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MARIA TEREZA TARGINO HORA OS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO CONTENCIOSA E DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Criação Editora CRIAÇÃO EDITORA CONSELHO EDITORIAL Fábio Alves dos Santos Jorge Carvalho do Nascimento José Afonso do Nascimento José Eduardo Franco José Rodorval Ramalho Justino Alves Lima Luiz Eduardo Oliveira Menezes Martin Hadsell do Nascimento Rita de Cácia Santos Souza www.editoracriacao.com.br Aracaju | 2017 Criação Editora MARIA TEREZA TARGINO HORA Aracaju | 2017 Criação Editora OS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO CONTENCIOSA E DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Projeto gráfico: Adilma Menezes Capa: © Steve Lovegrove | Dreamstime.com Todos os direitos reservados a Maria Tereza Targino Hora Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, com finali- dade de comercialização ou aproveitamento de lucros ou vantagens, com observân- cia da Lei em vigência. Poderá ser reproduzido texto, entre aspas, desde que haja expressa marcação do nome do autor, título da obra, editora, edição e paginação. A violação dos direitos de autor (Lei nº 9.619/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal. Hora, Maria Tereza Targino H811c Os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa e de jurisdição voluntária no novo Código de Processo Civil /Maria Tereza Targino Hora. - Aracaju: Criação, 2017. ISBN: 978-85-8413-150-1 126 p.,il. 21 cm 1. . Código de Processo Civil 2. Jurisdição-contenciosa 3. Jurisdição - voluntária I. Título II.Maria Tereza Targino Hora III.Assunto CDU 347:342 Catalogação – Claudia Stocker – CRB 5/1202 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 7 DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO CONTENCIOSA 1.1) Da Ação de Consignação em Pagamento 9 1.2) Da Ação de Exigir Contas 17 1.3 Das Ações Possessórias 24 1.4) Da Ação de Divisão e Demarcação de Terras Particulares 32 1.5) Da Ação de Dissolução Parcial da Sociedade 35 1.6) Do Inventário e da Partilha 43 1.7) Dos Embargos de Terceiro 56 1.8) Da Oposição 60 1.9) Da Habilitação 63 1.10) Das Ações de Família 64 1.11) Da Ação Monitória 67 1.12) Da Homologação de Penhor Legal 72 1.13) Da Regulação de Avaria Grossa 75 1.14) Da Restauração dos Autos 78 DOS PROCEDIMENTOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA 2.1) Disposições Gerais 81 2.2) Da Notificação e da Interpelação 84 2.3) Da Alienação Judicial 86 2.4) Do Divórcio e da Separação Consensuais, da Extinção Consensual de União Estável e da Alteração do Regime de Bens do Matrimônio 86 2.5) Dos Testamentos e dos Codicilos 92 2.6) Da Herança Jacente 96 2.8) Dos Bens dos Ausentes 98 2.9) Das Coisas Vagas 100 2.10) Da Interdição 101 2.11) Das Disposições Comuns à Tutela e à Curatela 114 2.12) Da Organização e da Fiscalização das Fundações 117 2.13) Da Ratificação dos Protestos Marítimos e dos Processos Testemunháveis a Bordo 119 BIBLIOGRAFIA 123 7 MARIA TEREZA TARGINO HORA Introdução Introdução O presente trabalho versa sobre os procedimentos especiais de juris- dição contenciosa e de jurisdição voluntária previstos no Novo Códi- go Processo Civil. Conforme será demonstrado, o novo diploma pro- cessual corrigiu antiga crítica da doutrina para alocar, dentro da parte especial e do respectivo Livro I (Processo de Conhecimento), tanto o procedimento comum (Título I), quanto os procedimentos especiais (Título III), de modo a quebrar a equivocada classificação do Código revogado que tratava dos procedimentos especiais em livro próprio, segregando, assim, estes últimos e o processo de conhecimento. Ademais, necessário registrar que o NCPC teve uma política clara de racionalizar os procedimentos especiais, isto é, de tentar manter ape- Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 8 MARIA TEREZA TARGINO HORA nas os procedimentos que ainda tinham alguma utilidade. Isso não significa, contudo, que as ações deixaram de existir, mas apenas que o procedimento a elas aplicado passa a ser o comum, é o caso, por exemplo, da ação de depósito e da ação de prestação de contas. Finalmente, assinalo que as principais mudanças em relação à legis- lação anterior atinentes aos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa foram devidamente enfrentadas nessa obra, merecendo destaque a introdução, pelo novel código, de novos procedimentos relacionados às ações de família, à ação de dissolução parcial de so- ciedade e à regulação de avaria grossa. Além disso, a oposição deixou de ser incluída como hipótese de intervenção de terceiro, para ser tratada como modalidade de ação autônoma. Quanto à jurisdição voluntária, observar-se-á que poucas modifica- ções foram trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, permanecen- do os procedimentos ali indicados, de um modo geral, regulamenta- dos de forma similar ao disciplinado no Código revogado. Todavia, conforme será estudado ao longo dessa obra, foram introduzidas significativas transformações na interdição, na parte geral dos proce- dimentos de jurisdição voluntária, assim como no procedimento de divórcio e de separação consensual. Feita essa breve introdução, espero que a obra venha a colaborar com a divulgação das alterações trazidas pelo NCPC no tocante aos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa como os de juris- dição voluntária. Almejo também que seja útil àqueles que buscam aprimorar os estudos sobre a nova lei processual e as suas principais inovações. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 9 MARIA TEREZA TARGINO HORA Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 1.1) DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO O pagamento em consignação, modalidade especial de pagamento, pode ser conceituado como um mecanismo existente na lei civil, de que pode se valer o devedor da coisa devida, para liberar–se de uma obrigação assumida em face de um devedor determinado, quando esteja em dificuldades para fazê-lo, seja porque o credor, por exem- plo, recusa-se a receber ou dar quitação, está em lugar inacessível ou, ainda, porque existe dúvida real a respeito de quem possui legitimi- dade para receber o pagamento. O Código Civil, em seu art. 355, elenca um rol meramente exemplifi- cativo de situações que a consignação poderá ocorrer, in verbis: Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 10 MARIA TEREZA TARGINO HORA Art. 335. A consignação tem lugar: I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar rece- ber o pagamento, ou dar quitação na devida forma; II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lu- gar, tempo e condição devidos; III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de aces- so perigoso ou difícil; IV - se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente re- ceber o objeto do pagamento; V - se pender litígio sobre o objeto do pagamento. É certo que a consignação em pagamento libera o devedor do vín- culo obrigacional, isentando-o dos riscos da dívida e de eventual obrigação de pagar juros moratórios ou multa contratual. Em suma, a consignação, desde que cumpridos os requisitos do pagamento (pessoa, modo, tempo, lugar), é capaz de afastar eventual aplicação das regras do inadimplemento, seja ele absoluto ou relativo. Ao discorrer sobre o tema, o Ilustre processualista Alexandre Freitas Câmara1 nos ensina que “não se pode admitir, por exemplo, que o pagamento por consignação de dívida já vencida, seja feito sem o depósito da multa moratória (quando, evidentemente, houver mora do devedor, o que se dá, por exemplo, no caso de o devedor procuraro credor após o vencimento da dívida para efetuar o pagamento, re- cusando – se este a lhe dar o recibo de quitação)”. Pois bem, ultrapassadas as breves considerações sobre o aspecto material do instituto, passemos agora à análise do seu aspecto pro- cessual, em especial, as novidades trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015. 1 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Editora Lumen Juris. 2008, p. 272. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 11 MARIA TEREZA TARGINO HORA Inicialmente, imperioso ressaltar que o procedimento de consigna- ção em pagamento extrajudicial foi substancialmente mantido pelo Novo CPC. O art. 593, §3ª, apenas amplia o prazo para ajuizamento da ação, na hipótese de recusa do credor, de trinta dias para um mês. Outra novidade está prevista no art. 539,§2º, ao registrar que o pra- zo de dez dias para o credor manifestar a recusa à consignação, será contado do retorno do aviso de recebimento. A primeira mudança significativa verificada na ação de consignação em pagamento diz primeira diz respeito à supressão do parágrafo único do art. 891 (CPC/1973). Por sua vez, o art. 540 do NCPC (891 CPC/1973) – sem alterações substanciais - dispõe que a ação de con- signação deverá ser requerida no lugar do pagamento. Vejamos a literalidade dos artigos mencionados. Art. 891. Requerer-se-á a consignação no lugar do paga- mento, cessando para o devedor, tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada impro- cedente. Parágrafo único. Quando a coisa devida for corpo que deva ser entregue no lugar em que está, poderá o devedor re- querer a consignação no foro em que ela se encontra. Art. 540. Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamen- to, cessando para o devedor, à data do depósito, os juros e os riscos, salvo se a demanda for julgada improcedente. Como pode ser observado, o parágrafo suprimido mostrava-se de pouca utilidade prática, tendo em vista que a regra prevista em seu teor, já estava abrangida pelo caput do mesmo dispositivo. Isto é, se o devedor tem a obrigação de entregar a coisa onde ela está, este também será o local do pagamento, de modo que, nesse caso, deve incidir a regra geral, qual seja, a de que a ação de con- signação deve ser proposta no lugar em que a obrigação deve ser Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 12 MARIA TEREZA TARGINO HORA adimplida. Nesse sentido, o Enunciado 59 do Fórum Permanente de Processua- listas (FPPC): “Em ação de consignação em pagamento, quando a coisa devida for copo que deva ser entregue no lugar em que está, poderá o devedor requer a consignação no foro que ela se encontra. A supressão do parágrafo único do art. 891 do Código de Processo Civil em vigor não afetará a regra acima destacada, tendo em vista que ainda possui previsão no art. 541 do Código Civil”. O art. 541 repete o disposto no art. 892 do CPC/173 ao apontar que se tratando de prestações sucessivas, consignada uma delas, pode o devedor continuar a depositar, no mesmo processo e sem mais for- malidades, as que se forem vencendo, desde que o faça em até 5 (cin- co) dias contados da data do respectivo vencimento. Em relação ao dispositivo acima comentado, também foi editado o Enunciado 60 do Fórum Permanente de Processualistas (FPPC): “Na ação de consignação em pagamento que tratar de prestações suces- sivas, consignadas uma delas, pode o devedor continuar a consignar sem mais formalidades as que se forem vencendo enquanto estiver pendente o processo”. Como bem registra Daniel Amorim2, continua, no Novo CPC (art. 542), cabendo ao juiz a análise da regularidade formal da petição inicial, e, sendo superada positivamente essa fase procedimental, o autor de- verá ser intimado para que realize o depósito no prazo de cinco dias, dependendo a citação do réu da efetiva realização desse ato pelo autor. Em havendo omissão de depósito, será caso de extinção do processo sem julgamento de mérito, existindo decisão do STJ3 que 2 NEVES, Daniel Amorim Assumpção Neves. Novo CPC – Código de Processo Civil – Inovações, Alterações e Supressões Comentadas. Editora Método, 2015, pg. 320. 3 REsp 702.739/PB, 3ª Turma, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. p/ acórdão Ministro Ari Pargendler, j. 19/09/2006. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 13 MARIA TEREZA TARGINO HORA admite o depósito após o prazo mencionado (cinco dias) previsto no art. 893, I, do CPC/1973 e mantido pelo art. 542, I, do Novo CPC. Outra alteração que merece ser comentada é a introdução, pelo Novo Código de Processo Civil, da regra prevista no parágrafo único do art. 542 (art. 892 CP/1973) o qual estabelece que se o autor da ação não consignar/depositar o valor que entende devido, o processo deverá ser extinto sem resolução de mérito pelo magistrado. Frise- se, mais uma vez, que não havia dispositivo correspondente no CPC de 1973, muito embora existam diversos julgados em que o aludido entendimento já era aplicado. Senão, vejamos. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - AUSÊNCIA DE DEPÓSITO, APESAR DO DEFERIMENTO - PRESSUPOS- TOS DE CONSTITUIÇÃO E DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO - EXTINÇÃO DO FEITO - SEN- TENÇA MANTIDA. (...) -O depósito do valor em conten- to é pressuposto essencial para o desenvolvimento válido e regular do processamento da ação de con- signação em pagamento, consoante as regras do art. 337 do CC e art. 893 e seguintes do CPC.(TJ-MG - AC: 10707130097314001 MG , Relator: Wanderley Paiva, Data de Julgamento: 02/04/2014, Câmaras Cíveis / 11ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/04/2014)(grifo nosso). CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. AUSÊNCIA DO DEPÓSITO A CONSIGNAR. EXTINÇÃO. INCIDÊNCIA ART. 267, IV, E 893, I, DO CÓDIGO DE RITOS. Na demanda de consignação em paga- mento, deixando o autor de efetuar o depósito, providên- cia essencial ao prosseguimento regular da demanda, im- põe-se a extinção do processo, sem resolução do mérito, por falta de pressuposto de desenvolvimento válido do processo (art. 267, inc. IV, c.c. art. 893, inc. I, ambos do CPC). Sentença mantida. Recurso não provido.(TJ-BA - APL: 03417260920138050001 BA 0341726-09.2013.8.05.0001, Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 14 MARIA TEREZA TARGINO HORA Data de Julgamento: 03/12/2013, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 06/12/2013)(grifo nosso) Igualmente, não é demais lembrar que o Superior Tribunal de Jus- tiça, no julgamento do RESP 1170188-DF, sob a Relatoria do Minis- tro Luis Felipe Salomão, firmou o posicionamento no sentido de que em ação de consignação em pagamento, ainda que cumulada com revisional de contrato, é inadequado o depósito tão somente das prestações que forem vencendo no decorrer do processo, sem o recolhimento do montante incontroverso e já vencido (STJ. 4a Turma. REsp 1.170.188-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/2/2014). Isto é, o autor da ação, além de depositar em juízo, mensalmente, o valor das prestações que considera correto, deve consignar também o valor correspondente às parcelas vencidas e inadimplidas. Os artigos 543 e 544 não trazem nenhuma novidade, vez que repe- tem as previsões dos art. 894 e 896 do Código de 1973, in verbis: Art. 541 - Tratando-se de prestações sucessivas, consigna- da uma delas, pode o devedor continuar a depositar, no mesmo processo e sem mais formalidades, as que se forem vencendo, desde que o faça em até 5 (cinco) dias contados da data do respectivo vencimento. Art. 544 - Na contestação, o réu poderá alegar que: I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida; II - foi justa a recusa; III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar dopagamento; IV - o depósito não é integral. Parágrafo único - No caso do inciso IV, a alegação somente será admissível se o réu indicar o montante que entende devido. Uma vez alegada a insuficiência do depósito, é lícito ao autor com- Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 15 MARIA TEREZA TARGINO HORA pletá-lo, em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato (art. 545). Quanto ao levantamento imediato dos valores previstos no art. 889, §1º, do CPC/1973 e mantido no art. 545, §1º, do Novo CPC, vale registrar o Enunciado 61 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “É permitido ao réu da ação de consignação em pagamento levantar “desde logo” a quantia ou coisa depositada em outras hipóteses além da prevista no §1º do art. 559 [atual art. 545] (insuficiência de depósi- to), desde que tal postura não seja contraditória com fundamento da defesa”. Quanto à última mudança a ser analisada, certo é que sempre foi possível propor uma ação de consignação contra várias pessoas, quando existisse dúvida fundada por parte do credor sobre quem deva legitimamente receber o pagamento. Por exemplo, com o fa- lecimento do credor, pode surgir confusão a respeito de quem seja o legítimo sucessor; ou podem surgir questões decorrentes de uma cláusula ambígua em um contrato, que não se permita identificar a quem deva ser dirigido o pagamento. Quanto a esse ponto não há novidade. A inovação está no art. 548 do NCPC ao regulamentar a possibilidade de ação de consignação contra vários credores presuntivos, in verbis: Art. 547. Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitima- mente receber o pagamento, o autor requererá o depó- sito e a citação dos possíveis titulares do crédito para provarem o seu direito. Art. 548 – No caso do art. 547: I - não comparecendo pretendente algum, converter-se- -á o depósito em arrecadação de coisas vagas; II - comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano; III - comparecendo mais de um, o juiz declarará efetua- do o depósito e extinta a obrigação, continuando o Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 16 MARIA TEREZA TARGINO HORA processo a correr unicamente entre os presuntivos cre- dores, observado o procedimento comum. Em relação ao inciso III, vale ressaltar que se houver dúvida quanto ao montante do crédito o processo não será extinto, devendo o magis- trado dar prosseguimento ao feito, para que se apure qual o correto valor da dívida. Assim, se a dúvida não disser respeito ao valor do de- pósito, mas apenas à titularidade do crédito, a obrigação será extinta par o devedor e o litígio remanescerá entre os possíveis credores. A respeito do tema, o Enunciado 62 do Fórum Permanente de Pro- cessualistas Civis: “A regra prevista no art. 548, III, que dispõe que, em ação de consignação em pagamento, o juiz declarará efetuado o de- pósito extinguindo a obrigação em relação ao devedor, prosseguin- do o processo unicamente entre os presuntivos credores, só se apli- cará se o valor do depósito não for controvertido, ou seja, não terá aplicação caso o montante depositado seja impugnado por qualquer dos presuntivos credores”. Por fim, quanto à sentença proferida em ação de consignação em pagamento, em regra, terá natureza meramente declaratória. Toda- via, como bem registra Daniel Amorim Assumpção Neves4, excepcio- nalmente, terá também natureza condenatória quando o réu alegar insuficiência do depósito e o autor não complementá-lo em dez dias, caso em que o juiz irá condená-lo a pagar a diferença apurada (art. 899, §2 do CPC/1973 e art. 545, §2º, do Novo CPC). 