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FACULDADE MORAES JUNIOR MACKENZIE RIO As duas faces do sistema penitenciário: uma abordagem do convívio entre presos e agentes penitenciários OBJETIVO Promover uma reflexão crítica sobre as relações estabelecidas entre presos e agentes penitenciários na construção da realidade própria do sistema prisional e suas repercussões na subjetividade desses sujeitos. METODOLOGIA O presente seminário foi desenvolvido a partir da seleção de artigos científicos que tratam da influência do sistema prisional ora na subjetividade dos presos, ora na subjetividade dos agentes penitenciários, de modo a permitir uma visão global das relações constituídas no ambiente penitenciário. O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO O antecedente do sistema prisional: o suplício como espetáculo punitivo estendeu-se até o início do século XIX; A partir do século XIX, as penalidades foram convertendo-se em detenção; e a prisão, neste contexto, marca um momento importante na história da justiça penal; A Colônia de Mettray, inaugurada em Paris, no ano de 1839, inova ao estabelecer um liame entre a punição e a reeducação dos presos mediante trabalho forçado, instrução primária e religiosa; O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO No Brasil, o Código Criminal do Império, de 1830, previa onze classes de penas: morte, galés, prisão com trabalho, prisão simples, banimento, degredo, desterro, multa, suspensão do emprego, perda do emprego e açoites; A proclamação da República ensejou a elaboração de um novo Código Penal, de 1890, que previa as seguintes penas: prisão celular, reclusão em fortalezas, prisão com trabalho obrigatório e prisão disciplinar para menores; O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO O Código Penal de 1940 encerrou a transição histórica da pena e estabeleceu a reclusão e a detenção como as espécies de penas privativas de liberdade; Segundo Dotti1, a prisão tem sido a esperança das estruturas formais do Direito para combater a criminalidade, mas a degradação do sistema penitenciário a níveis intoleráveis vem sendo a frequente prova de que os presídios brasileiros são verdadeiros depósitos de pessoas e permanentes fatores criminógenos; 1 DOTTI, René Ariel,1998 apud MAMELUQUE, Maria da Glória Caxito. A subjetividade do Encarcerado, um Desafio para a Psicologia, 2006, Revista Psicologia Ciência e Profissão, V. 26, p.626. 5 O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO A realidade do sistema carcerário brasileiro, sob o olhar de Carnelutti2, enfatiza que “o recluso deixa de sentir-se um homem. O signo do homem é seu nome, e o recluso já não tem nome. A essência do homem é a individualidade, e o recluso já não tem individualidade”; Todo ser humano é uma unidade complexa natural e cultural: sentimos necessidades, temos desejos, sentimentos, angústias, temores imaginários, racionalidade e paixões; 2 Carnelutti apud DOTTI, René Ariel,1998 apud MAMELUQUE, Maria da Glória Caxito. Op.Cit. 6 O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO A subjetividade é a síntese singular e individual que cada um de nós vai construindo segundo as experiências da vida social e cultural; Segundo Foucault3, o poder estatal interfere e determina as relações humanas e, em consequência, é elemento constitutivo importante na construção da subjetividade do indivíduo; A atual conjuntura do sistema penitenciário desvaloriza a vida humana e impõe aos presos uma nova forma de pensar e sentir que impregna na subjetividade dos egressos; 3 Foucault,2004 apud MAMELUQUE, Maria da Glória Caxito. Op.Cit. 7 O SISTEMA PENITENCIÁRIO E O PRESO O sistema penitenciário, portanto, estigmatiza e trata os presos como “coisa”; e os reflexos dessa desumanização estimulam a banalização da vida e acentuam a incapacidade de ressocialização do sistema, transformada em um aumento da violência e consequente reincidência delituosa; A reabilitação é socialmente aceita como um meio de reinserção, porém o egresso desse meio, contraditoriamente, não o é, o que revela o potencial de segregação social do crime; 8 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA A função do agente penitenciário sempre esteve associada ao encarceramento, à exclusão e à violência, motivo por que poucos eram aqueles que se interessavam em exercê-la; Houve época em que os indicados a ocupar a função de carcereiro poderiam ser presos caso se recusassem a desempenhá-la; O primeiro documento, no Brasil, que descreve de forma