Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
REYNALDO PORCHAT LENTE DA FACULDADE DE DIREITO DE SÃO PAULO DA RETROACTIVIDADE DAS LEIS CIVIS São Paulo Duprat & Comp - Rua Direita. 26 1909 DA RETROACTIVIDADE DAS LEIS CIVIS CAPITULO I Do conceito da retroactividade 1. A efficacia e o imperio da lei têm um determinado limite de tempo, que é fixado pelo momento inicial da sua publicação o pelo mo-mento final da sua abrogacão. Dentro nesse espaço de tempo, são regulados pela lei vigente todos os actos que nelle se realisam produzindo relações juridicas. Mas quando uma lei é abro- gada por uma outra lei. acontece geralmente que certos actos que furam praticados no do-minio da primeira, produzem consequencias ou effeitos que se projectam pelo tempo posterior a abrogação e vão eífecttvar-se ou tornar-se exigiveis quando já se acha em vigor a nova lei prerrogativa. — 4 — E se é verdade que a autoridade da lei cessa quando é ella abrogada, parece, á primeira, vista, que não póde mais ser invocada para regular quaesquer relações de direito, uma vez que pela publicação de uma nova lei começou esta a exercer plenamente a sua autoridade. Entretanto o direito permitte que, mesmo dentro no periodo de tempo em que domina a lei nova, seja invocada a lei antiga para reger certos actos que nasceram sob o seu imperio, e que ainda pão se acham de todo consummados, bem como as consequencias e os effeitos resultantes desses mesmos actos. 2. Quando a lei nova em vigor não attinge com a sua autoridade esses actos e suas consequencias, e os deixa inteiramente regulados pela lei antiga, sob cujo dominio tiveram nascimento, se diz que não ha retroactividade, isto é, que a lei nova não retroage, não tem acção alguma sobre taes actos praticados no passado, antes do momento da sua publicação, embora só depois desta se tornem exigíveis as respectivas consequencias e effeitos. Ao envez, quando a autoridade da lei nova se exerce sobre actos que foram praticados sob o dominio da lei antiga, e regula os effeitos e consequencias que venham a produzir-se já sob o imperio da nova lei, se diz que ha retroactividade, isto é, que a lei retroage, e que debaixo de sua acção cáem — 5 — os actos que. nasceram antes da sua publicação, mas cujos effeitos venham a tornar-se exigíveis depois delia. 3. Quaes sejam os actos que escapam á acção da lei nova, e quaes sejam os que a ella se submettem — é o importantíssimo problema juridico, que deu logar á construcção da theoria da retroactividade das leis, chamada por alguns ctheoria da não retroactividade das leis», (¹) por outros, «theoria da irretroactividade», (2) «theoria dos direitos adquiridos» (3) e que outros denominaram «questões de direito transitorio». (4) 4. O assumpto, quer sob o ponto de vista puramente theorico, quer sob o ponto de. vista do interesse prático, é dos que têm des-pertado as maiores controversias, ou, como diz Clovis Bevilaqua, é um dos pontos mais obscurecidos pela discussão jurídica. (5) Já no dar o nome á theoria, como acabamos de ver, não se harmonisam os escriptores. 5. E o desaccôrdo ainda se manifesta com maior inconvenieacia para o estudo da materia no definir-se o que seja retroactividade da lei. (¹) Baudry Lacantinerie—Trait. de Droit. Cio., % ed. v. I n. 125, nota I (²) Pacifici-Mazzoni — Ist. di Dir. Cio. Ital., v. I n.° 85 e segs. (³) Lassalle—Théor. Systém. d.s Droits. Acguis., trad. franc. 1,904— v. 1. (4) Chabot de 1'Allier—Quest. trans. sur le Cod. Civ. (5) Clovis Bevilaqua—Th. Ger. do Dir. Civ. pag. 19. 7. Os actos ou relações jurídicas perante os quaes a lei nova não retroage, são os con- vencionalmente chamados — direitos adquiridos. Quando, ao executar-se uma lei nova qual- quer, depara-se um direito adquirido que possa ser lesado, a lei não tem applicação ao caso, porque a retroactividade seria injusta. Quando não se encontra direito adquirido, applica-se a lei, mesmo retroactivamente, porque a retro-actividade é justa. A expressão — direito adquirido— é usa-da de longa data, geralmente adoptada, e exprime com clareza a idéa que nella se quer incluir. Não têm razão, portanto, Planiol, (¹) Va- reilles Sommières (2) e os que com elles criticam o uso dessa expressão, sem lhe apresentarem substitutivo satisfactorio. Se, em alguns casos, ha difficuldade em decidir se se trata de um direito adquirido ou de uma espectativa, isso não autorisa a declarar inexacta ou falsa a distincção. £' verdade que pode ser ella tomada em sentido differente quando se trate de outra materia jurídica; mas, empregada em qualquer questão pertencente á theoria da retroactividade das leis, tem um significado proprio, technica-mente firmado, e que não se confunde com qualquer outro. (1) Planiol— Trait. de Dr. Civ., 4 ed., v. I, n. 24I. (2) Vareilles Sommières — Une theor. nouv. sur la no* re-troact. des lois, apud Baudry, ob. cit., n. 125, n. I. CAPITULO II Do direito adquirido ; direito consumma-do ; faculdades ; espectativas. 8. Direito adquirido — Se é pelo re- conhecimento da existencia ou inexistencia do direito adquirido, que se conclue pelo effeito não retroactivo ou retroactivo de uma lei nova, cumpre fixar, de modo claro, o que seja — direito adquirido. Ingentes têm sido as tentativas feitas para o definir; e os mais notaveis jurisconsultos têm tomado parte na tarefa. Quasi sempre falhos ou incompletos os resultados, Planiol (¹) ainda modernamente chegou a chamar de artificial e viciosa a doutrina do direito adquirido, julgando impossível dar-lhe uma definição satisfactoria. (2). Mas não. pensamos com Planiol. Depois do preciosíssimo contingente trazido pelo insi- (1) Planiol—loi-, cit. (2) Guilherme Alves Moreira, na sua substanciosa obra ultimamente publicada, applaude a critica de Planiol; e para não empregar a expressão consagrada— direito adquirida —usa de outras equipollentes : «direito definitivamente individualisado >, « situação subjectiva definitivamente constituída >, etc.—Inst. dt Direito Civil Português—1907—v. I m. 36, 37 e 38.) — 12 — 121. Mais do que todas, a noção dada por Savigny, (1) contribue efficazmente para for-mular-se uma definição do direito adquirido. Para elle, direitos adquiridos são consequencias de factos juridicos passados, mas consequencias ainda não realisadas, que ainda não se tornaram de todo effectivas. Direito adquirido é, pois, todo o direito fundado sobre um facto juridico que já succedeu, mas que ainda não foi feito valer, são «as relações jurídicas de uma pessoa determinada, isto é, os elementos de uma esphera de independente domínio da vontade individual, e não as faculdades abstractas de todos os homens ou de classes inteiras de homens», nem as «espectativas, que se fundam sobre uma antiga lei, mas são destruídas pela lei nova». Nessa noção, vem se destacados alguns cara- cterísticos do direito adquirido: — consequencias de facto realisado sob a lei antiga, constituindo relações de direito, onde se manifesta o domínio da vontade individual, mas que ainda não se fizeram valer. 13. Posteriormente Lassale, imprimindo uma orientação profundamente philosophica ao estudo da materia, em sua admiravel monogra-phia sobre o assumpto (2) veiu, com idéas inteiramente novas, accentuar uma das feições (1) Savigny—ob. cit. v. 8 § 385, pags. 382, 385, 386 e 387. (2) Lassalle— ob. cit. — 13 — mais características do direito adquirido, mostrando a razão por que elle se impõe ao respeito perante quaesquer disposições de uma legislação futura. Para Lassale, o direito adquirido se apresenta como a effectuação da livre 'vontade do individuo. Quem o adquiriu, obroucomo um ente livre que pensou e quiz, sabendo o que queria, conhecendo a lei vigente, e acceitando voluntariamente as consequencias do seu acto. Uma lei nova que o violasse, constituiria uma af- fronta á inviolabilidade da personalidade humana. Este cunho da individualidade da pessoa, que assignala o direito adquirido, deante do qual deve desapparecer qualquer effeito de uma lei nova, é um dos pontos em que mais realça a theoria de Lassalle, e em que mais proveitosamente elle contribue para o conhecimento da natureza desse direito. A theoria do eminente escriptor pecca, porém, por ter elle, arrastado pelas exagerações da sua escola philosophica, affirmado que o direito adquirido resulta exclusivamente de um acto da liberdade individual, da acção livre da vontade, e não póde nascer de uma simples determinação legal independentemente do concurso da vontade do individuo. E' um pequeno senão, que torna incompleta a sua brilhante doutrina, excluindo da categoria dos direitos adquiridos alguns direitos, que devem ser incontestavelmente considerados taes. — 14 — Porque, como justamente observa Gabba (l) comquanto seja verdadeiro que a maior parte das relações jurídicas sejam postas em existen- cia pela vontade humana, e por isso a maior parte dos direitos adquiridos o sejam por meio de actos voluntarios, é, entretanto, certo que alguns direitos nascem directa ou indirectamente ipso jure, isto é, por obra da lei, e constituem verdadeiros direitos adquiridos. 14.. Foi com o aproveitamento dos elementos colligidos nas difinições precedentes, que o insigne Gabba, corrigindo e completando as idéas anteriormente expostas, conseguiu formular a su.t longa definição do direito adquirido. «E' direito adquirido», define elle, «todo o direito — a) que é consequencia de um facto idoneo a produzil-o em virtude da lei do tempo em que esse facto foi realisado, embora a occa-sião de o fazer valer não se tivesse apresentado antes da existencia de uma lei nova sobre o mesmo objecto, e —b) que nos termos da lei sob o imperio da qual se deu o facto de que se originou, entrou ímmediatamente a fazer parte do patrimonio de quem o adquiriu.»