antonio Manuel 
& Watercolor by 
Darcílio Lima, 
undated, 77 x 58,5cm
Coleção | Collection 
Marcia e Luiz 
Chrysostomo
[DetaLHe | DETA IL ]
26
ac Encontramos um pôster de uma exposição que Darcílio 
fez na galeria L’Atelier, em 68.O pôster não reproduz ne­
nhum trabalho dele, apenas um texto de Mário Pedrosa. 
Você não tinha propriamente um encontro direto com Dar­
cílio, era sempre através ou do Serpa ou do Mário? Ou seja, 
você não tinha uma relação direta com Darcílio, ou dele ir 
à sua casa, ou vocês saírem juntos?
Gostaria de saber também o que provocou Darcílio a traba­
lhar em cima da sua serigrafia de Che Guevara? Coisa que 
Serpa também fez. Eu conheço exemplares dessa serigrafia 
aquarelados tanto por Darcílio, quanto por Serpa. 
am Na verdade, houve uma relação, sim, com Darcílio, não 
só na casa de Serpa, mas eu me recordo de duas vezes ir 
com ele na Casa das Palmeiras, onde ele era frequentador e 
aluno, na rua Haddock Lobo, na Tijuca. Eu tinha um ateliê 
na Glória, e uma vez Darcílio apareceu lá. Combinamos, e 
eu me atrasei mais de duas horas, e ele deixou um bilhete, 
chateado, dizendo:
– Pô, nós marcamos às onze horas, e quando bateu 
uma hora, como você não apareceu, fui embora!
Nesse bilhete ele fez um desenho de um cálice de cujo in­
terior saíam duas mulheres nuas, enfim, algo fantasmagó­
rico, e que no momento não consigo encontrar, está perdido 
aqui no meu ateliê.
Então, tinha essa relação, um pouco fora da casa do Serpa, 
eventualmente no MAM também. 
Respondendo a questão das serigrafias: eu tinha combi­
nado com o Serpa e a Lygia Pape, nós três; que cada um 
faria um trabalho gráfico e passaria para o outro interferir. 
O Serpa interfere na minha serigrafia, eu interfiro na da 
Lygia Pape, e assim vai. O Darcílio morou lá na casa do 
Serpa, e era querido da família... da Lygia, mulher do Serpa, 
do Serpa, e dos filhos, ele virou um membro da família. Ele 
trabalhava vinte e quatro horas naquele ateliê, e o Serpa 
obviamente deu essas minhas serigrafias do Che Guevara 
para ele interferir também. 
guilherme gutman [gg] Você disse que às vezes vocês voltavam 
de ônibus, que tinham esses encontros. Como é que eram 
27
as conversas dele? Ele falava mais de arte, ele falava mais 
da vida, mais de coisas dele? Você saberia dizer se tinha 
alguma coisa em particular que chamava a sua atenção?
am Eu acho que tinha alguma coisa sim... Mais aberta da 
vida, da vida em si, mesmo. Agora, uma coisa específica de 
arte, não me recordo. Mas situações, como da Casa das Pal­
meiras ele narrava, e de algumas pessoas dali que tinham 
o trabalho interessante. Enfim, ele afirmava que ele gosta­
ria de ir para o exterior, de expor fora; tinha umas coisas 
assim, de realizar um sonho, um desejo de ir pra frente, de 
projetar o trabalho, ele tinha muita segurança no que fazia. 
Tem um lado também bastante afetivo. Por exemplo, o meu 
primeiro analista, quem me apresentou foi ele.
gg Ah, é?
am É. Numa dessas conversas do ônibus, voltando da casa 
do Serpa, eu falando da minha necessidade de fazer uma 
aná lise, uma coisa assim, e ele me apresenta o meu pri­
meiro analista.
ac Era analista dele?
am Não era analista dele, mas era um pouco ligado à Casa 
das Palmeiras.
Um dia ele me levou na porta do analista em Copacabana, 
tocou a campainha, e foi me apresentando ...
– Esse é o Antonio, de quem te falei!
E aí, surgiu minha primeira sessão, via Darcílio. 
Enfim..., na época, eu era ainda um adolescente, 18/19 anos, 
uma rebeldia e um inconformismo enorme, e eu conversava 
isso com ele.
Esse é um dado generoso do Darcílio. Eu não pedi nada, 
ele mesmo se ofereceu e conversou com o analista... E eu 
passei a pagar esse analista com trabalhos. A cada duas 
consultas, dava um desenho para ele. No final, dois anos 
depois, ele me chamou lá, fomos ver todos os desenhos, e 
ele devolveu tudo para mim, e disse: “Olha, isso tem mais 
28
valor na sua mão do que na minha. Só quero uma coleção 
de fotografias desses trabalhos.” Esses desenhos estão 
guar dados comigo até hoje, são trabalhos bastante livres, 
soltos, espontâneos. 
ac Darcílio era um virtuoso, com aquele trabalho pontilhista 
e obsessivo, certo? É uma verdade indiscutível.
am Mas o Serpa deu uma disciplina para ele. O Serpa foi 
fundamental na vida dele... Fez isso acontecer! Eu me lem­
bro dos primeiros desenhos dele; eram em lápis de cera, 
uns desenhos um pouco soltos, sem organização. Com o 
Serpa, não: ele cria uma disciplina, ele vai trabalhar todo 
dia, mora lá, e o trabalho dele cresce bastante. A escala do 
desenho é maior, a parte gráfica é mais rica e surge o pon­
tilhismo. A força de comunicação é maior. O surrealismo 
do Darcílio vai mais além ainda. Essa disciplina do Serpa 
foi fundamental para ele. Foi fundamental para melhorar 
a sua vida financeira, porque o Darcílio passou a vender 
seus trabalhos para os colecionadores do Serpa. Tem uma 
foto, que o Guilherme mostrou, dos dois no ateliê de Ivan 
Serpa; os dois trabalhando um do lado do outro, na mesma 
mesa. E era assim mesmo, um influenciava o outro; tinha 
um diálogo, uma relação nesse trabalhar, não é? Ele tam­
bém estimulava o Serpa, porque o Serpa era um apaixonado 
por arte. Então um trabalhando ao lado do outro é a parce­
ria perfeita, um estímulo genial. E há semelhanças. Alguns 
desenhos do Serpa têm semelhança com os do Darcílio. 
