Buscar

A história do povo Terena

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 155 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 155 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 155 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Presidente da República: 
Fernando Henrique Cardoso 
Ministro da Educação e do Desporto: 
Paulo Renato de Souza 
Secretário executivo: 
Luciano Oliva Patrício 
MEC 
Secretário de Educação Fundamental: 
Iara Glória Areias Prado 
Diretor do Departamento de Política da Educação Fundamental: 
Walter Kiyoshi Takemoto 
Coordenadora Geral de Apoio às Escolas indígenas: 
Ivete Maria Barbosa Madeira Campos 
MEC/SEF/DPEF 
Coordenação Geral de Apoio às Escolas Indígenas 
Esplanada dos Ministérios, Bloco "L". Sala (52(5 
CEP: 70.047-900 - Brasília/ DF 
Tel.: (61) 410 8 6 3 0 / 321 5323, Fax: ((51) 32 1 5864 
e-mail: cgaei@sef.mec.gov.br 
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
Reitor: 
Prof. Dr. Jacques Marcovitch 
Diretora da. Faculdade de Educação 
Profa. Dra. Myriam Krasilchik 
LAPECH - FEUSP 
CENTRO DE TRABALHO 1ND1GENISTA - CTI 
Presidente: 
Profa. Dra. Sylvia C. Novaes 
Coordenadora do Programa Educação Escolar Indígena 
Profa. Maria Elisa Ladeira 
GOVERNO POPULAR DO MATO GROSSO DO SUL 
Secretário Estadual de Educação: 
Prof. Pedro Kemp 
Núcleo de Educação Indígena 
Bittencourt, Circe Maria. 
A história do povo Terena. / Circe Maria Bittencourt, 
Maria Elisa Ladeira. - Brasília : MEC, 2000. 
156p. : ir. 
1.Educação Escola Indígena 2.Cultura Indígena 
I.Maria Elisa Ladeira. 
CDU 37(=081:81) 
Circe Maria Bittencourt 
Maria Elisa Ladeira 
A Historia 
do Povo Terena 
Maio / 2000 
MEC-SEF- USP 
REALIZAÇÃO: 
CENTRO DE TRABALHO INDIGENISTA - CTI 
FACULDADE DE EDUCAÇÃO - USP 
Produção: 
Programa de Educação Escolar Indígena/CTl 
Coordenação e elaboração: 
Circe Maria Bittencourt 
Maria Elisa Ladeira 
Pesquisa: 
Rogério Alves de Rezende 
Adriane Costa da Silva 
Professores Terena de Miranda: Severiano Pascoal, Genésio de Farias, Josefina Muchacho 
Henrique, Nilza Júlio Raimundo, Aríete Bonifácio, Ruy Sebastião, Eulogia de Albuquerque, 
Elizeu Sebastião, Anésio Pinto, Luzinete Raimundo, Nilo Delfino, Elcio de Albuquerque, 
Aronaldo Júlio. Paulo Bonifácio. 
Alunos do Laboratório de Pesquisa e Ensino de Ciências Humanas/USP/Lapech 
Consultoria: 
Nidia Pontusck 
Gilberto Azanha 
Aryon Dall'lgna Rodrigues 
Programação Visual: 
Sônia Lorenz 
Diagramação, mapas e tratamento das imagens: 
Antônio Kehl 
Revisão: 
Maria Regina Figueiredo Horta 
APOIO INSTITUCIONAL: 
Rainforest Foundation - Noruega 
Centro de Trabalho lndigenista 
Universidade de São Paulo 
Secretaria Estadual de Educação do Mato Grosso do Sul 
CENTRO DE TRABALHO INDIGENISTA - CTI 
Rua Fidalga. 548 - sala 13 
Vila Madalena - São Paulo - SP 
O5432-000 
Tel.: (11) 813-3450 
e-mail: cti@dialdata. com. br 
APRESENTAÇÃO 
Este livro de História tem muitos autores . Muitas p e s s o a s 
participaram, de diferentes formas, de sua criação e confecção. Ele 
nasceu de um encontro de professores Terena realizado pelo Centro de 
Trabalho Indigenista, em 1994, na Faculdade de Educação da 
Universidade de São Paulo. 
Os livros de História escrevem pouco sobre as populações 
indígenas, omitindo muito da participação destes povos na história de 
toda a nação brasileira. Este livro nasceu, assim, da vontade de deixar 
uma história escrita de um povo que vive há centenas de anos no território 
brasileiro, possuidor de um passado de lutas e de conquistas cuja 
memória histórica precisa ser conhecida, discutida, repensada. 
Para que esse livro pudesse ser escrito foram feitas muitas 
pesquisas. Os professores Terena pesquisaram com os mais velhos e 
registraram muitas histórias de um passado que começa no Êxiva, na 
região do Chaco. Alunos do curso de Prática de Ensino de História da 
Universidade de São Paulo e a equipe do Projeto de Educação do CTI 
fizeram levantamento de livros e documentos escritos, pesquisando 
sobre brasileiros, portugueses e espanhóis que, desde o século XVI, 
deixaram relatos e desenhos sobre os Terena. Muitas outras pesssoas 
do CTI e da USP ajudaram a redigir e organizar os diversos capítulos 
que fazem parte do livro. Especialistas em computação auxiliaram com 
sua arte a organizar os mapas, as ilustrações do livro. E ainda é 
importante destacar que esse livro não terminou, porque as crianças e 
jovens Terena irão completar muitas histórias, fazendo pesquisas junto 
com seus professores e escrevendo nos espaços reservados para que 
a história continue sendo escrita, por mais autores. 
Na trajetória de construir este livro foram enfrentados muitos 
desafios e dificuldades, mas também foi muito gratificante participar 
desse trabalho. As muitas pessoas que se envolveram na sua elaboração 
criaram laços de respeito e de amizade. Agradecemos a todos que 
colaboraram direta ou indiretamente para que este livro se tornasse uma 
realidade. 
Todos nós, que participamos da elaboração desse livro, esperamos 
que ele possa contribuir para aumentar os laços de solidariedade entre 
os Terena, e que ele ajude a reafirmar a identidade histórica de um povo 
que tem lutado para ser reconhecido como construtor da nação brasileira, 
sem perder sua autonomia cultural e política, seu modo próprio de ser e 
sua dignidade. 
Circe Maria Bittencourt Maria Elisa Ladeira 
Universidade de São Paulo Centro de Trabalho Indigenista 
SUMARIO 
Capítulo I - Começa uma História 9 
1. Os Aruák 12 
2. Povos Aruák no Brasil 14 
3. Povos indígenas no Brasil 18 
4. Histórias da origem do povo Terena 22 
5. Momentos da história do povo Terena 25 
Capítulo II - Tempos Antigos 33 
1. Os Guaná no Êxiva 35 
2. Contatos entre Guaná e brancos 37 
3. Os Terena em Miranda e Aquidauana 38 
4. Os Terena na época do Império brasileiro 42 
Capítulo III - Os Terena e a Guerra do Paraguai 53 
1. A Guerra do Paraguai 55 
2. Histórias da Guerra: relatos de Taunay 57 
3. Histórias da guerra: Relatos dos Terena 63 
Capítulo IV - Tempos da Servidão 73 
1. A Lei de Terras de 1850 e os povos indígenas 75 
2. Os Terena depois da Guerra do Paraguai 76 
3. O governo republicano e os povos indígenas 79 
4. A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil 82 
Capítulo V - O Território dos Terena 91 
1. O Serviço de Proteção aos Índios. 93 
2. A criação das áreas Terena. 96 
3. Os Terena e os problemas com o SPI 97 
4. A FUNAI e a situação atual. 98 
Capítulo VI - Cotidiano nas aldeias: ontem e hoje 105 
1. Vestuário 108 
2. Moradia l13 
3. As artes: cerâmica, cestaria e tecelagem 119 
4. Culinária 131 
5. Roças, pesca, coleta, caça e criação 134 
6. Festas e cerimônias 140 
Créditos Fotográficos 153 
BIBLIOGRAFIA 1 55 
A história do povo Terena é longa e está ligada às histórias de vários 
povos indígenas, dos europeus, dos africanos e seus descendentes. O 
povo Terena, juntamente com os Laiana e os Kinikinau, faz parte da 
história de grupos indígenas que vivem em várias regiões e países da 
América. 
Para se conhecer a história dos Terena é preciso recorrer a várias 
fontes de informação. Podemos conhecer o passado dos Terena pelos 
produtos da cultura material, como objetos de cerâmica, de tecelagem, 
instrumentos musicais, que revelam muito dos hábitos e costumes 
antigos e que atualmente nem sempre existem mais. Pode-se também 
recorrer aos textos escritos, desenhos, pinturas, fotografias feitos por 
brancos que estabeleceram contatos em diversos momentos com os 
Terena. 
E ainda, para sabermos sobre a vida passada dos Terena, é muito 
importante ouvir os relatos orais dos mais velhos. A tradição oral revela 
os momentos mais significativos da história dos povos indígenas. A 
língua falada pelos Terena é a mais importante fonte que se tem para se 
conhecer parte da história mais recente e também do passado mais 
distante. 
A lingua falada pelos Terena conserva elementos em comum com 
a língua usada pelos Laiana e pelos Kinikinau e que, embora com 
algumas diferenças, permite reconhecer que elepertence a uma língua 
de origem comum denominada Aruák. A identificação dessa língua 
comum é importante porque, por intermédio dela, podemos saber um 
pouco sobre a origem dos Terena e localizar o lugar onde vivem e 
viveram em outros tempos. 
Pode-se conhecer o lugar de origem das pessoas porque as línguas 
têm elementos comuns e pode-se perceber que cada povo recebe várias 
influências no contato com outras populações. Com a convivência são 
acrescentadas novas palavras, alterando constantemente a língua 
original. Quando uma comunidade se separa, a convivência entre as 
pessoas diminui e, em conseqüência, aumentam as diferenças na fala 
dos habitantes desses lugares. Quando esses grupos mudam-se para 
outros lugares distantes, perdem todo o contato entre si e não existe a 
possibilidade de incorporar palavras novas. 
Desta forma, apesar da língua ser a mesma, os Terena de 
Cachoeirinha, por exemplo, falam de um modo diferente dos Terena de 
Taunay e, da mesma forma, a língua portuguesa falada pelos gaúchos 
é diferente da língua portuguesa falada pelos pernambucanos ou pelos 
habitantes de Portugal. Podemos saber, então, pela fala, o lugar de origem 
daquela pessoa. Podemos também identificar se um Terena é de 
Cachoeirinha, de Ipegue, de Bananal ou de outras aldeias. 