detalhada a função do “Guarda de Presídio” foi o Decreto 3.706, de 29 de abril de 1924, época em que agentes eram escolhidos e nomeados pelo diretor do estabelecimento penal; 9 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA A partir da década de 1970, o concurso público firmou-se como meio para o ingresso na carreira de agente penitenciário, que em virtude de um cenário econômico de recessão veio atraindo um número crescente de interessados, em busca de estabilidade e melhor remuneração; O convívio dos agentes penitenciários com os presos exige a construção de hábitos e valores em sintonia com a realidade do sistema prisional do qual passam a fazer parte; 10 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA A linguagem é o principal instrumento de inserção do agente penitenciário, pois na realidade do sistema prisional é dotada de uma significação própria e exclusiva daquele contexto, carregada de duplos sentidos; A título de exemplo, o termo “entendeu” é usado como substituto de “entendi”, sendo que “entendi” é associado a homossexualidade; A linguagem das penitenciárias é evitada pelos agentes penitenciários para além dos muros das prisões, pois são desvalorizadas socialmente; 11 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA A imagem negativa perante a sociedade aliada à sensação de abandono pelo Estado negam qualquer possibilidade de reconhecimento do trabalho dos agentes penitenciários; O reconhecimento é decisivo na dinâmica da mobilização subjetiva da inteligência e da personalidade no trabalho, pois o esforço no trabalho somente adquire sentido quando reconhecida a sua necessidade e qualidade4; 4 Dejours, 2006 apud FRANCISCO, José Márcio e SANTIAGO, Eneida Silveira. Agentes de Segurança Penitenciária: a convivência social própria do sistema prisional e a convivência dos relacionamentos sociais fora do ambiente profissional. 12 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA A inexistência de reconhecimento externo fundamenta o que Dejours5 denomina estratégia coletiva de defesa, através da qual os agentes penitenciários buscam motivação no sentimento de pertencimento ao grupo pela via da exacerbação da virilidade; A virilidade confere à identidade sexual masculina a capacidade de expressão do poder pela força, agressividade, violência e dominação, que aproxima os agentes dos presos e, consequentemente, os afasta da sociedade; 5 Dejours, 2005 apud FRANCISCO, José Márcio e SANTIAGO, Eneida Silveira. Op. Cit. 13 O AGENTE PENITENCIÁRIO E O SISTEMA Os reflexos dessa aproximação-segregação estão retratados na inversão de polaridade em mão dupla: A imagem dos presos é positivada, na medida em que os agentes percebem o grau de articulação e organização promovidos pelas facções criminosas; A autoimagem dos agentes recobre-se de negatividade, pois a vivência no sistema é desvalorizada pela sociedade e o Estado não garante condições adequados para o trabalho, o que produz uma sensação de abandono; 14 AGENTE PENITENCIÁRIO E PRESOS: AS DUAS FACES DE UMA MOEDA PODRE A atual conjuntura do sistema penitenciário brasileiro é fator determinante para a convergência da imagem de presos e agentes prisionais para a marginalização social; A marginalização repercute na construção da subjetividade desses indivíduos, que recorrem a uma estratégia coletiva de defesa baseada na virilidade, que alimenta uma realidade forjada sob a égide da agressividade, dominação e violência; 15 AGENTE PENITENCIÁRIO E PRESOS: AS DUAS FACES DE UMA MOEDA PODRE Os hábitos adquiridos na realidade do sistema penitenciário evidenciam esses mecanismos de defesa coletiva e promovem um círculo vicioso que distancia o sistema prisional real de seu papel ideal: a ressocialização; 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS MAMELUQUE, Maria da Glória Caxito. A subjetividade do Encarcerado, um Desafio para a Psicologia, 2006, Revista Psicologia Ciência e Profissão, V. 26. PIO, Cleuza. Sistema Prisional e Psicologia: inúmeros desafios, 2006, O Portal dos Psicólogos. <http://www.psicologia.pt/artigos/ ver_artigo.php?codigo=A0304>. Acessado em 14 de abril de 2014. FRANCISCO, José Márcio e SANTIAGO, Eneida Silveira. Agentes de Segurança Penitenciária: a convivência social própria do sistema prisional e a convivência dos relacionamentos sociais fora do ambiente profissional. LOPES, Rosalice. O Cotidiano da violência: o trabalho do agente de segurança penitenciária nas instituições prisionais. 17
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