Aquelas mulheres, aquelas bundas que o Serpa fazia com 
pontilhismo, aquilo passa para o Darcílio. 
ac Há até trabalhos assinados pelos dois. O Guilherme, por 
exemplo, tem na coleção dele um trabalho que é dos dois. 
Quer dizer, você vê claramente o que foi feito pelo Serpa, 
advindo daquela série dos bichos, e o que foi feito pelo 
Darcílio. Você reconhece perfeitamente o que é de um e 
de outro. Mas existe uma sintonia entre os dois, e o tra­
balho se funde de uma forma bastante fluida. Não há um 
antagonismo mas sim um verdadeiro casamento, uma ver­
dadeira simbiose.
Depois que Darcílio ganha aquele prêmio de viagem, e 
vai morar na Europa, onde na França conheceu o Dali, o 
Labisse, enfim, conheceu vários surrealistas, expôs com 
29
eles, aconteceu algum movimento e tal. Mas quando ele 
retorna... Como foi? Por que ele sumiu?
am Eu não me recordo; não me lembro direito... mas ele 
sumiu, é verdade. Sumiu com essas viagens... Mas eu me 
lembro de algumas conversas dele, quando retornou, me 
mostrando recortes de jornais, revistas, do sucesso que 
foi o trabalho dele lá fora, principalmente na França. Tor­
nou­se um artista importante, afinal expôs com Dali. Mas 
depois eu perdi o contato com ele. Soube que ele tinha 
voltado para Cascavel, e depois não o vi mais; não tive 
mais notícias dele.
ac Acho que foi justamente quando ao voltar de Cascavel, 
ele foi para Cabo Frio e ficou morando por lá, até que de­
pois ficamos sabendo que Darcílio tinha morrido em um 
aci dente absolutamente estúpido. Ele caiu de uma bici­
cleta, bateu a nuca no meio­fio e morreu. Depois, ninguém 
nun ca mais falou de Darcílio; ele desapareceu. Embora, 
ain da antes dele morrer, tenha acontecido a exposição na 
Casa Laura Alvim, quando Célia Resende dirigia a casa, 
junto com Stella Marinho, que eu creio que exercia a presi­
dência na época. Conseguimos uma foto da abertura dessa 
exposição onde todos eles aparecem.
am Acho que sim... Eu também perdi o contato, e a gente não se 
viu mais. Foi por aí. Mas não me recordo exatamente quando. 
ac Tem mais alguma coisa que você gostaria de dizer? 
gg Sobre ele, sobre o trabalho dele...
am Ele surge de uma forma bastante rica e impressiona as 
pessoas pelo seu trabalho, pela sua evolução, inclusive 
Mário Pedrosa, como eu já disse. Um artista, enfim, que 
trabalha com o surreal, mas com uma força erótica extra­
ordinária, e uma técnica também forte que lhe ajuda nessa 
comunicação. É um artista único e extraordinário.ac Mais uma coisa: apesar de toda essa veia erótica do tra­
balho de Darcílio, ele te falava alguma coisa do comporta­
mento erótico pessoal dele, das relações dele, de alguma 
30
coisa sexual, ou ele era uma pessoa extremamente reser­
vada em relação a isso? Ou não, ou ele era um fauno, ou 
uma pessoa que se atirava nesse tipo de aventura, porque 
essa veia erótica do trabalho dele é absolutamente deter­
minante com todos aqueles falos, vaginas, cobras, línguas, 
peitos e mamilos, bundas e o diabo! O trabalho dele é um 
manancial de símbolos eróticos, certo?
am Não, ele comigo foi muito reservado sempre. Não rolava 
esse tipo de assunto, não me recordo de ter conversado 
com ele sobre isso, de ele ter se manifestado alguma coisa 
dessa situação sexual. Eu acho que ele colocava tudo isso, 
essa questão aparecia no trabalho. Não havia comentários 
de namorada, ou de namorado, isso eu nunca ouvi. Parece­
­me que todo esse erotismo ia para o trabalho, as mulheres 
saindo de um cálice, nuas, dentro de um copo de champa­
nhe é extraordinário.
gg Darcílio frequentou o seminário também. Ele pega ele­
mentos religiosos e transmuta aquilo.
am Sexualiza, não é?
ac É, ele foi seminarista. Nós conseguimos uma foto dele 
adolescente, de batina, como seminarista. 
am Ele era do seminário. Você lembrou um elemento forte, 
marcante, no trabalho e na vida dele. Às vezes extravasava 
isso até com as roupas e com o trabalho. Um dado que eu 
acho importante é que Darcílio Lima vem pela Dra. Nise 
da Silveira; ele surge pela Casa das Palmeiras. Esse é um 
dado fundamental do seu percurso.
ac Ela foi a primeira pessoa...
am Pessoa antenada! Maravilhosa! Pegou o Raphael, o 
Emygdio, veio o Darcílio também nesse bolo. Pela Casa das 
Palmeiras, vai para o Serpa, encontram­se, expandem­se, e 
depois frequentam o Pedrosa, vivendo uma riqueza evolu­
tiva, de uma força extraordinária.
31
gg São dois lugares muito pulsantes, não é? A Casa das Pal­
meiras e a casa do Serpa, os dois polos irradiadores, não é?
ac E o MAM! O MAM naquela época era o... 
am Claro, o MAM! 
ac ...era o centro do Rio de Janeiro. Todo mundo ia para o 
MAM, para a cafeteria do MAM, e tudo acontecia no MAM 
e no seu entorno.
am Eu ainda estou na busca do desenho do Darcílio. O do 
bilhete ... É pequenininho...
ac Vamos torcer para que você o localize até a exposição. 
Você tem algum outro tipo de documentação dele? Fotogra­
fias, cartas, alguma coisa mais?
am Não, não tenho. Só a memória do bigode dele. Mas eu 
ainda vou achar esse desenho!
ac Antonio, muito obrigado. Seu depoimento foi de uma ri­
queza única, inestimável!