(2). (2) Gabba— ob. cit. p- 175. (2) Gabba—eb. cit p. 191. Espínola—Syst. de Dir. Civ. Brasil, pag. 170 nota 5—reconhece que esta definição apresenta um criterio distinctivo sufficiente não só sob o ponto de vista theorico, como tambem para as necessidades da prática. Não pensa assim o douto Lacerda de Almeida—que a critica com rigor, em substancioso artigo publicado no Jornal do Commecio de 28 de fevereiro de 1909. — 15 — Essa definição, desde que seja completada com esta frase final, que lhe offerecemos em additamento,— «ou constituiu o adquirente na posse de um estado civil definitivo»,— encerra todos os característicos distinctivos do direito adquirido, que são: 1.° um facto acquisitivo, idoneo a produzir direito, de conformidade com a lei vigente; 2.0 uma lei vigente no momento em que o facto se realise; 3.0 capacidade legal do agente ; 4.0 ter o direito entrado a fazer parte do patrimonio do individuo, ou ter constituído o adquirente na posse de um estado civil definitivo; 5.0 não ter sido exigido ainda ou consum-mado esse direito, isto é, não ter sido ainda realizado em todos os seus effeitos. 15. I.° o facto — A expressão facto, segundo observa o autor da definição, deve ser tomada no seu mais amplo sentido, comprehen-dendo os factos e as relações jurídicas. E esse facto deve ser realisado completamente, de ac-cordo com a lei em vigor, porque se o facto) não tiver sido perfeito, como exige essa lei, não será apto a fazer adquirir um direito. O direito de uma pessoa determinada nasce do facto — jus oritur ex facto. Emquanto não se verifica o facto, que produz a acquisição de um direito, ha apenas possibilidade de direito, simples faculdade jurídica abstracta, ou mera espectativa. Para que o facto acquisitivo possa produzir direito, deve consistir em uma modalidade da situação em que o homem está pelo simples facto de ser homem. Essa modalidade pode provir ou de acto positivo da vontade humana, ou de fortuitas contingencias da vida social, de que a lei faz originar-se um direito. O acto voluntario pode ser praticado por uma só pessoa, seja a propria que adquire o direito, seja um terceiro, ( actos unilateraes ), ou por mais de uma pessoa (convenções); e pode ainda ser praticado ou com o proposito de fazer surgir um direito, ou sem o escopo de crear direito A palavra—facto—comprehende, pois, essas tres modalidades indicadas. Donde se conclue que um direito adquirido póde provir ou de um acto da propria vontade do adquirente, ou de um acto voluntario de outra pessoa, ou da determinação da lei, em virtude de uma cir-cumstancia qualquer ou caso fortuito. 16. Para que o facto acquisitivo seja apto a produzir direito adquirido, deve reunir certos requisitos essenciaes, que são os seguintes : a) Deve ser praticado de conformidade com a lei vigente, sendo observadas as condições e as formalidades prescriptas sob pena de nullidade. E' claro que um facto realisado — 17 — contra o disposto na lei em vigor seria inválido ou nullo, e de facto nullo não póde resultar nenhum direito. E desde que a lei estabelece certas fórmalidades especiaes internas ou externas, para que um acto seja idoneo a produzir direito, é certo que o facto acquisitivo deve ser posto em existencia com observancia dessas fórmalidades que a lei do tempo exige. E' perante esta lei que se deve verificar se o facto é legal, quer quanto á materia, quer quanto á fórma, e se está apto a produzir effeitos juridicos — tempus regit actum. Se não contiver as condições e as fórmalidades exigidas pela lei do tempo em que teve existencia, é nullo e não produz effeito algum. 17. Entretanto, alguns autores sustentam que, embora seja nullo um facto por ter sido praticado com falta de alguma condição ou fór- mal idade exigida pela lei do tempo, esse facto convalescerá quanto á substancia ou quanto á fórma, isto é, se tornará válido, desde o momento em que appareça uma lei nova dispensando a condição e a fórmalidade que não foi observada. Assim, por exemplo, se um testamento fôr feito por um menor, e sómente perante quatro testemunhas, o que será motivo de nullidade perante a lei actual, tornar-se-á válido se, por occasião da morte do testador, houver uma nova lei permittindo que os me- — 18 — nores façam testamento e que os testamentos sejam feitos perante quatro testemunhas. Lassalle argumenta em prol dessa opinião, no tocante á convalescença material, embora) quanto á convalescença fórmal a restrinja só ao que elle chama —fórmas probatorias, e diz que, desde que a lei nova aboliu a disposição prohibitiva que impedia a manifestação da vontade, não ha razão para que essa manifestação da vontade não produza effeito, uma vez que ella ainda subsiste, e que desappareceu o unico obstaculo que havia. E procurando encontrar fundamento para a sua opinião no direito romano, mostra que, se entre pessoas de differente religião, ou ligadas por parentesco em gráu proximo, se realisasse um casamento prohibido, e, portanto, nullo perante a lei vigente, esse casamento tornar-se-ia válido desde o dia em que apparecesse uma nova lei abolindo taes impedimentos. Gabba rebate com vantagem a opinião de Lassalle, proclamando um principio inteiramente opposto. (1). Diz elle que, assim como a lei nova não póde apagar os effeitos das relações jurídicas validamente concluidas sob o imperio de uma lei precedente, assim tambem não póde, salvo em casos excepcionaes e expressamente determinados,attribuil- os a actos que são nullos (1) Gabba—ob. cit., v. I, p. 243 — 19 — em virtude da lei sob cuja autoridade foram concluídos. Realmente, quem praticou um acto juridico violando as disposições imperativas da lei vigente, não póde esperar que esse acto venha algum dia a produzir effeito, como se a lei houvesse sido observada. Pode acontecer mesmo que uma pessoa viole a lei intencionalmente, certo de que o seu acto nunca produzirá effeito juridico. E seria uma violencia que a doutrina viesse válidar um acto contra a vontade de quem o praticou. 18. Nada faz para o caso o exemplo que Lassalle pretendeu encontrar no direito romano, onde, no fr. 4 e no fr. 65 § 1—de ritu nupt. (23-2) se declara que, embora originariamente inválido o casamento de um impubere, ou de um magistrado provincial com uma mulher da província por elle administrada, esse casamento se torna valido, desde o momento em que o impubere se torne pubere, ou o magistrado deixe o cargo que exercia. Em verdade, nesses casos, o direito romano admitte que se torne válido um acto que originariamente era nullo, não porque appare-cesse uma lei nova abolindo os impedimentos, como faz suppor Lassalle, — pois, não ha, nas hypotheses figuradas, nenhuma mudança de legislação, — mas sim, porque, como bem claramente se vê pelos exemplos, cessaram as cir- — 20 — cumstancias de facto que produziam a nullidade perante a lei vigente. Antes, o direito romano proclama o principio contrário, de que não convalescem os actos nullos, o que se vê estabelecido não só em materia de legados e fideicommissos pela regra cataniana (D. 34-7 ), segundo a qual o que é vicioso desde o principio não póde ter força nem effeito em qualquer tempo, como tambem nas regras geraes de direito, onde diz Paulo que—quod initio vitiosum est, non potest tractu temporis convalescere (fr. 29—de reg.jur. (50-17), e L. Rufino que—quæ ab initio inuti-tilis fuit institutio, ex postfacto convalescere non potest. (fr. 210 h. t.) O instituto da ratihabitio tambem em nada apoia a doutrina de Lassalle, porque, na ratihabitio—ratum habere,—ha uma approvação e ratificação daquillo que foi feito por falso procurador1,— rem haberi ratam hoc est comprobare adgnoscereque quod actum est a falso procuratore. (1) Está claro que não se cogita ahi de mu-dança de legislação. Savigny diz positivamente que a fórma de um negocio juridico deve julgar-se exclusivamente segundo a lei existente no tempo em que foi elle realisado de modo que uma lei posterior não influe sobre a sua válidade, quer simplifique, quer complique a antiga fórma. Esta (1) Ulpianus, fr. 12 § —rat. rem haberi (46—8). — 21 — maxima póde exprimir-se com as palavras — tempus regit actum, —• que correspondem, e aliás com maior gráu de certeza, á regra de direito local — locus regit actum (1). 18. b) O facto deve realisar-se em tempo proprio, isto é, deve ser posterior á publicação, e anterior á abrogação da lei que lhe dá effeito juridico. Realmente, o effeito juridico de um facto só lhe pode ser reconhecido pela lei dentro de cujo período de obrigatoriedade elle teve existencia. Algumas vezes acontece que uma lei nova attribue effeitos juridicos diversos a um facto dado no domínio da lei antiga. Mas isso só se pode verificar a respeito de um facto de natureza permanente, começando os effeitos ju- rid icos depois da publicação da nova lei, e sob a condição de não serem lesados direitos adquiridos. 