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Ciências do Ambiente e Bioclimatologia Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Esp. Valéria Leite Aranha Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites Bioclimatologia • Introdução • Definição sobre Bioclimatologia • Variação na Temperatura • Conforto Térmico • Considerações Finais · Compreender como os elementos climáticos afetam a vida animal. OBJETIVO DE APRENDIZADO Bioclimatologia Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja uma maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como o seu “momento do estudo”. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar, lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo. No material de cada Unidade, há leituras indicadas. Entre elas: artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados. Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar, lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Bioclimatologia Introdução Ao estudar a distribuição das espécies pelos diversos habitats da Terra, os ecólogos evolutivos têm-se perguntado porque determinada espécie existe em certos locais e não em outros, ou o que faz uma espécie ter distribuição mais ampla do que outra. Como vimos nas unidades anteriores, as respostas a essas questões são determinadas pela existência de certos eventos e elementos do meio ambiente, que podem agir diretamente sobre o funcionamento do organismo e sobre o seu ciclo de vida. Esses eventos, chamados de fatores ecológicos, foram divididos em abióticos, que compreendem os elementos não vivos do meio ambiente – como os físicos, químicos e edáficos – e os fatores bióticos, envolvendo a ação de outros seres vivos, através das relações ecológicas. Embora essa divisão não considere que esses fatores se sobrepõem na natureza, por exemplo: na Amazônia, o clima, fator abiótico importante para a sobrevivência de muitas espécies, é influenciado pela vegetação, fator biótico. O estudo do efeito dos fatores ecológicos sobre os seres vivos levou os ecólogos a enunciarem a Lei da Tolerância, estabelecendo que toda espécie apresenta, para cada fator ecológico, um valor máximo e mínimo entre os quais consegue sobreviver, chamados de limite de tolerância. Assim, por exemplo, a carpa, peixe nativo dos lagos do leste asiático, tem para a temperatura um mínimo tolerado de 5ºC e um máximo de 24ºC. Outros peixes de aquário e tanque de água doce têm limites mais restritivos, como o acará-bandeira, originário dos rios da região amazônica, cujo mínimo de tolerância é de 28ºC e o máximo de 30ºC. O fisiologista e químico Liebig propôs, em 1890, outra lei que rege a ação dos fatores ecológicos sobre os seres vivos, a chamada Lei do Mínimo, segundo a qual a distribuição de uma espécie é regida pelo fator ecológico para o qual o organismo possui menos controle e menores limites de tolerância. Esse fator ecológico é denominado fator limitante, pois restringe a ocupação de outros habitats pela espécie e é diferente para cada espécie. O fator limitante torna-se crucial quando os indivíduos da espécie estão mais frágeis e sensíveis e, portanto, com seus limites de tolerância mais estreitos. É o que ocorre no período da reprodução: os filhotes são mais indefesos e menos capazes de se adaptar às mudanças bruscas no ambiente. Mesmo os adultos são afetados, já que o cuidado com a prole é muito desgastante. Pássaros adultos empregam 80% do seu tempo cuidando da alimentação da ninhada. Em compensação, passam eles próprios a se alimentar menos, prejudicando sua resistência e diminuindo seus limites de tolerância. A espécie deve ter ajustadas as suas características corporais e comortamentais aos fatores ecológicos de seu habitat, principalmente aos fatores limitantes. Esse ajustamento é chamado adaptação. Essa adaptação contínua acumula modificações na estrutura genética, até produzir uma espécie totalmente nova. 8 9 Além de modificações corporais, que tornam os seres vivos adaptados ao ambiente e que são moldadas ao longo de milhares de anos, há outra forma de adaptação muito mais dinâmica e eficiente: o comportamento, entendido como qualquer alteração na conduta animal provocada por um estímulo. Por exemplo, quando a temperatura diminui e o alimento começa a faltar (estímulo), muitos pássaros migram (comportamento), fugindo, assim, de uma condição ambiental que ameaça a sobrevivência. O comportamento tem duas fontes básicas: a herança genética e a aprendizagem. O comportamento que passa geneticamente de geração a geração é chamado inato. Costuma ser mais simples, não se modifica durante a vida do indivíduo e restringe- se a atividades básicas de sobrevivência (alimentação, defesa e reprodução). O comportamento inato programa o indivíduo para as respostas fixas a situações ambientais e de vida, que não se alteram ao longo de muitas gerações e que devem ser iguais para todos os indivíduos da espécie. Um exemplo típico é o canto de acasalamento dos pássaros, que deve ser sempre igual para permitir o fácil reconhecimento pela fêmea. O comportamento aprendido, por outro lado, é adquirido durante a vida do indivíduo, é próprio de cada ser e não é transmitido geneticamente. Depende do condicionamento e memória do animal, sendo mais comum entre aves e mamíferos. A capacidade de aprendizagem permite uma adaptação mais rápida e maleável às mudanças do ambiente, como a procura de locais adequados para a alimentação ou abrigo, ou técnicas mais eficientes de caça. Um exemplo é o das abelhas, que aprendem onde estão as melhores flores da região e em qual época elas produzem mais néctar. es pé ci e au se nt e mínimo número de indivíduos ótimo zona ótima zona de sobrevivência limites de tolerância da espécie máximo valor do fator es pé ci e au