Antonio Manuel, pintor, escultor e cineasta, nas cido em Portugal em 
1947, chega ao Brasil em 1953, e fixa residência com sua família no 
Rio de Janeiro. Em meados da década de 1960, frequenta o ateliê de 
Ivan Serpa e suas aulas no MAM­RJ. Inicialmente, utiliza o jornal e 
sua matriz – o flan – como suporte para seus trabalhos, onde aborda 
temas políticos e discussões esté ticas. Posteriormente, produz vá­
rios filmes de curta­metragem. A partir da década de 1980, realiza 
pinturas de caráter abstrato­geométrico. Suas obras provocam uma 
reflexão sobre o contexto social e político brasileiro. Com um exten­
so currículo de exposições em im portantes galerias, museus e insti­
tuições, este ano representou o Brasil na Bienal de Veneza.
32
Caricatura de Darcílio Lima, feita 
por Sami Mattar, s/d | Caricature of 
Darcílio Lima by Samir Mattar, undated
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Caricatura de Darcílio Lima, feita por 
Ziraldo | Caricature of Darcílio Lima 
by Ziraldo, 1968
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
33
dePoimento YveS SerPa
Yves serpa
Guilherme Gutman
guilherme gutman [gg] Yves, muito obrigado por nos receber. 
Como você já deve saber, estamos realizando um resgate 
da obra e da vida de Darcílio Lima. Além das obras, a ex­
posição incluirá documentação e fotos para compor uma 
memorabilia sobre ele. Nessa pesquisa, é fundamental re­
conhecer a importância de seu pai, Ivan Serpa, na formação 
de Darcílio como pessoa e como artista. Para começar, fale 
um pouco da sua relação com ele.
Yves Serpa [YS] Eu tinha 14 anos quando ele [Darcílio] veio mo­
rar aqui em casa, por volta de 1965. Meu pai o conheceu 
na Casa das Palmeiras, lugar que ele ia muito porque era 
amigo da Dra. Nise da Silveira e também para estudar o que 
acontecia com aqueles ditos loucos. Ele foi se fascinan do 
com o que via por lá e Darcílio foi um dos alunos que mais 
lhe chamou a atenção. Tempos depois, chegou a um ponto 
em que o Darcílio estava com dificuldades, mas sua famí­
lia era do Ceará e ele estava meio desconectado deles. En­
tão, meu pai o trouxe aqui para casa. Na época todo mundo 
achou que meu pai era louco por trazer para dentro de casa 
uma pessoa egressa de uma instituição psiquiátrica. En­
tão, meu pai afirmou: “não, ele não tem nada de doente. 
Darcílio é um gênio; ele precisa é de ter alguém que possa 
alavancá­lo”. Ele foi se moldando à família e a família se 
moldando a ele. Ele veio para cá e a gente conversava muito, 
brincava muito... 
34
gg Tinha humor.
YS É! Vivia rindo. Ele era, digamos assim, sério e compe­
netrado na hora em que estava desenhando. Era aquela 
hora que ele saía do mundo para fazer o trabalho dele, 
a obra dele. Quando terminava, voltava aquela alegria, 
aquela brincadeira. Estava sempre rindo. Ele era uma pes­
soa muito alegre.
gg Na época ele ainda era muito novo, tinha uns 18 anos, 
certo?
YS Por aí, 18, 19 anos. Ele era um pouco mais velho do que eu...
gg E ele ficava completamente integrado? 
YS Totalmente. Era um membro da família. Ele não era um 
visitante, nem era um empregado! Ele virou um membro da 
família. Nós somos três filhos, mas muitos foram se agre­
gando, então, meus pais criaram mais seis. Lembro de um 
primo que veio para ficar um ano e ficou dez. Eu também 
tenho uma irmã de criação que chegou com dois anos e 
saiu para casar. E com Darcílio foi assim também, ele veio 
e tornou­se um filho. 
Ele entrou na família sem rótulos. Meu pai tinha muito de 
amigo, de pai, de irmão. 
gg Vocês se davam bem?
YS Tranquilo. Ele sempre foi muito divertido e brincalhão.
gg Divertido como?
YS Darcílio era uma pessoa pura; falava o que pensava e 
às vezes brincávamos dizendo “acho que esse cara ainda 
tá doido!” Mas, depois percebíamos que não, que ele era, 
de fato, uma pessoa muito pura, que não via maldade nas 
coisas que nós víamos por estarmos em um mundo mais 
cruel. Era época de revolução, logo após a revolução, então, 
todo mundo estava muito ressabiado com relação a tudo, 
35
e ele não estava preocupado com isso; ele queria fazer os 
desenhos dele, o negócio dele era outro, não era política!
gg Em relação ao universo do desenho dele, sobretudo 
quando se vincula a Ivan Serpa, seu pai, surge um universo 
onde entra violência, sexualidade, uma orgia louca que, na 
verdade, ele não vivia, mas que aparecia no seu desenho, 
você concorda?
YS Exatamente. Por isso que parecia que ele saía do mundo, 
ia para outra dimensão onde ele fazia sua obra. Outra coisa 
que se pode constatar é que, no início, sua obra era, sobre­
tudo, em preto e branco. Só mesmo desenho com nanquim. 
Mais adiante, ele começou a inserir cor. E se você observar, 
os trabalhos dele com cor são trabalhos lindíssimos. Um co­
lorido muito próprio, exuberante. Uma coisa bem marcante 
mesmo, bem pessoal.
gg É verdade, tem isso: além dos temas, tudo é muito exu­
berante e vibrante. 
YS No trabalho de Darcílio, a aquarela que se vê que é 
uma aquarela diferente. Porque a aquarela normalmente é 
aquela coresmaecida... A dele não! É a cor vibrante!
gg Pensei exatamente nisso, porque tem algo ali que pode­
ria até ser lido nos desenhos, que autoriza totalmente essa 
leitura, como uma coisa de uma eletricidade, uma agressi­
vidade, até uma possível violência.
YS Provavelmente era isso. Era uma maneira de ele descar­
regar, embora ele fosse uma pessoa calma.
gg E quanto à vida pessoal? Ele tinha amigos? Você sabe 
de alguma coisa?
YS Quando ele veio aqui para a nossa casa, os amigos dele 
eram os que ele conheceu na Casa das Palmeiras. Depois 
ele foi conhecendo toda aquela turma de alunos do meu pai 
que frequentava nossa casa e, a partir daí, ele começou a 
ter uma nova vida. 
36
gg Uma das fotos que mais me chamou a atenção é aquela 
que mostra o seu pai e Darcílio trabalhando muito próxi­
mos, na mesma mesa. Essa convivência traz para ele muito 
mais força, concorda? 
