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LEUCEMIAS 2 Copyright © Portal Educação 2013 – Portal Educação Todos os direitos reservados R: Sete de setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 Internacional: +55 (67) 3303-4520 atendimento@portaleducacao.com.br – Campo Grande-MS Endereço Internet: http://www.portaleducacao.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil Triagem Organização LTDA ME Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 Portal Educação P842l Leucemias / Portal Educação. - Campo Grande: Portal Educação, 2013. 112 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-8241-507-8 1. Leucemias. 2. Sangue – Análise. 3. Oncologia – Sangue. I. Portal Educação. II. Título. CDD 616.994 3 SUMÁRIO 1 ONCOGÊNESE .......................................................................................................................... 1.1 Ciclo Celular .............................................................................................................................. 2 ONCÓGENES .................................................................................................................. 2.1 Proto-oncógenes e genes supressores .................................................................................. 2.1.1 Gene p53 .................................................................................................................................... 2.2 Regulação da Apoptose ........................................................................................................... 2.3 Reparo do DNA ......................................................................................................................... 2.4 Tipos de reparo ......................................................................................................................... 2.5 Mutações ................................................................................................................................... 2.6 Alterações citogenéticas .......................................................................................................... 2.6.1 Numéricas ................................................................................................................................... 2.6.2 Estruturais ................................................................................................................................... 2.6.3 Qualitativas ................................................................................................................................. 2.7 Anormalidades Clonais ............................................................................................................ 3 NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS ............................................................................................ 3.1 Neoplasias linfoides ................................................................................................................. 3.2 Neoplasias mieloides ............................................................................................................... 3.3 Neoplasias de mastócitos ........................................................................................................ 4 ROTEIRO DIAGNÓSTICO DAS LEUCEMIAS LINFOIDES E MIELOIDES ............................... 5 MARCADORES IMUNOFENOTÍPICOS (IMUNOFENOTIPAGEM) ........................................... 5.1 Anticorpos monoclonais .......................................................................................................... 5.2 Imunofenotipagem .................................................................................................................... 4 5.3 Marcadores de linhagem B ...................................................................................................... 5.4 Marcadores de linhagem T ....................................................................................................... 6 MARCADORES MIELOIDES ..................................................................................................... 7 LEUCEMIA ................................................................................................................................. 7.1 Introdução ................................................................................................................................. 8 LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA ................................................................................................. 8.1 Leucemia mieloide aguda M0 (com mínima diferenciação) .................................................. 8.1.1 Característica da LMA-M0 .......................................................................................................... 8.1.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.1.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.1.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.2 Leucemia mieloide aguda M1 (sem maturação) ..................................................................... 8.2.1 Característica da LMA-M1 .......................................................................................................... 8.2.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.2.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.2.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.3 Leucemia mieloide aguda M2 (com maturação) ..................................................................... 8.3.1 Característica da LMA-M2 .......................................................................................................... 8.3.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.3.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.3.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.4 Leucemia promielocítica aguda M3 ......................................................................................... 8.4.1 Característica da LMA-M3 .......................................................................................................... 5 8.4.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.4.2.1Forma clássica ........................................................................................................................... 8.4.2.2Forma variante ........................................................................................................................... 8.4.3 Imunofenotipagem ......................................................................................................................8.4.4 Imuno-histoquímica ..................................................................................................................... 8.4.5 Citogenética ................................................................................................................................ 8.4.6 Tratamento.................................................................................................................................. 8.5 Leucemia mielomonocítica M4 ................................................................................................ 8.5.1 Característica da LMA-M4 .......................................................................................................... 8.5.