19. c) Deve ser perfeito, isto é, reali-sado completamente e em todas as suas partes. Diz-se assim, porque o facto acquisitivo pode ser simples ou complexo. Simples é aquelle que se realisa em um só momento, não apresentando partes successivas, separadas por um intervallo de tempo, (compra e venda, mutuo, etc.) Complexo é aquelle que se compõe de partes, as quaes vão tendo existencia separadamente, com intervallos de tempo. O facto complexo ainda (1) Savigny, ob. cit. v. 8 ( 388. p. 409. — 2 2 — pode verificãr-se de tres modos: ou posto em existencia por uma só pessoa, que praticou a série de actos em um período mais ou menos longo de tempo : (a usucapião); ou por duas ou mais pessoas, praticando cada uma separadamente, uma parte distincta do facto: (a suc-cessâo testamentaria); ou por um acto humano qualquer, ao qual se ligue um acontecimento posterior, que a pessoa não tem o poder de evitar: (os factos condicionaes). Emquanto o facto não está realisado era todas as suas partes, não póde produzir um di-reito adquirido. 20. Os autores discutem se, estando rea-lisada apenas uma parte do facto complexo quando appareça uma lei nova, pode a pessoa ainda realisar as outras partes para o fim de adquirir um direito. Gabba (1) responde fazendo distincções: E' permittido aperfeiçoar o facto, quando a parte que falta seja infallivel, devendo necessariamente verificar-se, (2) ou quando seja uma verdadeira e propria condição, cujo implemento não possa ser evitado pela pessoa contra quem se fórma o direito adquirido, ou quando seja um desenvolvimento ou transfórmação de um direito adquirido anterior em que ella tenha a sua base. (1) Gabba— ob. cit. p. 229. (2) Conf. Papinianus, fr. 79 princ. — de cond. et demonst. (35—O Ulpianus, fr. 921—de novat— (46—2). — 23 — Fóra dessas tres condições, não é permit tido completar ou aperfeiçoar o facto, pois a parte realisada pode conter apenas uma espe-ctativa e não um direito adquirido, visto que «não se póde admittir direito adquirido a adquirir um direito». 21. 2.° A lei vigente — Gabba (¹) diz que todas as vezes que affirmamos a existencia concreta de um direito, essa affirmação tem dois objectos: i.° a existencia de um facto do qual, ou em virtude do qual nós consideramos que surgiu o direito, 2.° a existencia de uma lei que daquelle facto faz nascer um direito. A lei nova, embora affirmando ou negando alguma cousa, deve referir-se a um objecto con-Icreto, visando determinados factos ou circum-stancias. Antes de concretisado no facto, o direito existe apenas em abstracto, em um simples estado de possibilidade na lei que dá a norma de agir e reconhece nos indivíduos uma faculdade jurídica. E formulando uma proposição fundamental na theoria da retroactividade, o eminente escriptor observa que não se pode admittir um direito concreto, que não tenha o seu fundamento em uma lei ou norma jurídica positiva, ( comprehendendo os usos e costumes), vigente no tempo em que o direito surge, e não provenha de um facto ao qual essa norma [jurídica attribue a virtude de produzir direito. (¹) Gabba—ob. cit. p. 195. A lei do tempo é que regula o facto. E não é possível applicar a um mesmo caso juri- dico duas leis emanadas em tempo diverso, salvo quando o facto juridico é complexo, e se decompõe em partes distinctas que tiveram existencia em tempo e sob leis differentes. 22. 3.° Capacidade legal do agente — Para que um facto seja idoneo a produzir direito, é necessario que o agente tenha capacidade jurídica reconhecida pela lei vigente no momento em que surgiu o facto. As questões de dolo, violencia ou erro, que podem viciar a vontade e influir sobre os effeitos de um acto praticado, devem ser tambem julgadas de accor-do com a lei do tempo. A capacidade de agir, diz Savigny, deve ser julgada exclusivamente segundo a data do facto juridico, seja . no tocante ao estado do facto, seja no que concerne á lei existente. Assim, se um menor conclue um contracto sem assistencia do tutor, este contracto é e permanece nullo, ainda depois que o menor tenha attingido a maioridade, e mesmo que uma lei posterior antecipe a epoca da maioridade. E da mesma fórma, o contractofeito por um maior de 21 annos é e permanece válido, mesmo que depois seja adoptada a legislação romana que fixa o começo da maioridade em 25 annos. (1) (¹) Savigny—ob. cit. v. 8 § 387 p. 408. — 25 — 23. 4.° Caracter patrimonial ou concreta utilidade resultante da posse de um estado civil definitivo — (¹) Nem de todos os direitos se pode dizer que são adquiridos. Para verificar-se a existencia de um direito adquirido, é necessario que elle constitua uma uti- lidade concreta da pessoa, utilidade que pode traduzir- se ou por vantajosas condições pessoaes subjectivas, resultantes da posse de um estado civil definitivo, ou por vantagens patrimoniaes, comprehendidas estas na sua mais ampla accepção. (2) A primeira fórma de utilidade attinge as qualidades constitutivas do estado da pessoa, (3) a segunda o patrimonio propriamente dito, concretisando-se em cousas externas, objectos de direito. O direito adquirido é, pois, individual, ou por fazer parte do patrimonio material de uma pessoa, ou por ligar-se intimamente á individualidade de alguem como um dos seus caracteres distinctivos. Limitando cuidadosamente o conceito do direito aquirido, adverte Gabba (4) que <direitos concretos e adquiridos são sómente aquelles (1) Filomnsi Guelfi— ob, cit- § 32 p. 111—diz que o direito adquirido, que deve ser respeitado, pertence ao domínio do direito privado devendo ter sido produzido de modo legitimo e fazer parte do patrimonio da pessoa. (2) Huc—Code Civil v. I n. 66. (3) Baudry Lacantinierie—ob. cit., v. 1 n. 146. (4) Gabba—ob. cit. p ato. — 26 — que, dentro da esphera do poder facultado pelas leis concernentes ás pessoas e ás cousas, visam a um determinado e vantajoso effeito, por essas leis contemplado de modo explicito ou implícito, e surgem nos indivíduos, ou por virtude da operosidade humana, ou por virtude directa da propria lei, em seguida a factos e circumstan-cias, nos modos e condições por ella preestabelecidas. > 24. 5.° Não estar ainda consumma- do o direito.—Como ultimo elemento caracteristico do direito adquirido, exige a definição que o direito ainda não tenha sido feito valer, isto é, que ainda não tenha sido realisado em todos os seus effeitos. Nesta condição está o criterio pelo qual se distingue o direito adquirido daquelle que já foi consummado. Desde que o titular de um direito já o fez valer contra quem elle existia, e desde que já se realisaram os effeitos delle decorrentes, esse direito entrou para a classe dos factos consummados. deante dos quaes nem é possivel cogitar de acção re-,-troactiva de lei alguma. O direito adquirido é um direito que pertence a alguem, mas que ainda não produziu todos os seus effeitos, e que, por isso, póde ainda ser exigido judicialmente pelo seu titular. O direito consummado é aquelle que já se fez inteiramente effectivo, é um facto acabado, totalmente realisado, e a respeito do qual nada é possivel reclamar senão — 27 — o respeito ao que já aconteceu e que já produziu todos os seus effeitos. 25. Por dois modos o direito se consumiria : por solução amigavel (transacção), ou por sentença judicial. Já dizia Paulo, nos arts. 229 e 230—de verb. sig. (50-16) que, pelas expressões transacta ou finita devemos entender não só aquellas cousas sobre as quaes houve controversia, mas tambem aquellas que se possuem sem ter havido controversia. Pertencem a esse numero os negocios terminados por um julgamento, os que se resolveram por uma transacção, ou os que Ana- lisaram por um silencio de longo tempo. Transacta finitave intelligere debemus, non solum quibus controversia fuit, sed etiam quæ sine controversia sint possessa : ut sunt judicio ter-minata, transactione composita, longioris tempo-ris' silentio finita. Na c. 7—de leg. (1-14), Theodosio e Va- lentiniano determinaram que as leis e as constituições só regulam os casos futuros e não podem revogar os factos passados—leges et cons-titutiones futuris certum est dare fórmam ne-gotis: non ad fada prceterita revocari; e na c. 2 § 23—de vet. jur. enucl. (1-17) Justiniano, promulgando as Instituías, o Digesto e o Codigo, ordenou que só tivessem força de lei para os casos futuros e pendentes, e não para os — 28 — que estivessem terminados por sentença judicial ou por composição amigavel, pois que estes de nenhum modo devem ser resuscitados—et suum vigorem in judiais os tendentes in omnièus causis, sive quæ postea emerserint sive in judiciis adhuc pendent nec ea judicialis vel amicalis forma com-pescuit. Quæ enim jam vel judiciali sententia finita sunt vel amicali pacto sopita, hæc resus-citari nullo volumus modo. E neste sentido, muitos outros textos se encontram affirmando todos que as leis novas não podem affectar os casos que já terminaram por transacção ou por sentença, isto é, os factos consummados—(c. 16—de transac. (2-4), c. 22 § I — de sacr. -eccl. ( 1-2 ) c. 17 § 1 —de fide instrum, (4-21), c. 15 § 5—de legit. hæred. (6-58), nov. 19 pr. e cap. 1. 