YS Claro que sim, é o que provavelmente aconteceu. O meu 
pai incentivou Darcílio a se soltar.
gg Você acha que Darcílio precisava dessa espécie de 
autorização?
YS Darcílio precisava disso, de alguém falar para ele: “Você 
quer fazer, então faz! Não se prenda, vai”, ou “O que você 
quer, é isso? Conseguiu? Não? Então faz de novo!”
gg Mas, olhando uma coisa mais técnica de Darcílio, a sen­
sação é que ele pegou alguma coisa.
YS Não, exatamente. Essa exigência de ficar pronto do jeito 
que foi pensado, ele absorveu, entendeu? Ele era meticu­
loso. Meu pai era muito exigente, se uma obra não ficasse 
perfeita, ele a destruía, e Darcílio também destruiu muita 
coisa, pois ele começou a ter aquela consciência da legi­
timidade do trabalho. O trabalho tinha de ser legitimado 
pelo que foi pensado. Essa cobrança ele também incorpo­
rou à sua rotina. É possível perceber que o trabalho do 
Darcílio é muito meticuloso; ele tem um equilíbrio incrível.
gg Eu acho que essa meticulosidade é uma característica 
de muitas fases de seu pai. Por isso que eu fico pensando 
que quando Ivan Serpa estava fazendo aqueles opticals, 
mais pontos de luz, na mesma época Darcílio começou a 
exercer o pontilhismo.
YS Darcílio também enveredou por esse caminho.
gg Por isso eu acho que ele também teve influências.
YS Mas, em momento algum ele copiou. Ele pegava, por 
exemplo, uma técnica que ele via, falava assim: “poxa, isso 
dá para incorporar no meu trabalho”. Ele não violentou o 
37
seu trabalho. Ele incorporou certas técnicas ao trabalho, 
sem se violentar. Isso é importante também. É você ver o 
trabalho de um artista, ver uma técnica, ficar fascinado por 
aquilo ali e ver como você pode usar aquela técnica no seu 
trabalho para se reinventar!
gg Você acha que Darcílio foi fiel a isso?
YS Sim, e ele também começou a ler sobre arte. Muito. Nós 
tínhamos por volta de quatro mil livros. E Darcílio tinha 
aces so a isso
gg Isso me leva a pensar em outra pergunta: Darcílio tinha, 
como influência ou como interesse, algum artista ou alguns 
artistas em particular, antigos ou contemporâneos?
YS Ele gostava muito de Dali. Dali sempre foi um norte. Ele 
achava que o Dali tinha, digamos, a mesma liberdade que 
ele. Ele falava muito de Dali; gostava e falava muito de meu 
pai, gostava de outros artistas com trabalho muito meticu­
loso, como Paulo Garcez. Eles chegaram a se conhecer aqui.
gg Ele tinha alguma consciência do valor do trabalho?
YS Tinha. Talvez não no início. Mas, depois, ele começou a ter 
noção de que o trabalho despertava o interesse das pessoas. 
No início, ele achava até muito engraçado, “Pô, tem gente 
à beça gostando do que faço”, mas depois conscientizou. 
gg Darcílio passou uma imagem de quase como se fosse 
meio casto. Você sabe se ligou a alguém?
YS Não, não, emocionalmente eu acho que não...
gg Se ninguém falou disso, acho que realmente não aconteceu. 
YS Não. Ele era uma pessoa que você conhecia e ficava 
ami go. Acho que ele nunca perdeu a pureza, entendeu? Ele 
foi se informando, foi se moldando, mas continuou sendo 
aquela pessoa que tinha uma alegria própria, luz própria. 
38
Eu costumo falar: ele tinha luz própria, não precisava de 
ninguém para jogar holofotes sobre dele. Ele se iluminava; 
iluminava o caminho dele... Seu trabalho era de primeirís­
sima qualidade, sempre foi. Era um artista na expressão 
da palavra. Ele era um virtuoso! Um produtor de obras de 
arte. E, infelizmente, não foi comercialmente reconhecido. 
Até que na Europa o trabalho dele teve uma valorização 
boa, mas, como ele morreu há um tempo e não houve um 
trabalho para divulgar sua memória, essa valorização não 
se manteve.
Ele era uma pessoa pura, uma alma pura. De uma alegria! 
Tinha momentos de tristeza. Tinha, mas ele equacionava 
para ficar alegre novamente. 
gg Mas tinha uma coisa excessiva essa alegria ou...
YS Não! Ele procurava manter­se alegre, entendeu? Não era 
euforia. Era alegria. Procurava se manter alegre, sempre 
sorrir. Meu pai também tinha muito disso. “A gente tem 
que se manter em alegria... procurar manter um equilíbrio 
positivo, porque se você ficar nessa só de problema, tris­
teza, você só atrai coisa negativa para você, certo?” Eu 
acho que Darcílio herdou isso: procurar manter­se alegre, 
conectado de uma outra maneira. 
gg Yves, agradecemos muito pelo seu tempo e pelo depoi­
mento tão esclarecedor e relevante!
Yves Serpa, desenhista e pintor, nascido em 1951, é filho do reno­
mado pintor Ivan Serpa, e iniciou sua carreira aos cinco anos na Es­
co linha de Artes do MAM­RJ. Tendo realizado diversas exposi ções 
e recebido prêmios, sua obra transita entre o concretismo e a op­
­art. Conviveu ainda jovem com Darcílio Lima, quando este mo rou 
por alguns anos na casa de seus pais, no bairro do Meier. Atual­
mente trabalha e reside em Maricá, Rio de Janeiro.
