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22 Do pagamento em consignação

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Do Adimplemento e Extinção das Obrigações 
Pagamentos Especiais 
	Pagamento, como já dito, significa cumprimento ou adimplemento da obrigação e pode ser direto ou indireto. Trata-se do principal meio de extinção das obrigações.
	Ao lado do pagamento direto há, porém, outras formas, que podem ser chamadas de pagamentos especiais. Alguns deles são tachados de pagamento indireto, como o pagamento em consignação, por ser efetuado mediante depósito judicial ou bancário, e não diretamente ao credor.
“Podemos chamar de pagamentos especiais, além do pagamento em consignação, que é modo indireto de pagamento, o pagamento com sub-rogação, a imputação do pagamento e a dação em pagamento.” 
Consignação
⌘ Conceito de pagamento em consignação:
	Consiste no depósito, pelo devedor, da coisa devida, com o objetivo de liberar-se da obrigação. 
	É meio indireto de pagamento ou pagamento especial.
	O sujeito passivo da obrigação tem não apenas o dever de pagar mas também o direito de pagar. 
	Se não for possível realizar o pagamento diretamente ao credor, em razão de recusa injustificada deste em receber ou de alguma outra circunstância, poderá, o devedor, valer-se da consignação em pagamento para não sofrer as consequências da mora. P. ex.: O locatário a quem o credor recusou o recebimento do aluguel por discordar do valor ofertado, tem interesse em não incorrer em mora e em não deixar acumular as prestações para não correr o risco de sofrer uma ação de despejo.
Dispõe o art. 334 do CC:
“Considera-se pagamento, e extingue a obrigação, o depósito judicial ou em estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma legais”.
	A consignação é instituto de direito material e de direito processual. Enquanto o CC menciona os fatos que autorizam a consignação. O CPC prevê o modo de fazê-la.
	Portanto, se o credor, sem justa causa, recusar-se a receber o pagamento em dinheiro, poderá o devedor optar pelo depósito extrajudicial, em estabelecimento bancário oficial, onde houver, ou pelo ajuizamento da ação de consignação em pagamento. Essa constitui modo de caracterização ou comprovação da mora accipiendi. Todavia, pode ela ser reconhecida também quando o devedor é cobrado judicialmente e argui a exceptio non adimpleti contractus, alegando que só estaria obrigado a pagar se o credor, antes, cumprisse a sua parte na avença. Comprovada essa situação, configurada estará a mora do credor.
“Embora a lei assegure ao devedor o direito de consignar a coisa devida, tal fato só pode ocorrer na forma e nos casos legais. Se não houver recusa do credor em receber ou outra causa legal, não pode aquele, sem motivo justificável, efetuar o depósito da prestação em vez de pagar diretamente ao credor. O depósito, nesse caso, será considerado insubsistente e a ação julgada improcedente.”
⌘ Objeto da consignação:
	O art. 334 do CC, ao falar em depósito judicial da “coisa devida”, permite a consignação não só de dinheiro como também de bens moveis ou imóveis.
	P. ex.: O credor que se recusar a receber a mobília encomendadas porque não está preparado para efetuar o pagamento convencionado dá ensejo ao marceneiro de consigná-la judicialmente. Também o imóvel pode ser consignado, depositando-se simbolicamente as chaves, como ocorre frequentemente nas rescisões de contratos de locação. 
	Por isso proclama a jurisprudência: “O direito material permite a consignação, tanto ao devedor de imóveis quanto de dinheiro, de quantidade de moveis, de coisa certa ou de coisa incerta”.
	O fato da consignação realizar-se por meio de um depósito limita a sua aplicação às obrigações de dar, podendo tomar a forma de entrega ou restituição. Constitui ela modo de extinção das obrigações inaplicáveis às prestações de fato.
Como acentua Sílvio Rodrigues - “Somente as obrigações de dar podem ser objeto de consignação, sendo mesmo absurdo imaginar o depósito de uma obrigação de fazer ou de não fazer.”
O CC distingue, dentre as obrigações de dar, as que concernem a objeto certo e individualizado das obrigações de dar coisa incerta ou genérica, em que a coisa é determinada apenas pelo gênero e quantidade, faltando, porém, definir a qualidade. Diz o art. 341 do CC:
“Se a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deve ser entregue no mesmo lugar onde está, poderá o devedor citar o credor para vir ou mandar recebê-la, sob pena de ser depositada.”
	Em se tratando de coisa indeterminada, incerta, faltando a escolha da qualidade e se esta competir ao credor, o devedor não será obrigado a permanecer aguardando indefinidamente que ela se realize. Preceitua o art. 342 do CC
“Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele citado para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada a coisa que o devedor escolher; feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á como no artigo antecedente”.
⌘ Fatos que autorizam a consignação:
	O art. 335 do CC apresenta um rol, não taxativo, dos casos que autorizam a consignação. Já outros são mencionados em artigos esparsos, como nos arts. 341 e 342, bem como em leis avulsas (Decreto-Lei n 58 de 10/12/1937. Art. 17 § único; Lei n. 492 de 30/08/1937, arts 19 e 21 III; e etc.).
	Os fatos que autorizam a consignação, previstos no mencionado art. 355 do CC, tem por fundamento:
A mora do credor (incs. I e II);
Circunstâncias inerentes à pessoa do credor que impedem o devedor de satisfazer a sua intenção de exonerar-se da obrigação (incs. III a V).
 Primeiro fato:
O primeiro fato que dá lugar à consignação (CC, art. 335, I) é “se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma”.
Trata-se de hipótese de mora do credor, em que só a recusa injusta, não fundada em motivo legítimo, a autoriza.
P. ex.: Se o locador não quiser receber o aluguel porque o inquilino não incluiu aumento autorizado por lei, não haverá lugar para a consignação. O motivo apresentado é injusto, pois ninguém é obrigado a receber menos do que lhe é devido. Se, no entanto, não houver base legal para o acréscimo pretendido, a consignação será procedente.
Observe-se que a consignação ainda terá lugar caso o credor concorde em receber o pagamento, mas recuse-se a fornecer o recibo de quitação ou caso não possa recebê-lo nem fornecê-lo, porque se trata de meio liberatório.
O caso em estudo contempla hipótese de dívida portable, em que o pagamento deve ser efetuado no domicílio do credor. É necessário que tenha havido oferta real, efetiva, incumbindo ao autor prová-la, bem como a recusa injustificada do credor. A este incumbe, ao contrário, o ônus de provar a existência de justa causa para a recusa.
 Segundo fato:
O segundo fato, mencionado no aludido art. 335 inc. II, é “se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos”.
Trata-se de dívida quérable (quesível), em que o pagamento deve efetuar-se fora do domicílio do credor, cabendo a este a iniciativa. Permanecendo inerte, faculta-se ao devedor consignar judicialmente a coisa devida ou extrajudicialmente a importância em dinheiro para liberar-se da obrigação.
Cuidando-se, na hipótese, “de dívida quesível, bastará ao autor alegar que o réu não foi, nem mandou buscar a prestação devida, no tempo, lugar e modo convencionados, caso em que competirá ao segundo o ônus de provar que diligenciou o recebimento”.
 Terceiro fato:
 
