Prévia do material em texto
MÓDULO 2: AMEBÍASE E GIARDÍASE COORDENADORES: Prof. João Carlos de Aquino Almeida Profª. Adriana Jardim de Almeida TUTORAS: Leide Laura Figueiredo Maciel Andreza Linhares Thaís Wolino PROTOZOÁRIOS ENTÉRICOS: 1. Amebíase: A amebíase é uma doença de distribuição ubiquitária, de caráter zoonótico, causada por uma das amebas que parasitam frequentemente o homem: a Entamoeba histolytica. A palavra amebíase costuma ser utilizada para designar a presença desse protozoário no organismo de qualquer hospedeiro vertebrado, com ou sem manifestações clínicas. Sua importância decorre da ampla distribuição geográfica e da alta incidência, sobretudo nas regiões tropicais. 1.1. As amebas patogênicas: As amebas são protozoários que se movem de uma maneira típica, ou seja, emitindo pseudópodos que são processos citoplasmáticos lançados pela periferia do seu corpo. Além da locomoção, os pseudópodos são utilizados para a incorporação de alimentos para o interior do organismo; as amebas englobam (fagocitam) o alimento antes de incorporá-lo. Estudando a classificação sistemática das amebas, consta-se que em uma única família há quatro gêneros parasitos do homem. Trata-se dos gêneros: Entamoeba, Iodamoeba, Endolimax e Dientamoeba. No entanto, apenas a primeira citada na relação, a seguir, é patogênica e as demais são comensais do intestino: Entamoeba histolystica, Entamoeba hartmanni, Entamoeba coli, Entamoeba gingivalis, Endolimax nana, Iodamoeba butschlii e Dientamoeba fragilis. Morfologia da Entamoeba histolytica: Considerando que este protozoário apresenta-se sob duas formas, a invasiva e a não- invasiva, deve-se levar em conta cada uma das duas formas para estudar bem a sua morfologia. A forma invasiva é virulenta, patogênica e hematófaga. As formas invasivas de tecido são as mais ativas do desenvolvimento da E. histolystica. Atingem diâmetros variáveis de 20 a 30µ, sendo espécimes maiores que os citados, uma raridade parasitária, encontrados somente em casos de disenteria amebiana aguda, bem como parasitando órgãos. Geralmente, apresentam um só e nítido núcleo que, ao ser corado para observação microscópica, é quase imperceptível nos exames parasitológicos. A fagocitose é uma das características mais marcantes dessa espécie de ameba representada pela atividade na formação de longos pseudópodos, que aparecem de maneira quase instantânea quando lançados em direção ao alimento. Ao se degenerar, a forma invasiva apresenta movimentos bem menos ativos nas fezes, até cessarem por completo. O que caracteriza a forma invasora é a presença de eritrócitos intracelulares, consequência do hábito hematófago. Tais amebas com hemácias inclusas podem ser encontradas eventualmente nas fezes, nas quais frequentemente não se percebe sangue ou qualquer outra anormalidade. A maioria dos pesquisadores acredita que a forma trofozoíta invasiva não se encista. Na fase não-invasiva, os trofozoítos representam a fase normal da vida vegetativa ou trofozoíta desses protozoários. Vivem na condição de comensais e não apresentam hematofagismo, portanto, não são patogênicos. Estão aderidos a superfície da mucosa do intestino grosso, nutrindo- se por fagocitose, de amido, bactérias e muco. Diferem das formas invasivas por não apresentarem dimensões mais avantajadas e não mostrarem hemácias em seu protoplasma. Antes de se encistar, a forma invasiva de E. histolytica perde a sua mobilidade, expulsa o material fagocitado e toma forma oval ou esférica. Os cistos da E. histolytica apresentam-se à fresco, como corpúsculos hialinos, geralmente de diâmetro entre 10 e 20µ, e esféricos. Inicialmente mononucleados, tornam-se binucleados por divisões sucessivas e, finalmente, tetranucleados, que são a forma infectante do ser humano. 1.2. O ciclo das amebas: As amebas intestinais apresentam um ciclo relativamente simples (Figura 1). A infecção começa com a ingestão de formas resistentes – os cistos – geralmente com água e alimentos contaminados por fezes de indivíduos portadores de E. histolytica. O desencistamento tem lugar no intestino delgado do novo hospedeiro. De cada cisto tetranucleado formam-se oito pequenas amebas com um só núcleo (estádio ou fase metacística) que se alimentam e crescem na luz intestinal para alcançarem a fase trofozoítica. As amebas maduras são maiores que as metacísticas e muito ativas. Fagocitam bactérias e outras partículas nutritivas do meio e podem multiplicar-se indefinidamente na luz do intestino grosso. Mas, em algum momento, as formas trofozoíticas reduzem a sua atividade, deixam