1. Os Aruák 
O nome Aruák vem de povos que habitavam principalmente as 
Guianas, região próxima ao norte do Brasil e algumas ilhas da América 
Central, na região das Antilhas. Quando os europeus começaram a 
dominar a região, os Aruák dividiam e disputavam o mesmo espaço 
com outro povo indígena, os Karib. E foi com estes dois povos que os 
europeus tiveram seus primeiros contatos. Tal como aconteceu com o 
nome Karib, que passou a designar aquela região, o Caribe, também o 
nome Aruák veio a ser usado pelos europeus para identificar um conjunto 
de línguas encontradas no interior do continente sul-americano. 
Observe com atenção o mapa para localizar a ampla região onde 
são faladas as línguas de origem Aruák. 
Podemos observar que se fala o Aruák na região norte da América 
do Sul, com povos que habitam a área dos rios Orinoco, Negro e 
seus afluentes, principalmente o rio Içana. E existem povos que 
habitam lugares próximos aos rios Japurá e Solimões, Purus e Juruá 
até chegar às nascentes do rio Ucaiáli. Os povos que falam a língua 
de origem Aruák, conforme pode-se verificar pelo mapa, não habitam 
em um único país. 
Outros grupos que se utilizam da língua de origem Aruák vivem 
mais ao sul do continente. Existem povos que vivem na região 
amazônica da Bolívia, no estado do Mato Grosso e na região do rio 
Xingu, no Brasil. O povo de língua Aruák que mora mais ao sul do 
continente americano são os Terena. 
2. Povos Aruák no Brasil 
Podemos agrupar os povos indígenas que falam a língua Aruák no 
Brasil de acordo com a região em que habitam. O rio Amazonas delimita 
as áreas dessas populações. 
Os grupos Aruák situados ao norte do rio Amazonas são vários. 
Ao ler sobre eles, procure no mapa a localização de cada um. 
Os Boníwa do Rio Içana. afluente do Rio Negro, compreendem 
um grande número de pequenos grupos distribuídos ao longo de todo o 
curso do rio e de alguns outros rios próximos. Cada um destes grupos 
fala dialeto próprio, mas com poucas diferenças entre si. 
Não muito distante vivem os Warekana. que compreendem alguns 
grupos situados em outro afluente do rio Negro, o rio Xié, e cuja língua 
difere muito pouco da de seus vizinhos, os Baníwa. 
Tariána é um outro grupo Aruák, mas que hoje pouco fala seu idioma 
de origem, porque ao se mudarem do rio Içana para a região do rio 
Uapés, o povo Tariána adotou a língua de seus novos vizinhos, os 
Tukano. Parece que apenas o grupo chamado íuemi continua mantendo 
a língua Tariána, que é também muito próxima da língua dos Baníwa do 
rio Içana. 
Moça Palikur 
Os grupos que vivem próximo 
ao rio Negro, Baré. Mondawáka e 
Yabaáno não têm mantido a língua 
de origem Aruák, sendo que a 
maioria deles fala s o m e n t e o 
português. 
Há também os Wapixana que 
vivem no estado de Roraima, às 
margens do rio Branco, e os Palikur. 
situados no estado do Amapá, na 
bacia do rio Oiapoque, que se 
utilizam de uma língua falada muito 
próxima, embora com algumas 
diferenças, da língua usada pelos 
povos Baniwa. 
Os grupos Aruák que vivem 
ao sul do rio Amazonas podem 
ser agrupados de acordo com as 
áreas que ocupam. Existem quatro 
áreas importantes que podem ser 
observadas pelo mapa. 
A primeira dessas áreas está 
situada no sudoeste do estado do 
Acre e nelas vivem os Apurínã (ou 
Ipurinã). com aldeias ao longo do 
rio Purus: os Kámpa no alto rio 
Juruá; os Maxinérí e Manitenérí (a 
língua Piro) no rio Iaco, um afluente 
do rio Juruá. 
Uma segunda área fica a oeste 
do estado do Mato Grosso, na 
região dos formadores do rio 
Juruena, que é um afluente do rio 
Tapajós, onde vivem os Paresi e os 
Salumã. 
Em uma terceira área, no alto 
do rio Xingu, são faladas línguas 
da família Aruák, muito semelhantes entre si. Estes grupos são 
denominados como Mehináku. Waura e Yawalapití. 
E, a quarta e última área é a que corresponde aos grupos que vivem 
na região mais meridional da família Aruák no Brasil. É o povo Terena. 
que habita na região dos rios Aquidauana e Miranda, afluentes do rio 
Paraguai, no estado do Mato Grosso do Sul. Na década de 30 um grupo 
de Terena foi transferido para o estado de São Paulo, numa área onde 
vivem os Kaingang e Nhandeva (Guarani), na região de Bauru. Em 
conseqüência desta migração, há meio século que a língua Terena 
também é falada nesta região. 
Existe um grupo na Bolívia, os Moxo. que ainda mantém a língua 
de origem Aruák; e outro denominado Choné, mas este povo atualmente 
só fala espanhol. No Paraguai há também os Guaná. que aparentemente 
não falam mais a língua. 
Todos estes grupos indígenas que falam a língua Aruák têm 
diferenças entre si, mas possuem uma mesma língua de origem. Além 
desta proximidade que indica uma origem comum, estes grupos têm 
semelhanças na forma de sua organização social. Todos esses grupos 
possuem ou possuíram formas de organização internas características, 
sendo tradicionalmente agricultores e conhecedores das técnicas de 
tecelagem e cerâmica. 
3. Povos indígenas no Brasil 
As populações indígenas do Brasil não são um só povo: são 
constituídos por muitos grupos, diferentes entre si e do conjunto de 
populações descendentes dos colonizadores europeus, portugueses, 
dos escravos africanos e dos imigrantes que aqui chegaram em 
diferentes épocas, como os italianos, árabes, espanhóis, alemães, 
japoneses, entre outros. A nação brasileira é, assim, constituída por estes 
povos e o conjunto de diferentes povos indígenas. 
Os povos indígenas foram as primeiras populações que ocuparam 
o território que foi denominado Brasil pelos portugueses, mas os 
momentos e a forma dessa ocupação ocorreram de maneiras 
diferentes. Para ocupar o território foram feitas guerras, realizaram-se 
acordos com autoridades, alianças entre vários grupos, houve a 
catequese de missionários, estabelecendo-se contatos diversos, às 
vezes de forma pacífica e em outras situações de maneira violenta. É 
importante destacar que esta situação ocorreu no passado, mas ainda 
acontece atualmente. 
A história da ocupação do território pelos grupos indígenas, 
anterior à chegada dos europeus também foi realizada de diferentes 
formas e momen tos . A ocupação do território foi s endo feita 
lentamente, durante muito tempo, por migrações de populações 
indígenas diferentes que estabeleceram contatos entre si, trocaram 
experiências, realizando alianças que enriqueceram suas heranças 
culturais ou, então, fizeram guerras para dominar áreas mais férteis 
ou de fácil comunicação. 
Desta forma, a população indígena no Brasilé constituída por 
diversos povos, diferentes entre si, com usos, costumes e crenças 
próprias, e que falam línguas diferentes. O direito a esta diferença, 
mantendo a língua e costumes tradicionais é atualmente garantido pela 
Constituição Brasileira de 1988 pelo Artigo 231: 
"São reconhecidos aos índios sua organização social 
costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos 
originários sobre terras que tradicionalmente ocupam, 
competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar 
todos os seus bens." 
Também está garantido por lei constitucional o direito de 
preservação e es tudo das línguas indígenas nas escolas , pelo 
Artigo 2 10: 
"O ensino fundamental regular será ministrado em língua 
portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a 
utilização de suas línguas maternas e processos próprios de 
aprendizagem." 
Existem aproximadamente 200 povos indígenas no Brasil que 
falam 170 línguas. Esta população corresponde, segundo estimativas, 
a 250 mil pessoas . Observe no mapa a seguir, a distribuição das 
populações indígenas no território brasileiro. 
É provável que na época da 
chegada dos portugueses, há 500 
anos , o número das línguas 
indígenas fosse maior do que é 
hoje. É também difícil saber o 
número de habitantes indígenas na 
época da chegada dos europeus. 
O desaparecimento de muitas 
línguas indígenas foi maior nas 
regiões co lonizadas mais 
intensamente e há mais tempo 
pelos portugueses, como a região 
sudeste, nordeste e sul do Brasil. 
As l ínguas ind ígenas 
existentes no Brasil podem ser 
agrupadas, de um modo geral, 
em grandes grupos denominados 
como "famílias lingüísticas" que, 
em alguns casos, têm falantes 
também em outros países. Estas 
"famílias" s ã o Tupi-Guaroni, 
Korib, Pono, Aruák e Jê. 
Existem também, além dessas 
grandes "famílias", outras "famílias" 
menores como Guaikuru, Tukano, 
Moku e Yanomami. E ainda existem 
as línguas que os es tud iosos 
classificam como "línguas 
isoladas". Por "língua isolada" 
queremos dizer que os lingüistas, 
que são os estudiosos das línguas, 
não sabem a que "família" original 
esta língua pertence. 
4. Histórias da origem do povo Terena 
Saber a origem dos povos é muito difícil. Em geral, cada povo cria 
mitos e lendas para explicar sua origem. O mito sobre como os Terena 
foram criados pode ser contado de várias maneiras. As diferenças entre 
as versões narradas estão ligadas ao momento e à situação vivida pelo 
povo quando contam essa parte da sua história. Os brancos também 
contam a sua história de vários jeitos, dependendo do tempo, das 
circunstâncias e dos grupos que es tavam no poder quando a 
escreveram. Por isso, a história de muitos personagens brancos que 
aparecem nos livros, também tem várias versões. 
Cada povo tem a sua própria maneira de contar sobre a criação do 
mundo e de como surgiram enquanto povo. Os povos de tradição 
judaico-cristã, por exemplo, têm o mito de Adão e Eva. Os Desana, que 
é um povo de língua Tukano que mora com outros povos de língua 
Aruák e Maku na região do rio Negro, no estado do Amazonas, contam 
sobre o Umuri ñhku, o "Avô do Universo". E assim, cada povo tem a sua 
própria tradição e visão do mundo. 
Segundo a tradição dos Terena, os professores da aldeia de 
Cachoeirinha, em 1995, resumiram assim a criação de seu povo: 
"A criação do povo Terena 
Havia um homem chamado Oreka Yuvakae. Este homem 
ninguém sabia da sua origem, não tinha pai e nem mãe, era 
um homem que não era conhecido de ninguém. Ele andava 
caminhando no mundo. Andando num caminho, ouviu grito 
de passarinho olhando como que com medo para o chão. Este 
passarinho era o bem-te-vi. 
Este homem, por curiosidade, começou chegar perto. Viu 
um feixe de capim, e embaixo era um buraco e nele havia uma 
multidão, eram os povos terenas. Estes homens não se 
comunicavam e ficavam trêmulos. Aí Oreka Yuvakae, segurando 
em suas mãos tirou eles todos do buraco. 