se nt e es pé ci e ra ra es pé ci e ra ra es pé ci e co m um es pé ci e co m um es pé ci e ab un da nt e Figura 1 – Lei da Tolerância. A abundância de carpas varia em função do nível de intensidade do fator ecológico considerado, por exemplo, a temperatura. É uma representação gráfi ca que permite visualizar a Lei da Tolerância. Fonte: Adaptado de Sariego (1994, p. 17) 9 UNIDADE Bioclimatologia Definição sobre Bioclimatologia É o estudo dos fenômenos naturais do ambiente, influenciando a vida animal e vegetal. Algumas definições da bioclimatologiasurgiram definindo esta ciência como ramo da climatologia e da ecologia, que trata dos efeitos do ambiente físico sobre os organismos vivos. Tito (1998) conceitua a bioclimatologia animal como: [...] ciência que busca entender as relações entre elementos climáticos e a fisiologia animal, tendo como perspectiva a superação de barreiras (limitações) impostas pelo meio ambiente sobre a expressão do potencial genético dos animais. Segundo Silva (2000), a bioclimatologia é “o campo especializado da climatologia que se ocupa das relações entre biosfera e atmosfera, e é também compartilhada com a ecologia”. Bioclimatologia Animal: é a ciência que busca entender as relações existentes entre os elementos climáticos e a fisiologia animal, tendo como meta o bom desempenho animal de acordo com o potencial genético. Bioclimatologia: entre as mais variadas definições sobre bioclimatologia, a forma mais simples, e ao mesmo tempo a mais ampla, é a que a define como o estudo da inter-relação entre clima, solo, planta e animais, complementado como um ramo da ecologia que estuda as reações e adaptações dos organismos vivos no e ao ambiente em que vivem. Nossos estudos de bioclimatologia darão ênfase à área da zootecnia, atendendo assim aos objetivos desta unidade de estudo, que é o de compreender como os elementos climáticos afetam a vida animal. Variação na Temperatura Animais Ectotérmicos e Endotérmicos A temperatura dos organismos é determinada pelas trocas de energia com o ambiente externo. As temperaturas ambientais variam muito em toda a biosfera, como já vimos na unidade anterior, e a sobrevivência e o funcionamento dos organismos estão fortemente relacionados à sua temperatura interna. A temperatura de um organismo está relacionada ao balanço entre os ganhos e as perdas de energia para o ambiente externo. Portanto, os organismos devem ou tolerar variações 10 11 em sua temperatura interna, quando a temperatura do ambiente externo muda, ou modificar sua temperatura interna por alguns modos fisiológicos, morfológicos ou comportamentais. As temperaturas ambientais, particularmente seus extremos, são, portanto, importantes e determinantes da distribuição dos organismos, como demonstrado pelas relações entre os biomas e os padrões climáticos globais discutidos nas unidades anteriores. A temperatura controla a atividade fisiológica A produção metabólica de energia química e a produção de componentes para o crescimento e a reprodução dependem de reações bioquímicas sensíveis à temperatura. Cada reação tem uma temperatura ótima relacionada à atividade de enzimas, moléculas baseadas em proteínas que catalisam as reações bioquímicas. As enzimas são estruturalmente estáveis em uma faixa limitada de temperaturas. A temperaturas elevadas, as proteínas constituintes perdem sua integridade estrutural, ou tornam-se desnaturadas, quando suas ligações se rompem. A maioria das enzimas torna-se desnaturada a temperaturas variando entre 40ºC e 70ºC. A temperatura letal superior para a maioria dos organismos é menor do que a temperatura na qual suas enzimas tornam-se desnaturadas, provavelmente porque a coordenação metabólica entre as rotas bioquímicas é perdida nessas temperaturas. O limite extremo inferior para a atividade enzimática é cerca de −5ºC (WILLMER et al., 2005). Os peixes e crustáceos antárticos podem alcançar temperaturas corporais de −2ºC porque a concentração de sais na água do mar na qual eles vivem diminui seu ponto de congelamento. A temperatura também determina as taxas de processos fisiológicos influen- ciando as propriedades de membranas, particularmente a baixas temperaturas. As membranas das células e organelas são compostas de duas camadas de moléculas lipídicas. A baixas temperaturas, essas membranas podem se solidificar, e as pro- teínas e enzimas embebidas nelas podem perder sua função, afetando processos tais como a respiração mitocondrial. As membranas também perdem sua função seletiva quando solidificam, vazando metabolitos celulares. A sensibilidade do fun- cionamento da membrana às baixas temperaturas parece estar relacionada à com- posição química das moléculas lipídicas da membrana. A temperatura influencia processos fisiológicos em organismos terrestres afetando a disponibilidade hídrica. Como vimos na unidade anterior, quanto mais quente o ar, mais vapor de d’água ele pode reter. Em consequência disso, a taxa na qual os organismos terrestres perdem água de seus corpos está relacionada à temperatura do ar. Os animais influenciam sua temperatura modificando o balanço de energia. Em um dia quente, dar um mergulho na piscina e então sentar-se à sombra com uma brisa alivia o calor opressivo. Os elefantes adotam uma rotina similar, nadando e borrifando água nas costas com a tromba. Esse tipo de comportamento facilita a perda de calor de vários modos. O contato direto de sua pele aquecida com a 11 UNIDADE Bioclimatologia água fresca leva à perda de energia pelo processo de condução, a transferência de energia do quente (moléculas movendo-se mais rapidamente) para o frio (moléculas movendo-se mais lentamente). Quando água e ar movem-se na superfície de seu corpo, a energia calórica é perdida por convecção. A mudança no