de emitir pseodópodes, fagocitar e formar vacúolos digestivos, diminuem de tamanho, e se arredondam para constituir a forma pré-cística. Em torno das amebas pré-císticas é segregado um envoltório resistente: a parede cística. No citoplasma aparecem inclusões especiais (os corpos cromatóides e os vacúolos de glicogênio) e o núcleo divide-se duas vezes, voltando a formar cistos típicos com quatro núcleos, capazes de resistir às condições do meio exterior e propagar-se. A E. histolytica tem a capacidade de invadir a mucosa intestinal e colonizar os tecidos do hospedeiro, produzindo aí formas trofozoíticas maiores que as encontradas na cavidade intestinal. Estas amebas grandes e invasivas constituem a forma magna de E. histolytica. O parasito desenvolve então um ciclo patogênico, alimentando-se de hemácias, células ou fragmentos celulares multiplicando-se por divisão binária, mas sem produzir cistos. O ciclo não patogênico, na luz do intestino grosso, e o ciclo patogênico, que se realiza nos tecidos da parede intestinal, do fígado e de outros órgãos, podem ocorrer simultaneamente ou não. Dependendo da fase em que se encontre, ou da circunstância de realizar um ciclo não patogênico ou patogênico, a E. histolytica pode habitar distintos meios: a) A fase cística desenvolve-se em fezes formadas e, expulsa com estas para o exterior, permanece no solo e na água durante algum tempo; b) Ao desincistar-se e durante o seu ciclo apatogênico (forma pequena ou “minuta” do parasito) vive na luz do intestino; c) Os tecidos invadidos pela variedade patogênica (forma “magna”) são principalmente, as paredes intestinais: mucosa e submucosa do ceco, do reto, do sigmoide e outras porções do intestino grosso; mais raramente o delgado (íleo), o fígado, os pulmões e a pleura, o cérebro e pele. Figura 1: Ciclo biológico da Entamoeba histolytica. Fonte: Adaptado de www.cdc.gov 1.3. Sintomas e sinais clínicos: A amebíase pode atingir todos os grupos etários e etnias, sendo os adultos os mais acometidos. Apesar de ser comumente assintomática, pode determinar diarreia, flatulência, dor no trajeto cólico e disenteria, denominada colite amebiana. Esse protozoário também pode causar comprometimento extraintestinal, por meio de disseminação hematogênica, e evoluir para um quadro de abcesso hepático, cerebral e meningoencefalite. Podemos resumir a sintomatologia nos seguintes pontos: a) Colite não disentérica: É a forma mais encontrada na amebíase, cujas manifestações são diarreia com quatro ou cinco evacuações por dia. Espontaneamente, altera-se o quadro para a cura, ou via de regra, com o uso de antiespasmódicos. O paciente pode apresentar queixas de cólicas abdominais, anorexia, náuseas, tenesmo (uma sensação dolorosa na bexiga ou na região anal, com desejo contínuo, mas quase inútil, de urinar ou de evacuar) e vômitos. b) Colite disentérica: Anteriormente era denominada de amebíase aguda. O quadro clínico agrava-se por três dias, com a presença de dores abdominais,evacuações pio-mucosanguinolentas em número elevado, vômitos, tenesmo e febre. A enterorragia pode ser de forma grave, simulando colite ulcerativa e até casos extremos fatais. O diagnóstico de Entamoeba histolytica é baseado no exame fresco de fezes, buscando os trofozoítas nas fezes liquefeitas. As formas císticas podem ser encontradas por outras técnicas habituais, nas fezes formadas. O protozoário tende a se alojar no muco e, muitas vezes, é encontrado englobando hemácias. 2. Giardíase: É uma infecção intestinal causada pelo protozoário flagelado Giardia duodenalis. Ele pode se apresentar em forma de cisto ou trofozoíto, sendo que a primeira é a responsável por causar diarreia crônica com cheiro forte, fraqueza e cólicas abdominais no hospedeiro (cão, gato, gado, roedores, ser humano, dentre outros), graças às toxinas que libera. Essas manifestações podem gerar um quadro de deficiência vitamínica e mineral e, em crianças, pode causar a morte, caso não sejam tratadas. Ocorre em todo o mundo, mas é mais frequente em regiões onde as condições sanitárias e de higiene são precárias. 