Buscar

Pesquisa em Serviço Social III Aula 10 Online

Prévia do material em texto

Aula 10 – Pesquisa em Serviço Social III
Introdução
Na disciplina de Pesquisa em Serviço Social II, vocês puderam estruturar seus projetos de pesquisa. Na aula de hoje, estaremos discutindo aspectos metodológicos que deverão servir para que possam não apenas fazer uma revisão do que construíram, mas, principalmente, voltarem-se sobre seu projeto criticamente, procurando corrigir e aperfeiçoar aquilo que considerarem necessário para melhor desenvolvimento de sua pesquisa monográfica. Esse é o espírito crítico com o qual o pesquisador deve se munir para conduzir seu trabalho.
O que veremos nessa aula
Iniciaremos essa décima e última aula com alguns comentários sobre a pesquisa quantitativa e alguns de seus procedimentos e termos mais básicos para o pesquisador em ciências sociais. Em seguida faremos uma breve revisão de conceitos, métodos e técnicas e ferramentas de que viemos falando até aqui.
Falamos muito pouco de pesquisa quantitativa e parece mesmo uma tendência dos alunos procurar escapar de procedimentos estatísticos mais complexos. Talvez essa seja uma tendência em nosso estado e as pesquisas na área de ciências humanas e sociais venham explorando a vertente qualitativa com mais frequência.
Pesquisa quantitativa e estatística
Para montar uma pesquisa quantitativa, muitas vezes temos que nos utilizar da estatística. Estatística é a ciência que utiliza-se das teorias matemáticas (principalmente as probabilísticas) para entender e explicar a frequência da ocorrência de eventos.
Para a pesquisa quantitativa em ciências sociais e nas leituras estatísticas que nelas aparecem, dados são vistos como variáveis.
Uma variável é uma característica qualquer de interesse que associamos à população ou à amostra para ser estudada estatisticamente (violência, matrículas em escolas de ensino fundamental). São chamadas assim porque apresentam variação de elemento para elemento na população ou amostra de estudo. Ou seja, variável é o comportamento de um dado frente aos vários outros dados em um certo recorte que fazemos da realidade.
Percebemos a realidade como se esta fosse composta por elementos discretos, mas que se influenciam mutuamente em algum grau. O quanto uma variável aumenta ou diminui em função de outra ou outras, é coisa que interessa ao cientista pesquisar. Isso tem sido feito em pesquisas experimentais em laboratório onde o controle que temos das variáveis presentes é muito maior do que nos trabalhos de campo que desenvolvemos na área de ciências sociais.
Um exemplo famoso que retiramos da psicologia é a chamada caixa de Skinner. Nesta caixa, existe uma alavanca que, uma vez pressionada pelo ratinho que nela será colocado libera comida. Pode-se medir quantas vezes o ratinho tecla ao acaso a alavanca até aprender a pressiona-la quando quer comer.
Classificação das variáveis
As variáveis podem ser:
Variáveis independentes – São condições ou características que o experimentador manipula em sua tentativa de determinar sua relação com os fenômenos observados.
Variáveis dependentes – São condições ou características que aparecem, desaparecem ou mudam quando o experimentador introduz, remove ou muda as variáveis independentes. Por exemplo, algumas variáveis dependentes podem ser medidas a partir do momento em que se constrói uma quadra poliesportiva e / ou um posto de saúde em uma comunidade.
No exemplo da caixa de Skinner, a variável dependente é a aprendizagem do ratinho. Quantos “ensaios” ele fará a parir do momento em que é colocado na caixa com a alavanca. A caixa e a alavanca são variáveis independentes. O comportamento do ratinho irá variar em função delas. No exemplo da quadra poliesportiva, imaginando que ela tenha sido construída em uma escola, ela seria uma variável independente e o número de falta e as aulas dos alunos seriam uma variável dependente. Com isso você mediu a variação das faltas às aulas dos alunos antes e depois da introdução da quadra na escola.
A coleta de dados
A coleta dos dados deve ser senão plenamente objetiva, pelo menos clara e transparente. Para isso, é preciso que a pesquisa tenha instrumentos fidedignos e válidos. A fidedignidade de um instrumento de medida refere-se à estabilidade, à possibilidade de repetição, à precisão das medidas com ele obtidas, i.e., ao grau de consistência dos valores medidos. A validade, por sua vez, tem a ver com até que ponto o instrumento está de fato medindo o que se supõe que esteja medindo.
Moda, a mediana e a média
Os conceitos básicos apresentados pela Estatística são a Moda, a Mediana e a Média. 
A Moda é a pontuação que ocorre mais frequentemente em uma distribuição de frequências (número de faltas por ano na escola em alunos de 10 anos ter moda = 18).