Em terceiro lugar, prevê o art. 335 inc. III, a hipótese de o credor ser “incapaz de receber” ou “desconhecido”, ter sido “declarado ausente” ou “residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil”.
O incapaz, em razão de sua condição, não deve receber o pagamento. A exigência da lei é que o devedor pague ao seu representante legal.
Para que se configure a hipótese de consignação, é necessário, pois, que, além de ser incapaz, o credor não tenha representante legal ou que, por algum motivo, o pagamento não possa ser efetuado a este (por inexistênciamomentânea, por ser desconhecido ou se recusar a recebê-lo sem justa causa, p.ex.). Nestes casos, a solução será consigná-lo.
Em geral, as obrigações são contraídas com pessoas conhecidas. Mas pode o accipiens, por fato posterior, tornar-se desconhecido, por exemplo, na hipótese de sucessão decorrente da morte do credor originário ou da transferência de título ao portador.
Ausente é a pessoa que desaparece de seu domicílio sem dar notícia de seu paradeiro nem deixar um representante ou procurador para administrar-lhe os bens (CC, art. 22). Como a ausência há de ser declarada por sentença, caso em que se lhe nomeará curador, dificilmente se caracterizará a hipótese descrita na lei, pois o pagamento pode ser feito ao referido representante legal do ausente, o qual dificilmente será desconhecido, podendo seu nome ser apurado no processo de declaração de ausência. 
A residência em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil constitui também circunstância que enseja a consignação, pois não se pode exigir que o devedor arrisque a vida para efetuar o pagamento.
 Quarto fato:
 
A quarta hipótese (CC, art. 335 inc. IV) apresenta-se quando ocorre “dúvida sobre quem deve legitimamente receber o objeto do pagamento”. 
Se dois credores mostram-se interessados em receber o pagamento, e havendo dúvida sobre quem tem direito a ele, cabe ao devedor valer-se da consignação para não correr o risco de pagar mal, requerendo a citação de ambos. É o caso, p.ex., de dois municípios que se jugam credores dos impostos devidos por determinada empresa, a qual tem estabelecimento em ambos.
Inexistindo a dúvida, será decretada a carência da consignatória, por falta de interesse para agir.
Comparecendo mais de um pretendente ao crédito, o devedor é excluído do processo, declarando-se extinta a obrigação. O processo prossegue entre os credores, para se apurar qual deles tem direito ao levantamento, descabendo reabrir-se a discussão sobre ser devido ou não o valor depositado.
Se aparecer apenas um pretendente, terá o direito de levantar a quantia depositada.
Não comparecendo nenhum, converter-se-á o depósito em arrecadação de bens de ausentes (CC, art. 898)
 Quinto fato:
Também pode ser consignado o pagamento “se pender litígio sobre o pagamento” (CC, art. 355 inc. V).
Estando o credor e terceiro a disputar em juízo o objeto do pagamento, não cabe ao devedor antecipar-se ao pronunciamento judicial e entregá-lo a um deles, assumindo o risco (CC, art. 344), mas, sim, consigná-lo judicialmente para ser levantado pelo que vencer a demanda. 
⌘ Requisitos de Validade da consignação:
	Para que a consignação tenha força de pagamento, preceitua o art. 366 do CC:
“Será mister concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento.”
	