Oreka Yuvakae, preocupado, queria comunicar-se com eles e 
ele não conseguia. Pensando, ele resolveu convocar vários animais 
para tentar fazer essas pessoas falarem e ele não conseguia. 
"Diz que antigamente não havia gente. Bem-te-vi, uítuka, 
descobriu onde havia gente debaixo do brejo. Bem-te-vi marcou 
o lugar aos Orekajuuakái que eram dois homens e estes tiraram 
a gente do buraco 
Antigamente, Orekajuuakái era um só e quando moço a 
sua mãe ficou brava, pois Orekajuuakái não queria ir junto com 
ela à roça, foi à roça, tirou foice e cortou com ela Orekajuuakái 
em dois pedaços. O pedaço da cintura para cima ficou gente, e 
a outra metade também. 
Antes de tirar a gente do buraco, Orekajuuakái mandaram 
tirar fogo, iukú. Pensaram quem uai tirar fogo. Foi o tico-tico, 
xauokóg. Ele foi e não achou fogo. Depois foi o coelho, kanóu, 
e tomou o fogo dos seus donos, os Tokeóre. 
O konóu chegou onde estava os Orekajuuakái e foram 
fazendo grande fogueira. Gente leuantou os braços e Orekajuuakái 
tirou do buraco. Toda gente era nu e tinha frio e Orekajuuakái 
chamaram para ficar perto do fogo. Era gente de toda raça. 
Orekajuuakái sempre pensaram como fazer falar esta gente. 
Mandaram-na entrar em fileira um atrás do outro. Orekajuuakái 
chamaram lobinho, okué, pra fazer rir a gente. Lobinho fez 
macacada, mordeu no próprio rabo, mas não conseguiu fazer 
rir. Orekajuuakái chamaram sapinho, aquele vermelho, kalaláke. 
Este andou como sempre anda e a gente começou a dar risada. 
Sapinho passou ida e volta ao longo da fila três vezes. Aí a 
gente começou a falar e dar risada. 
Orekajuuakái ouviram que cada um da gente falou diferente 
do outro. Aí separaram cada um a um lado. Eram gente de 
Finalmente ele convidou o sapo para fazer apresentação na 
sua frente, o sapo teve sucesso pois todos esses povos deram 
gargalhada, a partir daí eles começaram a se comunicar e falaram 
para Oreka Yuuakae que estavam com muito frio." 
Um estudioso do povo Terena, o antropólogo Herbert Baldus, depois 
de conversar com os Terena, durante as visitas que fez aos postos 
indígenas do estado de São Paulo em 1947, transcreveu a seguinte 
versão: 
toda roça. Como o mundo era pequeno, Orekojuuokái aumentou 
o mundo para o pessoal caber. 
Orekajuuakái deu uns carocinhos de feijão e milho e deu 
mandioca também e ensinou como se planta. Deu também 
semente de algodão e ensinou como tecer faixa. Ensinou fazer 
arco e flecha, ranchinho, roçar e plantar, "(relato oral de Antônio 
Lulu Kaliketé, traduzido para o português por Ladislau Haháoti) 
Linha do Tempo dos Terena 
Chegada dos 
Portugueses 
ao Brasil 
5. Momentos da história do povo Terena 
Cada povo tem m o m e n t o s importantes m a r c a d o s por 
acontecimentos que levam a mudanças na vida de toda a comunidade. 
Esses momentos surgem entrelaçados a vários acontecimentos e 
permanecem na memória de todos. Relembrar esses momentos e buscar 
entendê-los é importante para que se possa perceber os acontecimentos 
presentes e como eles estão ligados a esse passado. Para os Terena, 
têm sido relembrados três grandes momentos em sua história. 
O primeiro deles foi a saída do Êxiva, transpondo o rio Paraguai, e a 
ocupação da região do atual estado de Mato-Grosso do Sul. Este período 
foi longo, durando muitos anos, com migrações que foram feitas em 
todo o decorrer do século XVIII. Foi um período em que os Terena 
ocuparam um território vasto, dedicando-se à agricultura e estabeleceram 
alianças importantes com os Guaicuru e com os portugueses. 
Este foi o período dos Tempos Antigos. 
Em seguida, um acontecimento importante afetaria a vida dos 
Terena, a Guerra do Paraguai. O momento mais significativo da vida 
dos Terena foi a Guerra do Paraguai (1864-1870). Esta guerra, na qual 
participaram muitos países - Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai -
envolveu também os escravos deorigem africana e povos indígenas 
habitantes das regiões próximas ao rio Paraguai. Os Terena e Guaicuru 
aliaram-se aos brasileiros e lutaram para preservar seu território. 
Após a Guerra do Paraguai, muitas mudanças aconteceram na 
região e, para os Terena, ela significou a perda da maior parte do seu 
território, que passou a ser disputado pelos proprietários de terras 
brancos, que chegavam cada vez mais para plantar e criar gado. 
Este foi o período denominado Tempos da Servidão. 
E o terceiro momento correspondeu à delimitação das Reservas 
Terena, iniciado com a chegada da Comissão Construtora das Linhas 
Telegráficas chefiadas por Rondon, e continua até o presente. Essa 
época, do começo deste século até os dias de hoje, é marcada por uma 
maior proximidade com a população branca, os purutuyé, com 
mudanças nos hábitos e costumes terenas. Os Terena têm sido 
obrigados a se submeter a trabalhos para os proprietários de terras 
particulares. Este momento ainda está sendo vivido pelos Terena, que 
estão fazendo sua história, buscando maior autonomia enquanto povo, 
e mais direitos como cidadãos brasileiros. Este período não possui ainda 
um título. Cada criança ou jovem Terena pode denominá-lo como desejar. 
Depois de ler este livro, dê um título a este terceiro momento da 
história dos Terena: 
Tempos 
l . O s Aruák 
Escreva uma relação das fontes para se conhecer a história do povo 
Terena: 
Por que a língua falada pelos Terena é diferente da língua falada dos 
Salumã, se as duas línguas são da "família" Aruák? 
ATIVIDADES 
Observando o mapa 1, escreva: 
o nome dos países da América onde vivem povos de origem Aruák. 
o nome de três povos Aruák 
2. Povos Aruák no Brasil 
Escreva uma característica comum a todos os povos de língua Aruák. 
Observando o mapa 2, relacione: 
o nome dos estados brasileiros onde vivem povos de língua Aruák 
nome de alguns dos rios importantes para os Aruák 
3. populações indígenas no Brasil 
Leia com atenção os Artigos 231 e 210 da Constituição Brasileira de 
1988 e escreva com suas palavras os direitos de todos os povos 
indígenas do Brasil. 
Observe o mapa 3 e escolha dois estados brasileiros com um número 
expressivo de povos indígenas 
Quais os povos indígenas com quem os Terena mantêm contato? 
Escreva o nome de outros povos de quem você já teve notícias 
4. A História da origem do povo Terena 
Faça um desenho inspirado pelo mito de Orekajuvakái 
Converse com outras pessoas (pais, avós, etc.) sobre a origem dos 
Terena. Depois compare as versões, e escreva as diferenças. 
Procure saber junto aos mais velhos outros mitos Terena. Escreva nas 
linhas abaixo. Depois leia para seus colegas. 
5. Momentos da História do povo Terena 
Observe a Linha do Tempo e calcule há quantos séculos os Terena têm 
contato com os purutuyé. 
Explique o que é um século. 
Qual o século em que ocorreu a Guerra do Paraguai? 
Faça uma Linha do Tempo da história da sua aldeia, localizando: 
- época em que foi criada 
- acontecimentos mais importantes 
Mulher levando carga em 
bolsa de Garaguatá 
Mulher Lengua tirando água 
da planta Garaguatá 
1. Os Guaná no Êxiva 
Os avós contam que os Terena viviam antigamente no Êxiva, lugar 
conhecido pelos purutuyé como Chaco. 
As tribos que falavam a língua Aruák eram chamadas, na época 
em que os europeus chegaram ao Êxiva, de Guaná. Há relatos escritos 
pelos espanhóis descrevendo os Guaná. 
Sanches Lavrador escreveu um relato sobre sua viagem pela região 
do Êxiva, em 1767, e afirmou que: 
"Em vários partes do Paraguai católico se tem notícia da 
nação chamada Guaná. Nome que engloba todos os subgrupos. 
Estes subgrupos usam nomes para se distinguirem entre si. 
Francisco Aguirre, que percorreu a região em 1793, contou que: 
"Os Guaná, em seu idioma "Chané", isto é, "muita gente", 
habitam o Chaco paraguaio... das margens do rio Paraguai até 
os confins do Peru. É a nação mais numerosa... As nações 
Guaná que se conhecem nesta parte oriental são 5. Layana, 
Etelenoe ou Etelena, Equiniquinao ou Equiliquinao, Neguecatemi 
e Hechoaladi" 
Atualmente todos estas nações que compunham os Guaná estão 
agrupadas sob a denominação de Terena (Efeienoe), apesar de muitos 
dos velhos saberem se são descendentes dos Layana ou Kinikinaua 
(Equiniquinao). 
A história dos Terena no Êxiva ainda é relembrada pelos mais velhos 
das aldeias: 
"Meu sogro, pai de minha mulher... ele contou a história do 
Êxiva, de onde eles vieram fugindo. Meu sogro também veio de 
lá. Eles não sabiam falar o português, só falavam o Terena e 
não sabiam ler nem escrever... não sabiam nada, mas sabiam 
o tempo em que as árvores floresciam todos os anos. No mês 
de agosto começavam a derrubar o mato para plantar. 
Plantavam só um pedacinho de terra mas dava uma produção 
grande, com fartura... Não faltava nada para o índio comer. 
Tinha bastante peixe e caça. E muita mandioca para comer." 
(João Martins - 'Menootó' - aldeia Cachoeirinha) 
Os Guaná não eram a única nação que habitava o Chaco. Lá viviam 
também os Mbaya Guaicuru e os Guarani, com quem os Guaná 
estabeleceram vários tipos de contato. Os contatos entre os Guaná e 
os Guarani nunca foram amistosos, havendo muitas histórias de 
conflitos. 
A relação entre os Guaná e os Mbaya Guaicuru foi de aliança. A 
história das duas nações mostra que as alianças feitas entre elas foram 
muito importantes nas lutas contra tribos inimigas e contra espanhóis e 
portugueses. 