26. Releva notar que os autores divergem quanto á questão de saber se se deve applicar ao caso uma lei publicada posteriormente á sentença judicial, quando sobre esta pende ainda decisão de um tribunal superior, por ter sido contra ella interposto recurso de appellação. Gabba (1) diz que, na sua opinião, não ha duvida que sobre tal sentença deve influir toda e qualquer lei retroactiva por mera vontade do legislador, emanada pendente a causa. Em direito romano, porém, não póde ser admittida semelhante opinião, porque Justiniano (¹) Gabba, ob. cit. p. 37. — 29 — declarou expresssamente, em a nov. 115. pr. e cap. I que «se se interpuzer appellação contra a sentença pronunciada em uma causa, os juizes a devem julgar observando as leis vigentes no momento em que a sentença foi pronunciada, mesmo quando appareça, depois da sentença, uma lei nova, cujas disposições sejam applica-veis a casos anteriores.» Savigny justifica a disposição romana, di-zendo que o juiz da primeira instancia sómente podia decidir segundo a lei vigente no tempo da sua sentença, e ao tribunal de appellação só é permittido modificar uma sentença errada, mas nunca uma sentença justificada por si mesma. (¹). Tratando se de recursos contra a sentença que ainda não passou em julgado, a regra geralmente admittida é que uma lei nova não póde abolir, com effeito retroactivo, um recurso que a lei antiga admittia quando foi pronunciada a sentença. E Gabba entende que um recurso introduzido por lei nova não póde ser adoptado contra uma sentença pronunciada sob a vigencia de uma lei que o não admittia. (2). 27. Faculdades e expectativas.—Conhecida a natureza do direito adquirido, pelo estudo dos seus elementos constitutivos, podemos distinguil-o não só do facto consummado, (1) Savigny, ob. cit. § 397 p. p18. (2) Gabba, ob. aí. v. 4 p. 539. — 30 — como acabámos de vêr, mas ainda das simples faculdades e das meras espectativas, conforme a technica usada pelos autores, repellida mo- dernamente, sem razão alguma, por Planiol (1) e os que o acompanham. Faculdade, como a palavra bem claramente significa, é a simples capacidade, não exercitada, de praticar actos juridicos; é um direito que a lei reconhece, mas que nunca foi posto em prá-tica, do qual ainda não foi feito uso pela pes-soa de quem se trata, como, por exemplo, a faculdade de contrahir casamento, ou a faculdade de testar. Essa faculdade se mantém como tal, emquanto a pessoa não a exercita por meio de um facto acquisitivo de direito. Ella é anterior ao direito adquirido, e simples meio para o adquirir. Espectativa é a mesma esperança de um direito que, pela ordem natural das cousas, e de accordo com umalegislação existente, entrará provavelmente para o patrimonio de um individuo quando se realise um acontecimento previsto. A espectativa se distingue da faculdade,porque se transfórma em um direito que entrará para o patrimonio do individuo independentemente de qualquer acto deste. A faculdade só produz acquisição de direito quando exercida pelo titular O conceito da espectativa está para (1) Planiol, ob. cit. v. I n. 249. Clovis Bevilaqua.—Theor, do Dir. Civ. pag. 21. — 31 — o de faculdade, como o conceito de probabilidade está para o de possibilidade. A espectativa se distingue do direito adquirido porque este, como vimos, já entrou para o patrimonio da pessoa, ou, ao menos, já se concretisou em uma utilidade pessoal ou real para o individuo, ao passo que aquella é apenas uma esperança. Não ha direito adquirido, diz Filomusi Guelfi, quando um direito está no seu fieri ou devenire. (1) O direito em espectativa pode ser alterado por lei. O direito adquirido nem a lei o pode alterar. Um exemplo de espectativa de direito é a que tem o filho sobre a legitima paterna, porque em virtude de um acontecimento previsto, e de accordo com uma legislação vigente, elle espera que essa legitima entre para o seu patrimonio e constitua um direito adquirido. 28. Cumpre notar que o direito adqui-rido pode ser condicionado. E é preciso maior attençâo, neste caso, para não o confundir com a espectativa. Para isso, deve-se observar que o direito adquirido condicionado tem todos os elementos de um direito adquirido, e já se concretisou em utilidade para o individuo, dependendo apenas da realisação de uma condição ou de um termo para que possa ser exigido. Por isso, no direito condicionado o adimplemento (1) Filomusi Guelfi -obr. cit. $ 32. — 32 — da condição, mesmo que se verifique sob o dominio de uma lei nova, tem effeito retroacti-vo, de modo que o direito se considera como real e effectivo desde o momento em que nasceu sob condição. Como diz Savigny, a diffe- rença está nisto : na espectativa o exito depende inteiramente do mero arbítrio de uma outra pessoa ao passo que na conditio e no dies não tem logar este arbítrio. (1) 29. Feitas essas distincções indispensa-veis, podemos repetir, com segurança, a regra fundamental já exposta: — que a lei nova não pode ferir direitos adquiridos. Ou, em outros termos, deixando de parte os factos consumma-dos, que, como dissémos, estão inteiramente fóra de qualquer questão de direito transitorio, podemos dizer: — que a lei nova é retroactiva quando encontra simples faculdades ou meras espectativas; — não é retroactiva quando en- contra direitos adquiridos. (1) No primeiro caso, a retroactividade é justa, porque, como já foi demonstrado, as faculdades e as espectativas são direitos in abstracto, que ainda não se realisaram por um facto, e ' que não constituem parte do patrimonio, nem con- (1) Savigny—obr. cit. v. i $ 385, p. 388, $ 392 p. 434. (2) Dernburg— obr. cit. $ 43 n. 8—manifesta-sa contrário á opinião dos que dizem que a nSo retroactividade só se verifica em face dos direitos adquiridos; mas as poucas palavras do notavel jurisconsulto não bastam para produzir convicção. Elle mesmo reconhece que ta simples espectativas não têm defeca (cit. § in fin). — 33 — creta utilidade pessoal do individuo. Uma lei nova pode justamente extinguil-as sem causar damno algum, porque, como ensina Gabba, (1) desde que não haja lesão a direitos adquiridos, toda lei nova deve receber a mais ampla appli-cação a tudo o que concerne ao seu objecto, quer se trate de factos ou relações juridicas inteiramente novas, quer de consequencias de factos e relaçOes jurídicas anteriores. E ninguem se pode dizer lesado pela applicação da lei nova, pondera Baudry Lacantinerie, desde que ella não o despoja de algum direito adquirido. (2) No segundo caso, a retroactividade é injusta, porque, desde que o direito foi realisado, tornou-se adquirido, entrando a fazer parte do patrimonio de uma pessoa, ou constituindo-a na posse de um estado civil definitivo, e qualquer effeito retroactivo de uma lei nova seria uma offensa á pessoa, e grave lesão ao seu patrimonio, o que o direito não pode admittir. 30. Lassalle, com aquella profundeza phi- losophica que caracterisa o seu importante trabalho sobre esta materia, diz mesmo que — não retroactividade das leis e respeito aos direitos adquiridos são conceitos identicos. A retroactividade é inadmissível porque ella importa em uma invasão sobre a liberdade e a responsabi- (1) Gabba— ob cit\ v. I p. 182. (2) Baudry Lacantinerie—ob. cit. v. 1 n. 127. — 34 — lidade do homem. Aquelle que agiu livremente, conhecendo a lei vigente, e de conformidade com ella adquiriu um direito, sujeitando-se a todas as consequencias do seu acto nos termos dessa mesma lei, por confiar na ordem jurídica existente, não póde, sem violencia, ser, por disposição de uma lei nova, privado desse direito adquirido. O effeito retroactivo da lei, neste caso, seria uma affronta á personalidade do individuo, desrespeitando a vontade por elle ma- nifestada de accordo com a lei que conhecia. E a lei nova que declarasse expressamente ter effeito retroactivo, seria, na expressão de Las-salle, não uma lei, mas «o não direito absoluto, a destruição da idéa do direito em geral». O verdadeiro fundamento do respeito aos direitos adquiridos, está, pois, na inviolabilidade da personalidade humana, e na inseparabilidade do conceito do direito e do de uma pessoa que pensa e quer livremente. (1) 31. Mas não basta essa inviolabilidade da personalidade humana para justificar o respeito aos direitos adquiridos, diz proficientemente Gabba (2), completando a doutrina de Lassalle: «na retroactividade injusta os homens não vêm sómente offensas á personalidade, a qual, ás vezes, é sacrificada á razão de Estado, (1) Lassalle— ob. cie. v. I cap. II p. 65 e segs. (2) Gabba—ob. cie. p. 177. — 35 — mas elles vêm, além disso, verdadeiros damnos, verdadeiras diminuições de seu patrimonio pessoal e material. E isto porque o direito adquirido não é sómente uma manifestação do pensamento e da vontade do homem, mas é tambem um positivo augmento ou melhoramento da sua situação jurídica; e, porisso, o não direito que nasce da injusta retroactividade da lei, não é tolerado pelos homens, não só porque offende a dignidade humana, mas tambem porque di-minue o bem estar e produz um positivo prejuízo. » E' uma exigencia racional do direito, diz Filomusi Guelfi, que a lei não declare injusto ou nullo um acto exercido pela vontade sob a garantia de uma lei anterior. Desde que o primeiro direito formal, (a primeira lei) garantia o acto ou o facto, elle reconhecia a sua conformidade com a justiça e o direito; ora, se appa-rece um novo direito formal, com um conteudo diverso da justiça ou do direito, elle não pode nem deve desconhecer que a primeira lei correspondia ás exigencias historicas da justiça; e quem, na prática de um acto, se tem conformado com as prescripções do velho direito formal, prestou a homenagem devida ao proprio direito, donde resulta a exigencia de que seja respeitado o seu acto. (1) O principio da não retroactividade é, segundo Planiol, a salvaguarda necessaria dos direitos individuaes. Não haveria (1) Filomusi Guelfi—ob.cit. § 32—Dernburg—ob. cit. v. I p. 43. — 36 — nenhuma segurança para os particulares, escreve elle, se seus direitos, sua fortuna, sua condição pessoal, os effeitos de seus actos e de seus contractos pudessem, a cada passo, ser postos em questão ou supprimidos por uma mudança de