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.5.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.5.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.6 Leucemia mielomonocítica M5 .................................................................................................... 8.6.1 Característica da LMA-M5 .......................................................................................................... 8.6.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.6.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.6.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.7 Eritroleucemia M6 ..................................................................................................................... 8.7.1 Característica da LMA-M6 .......................................................................................................... 8.7.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.7.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.7.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 8.8 Leucemia megacarioblástica M7 ................................................................................................. 6 8.8.1 Característica da LMA-M7 .......................................................................................................... 8.8.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) .................................................................... 8.8.2.1Citoquímica ................................................................................................................................ 8.8.3 Imunofenotipagem ...................................................................................................................... 9 LEUCEMIAS BIFENOTÍPICAS E BILINEARES ........................................................................ 10 LEUCEMIAS AGUDAS INDIFERENCIADAS ............................................................................ 11 LEUCEMIA BASOFÍLICA AGUDA ............................................................................................ 12 CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE LEUCEMIAS MIELOIDES AGUDAS ............................... 12.1 Clínica ........................................................................................................................................ 12.2 Laboratório ................................................................................................................................ 12.3 Tratamento ................................................................................................................................ 13 DEFINIÇÕES .............................................................................................................................. 14 GALERIA DE IMAGENS (FIG. 54 A FIG. 62) ............................................................................ 15 LEUCEMIA LINFOIDE AGUDA (LLA) ....................................................................................... 15.1 Epidemiologia ........................................................................................................................... 15.2 Etiologia e patogenia ................................................................................................................ 15.3 Diagnóstico ............................................................................................................................... 15.3.1 Manifestações clínicas ................................................................................................................ 15.3.2 Infiltração de SNC/testículo/mediastino ...................................................................................... 15.4 Diagnóstico laboratorial ........................................................................................................... 15.4.1 Hemograma, mielograma e biópsia ............................................................................................ 15.4.2 Exames bioquímicos ................................................................................................................... 15.4.3 Coagulação ................................................................................................................................. 7 15.5 Diagnóstico radiológico ........................................................................................................... 15.6 Liquor (líquido cefalorraquidiano) ........................................................................................... 15.7 Ultrassonografia ....................................................................................................................... 15.8 Diagnóstico diferencial............................................................................................................. 16 AVALIAÇÃO DO PACIENTE COM SUSPEITA DE LEUCEMIA................................................ 16.1 Avaliação diagnóstica .............................................................................................................. 16.2 Morfologia e citoquímica .......................................................................................................... 17 LEUCEMIA DO RECÉM – NASCIDO......................................................................................... 17.1 Classificação imunofenotípica ................................................................................................ 18 LEUCEMIA MIELOIDE CRÔNICA (LMC) .................................................................................. 18.1 Manifestações clínicas ............................................................................................................. 18.2 Quadro laboratorial ................................................................................................................... 18.3 Evolução .................................................................................................................................... 18.4 Diagnóstico diferencial............................................................................................................. 18.5 Transplante de medula óssea alogênica (TMO) ..................................................................... 19 LEUCEMIA LINFOIDE CRÔNICA ..............................................................................................19.1 Características biológicas ........................................................................................................ 19.2 Quadro clínico ........................................................................................................................... 19.3 Achados laboratoriais .............................................................................................................. 19.4 Fatores prognósticos ............................................................................................................... 20 LEUCEMIA PROLINFOCÍTICA .................................................................................................. 20.1 Manifestações clínicas ............................................................................................................. 20.2 Achados laboratoriais .............................................................................................................. 