39
Sem título, 21/02/1969 | 
Untitled, 02/21/1969 
Nanquim sobre papel | Indian 
ink on paper, 47,2 x 37,4cm
Coleção | Collection Jorge 
Eduardo Lima Figueiredo
[DetaLHe | DETA IL ]
40
41
42
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Sem título | Untitled, 1966
Guache sobre papel | 
Gouache on paper, 41 x 50cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
Sem título | Untitled, 1971
Guache, aquarela e nanquim sobre 
papel | Gouache, watercolor and Indian 
ink on paper, 65,6 x 51,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
43
44
Sem título | Untitled, 1968
Aquarela e nanquim sobre 
papel | Watercolor and Indian 
ink on paper, 47,6 x 38,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
45
Sem título | Untitled, 1968
Aquarela e nanquim sobre 
papel | Watercolor and Indian 
ink on paper, 88,4 x 62,3cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
46
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68 x 51cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
47
48
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68 x 51cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
49
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68 x 51cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
50
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68,5 x 49cm
Coleção Particular | Private Collection
51
52
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Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 67,3 x 48,2cm
Coleção | Collection Fabio Settimi
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 48 x 40cm
Coleção | Collection Carlos Byington
53
54
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 48 x 40cm
Coleção | Collection Carlos Byington
55
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper,48 x 40cm
Coleção | Collection Carlos Byington
56
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 48 x 40cm
Coleção | Collection Carlos Byington
57
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 48 x 40cm
Coleção | Collection Carlos Byington
58
59
Visão | Vision, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 49 x 45,4cm
Coleção | Collection Gilberto Chateaubriand
Nisete no Vale de Deus | 
Nisete on the Valley of God, 1960
Caneta esferográfica e nanquim 
sobre papel | Ballpoint pen and 
Indian ink on paper, 32 x 25,1cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
60
Sem título, s/d | Untitled, undated
Nanquim aquarelado sobre papel | 
Watercolor and Indian ink on paper
55,1 x 39cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
61
62
63
Darcílio Lima e / and Ivan Serpa
Sem título | Untitled, 1971
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 48,2 x 38,3cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
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Sem título, 21/02/1969 | 
Untitled, 02/21/1969 
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 47,2 x 37,4cm
Coleção | Collection Jorge Eduardo 
Lima Figueiredo
64
65
Sem título | Untitled, 1969
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 45,9 x 36cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
66
Sem título | Untitled, 1967
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 51,6 x 40,9cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título, s/d | Untitled, undated
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 50,1 x 41,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
67
68
69
Sem título | Untitled, 1968
Hidrocor sobre papel | Felt tip 
pen on paper, 43,9 x 35cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
70
Sem título | Untitled, 1968
Aquarela e nanquim sobre papel | Watercolor 
and Indian ink on paper, 42,6 x 32,9cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título | Untitled, 1970
Nanquim e hidrocor sobre papel | Indian ink 
and felt tip pen on paper, 47,8 x 38,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
71
72
Sem título | Untitled, 1970
Nanquim e hidrocor sobre papel | 
Indian ink and felt tip pen on paper, 
48,6 x 37,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa 
73
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela, hidrocor e nanquim sobre 
papel | Watercolor, felt tip pen 
and Indian ink on paper, 62,8 x 45,5cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
74
Sem título | Untitled, 1970
Nanquim e hidrocor sobre papel | 
Indian ink and felt tip pen on paper, 
48,6 x 37,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa 
[DetaLHe | DETA IL ]
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela, hidrocor e nanquim sobre 
papel | Watercolor, felt tip pen and 
Indian ink on paper, 62,8 x 45,5cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
[DetaLHe | DETA IL ]
75
Sem título | Untitled, 1970
Hidrocor sobre papel | Felt tip pen 
on paper, 56,2 x 40,9cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
76
Espelho | Mirror, 1971
Lápis de cor aquarelado e caneta esferográfica 
sobre papel | Watercolor pencil and ballpoint 
pen on paper, 51,3 x 51,3cm
Coleção | Collection Marcio Gobbi Fernandes
77
78
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim e aquarela sobre papel | 
Indian ink and watercolor on paper, 
51,8 x 41,9cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
79
80
Sem título | Untitled, 1968
Aquarela e nanquim sobre papel | 
Watercolor and Indian ink on paper, 
36,6 x 31,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
81
Sem título | Untitled, 1969
Hidrocor sobre papel | Felt tip 
pen on paper, 48,4 x 38,9cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
82
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela e nanquim sobre papel | 
Watercolor and Indian ink on paper,
65,4 x 50,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
83
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela e nanquim sobre papel | 
Watercolor and Indian ink on paper, 
63,8 x 48,8cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
84
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela e nanquim sobre papel | Watercolor 
and Indian ink on paper, 62,8 x 47,8cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título | Untitled, 1967
Guache e esmalte sobre papel | Gouache 
and enamel on paper, 48,6 x 39,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
85
86
87
Sem título | Untitled, 1967
Aquarela sobre papel | 
Watercolor on paper, 69 x 54cm
Coleção | Collection Técio Lins e Silva
88
Sem título | Untitled, 1968
Intervenção (desenho) com nanquim sobre 
envelope impresso, postado e selado | 
Intervention (drawing) with Indian ink 
on printed, posted and sealed envelope, 
33,6 x 32,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
89
Sem título | Untitled, 1969
Intervenção (desenho) com nanquim 
e aquarela sobre cartaz | Intervention 
(drawing) with Indian ink and watercolor 
on leaflet, 36,8 x 29cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa 
90
Sem título | Untitled, 1968
Intervenção (desenho) com nanquim e 