1.2) DA AÇÃO DE EXIGIR CONTAS Ab initio, cumpre esclarecer que a “Ação de Prestação de Contas” era regulada no Código de Processo Civil de 1973 pelos artigos 914 a 919. Nestes dispositivos, em verdade, eram encontrados dois distintos 4 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op.cit., p. 357. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 17 MARIA TEREZA TARGINO HORA procedimentos especiais: o da “Ação de Dar Contas” e o da “Ação de Exigir Contas”. Ocorre que, o CPC de 2015 menciona, entre as ações de procedimento especial, apenas a de exigir contas, de modo que devemos observar o procedimento comum na ação de dar contas. Assim, tanto no CPC 1973 como no CPC 2015, quem estiver adminis- trando certos bens ou interesses de outrem, tem o dever de prestar contas de sua gestão, que poderá ser realizada de forma voluntária (prestar contas) ou mediante exigência dos interessados (exigir con- tas). Vários exemplos podem ser encontrados no Código Civil, tais como o mandatário (art. 668), os administradores nas sociedades (art. 1020), o síndico de condomínio (art. 1348), os tutores (art. 1755), os curadores (art. 1781), entre tantos outros. O procedimento especial de “exigir contas” será utilizado no caso de “prestação forçada de contas”. Trata-se, como se poderá observar, de um procedimento distinto da maioria dos conhecidos no ordena- mento brasileiro, pois existem, em regra, duas fases distintas: a pri- meira, para que o magistrado decida sobre a existência ou não da obrigação de o réu prestar contas. A segunda fase, que só se instaura se restar verificada a obrigação do réu de prestar contas, a qual servi- rá para que as contas sejam efetivamente prestadas, bem como para que se verifique a existência de eventual saldo em favor do credor ou devedor. Ao discorrer sobre o tema, Alexandre Freitas Câmara5 nos ensina o seguinte: É preciso notar, porém, que não se estará diante de dois processos distintos, tramitando simultaneamente nos mesmos autos. O processo, em verdade, é único, embora dividido em duas fases distintas. Há, pois o ajuizamento de uma única demanda, contendo um único mérito.A análi- 5 CÂMARA, Alexandre Freitas. Op.cit., p. 325. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 18 MARIA TEREZA TARGINO HORA se deste, porém, é dividido em dois momentos: o pri- meiro, dedicado à verificação da existência do direito de exigir a prestação de contas; o segundo, dirigido á verificação das contas e do saldo devedor eventual- mente existente (grifo nosso). O §1º do art. 540 do NCPC revoluciona ao exigir como requisito da petição inicial, que o autor especifique, de forma detalhada, as ra- zões pelas quais exige as contas, devendo, ainda, instruí-la com os documentos comprobatórios dessa necessidade, caso existirem. Ou seja, alegações genéricas da existência de um dever de prestação de contas são insuficientes, devendo o autor demonstrar as razões pelas quais necessita da atuação do Poder Judiciário para tanto. Tal exigên- cia visa dar maior segurança ao processo, bem como afastar as lides meramente temerárias. Uma particularidade desse procedimento é que, ao contrário do pro- cedimento comum ordinário, não existe previsão de marcação de audiência preliminar. A cabeça do art. 550 estabelece que o réu será citado diretamente para prestar contas ou contestar, de modo que diante da ausência de previsão acerca da referida audiência, deve –se observar a lógica do procedimento especial. Assim, citado o réu, no prazo de 15 (quinze dias) previsto no caput do art. 540, poderá este adotar uma entre várias condutas possíveis: • Pode reconhecer a obrigação de prestar constas, e já as apresen- tar, caso em que o juiz considerará superada a primeira fase e passará desde logo à segunda. • Uma vez prestadas as contas, o autor terá o prazo 15 (quinze) dias para manifestar - se sobre as mesmas (§2º) e, caso não concorde, deverá oferecer impugnação fundamentada e especificada, fa- zendo referência expressa ao lançamento questionado (§3º). Dos Procedimentos Especiaisde Jurisdição Contenciosa 19 MARIA TEREZA TARGINO HORA • Pode permanecer inerte, sem contestar nem prestar as contas soli- citadas, caso em que, o juiz, aplicando ao réu os efeitos da revelia, julgará antecipadamente a lide, nos termos do art. 355 (§4º), de- terminando que preste as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar (§5º). • Se o demandado não apresentar as contas no prazo de quinze dias acima mencionado, o autor deverá apresentá-las, podendo o juiz determinar a realização de exame pericial se necessário (§6º). • Pode apresentar resposta, alegando, por exemplo, a inexistência da obrigação de prestar contas. Caso o magistrado entenda que os pedidos formulados são procedentes, o réu será condenado a prestar contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. • Pode o réu contestar, negando a obrigação de prestar contas, mas, ao mesmo tempo, já apresentá-las. Nesse caso, o processo passará logo à segunda fase, pois ao apresentar as contas, o réu reconhece a obrigação, cumprindo apenas ao magistrado veri- ficar se elas estão corretas e se há saldo em favor dos litigantes. Importante frisar que, o art. 915, §2º do CPC de 1973 previa que o ato que condenava o réu a prestar contas, sem por fim ao processo, marcando o fim da primeira fase e a passagem para a segunda, teria natureza de sentença, in verbis: § 2o Se o réu não contestar a ação ou não negar a obrigação de prestar contas, observar-se-á o disposto no art. 330; a sen- tença, que julgar procedente a ação, condenará o réu a pres- tar as contas no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de não Ihe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. Ocorre que, o CPC de 2015 não mais designa o ato judicial que encer- Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 20 MARIA TEREZA TARGINO HORA ra a primeira fase como sentença, mas sim como decisão. Assim, em- bora existam controvérsias acerca da sua natureza jurídica, o enten- dimento que prevalece entre os doutrinadores é no sentido de que a nova legislação optou por considerá-la como decisão interlocutória, em face de qual caberá agravo de instrumento. No mesmo sentido, e Enunciado nº 177 do Fórum Permanente de Processualistas Civis afirma que “a decisão interlocutória que julga procedente o pedido para condenar o réu a prestar contar, por ser de mérito, é recorrível por agravo de instrumento”. Segundo a me- lhor doutrina, o fato ser cabível o agravo de instrumento facilita a utilização do recurso, pois o mesmo possui instrumento próprio, não paralisando o processo, assim como pelo fato de não possuir efeito suspensivo ope legis. Ademais, o novo diploma processual altera a forma de apresentação das contas prevista no art. 917 do CPC/1973, o qual dispunha que aquelas deveriam ser apresentadas na forma mercantil. Agora, o arti- go 551 e seus parágrafos exigem apenas que as contas apresentadas tanto pelo réu, como pelo autor, nas hipóteses acima elencadas, se- jam demonstradas na forma adequada, especificando – se as recei- tas, a aplicação das despesas e os investimos, se houver. Outra alteração realizada pelo CPC/2015 é que, pelo regime previsto no art. 917 do CPC/1973, as contas deveriam ser apresentadas em conjunto com os documentos justificativos. O §1º do art. 551 altera esse regime. Esses documentos só precisam ser apresentados após a impugnação justificada e específica do autor e apenas na medida de sua impugnação. De acordo com Ravi Peixoto6, 6 PEIXTO, Ravi. Procedimentos Especiais, Tutela Provisória e Direito Transitório. Ação de Prestação de Contas e o CPC/2015. Salvador: Editora Juspodivm. 2015, p. 323. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 21 MARIA TEREZA TARGINO HORA o réu não precisará apresentar a documentação referente a todos os lançamentos, mas tão somente em relação aos que forem impugnados pelo autor. Há de se destacar que os documentos só precisam ser apresentados caso haja impugnação específica e fundamentada dos lançamentos, não se admitindo impugnações genéricas, no sentido de que os débitos lançados estão incorretos. Um dos exemplos mais comuns de ação de exigir contas é aquela proposta pelo correntista em face do banco. Foi editada, inclusive, uma súmula para reconhecer essa possibilidade: Súmula 259 do Su- perior Tribunal de Justiça que assim dispõe: “A ação de prestação de contas pode ser proposta pelo titular de conta corrente bancária” (Obs: a súmula continua válida com o CPC 2015, mas a redação da súmula deverá ser atualizada com o novo nome do procedimento (ação de exigir contas)). Situação diversa que também envolve bancos e correntistas é aque- la que envolve os contratos de mútuo (empréstimo de dinheiro) e financiamento. Nesses casos, o STJ decidiu que não há interesse de agir por parte do devedor para a ação de exigir contas, tendo em vista que esta tem por finalidade essencial dirimir incertezas surgi- das a partir da administração de bens, negócios e interesses alheios, cabendo ao gestor a apresentação minuciosa de todas as receitas e despesas envolvidas na relação jurídica e, ao final, a exibição do sal- do, que tanto pode ser credor quanto devedor. Ou seja, é fundamen- tal que exista, entre autor e réu, relação jurídica de direito material em que um deles administre bens, direitos ou interesses alheios. Sem essa relação, inexiste o dever de prestar contas. No contrato de mútuo bancário, a obrigação do mutuante (no caso, a instituição financeira) cessa com a entrega da coisa (na hipótese, o dinheiro). Assim, não há obrigação do banco em prestar contas, porquanto a relação estabelecida com o mutuário não é de admi- Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 22 MARIA TEREZA TARGINO HORA nistração ou gestão de bens alheios, sendo apenas um empréstimo. Concluiu-se, então, pela inexistência de interesse de agir do cliente/ mutuário para propor ação de prestação de contas, haja vista que o mutuante/instituição financeira exime-se de compromissos com a entrega da coisa (STJ. 2ª Seção. REsp 1.293.558-PR, Rel. Min. Luis Feli- pe Salomão, julgado em 11/3/2015 (Informativo 558)). Por fim, faço a ressalva de que a Corte Cidadã firmou entendimento no sentido de que o dever de prestar contas não se transmite aos herdeiros, devido ao caráter personalíssimo da obrigação, não se po- dendo exigir que o espólio ou os sucessores o façam pelo de cujus (AgRg no REsp 1.145.754⁄ES, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 07⁄03⁄2014; REsp 1.122.589⁄MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 19⁄04⁄2012). Todavia, o mesmo não se pode afirmar quando é o espólio que pretende exigir as contas, porque “as circunstâncias que impedem a transmissibilidade do dever de prestar contas aos herdeiros do mandatário não se verificam na hipótese inversa, rela- tiva ao direito de os herdeiros do mandante exigirem a prestação de contas do mandatário”. (REsp 1.122.589⁄MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, DJe de 19⁄4⁄2012). Em suma, o direito de exigir a prestação de contas transmite-se aos herdeiros do de cujus, mas não o dever de prestá-las, tendo em vista que este é personalíssimo e, portanto, intransmissível. Por oportuno, colaciona–se recente julgado relatado pela Ministra Nancy Andrighi que trata do tema em análise: CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS. MORTE DA PARTE RÉ. SUCESSÃO PROCESSUAL. IMPOS- SIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA. 1. Ação de prestação de contas, distribuída em 23/06/2003, da qual foi extraído o presente recurso especial, conclu- so ao Gabinete em 28/09/2012. 2. Recurso especial em Dos ProcedimentosEspeciais de Jurisdição Contenciosa 23 MARIA TEREZA TARGINO HORA que se discute se o espólio da ré falecida pode suceder- -lhe na ação de exigir contas. 3. A disposição do art. 914, II, do CPC, de que a ação de prestação de con- tas compete a quem tiver a obrigação de prestá-las, deve ser lida e interpretada no sentido de competir somente àquele que administra os bens e interes- ses de terceiros (obrigação personalíssima), porque é a pessoa capaz de informar quais providências e despesas foram feitas, como foram feitas e por que o foram. 4. Os herdeiros não podem ser obrigados a prestar contas relativas a atos de gestão praticados por terceiro, realizados sem a anuência ou qualquer participação deles, mormente se considerado o ônus que a inércia lhes impõe, de o Juiz, eventualmente, acolher aquelas que o autor apresentar (art. 915, §§ 2º e 3º, do CPC). Precedentes. 5. A pretensão deduzi- da na ação de prestação de contas - o aclaramento dos gastos, rendimentos e a prova da boa administração - não se confunde com o direito material ao crédito even- tualmente existente, de modo que poderá o credor, pela via comum, buscar satisfazê-lo em face dos herdeiros, nos limites da herança. 6. Recurso especial conhecido e desprovido.(STJ - REsp: 1354347 SP 2011/0299177-0, Re- lator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/05/2014, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/05/2014)(grifo nosso). O art. 552 faz referência à sentença da segunda fase, impondo que a mesma seja líquida, apurando o saldo devedor, que poderá benefi- ciar tanto o autor, como o réu, ressaltando-se, nesse momento, o seu caráter de duplicidade. Como bem registra Ravi Peixoto7 o referido dispositivo apenas reproduz a lógica das decisões relativas a ações 7 PEIXTO, Ravi. Op.cit, p. 324. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 24 MARIA TEREZA TARGINO HORA de obrigação de pagar quantia, que, de acordo com o art. 491 do CPC/2015, devem sempre ser líquidas, ainda que o pedido seja gené- rico, salvo as exceções dos incisos I e II. Assim, exclui-se a possibilida- de de utilização da liquidação, de modo que não havendo a fixação de valores, a decisão deve ser anulada. O art. 553 trata de uma hipótese específica de prestação de contas, que é aquela relacionada com os casos em que o dever de prestar contas refere-se a administrador nomeado judicialmente (inventa- riante, tutor, curador, depositário, etc.). A particularidade dessa prestação de contas está no parágrafo único do mencionado dispositivo, que consiste na forma de efetivação de pagar quantia, caso exista saldo devedor. O juiz poderá destituí-lo, sequestrar os bens sob sua guarda, glosar o prêmio ou a gratificação a que teria direito o administrador. A novidade fica por conta da par- te final do parágrafo, ao estabelecer que este rol de medidas passa a ser meramente exemplificativo, pois, além das diligências elencadas, permite-se a adoção, pelo magistrado, de outras as medidas executi- vas necessárias à recomposição do prejuízo. 1.3 DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS Inicialmente, vale ressaltar que o direito brasileiro confere proteção à posse, permitindo que o possuidor a defenda de eventuais agressões de duas formas: pela autotutela e heterotutela (ações possessórias). A primeira é tratada no art. 1210, §1º do Código Civil que dispõe o seguinte: “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou se restituir por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manu- tenção, ou restituição da posse”. Este mecanismo de defesa, muito em- bora de grande relevância, desvia- se do âmbito de nossos estudos, já Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 25 MARIA TEREZA TARGINO HORA que feito sem a instauração do processo e sem a intervenção do Poder Judiciário. Desta feita, passemos a análise do que realmente nos interessa, as inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015 às ações possessórias e o seu procedimento (heterotutela). As ações possessórias são também chamadas pela doutrina de inter- ditos possessórios, a saber: a reintegração de posse, a manutenção de posse e o interdito proibitório, cabíveis, quando houver, respecti- vamente, esbulho, turbação ou ameaça. O tipo de agressão permite identificar qual a adequada ação. As formas de agressão ora mencionados são conceituadas por Mar- cus Vinicius Rios Gonçalves8 da seguinte forma: Esbulho: pressupõe que a vítima seja desapossada do bem, que o perca para o autor da agressão. É o que ocorre quando há uma invasão e o possuidor é expulso da coisa; Turbação: pressupõe a prática de atos materiais concretos de agressão à posse, mas sem desapossamento da vítima. Por exemplo, o agressor destrói o muro do imóvel da ví- tima; ou ingressa frequentemente, para subtrair frutas ou objetos de dentro do imóvel; Ameaça: não há atos matérias concretos, mas o agressor manifesta a intenção de consumar a agressão. Se ele vai até a divisa do imóvel, e ali se posta, armado, com outras pessoas, dando a entender que vai invadir, haverá ameaça. 8 GONÇAVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Editora Saraiva. 2015, p.860. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 26 MARIA TEREZA TARGINO HORA Certo é que, no caso concreto, nem sempre será fácil identifi- car quando há esbulho, turbação ou ameaça, razão pela qual o CPC/1973 considera as três ações possessórias fungíveis entre si, permitindo que o magistrado conceda uma forma de proteção di- ferente da pleiteada, sem que fique configurada a sentença extra petita (além do pedido). Ademais, caso no curso do processo, um tipo de agressão transforme-se em outro, poderá o juiz conceder a proteção adequada a esta nova circunstância, sem necessidade de alteração do pedido formulado na inicial. A fungibilidade das ações foi mantida pelo CPC/2015 em seu art. 554: “A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados”. O Novo CPC também conservou a possibilidade de cumulação do pedido de condenação de perdas e danos (inciso, I, do art. 555) e de multa cominatória ao pedido principal, sem prejuízo do procedi- mento especial (§, único). Todavia, suprimiu o inciso III do art. 921, do CPC/1973 que previa a possibilidade de ser cumulado o pleito de desfazimento de construção ou plantação feita em detrimento da posse do autor. Em razão do caráter dúplice das ações possessórias, é lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor (art. 556). Esse dispositivo autoriza ao demandando formular pedidos em sede de contestação, sem necessidade de reconvir. Feitas essas considerações iniciais, iniciemos os estudos das altera- ções mais relevantes realizadas pelo CPC/2015. Pois bem, em relação à vedação de propositura, tanto pelo autor como pelo réu, de ação petitória durante o trâmite do processo pos- Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 27 MARIA TEREZA TARGINO HORA sessório, o Novo CPC introduziu a ressalva de que tal impedimen- to não se aplica nos casos em que a pretensão for introduzida por terceira pessoa. Isto é, a vedação prevista no art. 557 do Novo CPC somente se aplica as partes da ação, não alcançando terceiros estra- nhos à lide possessória. Por oportuno, trago à baila o Enunciado 65 do FFPC, que assim dis- põe: “O art. 557 do projeto não obsta a cumulação pelo autor de açãoreivindicatória e de ação possessória, se os fundamentos forem dis- tintos”. Ademais, o Código de Processo Civil de 2015 mantém a exigência de prestação de caução quando o réu comprovar que o autor rein- tegrado ou mantido provisoriamente na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de sucumbência, responder por perdas e da- nos (art. 559). Todavia, existem duas novidades referentes à caução. A primeira é que o artigo em análise expressamente dispõe que a caução poderá ser real ou fidejussória; a segunda inovação é permitir que a parte economicamente hipossuficiente seja liberada da pres- tação de caução. Ao comentar esta última novidade, o Professor Daniel Amorim As- sumpção9, registra que esta regra é de difícil compreensão, vez que sendo requisito da exigência de prestação de caução a fal- ta de idoneidade financeira, como afastá-la para os econo- micamente hipossuficientes? Ao que parece, o dispositivo se valeu de expressões diferentes para indicar o autor que não tem condições de arcar com eventuais perdas e da- nos do réu, e ao mesmo tempo prevê que essa condição é causa para a exigência e dispensa de caução. O paradoxo criado pela norma é garantia de polêmica. 9 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op.cit., p. 359. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 28 MARIA TEREZA TARGINO HORA Para melhor compreensão da matéria, transcreverei os dispositivos ora comentados, grifando as modificações introduzidas pelo Novo CPC: Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tan- to ao autor quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa. Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegra- ção de posse a alegação de propriedade ou de outro direi- to sobre a coisa. Art. 559. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor provisoriamente mantido ou reintegrado na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de sucumbência, responder por perdas e danos, o juiz designar-lhe-á o pra- zo de 5 (cinco) dias para requerer caução, real ou fidejus- sória, sob pena de ser depositada a coisa litigiosa, res- salvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente. Outro ponto de destaque quando da análise do Capítulo III do Novo CPC, que trata das Ações Possessórias, foi a introdução dos §1º, §2º e 3º ao art. 554, que discorrem sobre as ações posses- sórias multitudinárias, ou seja, aquelas ações que envolvem inú- meras pessoas, não sendo possível individualizar os ocupantes. Diante da importância do tema, imprescindível a leitura atenta dos parágrafos mencionados: § 1o No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no lo- cal e a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 29 MARIA TEREZA TARGINO HORA § 2o Para fim da citação pessoal prevista no § 1o, o ofi- cial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem en- contrados. § 3o O juiz deverá determinar que se dê ampla publici- dade da existência da ação prevista no § 1o e dos res- pectivos prazos processuais, podendo, para tanto, valer-se de anúncios em jornal ou rádio locais, da pu- blicação de cartazes na região do conflito e de outros meios. Conforme observado, os dois primeiros parágrafos dispõem basica- mente sobre a forma de citação dos réus nas ações multitudinárias. Aqueles que forem encontrados no local serão citados pessoalmen- te e, os demais, deverão ser citados por edital. O parágrafo segun- do, determina que o oficial somente procurará os ocupantes no lo- cal uma vez, citando-se por edital os que no momento não forem encontrados. Ademais, a intimação do Ministério Público nos interditos posses- sórios em que figure no polo passivo grande número de pessoas é obrigatória, assim como a da Defensoria Pública, se existirem réus em situação de hipossuficiência econômica. Por sua vez, o parágrafo terceiro determina que deverá ser dada am- pla publicidade à existência da ação possessória multitudinária e dos seus prazos processuais. Ao comentar o novel dispositivo, Daniel Amorim Assumpção Neves10, faz a seguinte ponderação: Como a experiência mostra, a grande maioria dos réus nesse tipo de ação possessória será citada por edital, e é notória a ineficácia desse meio de tornar a existência 10 NEVES, Daniel Amorim Assumpção.op.cit. 2015, p. 360. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 30 MARIA TEREZA TARGINO HORA do processo conhecida. Por isso, elogiável o art. 554, §3º ao prever ampla publicidade da existência da ação e também dos prazos processuais por outros meios além do edital, tais como anúncios em jornal ou rádios locais e publicação de cartazes na região do conflito. De qual- quer forma, na maioria das vezes, a liderança do movi- mento responsável pela agressão possessória toma co- nhecimento da existência do processo judicial e de seu andamento. Ainda a respeito do tema, o Enunciado 63 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: No caso de ação possessória em que figure no polo passi- vo grande número de pessoas, a ampla divulgação previs- ta no §3º do art. 554 contempla a inteligência do art. 301, com a possibilidade de determinação de registro de pro- testo para consignar a informação do litígio possessório na matrícula imobiliária respectiva. Em relação ao procedimento das ações possessórias regulado pelo Código de Processo Civil de 2015, a única novidade diz respeito à in- trodução do art. 565 e seus parágrafos, que discorrem sobre o litígio coletivo pela posse de imóvel. O caput do dispositivo dispõe que nesse tipo de demanda, quan- do o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, obrigatoriamente deverá desig- nar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias. O parágrafo primeiro dispõe, ainda, que se a liminar concedida não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data de dis- tribuição, também caberá ao magistrado designar audiência de mediação. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 31 MARIA TEREZA TARGINO HORA Ao comentar o mencionado artigo, Brunela Vieira Vicenzi e Fernanda Pompermayer Almeida de Oliveira11 discorrem que previsão de audiência de mediação obrigatória garante não só a possibilidade de solução pacífica dos conflitos, mas também o direito à ampla defesa e ao contraditório. Isso porque, no CPC/1973 na hipótese de não retratação quanto à concessão de tutela liminarmente, resta à parte prejudicada somente a possibilidade de interpor agravo de instrumento (...). Por sua vez, a mediação prevista no Novo CPC permitirá não só que os indivíduos formulem sua defesa de forma mais livre – menos formalidade e mais oralidade, mas também que exponham todos os seus ar- gumentos de forma direta, perante o autor da ação e o juiz de primeiro grau que proferiu a decisão. O Ministério Público, em qualquer caso, será intimado para com- parecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça (§2º). Ade- mais, o magistrado poderá comparecer à área objeto do litígio sempre que sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional (§3º). Por fim, o parágrafo quarto aponta que os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana daUnião, de Estado ou do Dis- trito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio po- derão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório. 11 VICENZI, Brunela Vieira e Fernanda P. A. de Oliveira. Procedimentos Especiais, Tutela Provisória e Direito Transitório. Estamos indo em direção à Função Social da Posse? Análise das Inovações para Julgamento de Conflitos Possessórios no Novo CPC. Editora Método. 2015, p. 339. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 32 MARIA TEREZA TARGINO HORA Assim, observa-se que as intimações previstas pelo §2º constituem um dever do magistrado, enquanto que as intimações dispostas no §4º são meramente facultativas, isto é, cabe ao juiz, no caso concreto, analisar se a presença dos órgãos acima mencionados são, de fato, capazes de contribuir na solução do litígio. Todos esses procedimentos também são aplicáveis aos litígios que dizem respeito ao domínio ou propriedade, ou seja, também nos juízos petitórios (§5º). A título de exemplo, todos esses procedi- mentos devem incidir para os casos de desapropriação judicial pri- vada por posse trabalho, prevista nos §4º e §5º do art. 1228 do Có- digo Civil. 