estado da água do líquido para o vapor, quando ela evapora sobre a superfície de sua pele, absorve calor (transferência de calor latente). Menos óbvia é a perda de calor quando nos movemos para a sombra e irradiamos calor para os objetos mais frios nas imediações. O balanço entre os ganhos e as perdas de energia determina se a temperatura de um objeto, vivo ou não, aumentará ou diminuirá́. Ajustando esse balanço de energia com o ambiente, os organismos podem influenciar sua temperatura e, portanto, sua atividade fisiológica. Evitar temperaturas adversas por meio do comportamento e de modificações morfológicas do balanço energético é uma estratégia utilizada pelos animais que também exibem vários graus de tolerância às variações da temperatura corporal. Alguns animais, em particular, aves e mamíferos, tem a capacidade de gerar calor internamente. A perda evaporativa de calor não está́ largamente distribuída entre os animais. Exemplos notáveis de refrigeração evaporativa em animais incluem a transpiração nos seres humanos, a respiração ofegante em cães e outros animais, e a ação de lamber o corpo por alguns marsupiais sob condições de extremo calor. A geração interna de calor por alguns animais representa um avanço ecológico fundamental. Os animais capazes de geração metabólica de calor conseguem manter relativamente constantes as temperaturas internas próximo ao ótimo para a atividade fisiológica ao longo de grande faixa de temperaturas externas e, como resultado disso, podem expandir suas áreas de distribuição geográfica. Existem vários graus de dependência da geração interna de calor dentro do reino animal. Animais que regulam principalmente sua temperatura corporal pela troca de energia com o ambiente externo, os quais incluem a maioria das espécies animais, são chamados ectotermos. Os animais que dependem principalmente da geração interna de calor, chamados de endotermos, incluem, mas não estão limitados a, aves e mamíferos. A geração interna de calor é também encontrada em peixes (como exemplo o atum) e insetos (como as abelhas, as quais geram calor para funções metabólicas e defesa). ΔHanimal = Variação de energia térmica do animal, RS = radiação solar, IRg = Ganho de radiação infravermelha, IRp = Perda de radiação infravermelha, Hconv = Transferência convectiva de calor, Hcond = Transferência condutiva de calor, Hevap = Transferência de calor por evaporação Hmet = Geração metabólica de calor. ΔHanimal = RS + IVg. − IVp ± Hconv. ± Hcond. − Hevap. + Hmet. Figura 2 – Modificação do balanço energéticode animais Fonte: Acervo do Conteudista 12 13 Regulação da temperatura e tolerância em ectotermos. Geralmente, os ectotermos têm maior tolerância para a variação na temperatura corporal do que os endotermos, presumivelmente porque não podem alterar suas temperaturas corporais com tanta facilidade como os endotermos. A troca de calor com o ambiente, quer para refrigeração ou aquecimento, depende da quantidade de área superficial relativa ao volume do animal. Uma grande área superficial em relação ao volume permite maior troca de calor, mas torna mais difícil manter uma temperatura interna constante em face das temperaturas externas variáveis. Uma área superficial menor em relação ao volume diminui a capacidade do animal para ganhar ou perder calor. Essa relação entre área superficial e volume impõe um limite sobre o tamanho e a forma do corpo de animais ectodérmicos. Para uma forma corporal semiesférica, quando o tamanho do corpo aumenta, a razão entre a área de superfície e o volume diminui, e a capacidade de trocar calor com o ambiente diminui. Pequenos ectotermos aquáticos geralmente permanecem a mesma temperatura que a água circundante. Alguns animais aquáticos maiores, entretanto, demonstram capacidade para manter temperatura corporal significativamente mais quente do que a água circundante. Por exemplo, o atum-saltador (Katsuwonis pelames) usa a atividade muscular, em conjunto com a troca de calor entre vasos sanguíneos, para manter a temperatura corporal até́ 14ºC (25ºF) mais quente do que a água do mar circundante. Outros grandes peixes oceânicos usam mecanismos circulatórios de troca de calor para manter os músculos aquecidos, isso é particularmente importante para espécies predatórias que dependem de aceleração rápida para capturar presas, as quais são auxiliadas por terem músculos mais aquecidos. Músculo vermelho de natação A) B) Geração interna de calor do atum Vértebra Os músculos vermelhos de natação geram calor 19,3ºC 21,3ºC 23,3ºC 25,3ºC 27,3ºC 29,3ºC 31,4ºC 19,3ºC 21,3ºC 23,3ºC 25,3ºC 27,3ºC 29,3ºC 31,4ºC Figura 3 – (A) Geração interna de calor pelo atum. Calor gerado nos músculos vermelhos de natação do atum-salta- dor, usados para atravessar a água, aquece o sangue que fl ui por eles, e é conduzido por veias próximo à superfície do corpo. Essas veias funcionam em paralelo às artérias que carregam o sangue oxigenado frio proveniente das brânquias, aquecendo esse sangue antes que ele chegue aos músculos de natação. (B) Um corte transversal de um atum mostra que as temperaturas em seu núcleo permanecem mais quentesdo que aquelas da água circundante. Fonte: Adaptado de Cain (2011, p. 95) 13 UNIDADE Bioclimatologia A mobilidade de muitos ectotermos terrestres lhes permite se mover para locais mais quentes ou mais frescos para ajustar sua temperatura corporal. Aquecer-se ao sol ou mover-se para a sombra permite a esses animais ajustarem ganhos e perdas de energia via radiação solar, condução e radiação infravermelha. Por exemplo, répteis e insetos emergindo de esconderijos após uma noite fria irão expor-se ao sol para aquecer o corpo antes de iniciarem suas atividades diurnas. Em regiões temperadas e polares, as temperaturas caem abaixo do ponto de