2.1. Espécies patogênicas: Giardia duodenalis (sinonímia: G. lamblia) é um pequeno protozoário, flagelado que durante o seu ciclo vital apresenta duas formas: trofozoítas e cistos. A forma trofozoíta mede cerca de 12 a 15µ de comprimento por 6 a 8µ de largura, tem simetria bilateral e contorno piriforme, quando vista de face. O corpo bastante deformável, mostra um achatamento dorsoventral. Na superfície ventral há uma área ovóide que constitui um disco adesivo ou disco suctorial, que ocupa dois terços dessa face; ele é sustentado internamente por placas estriadas e circunscrito externamente por um delicado rebordo. Outras descrições do parasito atribuem-lhe a forma de um cone oblíquo, fortemente inclinado, estando a base representada pelo disco suctorial. No interior do citoplasma, as estruturas são quase sempre duplas e simétricas e compreendem: um par de núcleos, cada qual tendo um cariossomo central, mas sem cromatina periférica; e dois feixes de fibras longitudinais – os axóstilos- que se iniciam junto a oito blefaroplastos e se continuam com os flagelos posteriores. Os flagelos formam pares. Os trofozoítas vivem no duodeno e nas primeiras porções do jejuno, sendo por vezes encontrados nos condutos biliares e na vesícula biliar. A atividade dos flagelos imprime-lhes um deslocamento rápido e irregular, como que às sacudidas. Porém, aderem em grande número à superfície da mucosa, graças ao disco suctorial que possuem, chegando a formar um revestimento extenso a tal ponto que, segundo alguns autores, seria capaz de interferir na absorção de gorduras e vitaminas lipossolúveis, especialmente a vitamina A. Nas evacuações liquidas os trofozoítas aparecem em grande número, porém em fezes formadas predominam os cistos. Centenas de milhões ou bilhões de cistos podem ser eliminados diariamente em um individuo infectado. Ao encistar-se o trofozoíta torna-se globoso, desaparece o disco ventral e o parasito como que se enrola sobre si mesmo; os flagelos tornam-se intracitoplasmáticos. Forma-se uma membrana cística fina, porém bem destacada do citoplasma, e os dois núcleos dividem-se para constituir quatro núcleos filhos. Os cistos são elipsoides ou ovoides e medem cerca de 12 µ de comprimento. Possuem estruturas internas duplicadas em relação aos trofozoítas, isto é, quatro núcleos pequenos, aproximadamente circulares e com cariossomo central, axostilos e corpos parabasais. A disposição, entretanto, pode ser irregular, estando ora quatro núcleos agrupados perto de um dos pólos, ora divididos entre dois extremos. Na água, os cistos podem conservar sua vitalidade durante dois meses ou mais. 2.2. O ciclo evolutivo: O ciclo vital da Giardia é composto de dois estágios: trofozoítos e cistos (Figura 2). A Giardia infecta os seres humanos após a ingestão de 10 a 100 cistos. Os cistos ingeridos que medem de 8 a 10 µ, produzem cada um dois trofozoítos no duodeno. Após saírem os cistos, os trofozoítos colonizam a luz do duodeno e jejuno proximal onde se ligam à borda em escova das células epiteliais do intestino delgado e se multiplicam por divisão binária. O corpo do trofozoíta tem formato de uma lágrima, medindo de 10 a 20 micrômetros de comprimentos e 5 a 15 µ de largura. Os trofozoítas da Giardia contem dois núcleos ovais anteriormente, um disco ventral grande, um corpo mediano curvado posteriormente e quatro pares de flagelos. À medida que os trofozoítas que se descolam caminham caudalmente ao longo do trato intestinal, se transformam em cistos ovais que contém quatro núcleos. Os cistos são eliminados nas fezes dos indivíduos infectados e podem permanecer viáveis na água por dois meses. Sua viabilidade frequentemente não é afetada pelas concentrações usuais de cloro utilizadas para purificar a água para consumo humano. Figura 2: Ciclo biológico da Giardia lamblia. Fonte: Adaptado de www.cdc.gov 2.3. Sintomas e Sinais Clínicos: O período de incubação da infecção por Giardia é de uma ou duas semanas, mas pode ser prolongado. Um amplo espectro de manifestações clínicas ocorrem, dependendo da interação entre a Giardia lamblia e o hospedeiro. As crianças que são expostas a Giardia lamblia podem apresentam excreção assintomática do microrganismo, diarreia infecciosa aguda ou diarreia crônica com sinais e sintomas persistentes do trato gastrointestinal, incluindo déficit de crescimento. A maioria das infecções tanto em crianças quanto em adultos é assintomática. Geralmente não ocorre disseminação extra-intestinal, mas ocasionalmente os trofozoítos podem migrar para os ductos biliares e pancreáticos. Infecções sintomáticas ocorrem com mais frequência em crianças do que em adultos. A maioria dos pacientes sintomáticos apresentam um período limitado de diarreia aguda, afebril ou com febre baixa, náuseas e anorexia: uma pequena proporção de pacientes apresenta uma evolução intermitente ou mais protaída caracterizada por diarreia, cólicas e distensão abdominal, sensação de plenitude gástrica, mal estar, flatulências, náuseas, anorexia e perda de peso. Inicialmente, as fezes podem ser profusas e aquosas e depois se tornam gordurosas e com fétido e podem flutuar no sanitário. As fezes não contém sangue, muco nem leucócitos. Vários graus de má absorção podem ocorrer. Padrões anormais de fezes podem se alternar com períodos de constipações e evacuações normais. A má absorção de açúcares, gorduras e vitaminas lipossolúveis tem sido bem documentada e pode ser responsabilizada por uma perda de peso substancial. 