guache sobre cartão impresso | Intervention 
(drawing) with Indian ink and gouache 
on printed cardstock, 31,8 x 36,8cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
91
92
Sem título | Untitled, 1968
Colagem sobre papel | Collage on paper, 
40,6 x 37,3cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título, s/d | Untitled, undated 
Nanquim e colagem sobre papel | Indian 
ink and collage on paper, 72,6 x 54,6cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
93
94
Sem título | Untitled, 1967
Pintura bilateral sobre placa de 
madeira | Double­sided painting 
on wood plate, 50 x 26,5cm
Coleção | Collection Marcio 
Gobbi Fernandes
[verso e frente | bAck AnD fronT ]
95
96
Antonio Manuel e / and Darcílio Lima
Che Guevara
Serigrafia de Antonio Manuel aquarelada por Darcílio 
Lima, s/d | Screen­print by Antonio Manuel and 
watercolor by Darcílio Lima, undated, 77 x 58,5cm
Coleção | Collection Laura Olivieri Carneiro de Souza
97
98
Antonio Manuel e / and Darcílio Lima
Che Guevara
Serigrafia de Antonio Manuel aquarelada por Darcílio 
Lima, s/d | Screen­print by Antonio Manuel and 
watercolor by Darcílio Lima, undated, 77 x 58,5cm
Coleção | Collection Marcia e / and Luiz Chrysostomo
99
Antonio Manuel e / and Darcílio Lima
Che Guevara
Serigrafia de Antonio Manuel aquarelada por Darcílio 
Lima, s/d | Screen­print by Antonio Manuel and 
watercolor by Darcílio Lima, undated, 77 x 58,5cm
Coleção | Collection Marcia e / and Luiz Chrysostomo
100
Sem título, 16/05/1966 | Untitled, 05/16/1966
Xilogravura | Woodcut, 44,1 x 37,1cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
101
102
Sem título, s/d | Untitled, undated
Litografia, P.A. | Lithograph, AP, 
74 x 55cm
Coleção | Collection Alex Gama 
103
104
Página anterior | PREVIOUS PAGE 
Sem título | Untitled, 1969
Litografia | Lithograph, 05/50, 
69 x 48,7cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
Sem título | Untitled, 1969
Litografia, P.A. | Lithograph, AP,
59 x 41,3cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
105
106
Sem título | Untitled, 1972
Litografia | Lithograph, 07/25, 
79,4 x 59,4cm
Coleção | Collection Jorge 
Eduardo Lima Figueiredo
Sem título | Untitled, 1972
Litografia | Lithograph, 07/25, 
64,9 x 55,7cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
107
108
109
Sem título| Untitled, 1968
Litografia | Lithograph, 16/60, 88,3 x 69,5cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
Sem título | Untitled, 1970
Litografia, P.A. III | Lithograph, AP III, 
82 x 62cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
110
Sem título | Untitled, 1972
Litografia, P.A. I | Lithograph, AP I,
85,5 x 67,5cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
111
112
Semtítulo | Untitled, 1971
Litografia, P.A. I | Lithograph, AP I, 
86,5 x 66,3cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título | Untitled, 1969
Gravura | Engraving, 02/50, 61,4 x 40cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
113
114
115
Sem título | Untitled, 1972
Litografia, P.A. | Lithograph, AP, 87 x 69cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
116
117
118
PáginaS anterioreS | PREVIOUS PAGES
Sem título | Untitled, 1971
Litografia, P.A. | Lithograph, AP, 
76 x 59cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Sem título | Untitled, 1972
Litografia | Lithograph, 13/40, 
61,3 x 46cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
Sem título | Untitled, 1970
Água­forte, P.A. | Etching, AP, 
70 x 49,8cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
119
120
121
Sem título, s/d | Untitled, undated
Água­forte e água­tinta | Etching 
and aquatint, 80 x 53cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa 
Sem título | Untitled, 1988 
Serigrafia, P.A. 3/3 | Screen­print, 
AP 3/3, 66 x 48,1cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
122
123
124
125
PáginaS anterioreS | PREVIOUS PAGES
[DetaLHes | DETA ILS ]
Sem título, s/d | Untitled, undated 
Pintura sobre vaso de cerâmica | 
Painting on ceramic pot, 48 x 20 x 20cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
Bandeira oficial do município 
de Cascavel (CE) | Official flag 
of Cascavel, Ceará
Poliamida resinado | Polyamide resin, 
130 x 90cm
O desenho foi feito por Darcílio Lima 
em 1983, a pedido do prefeito Jurandir 
Dantas de Sousa | This drawing was 
made by Darcílio Lima in 1983 upon 
request by Mr. Jurandir Dantas de 
Sousa, Mayor
126
127
darcílio (Paula) lima cronoLoGia Da viDa e Da obra
Guilherme Gutman
1944
Nasce em Cascavel (CE). Último filho 
de uma prole de cinco.
Ainda na infância, muda­se para a capital, 
Fortaleza.
Aos dez anos fez a sua primeira exposição, 
ainda no colégio.
1958
Vem para o Rio de Janeiro (RJ). Segundo 
um crítico da época, seus temas eram 
“jangadas e praias”. Aos 15 anos trabalhou 
com guache e aos 20, experimentado a tinta 
a óleo.
1966
Vive em condições adversas, até que 
é acolhido pela Dra. Nise da Silveira 
(1905­1999) na Casa das Palmeiras, lugar 
de promoção da saúde mental, nos moldes 
de uma psiquiatria libertária e sob forte 
influência das teorias de Carl G. Jung. 
Produz vários trabalhos que permanecem 
no acervo da instituição.
Sobre o período anterior a 1966, diz ele: 
Não era aquilo que eu queria, aquelas 
paisagens passivas. Queria uma coisa além 
da realidade. Então comecei a pintar só 
pedras, foi a minha crise. 
Certos quadros eram apenas isso, uma 
imensa e hermética pedra que eu ia 
violentar em seguida. [Em seguida] foi a 
fase dos nus, todos adquiridos por Dona 
Nise da Silveira para a sua Clínica da Casa 
das Palmeiras. 1966, ano da aceitação 
integral da minha verdade.
Grande interesse por leituras de ficção 
científica, Sartre e os evangelhos.
1967
Foi encaminhado pela Dra. Nise ao ateliê 
de Ivan Serpa (1923­1973), que já a 
conhecia a partir do trabalho que 
desenvolveu em conjunto com o crítico 
Mário Pedrosa (1900­1981), com Almir 
Mavignier (1925), então funcionário da 
secretaria do hospital psiquiátrico, e 
com Abraham Palatinik (1928) no Centro 
Psiquiátrico Pedro II (Engenho de Dentro, 
Rio de Janeiro), no final da década de 1940.
Darcílio morou e trabalhou ao lado de Serpa 
por quase três anos. Estimulada por Serpa, 
a sua produção avançou muito, encontrando 
a trilha que, nos anos seguintes, resultou 
no que talvez seja o melhor de sua obra.
Recebe a Grande Medalha de Ouro no III 
Salão de Arte Contemporânea de Campinas 
(SP). Segundo um crítico de arte, membro 
do júri, “Ninguém sabia quem era”.
Sem título, s/d | Untitled, undated
Litografia, P.A. | Lithograph, AP, 
74 x 55cm
Coleção | Collection Alex Gama
[DetaLHe | DETA IL ]
128
1968
Inaugura, em janeiro, sua primeira 
exposição individual,na Galeria L’Atelier 
(Rio de Janeiro), com texto de apresentação 
de Mário Pedrosa. Nessa exposição, um 
jornalista da época afirma, “[Darcílio] 
foi convidado por um militar a retirar as 
estrelas de coronel que usava em sua 
indumentária no dia da inauguração”.