1.4) DA AÇÃO DE DIVISÃO E DEMARCAÇÃO DE TERRAS PARTICULARES A ação de demarcação cabe ao proprietário, para obrigar o seu con- finante a estremar os respectivos prédios, fixando-se novos limites entre eles ou se aviventando os já apagados. Já a ação de divisão, tem por objetivo a dissolução do condomínio, transformando a cota ideal de cada condômino sobre o prédio comum em parte concreta e determinada. A respeito do tema, o Professor Cintra Pereira 12 esclarece que: Embora o Código de Processo Civil tenha regulado as duas ações em um mesmo capítulo, evidencia – se, todavia, si- tuações distintas: a demarcatória pressupõe a existência de dois prédios confiantes cujos limites não estejam per- feitamente estremados. Há confusão de limites ou, pelo menos, incerteza quanto à exata extensão das respectivas propriedades (...). A divisão, por seu turno, pressupõe um só imóvel que pertença a dois ou mais proprietários que se 12 MARCATO, Antônio Carlos. Código de Processo Civil Interpretado. 2008, p. 2708. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 33 MARIA TEREZA TARGINO HORA encontram dispostos a extinguir o condomínio. Em suma, a demarcação está ligada ao direito de vizinhança; a divi- são é forma de extinguir a comunhão. O art. art. 569 prevê que cabe ao proprietário a ação de demarcação, para obrigar o seu confinante a estremar os respectivos prédios, fi- xando-se novos limites entre eles ou se aviventando os já apagados e ao condômino a ação de divisão, para obrigar os demais consortes a estremar os quinhões. Existem dois Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis a respeito do tema. Vejamos: Enunciado 68 - Também possuem legitimidade para a ação demarcatória os titulares de direito real de gozo e fruição, nos limites dos seus respectivos direitos e títulos constitutivos de direito real. Assim, além da proprieda- de, aplicam-se os dispositivos do Capítulo sobre ação demarcatória, no que for cabível, em relação aos direi- tos reais de gozo e fruição(grifo nosso). Enunciado 69 - Cabe ao proprietário ação demarcatória para extremar a demarcação entre o seu prédio e do con- finante, bem como fixar novos limites, aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos (grifo nosso). Imperioso assinalar que é lícita a cumulação dessas ações, caso em que se deverá processar primeiramente a demarcação total ou parcial da coisa comum, citando-se os confinantes e os condôminos (art. 570). O Novo Código de Processo Civil insere dois novos artigos ao Capí- tulo IV, que trata da Ação de Divisão de Demarcação de Terras Parti- culares. O primeiro deles é o art. 571 o qual prevê que a demarcação e a divisão poderão ser realizadas por escritura pública, desde que maiores, capazes e concordes todos os interessados. Já o art. 573 Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 34 MARIA TEREZA TARGINO HORA dispõe que se o imóvel em análise for georreferenciado, com aver- bação no registro de imóveis, pode o juiz dispensar a realização de prova pericial. Outra novidade está prevista no art. 575 que dispõe que qualquer condômino é parte legítima para promover a demarcação do imóvel comum, requerendo a intimação dos demais para, querendo, intervir no processo. Registre–se que no CPC/1973 os demais condôminos deveriam ser citados para ingressarem no feito como litisconsortes. A forma de citação dos réus também sofreu alteração, tendo em vista que o art. 576 expressamente aponta que os réus serão citados pelo correio, observado o disposto no art. 247, cabendo a citação por edi- tal somente nas hipóteses previstas em lei para tal modo de citação. Por sua vez, o artigo correspondente no CPC/1973 dispunha que os demandados residentes na comarca deveriam ser citados por pes- soalmente, enquanto os demais por edital. Já o art. 581, caput, do Novo CPC reproduz a regra consagrada no Có- digo anterior, qual seja, a de que a sentença que julgar procedente o pedido determinará o traçado da linha demarcada. A inovação está no seu parágrafo único, sem precedentes no CPC/1973, ao dispor que a sentença proferida na ação demarcatória determinará a resti- tuição da área invadida, se houver, além de declarar o domínio ou a posse do prejudicado, ou de ambos. Assim como no art. 962 do CPC/1973, o art. 583 do NCPC estabelece que as plantas serão acompanhadas das cadernetas de operações de campo e do memorial descritivo, e seus incisos indicam os requisitos formais do referido memorial. Merece destaque a atualização feita pelo inciso VI, ao estabelecer que as distâncias a pontos de referên- cia, tais como rodovias federais e estaduais, ferrovias, portos, aglo- merações urbanas e polos comerciais, deixando, assim, de se referir à estação da estrada de ferro, ao porto de embarque e ao mercado mais próximo, como constado no Código revogado. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 35 MARIA TEREZA TARGINO HORA Por fim, registro o art. 590 o qual dispõe que o juiz nomeará um ou mais peritos para promover a medição do imóvel e as operações de divisão, observada a legislação especial que dispõe sobre a identifi- cação do imóvel rural. Ademais, o seu parágrafo único, inova ao assi- nalar que o perito deverá indicar as vias de comunicação existentes, as construções e as benfeitorias, com a indicação dos seus valores e dos respectivos proprietários e ocupantes, as águas principais que banham o imóvel e quaisquer outras informações que possam con- correr para facilitar a partilha. 1.5) DA AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE O Novo Código de Processo Civil cria no Título III, que trata dos procedimentos especiais, um novo procedimento denominado de ação de dissolução parcial de sociedade, regulamentado pelos arts. 599 a 609. O CPC/1973 não continha dispositivos específicos acerca da maté- ria. O seu art. 1.218, inciso VIII, inserido no livro das disposições fi- nais e transitórias, manteve em vigor os arts. 655 a 674 do CPC/1939, que regulavam a “dissolução e liquidação de sociedades”, até que o procedimento viesse a ser regulamentado por lei especial. Tal le- gislação nunca foi editada, de modo que, atualmente, as regras de dissolução e liquidação da sociedade continuaram sendo as esta- belecidas no CPC/1939. Ocorre que, tais regras, dizem respeito à dissolução total da socieda- de e não à dissolução parcial. É total a dissolução quando ocorre a ex-tinção e liquidação desta. É parcial quando um ou alguns dos sócios se desligam da sociedade, mas ela continua existindo. Assim, não existiam regras procedimentais próprias sobre a dissolução parcial de sociedade, razão pela qual o Novo CPC inova ao criar um regra- mento processual específico para a hipótese de desfazimento parcial dos laços societários. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 36 MARIA TEREZA TARGINO HORA Pois bem, o art. 599 dispõe que o objeto da ação de dissolução pode- rá ser: a) a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; b) a apuração dos haveres do sócio falecido, ex- cluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou c) somente a resolução ou a apuração de haveres. Ou seja, ação pode ser propos- ta para que o magistrado decrete a dissolução parcial da sociedade e apure os haveres ou, igualmente, apenas para que seja feita a apura- ção de haveres ou se dissolva a sociedade. O processualista João Luiz Lessa Neto13 ressalta que para ser propos- ta a ação, deverá existir conflito entre os sócios, não sendo possível a dissolução extrajudicial ou por inexistir acordo sobre os haveres a serem pagos. Inexistindo conflito entre os sócios, e podendo a disso- lução ser realizada adequadamente extrajudicialmente, faltará inte- resse de agir para a propositura da ação. Complementa que podem existir conflitos em relação a dois pontos principais: a reso- lução da sociedade e a apuração de haveres. A ação de dis- solução parcial poderá ter por objeto esses dois pontos, que serão conhecidos e decididos em fases procedimentais sub- sequentes, ou ainda, apenas um deles. É possível, por exem- plo, que exista consenso quanto à retirada de um sócio, mas divirjam os interessados sobre os haverem serem pagos a esses sócios pela liquidação de sua participação no capital social”. O §1º estabelece que a petição inicial deve ser instruída com o con- trato social consolidado. Assim, realizando-se uma interpretação 13 LESSA NETO, João Luiz. A Ação de Dissolução Parcial de Sociedade no Novo Código de Processo Civil – algumas Anotações. Procedimentos Especiais, Tutela Provisória e Direito Transitório. Editora Juspodivm. 