A aliança entre Guaná e Guaicuru foi possível por serem povos 
com um modo de vida diferente. Os Guanás eram hábeis agricultores 
que viviam das roças próximas às suas aldeias e os Guaicuru, vivendo 
da caça e da pesca, controlavam vastos territórios. Atualmente o único 
grupo de origem Mbaya Guaicuru no Brasil é o Kadiwéu, que vive ao sul 
do pantanal do Mato-Grosso do Sul, na fronteira com o Paraguai. Alguns 
relatos dos Kadiwéu mostram que essas diferentes maneiras de viver 
sempre existiram: 
"Quando Deus (Aneotedroni) terminou de fazer cada tribo, 
ensinou o que eles poderiam fazer: deu enxada para os terena, 
foice para os brancos e para os Kadiwéu deu a terra, porque 
para Kadiwéu deu a terra, porque não pode roçar, não sabe roçar" 
(Basílio Kadiwéu, l989) 
As diferenças entre os Guaná e os Guaicuru facilitaram as relações 
de troca. Os Guaicuru aprenderam a utilizar cavalos trazidos da Europa 
para fazer guerra e protegiam as aldeias aliadas dos ataques dos inimigos 
Guarani e dos espanhóis. Os Guaicuru forneciam para os Guaná facas e 
machados que eram utilizados na agricultura. Os Guaná forneciam aos 
Guaicuru produtos que cultivavam nas roças, roupas de algodão e 
cobertores. Para consolidar estas alianças, os Guaná e os Guaicuru 
realizavam casamentos entre si. 
Vários relatos escritos dos espanhóis comprovam essas trocas. Eis 
um desses relatos: 
"Os Guaicuru recebiam dos Guaná algum grão para viagem, 
um bolo de Nibadana com que pintam de vermelho, e alguma 
manta de algodão, seja branca ou listrada de várias cores, que 
com gosto tecem os Guaná." 
(Sanches Labrador, 1 767) 
2. Contatos entre Guaná e brancos 
Os brancos chegaram ao Êxiva navegando pelo rio Paraguai, vindos 
do porto de Buenos Aires. Vieram atraídos pelas lendas sobre a riqueza 
das minas de ouro e prata na região dos Andes, onde a mais rica das 
minas de prata era Potosi, no atual país chamado Bolívia. Esse era o 
caminho mais curto para chegar até a região das minas. Sabendo disso, 
eles organizaram muitas expedições para lá. Assim, a partir do século 
XVI, começou a história do contato entre os povos indígenas, primeiros 
habitantes e senhores dessas terras, e os europeus. 
Schimdel, um escritor europeu que passou pelo Êxiva naquela 
época, descreveu a vida dos Guaná: 
"Neste caminhoachamos roças cultivadas com milho, 
raízes e outros frutos (...) Quando eles colhem um roçado, outro 
já está amadurecendo e quando este está maduro, já se plantou 
num terceiro, para que em todo se tivesse alimento novo nas 
roças e nas casas". 
Nem sempre as relações entre os europeus, os Guaná e seus aliados 
foram de amizade. Houve muitos conflitos, porque os brancos queriam 
conquistar as terras próximas ao rio Prata, interessados no ouro e prata. 
Para os europeus, esses metais tornaram-se produtos muito cobiçados, 
porque transformavam-se em dinheiro, tornando as pessoas ricas e isso 
gerou muitas brigas e confrontos. Havia disputas entre os próprios 
europeus, lutando portugueses contra espanhóis para dominar as regiões 
com riquezas minerais e havia as guerras contra as populações indígenas 
que procuravam resistir à conquista de seus territórios. 
Os espanhóis foram os primeiros a chegar. Logo depois, vieram os 
portugueses. Construíram vilas para morar. Trouxeram instrumentos de 
ferro para plantar (machados e facões), alimentos (cana-de-açúcar, 
manga, café) e animais diferentes (vacas, carneiros, cabritos, cachorros, 
galinhas e cavalos). A presença dos brancos provocou muitas mudanças 
na vida dos índios. Vieram os padres missionários, que criaram aldeias 
para os índios aprenderem a religião cristã e a língua dos estrangeiros. 
3. Os Terena em Miranda e Aquidauana 
A região do Êxiva ficava próxima das minas de metais preciosos e 
os colonizadores europeus disputavam esse território. Espanhóis e 
portugueses faziam guerras para decidir quem ficaria com essas terras. 
AS várias tribos da região foram envolvidas por essas lutas. Para defender 
seu povo e suas terras, os Guaná procuraram fazer aliança com os 
portugueses. Já os Guarani, procuraram unir forças com os espanhóis 
contra seus antigos inimigos, os Guaicuru. 
Durante essas guerras muitas aldeias foram destruídas. Os Guaná, 
vieram se deslocando acompanhando os seus aliados Mbayá-Guaicuru 
para o Mato Grosso do Sul, no século XVIII. Os Terena, os Kinikinau, os 
Laiana reconstruíram suas aldeias perto do forte Coimbra e das vilas 
das Serras do Albuquerque, entre os rios Paraguai e Miranda. Os Kadiwéu 
e outras tribos Guaicuru se estabeleceram nas redondezas da Serra de 
Maracaju. 
Alguns relatos dos mais velhos contam porque os Terena saíram 
do Êxiva e como eles atravessaram o rio Paraguai: 
"Meu pai cresceu lá mesmo no Êxiva. Meu pai fugiu de lá 
porque lá havia os índios ('kopenoti') bravos. Eles atravessaram 
as morrarias atrás de Porto Esperança. Na água quando nadou, 
amarrou um carandá seco na cintura como jangada." 
(Antônio Muchacho - aldeia Cachoeirinha) 
"Minha avó, meu avô são do Êxiva. Eles usaram uma taquara 
bem grande para atravessar o rio... pelo nome 'taquaruçu' ela é 
conhecida pelos purutuyé. Eles trançavam com cipó (humomó) 
para fazer uma canoa para atravessar o rio Paraguai 
(huveonokaxionó - 'rio dos paraguaios'), quando vieram para 
a Cachoeirinha." 
(João Martins - 'Menootó' - aldeia Cachoeirinha) 
O trabalho dos Terena nas plantações foi assim lembrado: 
"... Quando a gente fazia roça, não tinha enxada. A enxada 
não era como a de hoje: era de cerne pontudo... era um cerne 
de árvore que não dava para quebrar. Plantavam melancia, 
moranga, abóbora, milho, feijão de corda. As árvores eram 
derrubadas com fogo... não havia ferramentas de metal para 
fazer esses serviços... instrumentos de ferro são coisas 
recentes..." 
(João Martins - 'Menootó' - aldeia Cachoeirinha) 
4. A OCUPAÇÃO DE MATO GROSSO 
Na época em que os Terena deixaram o Êxiva, a região de Miranda 
era desabitada. Eles foram os primeiros a ocupar a área. A ocupação da 
região pelos portugueses começou depois da descoberta de ouro na 
região de Cuiabá e em Mato Grosso, no século XVIII. várias povoações 
foram fundadas pelos portugueses nessa época: Cuiabá (1727); 
Albuquerque e Vila Maria (1778). 
preocupados em defender suas fronteiras dos espanhóis, os 
portugueses também construíram vários fortes: Forte de Coimbra (1775), 
Forte Dourado e Presídio de Miranda (1778). Observe no mapa a 
localização estratégica de alguns destes fortes. 
Assim, enquanto os espanhóis queriam instalar fazendas de gado 
para efetivar a posse na região e expulsar as populações nativas, os 
portugueses procuraram garantir o domínio da região através da 
construção de fortes e acordos com os índios. Já nessa época os Guaná 
vendiam no Forte de Coimbra redes e panos, batatas, galinhas e porcos 
e, em troca recebiam objetos de metais e tecidos. 
Para dominar a região, os purutuyé precisavam da amizade dos 
grupos indígenas que aí viviam. Era importante ter gente para garantir a 
posse das terras e para morar nas novas vilas e cidades. Também 
precisavam de trabalhadores para as minas e para as fazendas que 
surgiam, onde plantavam cana-de-açúcar e criavam gado. Para a região 
foram enviados soldados para vigiarem as fronteiras. 
Os portugueses fizeram uma lei que proibia a escravização dos 
indígenas, mas eles eram obrigados a morar em aldeias dirigidas por 
chefes brancos. Aí, os índios deveriam aprender a viver e a trabalhar de 
acordo com os costumes do homem branco. Mas os Guaná continuaram 
levando uma vida independente dos brancos. Graças à aliança com os 
Guaicuru, conseguiram manter o domínio da região entre os rios Apa e 
Miranda. Observe no mapa 4 esta região de domínio dos índios. 
Os colonizadores brancos tentaram de várias maneiras conquistar 
a amizade dos índios, especialmente dos Guaicuru, pois queriam 
colonizar a região. Para isso, faziam comércio, distribuíam presentes e 
davam aos chefes das tribos aliadas patentes do exército. 
Os "Cavaleiros" (como os purutuyé chamavam os Guaicuru) eram temidos 
tanto pelos portugueses, como pelos espanhóis. Montados em cavalos, 
utilizavam sua boiada para atacar os inimigos. Destruíam suas povoações, 
roubavam seus cavalos e seu gado, e arruinavam suas plantações. 
Os Guaicuru, depois de muitos confrontos, tiveram interesse em 
estabelecer um acordo com os portugueses. Daí foi assinado um tratado 
entre eles no Real Presídio de Coimbra, em 1791. Esse tratado, 
assegurava a proteção da coroa portuguesa e transformava os Mbayá-
Guaicuru em súditos da rainha de Portugal. 
Depois do Tratado de 1791, a aliança entre os Guaicuru e os Guaná 
começou a se enfraquecer. Os Guaná não necessitavam mais da "proteção" 
dos Guaicuru e ampliaram o contato com os brancos, principalmente depois 
da independência do Brasil em relação a Portugal (1822). 
4. Os Terena na época 
do Império brasileiro 
Depois que os brasileiros se libertaram de Portugal, o governo 
estabelecido foi de uma monarquia, sob o poder de um imperador, D. 
Pedro I, e depois do seu filho, D. Pedro II. Este é o período do Império 
(1822-1889). 
Logo depois da independência, o governo permitiu a presença de 
viajantes e estudiosos estrangeiros em várias partes do país. Uma das 
expedições estrangeiras que visitou a região de Mato Grosso foi a 
Expedição Langsdorff, nos anos 1825 a 1829, para estudar os animais 
e as plantas brasileiras. 
O desenhista que acompanhava a expedição chamava-se Hercule 
Florence e ele passou também a escrever sobre as populações indígenas 
que iam conhecendo na viagem. 