congelamento por extensos períodos. Os ectotermos que habitam essas regiões devem evitar ou tolerar a exposição a condições de congelamento. A evasão pode tomar a forma de migração sazonal (movendo-se para uma latitude mais baixa) ou o movimento para microambientes locais onde a temperatura situa-se em torno ou acima do congelamento (enterrando-se no solo). A tolerância a temperaturas abaixo de zero envolve minimizar o dano associado com a formação de gelo nas células e tecidos. Se o gelo toma a forma de cristais, eles irão perfurar as membranas celulares desorganizando o funcionamento metabólico. Alguns insetos que habitam climas frios contêm altas concentrações de glicerol, composto químico que minimiza a formação de cristais de gelo e diminui o ponto de congelamento dos fluidos corporais. Esses insetos passam o inverno em estado semicongelado, emergindo na primavera quando as temperaturas são mais apropriadas à atividade fisiológica. Vertebrados ectodérmicos geralmente não toleram o congelamento no mesmo grau que os invertebrados ectodérmicos devido aos tamanhos maiores e à maior complexidade fisiológica. Raros anfíbios, entretanto, podem sobreviver parcialmente congelados. Figura 4 – Animais móveis podem usar o comportamento para ajustar sua temperatura corporal. Esse lagarto- de-árvore-ornamentado (Urosaurus ornatos) moveu-se para um local ensolarado para absorver radiação solar e elevar sua temperatura corporal a uma faixa adequada à realização de suas atividades diárias. Fonte: iStock/Getty Images. Regulação da temperatura e tolerância em endotermos Apesar de tolerarem uma faixa mais estreita de temperaturas corporais do que os ectotermos (30ºC – 45ºC, 86ºF – 113ºF), a capacidade dos endotermos para gerar calor internamente lhes tem permitido expandir grandemente suas áreas de 14 15 distribuição geográfica. Os endotermos podem permanecer ativos a temperaturas abaixo de zero, algo que a maioria dos ectotermos não podem fazer. O custo de ser endotérmico é uma alta demanda por energia (alimento) para suportar a produção metabólica de calor. A taxa de atividade metabólica em endotermos está associada com a temperatura externa e com a taxa de perda de calor. A taxa de p erda de calor, por sua vez, está relacionada ao tamanho do corpo devido a sua influência sobre a razão entre a área de superfície e o volume. Pequenos endotermos têm taxas metabólicas maiores, e requerem mais energia e taxas de alimentação maiores, do que grandes endotermos. Animais endotérmicos mantém taxa metabólica basal constante ao longo de uma faixa de temperaturas ambientais conhecida como zona termoneutra. Quando a temperatura ambiental cai para um ponto em que a perda de calor é maior do que a produção metabólica de calor, a temperatura corporal começa a cair, provocando elevação na geração metabólica de calor. Esse ponto é chamado temperatura crítica inferior. A zona termoneutra e a temperatura crítica inferior diferem dentro das espécies de mamíferos. Como seria esperado, animais do Ártico têm temperaturas críticas inferiores, abaixo daquelas de animais de regiões tropicais. Observe também que a taxa de atividade metabólica aumenta mais rapidamente abaixo da temperatura crítica inferior em mamíferos tropicais do que em mamíferos do Ártico. ÁRTICO TROPICAL Esquilo do solo Filhote do urso polar Mais frio (B) (A) Su pe rio r In fe rio r Mais quente Zona termoneutra Temperatura crítica inferior 400 300 200 100 -70 -50 -30 -10 10 30 Temperatura corporalTemperatura mais baixa no Ártico Temperatura ambiental (°C) Ta xa m et ab ól ic a (n or m al iz ad a em b ra sa l) Raposa ártica e grandes mamíferos Filhote de cão esquimó Lêmingue Taxa metabólica basal = 100 Doninha Quati Rato-do-mato Sagui Humano nu Observada Extrapolada Macaco-da-noite Guaxinim Preguiça Ta xa m et ab ól ic a ( ) Quando a temperatura ambiental cai abaixo da temperatura crítica inferior, a taxa metabólica começa a aumentar a �m de gerar mais calor. A taxa metabólica basal permanece a mesma enquanto a temperatura ambiental situa-se dentro da zona termoneutra. Figura 5 – As taxas metabólicas em endotermos variam com as temperaturas ambientais. (A) A taxa metabólica basal de um endotermos permanece constante ao longo de uma faixa de temperaturas conhecida como zona termoneutra. Quando as temperaturas ambientais alcançam um limite inferior,conhecido como a temperatura crítica inferior, sua taxa metabólica aumenta para gerar calor adicional. (B) As zonas termoneutras e as tempera- turas críticas inferiores dos endotermos variam com seus habitats. As temperaturas críticas inferiores de endo- termos árticos são menores do que aquelas de endotermos tropicais, e suas taxas metabólicas aumentam mais lentamente abaixo dessas temperaturas críticas, como mostrado pelas inclinações mais baixas das curvas. Fonte: Adaptado de Cain (2011, p. 96) 15 UNIDADE Bioclimatologia Qual é a razão para essas diferenças entre animais de diferentes biomas? Ex pl or Para a endotérmica funcionar eficientemente, os animais devem ser capazes de reter o calor do corpo. Portanto, a evolução da endotérmica em aves e mamíferos requer isolamento térmico: plumagem, pelagem e gordura. Essas camadas isolantes proporcionam uma barreira que limita a perda condutiva de calor (e, em alguns casos, convectiva). A pelagem e a plumagem isolam principalmente ao proporcionar uma camada de ar estacionário, similar à camada limítrofe, adjacente à pele. Diferenças no isolamento ajudam a explicar as diferenças nas temperaturas críticas inferiores e a velocidade de elevação da taxa metabólica entre os endotermos. Os mamíferos árticos geralmente mantêm pelagens mais espessas do que mamíferos de climas mais quentes. Em climas mais quentes, a capacidade para se refrescar por meio