 Em relação às pessoas ou requisitos subjetivos:
Deve o pagamento ser feito pelo devedor capaz e ao verdadeiro devedor, também capaz, ou seu representante, sob pena de não valer, salvo se ratificado por este ou se reverter em seu proveito (arts. 304 e s., 308 e 876 do CC)
A legitimidade ativa para a ação consignatória é conferida ao devedor, ao terceiro interessado no pagamento da dívida e também ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e à conta do devedor (CC, art. 304 e parágrafo único)
Quanto a legitimidade passiva, réu da ação consignatória será o credor capaz de exigir o pagamento ou quem alegue possuir tal qualidade, bem como o seu representante, uma vez que tem ela finalidade liberatória do débito e declaratória do crédito.
Deve ser proposta, por essa razão, contra quem tiver obrigação de receber e poder para exonerar o devedor.
Se essa pessoa for desconhecida, será citada por edital (CPC, art. 231, I), com a intervenção, em seu favor, de curador especial (CPC, art. 9, II).
 Quanto ao objeto ou Requisitos Objetivos:
Exige-se a integralidade do depósito, porque o credor não é obrigado a aceitar pagamento parcial.
Orienta-se a jurisprudência do STJ no sentido de que “impõe-se ao devedor, na consignatória, ao efetuar o depósito, fazê-lo com inclusão da correção monetária do período compreendido entre a data do vencimento da obrigação e a do efetivo depósito, sob pena de ser julgado improcedente o pedido”. Da mesma forma, ao principal devem ser acrescidos os juros de mora devidos até a data do depósito (CC, art. 337).
Se a hipótese consistir na entrega de coisa, deverá ela realizar-se juntamente com os respectivos acessórios, como os frutos ou produtos a que o credor tenha direito. Assim, p. ex., na entrega de ações, com dividendos já vencidos e pagos ou com bonificações já concedidas, não será suficiente para a procedência da ação a consignação somente dos títulos. Se tal ocorrer, poderá o credor alegar que o depósito não é integral (CPC, art. 896, IV).
 Modo:
 
Será o convencionado, não admitindo-se, por exemplo, pagamento em prestações quando estipulado que deve ser à vista.
 Tempo:
 
Deve ser, também, o fixado no contrato, não podendo o pagamento efetuar-se antes de vencida a dívida, se assim foi convencionado.
Poderá ser efetuado pelo devedor, contudo, a qualquer tempo, se o prazo foi estipulado em seu favor (CC, art. 133), ou assim que se verificar a condição a que o débito estava subordinado (CC, art. 332).
A mora do devedor, por si só, não impede a propositura da ação consignatória, se ainda não provocou consequências irreversíveis e o pagamento ainda é útil ao credor, pois tal ação pode ser utilizada tanto para prevenir como para emendar a mora. Assim, se, “apesar do protesto de cambial representativa de prestação, a credora não rescindiu o pacto e nem executou o débito, nada obsta que a alegada recusa das prestações seguintes permita a utilização da consignatória.”
⌘ Levantamento do Depósito:
	Dispõe o art. 338 do CC que:
“Enquanto o credor não declarar que aceita o depósito, ou não impugnar, poderá o devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas despesas, e substituindo a obrigação para todas as consequências.”
	Desse modo, se o credor ainda não foi citado ou se, citado, não impugnou a oferta, deixando de oferecer resistência ao pedido, pode o devedor levantar a prestação consignada, tornando ineficaz a oblação feita. Arcará ele, nesse caso, com as consequências jurídicas de sua retratação, pois permanecerá respondendo pelos juros da dívida e pelos riscos da coisa até que ocorra a tradição, bem como pelas despesas do depósito, pois a obrigação subsiste integralmente.
	Se, em vez de contestar a ação, o credor aceita o depósito, “o devedor já não poderá levantá-lo, embora o credor consinta, senão de acordo com os outros devedores e fiadores” (CC, art. 339).
	A declaração de procedência do depósito acarreta a extinção da obrigação a que estava adstrito o devedor, com eficácia de pagamento, e, em consequência, a exoneração dos fiadores e codevedores.
	O dispositivo trata da impossibilidade de levantamento do objeto depositado depois de julgado procedente o pedido, mesmo havendo anuência do credor, quando existirem outros devedores e fiadores.
	Procura-se, dessa forma, resguardar os direitos destes, pois a procedência da ação extingue a obrigação, acarretando a exoneração dos devedores solidários.
	Se estes, no entanto, concordarem com o levantamento, deixará de existir o impedimento legal. 
	O consentimento posterior do credor com a pretensão do devedor de levantar o depósito não tem forca para restaurar a dívida extinta, mas faz surgir uma outra obrigação, que pode ser uma doação ou outro negócio.
	A esta nova obrigação não estão jungidos os que, vinculados à anterior, não assentiram em se comprometer novamente.
 
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