Sobre os Guaná ele deixou a seguinte descrição: 
"Os Guanás moram na margem oeste do rio Paraguai, um 
pouco acima da vila de Miranda: acham-se todos juntos e 
aldeados numa espécie de grande povoação. Usam de uma 
língua própria, mas em geral sabem alguma coisa de português, 
que falam à maneira de quase todos os índios ou dos negros 
nascidos na costa d'África. De quanta tribo tem o Paraguai, é 
esta que mais em contato está com os brasileiros. Lavradores, 
cultivam o milho, o aipim e mandioca, a cana-de-açúcar o 
algodão, o tabaco e outras plantas do país.Fabricantes,possuem alguns engenhos de moer cana, e fazem grandes 
peças de pano de algodão com que se vestem, além de redes 
e cintas industriais, vão, em canoas suas ou nas dos brasileiros, 
até Cuiabá para venderem suas peças de roupa, cintas, 
suspensórios, cilhas de selim e tabaco." 
(Hercule Florence, 1825-1829) 
E deixou desenhos, registrando costumes da época: 
Moça Guaná e Guanitá, chefe dos Guanás. 
Duas pirogas cie Guanás, 182 7 
Um outro viajante chamado Francis Castelnau visitou a região em 
1845 e escreveu que os Terena viviam mais isolados que os outros 
Guaná (os Kinikinaua e os Layana). 
"A 5 de abril fomos visitar o aldeamento dos terenos, índios 
que pertencem à mesma nação dos precedentes Guanás, mas 
que até aqui têm tido muitas poucas relações com os brancos. 
É uma nação guerreira que conserva em toda integridade os 
costumes de seus antepassados. 
O aldeamento que íamos visitar fica, em linha reta, duas 
léguas e um terço a nordeste de Miranda... Compõem-se o 
aldeamento de umas cento e dez casas, unidas umas às outras. 
Estas formam um imenso rancho coberto de folhas de palmeira 
e estão dispostas em círculo, à volta de uma grande praça 
central. Toda a população, constituída de mil e quinhentos a 
mil e oitocentos habitantes, ocupava-se ativamente na 
preparação de uma festa" 
ATIVIDADES 
l. Os Guaná no Êxiva 
Quem foram os Guaná? 
Localize no mapa 4 a região do Êxiva. 
Por que, no relato de João Martins, na época em que os Terena viviam 
no Êxiva havia fartura? 
Escreva o nome de outros povos que habitavam a região do Chaco. 
Por que os Guaná fizeram alianças com os Guaicuru? 
Pergunte para os avós alguma história sobre os antigos conflitos entre 
os Terena e os Guarani e depois escreva nas linhas abaixo. 
Escreva o que você conhece da vida dos Kadiwéu (pergunte para os 
pais, avós ou outras pessoas da aldeia) 
pedir para os antigos (avós) contarem histórias da vida dos Terena no 
Êxiva e escreva nas linhas abaixo. Depois faça um desenho. 
47 
Agora faça um desenho sobre essas histórias. 
2 contatos entre Guaná e brancos 
por que os metais preciosos eram importantes para os europeus? 
Escreva sobre as mudanças que ocorreram na vida dos Terena depois 
da chegada dos europeus. 
3. Os Terena em Miranda e Aquidauana 
Por que os Guaná saíram do Êxiva? 
Faça uma comparação entre os tipos de alimentos que os Guaná 
plantavam no Êxiva e os que são plantados hoje. 
Observe no mapa 4 os fortes construídos pelos portugueses e explique, 
com suas palavras, por que foram construídos. 
Por que foi assinado o Tratado de 1791 entre portugueses e Guaicuru e 
quais as conseqüências para os Terena? 
4. os Terena na época do Império brasileiro 
pelo desenho de Hercule Florence, como eram as vestimentas das 
mulheres Guaná daquela época? Você sabe o nome dessa vestimenta ? 
(Pergunte às avós) 
Como era realizado o comércio entre os brancos e os Guaná ? Compare 
com os dias atuais. 
Qual o transporte utilizado nesse comércio ? Ainda existe essa forma de 
transporte na região em que você mora? 
Desenhe a aldeia descrita por Castelnau. 
A Retirada da Laguna. 
l. A Guerra do Paraguai 
Na América do Sul, a região dominada pelos portugueses manteve-
;e unida após a Independência em 1822, formando um só país, o 
Brasil. 
Com as colônias espanholas não aconteceu o mesmo. As regiões 
dominadas pelos espanhóis, ao se libertarem, formaram vários países 
independentes. Foi o que ocorreu com o Vice-Reinado do Prata, do qual 
fazia parte a região do rio Paraguai. Após a expulsão dos espanhóis, 
esse Vice-Reinado deu origem a quatro países: Argentina, Uruguai, 
Paraguai e Bolívia. 
Depois da independência houve vários conflitos entre os países da 
região do rio Paraguai e do rio da Prata para delimitar as fronteiras e 
organizar seus territórios. Havia também discordâncias entre eles por 
causa do direito de navegar no rio Paraguai, no rio Paraná e no rio da 
Prata. A liberdade de navegação era importante para que os países 
pudessem realizar seu comércio. 
O Paraguai era um dos países mais poderosos da região naquela 
época. Não possuía território perto do mar, mas controlava a navegação 
no rio Paraguai. O desejo dos governantes do Paraguai era obter território 
junto ao oceano Atlântico para exportar e importar produtos. Os 
paraguaios começaram a ter vários problemas com os países vizinhos, 
principalmente com o Brasil e a Argentina. 
Os problemas com o Brasil estavam relacionados ao controle sobre 
a navegação no rio Paraguai, pois o rio Paraguai era o principal caminho 
que ligava a província de Mato Grosso ao litoral brasileiro. 
A guerra começou quando o exército de Solano Lopez, o governante 
paraguaio, invadiu Mato Grosso em dezembro de 1864. Solano Lopez 
usou como pretexto para a invasão, o fato do governo de D. Pedro II ter 
ajudado a destituir o presidente do Uruguai que era aliado do Paraguai. 
Ao mesmo tempo, Solano Lopez tentava conquistar territórios para 
chegar ao mar. 
A invasão do território brasileiro pelo exército paraguaio foi feita por 
dois grupos de soldados. Um atravessou o rio Paraguai em direção ao 
forte Coimbra e Corumbá, que foram facilmente ocupados. O outro grupo 
atravessou o rio Apa, em Bela Vista, e avançou em direção de 
Aquidauana e Miranda. O exército paraguaio também invadiu o território 
argentino, na província de Comentes, para alcançar a província brasileira 
do Rio Grande do Sul. 
O Brasil, a Argentina e o Uruguai uniram-se e formaram a Tríplice 
Aliança para combater os paraguaios. A Tríplice Aliança recebeu armas 
dos ingleses, que desejavam ter negócios no Paraguai depois que Solano 
Lopez fosse vencido. 
Durante a guerra, parte das tropas brasileiras era formada por 
escravos negros. A esses escravos o imperador D. Pedro II havia 
prometido a liberdade quando a guerra acabasse. 
O governo brasileiro também chamou índios de Mato Grosso para 
combaterem os paraguaios. Os Guaicuru lutaram ao lado do exército 
brasileiro, enquanto os Terena, que sempre foram grandes agricultores, 
além de enfrentar o exército paraguaio, também participaram da guerra 
fornecendo alimentos para os combatentes. 
Os exércitos da Tríplice Aliança entraram em Assunción, a capital 
do Paraguai, em janeiro de 1869, mas os últimos combatentes 
paraguaios só foram derrotados em 1870. 
Após quase cinco anos de luta, o Paraguai estava totalmente 
arrasado. A maior parte de sua população masculina estava morta ou 
mutilada. No início da guerra a população paraguaia era de 800. 000 
peesoas, mas em 1870, quando a guerra terminou, essa população era 
de apenas 194. 000 pessoas. 
O Brasil pôde então dominar a navegação do rio Paraguai e demarcar 
suas fronteiras da maneira que achou melhor, tomando partes do território 
paraguaio. A Inglaterra, por sua vez, também pôde explorar as riquezas 
do Paraguai. 
2. Histórias da Guerra: relatos de Taunay 
Para conhecermos o envolvimento dos Terena e outros povos 
indígenas na Guerra do Paraguai existem fontes escritas e orais. A fonte 
escrita mais importante para a história do povo terena é o conjuntos de 
textos escritos por Alfredo Taunay. 
Relatos de Taunay 
Alfredo de Taunay (pronuncia-se 
"Toné") foi um escritor e engenheiro que 
participou da Guerra do Paraguai. Entre 
os escritos que ele deixou, encontra-se 
a descrição de Miranda durante a Guerra 
e o livro contando da Retirada da Laguna. 
Pelo livro "Retirada da Laguna" 
sabemos que os Terena participaram 
como soldados na campanha da guerra, 
junto com os demais soldados, sofrendo 
as calamidades da guerra. Taunay conta 
que no caminho para Nioac, tentando 
proteger a vila de outro saque dos 
paraguaios, a coluna de soldados foi 
atacada pela epidemia da cólera que 
matou muito soldados. Um dos primeirosAlfredo-Escragnolle Taunay 
a morrer pela doença foi um Terena: 
"...Pouco depois morrem, com um dia de moléstia apenas, 
um índio terena recebido na enfermaria de Bella Vista". 
E depois, continuou Taunay, outros Terena também morreram: 
"Neste dia fez o cólera nove ultimas. Assinalaram-se vinte 
casos novos: o chefe dos Terenas, Francisco das Chagas, 
chegou moribundo numa rede que sua gente carregava. 
Estavam estes índios no auge do terror; mas não podiam mais 
abandonar a coluna, ocupado como se achava todo o campo 
por um inimigo (os paraguaios), que, quando os apanhava, 
jamais deixava de os fazer parecer nos mais horríveis suplícios". 
Nessa época podemos saber como viviam os Terena pelos escritos 
de Taunay em outro livro onde descreveu a região de Miranda. 
A população indígena do distrito de Miranda na época da Guerra, 
escreveu Taunay, era formada por duas grandes nações: a Guaicuru e a 
Chané, que era o outro nome com que eram conhecidos os Guaná. 
Faziam parte da nação Guaicuru os Kadiwéu e os Beaquieu, que 
viviam juntos perto dos rios Paraguai e Nabileque, e um grupo que 
Taunay chamou apenas de "guaycuru", que vivia em Lalima e perto 
de Nioaque. 
A nação Chané (Guaná) dividia-se em quatro grupos: os Terena, 
os Kinikinau, os Layana e os Chooronó (que Taunay, às vezes chamava 
apenas de "guanás"). No tempo da invasão paraguaia, os Terena 
moravam no Naxedaxe, no Ipegue, na Cachoeirinha e em uma aldeia 
chamada "Grande". Os Kinikinau vivam no Euagaxigo (Agaxi) e no 
Laiuad. 
Taunay descreveu assim os Terena que encontrou: 
"O Terena é ágil e ativo: o seu todo exprime mobilidade (...) 
e conserva arraigados os usos e tradições de sua raça, graças 
talvez a um espírito mais firme de liberdade. 