da condução e convecção é inibida pelo isolamento, e a pelagem espessa pode ser um impedimento para a manutenção da temperatura corporal ótima. Alguns endotermos apresentam aclimatização sazonal à temperatura pelo crescimento de uma pelagem mais espessa no inverno, a qual é trocada quando as temperaturas se tornam mais quentes. Climas frios são severos para endotermos pequenos. Mamíferos pequenos, por necessidade, têm pelagem fina, visto que a pelagem espessa inibiria sua mobilidade. A elevada demanda por energia metabólica abaixo da temperatura crítica inferior, os baixos valores de isolamento de sua pelagem e sua baixa capacidade de armazenar energia tornam os pequenos mamíferos residentes improváveis de habitats polares, alpinos e temperados. Entretanto, as faunas de muitos desses climas frios contêm muitos endotermos pequenos, às vezes em grandes abundâncias. O que explica essa aparente discrepância? Ex pl or Endotermos pequenos, tais como roedores e beija-flores, são capazes de alterar a temperatura crítica inferior durante períodos frios entrando em um estágio de dormência conhecido como torpor. As temperaturas corporais dos animais em torpor podem cair tanto quanto 20ºC abaixo de suas temperaturas normais. A taxa metabólica de um animal em torpor é 50–90% menor do que sua taxa metabólica normal, proporcionando substancial economia de energia (SCHMIDT-NIELSEN, 1997). Entretanto, energia ainda é necessária para despertar o animal do torpor e trazer a temperatura corporal de volta a seu valor usual. Portanto, a duração de tempo que um animal pode permanecer em torpor é limitada por suas reservas de energia. Pequenos endotermos podem passar regularmente por um torpor diário para minimizar a energia necessária durante noites frias. O torpor que dura várias semanas durante o inverno é possível somente para animais que têm acesso a alimento suficiente e podem armazenar reservas de energia suficientes, tais como 16 17 marmotas. O torpor é relativamente raro em climas polares, devido à falta de alimento para proporcionar suficiente armazenamento de energia em gordura para atravessar o inverno sem comer. Alguns grandes animais, tais como ursos, entram em sono hibernal de longa duração, durante o qual a temperatura corporal diminui apenas levemente, em vez de entrarem em torpor. de o xi gê ni o m l/h or a ( ) Ta xa m et ab ól ic a (c on su m o) Tem peratura corporal (°C) ( ) Dias 0 0 200 400 600 800 1.000 1.200 1.400 1.600 1.800 0 5 10 15 20 25 30 35 40 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Torpor Profundo Despertar Torpor Temperatura corporal normal Durante o torpor a taxa metabólica diminui substancialmente, diminuindo a demanda energética Figura 6 – Torpor de longa duração em marmotas. O torpor permite às marmotas (Marmota fl aviventris) conservarem energia durante o inverno, quando a comida é escassa, e a demanda por energia metabólica para se manterem aquecidas é alta Fonte: Adaptado de Cain (2011, p. 97) Conforto Térmico Conforto térmico para animais homeotérmicos é quando o animal se encontra em um ambiente de equilíbrio térmico, ou seja, situação em que o animal não necessita mobilizar os recursos de termorregulação para se ajustar às condições ambientais. Portanto, o animal não sofre estresse pelo frio ou pelo calor. Nessas condições, desde que alimentado adequadamente, o animal apresenta o máximo do desempenho produtivo de acordo com o potencial genético. Os limites de temperatura ideal para o conforto animal estão condicionados a vários fatores, tais como: espécie, raça, peso, idade, estado fisiológico, condição nutricional e fatores ambientais variados. Segundo Silva (2000), alguns autores determinam o conforto térmico de várias espécies de animais, baseando-se na umidade e na temperatura. É importante que se considere, também, a radiação solar, para não corrermos o risco de não considerar a diferença entre animais mantidos no interior de um abrigo à sombra e sob o sol direto. Outro fator que pode atuar na termoneutralidade é o vento. Em um ambiente com a mesma temperatura, mesma umidade do ar e mesma intensidade da radiação solar, a presença do vento influencia diretamente no bem-estar do animal. 17 UNIDADE Bioclimatologia A importância do conforto animal reside no fato de que, na termoneutralidade, o gasto de energia para a manutenção do animal ocorre em um nível mínimo e, dessa forma, a energia metabolizada pode ser direcionada quase que na totalidade para os processos produtivos, não ocorrendo o consumo de energia de que todo e qualquer mecanismo de termorregulação necessita. Hipotermia Homeoteramia Hipertermia Sobrevivência M or te M orte Conforto Térmico Temperatura do ambiente Reações Fisiológicas e Comportamentais Reações Fisiológicas e Comportamentais Estresse de Frio Representação da variação da temperatura corporal do animal Representação da utilização de energia pelo animal para termorregulação Temperatura crítica inferior (TCI) Temperatura crítica superior (TCS) Estresse de Calor Figura 7 – Zona de Termoneutralidade. Para saber se um animal está ou não em sua zona de conforto, é fundamental estabelecer as TCs inferiores e superiores Fonte: Adaptado de Prof. Dr. Marcos Chiquitelli Neto. UNESP-Ilha Solteira Radiação solar e suas implicações no conforto térmico A radiação solar é uma energia eletromagnética de ondas curtas, que atinge a Terra e é a fonte principal de calor no ambiente, portanto é imprescindível para a vida na Terra. Da energia solar, grande parte é perdida na atmosfera, da seguinte forma: 1. Por reflexão: 30% são refletidas pelas camadas de nuvens de volta para o espaço, e 6% são refletidas pela superfície terrestre; 2. Por absorção: 15% são absorvidas na atmosfera pelo vapor de água, CO2 e partículas (aerossóis) e 