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Lugar: França. Tempo: final do século XIX. Eis a jovem empregada doméstica, Augustine (Soko), têm um intenso ataque – que consiste em ir ao chão se debatendo – enquanto serve em um jantar na casa de seus patrões. Em seguida, acompanhamos ela ser levada pela prima a uma hospital local para ser avaliada. Sem muitas explicações, o médico do plantão afirma que a moça precisa ficar internada para alguns exames mais específicos. Um pouco mais a frente descobrimos que a instituição onde Augustine se tornou paciente não é um simples hospital, mas uma especie de sanatório de responsabilidade do professor Jean-Martin Charcot(Vincent Lindon). A enxuta abertura de Augustine citada nesse primeiro parágrafo remonta um passado distante sobre Charcot, pioneiro nos estudos neurológicos, e sua paciente mais famosa, Augustine.
Na clínica dirigida por Charcot apenas são aceitas pacientes femininas com suspeita de histeria, doença vista como controversa e então ainda não reconhecida “oficialmente” pela ciência. Entre a narrativa principal que acompanha o caso de Augustine, a estreante diretora Alice Winocour (também autora do roteiro) pontua a trama com alguns depoimentos de outras internas. Podem meio que engessar a narrativa de Augustine, mas tais declarações se fazem interessantes para quebrar a condição ficcional – trazendo certo ar documental – e lembrando ao espectador que está diante de uma história verídica, além de levantar algumas suspeitas sobre a conduta profissional de Charcot. Visto com reticências por seus colegas, o sisudo professor procura se tornar referência no assunto e encontra na assustada Augustine a “cobaia” ideal para seus estudos. No entanto, qual o limite da relação médico x paciente?
Sem fazer muito esforço, se pode remeter Augustine à Um Método Perigoso (2011), de David Cronenberg. No filme de Cronenberg, uma paciente feminina – também avaliada como histérica – divide as atenções de dois psicanalistas renomados: Sigmund Freud e Carl Jung. Entretanto, indo à contramão do que se poderia imaginar, Um Método Perigoso aposta bastante no viés sexual da história, o que rendeu certas polêmicas. Enquanto aqui, o trabalho de Alice Winocour parece ser muito mais rígido e fiel em relação ao recorte histórico. O clima é austero, evidenciado pela fotografia de tons acinzentados – sugerindo tristeza, melancolia – e uma trilha sonora que sempre deixa no ar a sugestão de que algo não vai acabar muito bem. E o relacionamento entre Augustine e Charcot nunca ganha contornos mais evidentes, apesar de muito ser externado através de olhares e gestos. Nesse sentido, não seria errado afirmar que o trabalho de Winocour detêm certa força imagética.
Apesar da dupla de protagonistas transmitirem uma especie de intensidade reprimida, abstraindo sentimentos, onde creio residir o grande mérito de Augustine, o filme possui algumas fragilidades evidentes. Uma delas, a qual considero crucial, é a histeria patológica de Augustine. A doença nunca parece realmente palpável, faltou mais aprofundamento nesse ponto. Então também não seria errado concluir que se nos momentos mais íntimos Soko entrega uma atuação razoavelmente convincente, o mesmo não pode ser dito quando está tendo os ataques. Tudo parece exageradamente anti-natural e forçado. Enquanto nas sessões públicas que Charcot usa para se auto-promover estimulando a histeria de Augustine através da hipnose, o ator Vincent Lindon demonstra estar imerso em seu personagem. A convincente interpretação de Lindon acaba por diminuir mais ainda esses momentos de Soko. Outro problema é a sub-utilização da personagem de Chiara Mastroianni, esposa de Charcot.
Enfim, Augustine não é dessas obras que tocam, principalmente por não conseguir trazer o espectador para dentro do filme, que observa tudo de uma forma deveras distanciada. No entanto, promove discussão e levanta questões pertinentes não somente sobre a história, mas como sua realizadora resolveu concebe-lá. Acredito que ainda escutarei falar mais vezes no nome de Alice Winocour.

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