São as mulheres geralmente baixas, têm cara larga, lábios 
finos, cabelos grossos e compridos (...) e expressão de inteligência. 
Trazem comumente parte do busto descoberto e uma julata, tanga 
ou avental de algodão, cinto abaixo dos seios, com uma das 
pontas passadas entre as coxas e segura à cintura. 
Raras dentre elas sabem falar o português: todas porém o 
compreendem bem, apesar de fingirem não o entenderem." 
Taunay na aldeia de Naxadaxe 
Em março de 1866, ainda durante a guerra, Alfredo de Taunay, o 
capitão-engenheiro Antônio do Lago e alguns soldados tentavam escapar 
dos paraguaios. Perto de um córrego chamado Piranhinha, eles 
chegaram a uma estrada onde parecia haver passado muita gente. Mais 
adiante Taunay começou a ouvir barulho: 
"Na realidade numa volta além, achava-se a aldeia, cujos 
ruídos cada vez mais íntimos, denunciavam a vida e a animação 
do trabalho." 
Taunay e seus companheiros haviam chegado à aldeia de Naxedaxe, 
onde um grande número de Terena havia se refugiado. 
"Ouvimos grande vozerio, algazarra contínua, e quando 
ante de nós surgiram as primeiras palhoças, uma chusma 
(grande quantidade) de gente armada se atirou ao nosso 
encontro. (...) Chegaram alguns de tais indivíduos a apontar-
nos espingardas..." 
Pensando que os visitantes brancos pudessem ser paraguaios, os 
Terena do Naxedaxe foram recebê-los de armas em punho. Mas quando 
reconheceram alguns dos soldados, festejaram a visita. O povo do 
Naxedaxe, então, levou os soldados até a casa do capitão da aldeia, 
que chamava-se José Pedro e sabia ler e escrever. 
Os Terena do Naxedaxe estavam pintados com urucum e jenipapo 
e carregavam lanças e espingardas. As espingardas, Taunay ficou 
sabendo depois, haviam sido tiradas do depósito de armas de Miranda, 
quando os índios se armaram por conta própria para se defender dos 
Paraguaios. 
O povo do Naxedaxe deu galinha cozida com arroz para Taunay e 
seus companheiros, que assim mataram a fome que vinham passando 
em sua marcha. 
No dia seguinte, Taunay ganhou milho, farinha de mandioca, mel e 
rapadura dos Terena, que estavam preparando a aldeia para uma festa. 
Vários curadores cantavam para que o mel fermentasse depressa para 
fazer a bebida para a festa. 
Depois de visitar essa aldeia, Taunay escreveu que, apesar do longo 
contato com o branco, o povo Terena ainda mantinha sua tradição. 
Taunay e os koixomuneti 
Naquela mesma época, durante os anos de guerra contra o Paraguai, 
o escritor Alfredo de Taunay pôde observar muitas vezes os koixomuneti 
Terena em ação. 
No relato que escreveu, Taunay nos conta que, nos dias em que 
esteve na aldeia Terena, os koixomuneti cantavam o tempo todo, pelos 
mais variados motivos: 
"cantavam para as colheitas, para a chuva parar, para a 
chuva cair, para o milho pendoar. Cantavam a noite inteira, 
fazendo previsões e conversando com o macauã". 
Taunay chamava os koixomuneti de "padre índio": 
"O padre, para suas vigílias, veste-se de uma julata ornada 
de lantejoulas e presa à cintura por uma espécie de lalim de 
contas. Pinta o tórax, braços e cara com jenipapo e urucum. 
Estende um couro diante da porta de sua choupana e nele 
caminha, lenta e compassadamente, avançando e recuando a 
cantar, ora estrondosamente, ora em voz baixa e monótona, 
com o acompanhamento de um chocalho, que agita à mão 
direita. À esquerda empunha um espanador de penas de ema, 
bordado com desenhos caprichosos." 
O curador ia cantando pela madrugada afora e então parava por 
um longo tempo. De repente ouvia-se, bem longe, o grito do macauã, 
que era respondido pelo curador. Os pios do pássaro iam se aproximando 
rada vez mais e no final o koixomuneti começava a fazer as previsões. 
Taunay confessou ter ficado muito impressionado com a conversa entre 
o koixomuneti e o macauã e desenhou um deles: 
Cerimonia religiosa dos Índios Guanás, 1866. 
Uma história sobre Pacalalá 
Um outro relato de Taunay foi sobre Pacalalá. Taunay escreveu que 
encontrou, na serra de Maracaju, uma mulher Kinikinau que chorava dia 
e noite a morte de seu filho. Era a mãe de Pacalalá, um jovem que havia 
liderado a luta dos índios de Miranda contra os paraguaios. Taunay, então, 
registrou a história de Pacalalá. 
No início da Guerra do Paraguai, o Agaxi ainda era território indígena 
habitado pelos Kinikinau, parentes dos Terena. Quando os soldados 
sobreviventes do segundo corpo de cavalaria de Nioaque passaram pela 
aldeia, deixaram os Kinikinau preocupados com a notícia de que os 
paraguaios estavam se aproximando. 
Nessa época o capitão dos Kinikinau de Agaxi era um velho 
chamado Flávio Botelho que não estava fazendo certo com o povo. 
Revoltado, o povo do Agaxi destituiu o capitão e colocou Pacalalá em 
seu lugar. Segundo Taunay, Pacalalá: 
"Era rapaz de pouco mais de vinte anos; tipo soberbo de 
robustez, índio de raça pura, como lhe denunciavam a cor de 
cobre vermelho, as feições angulosos, os molares salientes, os 
dentes acerados e magníficos. Os olhos pequenos e vivíssimos, 
e o queixo acentuado denunciavam-lhe a inteligência e a energia." 
Mais recentemente outros estudiosos dos povos indígenas da região, 
recolheram relatos sobre o período da Guerra do Paraguai e contam 
que, mesmo antes de ser eleito capitão, Pacalalá denunciava os abusos 
dos brancos de Miranda contra seu povo. Ele sempre dizia: 
"Cuidado com os purutuyé. Não somos seus escravos. Eles 
são nossos iguais e não nossos senhores. Nesta terra não deve 
haver duas espécies de gente: uma que manda e outra que 
trabalhe. Todos devem trabalhar e receber a paga justa de seu 
trabalho." 
A primeira coisa que Pacalalá fez depois de eleito capitão foi pedir 
que seu povo abandonasse a aldeia em busca de refúgio. Enquanto 
velhos, mulheres e crianças carregavam o que era possível para as matas 
da serra de Maracaju, Pacalalá foi com trinta rapazes até Miranda pedir 
armas às autoridades brancas, para enfrentar os paraguaios que se 
aproximavam. 
Chegando em Miranda, Pacalalá e seus companheiros perceberam 
que ninguém na cidade tinha intenção de resistir aos paraguaiose as 
autoridades se recusaram a entregar armas aos índios. 
Alguns dias depois, todos os brancos fugiram de Miranda, deixando 
o arsenal da cidade cheio de armas e munições. Os Kinikinau, juntamente 
com os Terena, Layana, entraram no arsenal e se armaram sozinhos, 
antes que os paraguaios chegassem e foram para a serra de Maracaju. 
Quando os índios chegaram à serra, os brancos também tinham 
se refugiado lá e estavam passando fome. Logo os Kinikinau e os 
Terena começaram a fazer suas roças e em pouco tempo havia comida 
para todos. 
Os paraguaios haviam ocupado toda a região entre o rio Apa e o rio 
Paraguai. A serra de Maracaju, no entanto, continuava a ser um abrigo 
seguro contra os paraguaios . De lá desc iam Pacalalá e s e u s 
companheiros para roubar o gado dos paraguaios e assim abastecer os 
refugiados com carne. 
Certa vez, enquanto tocavam os bois para a serra, foram 
surpreendidos por uma patrulha paraguaia. Pacalalá, então, organizou 
uma emboscada, matando o comandante da patrulha e levando seu 
cavalo como troféu. 
Em 1866, quando as tropas brasileiras ainda estavam muito longe 
de Miranda, Pacalalá foi com seis Kinikinau e dez Terena até um canavial 
na margem direita do rio Aquidauana, para fazer rapadura. Passaram lá 
alguns dias, sem ver nenhum sinal dos paraguaios. Isso fez com que se 
descuidassem um pouco da vigilância. Mas, foram vistos por uma 
patrulha inimiga que chamou reforços e foram cercados por quase 
duzentos soldados paraguaios. 
Pacalalá animou seus companheiros a enfrentar os inimigos com 
coragem, e logo nos primeiros disparos os índios mataram uns doze 
paraguaios e abrigaram-se, então, em uma mata próxima, de onde fizeram 
os soldados inimigos retroceder. Porém, quando o inimigo já ia batendo 
em retirada assustado, Pacalalá foi atingido por uma bala certeira. 
Quando a notícia da morte de Pacalalá chegou à serra, todos 
choraram. As moças cortaram os cabelos na altura das orelhas e tiraram 
seus enfeites, em sinal de luto. 
3. Histórias da guerra: Relatos dos Terena 
Existem as fontes orais que são os relatos dos Terena presentes na 
memória da população. 
Os Terena contam que: 
"antes da Guerra do Paraguai já habitavam na região de 
Miranda e mantinham relações com o povoado de Miranda. 
Quando a cidade de Miranda foi invadida, as aldeias que estavam 
situadas nessa região também foram atacadas. Os Terena se 
organizaram para fazer frente, utilizando as táticas próprias dos 
índios, como por exemplo, ataque noturno. Os Terena 
investigavam onde ficava o acampamento dos paraguaios e 
cercavam no momento em que os inimigos não percebiam, 
geralmente à noite. Já os paraguaios atacavam só de dia. 
Foram feitos vários enfrentamentos onde morriam índios 
Terena e também paraguaios. Conta-se que na aldeia Babaçu, 
os paraguaios mataram um Terena, pendurando-o num pé de 
árvore. 
Os Terena se escondiam nos matos e outros fugiam para a 
região de Bananal e Limão Verde. Durante a guerra é que foi 
fundada a aldeia de Limão Verde. Na área de Cachoeirinha existia 
um povoado chamado "Pulóvo'uti" e esta localidade servia de 
esconderijo durante a guerra porque era de difícil acesso por ser 
cercada de mata muito fechada." 
Em outro relato ficamos sabendo que: 
"Na aldeia Bananal, no município de Aquidauana, os Terena 
fizeram confronto com a tropa paraguaia, que resultou na morte 
de vários soldados e de indígenas. O episódio aconteceu no 
momento em que a tropa estava passando em frente da aldeia, 
precisamente ao norte. As tropas se dirigiam para a Serra do 
Maracajá, para conquistá-la e lá seria o fim do fronteiriço, caso 
os paraguaios vencessem a guerra. 