2015, p. 406 Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 37 MARIA TEREZA TARGINO HORA analógica, nos casos de sociedade anônima, deve ser acostada à exordial o seu estatuto social. Por sua vez, o §2º alarga o seu objeto ao estabelecer que a ação também pode ser proposta nos casos de dissolução de sociedade anônima de capital fechado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim. Ou seja, exigem–se dois requisitos no caso de dissolução da S/A de capital fechado: o primeiro é a participação societária mínima e o segundo é a demonstração de que a sociedade não mais pode atingir o seu fim. Assim, percebe-se que o Novo CPC inova no tratamento legislativo da matéria, pois o artigo 206, inciso II, b, da Lei de Sociedades Anônimas trata apenas da hipótese de dissolução total da sociedade, quando não for possível preencher o seu fim social. Não há menção alguma à possibilidade de dissolução parcial das sociedades anônimas. Imperioso destacar que a matéria – dissolução parcial da sociedade anônima – não é novidade no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, que já pacificou o entendimento quanto à possibilidade de dissolu- ção parcial de sociedade anônima fechada de cunho familiar. O Ministro Castro Filho no julgamento do REsp 111.294/PR, pondera que a realidade brasileira revela a existência diversas sociedades anô- nimas de médio e pequeno porte, de capital fechado, que concen- tram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como ocorre com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuito perso- nae. Em casos que tais, deve ser reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa e tal circunstância não pode ser desconsiderada por ocasião de sua dissolu- ção, de modo que a ruptura da affectio societatis representa verdadei- ro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 38 MARIA TEREZA TARGINO HORA Significa dizer que para jurisprudência atual do STJ é possível a disso- lução parcial da sociedade anônima de cunho familiar quando hou- ver o rompimento da affectio societatis, sem a exigência de cumpri- mento de qualquer outro requisito, enquanto o Novo CPC exige uma participação societária mínima e o requisito de demonstração de que a sociedade não mais pode atingir o seu fim. Nos incisos II e III do art. 599 está previsto o pedido de apuração de haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de reti- rada ou recesso, que pode ser cumulado com o pedido de dissolução parcial ou elaborado isoladamente. Os legitimados ativos para o ajuizamento da ação em análise estão previstos no art. 600, que assim dispõe: Art. 600. A ação pode ser proposta: I - pelo espólio do sócio falecido, quando a totalidade dos sucessores não ingressar na sociedade; II - pelos sucessores, após concluída a partilha do sócio falecido; III - pela sociedade, se os sócios sobreviventes não admiti- rem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social; IV - pelo sócio que exerceu o direito de retirada ou re- cesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais só- cios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 (dez) dias do exercício do direito; V - pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; ou VI - pelo sócio excluído. O parágrafo único estabelece, ainda, que o cônjuge ou companhei- ro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 39 MARIA TEREZA TARGINO HORA poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por aquele sócio. O Novo CPC, em seu art. 601, elenca espécie de litisconsórcio passivo necessário entre os demais sócios e a sociedade para que, no prazo de 15 (quinze) dias, concordem com o pedido ou apresentem contes- tação. Por sua vez, o parágrafo único faculta a citação da sociedade se todos os seus sócios o forem, fazendo a ressalva de que, mesmo nes- se caso, aquela ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada. Dani A. A. Neves14, ao comentar o último dispositivo, faz a seguinte crítica: O parágrafo único, apesar de boa intenção e encontrar am- paro em jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça, foi formulado de forma sofrível e apta a suscitar dúvidas na academia e na praxe forense. Aparentemente, o objetivo do legislador era dispensar a presença da sociedade no polo passivo na hipótese de todos os sócios participarem da demanda, o que não tornaria o litisconsórcio necessá- rio, ao menos quanto à sociedade. A sua inclusão, portan- to, seria facultativa A literalidade da norma, entretanto, não permite tal con- clusão, porque não dispensa a presença da sociedade no polo passivo, mas apenas sua citação. E, para que seja dispensada sua citação, é natural que a sociedade esteja no polo passivo, afinal, não há que se falar em citação de quem não é réu no processo. Registre-se que, nos termos do art. 602, o valor apurado em favor do sócio que se busca excluir da sociedade poderáser compensan- do com o valor devido à sociedade de natureza indenizatória. Como 14 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op.cit., p. 371. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 40 MARIA TEREZA TARGINO HORA a sociedade tem legitimidade ativa e passiva na ação de dissolução parcial da sociedade, o pedido de compensação poderá ser formula- do tanto na petição inicial, como na contestação, quando terá natu- reza convencional. Pois bem, existindo manifestação expressa e unânime pela concor- dância da dissolução, o juiz a decretará, passando-se imediatamente à fase de liquidação (art. 603, caput). Nesse caso, não haverá conde- nação em honorários advocatícios de nenhuma das partes e as cus- tas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social (§1º). Em contrapartida, havendo contestação, observar-se-á o pro- cedimento comum (§2º). Ultrapassada a etapa de dissolução da sociedade, passa-se a segun- da fase do procedimento especial em estudo, qual seja a apuração de haveres. Esta nada mais é que o levantamento dos valores refe- rentes à participação do sócio que se retira ou que é excluído da sociedade. Nos termos do art. 604, para apuração de haveres, o juiz: a) fixará a data da resolução da sociedade; b) definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social e c) nomeará o perito. Não há discricionariedade para o juiz fixar a data da dissolução, vez que esta deverá ser estabelecida conforme os critérios previstos no art. 605, in verbis: I - no caso de falecimento do sócio, a do óbito; II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do re- cebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante; III - no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente; IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo de- terminado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 41 MARIA TEREZA TARGINO HORA V - na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado. No que diz respeito ao critério de apuração de haveres, o juiz deve- rá sempre respeitar aquilo que estiver pactuado entre as partes no contrato social ou em acordo de sócios. Ou seja, apenas em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determina- ção, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma, consoante disposto no art. 606 do Novo CPC. A propósito, O Superior Tribunal de Justiça, atualmente, possui enten- dimento consolidado no sentido de que em respeito à preservação da sociedade e do montante devido ao sócio dissidente, mesmo que o contrato social eleja critério para a apuração de haveres, este somen- te prevalecerá caso haja a concordância das partes com o resultado alcançado. Existindo dissenso, faculta-se a adoção da via judicial e o critério que melhor reflete o valor patrimonial da empresa é o balanço de determinação, de modo que a novel legislação processualista, ao elencar como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apu- rado em balanço de determinação, está em plena consonância com as recentes decisões proferidas por nossa Corte Superior. Senão, vejamos: DIREITO EMPRESARIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIE- DADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. SÓCIO DISSIDENTE. CRITÉRIOS PARA APURAÇÃO DE HAVE- RES. BALANÇO DE DETERMINAÇÃO. FLUXO DE CAIXA. 1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o critério previsto no con- trato social para a apuração dos haveres do sócio re- tirante somente prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 42 MARIA TEREZA TARGINO HORA 2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de determinação é o critério que melhor re- flete o valor patrimonial da empresa. 3. O fluxo de caixa descontado, por representar a meto- dologia que melhor revela a situação econômica e a capa- cidade de geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado juntamente com o balanço de determinação na apuração de haveres do sócio dissidente. 4. Recurso especial desprovido.(STJ - REsp: 1335619 SP 2011/0266256-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/03/2015, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/03/2015) Vale lembrar que em todos os casos em que for necessária a realiza- ção de perícia, a nomeação do perito deverá recair preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades (§ único), bem como que a data da resolução e o critério de apuração de haveres podem ser revistos pelo juiz, a pedido da parte, a qualquer tempo antes de iniciada a perícia (art. 607). Por fim, nos termos do art. 604, §1º, o juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem, que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos, podendo tal depósito ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucesso- res (§2º). Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 43 MARIA TEREZA TARGINO HORA 1.6) DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA Com a morte, termina a responsabilidade civil do homem, tem início a sucessão e ocorre a transmissão dos bens aos herdeiros do de cujus. Segundo Maria Berenice Dias15 “inventário, em sentido estrito, é o rol de todos os bens e responsabilidades patrimoniais de um indivíduo. Na acepção ampla, é o procedimento destinado a individualizar o pa- trimônio dos herdeiros e entregar os bens a seus titulares”. Acrescenta a autora que o inventário pode processar-se judicial ou ex- trajudicialmente; de forma amigável ou contenciosa; pelo rito do in- ventário ou do arrolamento. A lei fornece um cardápio de opções e a escolha dependerá da capacidade dos herdeiros, da existência de testamento e da concordância dos herdeiros quanto à divisão de bens. Flávio Tartuce16, em sua obra Direito das Sucessões, pondera que o objetivo do procedimento, é a liquidação dos bens e a divisão patri- monial do acervo hereditário, cessando o condomínio legal pro indi- viso existente entre os herdeiros, situação não desejada pelas partes envolvidas. Em relação ao instituto em análise, o art. 1991 do Código Civil de 2002 dispõe que “desde a assinatura do compromisso, até a homo- logação da partilha, a administração da herança será exercida pelo inventariante”. Isto é, o inventariante é o administrador do espólio, que pode ser conceituado como o conjunto dos bens que integra o patrimônio deixado pelo de cujus, e que serão partilhados, no inven- tário, entre os herdeiros ou legatários. O Novo Código de Processo Civil, assim como o Código anterior, tra- ta de forma ampla os procedimentos de inventário e partilha e aca- 15 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. Editora: Revista dos Tribunais. 2009, p.55. 16 TARTUCE, Flávio. Direito das Sucessões. Editora: Método. 2015, p.552. Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 44 MARIA TEREZA TARGINO HORA ba por repetir a maioria das regras outrora previstas. Nesse sentido, Marcus Vinicius Rios Gonçalves17 registra que não há no Novo CPC alterações muito significativas no processo de inventário. Segundo o renomado processualista, as principais mudanças são: • Muitos dos prazos mencionados no CPC/1973 foram aumentados;• Não se repetiu a possibilidade de o juiz, de ofício, determinar a sua abertura; • Nos termos do art. 654, parágrafo único: “A existência de dívida para com a Fazenda Pública não impedirá o julgamento da parti- lha, desde que o seu pagamento esteja devidamente garantido” • O arrolamento continua previsto como forma simplificada de in- ventário para a hipótese de os bens do espólio serem de peque- no valor, até o limite de 1.000 salários mínimos, não mais 2.000 OTNS, como no Código de 1973. Continua também havendo pre- visão do arrolamento sumário, com os mesmos requisitos. O art. 610, caput, do CPC/2015 praticamente repetiu as regras pre- vistas no art. 982 do CPC/1973, ao dispor que havendo testamento ou interessado incapaz, proceder –se–á ao inventário judicial. O §1º, por sua vez, admite que o inventário e a partilha sejam feitos por es- critura pública, isto é, extrajudicialmente, se todos forem capazes e concordes. Nas palavras de Daniel Amorim Assumpção18: A inovação fica por conta de duas previsões do §1º do art. 610 do Novo CPC. Primeiro, o dispositivo esclarece que a escritura pública servirá como documento hábil para qualquer ato de registro, e não só para o registro para o 17 GONÇAVES, Marcus Vinicius Rios. Op.cit, p.883. 18 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op.cit., p. 372. Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 45 MARIA TEREZA TARGINO HORA registro imobiliário, como era previsto no antigo disposi- tivo. Segundo, o dispositivo indica expressamente que a escritura pública é documento hábil para levantamento de importância depositada em instituições financeiras”. Não é demais lembrar que o inventário extrajudicial não é forma obrigatória, mas sim facultativa. Isto é, caso as partes prefiram o in- ventário judicial ao extrajudicial, poderão os herdeiros dele se utilizar seguindo as normas previstas na legislação processual civil. O Novo CPC estabelece, ainda, novo prazo para abertura do inventá- rio: o processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte. Com isso, o prazo de 60 (sessenta) dias previsto no CPC/1973 foi modificado, com a preserva- ção da possibilidade de prorrogação do prazo de abertura, a pedido do interessado ou de ofício pelo magistrado. Observa-se que, assim como a legislação anterior, o Novo Estatuto Processual, não consagra nenhum tipo de sanção em caso de des- cumprimento do mencionado prazo. Todavia, a ausência de previsão não impede/impedirá que cada Estado institua multa pelo retarda- mento do início do inventário. É esse o entendimento consagrado na Súmula 542 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual é consti- tucional a multa instituída pelo Estado– Membro, como sanção pelo retardamento do início ou da ultimação do inventário. Assim, não ha- vendo a abertura do inventário no prazo previsto, as partes ficaram sujeitas à multa, que poderá ser estabelecida por lei estadual. Nos termos do art. 613 do CPC/2015, até que o inventariante preste o compromisso, continuará o espólio na posse do administrador provi- sório. Complementando, o art. 614 esclarece que este representa ati- va e passivamente o espólio e é obrigado a trazer ao acervo os frutos Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 46 MARIA TEREZA TARGINO HORA que desde a abertura da sucessão percebeu, bem como tem direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez e responde pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa. O art. 615 que trata da legitimidade para requerer a abertura do in- ventário e da respectiva partilha, repete o art. 987 do CPC/1973, ao dispor que aquela caberá a quem estiver na posse e na administração do espólio. Ademais, o referido dispositivo, em seu parágrafo único, mantém a exigência de que o requerimento deverá ser instruído com a certidão de óbito do autor da herança. O art. 616, equivalente ao art. 987 do Estatuto revogado, apresenta, de forma não taxativa, o rol de legitimados concorrentes para reque- rer a abertura do inventário. São eles: I - o cônjuge ou companheiro supérstite: o herdeiro; o legatário; o testamenteiro; o cessionário do herdeiro ou do legatário; o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança; o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; a Fazenda Pública, quando tiver interesse; o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supérstite. Assim, extrai–se da leitura do dispositivo que houve a inclusão expressa do companheiro como legitimado, assim como a substituição do termo “síndico da falência” por “admi- nistrador judicial da falência”. Frise-se que, consoante mencionado no início desse tópico, não exis- te mais a possibilidade de abertura do inventário de ofício pelo ma- gistrado. Após aberto o inventário, o juiz nomeará o inventariante que passará a exercer as suas atribuições após prestar compromisso. Ele substitui o administrador provisório, que até então estava incumbido de zelar pelo espólio e administrar os bens. O art. 617, correspondente do art. 980 do CPC/1973, estabelece a ordem sucessiva de pessoas que po- derão ser nomeadas inventariantes pelo magistrado, in verbis: Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa 47 MARIA TEREZA TARGINO HORA I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que es- tivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste; II - o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevi- vente ou se estes não puderem ser nomeados; III - qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio; IV - o herdeiro menor, por seu representante legal; V - o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administra- ção do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados; VI - o cessionário do herdeiro ou do legatário; VII - o inventariante judicial, se houver; VIII - pessoa estranha idônea, quando não houver inventa- riante judicial. Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhar a função. Em relação a esse ponto, verificam – se duas inclusões: o herdeiro me- nor, por seu representante legal no inciso IV e o cessionário de her- deiro ou legatário no inciso VI. Assim, resta superado o entendimento jurisprudencial no sentido de que a inventariança somente poderia ser exercida pelos herdeiros maiores e capazes. A propósito, confira-se o seguinte julgado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INVENTÁRIO. TESTA- MENTO. NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE. ORDEM LEGAL. ART. 990 DO CPC. NOMEAÇÃO DE TESTAMENTEIRO. IM- POSSIBILIDADE. HERDEIROS TESTAMENTÁRIOS, MAIORES E CAPAZES. PREFERÊNCIA. - Para efeitos de nomeação de inventariante, os herdeiros testamentários são equipara- dos aos herdeiros necessários e legítimos. - Herdeiro me- nor ou incapaz não pode ser nomeado inventariante, Os Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa e de Jurisdição Voluntária no novo Código de Processo Civil 48 MARIA TEREZA TARGINO HORA pois é impossibilitado de praticar ou receber direta- mente atos processuais; sendo que para os quais não é possível o suprimento da incapacidade, uma vez que a função de inventariante é personalíssima. - Os herdeiros testamentários, maiores e capazes, preferem ao testamenteiro na ordem para nomeação de inventariante. - Existindo herdeiros maiores e capazes, viola o inciso III, do art. 990, do CPC, a nomeação de testamenteiro como inventariante. Recurso especial conhecido
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