A Mediana é o ponto em uma distribuição de frequências abaixo do qual está a metade das pontuações ou escores.
A Média é a média dos escores em uma distribuição de frequências. Frequência é o número de ocorrências de um evento (ex. média de filhos).
O uso dessas ferramentas da estatística permite que agrupemos os dados de modo mais funcional, permitindo ao leitor de nosso trabalho uma leitura mais fácil e facilitando também cálculos e mensurações futuras que se apoiem nos dados da pesquisa. Note que você não precisará ser brilhante em estatística para utilizar essas referências. Sozinho ou com o auxílio de seu tutor, poderá tabular (organizar em tabelas) os registros quantificados de uma coleta de dados e expô-los ao seu leitor de modo mais organizado utilizando esses registros.
Assim, uma vez que colha dados quantitativos você poderá utilizar tabelas e os gráficos. Estes podem ter vários formatos, entre eles dois de uso relativamente simples e bastante frequente, que são os gráficos de “coordenadas cartesianas” e os gráficos em forma de “pizza”. A utilização destes recursos mais uma vez facilitará a leitura dos dados pelo leitor e facilitará a comparação e utilização em trabalhos futuros.
Planejamento
Uma pesquisa precisa de planejamento. O planejamento é a manifestação de passos para se atingir um fim. Os passos para uma pesquisa quantitativa são:
• Formulação do problema;
• Delineamento do que se procurará resolver do problema;
Formulação de uma hipótese que será o norteador da coleta de dados;
• Plano operacional, que é uma detalhamento dos passos que se seguirá;
• Execução do plano operacional;
• Mapeamento das observações, o que envolve a parte de matemática e estatística (contagem e cálculos); os dados são transformados em dados e variáveis
• Consolidação dos dados observados; é um trabalho de resumo, de súmula dos vários dados em um texto sucinto;
• Confrontação da consolidação com a hipótese apresentada no início do planejamento;
• Conclusão, que é a confirmação da hipótese, sua rejeição ou uma descoberta de uma novidade apresentada pelo confronto da experiência com a hipótese.
Apresentação de uma pesquisa quantitativa
A apresentação de uma pesquisa quantitativa, de um modo geral, tem o seguinte corpo:
- Capa – Onde se apresenta o título e a identificação do pesquisador;
- Resumo – É a manifestação generalizada e sucinta de toda a pesquisa. Sua importância é a indexação em bancos de dados e bibliotecas, quando for publicada;
- Introdução – É a manifestação dos objetivos e preocupação do autor da pesquisa. Neste momento, o autor diz como vê a realidade (a sociedade, no nosso caso de Assistência Social). Logo em seguida, é apresentado a motivação da pesquisa e o delineamento da hipótese e a divisão do trabalho de coleta de dados;
- Referencial teórico – É a escolha do referencial baseado em um conjunto de conhecimentos já consagrados. Geralmente é a escolha e a discussão de um ou vários autores que já se manifestaram teórica e filosoficamente sobre a parte da realidade em que vamos nos debruçar;
- Metodologia – É apresentação e justificação do tipo de método se escolheu. No nosso caso agora é a manifestação sobre a pesquisa quantitativa. Neste momento importante, deve-se dizer:
a) Determinar o tempo da pesquisa: mêstal vou fazer tal coisa. Dentro do mês dentro de casa semana, vou fazer isso. Tal dia, vou entrevistar tais e tais pessoas, nos seguintes horários. Tal dia vou tabular, ou seja, consolidar, ou resumir os dados coletados
b) Fazer uma descrição das pessoas a serem pesquisadas: o grupo de pessoas, a quantidade de pessoas a serem entrevistadas (caso a pesquisa dependa de entrevista de pessoas)
c) Onde será feita a pesquisa;
- Como será feita a pesquisa – Perguntas escritas ou orais; perguntas diretas ou múltiplas escolhas; um pesquisador ou vários, etc.
- Estudo de caso –Nesse contexto consiste na descrição do desenrolar da pesquisa, ou seja, como, pouco a pouco os resultados foram aparecendo. 
- Conclusão – É a afirmação ou negação da hipótese apresentada no início da monografia da pesquisa. A conclusão nada mais é que uma retomada da introdução, agora confirmada (ou negada) por todo o desenrolar da pesquisa.
Embora esse roteiro tenha elementos que só valem para as pesquisas estritamente qualitativas, muitos de seus pontos valem também para sua pesquisa qualitativa ou mista. Procure rever ponto a ponto o projeto já construído por você e registrar os pontos que estão ou não, procurando ter clareza da estrutura do trabalho que está construindo. Você pode ter boas razões para saltar algum destes pontos, porém é importante que saiba dizer porque assim o fez. Portanto não deixe de fazer um “checklist” do teu projeto a partir desta ordem que coloquei agora acima. Claro, você optar por outros instrumentos de revisão. O que ofereço aqui é apenas um modelo.
