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Correlação entre obsessão e religiosidade.

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A semelhança existente entre a obsessão e a religiosidade não é apenas 
superficial, pois o insight da origem do cerimonial neurótico pode nos estimular 
a estabelecer deduções sobre os processos psicológicos da vida religiosa. 
Tanto nos atos obsessivos, quanto na religião, o indivíduo veda algumas 
coisas a si mesmo, enquanto outras são permitidas apenas após a realização 
de um determinado cerimonial. OBSESSÃO: Só posso dormir depois de 
organizar o quarto de uma determinada maneira. RELIGIÃO: Sexo somente 
após o casamento. 
As semelhanças entre cerimoniais neuróticos e atos sagrados religiosos são: 
 A negligência desses cerimoniais gera culpa ou escrúpulos de 
consciência; Na completa exclusão de todos os outros atos (revelada na 
proibição de interrupções); 
 E na extrema consciência com que são executados em todas as 
minúcias. 
As diferenças são óbvias, e algumas tão gritantes que tornam qualquer 
comparação um sacrilégio: 
 A grande diversidade individual dos atos cerimoniais [neuróticos] em 
oposição ao caráter estereotipado dos rituais (as orações, o curvar-se 
para o leste, etc.); 
 O caráter privado dos primeiros em oposição ao caráter público e 
comunitário das práticas religiosas; 
 Enquanto todas as minúcias do cerimonial religioso são significativas e 
possuem um sentido simbólico, as dos neuróticos parecem tolas e 
absurdas. 
Tanto nos atos obsessivos, quanto na religiosidade, os indivíduos não 
possuem conhecimento do significado de seus atos e cerimoniais. Enquanto o 
indivíduo obsessivo não entende o porque, o indivíduo religioso não busca 
saber o porque, mesmo tendo capacidade e condições para a obtenção dessas 
informações. O indivíduo obsessivo só conseguirá respostas se realizar 
psicoterapia. 
“Para os crentes, entretanto, os motivos que os impele às práticas 
religiosas são desconhecidos ou estão representados na 
consciência por outros que são desenvolvidos em seu lugar.” 
Enquanto o indivíduo obsessivo que sofre de compulsões e proibições 
comporta-se como se estivesse dominado por um sentimento de culpa, um 
sentimento inconsciente de culpa. Esse sentimento de culpa dos neuróticos 
corresponde à crença dos religiosos de serem apenas miseráveis pecadores; e 
as práticas devotas (orações, invocações) com que ele precedem cada ato 
cotidiano, especialmente os empreendimentos não habituais, parecem ter o 
valor de medidas protetoras ou de defesa. 
Enquanto nos atos obsessivos, há sempre a repressão de um impulso 
instintual (um componente do instinto sexual). A formação de uma religião 
parece basear-se igualmente na repressão, na renúncia de certos impulsos 
instintuais. Entretanto, esses impulsos não são componentes exclusivamente 
do instinto sexual (como no caso das neuroses); são instintos egoístas, 
socialmente perigosos, embora geralmente abriguem um componente sexual. 
Afinal, o sentimento de culpa resultante de uma tentação contínua, e a 
ansiedade expectante sob a forma de temor da punição divina nos são 
familiares há mais tempo no campo da religião do que no da neurose. 
As recaídas totais no “pecado” são mais comuns entre os indivíduos 
piedosos do que entre os neuróticos, originando uma nova forma de atividade 
religiosa: os atos de penitência, que têm seu correlato na neurose obsessiva. 
O simbolismo dos atos obsessivos resultam de um deslocamento, da 
substituição do elemento real e importante por um trivial – por exemplo, do 
marido pela cadeira. No campo religioso existe uma tendência para o 
deslocamento de valores psíquicos, de forma que os cerimoniais triviais da 
prática religiosa adquirem um caráter essencial, tomando o lugar dos 
pensamentos fundamentais. Por isso é que as religiões sofrem reformas de 
caráter retroativo, que visam restabelecer o equilíbrio original dos valores. 
O caráter tranquilizador que os atos obsessivos possuem não é tão 
evidente nas práticas religiosas. Nelas, descobrimos esse aspecto das 
neuroses quando lembramos a frequência com que são cometidos, justamente 
em nome da religião e aparentemente por sua causa, todos os atos proibidos 
pela mesma – ou seja, as expressões dos instintos por ela reprimidos. 
Freud descreve a neurose como uma religiosidade individual e a religião 
como uma neurose obsessiva universal. 
A semelhança entre os dois reside em recusar implicitamente, a ativação 
dos instintos existentes. E a diferença, na natureza desses instintos, que na 
neurose são exclusivamente sexuais em sua origem, enquanto na religião são 
de fontes egoístas.

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