3% são absorvidas na ionosfera, na formação de ozônio; 3. Por dispersão: 15% são dispersadas pelas partículas sólidas e gasosas. Portanto, da radiação solar, apenas 31% atingem a superfície terrestre. As parcelas da radiação que atingem a superfície da Terra são constituídas basicamente por ondas curtas (0,3 a 4,0μm). A energia solar que atinge a superfície terrestre ao nível do mar raramenteexcede 1.088 a 1.120 W/m², mesmo nos dias mais claros; em média, acha-se ao redor de 900 a 980W/m². A banda UVC (0,20 – 0,28μm) apresenta um efeito biológico particularmente intenso e perigoso, mas é quase toda absorvida pela camada de ozônio e não ultrapassa a estratosfera. A banda UVB (0,28 – 0,32μm) é importante para a síntese de vitamina D, mas 18 19 apresenta riscos de dano celular quando há exposição excessiva a ela. Os raios da banda UVA (0,32 – 0,40μm) são menos penetrantes e estão associados à síntese de melanina. Entretanto, a radiação solar tem vários efeitos biológicos importantes, entre eles: síntese orgânica (fotossíntese, síntese de vitamina D); transformação da matéria (melanogênese, eritemas, efeitos bactericidas); e efeitos diversos (fotoperiodismo, fototropismo, fototaxia, movimentos fotonásticos, germinação de sementes, fotomorfose, estímulos nervosos e glandulares). O balanço térmico ou a radiação trocada entre o animal e o meio ambiente depende dos tipos de exposição do animal à radiação. A radiação chega ao animal de duas formas: radiação solar direta, através da pelagem ou pelo, 50 a 70% do total em um ambiente aberto, e radiação solar difusa, retransmissão do calor radiante. As trocas térmicas por radiação entre os animais e seu ambiente (climas tropicais) determinam as diferenças entre um ambiente tolerável ou insuportável. Todo e qualquer objeto ou superfície, cuja temperatura esteja acima de zero absoluto (0°C ou – 273,15°F), representa fonte de radiação térmica. d a b c e g f Figura 8 – Fontes de radiação térmica sobre o animal. Pode ser observada a radiação solar de ondas curtas (a); radiação de ondas curtas refl etidas pelas nuvens (b); radiação de ondas longas emitidas pelo Sol e refl etidas nas nuvens (c); radiação celeste de ondas curtas (d); radiação de ondas longas emitidas por corpos e objetos vizinhos (e); radiação de ondas longas emitidas pelo solo (f); e radiação de ondas curtas refl etidas na superfície do solo (g). Fo nte: Adaptado de SILVA (2000) A velocidade do vento é um fator fundamental para a determinação das trocas térmicas por convecção e evaporação, influindo diretamente no conforto térmico. A radiação solar que atinge a superfície terrestre é mais ou menos absorvida pelo terreno, dependendo da Em consequência, a superfície transfere energia térmica para as moléculas de ar imediatamente em contato com elas (convecção). Quando a diferença de densidade do ar adjacente à superfície for tão grande em relação à densidade da atmosfera circundante que força ascensional permita vencer a gravidade, então uma bolha de ar aquecido desloca-se para cima e abre embaixo uma zona de baixa pressão, sendo imediatamente preenchida pelo ar menos quente e mais denso das vizinhanças. 19 UNIDADE Bioclimatologia Outro fator que influencia as trocas térmicas entre o animal e o ambiente é a umidade relativa do ar. Quando o ambiente está quente e seco, a evaporação processa-se de uma maneira mais rápida e pode ocorrer irritação cutânea e desidratação geral. Por outro lado, em ambiente quente e úmido, a evaporação é muito lenta e causa redução na termólise, aumentando o estresse pelo calor. Estresse causado pela radiação – Estresse Térmico É definido como sendo o resultado da inabilidade do animal em dissipar calor suficientemente para manter a sua homeotermia (WEST, 1999). O estresse térmico pode ser em função de temperaturas abaixo da TCI (temperatura crítica inferior) ou acima da TCS (temperatura crítica superior). O Brasil, por estar situado geograficamente, na sua maior parte, entre o equador e o trópico, apresenta problemas com o estresse causado pelo calor, ou seja, acima da TCS. Termorregulação Entende-se por termorregulação o processo de controle da temperatura corporal de um animal em um ambiente qualquer, quando há um gradiente de temperatura, ou seja, quando o animal não se encontra em termoneutralidade. Os seres vivos são sistemas geradores de energia térmica, produzida no processo metabólico de manutenção das funções vitais do organismo. A energia química, denominada de taxa metabólica, proveniente da transformação dos alimentos, dá origem à energia mecânica, isto é, atividade muscular. Além disso, ocorre troca de energia com o ambiente, denominada de energia térmica, que ocorre de diferentes modos: radiação, convecção e condução. Em um dado momento, o organismo está ganhando e perdendo energia, ou seja, o animal deve estar em equilíbrio térmico com o ambiente, a não ser quando o animal permanece numa condição de trabalho invariável em um ambiente absolutamente inalterado. Normalmente, o animal está em uma troca constante de energia e a temperatura corporal depende do equilíbrio entre os mecanismos de produção, ganho e perda de calor. Essa necessidade de troca de calor para proporcionar o conforto térmico ao animal apresenta grandes diferenças entre os tipos de animais. Nos animais ectotérmicos, a temperatura corporal varia com o meio ambiente externo em que vivem. Esses animais exigem menor energia, conseguindo sobreviver a longos períodos de escassez de alimento, pois despendem menor quantidade de energia na produção de calor, vivendo com baixa taxa metabólica. Por isso, podem utilizar grande parte de seu aporte de energia no crescimento e na reprodução, embora, como não dispõem de mecanismos eficazes, no inverno, a maioria dos répteis e anfíbios hibernam, pois é uma maneira de sobreviver com o mínimo de taxa metabólica; com o retorno das temperaturas mais quentes, voltam às atividades normais de sobrevivência e procriação. 