vontade do legislador. O interesse geral, que não é aqui senão a resultantedos interesses individuaes, exige, pois, que aquillo que foi regularmente feito sob o imperio de uma lei, seja considerado como válido, e, por consequencia, estavel, mesmo depois da mudança da legislação. (1) 32. O que se diz do direito adquirido, isto é, que a lei nova não retrotrahe o seu effeito quando o encontre, porque a retroactividade seria injusta, applica-se tambem ás consequencias do direito adquirido, porque ellas participam da mesma natureza deste. (2) Assim, adquirido um direito qualquer, todas as faculdades que delle decorrem como consequencias ou effeitos, são tambem direitos adqui-ridos e fórmam com elle uma só entidade. De facto, seria illusorio o respeito em que se deve ter o direito adquirido, se se pudesse impedir, por uma lei nova, a realisação das consequencias ou dos effeitos delle derivados, pois, um direito adquirido, como diz Gabba, (1) Planiol—ob. fit. v. I n. 240. (2 ) Alves Moreira—ob. cit. v. I n. 37. — 37 — algumas vezes se apresenta como uma unidade simples, mas outras vezes se apresenta como um complexo de muitas faculdades ou direitos que, ou coexistem, ou se exercitam successiva-mente em dadas circumstancias. (1) Neste ultimo caso, quando os direitos se exercitam successivamente uns como consequencias dos outros, estas consequencias participam da mesma natureza do direito adquirido, se contêm os mesmos caracteres deste e se se apresentam como um seu desenvolvimento ou transformação. Não importa que essas consequencias sejam previstas pelas partes contractantes, ou sejam exclusivamente estabelecidas pela lei vigente ao tempo em que se deu o facto. E' um desses princípios que se podem chamar fundamentaes e sagrados, porque têm por base a razão, a justiça e a fé inviolavel dos contractos, diz Chabot de 1'Allier, esse pelo qual se reconhece que nada deve ser alterado por uma lei nova relativamente aos effeitos de uma convenção irrevogavel. (2) Com a conclusão do contracto, escreve Savigny, as duas partes contractantes adquirem um direito á efficacia constante de todas as regras concernentes ás questões delle deriva-das. E esse direito é um direito adquirido, que (1) Gabba—ob. cit. v. I p. 276. (2) Chabot de I'AIlier—ob. cit. — 38— deve ser mantido em frente de qualquer leí nova. Esta maxima é verdadeira e tem applica-ção tambem aos contractos cujo effeito é diffe-rido pela dependencia de um termo, ou tor-nado incerto em virtude de uma condição. Além de estar de accordo com o principio fundamental da theoria, tem ella uma verdadeira importancia prática, porque é só pela sua appli-cação que se póde inspirar a confiança indis- pensavel á segurança do commercio, de que a efficacia dos contractos se manterá inalteravel. (1) 33. Grande divergencia tem dividido os autores quanto ao caracterisar quaes sejam as consequencias dos actos e contractos juridicos, que devem ser consideradas como direitos adquiridos para escaparem a qualquer acção da lei nova. Não nos sendo possível, pela natureza desta exposição, acompanhal-os nas longas discussões sustentadas a respeito, basta-nos declarar que a doutrina hoje triumphante é a de Gabba, que, deixando de parte a distincção entre consequencias e effeitos, e entre consequencias immediatas e remotas, affirma que «todas as vezes que nas consequencias dos (1) Savigny — ob. cit. § 392 p. 434-435 — Dernburg,—ob. cit. § 43. reconhece que, uma vez constituídas as relações juridicas, mau grado a entrada em vigor de novas leis, continuam perennemente a desenvolver os effeitos juridicos produzidos segundo a lei do tempo de sua constituição, a cujo domínio ficam sujeitas. — 39 — direitos adquiridos, isto é, nos effeitos destes, não directos e immediatos, mas occasionaes e eventuaes, ou posteriores aos immediatos e directos, queridos e postos como taes pelos contractantes e pela lei, todas as vezes que, em taes consequencias se encontre o caracter de desenvolvimento ou transfórmação do originario direito adquirido, ellas têm o caracter de outros tantos direitos adquiridos, e qualquer outra distracção se torna inutil. (1) Só com esse criterio é possível fixar a extensão do direito adquirido. (1) Gabba—ob. cit. p. 295. CAPITULO III Das leis expressamente retroactivas 34. A exposta razão fundamental que determina a inviolabilidade do direito adquirido, repellindo, em qualquer hypothese, a retroactividade injusta, faz com que, de accôrdo com Struvius e Lassalle, e a despeito da opinião contrá-ria de grande numero de autoridades, não admitíamos a acção retroactiva por disposição expressa do legislador, quando este tenha por escopo ferir direitos adquiridos. Admittir a retroactividade pela simples intenção do legislador, é renunciar a todo ponto de vista scientifico, é duvidar da sciencia. (1) Como diz Berriat Saint Prix, o proprio poder legislativo não pode despojar um cidadão dos direitos que compõem seu patrimonio; elle não pode graval-o com um onus que diminua a sua fortuna. (2) (1) Lassalle—ob. cit., v. I, p. 45. (2) Berriat Saint Prix — Ther. du Dr. Constit—1851 —ns. 736 e 737. — 42 — Filomusi Guelfi que, conforme o direito] positivo italiano, reconhece no legislador a fa-culdade de declarar expressamente retroactiva uma lei, adverte, ponderosamente, ser de bôa politica que elle não abuse desse poder, por-quanto o principio da não retroactividade, ge-ralmente acceito, que exige o respeito aos actos praticados de conformidade com a lei antiga, deve tambem ser attendido pelo proprio legis-lador. (1). 35. E' tão procedente pela sua legitimidade jurídica esse principio, que, em alguns paizes, já foi elle acolhido como preceito constitucional para servir de salutar aviso aos legisladores ordinarios. A França, embora sem exito, já tentou collocal-o em uma das suas constituições. (2) Nos Estados Unidos da America do Norte, a constituição federal prescreve, no art. I sec. 9 n. 3, que não poderá ser votada lei que tenha effeito retroactivo (ex post facto). (3). E entre nós tem sido esse principio acceito desde a organisação do Imperio, como uma das garantias dos direitos do homem. Assim, a constituição imperial estabeleceu, no art. 179 § 3, que a disposição da lei não terá effeito retroactivo, e a constituição federal republicana, (1) Filomusi Guelfi— ob. cit., § 32. (2) Constituição de 5 fructidor anno III (22 de agosto de 1795) (3) Tambem a const. da Noruega, art. 97, a da Grecia, art. 7 e a carta constitucional portugueza, art. 145 § 2. — 43 — no art. II n. 3, prohibe aos Estados, como á União, o prescrever leis retroactivas. E', portanto, inadmissível no Brasil, de accôrdo com a verdadeira doutrina, a acção retroactiva da lei por disposição expressa, que muitas legislações permittem, e de que tanto abusou a legislação romana no tempo dos imperadores. Como bem pondera Savigny, é sum-mamente importante que se possa ter uma confiança segura na autoridade das leis exis- tentes. Cada qual deve poder estar certo de que os negocios juridicos que fez, conforme as leis existentes, para adquirir direitos, produzirão os seus effeitos ainda no futuro. (1). 36. Deve-se notar que o dispositivo constitucional citado refere-se ao legislador e não ao juiz. A sua fórma não deixa nenhuma duvida sobre isso, porque véda que elle, quer nos Estados, quer na União, prescreva leis com effeito retroactivo expresso. Ao juiz não fóra possível prohibir que applicasse as leis com ef-feito retroactivo nos casos em que ellas o tenham pela natureza do objecto sobre que recáem. Desde que uma lei nova não encerre disposição expressa sobre acção retroactiva,—e entre nós isso é impossível, como vimos — o juiz deve dirigir-se,na applicaçâo das leis, guiado apenas pelos princípios doutrinarios já expostos, (1) Savigny—ob. cit., § 385, p, 390. — 44 — que determinam que uma lei nova deve ser applicada do modo o mais completo, abrangen-do todos os casos que se incluam na esphera do seu objecto, e respeitando apenas aquelles em que se verifique a existencia bem caracte-risada de um direito adquirido. CAPITULO IV Dos institutos juridicos de duração perpetua 37. Um dos pontos em que alguns es-criptores têm procurado justificar a retroactividade expressa, é aquelle referente ás leis que têm por fim abolir certos institutos de duração perpetua, como a emphyteuse, os feudos, a servidão da gleba, a escravidão, etc. Realmente, os progressos da civilisação, impulsionando o aperfeiçoamento do direito, têm determinado a necessidade de abolir os institutos juridicos, que não se adaptam mais ás novas condições, á indole, aos costumes do povo. Ao mesmo tempo, não é possível deixar de reconhecer que a abolição desses institutos produz effeitos directos sobre o patrimonio dos indivíduos, constituindo um verdadeiro ataque aos direitos adquiridos. Ora, se, de conformidade com o principio fundamental da theoria da retroactividade, as leis novas não podem retrotrahir o seu effeito de modo a lesar direitos adquiridos, segue-se — 46 - que, uma vez resalvados da acção retroactiva da nova lei esses direitos, e sendo elles de natureza perpetua, como é o direito do emphyteuta sobre o immovel emphyteuticado, ou o do senhor sobre o escravo, a lei abolitiva não poderia realisar o seu fim, seria uma lei inefficaz. 