Os terena se organizaram convocando os homens 
corajosos para fazer parte na defessa do território brasileiro, 
armados simplesmente de flechas em obediência de seu líder. 
No lugar onde as tropas inimigas iam cruzar havia 
vegetação chamada "bacuri", muito fechada, justamente um 
lugar escolhido pelos Terena para fazer confronto utilizando a 
tática de guerra própria do índio. Os Terena se organizaram nas 
matas, cuidadosamente camuflados. Sendo bons de manejo 
com flechas, acertavam mortalmente os adversários. 
Os paraguaios reagiram ao ataque e foram infelizes, porque 
quando tentavam entrar na mata para atacar os indígenas 
facilitovam os lances certeiros das flechas. Os Terena não 
dispondo de muitas flechas, em obediência ao cacique 
desapareceram nas matas. 
Cessado o ataque os paraguaios tomaram providências 
para enterrar seus mortos. No local fizeram uma enorme valeta 
onde enterraram todos os cadáveres juntos. Nesse local os 
antigos terena da aldeia Bananal acharam por bem usar como 
cemitério da comunidade (relato de Olímpio Serra da aldeia de 
Argola)." 
Rondon, muitos anos depois de terminada a Guerra do Paraguai, 
no ano de 1904, ao demarcar as áreas Terena de Ipegue e Cachoeirinha, 
reforça o sofrimento do povo Terena na época da Guerra ao apontar em 
seu relatório a localização da aldeia de Ipegue destruída pelos paraguaios: 
"...depois (a linha divisória da área de Ipegue cortou um 
capão com taquara, entrou novamente no cerrado, até uma 
lagoa seca onde começam os Campos do Ipégue, vendo-se à 
esquerda 1.000 m., a tapera do Ipégue, antiga Aldeia destruída 
pelos Paraguaios"... 
Uma história sobre Kali Siini 
Os Terena também contam as histórias dos heróis de suas aldeias 
que lutaram na Guerra do Paraguai. Entre esses heróis está Kali Siiní: 
"Não havia mais líder e o povo começou a fugir. Então Kali 
Siiní, da aldeia Cachoeirinha, Kali Hoopenó, da aldeia Passarinho 
e uhaaká, da aldeia Moreira, se juntaram. Os três eram 
koixomuneti. Eles foram para Cuiabá. Os três queriam ser 
capitães de suas aldeias: de Passarinho, de Cachoeirinha e de 
Moreira. 
Eles haviam fugido do Ângelo Rebuá, o purutuyé bravo de 
Miranda. E como o Ângelo era bravo, não esperou que os 
paraguaios chegassem a Miranda: ele fugiu logo... Ângelo Rebuá 
era bravo só no meio das pessoas... 
O pego de Uhaaká era o piê e o peyó de Kali Hoopenó era 
o gavião. A função de Kalí Siini era cuidar para que ninguém os 
atacasse pelo fundo do barco onde viajavam. Eu não sei qual 
era o peyó do Kali Siiní. 
Eles voltaram de Cuiabá com uma carta. Kali Hoopenó, 
Uhaaká e Kali Siini, todos os três já eram capitães e chegaram 
todos vestidos de naatí. 
(relato de Antônio Muchacho, de Cachoeirinha) 
Kali Siiní, enquanto lutava contra os paraguaios, 
preocupava-se com o futuro do povo Terena: 
Em uma tarde Kali Siiní pegou uma onça. A onça atacou 
quando Kali Siiní estava brigando sozinho contra os paraguaios. 
Ele brigava com flecha e lança e é por isso que nós temos esse 
pedaço de terra. 
Kali Siiní matou a onça, coureou, fez um manto com o couro 
e assim chegou à aldeia. Quando ele matou essa onça, fizeram 
uma festa grande e assaram muita batata e muita mandioca. 
Quando acabou a guerra, Kali Siini recomendou que a gente 
não deveria se casar com purutugé, nem falar o português, nem 
trazer purutugé para a aldeia. Ser sempre Terena e não deixar a 
meninada sair da aldeia para não perdermos a terra. 
Todos os anciões se reuniram para o povo não se misturar 
com o purutgé, para que ninguém saísse. 
Kali Siini era nosso avô. Ele era baixinho e era koixomuneti. 
Para seguir a recomendação de Kali Siini todos devem tomar 
conta da aldeia, não dependendo dos purutugé". 
(relato de Dona Maravilha, de Cachoeirinha) 
ATIVIDADES 
1. A Guerra do Paraguai 
Sublinhe com lápis, no mapa l, os países que participaram da Guerra 
do Paraguai. 
Por que aconteceu a Guerra do Paraguai? 
Escreva uma conseqüência da Guerra do Paraguai. 
2. Histórias da Guerra: relatos de Taunay 
Quem foi Taunay e por que ele foi ajudado pelos Terena da aldeia de 
Naxedaxe? Pergunte e localize no mapa 4 onde ficava a aldeiade 
Naxedaxe. 
Desenhe, com as informações do texto, como teria sido a aldeia de 
Naxedaxe. 
Por que os koixomuneti são chamados por Taunay de "padres índios"? 
3. Histórias da guerra: relatos dos Terena 
Como os índios que se refugiaram na serra de Maracaju lutavam contra 
os paraguaios ? Desenhe uma cena de combate. 
Procure saber com seus avós outras histórias sobre a participação dos 
Terena na Guerra do Paraguai. Escreva no espaço abaixo e conte para 
seus colegas. 
l. A Lei de Terras de 1850 
e os povos indígenas 
Até 1850 as terras no Brasil eram doadas pelo governo às pessoas 
de sua confiança. Em 1850 foi decretada a "Lei de Terras" e, a partir 
desta data, ficou determinado que as terras poderiam ser compradas e 
vendidas sem precisar de aprovação do governo. As terras tornaram-
se. então, mais valiosas, porque por intermédio da compra e venda 
elas poderiam ser transformadas em dinheiro. As terras passaram a dar 
lucro a seus proprietários, independentemente das benfeitorias nelas 
existentes. 
A Lei de Terras tinha como finalidade forçar a colonização de mais 
ferras e autorizava o governo a vender, por leilão, as terras devolutos, 
isto é, terras que não possuíam registro de propriedade. Apenas um 
mês depois da aprovação da Lei de Terras, o Ministério do Império 
Mandava incorporar como terras devolutas as terras dos índios que já 
não viviam em aldeamentos. 
A Guerra do Paraguai marcou profundamente a história dos Guaná. I 
Como vimos, um dos palcos do conflito foi justamente em território deste 
povo, que aliado dos brasileiros, sofreram ataques e represálias por parte 
das tropas paraguaias. É quase certo que todas as aldeias então existentes 
na região dos rios Miranda e Aquidauana desapareceram, com seus 
habitantes buscando refúgio nas serras de Maracajá e Bodoquena. 
Quando a Guerra do Paraguai chegou ao fim, em 1870, os Terena 
começaram a voltar para suas antigas aldeias, destruídas durante os 
combates. Muitas aldeias haviam sido completamente aniquiladas e 
nunca mais foram reconstruídas ou recuperadas. O antigo território das 
aldeias já era disputado por novos "proprietários", em geral oficiais 
desmobilizados do exército brasileiro e comerciantes que lucraram com 
a guerra e que permaneceriam na região. 
Os Terena haviam lutado na Guerra para garantirem os territórios 
que ocupavam, mas este direito não foi garantido pelo governo brasileiro 
e a vida do povo Terena seria, a partir daí, bem diferente. 
Depois de ganhar a guerra contra os paraguaios, o governo brasileiro 
começou a incentivar a ida de purutuyés de outras regiões do país para 
Mato Grosso. Assim, o governo poderia controlar melhor a região, 
guardando a fronteira com fazendas de gado e plantações. 
2. Os Terena depois da 
Guerra do Paraguai 
Muitas terras de posse dos índios foram assim tomadas e vendidas 
em leilão; justamente daqueles índios que não eram mais "selvagens" e 
viviam pacificamente com os chamados "civilizados". Esta era uma nova 
situação da história da propriedade da terra no Brasil e afetou muito a 
vida dos grupos indígenas. 
Pela primeira vez o governo do Império estabelecia em lei a 
diferença entre "índio bravo - índio manso". O "índio bravo" era 
selvagem porque defendia através das armas a sua terra, e nesse caso 
o governo reconhecia sua posse. Agora, o "índio manso" não brigava I 
mais, então podia ser expropriado de sua terra. E esta era a condição I 
do povo Terena. 
Aqui dois índios Terena que combateram na guerra, com uniformes de oficiais em 
desuso. 
As fazendas começaram a se multiplicar. Na região do Mato Grosso, 
os Terena viram-se cada vez mais cercados pelas fazendas de gado. 
Os rebanhos das fazendas es tavam sempre destruindo as 
Plantações dos Terena. A vida nas aldeias ficou muito difícil e boa parte 
dos Terena foi obrigada a se empregar como trabalhadores nas fazendas. 
É por isso que muitos avós que hoje moram nas aldeias nasceram nas 
fazendas. Os Terena que não queriam se submeter acabavam por sair 
da região e se refugiaram em lugares mais distantes. Os fazendeiros 
conseguiam, então, se apossar de mais terras do povo Terena. 
Os conflitos entre os Terena e os fazendeiros eram constantes. Havia 
muita exploração dos proprietários brancos sobre o trabalho dos Terena. 
Um exemplo dos conflitos foi o que ocorreu por volta de 1890. Dois 
fazendeiros brigavam entre si na região de Miranda. A fazenda Santana, 
que era disputada pelos dois fazendeiros foi saqueada por um deles, 
mas o proprietário resolveu por a culpa nos Terena da região de 
Cachoeirinha. Por causa dessa acusação, os Terena foram obrigados a 
trabalhar de graça para o dono da fazenda. O povo de Cachoeirinha se 
revoltou contra esse fazendeiro e muitas famílias deixaram a aldeia, 
buscando refúgio em Bananal e na serra do Maracaju. 
Este período da história do povo Terena é conhecido como os 
Tempos da Servidão. 
