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Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 0 Universidade Federal de Campina Grande Centro de Humanidades Unidade Acadêmica de Letras PET – Programa de Educação Tutorial (petletrasufcg@gmail.com) Professores com a mão na massa: Relatos de experiências de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Denise Lino Ludmila Kemiac (Organizadoras) Editora da Universidade Federal de Campina Grande Revisores: Aluska Silva Anna Raphaella de Lima Marenco Clara Regina Rodrigues de Souza Elisa Cristina Amorim Ferreira Ludmila Kemiac Jemima Bortoluzi Nayara Araújo Duarte Priscila Raposo Ananias Rodrigo Fernandes de Sousa Wesley Barbosa Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 1 Apresentação Este livro apresenta os relatos da atividade de imersão no ensino fundamental, que foi realizada pela primeira vez pelo PET LETRAS1 em 2008. Ao realizá-la, os petianos tinham vários desafios. O primeiro deles foi o de diversificar as atividades de extensão, dirigindo-se ao ensino fundamental, já que o grupo tinha uma larga experiência com o pré-vestibular. O segundo foi o de realizar uma atividade fora dos muros da UFCG, enfrentando as dificuldades e facilidades inerentes ao fato de sair da universidade para trabalhar com a escola pública. O terceiro foi o de integrar teoria e prática. Como o grupo acabara de ler o livro Professores reflexivos em uma escola reflexiva, Alarcão (2004)2, o desafio era refletir na ação sobre a prática docente e sobre a própria atuação. Para isso, a imersão foi organizada da seguinte forma: caberia ao petiano identificar uma escola pública e um professor de Língua Portuguesa que o acolhesse como um estagiário, para que ele observasse, num primeiro momento, ainda que poucas aulas, 5 apenas, e, depois, atuasse como o regente em outras 5 aulas. A observação deveria resultar num trabalho de intervenção que contribuísse para a aprendizagem dos alunos visitados. Escrever o relato da experiência de modo que o mesmo não fosse mera descrição das atividades, mas se constituísse como um instrumento de reflexão sobre a ação docente apresentou-se como uma prática letrada acadêmica e profissional vivenciada pelos petianos antes mesmo de chegarem ao estágio supervisionado. Com isso, acreditamos que, do ponto de vista do programa PET, estamos contribuindo com a formação acadêmica desses alunos e melhor instrumentalizando-os como profissionais, haja vista que o relato, sem dúvida, é um instrumento de atuação do professor, ainda pouco utilizado. Conhecê-lo na graduação nos parece fundamental para a ação reflexiva. Com essa iniciativa, esperamos estimular licenciandos e professores a utilizarem esse instrumento a fim de trocarem informações sobre suas experiências de ensino. 1 Programa de Educação Tutorial, mantido pelo MEC. No curso de Letras – UFCG – Campus I – funciona initerruptamente desde 1992. 2 ALARCÃO, Isabel. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2004. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 2 Aqui são apresentados seis capítulos organizados por área de atuação. Os dois primeiros focalizam o ensino de literatura. O primeiro foi escrito pelos petianos Nayara Duarte e Rodrigo Fernandes de Sousa, que atuaram no 6º ano de uma escola pública estadual, e juntamente com a professora regente aplicaram as oficinas da olimpíada de Língua Portuguesa para essa série, trabalhando o gênero Poema. Nesse relato, nos sensibiliza o empenho tanto dos petianos quanto da professora para que os alunos tivessem contato recorrente com o texto literário. O segundo capítulo, escrito pelo petiano Wesley Barbosa, descreve o empenho de um professor iniciante para ensinar aos alunos do 8º ano o que é e o que não é texto literário. Destaca-se nesse relato a sensibilidade do professor para perceber as necessidades dos alunos e direcionar o seu trabalho para atender às expectativas de conhecimento que subliminarmente aparecem na sala de aula. A experiência realizada permitiu que o bolsista voltasse à escola onde estudou e já atuou como professor voluntário, tendo agora um outro olhar. Os capítulos três e quatro tematizam a leitura. No terceiro capítulo, as petianas Ludmila Kemiac, Clara Regina Rodrigues de Souza e Elisa Cristina Amorim Ferreira experimentam o ensino de leitura numa turma de 8º ano, focalizando o tema a violência contra a criança, a partir de dois contos: um de Andersen e outro de Lobato. O resultado pode ser resumido com o interesse despertado nos alunos pelos aspectos intertextuais da leitura. No quarto capítulo, a petiana Aluska Silva volta à escola onde cursou o ensino fundamental e encontra-se com uma de suas professoras, com a qual desenvolve um trabalho comum. Ao assumir a regência da turma, a petiana teve a oportunidade de trabalhar a leitura dramática de contos, suscitando nos alunos o interesse pela leitura oral. Encerrando esta obra, os capítulos cinco e seis tematizam o ensino de análise linguística no 7º e 8º anos, respectivamente. No capítulo cinco, a petiana Priscila Raposo Ananias focaliza o ensino de adjetivação a partir da leitura de uma crônica. No capítulo seis, a petiana Edlene da Silva Oliveira aborda o ensino dos termos da oração a partir de um conto. Vemos nesses dois relatos que, apesar das poucas aulas ministradas, a perspectiva indutiva de discussão sobre os usos da língua despertou nos alunos o interesse pelo eixo de análise lingüística nas aulas de língua portuguesa. De modo geral, os relatos aqui apresentados expõem as condições de debilidade em que se encontra a escola pública. Os petianos testemunham com o seu trabalho desde o sucateamento dos prédios ao pouco envolvimento de alguns professores, que os viam como seus substitutos imediatos, delegando-lhe, em alguns casos, a gerência da sala de aula e do conteúdo, sem um prévio planejamento. Além disso, em vários trabalhos é comum o relato da suspensão de aulas pelos mais Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 3 diversos motivos. Por outro lado, vale destacar a participação de alguns professores que, não obstante as péssimas condições em que trabalham, demonstram um significativo engajamento com a educação pública e uma perspectiva de trabalho conjunto com a universidade. Esperamos com essa publicação motivar outros alunos de Letras e docentes da escola pública para o estabelecimento de parcerias que subsidiem a formação inicial de professores de língua portuguesa e de literatura, bem como fomentem a melhoria da educação básica na escola pública. Além disso, esperamos que os relatos se tornem sugestões para a atuação docente. Com essa publicação, colocamos em prática de modo evidente a tríade que caracteriza o trabalho do PET: ensino, pesquisa e extensão. Pois, a imersão resultou de atividade de ensino (estudo do texto de Alarcão) que se transformou em atividade de pesquisa com a busca de fundamentos norteadores da prática, que, por sua vez, se materializou na extensãoe se torna permanente com o livro ora publicado. Campina Grande, Junho de 2009 Denise Lino e Ludmila Kemiac (Organizadoras) Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 4 Sumário O GÊNERO POEMA NO 6° ANO: DESAFIO DA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA Nayara Araújo DUARTE Rodrigo Fernandes de SOUSA 5 “ESSES TEXTOS QUE TÊM UMA HISTÓRIA”: O ENSINO DE LITERATURA EM UMA TURMA DO 8° ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL Wesley BARBOSA 23 DE ANDERSEN A LOBATO: UMA PROPOSTA DE LEITURA REFLEXIVA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL Ludmila KEMIAC Clara Regina Rodrigues de SOUZA Elisa Cristina Amorim FERREIRA 34 INTERVENÇÃO NO ENSINO FUNDAMENTAL: TRABALHANDO A LEITURA E A COMPREENSÃO DE TEXTO COM ALUNOS DO NONO ANO Aluska SILVA 60 PARA ALÉM DA LITERATURA: A ADJETIVAÇÃO NO GÊNERO CRÔNICA Priscila Raposo ANANIAS 73 CONVIVENDO COM O ENSINO FUNDAMENTAL: DESCOBERTAS E APRENDIZAGENS PARA UMA PROFESSORA INICIANTE. Edlene da Silva OLIVEIRA 94 Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 5 O GÊNERO POEMA NO 6° ANO: DESAFIO DA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA Nayara Araujo DUARTE Rodrigo Fernandes de SOUSA Introdução Este texto é resultado de uma experiência desenvolvida em uma turma do sexto ano do Ensino Fundamental na escola Estadual Severino Cabral, em Campina Grande - PB, durante os meses de maio, junho e julho do ano de 2008. Diferentemente dos demais relatos desse livro, neste não se observou o dia-a-dia regular de uma sala de aula, mas a realização de aulas preparatórias para um concurso intitulado Olimpíadas de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro. Promovido pelo Ministério da Educação em parceria com a Fundação Itaú Social e o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC), o concurso, segundo seus idealizadores, teve por objetivo “contribuir para