Este foi um breve resumo com alguns pontos que nos parecem principais para o desenvolvimento de uma pesquisa quantitativa ou para o uso de dados quantitativos em sua pesquisa. Passemos a examinar agora um fragmento de caso que nos permitirá rever os conceitos sobre os quais até agora viemos falando, nas aulas anteriores.
Passemos agora ao segundo momento dessa aula, quando utilizaremos o fragmento de um caso para pensar os recursos metodológicos que viemos discutindo até aqui.
Caso 1
Em janeiro de 2011, um período excepcionalmente prolongado de chuvas fortes culmina naquilo que ficou conhecido como “tragédia da serra”, quando Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis, além de uma série de pequenas cidades da região serrana fluminense ficaram marcadas pela maior catástrofe natural ocorrida no Brasil. Mais de novecentas pessoas morreram e muitas ficaram desabrigadas. Além disso, a catástrofe abala a situação da cidade como um todo trazendo reflexos negativos na atividade econômica, esgotamento no sistema de saúde já precário em tempos de normalidade - e outras consequências que obrigam a sacrifícios penosos grande parte da população.
Uma parceria entre a SETRAB (Secretaria de trabalho do Estado do RJ) e uma empresa privada que trabalha gerenciando o trabalho de pessoas portadoras de necessidades especiais firmam uma parceria para intervir junto à população colocada em abrigos na cidade de Nova Friburgo. O objetivo dessa parceria é ajudar a população escolhida (sem restrição quanto a serem ou não portadoras de necessidades especiais) a voltar a ocupar postos de trabalho na cidade.
O curso de psicologia do campus Nova Friburgo da Universidade Estácio de Sá é contatada pela empresa para fornecer alunos que fariam parte do trabalho como estagiários. Assim, além do objetivo direto de proporcionar a recolocação no mercado de trabalho de uma parte da população atingida, a iniciativa permitiria a obtenção de dados sobre a população foco e a capacitação profissional e acadêmica de alunos de uma Universidade local.
Questionários são elaborados para colher dados básicos sobre a população (sexo, idade, escolaridade, endereço etc. Mas também possíveis interesses em uma atividade profissional). Quando a equipe se encontra pronta para iniciar o trabalho, só restava um abrigo das mais de duas dezenas de abrigos que foram constituídos após a tragédia. Isso obrigou a equipe a modificar a sua população alvo, indo buscar pessoas vitimadas pela tragédia nos bairros e comunidades locais.
Pessoas consideradas chave das comunidades focadas pela equipe (líderes comunitários etc.) foram chamadas a participar ajudando a localizar possíveis beneficiários da iniciativa. Os questionários são aplicados e a parceria entre a SETRAB e a prefeitura chega a um acordo quanto à oferta de cursos de capacitação que levem em consideração os resultados dessa “pesquisa-ação”, para que a população alvo seja encaminhada para postos de trabalho compatíveis com os interesses e potencialidades encontradas entre a população.
Os cursos de capacitação, ao final de tudo e com o passar do tempo, não foram ofertados, a despeito da insistência dos coordenadores do projeto. Alegou-se entraves políticos mas ninguém assumiu a responsabilidade. Ou seja, a pesquisa-ação atinge os objetivos iniciais, realiza a sua parte, porém não acontece a contraparte que deveria vir dos órgãos municipais. A iniciativa termina em decepção e podemos especular que um dos efeitos disso é deixar as pessoas da população foco ainda mais desalentadas quanto ao que podem esperar de políticos e da sociedade “organizada”.
Percebeu-se durante o trabalho voluntário (que foi importante e amplamente noticiado pela mídia) de apoio às vítimas da tragédia o quanto as pessoas não tinham a menor consciência de seus direitos e das obrigações do estado para com elas. Por um lado não acreditavam em promessas, não buscavam seus direitos; por outro, acotovelavam-se para receberas doações e mostravam-se passivas do ponto de vista do exercício de sua cidadania, à espera de algum tipo de milagre, como se não pudessem se tornar cidadãos pertencentes a uma sociedade pela qual são responsáveis mas que também tem responsabilidades para com eles.
O fato de mais uma vez ter sido desenvolvida e apresentada uma proposta a esta população e pouco ou nada ter acontecido de concreto, talvez possa criar mais desalento e desconfiança em uma população acostumada a achar que ninguém fará nada por ela. Ganha força a ideia de que tudo não passa de promessas feitas para o próprio benefício dos que prometem. Por outro lado tal contexto envolve a passividade desta população que não reclama nem parece inclinada a acreditar que vale a pena lutar pelos seus direitos.

Continue navegando