Integra o VI Resumo de Arte do Jornal do 
Brasil, no MAM­RJ e o XVII Salão Paulista 
de Arte Moderna.
Obtém o certificado de isenção de júri 
no XVII Salão Nacional de Arte Moderna.
Participa de várias coletivas: “Mostra de 
arte fantástica – necrológica”, no Floresta 
Country Club (Rio de Janeiro), no qual 
apresenta o objeto A virgem; “Carolina”, 
composta de “interpretações plásticas do 
personagem da música de Chico Buarque 
de Holanda”; e “As eróticas”, no Museu 
de Arte Moderna da Bahia.
Na noite de vernissage de Ivan Serpa, 
uma jornalista do Jornal do Brasil (Rio de 
Janeiro) escreve: Darcílio Lima, também 
pintor, apareceu com um trabalho intitulado 
A noiva. O trabalho: uma jovem, (aluna, 
aliás, de Serpa), vestida com longa veste 
branca, pintada com símbolos e caracteres 
eróticos que só são mesmo entendidos 
quando seu autor os explica, de viva voz.
1969
Integra o VII Resumo de Arte do Jornal 
do Brasil, categoria “desenho” no MAM–RJ.
Capa do livro A Celestina, clássico 
espanhol de Fernando de Rojas, feita a 
partir de desenho original.
Recebe isenção de júri no XVIII Salão 
Nacional de Arte Moderna, e o prêmio 
Assis Chateaubriand no Salão da Bússola.
Participa da Sala Especial Sala de 
Arte Mágica, Fantástica e Surrealista, 
na X Bienal de São Paulo.
Conhece e se aproxima do premiado 
desenhista e gravador Marcelo Grassmann 
(1925),um entusiasta de seu trabalho e o 
introduz na técnica da gravura.
1970
Participa da IV Coletiva da Galeria 
Ibeu– “O rosto e a obra”; da Jovem 
Arte Contemporânea, no Museu de Arte 
Contemporânea da USP e do XIX Salão 
Nacional de Arte Moderna.
Interesse de europeus pelo seu trabalho: 
Mantém contato com Jacques Fouché, 
da Arte­Idéia; ilustra um texto de Jean­
Jacques Pauvert para a revista francesa 
Bizarre. E acerta com Eric Losefeld o 
lançamento de um livro de desenhos para 
a sua editora, segundo um jornalista do 
Correio da Manhã (RJ).
Darcílio Lima na 
Primeira Comunhão, 
s/d | Darcílio Lima 
receiving his First 
Communion, undated
Darcílio Lima no 
seminário, s/d | 
Darcílio Lima in the 
seminary, undated
Darcílio Lima no 
carnaval, s/d | Darcílio 
Lima during the 
carnival, undated
Darcílio Lima servindo 
o Exército, s/d | 
Darcílio Lima serving 
the Army, undated
129
1971
Ganha o prêmio de Viagem ao Exterior 
no XX Salão Nacional de Arte Moderna, 
no MAM–RJ.
Integra o III Panorama de Arte Atual 
Brasileira, no MAM–SP.
Aparece na revista londrina Art and 
Artists em imagens e em texto crítico 
de Beresford Evans.
1972
Comentário de um crítico: Aplicando o 
prêmio [de viagem ao exterior], realiza um 
périplo de viagens que o teria levado aos 
extremos de Nova York, Cairo, Medina, 
Turquia, Paris, Escócia e Weimar. Há 
também referências à “Escócia [onde teria 
vivido em um castelo], à Floresta Negra 
e à Áustria”.
Durante sua estada de dois anos em Paris, 
assinou contrato com a editora de gravuras 
Vision Nouvelle, a mesma de Miró, Dali e 
Vasarély.
Publica o texto “Vision contemporary” 
na revista inglesa The Image, acompanhado 
de imagens de seus trabalhos.
Apresenta exposição na galeria Trois, 
Pleux, Deux, em Paris.
1974
Tem trabalhos incluídos na Mostra 
de Gravura Brasileira, Fundação Bienal 
de São Paulo.
1975
Retorna ao Brasil.
Publicação do livro Darcílio Lima, 
diafragma, primeiro número da Coleção 
Arte Hoje: Almas e Climas (Rio de Janeiro: 
Etcetera Edições).
Participa da XIII Bienal de São Paulo.
Realiza exposição na Galeria Bonino;a 
última organizada pelo artista, quando 
saiu do cenário artístico e ninguém sabia 
notícias suas. 
1976
Participa da Bienal Nacional com três 
desenhos, em bico de pena, da série Legião 
e outros dois da série Diafragma, um dos 
quais reproduzido no catálogo.
1982
Volta para Cascavel (CE).
1983
A pedido do prefeito, desenha a bandeira 
oficial de sua cidade natal.
130
1985
Um jornalista que o encontra em Cascavel 
relata: “Deparei­me com um mendigo de 
olhar perdido, cabelos ralos e mal cuidados. 
[...] Morava agora nos fundos de uma velha 
igreja Batista, ao lado de um cemitério”. 
Começa a ser articulado o seu retorno ao 
Rio de Janeiro.
1986
Possível ano de retorno ao Rio de Janeiro.
1988
Última exposição em vida, na Casa de 
Cultura Laura Alvim, no Rio de Janeiro.
1990
Foi morar em Búzios (RJ), onde voltou 
a produzir em óleo sobre tela.
1991
Morre em Cabo Frio (RJ), em 31/08, em 
consequência de uma queda sofrida em 
Búzios, seguida de traumatismo craniano.
2000
Tem obra exposta na “Mostra do 
Redescobrimento”, Fundação Bienal de 
São Paulo, São Paulo.
2001
Quinze desenhos sobre papel, produzidos 
em 1966, na Casa das Palmeiras, são 
apresentados em “Inconsciente e criação”, 
no Museu Nacional de Belas­Artes, 
Rio de Janeiro.
2004
“Mar do inconsciente: a imagem como 
linguagem”, exposição de artistas da 
Casa das Palmeiras, no Espaço BNDES, 
Rio de Janeiro.
2005
Seus trabalhos são apresentados na 
exposição “Visual glossolalia”, na Louise 
Ross Gallery, em Nova York, junto de 
artistas como Minnie Evans e Carlo Zinelli.