Os tempos da servidão dos Terena ainda é lembrado nos relatos 
do povo das aldeias: 
"Naquela época os Terena se encontravam fora de sua 
aldeia, trabalhando nas fazendas em condições de quase 
escravidão. Trabalhavam quase sem remuneração e muitas 
vezes os fazendeiros simulavam o acerto de contas e diziam, 
aproveitando-se dos índios: você ainda está devendo, portanto 
tem que trabalhar mais um ano. E a cada acerto de contas eles 
repetiam o mesmo." (Genésio Farias) 
"O pessoal daquela época tinha medo porque ainda se 
lembrava do patrão que os chicoteava na fazenda. Quem se 
atrasava para tomar chá de manhã era surrado... foi o finado 
meu avô quem me contou. Como castigo o pessoal tinha que 
arrancar o mato com as próprias mãos. Quando a comida 
estava pronta, eles mediam toda a sua tarefa. Eram quinze 
braças de tarefa e, mesmo não terminando a tarefa do dia, de 
manhã mediam outra tarefa, que acumulava." (João Menootó' 
Martins) 
"Meu pai, Belizário Rondon, da aldeia Passarinho, foi cativo 
da fazenda Sucuri. Para marcar o tempo, era orientado peia lua 
nova e para acertar a conta com o patrão ele fazia traços na 
bainha do facão, marcando os dias do mês." (Honorato Rondon 
da aldeia Passarinho) 
3. O govêrno republicano 
e os povos indígenas 
Muitas mudanças aconteceram no país depois da Guerra do Paraguai. 
Algumas cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, cresceram 
rapidamente e surgiram as primeiras fábricas no Brasil. Em 1888, o 
governo pôs fim ao trabalho escravo e começou a incentivar a vinda de 
imigrantes da Europa para trabalhar principalmente nas fazendas de café. 
O café havia se transformado no principal produto de exportação do Brasil. 
O café era transportado através de estradas de ferro até o porto de 
Santos, de onde era exportado para outros países. Com parte dos lucros 
da venda do café, foi possível desenvolver novas técnicas e 
aperfeiçoamentos nos meios de comunicação. O Governo do imperador 
D. Pedro II havia também iniciado uma política de instalação de linhas 
telegráficas. 
Em 1889, enquanto o povo Terena ainda vivia no tempo da servidão, 
o imperador D. Pedro II foi tirado do poder por um grupo de militares 
apoiados por grupos sociais que desejavam mudanças nas leis e na 
organização econômica do país. O Brasil, então, deixou de ser uma 
monarquia e se tornou uma república, governada por um presidente. 
O governo republicano ampliou a política de construção de estradas 
de ferro e de linhas telegráficas para melhorar a comunicação e o 
transporte entre o litoral e o interior do país e fortalecer seu controle 
sobre todo o território brasileiro. As estradas de ferro facilitavam também 
o transporte de produtos para os portos do Oceano Atlântico, de onde 
eles seriam exportados para países distantes. 
A instalação de linhas de telégrafo, ligando o litoral ao interior do 
país, fazia parte das grandes transformações promovidas pelogoverno. 
O telégrafo era o meio de comunicação à distância mais rápido e 
moderno que existia naquela época. 
Em 1888, um ano antes da República ser proclamada, o imperador 
D. Pedro II criou a Comissão Construtora de Linhas Telegráficas. o 
objetivo dessa Comissão era instalar linhas de telégrafo por todo o interior 
do Brasil e sua primeira missão foi levantar os postes telegráficos da 
cidade paulista de Franca até a cidade de Cuiabá no Mato Grosso. 
O governo republicano continuou a instalar os postes telegráficos 
na região do Mato Grosso. Em 1900 foi organizada uma Comissão para 
ligar o trecho do telégrafo de Cuiabá até a fronteira com a Bolívia e o 
Paraguai. Essa Comissão foi liderada por Cândido Mariano da Silva 
Rondon, que já havia participado de outros trabalhos de construção da 
linha telegráfica. 
A construção desse ramal do telégrafo exigia muita mão-de-obra e 
Rondon passou a convencer os índios para ajudar nos trabalhos de 
instalação da linha. 
"O poste telegráfico vai abrindo caminho à civilização. E. neste caso, duplamente, os 
operários que o erguem são quase todos recrutados entre os indígenas locais." 
Os primeiros índios que participaram dos trabalhos da comissão 
foram os Bororó. Quando a linha telegráfica chegou à margem do rio 
Taquari, os Bororo não quiseram mais continuar seu trabalho. Dali para 
frente, disseram eles, estava o território dos Guaicuru e dos Terena. E, 
a partir daquele momento, o trabalho dos Bororo foi substituído pelo 
dos Terena, que participaram das atividades da Comissão até o final. 
Essa época ainda faz parte da memória dos mais velhos das aldeias: 
"Quando o finado Marechal Rondon passou por aqui, meu 
tio mais velho foi com ele. Meu tio se chamava José Henrique. E 
tinha outro tio meu que acompanhou o Marechal Rondon 
quando ele passou na terra de Cachoeirinha. Ele se chamava 
José Marques e era cozinheiro lá onde eles acampavam. 
Eles passavam na região de Cáceres, Barra dos Bugres, 
pra lá de Cuiabá, onde meu tio passou acompanhando a 
medição da terra. Esse era o serviço de meu tio. Rondon gostava 
muito de andar com José Henrique, meu tio mais velho, porque 
ele trabalhava muito bem..." 
(relato do sr. Félix da aldeia de Cachoeirinha) 
Nas palavras de Rondon, esse tempo de pós-guerra, o tempo da 
servidão, é assim descrito: 
"Os Terena são comumente explorados pelos fazendeiros. É 
difícil encontrar um camarada Terena que não deva ao seu patrão 
os cabelos da cabeça... Nenhum "camarada de conta" poderá 
deixar o seu patrão sem que o novo senhor se responsabilize. E, 
se tem ousadia de fugir, corre quase sempre o perigo de sofrer 
vexames, pancadas e não raras vezes a morte, em tudo figurando 
a polícia como co-participante em tais atentados" 
4. A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil 
Depois da Guerra do Paraguai, dois fatos significativos marcariam a 
história dos Terena, a criação do Serviço de Proteção aos índios/SPi e a 
construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, esta última responsável 
direta pelo aumento da população da região sulmatogrossense. O número 
de habitantes cresceu cinco vezes mais em poucos anos. 
Em 1904, quando a linha telegráfica até a fronteira com a Bolívia 
ainda estava sendo construída, foi fundada a Companhia Estrada de 
Ferro Noroeste do Brasil. 
Essa Companhia, que foi criada com dinheiro brasileiro, francês el 
belga, tinha o objetivo de construir uma estrada de ferro ligando a cidade 
de Bauru, no estado de São Paulo, à cidade de Corumbá, em Mato 
Grosso. 
A cidade de Corumbá foi escolhida por estar na fronteira com a 
Bolívia. O governo brasileiro ainda estava levando adiante o projeto de 
fortalecer as fronteiras no sul de Mato Grosso. Depois de pronta, essa 
ferrovia seria ligada a outra estrada de ferro que já estava sendo 
construída e ligava a cidade de Bauru ao porto de Santos. Com a Estrada 
de Ferro Noroeste, o sul do Mato Grosso teria um caminho seguro até o 
mar. O trem também levaria com rapidez os produtos de Mato Grosso 
para o litoral. Isso faria com que mais purutuyés fossem para a região 
da fronteira com o Paraguai e Bolívia criando fazendas e cidades. 
Em 1905 começou a construção da Estrada de Ferro Noroeste. Seus 
trilhos eram instalados ao mesmo tempo em Mato Grosso e em São 
Paulo, e se encontrariam no meio do caminho. De Corumbá, a estrada 
de ferro passaria por Porto Esperança, Miranda, Aquidauana, Campo 
Grande, Três Lagoas, Araçatuba, Penápolis, até chegar a Bauru. 
Os Terena que já haviam participado da instalação da linha 
telegráfica, trabalharam na construção do trecho Mato Grosso da ferrovia, 
juntamente com os purutuyé pobres. No trecho paulista os trabalhos 
tiveram que ser suspensos por um bom tempo por causa da resistência 
do povo Kaingang contra a invasão de seu território. 
Os Kaingang já estavam em guerra contra os fazendeiros de café 
quando a ferrovia começou a ser construída. Fazendeiros que queriam 
plantar café nas terras dos Kaingang estavam invadindo o território desse 
povo. 
A construção da estrada de 
ferro fez esse conflito ficar mais 
violento porque os trilhos da 
estrada de ferro p a s s a v a m 
dentro do território Kaingang. Os 
Kaingang começaram a atacar 
os t rabalhadores da ferrovia, 
que t a m b é m m a t a v a m os 
Kaingang sempre que tinham a 
oportunidade. 
Funcionários do SPI foram mandados para o território dos Kaingang 
tentar fazer um acordo de paz. Em 1912 um primeiro grupo de Kaingang 
liderado pelo cacique Vauhin, fez a paz com o pessoal do SPI. Depois 
dele, outros grupos começaram a depor suas armas. 
Com o tratado de paz, os Kaingang foram aldeados em reservas 
muito pequenas, perdendo a maior parte de suas terras para os 
fazendeiros. Nos anos seguintes, a maior parte desse povo morreu de 
doenças transmitidas pelos brancos. 
Com o fim da resistência dos Kaingang, a ferrovia seguiu em direção 
a Mato Grosso, encontrando-se, em 1917, com o trecho construído, com 
a participação dos Terena, a partir de Porto Esperança. Muitos dos Terena 
que trabalharam na construção da Estrada de Ferro Noroeste ficaram na 
memória dos mais velhos: 
"Os trabalhos da ferrovia foram feitos praticamente pelos 
índios. Muitos morreram pelos vários acidentes que aconteceram 
no período de construção da estrada de ferro. Da aldeia 
Cachoeirinha participaram José Benedito, Elias Antônio, Félix 
Candeia e muitos outros. 
Segundo eles foi um trabalho difícil, arriscando a própria 
vida na região do Pantanal, onde existem muitos animais 
selvagens. 
Félix Antônio, Úli Terena, lembra que participou da 
construção da ponte do rio Paraguai e quando chegou na cidade 
de Corumbá, foi realizada uma festa, comemorando a realização 
do trabalho." 
ATIVIDADES 
1. A Lei de Terras de 1850 e as terras indígenas 
Explique com suas palavras o que foi a Lei de Terras de 1850 e escreva 
nas linhas abaixo. 
Por que as populações indígenas foram prejudicadas pela Lei de Terras 
de 1850? 
2. Os Terena depois da Guerra do Paraguai 
Por que o governo incentivou a ida dos purutuyé para Mato -Grosso? 
Quais a mudanças que ocorreram com os Terena depois da Guerra do 
Paraguai? 
Escreva sobre algum tipo de conflito entre os Terena e os fazendeiros. 
por que este período da história do povo Terena é lembrado como 
Tempos da Servidão? 
3. O governo republicano e os povos indígenas 
Qual a diferença entre Monarquia e República? 
Quando o Brasil tornou-se uma República? 
Qual a importância da construção das ferrovias e das linhas de telégrafo 
no final do século XIX e início do século XX para o Brasil? 
Escreva sobre o tipo de participação dos Terena na construção das linhas 
de telégrafo. 
4. estrada de ferro Noroeste do Brasil 
por que nove conflitos entre o governo e os Kaigangs na época da 
construção da Noroeste do

Continue navegando