39. A' vista disso, alguns autores esforçam-se por demonstrar que semelhantes leis têm effeito retroactivo completo, levando de vencida os direitos adquiridos; e assim deve ser, dizem elles, porque, desde que seja reconhecida a necessidade de abolir institutos de natureza per-i petua, por nao estarem mais de accôrdo com as idéas e as condições da sociedade civil, é que esses institutos nao têm mais legitimidade perante os princípios superiores do direito, da justiça e da razão (1). E em nome desses princípios, póde ser considerada como justa, nesses casos excepcionaes, a retroactividade com offensa aos direitos adquiridos (2). No caso em que a lei positiva é, de facto, a negação do direito e da justiça, dizia o notavel profes-sor Conselheiro Justino de Andrade, a lei nova, que a revoga, tem effeito retroactivo, em face de um principio irrefragavel, que é o seguinte : (1) Struvius chama-lhes «horrores, vergonhas moraes injus tiças que não têm por si existencia jurídica. — Apud Savigny, ob, cit. p. 527. (2) Vincenzo Simoncelli— Sui limitti della legge nel tempo — Studii di diritto in onore di Vittorio Scialoja— igo5, v. 1 p. 382. — 47 — — « as leis que restabelecem o direito natural le reparam os direitos imprescriptiveis da humanidade, devem receber immediata applicação por todos os meios possíveis.» 39. Para outros, a inviolabilidade dos [direitos adquiridos é um dogma tão respeitavel, que, mesmo nesses casos figurados, não é admissível que a lei nova os extinga sem que los indivíduos prejudicados sejam devidamente recompensados pelo Estado com a competente indemnisação pelo damno que soffrerem. No Brasil, quando foi abolida a escravidão, pela lei de 13 de maio de 1888, os poderes publicos entenderam do primeiro modo, a despeito do preceito constitucional vigente, achando justa a retroactividade da lei para o effeito de extinguir, como extinguiu, sem indemnisação alguma, os direitos adquiridos dos senhores so-bre os escravos, que constituíam uma propriedade garantida pelas leis. Na Inglaterra, quando foi abolida a escravidão nas possessões inglezas, entendeu-se do segundo modo, que está mais de accordo com o rigor do direito, despendendo o governo in-glez avultadas sommas para indemnisar os damnos causados aos senhores dos escravos. O certo é que, a despeito das divergencias quanto ao dever de indemnisação, que nos pa-rece um consectario do respeito aos direitos — 48 — individuaes, todos concordam em que as leis abolitivas de institutos de duração perpetua ne- cessitam, para a realisação do seu fim, do mais amplo effeito retroactivo, extinguindo mesmo os direitos adquiridos. E', segundo pensamos, uma excepção á doutrina exposta, excepção justificada pela ne- cessidade jurídica que dictou a nova lei. CAPITULO V Das leis sobre prescrlpçíio 40. A materia concernente á prescripção, quer acquisitiva, quer extinctiva, tem despertado a attenção especial dos auctores, porque ella se concretisa sempre em um facto complexo, a respeito do qual sérias difficuldades se apresentam ao tratar-se da applicação de uma lei nova. Sendo a prescripção o instituto jurídico em virtude do qual, decorrido um certo lapso de tempo, e verificadas certas condições legaes, uma pessoa adquire ou perde direitos, é claro que» quando apparecem leis novas alterando o espaço de tempo, ou modificando os requisitos da prescripção, surge logo a questão de saber se uma prescripção começada no domínio da lei antiga e ainda não terminada ao apparecer a lei nova, continúa a ser regulada por aquella lei, ou se será regulada pela lei nova, ao menos quanto a parte que falta para completar o tempo. 41. Os escriptores divergem, dizendo uns, inspirados pelo cod. civ. francez, art. 228I, — 50 — que, começada a prescripção, tem o prescri-bente um direito adquirido a que ella seja re-gida pela lei sob a qual teve começo, e, por-tanto, a lei nova não pode retroagir, alcançando uma prescripção já começada. Dizem outros, influenciados pelo antigo cod. prussiano, que, se a prescripção começada ainda não está finda ao apparecer uma nova lei, fica ella subrnettida ao regimen desta, porque, na hypothese, o facto acquisitivo, que é complexo, não se reali-sou perfeitamente, e, portanto, não produziu um] direito adquirido. 42. De conformidade com o que já foi dito a respeito do facto acquisitivo complexo, não temos dúvida em admittir, em geral, esta segunda opinião, porque, como ficou anterior-mente explicado, emquanto não se realisam todas as partes do facto, não pode elle produzir um direito adquirido. Como pondera Windscheid, o começo da prescripção não imprime ainda ás relações o seu perfeito cunho jurídico; portanto, a nova lei domina a prescripção em curso, e aquelle que está prescrevendo não pode pretender terminar a prescripção segundo a norma juridica antiga, desde que a nova norma não admitta tal prescripção, ou requeira uma condição que o direito anterior não exigia, como, por exemplo, a bôa fé. (1) (1) Windscheid—ob. vit. vol. I $ 32 nota 10. — 51 — 43» Assim, applica-se retroactivamente a uma prescripçao em curso: a) A lei nova que abolir a prescripçao re lativa ao mesmo objecto regulado pela lei an- b) A lei nova que augmenta o prazo prescripcional estabelecido pela lei antiga, de modo qne a prescripçao em curso sómente pode produzir os seus effeitos depois de decorrido o novo prazo, embora, por equidade, deva computar-se o tempo já realisado sob a lei antiga, porque, como diz Windscheid, o direito novo só exige que um determinado estado de cousas haja durado um certo tempo, mas não que tenha durado um certo tempo sob o seu imperio, (I) c) A lei nova que abrevia o tempo prescri- pcional estabelecido pela lei anterior, de modoque a prescripçao se completa uma vez decor rido o menor prazo estabelecido por aquella lei,computado, tambem por equidade, o tempo de corrido no domínio da lei antiga, (2) salvo se fôr brevíssimo o tempo que faltar depois de publicada a nova lei, ou se, no dia dapublica ção, já estiver decorrido todo o prazo ' exigido (1) Windscheid, lod. cit. (2) A solução mais jurídica, diz Planiol (ed. cit. a. 248) é estabelece uma proporção entre o tempo decorrido e o tempo a decorrer. Em contrario: Savigny, (ob. cit. § 391 p. 430) que en- tende dever deitar-se ao adquirente s escolha aa cxplicação de lei antiga ao de nota. — 52 — por esta, pois, nestes casos, a prescripçãol deria produzir surprezas gue o direito não admittiria, e poderia dar-se mesmo o absurdo de realisar-se uma prescripção em um prazo menòf do que o exigido pela lei vigente ao tempo emj que ella se verificou. d) A lei nova que dispõe sobre requisitos para a prescripção, quer exigindo mais quer exigindo menos, de modo que a parte que faltar para completar-se a prescripção em curso, deve ser julgada de accordo com os requisitos deter- minados pela lei nova. Pela mesma razão de equidade se tem admittido que a parte já decorrida da prescripção deve ser apreciada conforme os requisitos da lei antiga, pois seria impossível exigir, relativamente a facto passado, a observancia de requisitos que só mais tarde fóram reclamados por uma lei nova, salvo se se tratar de um novo requisito que se refira ao principio ou a todo o período da prescripção/ como, por exemplo, o requisito da. boa fé, caso em que a parte decorrida perde todo o valor para o effeito da prescripção. (l) Quanto á lei nova que dispensa certos requisitos exigidos pela lei antiga, não ha dúvida que tem effeito retroactivo para reger a prescripção em curso, mas nao pode validar a parte da prescripção já de-decorrida no domínio da lei antiga, se nao fo- (1) Windscheid, loc. cit. — 53 — ram observados os requisitos que esta lei exigia. Applica-se aqui o que já dissémos a respeito na convalescença dos actos juridicos, onde já ficou demonstrado que uma lei nova, abolindo requisitos que a lei antiga exigia, não pode fazer válido aquillo que perante esta lei era nullo. e) A lei nova que introduz novos modos de interrupção da prescripção. Todas essas regras, em virtude das quaes uma prescripção em curso fica sujeita ás dispo- sições da lei nova, são consectarios da affirma- ção, anteriormente feita, de que emquanto não está terminado o tempo da prescripção não ha direito adquirido para o prescribente. CAPITULO VI Das leis interpretativas 44. As leis interpretativas merecem uma ligeira referencia ao tratar-se da theoria da retroactividade, não porque sejam ellas leis retroactivas, mas porque, em virtude da sua applicação aos factos anteriores, que se deram no dominio da lei interpretada, e que aindanão foram consummados, tem ellas uma acção apparentemente retroactiva. Não existe uma verdadeira retroactividade, porque entre a lei novainterpretativa e a lei antiga interpretada nãoha um conflicto de leis no tempo ; aquella apenasesclarece o sentido obscuro desta, confirmando-lhe, porém, todas as disposições; nihil dat sed datum significai (1); não é propriamente uma lei nova differente da antiga, mas surge, por uma necessidade geral, sem estatuir nada de novo, para fazer um só corpo com a lei interpretada e ter applicação desde a data em que esta entrou em vigor. (1) Ulpianus fr. 21 § I—qui testam, fac. poss. (28-1) — 56 — 45. Justiniano, em a nov. 19 pref. in fin., resolvendo dúvidas levantadas ácerca do effeito retroactivo da lei interpretativa pela qual esclareceu o sentido das leis anteriores relativas á legitimidade dos filhos nascidos antes do contracto dotal, decidiu que a nova lei deveria ser applicada mesmo aos filhos nascidos antes da sua promulgação, embora não estivesse isso declarado expressamente, porquanto, se é verdade que quando se quer dar effeito retroactivo a uma lei, deve isso ser dito de modo expresso, não é, todavia, necessario fazer o mesmo quando seja promulgada uma segunda lei que não seja senão um complemento da pri- meira. Por isso, e para não encher o codigo de cousas superfluas, deixou de declarar, na terceira lei sobre o assumpto, o tempo em que devêra entrar em vigor, porque é sabido geralmente que uma lei interpretativa dispõe para todos os casos regidos pela lei a que se re- fere — cum omnibus manifestum sit oportere ea, quae adjecta sunt, per interpretationem in illis valere, in quibus et interpretatis legibus fit locus. E em a nov. 143 cap. 1, fixando a verdadeira interpretação da lei relativa á punição dos dè-lictos de rapto de mulheres, determinou que a interpretação constante dessa novella se ap-plicará não só aos casos futuros, senão tambem aos passados, como se a lei interpretada tivesse sido promulgada ab initio com essa in- — 57 — terpretação—quam interpretationem non in fu- turis tantummodo casibus, verurn in prateritis etiam valere sancimus, tamquam si nostra lex ab initio cum interpretatione tali promulgata fuisset. 