3. Prevenção e controle da Amebíase e Giardíase: Educação sanitária: Dadas as características clínico-pedagógicas da amebíase e das dificuldades para identifica- la, para o grande público, como um problema específico de saúde pública, sua abordagem educacional deve ser feita no contexto da luta contra doenças diarreicas. Vimos que a amebíase é em larga escala, uma doença de mãos sujas. A educação sanitária além de insistir sobre a obrigação de usar as latrinas e instalações sanitárias, e de nunca defecar no chão, problemas esses correntes em zonas rurais e entre as crianças pequenas. Uma das medidas mais importantes para evitar a transmissão da doença é a lavagem das mãos, sempre que possível com água e sabão depois de defecar e limpar-se, antes de tocar em alimentos que serão consumidos crus, antes das refeições, depois de tocar em alimentos ou objetos que podem ter sido contaminados com fezes, águas poluídasou mãos sujas, depois de cuidar da higiene de doentes e de possíveis eliminadores de cistos. Deve-se aconselhar o uso de unhas curtas ou lavá-las frequentemente com escova e sabão. Evitar alimentos que possam estar contaminados ou que possam não ter sid convenientemente lavados ou desinfectados (como frutas e legumes). Evitar alimentos manipulados por vendedores ambulantes e consumidos sem muitos cuidados. Saneamento Ambiental: Para que as medidas acima tenham sentido, é essencial que o abastecimento de água seja abundante e de fácil acesso. A água para uso doméstico deve ser potável, livre de contaminação de material fecal proveniente de humanos e de animais, uma vez que a infecção humana por cistos de Giardia que afetam animais domésticos e silvestres ainda precisa ser melhor entendida. A fim de que não veicule eventualmente cistos de amebas, a água destinada às redes urbanas deve sofrer um tratamento que comporte: a floculação por coagulantes químicos (sulfato de alumínio ou de ferro, ou cloreto ferroso, que floculam e se precipitam quando transformados em hidróxidos); a sedimentação e a filtração rápida; ou simplesmente filtração lenta, sem coagulante, para retenção de cistos. Para maior segurança (ou onde não haja tratamento de água), usar nos domicílios filtros de porcelana porosa. Previne-se assim, os riscos de contaminação por defeitos existentes na rede de distribuição de água. A cloração é ineficaz, pois para destruir os cistos seriam necessárias concentrações de cloro intoleráveis para se beber. A existência de instalações sanitárias e rede de esgotos é importante para a profilaxia. O tratamento dos esgotos deve assegurar a destruição dos cistos. Não se deve permitir que fezes humanas sejam utilizadas como adubo (a menos que convenientemente tratadas) ou que contaminem águas destinadas à irrigação. O lodo seco, resultante do tratamento anaeróbio dos esgotos em câmaras digestoras, deve alcançar temperaturas de 60-70ºC, para destruir os cistos, antes de poder ser utilizado como fertilizante. O combate as moscas e as baratas faz parte das medidas de saneamento, ainda que o papel desses insetos como vetores seja ainda muito discutível. Para limitar as populações dessas pragas, deve-se remover o lixo e dar-lhe destino adequado; proteger o alimento do acesso de insetos e, se necessário, usar inseticidas contra estes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 1. REY, L – Parasitologia, 3ª edição. RJ – Guanabara Koogan S.A, 2001. 2. Ciclos biológicos disponíveis em http://www.cdc.gov Acesso em 14 de julho de 2016. 3. COELHO, C & CARVALHO, A.R – Manual de Parasitologia Humana, 2ª edição – Editora ULBRA. 4. BEHRMAN, KLIEGMAN E JENSON – Tratados de Pediatria –– 17ª EDIÇÃO – SAUNDERS ELSEVIER. 5. DANIELS M.E., SHRIVASTAVA, A., SMITH W.A. SAHU, P., ODAGIRI M., MISRA P.R., SUAR P.P.M., CLASEN T., JENKINS MW. Cryptosporidium and Giardia in Humans, Domestic Animals, and Village Water Sources in Rural India. Am. J. Trop. Med. Hyg., 93(3): 596–600, 2015. 6. NOWAK P., MASTALSKA K., LOSTER J. Entamoeba Histolytica - Pathogenic Protozoan of the Large Intestine in Humans. J Clin Microbiol Biochem Technol 1(1): 010-017, 2015.