2006
Mostra em homenagem aos 150 anos de 
nascimento de Sigmund Freud, Centro 
Cultural Banco do Nordeste, Fortaleza (CE).
2012
Outsider Art Fair, Nova York.
2013
Metro Show, Nova York.
Célia Resende, 
Belisário Franca, 
Darcílio Lima e outros, 
na gravação do 
vídeo Fragmentos 
do fantástico, s/d | 
Célia Resende, 
Belisario Franca, 
Darcílio Lima 
and others in the 
shooting of the 
video Fragmentos do 
fantástico, undated
131
Darcílio Lima em 
requintado interior 
Europeu, s/d | Darcílio 
Lima in a refined 
European interior, 
undated
Célia Resende, Stella 
Marinho, Cláudio 
Wanderley, Darcílio Lima 
e outros/and others
132
Casa de Cultura Laura Alvim, 1988
1. Orlando Bessa, Alfredo Souto 
de Almeida e/and Eloá Bessa
2. Roberto Magalhães, Darcílio Lima 
e/and João Paulo Lima
3. Alfredo Souto de Almeida, Vanda 
Pimentel e/and Darcílio Lima
4. João Paulo Lima, Darcílio Lima, 
Adriano de Aquino e/and Roberto 
Magalhães
5. Gerardo Mello Mourão, Darcílio 
Lima e outros/and others
Darcílio Lima trabalhando, s/d | 
Darcílio Lima working, undated
133
Recorte de jornal no exterior, s/d | 
Foreign newspaper clipping, undated
Jornal Letras&Artes, ano III, 
n. 4, agosto de 1989 | Newspaper 
Letras&Artes, Year III, no. 4, 
August 1989 
Jornal do Brasil, 5 de maio de 1991 | 
May 5, 1991
Publicação do anúncio fúnebre de 
Darcílio Lima, s/d | Darcílio Lima’s 
obituary, undated
134
A reprodução faz parte da 
Revista Planeta, n. 4, Editora Três | 
The reproduction is part of magazine 
Planeta no. 4, by the Publishing 
House Three
A reprodução faz parte da 
Revista Planeta, n. 39, Editora Três | 
The reproduction is part of magazine 
Planeta no. 39, by the Publishing 
House Three
135
Reprodução do cartaz de divulgação da 
exposição “Desenhos”, na Galeria Bonino | 
Reproduction of poster for the exhibition 
“Desenhos”, staged at Bonino Art Gallery 
1975, 63,5 x 27,5cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
136
Capa e encarte do compacto com a trilha 
sonora do filme Carnaval, o aval da carne, de 
Carlos Marques e Ralph Justino | Cover and 
insert of the original soundtrack album from 
the movie Carnaval, o aval da carne, directed 
by Carlos Marques and Ralph Justino, 1983
Reprodução do livro Diafragma, da 
editora Etcetera | Reproduction of the 
book entitled Diafragma released by 
the Publishing House Etcetera, 1975 
40,64, x 24,13cm
Coleção | Collection Guilherme Gutman
137
138
engliSH verSion
139
MeMories and recaptures...
Afonso Henrique costa
conceiving the retrospective of the Darcílio Lima’s 
lifework and working in its coordination have shown 
to be a link to my own past.
i have always been interested in art. since i 
can remember, as a youngster visiting friends and 
colleagues, firstly i greeted the people i met in their 
places, but soon after i headed for the paintings on 
the walls to examine them. the curiosity about the 
arts has always been inherent to my range of view, 
something inborn that i seem unable to justify. 
i was born with it.
around 1966/67, i decided to take the classes 
provided by the Department of courses of mam-rJ 
(museum of modern art of rio de Janeiro). many 
celebrated masters taught there, such as aluísio 
carvão, Domenico Lazzarini and, mainly, ivan serpa, 
of whom i became a student.
unarguably, the most important lesson that 
ivan serpa left to me was how to look at the arts. 
He has refined my ability to see, freeing it, making 
it savvier, clearer and more objective. in fact, serpa 
always let his students free to do whatever they 
will, truly encouraging them. He only advised them 
to work, and to do it increasingly more. He really 
demanded it.
caiXa is one of the main supporters of the brazilian 
culture and annually disburses more than brL 60 
million from its budget to sponsor cultural projects 
in its own centers and that of third party, centered 
upon movie screenings, art exhibits, theater plays, 
dance shows, musical presentations, and dance and 
theater festivals throughout the brazilian territory, 
not to mention the brazilian handicraft.
Projects are chosen by means of call for tenders, 
an opportunity for caiXa to democratize the access 
to producers and artists of all federative units, as 
well as to ensure the transparency to all society 
sectors concerning the sums disbursed by the 
institution.
the exhibition “Darcílio Lima – a fantastic 
universe,” conceived and coordinated by afonso 
costa and curated by the psychoanalyst Guilherme 
Gutman, is an effort to rescue, appreciate and give 
publicity to the work of visual artist Darcílio Lima, 
one of the most important representatives 
of surrealism in brazil.
by staging this new exhibit to the audience of 
rio de Janeiro, caiXa underlines its cultural policy 
to foster the debate and dissemination of ideas, 
furthering the diversity of thought, and keeping 
alive its core motif, which is to widen the access 
to artistic production.
Caixa Econômica Federal
Sem título | Untitled, 1968
Nanquim sobre papel | Indian ink 
on paper, 68 x 51cm
Coleção | Collection Família Ivan Serpa
[DetaLHe | DETA IL ]
140
i also recall the special care of serpa for 
Darcílio. He has even generously hosted Darcílio 
at his place, after the latter’s sojourn at casa 
das Palmeiras, where nise da silveira developed 
a remarkable work. ivan serpa adored Darcílio; 
undoubtedly one of his favorite students, who he 
encouraged and supported the most. undeniably he 
was a patron of the arts for him, with all possible 
commitment and dedication. He used to state that 
Darcílio needed no classes, he only had to work hard, 
and, in view of this, the artist grew more and more 
obsessed with the development of his notable work.
i used to meet Darcílio fairly frequently and 
my memories of him are clear. always holding a 
folder from the stationer’s Papelaria União packed 
with pieces, some of them still underway, and on 
which he used to work anywhere, when the time and 
occasion thus allowed.
His drawings were obsessive in nature, with 
thousands of points and strokes, demanding much 
time to be completed.

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