46. Não alcança, porém, a lei interpre-tativa aquillo que já estiver terminado por tran-sacção ou por sentença judicial. Dil-o positivamente a citada nov. 19 cap. 1 — exceptis illis negotiis, quae contingit ante leges a nobis positas aut decreto judicum aut transa- ctione determinari. Esse decreto judicial a que se refere o texto é, sem duvida, aquelle que já passou em julgado, porque a sentença sobre a qual pende um recurso de appellação, fica sujeita á unica interpretação verdadeira, que é a fixada pela nova lei, a qual os juizes supe- riores têm o dever de applicar como parte in- tegrante da lei interpretada, reconhecendo como falsa qualquer interpretação differente que houvesse sido dada pelo juiz de primeira instancia. Esta conclusão é uma consequencia do principio de que a lei interpretativa se considera como vigente desde a data da lei interpretada, postos fóra do seu alcance apenas os factos consummados. (1) (1) Espínola—ob. cit, p, 181 n.° 33—observa, com razão, que não pode haver direito adquirido baseado na interpretação falsa da lei. — 58 — 47. Cumpre fazer aqui a mesma observação que fizemos no paragrapho em que estudámos as leis interpretativas, isto é, que uma lei não é interpretativa só porque assim a denomina o legislador, mas sómente o é quando tem por fim simplesmente interpretar uma outrae nada innovar. (1) Aquellas que apparecem com esse nome, mas innovam as 4eis interpretadas, modifican-do- lhes as disposições, não devem ser tratadas, em sua applicação, como leis interpretativas. (1) Bacon—aphor. n. 51. CAPITULO VII Doutrinas diversas 48. Os princípios até aqui expendidos, que constituem, segundo pensamos, as bases fundamentaes de uma verdadeira theoria da re- troactividade das leis, patenteam desde logo que, filiado á exacta doutrina tão admiravelmente exposta por Gabba, cujos ensinamentos nos vêm guiando em toda esta materia, não podemos acompanhar a alguns dos mais notaveis jurisconsultos, que têm construído differen-tes doutrinas sobre tal assumpto. 49. Assim, para começar pelo maior de todos em saber e em autoridade, não acceita-mos como principio basico aquelle que Savigny estabelece como fundamento de sua doutrina, dizendo, que são retroactivas as leis que se referem ás instituições jurídicas, isto é, que dispõem sobre a existencia, a não existencia, ou o modo de existir dessas instituições em geral, e que não são retroactivas as leis que se referem á acquisição de direitos, isto é, as — 60 — que regulam as concretas relações de direito entre pessoas determinadas. (1) Não ha dúvida que, a despeito de certas) difficuldades mostradas por Lassalle, (2) e de dizer Dernburg (3) que o limite entre essas duas classes de leis não se manifesta claro nem estavel, é theoricamente verdadeira a distincçãofeita por Savigny entre leis que se referem ao ser ou não ser das instituições jurídicas, e leis que se referem á acquisição de direitos. Com effeito, as primeiras são aquellas que cream ou extinguem certos institutos juridicos, como, por exemplo, o da emphyteuse, o do divorcio, o do fideicommisso, o da tutela da mulher, etc, as segundas são aquellas que regulam as relações jurídicas concretisadas entre as pessoas que, por meio delias, adquirem ou perdem direitos. Mas não é possível admittir-se que só em virtude do seu objecto, as leis tenham ou deixem de ter acção retroactiva. 50, Na verdade, as leis sobre existencia de institutos juridicos, segundo Savigny, ou têm por fim crear novos institutos, ou abolir os que existem, ou alterar o seu modo de ser, No primeiro caso, não se pode cogitar de retroactividade, porisso que, antes da nova lei, (1) Savigny, ob, cit. v. 8 § 383 e segs Sobre a comprehen-são dessas duas categoria de leis. veja-se o largo e interessante estudo de Simoncelli na monographia cit. pag. 355. (2) Lassalle, loc. cit. (3) Dernburg, loc. cit. — 61 — pada podia haver concernente ao instituto creado. No segundo caso, a lei que decreta a abolição de instituto juridico, é uma lei prohibitiva, pela qual se ordena que nada mais se faça relativamente ao instituto abolido. Mas é Savigny mesmo quem demonstra que nem todas as leis prohibitivas são retroactivas. Imagine-se uma lei abolindo o instituto do divorcio, ou o da adopção de filhos. Essa lei poderá, juridicamente, ter effeito retroactivo ? Sem dúvida que não: todos os divorciados, bem como os filhos adoptados no regimen da lei antiga, escapam á acção da lei nova, e podem fazer valer, em qualquer tempo, os seus direitos adquiridos. 51. Quanto ás leis sobre o modo de ser dos institutos juridicos, não é possível dis-tinguil-as das que se referem á acquisição de direitos, pois, como diz Gabba, o modo de ser dos institutos juridicos não consiste senão na qualidade e nos limites dos direitos que, por occasiâo e em virtude dos mesmos institutos, podem ser adquiridos. A celebre const. 27—de usuris (4-32) serviu de objecto para demonstrar como foi impossível a duas intelligencias privilegiadas concordarem na qualificação desse preceito do imperador Justiniano. Savigny (1) con-demnou a lei por entender que ella se referia (1) Savigny, ctí. p. 435. — 62 — á acquisição de direitos; ao passo que Lassalle (1) a applaudiu não pensando do mesmo modo. 52. Lassalle refuta a Savigny dizendo que a sua distincção repousa apenas em abstractas categorias intellectuaes, que não servem de segura base, e accrescenta que as leis, con-forme sejam consideradas sob o ponto de vista do individuo ou do objecto, podem classifícar-se como leis sobre acquisição de direitos, no primeiro caso, e no segundo, como leis sobre existencia de direitos. Realmente se nota, na obra de Savigny, um certo arbítrio no classificar as leis em uma ou em outra categoria. (z) 53. Quanto á não retroactividade das leis que se referem á acquisição de direitos, é doutrina perigosa e falsa, porque essas leis têm por objecto relações jurídicas entre pessoas determinadas, e, como já longamente demonstrámos ao expôr a verdadeira theoria, é certo que nem todas as relações de direito produzem direito adquirido, e quando não ha um direito adquirido, sabemos que as leis novas retro- trahem o seu effeito. 54. Entretanto, se não é possível accei-tar como um principio fundamental da theoria da retroactividade a distincção a que acabamos de alludir, devemos, todavia, reconhecer a grande (1) Lassalle, cit. p. 289. (2) Windscheid. —Dirit. delle Pandette (trad ital.) v. I § 32 nota 6. — 63— Importancia da doutrina savigniana, já pelas vastas idéas com que ella enriqueceu o assumpto, já porque aprofundou a noção do direito adquirido, distinguindo- o das simples faculdades e das meras espectativas. Releva notar, porém, que Savigny, admittindo ao seu principio, para justificar a ampliação ou a estricção da efficacia da lei nova, certas excepções que, segundo elle, devem ser determinadas expressamente pelo legislador, (1) deixa vacillantes as bases da sua doutrina, che- gando mesmo ás vezes a perdel-as de vista. E é digno de nota, que, nos resultados praticos da applicaçâo das leis novas, e nas consequen- cias finaes de suas minuciosas lucubrações, Savigny, em regra geral, põe-se de accordo com a verdadeira theoria do respeito ao direito adquirido. Isto nos permitte observar com Gabba que, attendendo mais aos factos que ás pala-vras, pode-se dizer que a verdadeira doutrina de Savigny não é aquella que parece contida nas formulas por elle inventadas; é, porém, uma doutrina muito mais simples, e que todos podem cornprehender, isto é, que, em regra geral, todas as leis se podem applicar a con- sequencias de factos e relações juridicas anteriores, desde que com isso não se offendam direitos adquiridos. (2) (1) Savigny, cit § 397 (2) Gabba, cit. p. 170. — 64 — 55. A doutrina dos que sustentam que são retroactivas as leis prohibitivas, tambem não assenta em fundamento solido. Esse criterio deduzido da fórma da lei, é completamente accidental, e extranho aos princípios que regem a efficacia da lei no tempo, sendo certo, como já referimos acima, que innumeras leis prohibi-tivas não podem ter effeito retroactivo, se a sua applicação importar em offensa a direitos adquiridos. Por exemplo, uma lei que prohiba os contractos de quota litis, ou uma lei que prohiba o emprestimo de dinheiro a juro maior do que seis por cento, não se applicam aos contractos já feitos e ainda não exigidos. (1) Os exemplos