a melhoria da qualidade de ensino e para o aperfeiçoamento da escrita dos alunos das 4ª e 5ª séries do Ensino Fundamental (5º e 6º anos do Ensino Básico de 9 anos), das 7ª e 8ª séries do Ensino Fundamental (8º e 9º anos do Ensino Básico de 9 anos) e 2º e 3º anos do Ensino Médio” de escolas públicas de todo o país (http://olimpiadadelinguaportuguesa.mec.gov.br/olimpiada). Para isso, apostou em uma série de premiações como uma maneira de “estimular o desenvolvimento de competências de escrita”, bem como forneceu “subsídios e material de apoio pedagógico (kit de criação de textos) para que os professores realizem oficinas de leitura e escrita com seus alunos”. Entre outras justificativas, o projeto defende o seu papel contribuinte para que “escolas e professores revejam os métodos convencionais de ensino de escrita”, como também identifiquem, valorizem e divulguem textos que demonstrem “a competência dos alunos da escola pública no uso da Língua Portuguesa” (citações retiradas do site anteriormente identificado). Escolhemos observar esse tipo de atividade, entre outros motivos, para, primeiro, promover uma aproximação da prática docente ainda durante nosso período de formação enquanto alunos graduandos em Letras, visto que disciplinas práticas ocupam pontualmente posição terminal e praticamente finalizadora em nosso (e em tantos outros) curso(s) de graduação; e, segundo, para proporcionar algum retorno Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 6 acadêmico de um tipo de atividade que, a nosso ver, tem se tornado comum em muitas escolas públicas do país, mas que dificilmente são oportunamente apreciadas. A escolha por observar uma parte da turma, que estava sendo preparada para um fim específico, saindo, portanto, da rotina diária das aulas de português, foi uma sugestão de um dos petianos, sendo assim bastante válida, visto que essa seria uma contribuição a mais para o grupo, no que tange à diversidade de experiências dentro do PET. Período de observação Contextualização A princípio, tínhamos intenção de freqüentar as aulas de uma das séries do Ensino Fundamental do colégio Severino Cabral, durante um período de 10 aulas, para, em seguida, depois de identificada alguma provável dificuldade de aprendizagem dos alunos, propor uma sequência didática de intervenção, com duração média de 5 aulas, com vistas à superação de tal dificuldade. O concurso, contudo, nos parecendo uma experiência diferenciada, apresentava, como tal, uma disposição bem específica, com oficinas e sequências didáticas previamente definidas. Sendo assim, o alvo de nossa observação foram 10 oficinas, ministradas pela professora efetiva da turma; e 4 oficinas ministradas por nós, petianos, nas quais pudemos exercer nossa intervenção de acordo com a atividade previamente determinada. Vale lembrar que durante as últimas 11 oficinas contamos com a presença de dois estagiários da disciplina Prática de Ensino I, do período 2008.1, de nossa instituição, a UFCG. As oficinas eram realizadas todas às terças-feiras, entre às 7h e 8h40min. Este horário correspondia às duas primeiras aulas de Português dos alunos do sexto ano A, dos quais frequentavam as oficinas cerca de 25 de um universo de 52 discentes. Tal realidade, segundo alegou a professora, decorreu da impossibilidade de se realizar uma atividade integrativa com tamanha quantidade de alunos, seja porque não havia, segundo ela, um bom espaço para comportar a todos, seja por conta da indisciplina dos alunos. De fato, vez por outra, eles “fugiam ao controle”. A solução encontrada pela professora para a realização do concurso foi, então, a de dividir a turma: os interessados, voluntariamente selecionados, assistiam às oficinas na sala de vídeo do colégio, enquanto os demais permaneciam em sua classe original acompanhando um conteúdo programático proposto pelo livro didático, obviamente, devido a propriedades Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 7 básicas dos corpos físicos, ministrado por outro professor. Este outro, aluno da mesma disciplina supracitada, Prática de Ensino I. Inicialmente, nós, observadores, questionamos muito a posição da professora em dividir a turma em dois grupos, pois, de certa forma, ela estaria excluindo o direito de parte dos alunos ter acesso à poesia, que era o foco das aulas observadas. Tivemos de nos conformar com “a voz experiente” da professora que, segundo suas próprias palavras, ia de encontro ao “nosso idealismo de graduandos”. Desde então passamos a nos questionar sobre a real existência de um tão suscitado abismo entre teoria e prática. Talvez o que realmente faltasse naquele momento fosse um tanto mais de interesse da professora. É claro que uma disseminação discursiva tão abrangente tenha lá algum valor de “verdade” (sem que aqui a essa palavra se pese qualquer especulação filosófica mais profunda), mas até onde isso não seria uma forma, até certo ponto resignada, de se manterem determinadas atitudes impassíveis diante de um sistema, diga-se de passagem, negativo, que teima por se manter e se auto-promover? É claro também que, diante de nossaatitude de observadores, não nos passaram despercebidas as condições a que muitas vezes o trabalho do professor tem de se submeter em uma escola pública. A professora nos informou da importância que aquele colégio assumia entre a comunidade, isso também devido ao crescente interesse de sua direção no envolvimento dos alunos e professores nos mais diversos projetos e programas de ensino ou concursos incentivados pelo ministério da educação – os quais muitas vezes são desenvolvidos sem recursos outros senão apenas a reprodução de material xerografado. Apesar disso, no que se pesem todas as atitudes da professora observada, ela se mostrou muito interessada pelo concurso, muitas vezes até empreendendo recursos próprios para que fossem desenvolvidas algumas de suas atividades. Ainda assim, achamos naquele momento que as atividades referentes às Olimpíadas poderiam ter sido realizadas de forma diferente. Infelizmente o quadro em que se encontra a educação em nossa sociedade apresenta grandes obstáculos a serem superados, mas ainda assim a vida caminha, os professores devem trabalhar, fazendo o que podem, ou melhor, devem, e os alunos receber o que lhes oportunizam, ou ainda melhor, lhes cabe de direito. E, diante desse raciocínio, não nos é escusado lembrar o sábio ensinamento de Antonio Candido (1989) sobre o papel formador da literatura3, tratado nesses mesmos termos, segundo um direito fundamental para formação do indivíduo e para seu processo de humanização. Entendendo esse “processo como o que confirma no homem aqueles 3 Neste momento, recordamos o estudo do texto Direitos Humanos e Literatura, de Antonio Candido, lido pelo grupo PET-Letras no ano de 2008 em um dos encontros da atividade de nome Núcleo de Estudos. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 8 traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo” (op. cit., p. 117), esse direito não deve ser negado, assim como não deve ser negado o direito ao suprimento das necessidades básicas, visto que a literatura em nada se difere destas últimas. Segundo Candido, direito humano é aceitar que tudo que é indispensável para mim também o é para o próximo. E não só os direitos fundamentais como a alimentação, a água, a moradia e o emprego, mas o acesso a uma boa música e a uma literatura de qualidade. O autor nos expõe que o exercício dos direitos humanos em nosso país é dificultado, principalmente, por causa da desigualdade social. Poucos têm acesso a obras clássicas, porém isso não quer dizer que não a queiram em suas vidas, mas sim, que são privadas pelo sistema de as conhecerem. Nos bancos escolares muito pouco é oferecido, e quando o é, isso muitas vezes é feito em fases erradas, ou de forma a desestimular a leitura, por obrigação e não por gosto. Segundo o autor, as pessoas, em sua grande maioria, passam pela vida sem nunca terem tido um bom contato com o mundo da literatura, sem se identificarem com essa ou aquela personagem. Sem matar sua grande sede pelo fantástico que, em maior ou menor grau, temos todos. O que é tratado por Candido nos termos de um deixar-se morrer estando vivo. E foi dentro de um espírito de pessoas que sentem o peso da falta de oportunidades iguais para todos que iniciamos nossas atividades no concurso, seccionados. Descrição das oficinas A atividade de observação realizou-se em cinco dias, o equivalente a dez aulas, seguida por dois dias de intervenção, equivalentes a quatro. Dividimos o período de intervenção de forma que cada oficina ficasse sob a responsabilidade de apenas um de nós.4 Primeira oficina A primeira oficina foi um momento de aproximação dos alunos com o gênero a ser estudado. A professora, na aula anterior, ainda comum a todos os alunos, pediu que o grupo a ser separado pesquisasse e trouxesse exemplos de poemas. Já na pequena sala separada para o grupo que participaria da Olimpíada, no dia da oficina, 4 A primeira intervenção foi realizada pelo petiano Rodrigo Fernandes, e a segunda ministrada por Nayara Duarte. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 9 ela estimulou a leitura em voz alta dos poemas selecionados, atividade que contou com grande colaboração dos alunos. Percebemos que eles se preocuparam em pesquisar diferentes autores, o que resultou em uma considerável diversidade de poemas. Seis poemas diferentes resultaram dessa atividade: O Convite, de José Paulo Paes, A Flor de Maracujá, de Fagundes Varela, Das Falsas Posições, de Mário Quintana, A Foca, As Borboletas e São Francisco, de Vinícius de Moraes. A professora pediu então que os alunos montassem o mural a partir de suas escolhas, atividade essa que marcou o término da primeira oficina e o início, pendente, da segunda. Na mesma aula, a docente dividiu a turma em quatro grupos e pediu que eles trocassem e lessem os poemas entre si e elegessem dois que a maioria gostasse para a confecção de um mural, na aula seguinte. A cada término da leitura, a professora sempre questionava aos alunos o porquê da escolha e as respostas eram variadas, mas sempre as mesmas: “porque é bonito”, “porque é alegre”, “porque fala de (e dizia alguma palavra do poema)”, e as conversas não passavam disso. Consideramos essa abordagem um tanto superficial, entretanto fazia parte da atividade esse tipo de pergunta, pois, para muitos alunos, aquele era o primeiro contato com o gênero, e eles não estavam, ainda, acostumados àquele tipo de situação. Muito embora ainda estivéssemos nos acostumando com a atividade, ainda inédita, da observação docente das aulas, pelo menos dois episódios chamaram bastante nossa atenção nessa primeira oficina. O primeiro foi o fato de a professora ter deixado passarem despercebidas as identificações autorais dos poemas, como se essa informação pouco importasse para a sua leitura. De fato, em certo momento da escolha e transcrição dos poemas pelos grupos, um dos alunos questionou um companheiro de equipe da necessidade de se colocar o nome do autor na transcrição, ao que o outro respondeu sem hesitações: “para quê? Não vai mudar em nada mesmo!”. Para nossa satisfação o aluno não se contentou com tal resposta. Procurando, por sua conta, uma segunda opinião, dessa vez mais experiente, obteve a resposta que julgava mais acertada. O que, contudo, pareceu-nos ainda, poderia ter sido alvo de uma maior problematização junto a toda sala reduziu-se apenas a um caráter instrucional: “coloquem o nome dos autores nos poemas!”. A assinatura requisitada ali não surgia apenas enquanto uma formalidade, mas assumia um caráter funcional. O que, de certa forma, abre espaço para a nossa segunda observação: o fato de a turma ter optado por um maior número de poemas de Vinícius de Moraes. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 10 Tal observação, contudo, quando levada à professora, não surtiu o menor efeito de interesse. Pelo menos não da maneira pela qual surtiu em um dos autores deste relato. De fato, essa deveria ser a porta de acesso a que a professora chegaria à experiência de leitura ou de identificação dos alunos com a poesia. Na verdade, paraa professora pouco importaria mesmo tal constatação uma vez que o material oferecido pelo Ministério da Educação já havia sido quase todo xerocopiado pela direção do colégio, inviabilizando assim uma alteração nos rumos do processo didático, sequencial, “planejado” pela professora. Segunda oficina A segunda oficina foi iniciada com a construção de um mural com os poemas selecionados na semana anterior. De forma animada, os alunos participavam ajudando a professora a colar as folhas de papel. Após essa atividade, a professora deu continuidade ao que estava previsto para o segundo dia de oficina, seguindo o planejamento do manual. Para este dia, o tema da oficina era “O que faz um poema”, tendo por objetivo expor as características gerais de tal gênero. A professora iniciou insistindo na pergunta sobre o porquê da escolha daqueles textos, e como eles sabiam que os mesmos eram poemas, as respostas vieram de maneira quase que imediata: presença de rimas, versos, “faz viajar na imaginação”, não se escreve do mesmo jeito (comparando a um texto em prosa), possui estrofes, etc. Foi interessante perceber que conceitos como rimas, versos e estrofes já estavam sendo citados antes mesmo de qualquer explicação teórica feita pela professora. Após as respostas, a professora veio confirmar, através de conceituação, o que os alunos tinham sugerido. Dois conceitos foram inicialmente transmitidos aos alunos: o de verso: “É cada uma das linhas escritas”; e o de estrofe: “é o grupo de versos, separados por um espaço”. Essas definições e todas as outras utilizadas durante as aulas estão presentes também no manual do professor. Após as definições, a professora fez uma comparação dos poemas escolhidos com textos de outros gêneros (texto jornalístico, receita...), enfatizando ainda mais as respostas dos alunos. Em um terceiro momento, a professora entregou aos alunos o poema Tem tudo a ver, de Elias José, que estava sugerido no manual, e solicitou uma leitura em voz alta. Os alunos não hesitaram e leram prontamente. Foi interessante observar que as leituras não eram feitas segundo solicitava o gênero, ou seja, os alunos liam o poema como costumavam ler qualquer outro texto, o mais rápido possível. O que demonstrava a importância que os alunos davam à decodificação como um processo de identificação de bons leitores. Não havia pausas, nem respeito à pontuação, Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 11 todavia, tanto nós observadores, como a professora, deixávamos a leitura livre. Depois de muitas leituras, todas da mesma forma, a professora pediu que um de nós fizesse uma leitura, e a percepção foi imediata: os alunos ficaram surpresos com a diferença entre as leituras. Após a leitura oral do texto de Elias José, a professora repetiu o mesmo procedimento com outros dois poemas, Mar azul, de Ferreira Gullar, e um de Cora Coralina. Contudo, dessa vez, de um lado, agradou-nos o fato de os alunos voluntários lerem pausadamente os textos, mas, por outro, desagradou-nos a professora ter se atido apenas à identificação superficial dos componentes dos poemas, uma vez que, principalmente no de Gullar, a estrutura poemática dificultava bastante a interpretação, ainda mais para alunos não habituados àquele tipo de leitura. Depois, a professora pediu para que os alunos lessem outros poemas em voz alta e foi bastante perceptível o policiamento deles em relação às pausas e pontuação, tentando alcançar o modelo de leitura apresentado e que eles consideraram “mais bonita e mais certa”. A segunda oficina foi encerrada depois de discutidas as percepções dos alunos acerca da leitura e dos poemas. Terceira oficina A terceira oficina foi intitulada “Primeiro ensaio” e realmente foi o que sucedeu. A oficina foi a primeira oportunidade de os alunos colocarem no papel suas idéias em forma de poema. Para isso, neste dia, fomos para uma sala mais ampla, com carteiras individuais para evitar dispersão durante o momento de escritura. Basicamente, a professora distribuiu folhas de papel aos alunos e pediu que estes escrevessem um poema que falasse sobre a seguinte temática: “O lugar onde vivo”. Nesse momento, a professora ainda chamou a atenção dos alunos para a diferença entre título e temática: “eu estou dando a vocês o tema, mas fiquem à vontade para dar um título ao que escreverem”. Inicialmente, os alunos evitaram nos pedir ajuda e apenas direcionavam as questões a professora. Entretanto, com o incentivo dela, eles começaram a nos dirigir, não só questionamentos, mas pediam que pudéssemos ler, opinar e dar alguns “retoques” ao texto que escreviam. Na medida em que os alunos iam terminando ou progredindo na escrita vinham mostrar o que haviam feito à professora. Esta, entretanto, não parecia saber muito em que ajudá-los, o que a fez, a certa altura, pedir aos alunos que também nos mostrassem seus escritos, uma vez que “também éramos professores de português”. Essa última informação, contudo, não nos pareceu ser prova de que saberíamos avaliar da melhor maneira os tais poemas. É claro que éramos professores de Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 12 português, mas não se tratava de restringir os escritos a mera correção gramatical. Inclusive, em alguns casos era perceptível lembrar aos alunos que a pontuação, por exemplo, poderia ser ou não um recurso utilizado. Naquele momento sentimos na pele algo semelhante ao que a professora provavelmente estava sentindo. O que dizer? Como avaliar ou mesmo validar tal texto? De fato, se já parece difícil corrigir um gênero textual que temos