20 21 Nos animais homeotérmicos, a temperatura corporal não acompanha à do meio ambiente. Por esse fato, todos esses animais apresentam mecanismos para produzir calor quando a temperatura ambiente está abaixo da corporal, para também dissipar o calor, quando em excesso, pela energia metabólica e pela irradiação que recebe do meio ambiente. Quando esses mecanismos não conseguem manter a temperatura corporal no conforto térmico, podem sofrer transtornos fisiológicos, tais como: choque pelo calor (hipertermia), choque pelo frio (hipotermia) e febre. Mecanismo de transferência de energia térmica Os animais, para estarem em homeotermia, necessitam de uma constante troca de calor, e os principais mecanismos são: radiação, convecção e, somente para a dissipação de calor, a evaporação. Por definição, a radiação é a transferência de energia térmica de um corpo para o outro, através de ondas eletromagnéticas. Qualquer superfície, cuja temperatura esteja acima do zero absoluto (-273,15°C ou 0°K), emite radiação térmica. O fluxo de calor nesse processo depende da temperatura e da natureza da superfície da pele – por exemplo, animais de cor clara refletem mais radiação que animais de cores escuras. A energia incidente na superfície entra sob a forma de ondas de radiação térmica que podem ser refletidas, absorvidas e transmitidas. As propriedades da superfície quanto à transferência de radiação podem ser: reflexividade, absorvida de transmissidade e emissividade. A condução é a transferência de energia térmica entre corpos, entre partes de um mesmo corpo, por meio de energia cinética da movimentação das moléculas ou pela movimentação de elétrons livres. Esse fluxo passa das moléculas de alta energia para as de baixa, necessitando de contato direto. É um processo importante na termorregulação do animal, pois esse processo permite a passagem de calor desde o núcleo central do organismo até a superfície corporal externa, através do contato entre partículas dos tecidos. Também é responsável pela passagem do calor da superfície da pele para o meio. A velocidade depende do gradiente térmico entre a pele e o meio. A convecção é a transferência de energia através de um fluido líquidoou gasoso. A corrente de fluido absorve energia térmica em um dado local e, então, desloca-se para o outro lado, onde se mistura e transfere energia. Ocorre a transferência de energia devido à movimentação de ar, cujas moléculas são de corpos mais quentes para os mais frios, portanto os fatores nesse processo são a movimentação do ar e a extensão da superfície corporal. A convecção pode ser natural ou passiva quando ocorre o deslocamento do fluido por diferença na densidade; mas pode ser forçada ou ativa, quando o deslocamento do fluido ocorre por forças ativas, como bombas, ventiladores, mecanismos geradores de ventos ou turbulências. 21 UNIDADE Bioclimatologia Enquanto a evaporação é a transferência de calor pela passagem das moléculas de água ao ar, sob a forma de vapor. Esse mecanismo de dissipação de calor pode ocorrer na pele e nas vias respiratórias. É um processo muito importante, pois em temperaturas elevadas a maior parte da dissipação de calor ocorre por evaporação. O animal perde calor quando a água contida no suor, na saliva e nas secreções respiratórias é transformada em vapor de água. A perda do calor por evaporação é contínua, mesmo em condições termoneutras, devido à ocorrência de difusão de água através da pele (sudorese) e vapor de água nas vias respiratórias. A sudorese ou sudação ocorre a partir de glândulas sudoríparas localizadas na derme. A maior parte dos mamíferos placentários possui glândulas sudoríparas, mas, nos cães e suínos, essas glândulas são pouco desenvolvidas. Os animais domésticos que mais suam, pela ordem decrescente de importância desse mecanismo para a termorregulação, são os equinos, asininos, bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos e suínos. Além disso, existem sensíveis diferenças entre as raças desses animais. O ofego ou hiperpneia é a forma de aumentar a evaporação pelas vias respiratórias, principal meio de perda de calor por evaporação em aves, suínos, cães e ovinos submetidos a altas temperaturas. A perda de água provoca no animal um aumento no consumo para fazer a reposição. Figura 9 – Troca de calor entre um grande mamífero e o ambiente em um dia quente. As setas vermelhas indicam as fontes de ganho de calor líquido pelo animal (radiação total); as setas azuis representam as vias de perda de calor líquido (resfriamento por evaporação, condução para o solo, radiação de ondas longas para o espaço e convecção forçada pelo vento). Se as temperaturas do ar e do solo forem maiores do que as do animal, as setas de convecção forçada, condução e radiação deverão ser invertidas. Desse modo, o animal poderia perder calor apenas através do resfriamento por evaporação Fonte: Hickman (2016, p. 704) 22 23 Figura 10 – Adaptações fi siológicas e comportamentais do elande para regular a temperatura na quente e árida savana da África Central. Fonte: Hickman (2016, p. 703) Efeito do estresse térmico e termorregulação nos animais Estresse térmico pelo excesso de calor, ou seja, estresse causado por temperaturas acima da termoneutralidade. Segundo Truman (1988), “o estresse atua em detrimento do bem-estar do organismo”. Outra definição apresentada por Baccari Jr. (1987) é que o “estresse é a soma de respostas do organismo à agressão de ordem física, psicológica, infecciosa e outros capazes de pertubar-lhe a homeostase”. Os tipos de estresse podem ser: mecânicos (traumatismo), físicos (calor, frio, umidade, eletricidade, som), químicos (drogas), biológicos (agentes infecciosos, estado de nutrição, dos esforços corporais) e fatores psíquicos (solidão, medo), conforme Baccari Jr. (1987). Em se tratando de estresse térmico, para cada espécie animal existe uma faixa de temperatura de conforto térmico. Além das diferenças entre espécies, varia também de acordo com a raça, idade, peso corporal e outros fatores que interferem na termoneutralidade. Quando a temperatura do meio é abaixo da temperatura crítica inferior ou acima da temperatura crítica superior, ou seja, fora da faixa de conforto térmico, desencadeiam no animal processos de termorregulação, na tentativa de manter a temperatura corporal em homeotermia. Porém, quando a temperatura inferior for abaixo do limite inferior ou acima do limite superior, o animal não consegue manter a temperatura corporal e entra em hipotermia (abaixo) ou hipertermia (superior), e o animal sobrevive com estresse extremo e grande desgaste, portanto com grande prejuízo no desempenho. O limite de sobrevivência do animal é atingido no limite inferior da hipotermia ou no limite superior da hipertermia. 23 UNIDADE Bioclimatologia Na verdade, os animais diferem quanto às altas temperaturas que podem suportar. A tolerância à temperatura extrema pode variar com o tempo de exposição, e um certo grau de adaptação à exposição por um longo tempo na temperatura próxima do limite térmico possa ocorrer. Frequentemente, amplia-se esse limite, porque o animal com excesso de calor acomoda-se e pode tolerar a temperatura que anteriormente era letal. Devemos lembrar que a temperatura letal para certos animais não pode ser determinada com precisão porque o tempo de exposição é também importante, pois uma temperatura abaixo ou acima do limite de sobrevivência, por alguns minutos, pode ser suportada pelo animal, mas se for mantida por várias horas, o animal poderá vir a perecer. Outros elementos também atuam nessa tolerância, como a presença de vento, a umidade relativa do ar, a altitude e ainda outros fatores, como o estado de saúde do animal etc. Considerações Finais A temperatura dos organismos é determinada pelas trocas de energia com o ambiente externo. A temperatura exerce controles importantes sobre os processos fisiológicos por meio de seus efeitos sobre enzimas e membranas. Os ganhos de energia a partir do ambiente e as perdas de energia para ele determinam a temperatura de um organismo. Modificar essa troca de energia com o ambiente permite a um organismo controlar sua temperatura. Os animais modificam seu balanço energético principalmente por meio do comportamento, ajustando a eficácia da perda de calor convectivo e, nos animais endotérmicos, pela geração interna de calor. As aves e mamíferos endotérmicos diferem dos ectotérmicos por terem uma produção de calor metabólico muito maior e uma condutância de calor do corpo muito menor. Eles mantêm a temperatura corporal constante equilibrando a produção com a perda de calor. Os pequenos mamíferos, em sua maioria, em ambientes quentes, escapam do calor intenso e reduzem a perda de água por evaporação vivendo em tocas. Os animais maiores empregam diversas estratégias para lidar com a exposição direta ao calor, incluindo isolamento por reflexão, armazenamento de calor pelo corpo e resfriamento por evaporação. Os endotérmicos de ambiente frios mantêm a temperatura corporal diminuindo a perda de calor com uma pelagem ou plumagem espessa, através do resfriamento periférico e aumentando a produção de calor através do tremor e da termogênese sem tremores. Os pequenos endotérmicos também podem fugir da exposição às baixas temperaturas vivendo sob a neve. 24 25 A hipotermia adaptativa é uma estratégia usada por pequenos mamíferos e aves para reduzir as demandas de energia durante períodos de inatividade (torpor diário) ou em períodos de frio prolongado e disponibilidade mínima de alimento (hibernação). Conforto térmico para animais homeotérmicos é quando o animal se encontra em um ambiente de equilíbrio térmico, ou seja, situação em que o animal não necessita mobilizar os recursos de termorregulação para se ajustar às condições ambientais, portanto, o animal não sofre estresse pelo frio ou pelo calor. Entende-se por termorregulação o processo de controle da temperatura corporal de um animal em um ambiente qualquer, quando há um gradiente detemperatura, ou seja, quando o animal não se encontra em termoneutralidade. Os animais diferem quanto às altas temperaturas que podem suportar. A tolerância à temperatura extrema pode variar com o tempo de exposição, e um certo grau de adaptação à exposição por um longo tempo na temperatura próxima do limite térmico possa ocorrer. 25 UNIDADE Bioclimatologia Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Embrapa https://www.embrapa.br/ Livros A economia da natureza RICKLEFS, Robert; RELYEA, Rick. A economia da natureza. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. Introdução a bioclimatologia animal SILVA, Roberto Gomes. Introdução a bioclimatologia animal. São Paulo: Editora Nobel, 2000. Vídeos Bem Estar Animal e Conforto Térmico https://youtu.be/-qtYXWbU9-Q Termorregulação animais https://youtu.be/C59N-MfSLkM 26 27 Referências CAIN, Michael L.; BOWMAN, William D.; HACKER, Sally D. Ecologia. Porto Alegre: Artmed, 2011. HICKMAN, Cleveland P.; ROBERTS, Larry S.; KEEN, Susan L.; EISENHOUR, David J.; LARSON, Allan, I. Princípios integrados de zoologia, 16. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. SARIEGO, José Carlos. As ameaças ao planeta azul. São Paulo: Scipione, 1994. TAKAHASHI, Leonardo Susumu. Bioclimatologia zootécnica. Jaboticabal: UNESP, 2009. 27
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