apontados pelos adeptos dessa doutrina, referem-se todos a institutos juridicos de duração perpetua, ácerca dos quaes só por excepção se justifica o effeito retroactivo, como já foi anteriormente demonstrado, (cap. IV) 56. Uma outra conhecida doutrina prégada por Odilon Barrot, na Assembléa nacional franceza, declarava que não é verdadeiro o principio de que as leis não são retroactivas, porque a verdade é que as leis favoraveis são retroactivas. Isto pode ser até certo ponto admittido, desde que se considerem leis favoraveis aquel-las que não ferem direitos adquiridos. Sé, po- (1) A c, 27 de uzuris (4-32) foi uma violencia aos direitos. adquiridos, só tendo applicação por forca. da vontade expressa de Justiniano. — 65 — rém, ao applicar-se uma nova lei favoravel a um individuo, houver lesão ao direito adquirido de outrem, não é possível dar a essa lei effeito retroactivo. Tudo se resolve, pois, em uma questão de direito adquirido. A theoria da retroactividade das leis favoraveis ao individuo sómente pode ser acceita na esphera do direito criminal, em virtude do principio — nulla poena sine lege, e em homenagem á humanitatis causa. (1) 57. A doutrina que estabelece como criterio para a retroactividade a intenção do legislador expressamente manifestada na lei, é insubsistente por arbitraria, submettendo a razão jurídica aos dictames autoritarios dos legisladores. Já expuzémos, anteriormente, os motivos por que entendemos que o legislador não tem o direito de impôr effeito retroacivo ás leis que promulga, (cap. III). 58. A doutrina de Lassalle é de inesti-timavel valor em virtude do seu profundo estudo philosophico ácerca do direito adquirido. Já fizemos ver que, segundo elle, é a inviolabilidade da pessoa humana o verdadeiro fundamento do respeito devido ao direito adquirido. Para elle, respeito aodireito adquirido e não retroactividade da lei são conceitos identicos. Como vemos, essa base geral da sua doutrina é quasi egual Cod. Penal, art. 3.0 — 66 — á de Gabba. Mas afasta-se deste autor no ponto fundamental em que Lassalle expõe o conceito do direito adquirido, affirmando que elle sempre) resulta de um acto da vontade humana. Ora, conto já ficou demonstrado que ha direitos adquiridos que nascem por obra da lei, e indepen-, dentemente de qualquer manifestação da vontade, é logico que, a despeito dos justos encómios que merece, a doutrina de Lassalle não é admissível em todas as suas partes. 59. Uma das doutrinas mais generalisa-das, e que de longo tempo vem conquistando foros de verdade, é a que sustenta que são retroactivas as leis de ordem publica ou as leis de direito publico (1). Esse criterio é, porém, inteiramente falso, (2) tendo sido causa das maiores confusões na solução das questões de retroactividade. Antes de tudo, cumpre ponderar que é difficilimo discriminar nitidamente aquillo que é de ordem publica e aquillo que é de ordem privada. São tão intimas as relações de direito publico e de direito privado, que já Bacon observava no seu aphorismo III —jus privatum, sub tutela juris publici, latet. O interesse pu- (1) Simoncelli, na monographia citada, defende com bri- lhantismo essa doutrina, cercando-a de limitações derivadas da distinc- ção entre leis absolutas ou cogentes e leis simplesmente dispo-sitivas facultativos, Applaudindo, com algumas restricções, a doutrina de Savigny, procura demonstrar que ella assenta, em ultima analyse, no principio de que são retroactivas as leis de ordem publica absolutas. (2). Alves Moreira, ob. cit. n. 36. blico e o interesse privado se entrelaçam de tal fórma, que as mais das vezes não é possivel separai-os. E seria altamente perigoso proclamar como verdade que as leis de ordem publica ou de direito publico têm effeito retroactivo, porque mesmo deante dessas leis apparecem algumas vezes direitos adquiridos, que a justiça não permitte que sejam desconhecidos e apa- gados (1). O que convém ao applicador de uma nova lei de ordem publica ou de direito publico, é verificar se, nas relações juridicas já existentes, ha ou não direitos adquiridos. No caso affírmativo, a lei não deve retroagir, porque a simples invocação de um motivo de ordem publica não basta para justificar a offensa ao direito adquirido, cuja inviolabilidade, no dizer de Gabba (2) é tambem um forte motivo de interesse publico. 60. Porisso é que, no direito judiciario e no direito processual, se é verdade que as novas leis se applicam geralmente aos casos pendentes, onde não se vêm senão simples faculdades, entretanto deparam-se algumas vezes, mesmo nesses departamentos juridicos, certos direitos adquiridos, que escapam á acção das leis novas. (1) Simoncelli mesmo o reconhece, confessando que no direito pri vado prevalece a irretroactividade, e no direito publico prevalece a retroactividade (pag. 361.) (2) Gabba, 06. cit, p. 151. — 68— Assim, se o direito de acção, em regra, não é um direito adquirido, podendo ser abolido pelas novas leis, emquanto não foi exercitado, como, por exemplo, a acção de divorcio, a de dissolução de casamento, a de investigação da paternidade, etc, ha casos, todavia, era que constitue elle um verdadeiro direito adquirido, quando a acção faz parte da essencia desse direito sendo uma consequencia delle, ou sendo a transfórmação desse direito no meio indispensavel para o fazer valer, como são as acções que nascem de um titulo de credito. Nestes casos, uma lei nova não pode, sem injusta retroactividade, declarar inadmissível a acção concedida pela lei anterior, porque seria illusoria a acquisição de um direito se não houvesse para o seu titular a segurança de o poder exigir judicialmente no futuro. (1) Assim tambem os actos processuaes, em regra, não attribuem direitos adquiridos aos litigantes, de modo que uma lei nova se applica sempre retroactivamente aos processos pendentes, visto que a fórma de processo não é da essencia do direito dos indivíduos, e pode ser alterada em qualquer tempo pelo legislador. (1) Essa verdade foi reconhecida pala sentença da Côrte de Cassação de Paris applicando aos creditos dos judeus a disposição do celebre decreto de Napoleão I, de 17 de março de 1808, em que foi declarado que não tinham acção perante os tribunaes os emprestimos feitos por judeus a menores sem auctorisação dos tutores, etc. A Côrte decidiu que o decreto não era applicado aos emprestimos anteriores á tua publicação. — 69 — Mas certos casos ha em que, praticado um acto processual, elle faz nascer, em quem o praticou, um verdadeiro direito adquirido aos effeitos decorrentes do acto, e uma lei nova, sem injusta retroavidade, não pode impedir que taes effeitos se realisem. 61. O principio fundamental da theoria da retroactividade, adverte Cabba, (1) deve applicar-se egualmente ao direito privado e ao direito publico; e, portanto, as leis novas, de quaesquer especies que sejam, devem respeitar os direitos adquiridos. O que ha de singular no tocante ás leis de direito publico é que, nas relações jurídicas por ellas creadas, visando especialmente funcções de interesse publico ou de indole politica, os indivíduos em geral se sujeitam ás publicas exigencias, e não nascem tão facilmente os direito adquiridos, que são de indole privada. (2) Dahi o dizer-se geralmente que as leis concernentes ao interesse publico ou politico se applicam immediatamente com effeito retroactivo. (1) Gabba—eit. p. 140. (2) Baudry Lacantinerie 06. eit. n. 143. CAPITULO VIII Doutrina romana 62. Na exposição que fizemos, em largos traços, dos princípios fundamentaes da theoria da retroactividade das leis, não nos prendêmos aos textos da legislação romana, porque, dos seus diversos dispositivos esparsos pelas colle-cções, fóra impossível deduzir systematicamente uma doutrina completa e acceitavel sobre a retroactividade. Certamente não passou despercebido aos romanos o alto interesse juridico que se liga a este importantíssimo assumpto, que já tinha despertado a attenção dos philosophos antigos. Na Grecia, Platão e Socrates já prégavam, como verdade philosophica, que as leis, cujo fim é o util, sómente podiam dispôr para o futuro. Mais tarde Cicero, na sua segunda oração contra Verres, referindo-se á lei Voconia, fazia ver que as leis não deviam reger actos do pas- sado. (1) O direito canonico tambem elaborou (1) Cicero—In Verrem. I—42—In lege Voconia non est, Fe-cit Fecerit: neque in ulla prateritum tempus reprehenditur, nisi ejus rei, qum sua sponte tam scelerata ac nefari est, ut etiamsi lex non esset, magno opere vitanda fuerit... De Jure vero civili si quis novi instituit, is non omnia quae ante acta sunt, rata este patietur — 72— regras a respeito do assumpto. No corpo da legislação de Justiniano deparam-se muitissimos textos no Codigo e nas Novellas, contendo diversas regras sobre applicação da lei relativamente ao tempo, que não offerecem base, po-rém, para a construcção de uma theoria homogenea e logica. 63. Parece que o verdadeiro fundamento romano para uma doutrina da retroactividade, é a celebre c. 7—de leg. (1—14) em que os imperadores Theodosio e Valentiniano decretaram que—é certo que as leis e as constituições sómente regulam os negocios futuros, e não podem revogar os factos passados, salvo se expressamente for declarado que os seus, preceitos se extendem ao tempo passado e tambem aos negocios pendentes.—Leges et consti-tutiones futuris certum est dare fórmam negotiis, non ad facta praeterita revocari, nisi nominatim etiam de praeterito tempore
Compartilhar