contato frequentemente, como um resumo, uma resenha ou um artigo, o que dizer de um que dificilmente escrevemos? Apesar de toda a dificuldade, não era difícil sentir em alguns textos a beleza de algumas construções; certo lirismo, sinceramente recorrente à memória. Outras tantas vezes, entretanto, faltavam aos poemas (por que não dizer?) densidade, grande parte das vezes recorrentes ao simples uso indiscriminado da rima, rima pobre, diga-se de passagem, mas, ainda assim, como ser melhor? Quarta oficina A quarta oficina foi destinada à leitura de um conto de Antônio Gil Neto – Cantador (de sentimentos escondidos). O texto foi discutido e lido várias vezes seguidas pelos alunos. A professora nos pediu que fizéssemos uma leitura, chamando a atenção para a poeticidade presente no texto, apesar de ele ser escrito em prosa. Ainda nessa oficina, a professora propôs uma atividade de entrevista com familiares, vizinhos, amigos, em que os alunos deveriam, através de perguntas, procurar saber os gostos das pessoas em relação à poesia, saber que poemas que essas pessoas gostam, se conheciam algum poeta, e, depois, coletar alguns dos poemas citados pelos entrevistados a fim de trazê-los para sala de aula. Vale lembrar que, nesta oficina, chamou-nos atenção o fato de a professora ter pedido aos alunos que realizassem uma entrevista sem que ao menos esse gênero tivesse sido referido antes em sala de aula. De fato, essa atividade era sugerida pelo manual também sem maiores encaminhamentos. Visando diminuir essa lacuna, propomos um pequeno roteiro aos alunos com algumas orientações sobre o gênero. Os poemas recolhidos seriam socializados na próxima aula – um sarau. No final da aula, juntamos os alunos para nos preparar para o sarau, ensaiando, lendo e relendo os poemas a serem lidos no evento. Para o sarau, os alunos foram selecionados para declamaralguns poemas específicos, mas todos estariam envolvidos na leitura de Trem de ferro, de Manuel Bandeira, o que causou uma total euforia por parte dos alunos. Neste dia, contamos ainda com a presença de duas alunas da disciplina Prática de Ensino de Língua Portuguesa I, 2008.1, da UFCG, que estavam desenvolvendo também um trabalho de Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 13 observação na mesma turma, e que nos ajudaram nos ensaios e na organização do evento. Quinta oficina A quinta oficina foi inteiramente dedicada ao sarau, não só os instantes da aula, mas a manhã inteira. Depois de muita conversa, conseguimos convencer a professora e decidimos que levaríamos toda a turma para participar do evento. Entendemos que essa seria uma oportunidade única de desenvolver, nos alunos que não tiveram interesse em participar das oficinas, o conhecimento e o gosto pela leitura e, especificamente, pela poesia. Sendo assim, excepcionalmente neste dia, a turma foi novamente unida e levada para um salão de uma igreja localizada em frente à escola. No momento do sarau, entendemos os argumentos da professora e sua hesitação em levar todos os alunos para a atividade, mas a euforia e quantidade de alunos não fizeram com que desanimássemos do trabalho. Contamos também com a presença do professor Hélder Pinheiro da Unidade Acadêmica de Letras da UFCG, que aceitou o convite e compareceu ao evento, ministrando uma rápida explanação sobre como e o que é preciso para a elaboração de poema. O sarau contou ainda com a colaboração de outros dois estagiários da disciplina de Prática de Ensino de Língua Portuguesa I, 2008. 1, da UFCG, e um convidado de um dos estagiários para ajudar no aspecto musical. Tivemos momentos únicos com os alunos. O sarau resultou em uma manhã alegre e descontraída, com muitos poemas, muita música e brincadeiras e principalmente: a participação dos alunos. É interessante ressaltar que, no evento, não tivemos só os alunos interessados na Olimpíada, mas a turma inteira do 6º ano. O mais importante é que neste dia conseguimos atingir o objetivo do sarau, que era divulgar a poesia e o direito do acesso a ela. Um pouco de teoria... Com o objetivo de fundamentar o nosso trabalho em uma teoria, optamos basicamente por conceitos de Produção textual e de Gênero textual. Neste caso, buscamos responder a duas questões: “O que é gênero textual?” e “Para que ensiná- lo na sala de aula?”. Posteriormente, abordamos no gênero alvo das nossas aulas de observação, a poesia. Para tanto, nos fundamentamos no livro Poesia na sala de aula (PINHEIRO, 2007). Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 14 Produção Textual Na atividade em sala de aula, observamos diversas metodologias no que se referem à produção textual. Sercundes (1994) avalia basicamente duas práticas: “A escrita vista como dom” e “Produção com atividade prévia”. A atividade de escrita vista como um dom é aquela feita sem uma atividade prévia, descontextualizada do trabalho pedagógico feito pelo professor e não apresenta um caráter evolutivo do trabalho com o texto. Geralmente, são feitas atividades apenas que exigem do aluno uma boa articulação das palavras e idéias, em que essa habilidade é considerada um dom, e só alguns a possuem. Nesta perspectiva, é desprezado o trabalho exaustivo com as palavras no processo de construção do texto. Já na produção com atividade prévia o processo de escritura é uma consequência de outra atividade, como por exemplo, uma leitura ou um filme. Após a realização da primeira atividade, o professor realiza discussões, outras leituras, para que o aluno seja capaz de perceber o diálogo entre os diversos textos, e, no momento da escritura, lance mão de todos os conhecimentos previamente adquiridos. Segundo Sercundes (op. cit.), a escrita como trabalho leva à produção. Neste caso, surge de um processo contínuo de ensino/aprendizagem (p. 74). Trata-se de um trabalho que visa unir o conhecimento às necessidades reais do aluno. Partindo do conteúdo estudado, é criada uma situação real de aproximação do aluno a esse estudo e só depois é trabalhada entre os alunos a escritura de textos orientados pelo professor. Nesse processo de escritura é exigido do aluno um domínio maior da língua e os resultados são mais eficazes, pois ele é inserido na realidade do uso da língua, desta forma terá conhecimento do funcionamento real da linguagem, contribuindo assim para o processo de aprendizagem. Diante desse contexto de escrita, temos os estudos dos gêneros textuais. Segundo Marcuschi (2005, p.19), gêneros são entidades sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer situação comunicativa. Os gêneros surgiram a partir da necessidade de comunicação, por isso que nos primórdios só existiam gêneros orais. Com o desenvolvimento da escrita, surgiram, então, novos gêneros que acompanham a evolução sócio-histórica e também tecnológica, por exemplo, e-mails, chats, videoconferências. Com toda a evolução da comunicação, os novos gêneros são uma espécie de adaptação dos antigos gêneros, segundo o autor. Este fenômeno já fora previsto por Bakhtin, que usou o termo transmutação dos gêneros. Como já citado anteriormente, Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 15 estas inovações visam atender a necessidades mais atuais, como por exemplo, o que tínhamos antes para viabilizar a comunicação entre as pessoas era a carta pessoal, hoje temos o e-mail, que tem sido adotado por parte da população e tem, basicamente, o mesmo fim da carta pessoal. Quando falamos em gênero textual, devemos levar em consideração o suporte no qual ele está inserido. O suporte pode fazer toda diferença de um gênero para outro, pois, através dele, podemos identificar a funcionalidade ou intencionalidade do texto. Dessa forma, não podemos afirmar, acerca de dois exemplares, que são o mesmo texto e o mesmo gênero, uma vez que isso dependerá do suporte em que eles estejam. Cada gênero possui sua funcionalidade, estrutura e linguagem específica para atender a um determinado fim – a comunicação, pois, ainda segundo Marcuschi (2005, p.22) é impossível se comunicar verbalmente a não ser por um gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Visto que a comunicação é fundamental ao ser humano, é preciso que todos sejam capazes de usar os diversos níveis de linguagem presentes na sociedade. O trabalho com o texto baseado na teoria dos gêneros textuais (orais e escritos) em sala de aula é um proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e parte do entendimento de que o estudo dos gêneros textuais é de fundamental importância para a formação do indivíduo, posto que contribui para inclusão do mesmo em uma sociedade comunicativa. Segundo Dell’Isola (2007:19), as práticas didático-pedagógicas de Língua Portuguesa precisam considerar a heterogeneidade de textos existentes em nossa sociedade e levar em conta a necessidade de tornar nossos alunos proficientes leitores e produtores de textos. A afirmação é bastante pertinente e dispensa grandes comentários, pois é função do professor propiciar ao aluno um ensino em que ele seja capaz de adequar-se a diferentes situações sócio-comunicativas, não sóno que diz respeito à linguagem, mas, neste caso especificamente, aos gêneros textuais que cercam todo e qualquer tipo de comunicação. Um último ponto a ser mencionado em relação ao ensino dos gêneros textuais e de Língua Portuguesa é que, como afirma Dell’Isola, deve ser enfatizada a utilidade de para quê se aprendem tais conceitos; o aluno precisa perceber a funcionalidade dos conceitos teóricos nas práticas de leitura e escritura. O gênero poesia em sala de aula Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 16 No ensino de Língua Portuguesa, verificamos um enfoque voltado ao ensino dos gêneros, sugerido pelos próprios PCN, entretanto, o gênero poesia não figura entre os mais cotados para o ensino, sendo esquecido e pouco conhecido entre a comunidade estudantil. Além da atitude do professor, mediante o pouco tempo para tanto conteúdo, temos ainda a maioria dos livros didáticos que pouco valorizam esse gênero, sendo usado muitas vezes como mero pretexto para uma atividade gramatical. Dessa forma, fica cada vez mais difícil o trabalho com esse tipo de texto em sala de aula. O professor Hélder Pinheiro, em seu livro Poesia na sala de aula (2007), afirma que a poesia pouco é trabalhada em sala de aula, e quando o fazem é de maneira inadequada, trabalhando o poema puramente quanto estrutura e linguagem, o que faz com que o aluno se torne um mero decodificador de poemas, perdendo assim, toda a beleza que um estudo detalhado teria. Ele afirma ainda que o estudo da forma, da linguagem é valido, mas não somente isto. A poesia tem a ver com a percepção de sentimentos, de visões de mundo. No período de observação percebemos que os detalhes do poema estavam caindo no esquecimento tal como descrevia o professor Hélder, sendo propostas aos alunos perguntas limitadas, que contavam sempre com as mesmas respostas. Isso acontecia por vários motivos: o tempo da aula e até a duração do período de oficinas, a maturidade dos alunos que não se preocupavam em argumentar para fundamentar suas respostas... Durante a intervenção procuramos privilegiar os debates, conforme veremos a seguir. Intervenções Primeira intervenção Minha intervenção se deu, logo após o sarau poético, na sexta oficina, que tinha por objetivos a identificação e a criação de rimas por parte dos alunos. A mudança de pessoa gramatical aqui, como o leitor deve ter percebido, se justifica já que decidimos, Nayara e eu, que cada um deveria realizar uma intervenção individual, até para simular uma situação mais real de atuação na sala de aula. Minha atuação, logo, se deu de forma individualmente planejada de forma que, embora o caderno de atividades elaborado pelo MEC já indicasse as atividades a serem realizadas naquele dia, decidi ainda, motivado pelo encaminhamento dado às aulas pela professora responsável pelo projeto, acrescentar alguns apontamentos de leitura para dois poemas escolhidos por mim. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 17 Iniciei a oficina informando aos alunos sobre minha responsabilidade em desenvolver as atividades d’Os Poetas na Escola naquele dia, bem como os dois objetivos, já citados, a serem desenvolvidos. Após escrevê-los no quadro, pedi aos alunos que mobilizassem seus conhecimentos sobre o conteúdo proposto pelo CA e tentassem formular uma definição própria para rima. Ouvidas suas sugestões e anotadas no quadro, solicitei a eles que verificassem em seus cadernos ou no mural um conceito de tal aspecto do poema, elaborado logo na segunda oficina pelos próprios alunos, de forma a validar o novo conceito proposto. Pretendi nesse momento, não apenas definir um foco de atenção para os alunos na aula, como também recapitular um conhecimento já desenvolvido em sala, mas a ser aprofundado naquela oficina. Após essa atividade inicial, pedi aos alunos que lessem silenciosamente dois (fragmentos xerocopiados de) poemas, previamente distribuídos entre eles, e, a seguir, li, em voz alta e de acordo com o tom de cada um dos poemas5, “Minha terra”, de Álvares de Azevedo, e “Pátria amada”, de Vinícius de Moraes. Antes de partir para o primeiro objetivo da oficina propriamente, pedi para que os alunos apresentassem algumas impressões e/ou as interpretações dos poemas (encaminhei a atividade com questões do tipo 1.O que vocês acharam dos poemas? Gostaram? Porquê?; 2.Do que eles tratam? Eles têm algo em comum? O quê?; 3.Existe alguma diferença entre eles? Quais?; 4.Algo chamou atenção em algum deles? Porquê?). Após ouvi-los, fiz alguns comentários sobre aspectos composicionais importantes de cada poema, como o fato de, no primeiro, Álvares de Azevedo ter se dedicado bastante às sensações físicas proporcionadas pela sua terra, ligadas à visão, ao tato, ao olfato e à audição, e, no segundo, Vinícius de Moraes ter promovido uma intertextualidade com a letra do hino nacional brasileiro. No caso do último poema, destaquei ainda a maneira afetiva com a qual as palavras foram empregadas, se comparadas ao emprego na canção-símbolo nacional. Nesse momento, como, aliás, uma das estagiárias me veio comentar depois, preferi não utilizar de metalinguagem alguma, muito embora tratasse de elementos bem específicos dos poemas como a sinestesia, por exemplo, no primeiro poema. Terminado esse momento interpretativo, que durou pouco menos de meia hora, pedi aos alunos que retornassem ao primeiro texto e identificassem as rimas presentes nele, as quais começaram a jorrar numa escala ascendente, do burburinho à algazarra, em dois tempos. De fato, tal procura não apresentava dificuldade aos 5 Um tratamento da leitura poética com ênfase em sua tonalidade pode ser vista em Alfredo Bosi (1996). Tal estratégia de leitura (de encontro do tom certo do poema) é vista pelo autor como meio caminho andado para uma boa interpretação do poema. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 18 alunos, uma vez que se encontravam todas nas palavras finais de cada verso, emparelhadas. Logo a seguir, solicitei a releitura do segundo poema com o mesmo objetivo anterior, identificar suas rimas. Estas, desta vez, surgiram ao passo lento, de uma escala que ia do sopro ao ritmo acústico de um eco produzido em um telefone sem fio, totalmente inseguras, já que o poema as trazia ora internas, ora externas, mistas. Aproveitei esse momento para atentar aos alunos das possibilidades variadas do uso das rimas, bem como, em alguns casos, da sua ausência total. Para isso, tentei fazer com que lembrassem das oficinas anteriores e dos poemas nelas lidos, alguns rimados, outros não. Em seguida, lemos outro poema intitulado “Duas dúzias de coisinhas à-toa que deixam a gente feliz”, da autoria de Othavio Roth. O procedimento foi semelhante ao anterior: a leitura silenciosa precedeu a em voz alta e os alunos foram questionados sobre o conteúdo do texto. Contudo, enquanto a minha leitura foi precedida pela de alguns alunos que voluntariamente se prontificaram a ler o texto também, as questões de leitura, assim como a própria leitura integral do texto, foram precedidas de perguntas inferenciais/ou remetentes à experiência individual dos alunos, a partir do título e das imagens do poema. Os alunos foram ainda solicitadosa pensar em pequenas coisas que os deixavam felizes. Houve ainda aqueles que, mal terminada a minha leitura, se ofereceram para identificar as rimas no poema. Acatadas as suas alardeadas solicitações, propus uma atividade em que os alunos deveriam escrever um verso cujo conteúdo fosse “alguma coisinha à toa que deixa a gente feliz”. Expliquei aos alunos que eles deveriam pensar, se possível, em algo diferente daqueles elementos contidos no texto que havíamos acabado de ler e escrever um único verso. Em seguida, iniciaríamos as atividades referentes ao nosso segundo objetivo escrevendo um texto coletivamente. Nesse momento deixei os alunos um pouco mais à vontade para escreverem seus versos e pedi para que os estagiários e a professora me ajudassem enquanto eu atendia os alunos que solicitavam meu aval sobre seu processo composicional, seja os supervisionando também, seja na distribuição de dicionários previamente selecionados para aquele momento. Nesse momento, contudo, lembrei-me de que não deveria ter feito tal solicitação devido à própria experiência que realizava, mas apesar da permissão concedida aos estagiários, os alunos não a utilizaram. Dessa forma, diversas vezes fui questionado pelos alunos sobre a necessidade dos versos rimarem. Outras diversas vezes tive de explicar-lhes que a atividade consistia na confecção de um único verso e de que por isso não necessariamente precisariam rimar. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 19 Conclui, a partir daí, que não adiantavam minhas explicações: os alunos queriam demonstrar sua capacidade de criar versos rimados. Uma das meninas chamou muita atenção nesse momento: quando, no início da oficina, explicava à turma os objetivos daquele dia, ela se virou com um tom indiferente para a professora e disse-lhe que não sabia fazer aquilo não, que era muito difícil. Contudo, durante o momento de confecção do seu verso, ela se prontificou, com ar de subestimada: Ah não, não vou fazer só um verso! Vou fazer uma estrofe inteira! Depois de cerca de 15 minutos, foi a hora de reunir os versos e escrever o texto coletivo. Tentei ser o mais democrático possível. A princípio, havia pensado em prosseguir tal atividade da mesma maneira proposta pelo livro: pediria a eles que procurassem entre os colegas versos que rimassem com os seus; a partir daí, formassem grupos de dois ou três alunos e montassem uma pequena estrofe. A sala, entretanto, não possuía espaço suficiente para que os alunos circulassem livremente, nem tampouco me senti apto para tentar conter uma turma tão animada quanto aquela se apresentara. Em um dos momentos a professora foi muito importante para que conseguisse dar continuidade à minha intervenção: a mesma garota anteriormente citada se mostrou muito avessa às minhas solicitações e teimava para que eu colocasse seu texto integralmente na versão final, mesmo quando lhe disse que não estava de acordo com o proposto pela atividade. A professora, de fato, percebendo sua má vontade em ceder, chamou-lhe atenção alegando que a atividade desenvolvida por mim era um tanto difícil, principalmente por ser coletiva, assim como para o fato de a menina estar deliberadamente interessada em atrapalhar o trabalho. Realmente, ela se comportou muito diferentemente dos demais dias em que observei as aulas da professora, mais agitada e pouco disciplinada, apesar de interessada. Senti o quanto a dimensão afetiva às vezes pode ser importante para o bom andamento das atividades, bem como que em certos momentos a autoridade nem sempre imprescinde de uma boa reprimenda, por mais tradicional ou autoritário que isso possa parecer... Segunda intervenção A sétima oficina foi separada para minha intervenção e teve por título “Sons e quadras”. O objetivo era continuar com a identificação de rimas, apresentação de quadras e do conceito de aliteração. Esta oficina teve um caráter longo e por isso foi dividida em três momentos. Em um primeiro momento, me limitei a recuperar o que tínhamos visto sobre rimas e insistir na utilização das mesmas na construção do texto dos alunos, sem Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 20 perder o sentido geral do poema. Continuando com a temática sobre rimas, introduzi o assunto “Quadras” com uma conversa informal enfocando o que eles sabiam sobre tal. Em seguida, entreguei para eles exemplos de quadras para que lessem e observassem semelhanças, diferenças, características. Como sempre, a turma foi bastante participativa colaborando com a leitura e respondendo aos questionamentos. Depois desse momento de conversa, seguindo um pouco o manual, situei para os alunos o autor de quadras - o poeta Fernando Pessoa - e entreguei para eles cópias do poema “Quadras de gosto popular” e pedi que identificassem as rimas e a forma como apareciam nessas quadras. Desta forma, vencemos mais um objetivo desta oficina que era a identificação de esquemas de rimas. Por fim, em um último momento, entreguei aos alunos a cópia do poema “Violões que choram” de Cruz e Souza, que estavam também no manual, e iniciamos uma conversa sobre o poema lido. Ao perguntar o que eles percebiam com a leitura do poema, a resposta foi quase que imediata: “a repetição dos sons.” A partir daí, introduzi o conceito de aliteração, chamando sempre a atenção para o efeito de sentido que o recurso trás para o poema. Utilizei ainda a leitura do poema “Mar Azul” de Ferreira Gullar, que já tínhamos lido nas primeiras oficinas, mas que não tinha sido trabalhado, sendo esta uma ótima oportunidade de retomada, já que exemplificava muito bem o aspecto sonoro que estávamos destacando. A aula se desenvolveu, de modo geral, tranquilamente. Apesar de ter sido uma oficina um pouco longa e com muitas informações, conseguimos aproveitar bem o tempo e explorar de maneira satisfatória todo o conteúdo previsto. Alguns fatores dificultaram esta última oficina, como, por exemplo, era a última aula antes do recesso o que tornou os alunos eufóricos com a chegada das tão esperadas férias. Outro fator foi que neste dia nenhum dos estagiários pode estar presente, bem como a professora, que precisou se ausentar da sala. Além disso, neste dia permanecemos na sala onde iniciamos as oficinas, tratando-se de uma sala pequena onde não há carteiras, apenas duas mesas, e os alunos são obrigados a ficar em grupos, o que provoca focos de conversas paralelas. No entanto, em meio a pedidos de silêncio e pausas para chamar a atenção de alguns alunos, os objetivos da oficina foram alcançados e com bom êxito. O período de observação para a elaboração deste trabalho foi concluído com as nossas aulas de intervenção e também porque, como já mencionado, os alunos entraram em recesso. No entanto, ao final de nossa observação, as oficinas para a Olimpíada de Língua Portuguesa não terminaram. Na volta do recesso haveria uma intensificação, sendo realizadas duas oficinas por semana, agora com o auxílio das alunas da disciplina de Prática I, visto que haveria no somente o mês de julho para Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 21 finalizar todas as oficinas (mais sete), uma vez que o prazo máximo de envio das versões finais dos poemas feitos pelos alunos seria no mês de agosto. A atividade de observação terminou nesse período, porisso não acompanhamos as versões finais dos poemas, no entanto, apesar do pouco tempo com os alunos percebemos a disposição em aprender e o interesse da maior parte deles, o que nos leva a acreditar que a experiência das Olimpíadas foi positiva para a professora, para os alunos e para nós observadores. Para finalizar Acreditamos que este trabalho nos proporcionou reflexões pertinentes sobre o ensino de Língua Portuguesa, e principalmente sobre a realidade deste ensino. Levando em consideração a finalidade específica das aulas que observamos e a ausência dos alunos da série que não participaram da Olimpíada, acreditamos que bons frutos saíram desta experiência, baseados nas reflexões que pudemos construir na sala de aula mediante as atividades realizadas. A verdade é que o que relatamos aqui foi apenas uma parte de todo o processo constituído pelas oficinas e, no final das contas, não tivemos a oportunidade de apresentarmos uma conclusão mais concreta para este tópico. Finalizamos, então, com a expectativa que os alunos de fato tenham aprendido algo novo através das aulas da professora, bem como das nossas intervenções, e, principalmente, saibam utilizar aqueles conhecimentos, não só de maneira imediatista na composição para a Olimpíada, mas que sejam bons leitores e escritores de poemas. Através desta experiência fomos capazes de perceber o abismo existente entre a teoria que estudamos na universidade e a realidade escolar, o qual só poderá ser revertido com bom planejamento e dedicação do professor na sua elaboração de aulas; aulas essas que consigam ser capazes de suprir as necessidades de conhecimentos dos alunos, bem como minimizar a falta de recursos a serem utilizados no ensino das nossas escolas públicas. Percebemos também a importância de propostas como a das Olimpíadas para estimular o desenvolvimento de alunos de escolas públicas. Contudo, essas atividades, ao que tudo indica, ainda vêm sendo realizadas sem que seus executores (no caso específico, professores) tentem adequar as orientações à realidade imediata da sala de aula, afinal, antes de tudo, a proposta deve ser vista apenas como um possível caminho, uma idéia de planejamento, e, como tal, deve ser passível de novos rumos diante de seu processo de aplicação, desenvolvimento. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 22 É claro que diversos fatores podem contribuir para um acompanhamento cerrado ao caderno de atividades, por exemplo, entre os quais podemos destacar o próprio caráter de novidade que uma atividade como essa encerra em sala de aula. No caso específico da poesia, vale lembrar que, muitas vezes, sequer sua leitura é oportunizada aos alunos, quem dirá sua produção; mas, ainda assim, havemos de nos questionar diante de nossa prática e tentar buscar melhores formas de agir. Referências BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/ Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. BOSI, Alfredo. Leitura de poesia. São Paulo: Ática, 1996. CANDIDO, Antonio. 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Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 23 “ESSES TEXTOS QUE TÊM UMA HISTÓRIA”: O ENSINO DE LITERATURA EM UMA TURMA DO 8° ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL Wesley Barbosa Introdução O presente trabalho relata a experiência de observação e intervenção realizada em uma turma do 8º ano, na E.E.E.F.M. Severino Cabral, na periferia da cidade de Campina Grande. Tendo estudado por três anos nessa instituição, sabemos de todas as suas dificuldades, que, aliás, são encontradas no ensino público como um todo, mas também somos conhecedores do empenho da direção e de alguns professores (incluindo, pelo menos enquanto éramos alunos, a professora abaixo citada) em reverter todos os problemas. Não estaria errado aquele que imaginasse uma certa carência de recursos nesta escola, principalmente no que diz respeito a aparelhos eletrônicos, como data-shows, microcomputadores, etc. No entanto, cremos que isso não se repete em relação aos livros. Observando a instituição com o olhar de quem estuda a literatura, percebemos que ela não está tão distante de ser um ambiente propício à difusão da leitura. Segundo dados presentes em Soares & Lima (2007), a escola possuía, naquele ano, um acervo superior a trezentos e cinqüenta títulos, somente no que se refere a obras literárias em sua biblioteca. Há, inclusive, livros teóricos de autores indispensáveis para o curso de Letras, como Bakthin. Grande parte deste acervo foi adquirido nos últimos cinco anos, como parte do Projeto Alvorada, do Governo do estado. Ora, se por um lado, a carência de recursos eletrônico-midiáticos é um empecilho a uma tentativa de aula mais dinâmica, mais interessante e até mesmo mais participativa, a presença maciça de obras literárias não tem ajudado a aumentar a frequência de leitura. Muito pelo contrário, apesar dos esforços da direção em conseguir funcionários para manter a biblioteca aberta nos três turnos, são poucas as vezes em que os livros são solicitados. Muitos professores jamais requisitaram empréstimos, seja diretamente na biblioteca, seja indicando a seus alunos. Pudemos perceber durante o período de observação que a professora A. C. (doravante P) realizou aulas de leitura, utilizando apenas os textos do livro didático como objeto de trabalho. Esse trabalho era sempre realizado em três etapas: ler o texto que estava no livro fazendo breves comentários, pedir para os alunos fazerem o exercício também proposto no livro didático e corrigir essas atividades. Notou-se, porém, que os alunos tinham determinada dificuldade em compreender a diferença Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 24 entre os textos “comuns”, não literários, de circulação cotidiana colocados no livro (artigos, reportagens, resenhas, etc.) e os textos ditos literários (poemas, contos, trechos de romances), uma vez que ambos os casos eram representados com a mesma tipologia pelo livro: leitura. Percebemos também uma profunda e até bem intencionada tentativa por parte da professora em mostrar-lhes essa diferença. Todavia, os termos utilizados, bem como o método não satisfizeram a curiosidade dos alunos. A respeito disso, gostaríamos de transcrever um trecho de conversa entre dois alunos que estavam sentados próximos a nós. Pela importânciaque demos aos comentários, não pensamos duas vezes antes de abrirmos a agenda e transcrever um trecho dos mesmos: A. 1 - Essa aula é de literatura? A. 2 - É, eu acho que é, a professora não falou?! A. 1 - Mas eu nunca entendo o que é literatura. Tu sabe isso. A. 2 - Mulher... É essas história, esses textos que têm uma história. A. 1 - Ah, poesia também é história? A. 2 - Poesia fala de amor, menina, de coisa bonita, essas histórias as vezes conta uns negócios ruins... A. 1 - Mas naquele dia, ela disse que o texto não era de literatura, tu lembra? A. 2 - Quando? A. 1 - Naquele, que ela leu aquele negócio do jornal. (...) Percebe-se claramente a dificuldade dos alunos em compreender a diferença entre os diferentes tipos de texto bem como distinguir as características básicas de cada gênero literário. Dizer que poesia fala de amor ou coisas bonitas, mostra que a aluna em questão não tem o conhecimento devido sobre literatura, uma vez que os temas não determinam os gêneros, mas, no máximo, o modo como o autor vai organizar seu texto, escolher as palavras corretas, etc., para satisfazer as suas intenções. Além disso, Augusto dos Anjos, Baudelaire, Álvares de Azevedo, e muitos outros poetas falaram em seus poemas de temas muito distintos do amor (o que dizer dos concretistas, que praticamente eliminaram “o que dizer”?). Ora, não se espera que um aluno que esteja cursando o oitavo ano do ensino fundamental já saiba discorrer com maturidade acerca do fenômeno literário em suas diversas faces, nem pretend333emos que as aulas de literatura busquem esse fim, todavia, acreditamos ser possível, desde este período, apresentar aos alunos uma noção básica do que Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 25 seja literatura, suas principais características, bem como torná-los capazes de identificarem diferenças entre textos (capacidade esta que extrapola o âmbito da literatura, abrangendo todos os gêneros textuais). Refletindo sobre a realidade observada Cabe-nos nesse momento, baseados nessas observações, tentarmos dar a esses alunos a nossa contribuição, dentro daquilo que julgamos ser o método, senão ideal, pelo menos mais satisfatório que o apresentado acima (e colocá-las em prática). De certa forma, o ensino de literatura, na educação básica, tem-se apresentado como uma prática totalmente aquém da realidade que reveste o fenômeno literário. O que pretendemos é que se busque, desde cedo, dar ao aluno a noção exata do que seja literatura, ou pelo menos não lhe dêem a noção errada. Talvez, as alunos acima citadas, só tenham visto em sua vida escolar poemas com temas amorosos, ou quem sabe, alguns professores não tenham lhes “ensinado” tal coisa, fazemos esta observação por experiência própria (relembrando os tempos de aluno, e tendo percebido o quanto é difícil desfazer certos “mitos” que os alunos trazem - muitas vezes até o final do ensino médio). A ineficácia do ensino de leitura soma-se à má observação dos textos literários, formando assim, um imenso problema, que culmina no último ano de escolarização do aluno, ou seja, o terceiro do ensino médio. É nesse período que o aluno se vê diante de uma imensidade de textos literários para ler em um curtíssimo tempo e sem o conhecimento necessário. Talvez, se começarmos desde o ensino fundamental a mostrar alguns conceitos e características aos alunos, eles possam compreender o quanto antes as características que revestem a literatura. Assim, chegarão no ensino médio prontos para três anos de contato mais aprofundado com esses textos, já tendo uma breve noção daquilo que estão vendo em seus livros e cadernos. Acreditamos que a linguagem literária possui elementos formais e estilísticos que a diferem das demais formas de expressão verbal. A respeito disso, concordamos com Amora (2006), quando este afirma que a literatura é “um conhecimento individual e intuitivo da realidade” (p. 51) e que este conhecimento se faz de uma forma “profunda e original” (p. 53). Outra característica é que tal conhecimento é “mais rico e variado” que o dos “homens comuns” (p. 54). Assim, se cada escritor possui um modo de escrever sobre determinado tema, vários são os modos de analisar estes diferentes textos. Além disso, todos os gêneros literários possuem suas próprias características, sendo, portanto, classificáveis e analisáveis de acordo com essas características. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 26 Voltamos a insistir que não se espera que no oitavo ano os alunos já aprendam todas essas características, no entanto, devemos já nessa época, apresentar aqueles pontos que são mais básicos e fundamentais. É na explicitação dessas características que residiu o nosso objetivo principal. Nossa intervenção tentou, portanto, levar aos alunos textos literários e não-literários (porém, nos detendo bem mais na análise dos literários) e apresentar as características dos primeiros que os diferem dos segundos, vendo nessas características as intencionalidades e a essência dos primeiros que os distinguem dos segundos, ou seja, os elementos que os tornam literários. Uma “nova noção”: a literatura vista como uma arte Nossa intervenção foi realizada em três aulas, nos dias 21 (duas aulas) e 22 (uma aula) de Julho de 2008. Idealizamos um modelo de aula que abrangesse os dois principais gêneros literários, ou seja, poesia e prosa, mostrando as especificidades de cada um. Cada um desses gêneros seria estudado de acordo com suas características próprias, e em seguida, já dando uma noção básica do que seria literatura para o aluno, mostrar-lhe porque aquele tipo de manifestação lingüística é diferente das demais. Além disso, sabemos (mais uma vez por experiência própria) que dificilmente um aluno no ensino fundamental tem uma visão positiva da literatura. Inúmeros são os motivos que contribuem para tal situação (basta, para citar apenas um, lembrarmos o modo muitas vezes normatizante e desmotivador que alguns livros didáticos utilizam para apresentar este tipo de texto), requisitando que o professor tenha um pouco de habilidade para vencer essa barreira de medo, desconfiança e, muitas vezes, de ódio. Habilidade, neste caso, vem a ser um termo que pressupõe reflexão acerca da prática pedagógica que se está levando para a sala de aula. É neste momento que lembramos dos postulados de Alarcão (2004), que aborda a questão do professor reflexivo, ou seja, um professor que saiba adaptar suas aulas às necessidades de cada aluno. Aliado a isto tudo, estava o meu conhecimento com relação aos comentários nada animadores que ouvia enquanto estava “infiltrado” entre os alunos. É nesse momento que o professor tem conhecimento (e como seria bom que todos os professores tivessem esta oportunidade!) da opinião dos alunos com relação a cada aula, cada assunto. Com certeza, não era muito animadora a opinião deles com relação à literatura, mas isto não nos desanimou. O que fazer então, para lidar com esse tipo de situação? Durante o período de reflexão, chegamos à conclusão de que seria importantíssimo levar os alunos a Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 27 perceberem que sua visão acerca da literatura estava equivocada.A literatura não é um monte de textos chatos, com linguagem dificílima, ambientados numa época em que nem sonhávamos existir, tratando de temas caretas. A literatura, como expressão artística inteiramente determinada pelo contexto social em que está inserida, nada mais faz que refletir esse contexto. Ora, a literatura não morreu na primeira metade do século XX, conforme alguns livros parecem querer ensinar. Nesse momento, existem vários escritores, escrevendo textos que se encaixam perfeitamente com o contexto social em que estamos vivendo. Há textos com temáticas recorrentes, há textos com críticas sociais atuais, há textos para todos os públicos. Acreditamos que os alunos do ensino fundamental deveriam entrar, primeiramente, em contato com esses textos, textos que refletem seus problemas, seus êxitos, suas necessidades, suas dúvidas, suas curiosidades... Ao contato com esses textos, se aliaria seu estudo detalhado, não um estudo (e será que isso seria estudo?) voltado para características meramente formais, recortes de trechos, características de escolas, da obra como um todo, sem se deter na análise mais detida de um texto, etc. Aqui, independentemente desses fatores, proporcionaríamos um contato mais íntimo com texto e suas especificidades. Aquele estudo de escolas literárias, seguindo uma ordem cronológica, etc., se precisa realmente ser feito, só seria no ensino médio. Neste período inicial, bastaria ao aluno o contato com os textos, conhecendo a literatura, ganhando interesse pela mesma. Pensamos numa intervenção que buscasse justamente apresentar para os alunos a literatura como um tipo de expressão artística, porém, que despertasse neles o interesse pela mesma, modificando assim, sua visão sobre esse tipo de texto. Escolhemos para nossa intervenção dois textos que julgamos interessar aquele público, formado por estudantes que estão entrando na adolescência. O primeiro texto trabalhado, apresentado a seguir, foi uma poesia de Fernando pessoa, que tinha como temática o amor (ou pelo menos uma crítica a ele). Pensamos que, nesta idade (entre 13 e 16 anos), tal temática interesse muito os adolescentes. Todavia, no poema, o “eu- lirico” deseja tornar-se uma pessoa livre de sentimentos, uma vez que na sua opinião, tanto o amor como o ódio oprimem. Nossa intenção foi promover um debate sobre a opinião dos alunos com relação ao tema do poema na primeira parte do estudo, e depois, fazer uma análise do mesmo. O outro texto, uma crônica de Luiz Fernando Veríssimo, tratava, com humor, da questão da corrupção no Brasil. Abaixo, transcreveremos os dois textos. Texto 1: (Ricardo Reis – Fernando Pessoa) Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 28 Não só quem nos odeia ou nos inveja Nos limita e oprime; quem nos ama Não menos nos limita. Que os deuses me concedam que, despido De afetos, tenha a fria liberdade Dos píncaros sem nada. Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada É livre; quem não tem, e não deseja, Homem é igual aos deuses. Texto 2: Hábito Nacional (Luis Fernando Veríssimo) Por uma destas coincidências fatais, várias personalidades brasileiras, entre civis e militares, estão no avião que começa a cair. Não há possibilidade de se salvarem. O avião se espatifou - e, levando-se em consideração o caráter dos seus passageiros, “espatifar” é o termo apropriado - no chão. Nos poucos instantes que lhes restam de vida, todos rezam, confessam seus pecados, em versões resumidas, e entregam sua alma à providência divina. O avião se espatifa no chão. São Pedro os recebe de cara amarrada. O porta-voz do grupo se adianta e, já esperando o pior, começa a explicar quem são e de onde vêm. São Pedro interrompe com um gesto irritado. - Eu sei, eu sei. Aponta para uns formulários em cima de sua mesa e diz: - Recebemos suas confissões e seus pedidos de clemência e entrada no céu. O Porta-voz engole em seco e pergunta: - E… então? São Pedro não responde. Olha em torno, examinando a cara dos suplicantes. Aponta para cada um e pede que se identifiquem pelo crime: - Torturador. - Minha financeira estourou. Enganei milhares. Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 29 - Corrupto. Menti para o povo. - Sabe a bomba, aquela? Fui o responsável. - Roubei. - Me locupletei. - Matei. Etcétera. São Pedro sacode a cabeça. Diz: - Seus requerimentos passaram pela Comissão de Perdão e foram rejeitados por unanimidade. Passaram pelo Painel de Admissões, uma mera formalidade, e foram rejeitados por unanimidade. Mas como nós, mais que ninguém, termos que ser justos, para dar o exemplo, examinamos os requerimentos também na Câmara Alta, da qual eu faço parte. Uma maioria esmagadora votou contra. Houve só um voto a favor. infelizmente, era o voto mais importante. - Você quer dizer… - É. Ele. Neste caso, anulam-se todos os pareceres em contrário e prevalece a vontade soberana d’Ele. Isto aqui ainda é o Reino dos Céus. - E nós podemos entrar? São Pedro suspira. - Podem. Se dependesse de mim, iam direto para o Inferno. Mas… Todos entram pelo Portão do Paraíso, dando risadas e se congratulando. Um querubim que assistia à cena vem pedir explicações a São Pedro. - Mas como é que o Todo-Poderoso não castiga essa gente? E São pedro, desanimado: - Sabe como é, Brasileiro… Os dois textos foram trabalhados na mesma aula, que, à medida que foi se desenvolvendo, satisfez nossas expectativas e até as superou, uma vez que os alunos participaram bastante das discussões dos dois textos. O primeiro texto (Veríssimo, 2001) causou enorme debate, uma vez que cada pessoa tinha uma “história” amorosa para contar (decepções, intrigas, mentiras). Mostramos para os alunos, que aquela não era uma temática romântica, ou pelo menos não se encaixava nos moldes de romantismo conhecidos por eles. Comentamos os prováveis motivos de tal escolha do autor, bem como a escolha de determinados termos e construções. Procuramos mostrar, nos aspectos formais, porque o poema é caracterizado como modernista. Atentamos para o uso de alguns verbos no início do poema, bem como para os adjetivos utilizados em alguns versos. Levamos os alunos a compreenderem que o modo como um “eu-lírico” ou um narrador adjetivam determinados acontecimentos ou seres determina o quanto tais acontecimentos ou seres o sensibilizaram. E os verbos Denise Lino de Araújo e Ludmila Kemiac (Orgs). Professores com a mão na massa: relatos de experiência de ensino de Língua Portuguesa e de Literatura Livro CD, produzido pelo PET LETRAS UFCG, com apoio da EDUFCG, UAL, CH. 30 de teor semântico negativo utilizados na primeira estrofe? E a posição do amor com o ódio? Ou seria comparação? E o porquê de certas comparações e metáforas no final do poema. Pouco a pouco, os alunos foram entendendo os aspectos trabalhados e passaram a participar da aula, mostrar características que achavam que não estariam presentes em um texto comum (no entanto, propositadamente ainda não tínhamos mostrado nenhum texto “comum” aos alunos). O segundo texto – a crônica - (Pessoa) também causou um debate no início da abordagem. Chamamos a atenção para a extrema atemporalidade do texto, que pode ser lido daqui a um século, provavelmente, com o mesmo efeito humorístico e crítico. Pouco a pouco fomos mostrando as características lingüísticas
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