8 21 TRICOCITOLEUCEMIA (LEUCEMIA DE CÉLULAS PILOSAS) ............................................... 21.1 Quadro clínico e laboratorial ................................................................................................... REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 1 ONCOGÊNESE 9 Por meio deste estudo serão apresentadas bibliografias que demonstram as alterações que dão origem ao processo oncológico. O desenvolvimento embrionário, tal como a manutenção da homeostase dos tecidos e no reparo de lesões, é necessário para que haja equilíbrio entre proliferação e morte celular (apoptose). A vantagem proliferativa das células cancerosas é na verdade uma ruptura do equilíbrio entre proliferação e apoptose, em que tanto aumento da proliferação como redução da apoptose podem resultar na expansão do número de células. Pode-se dizer que os tumores são consequências de alterações moleculares que resultam da quebra de integridade funcional do ciclo celular, essas alterações conferem à célula habilidades capazes de determinar modificações de seu comportamento e estas alterações são responsáveis pela biologia do câncer. As células normais têm a capacidade de controlar o número de gerações até que elas entrem em estado de senescência, quando o crescimento cessa e posteriormente estas células morrem. As células que sobreviveram a este processo passam a se dividir indefinidamente sem invadir tecidos e são semelhantes às normais, assim sendo serão chamadas de células tumorais. Chama-se célula cancerígena aquela que é indiferenciada e adquire a capacidade de invadir tecidos, ou seja, a capacidade de metástase. Todas as neoplasias humanas têm uma característica comum: cada neoplasia constitui um clone derivado de uma célula que sofreu alterações críticas em seu DNA e transmite esta alteração a todas as suas descendentes. Neste sentido, cada neoplasia é uma doença genética, pois implica uma alteração do DNA. Mutações que originam as neoplasias podem ocorrer em uma célula somática e, portanto, não se transmitem às descendentes. Por outro lado, existem algumas alterações gênicas que são hereditárias BRCA1 em tumores de mama, e do gene Rb em retinoblastoma, sendo este último presente apenas em crianças. 10 Figura 1 - Etapas da carcinogênese mostrando agente agressor lesionando o DNA e alterando o ciclo celular multiplicando-se desordenadamente. 1.1 Ciclo celular O período da interfase denominado S, quando ocorre a síntese do DNA, é procedido e seguido por dois intervalos (gaps) ou períodos de interfase (G1 e G2) em que não ocorre síntese de DNA. O processo divide-se desta forma: G1 é o período que transcorre entre o final da mitose e o início da síntese do DNA, S é o período de síntese do DNA e G2 que é o intervalo entre o final da síntese do DNA e o início da mitose. Durante o período G2 a célula possui o dobro (4C) da quantidade de DNA presente na célula diplóide original (2C). Mitose é a divisão celular, depois da mitose as células filhas entram novamente no período G1 e possuem o conteúdo de DNA equivalente a 2C A duração do ciclo celular varia consideravelmente de um tipo celular a outro. Para uma célula de mamífero crescendo em cultura com um tempo de geração de 16 horas, o tempo dos diferentes períodos seria: G1 = 5 horas, S = 7 horas, G2 = 3 horas, mitose = 1hora. O controle do ciclo celular é um dispositivo bioquímico que opera a partir de uma série de proteínas que interagem entre si e que induzem e coordenam os processos dependentes essenciais responsáveis pela duplicação e divisão dos conteúdos celulares. No coração desse sistema está uma série de complexos de proteínas (p53) formados por dois tipos básicos de componentes: subunidade de proteinoquinase (chamadas proteínas Cdk) e proteínas ativantes (chamadas ciclinas). No mínimo dois destes complexos proteicos regulam o ciclo celular normal, um no ponto de controle G1, e situa-se antes do início da fase S, e o outro em G2 antes do início da fase M. Estes complexos de 11 proteínas exercem seu controle por meio de sua atividade quinásica, pela ativação e desativação das quinases em pontos estratégicos do ciclo. Figura 2 - Ciclo celular. 2 ONCÓGENES 2.1 Proto-oncógenes e genes supressores de tumor 12 Oncógenes são formas alteradas de proto-oncógenes, isto é, genes envolvidos no controle da proliferação celular que podem diferir tanto na estrutura quanto na função da proteína codificada pelo seu homólogo normal e que estão envolvidos na transformação maligna. A ativação de proto-oncógenes juntamente com a inativação dos genes supressores de tumor são as principais alterações gênicas envolvidas no desenvolvimento tumoral, existem cerca de 30 genes supressores de tumor que inibem a progressão do ciclo celular, caso o DNA esteja danificado. Portanto, enquanto os oncógenes codificam proteínas que promovem o crescimento celular, os produtos dos genes supressores de tumor agem no sentido contrário, ou seja, bloqueiam a divisão celular. Também referidos como antioncógenes, são importantes reguladores do ciclo celular, e a perda da sua função repressora é um evento comum na maioria ou na totalidade das neoplasias humanas. Figura 3 – Proto-oncógene C MYC por imunocitoquímica. 13 Figura 4 – Transformação de proto-oncógene em oncógene, por ação de agente carcinogênico, e desenvolvimento de tumor. 2.1.1 Gene p53 Trata-se do alvo mais comum de aberrações estruturais nas neoplasias humanas. A perda homozigótica deste gene pode ser detectada em linfomas não Hodgkin, leucemia linfoide aguda e mieloma múltiplo. Diversas funções já foram identificadas associadas ao gene p53, e uma das mais importantes refere- se à vigilância do ciclo celular impedindo a propagação de células com material genético alterado. A proteína p53 localiza-se no núcleo e, quando recrutada, age inicialmente controlando a transcrição de vários outros genes. Em condições fisiológicas, sua meia-vida é curta e, portanto, o gene p53, ao contrário da proteína Rb, não tem participação no ciclo celular normal. Caso ocorra um dano irreparável, o p53 ativa genes de apoptose, como bax, que conduzirão a célula à morte. Em algumas das famílias portadoras da Síndrome de Li-Fraumeni ocorre a transmissão hereditária de uma cópia do gene p53 mutado.Tais pessoas têm uma taxa alarmante de neoplasias que começam a ocorrer em idade muito precoce, especialmente sarcomas, leucemias, linfomas e câncer de mama. 14 Figura 5 – Localização da proteína p 53. 2.2 Regulação da apoptose A apoptose permite a eliminação de células que perderam a função ou que serão substituídas por outras, ou ainda que sofreram lesões sutis que impedem sua viabilidade. Da mesma forma, no adulto o equilíbrio homeostático nos tecidos é mantido pela apoptose e proliferação celular. Ao sofrer uma grave lesão que comprometa sua viabilidade (por exemplo, anoxia ou calor), a célula pode ser destruída por falência de seus múltiplos sistemas metabólicos (necrose). Alternativamente, mecanismos imunológicos ou lesões ao genoma da célula podem desencadear sua eliminação por apoptose. Em contraste com a necrose, a apoptose é um mecanismo ativo, que envolve a ação coordenada de genes proapoptóticos e ativação de uma cadeia de enzimas (caspases) que degradam o DNA. Estes grupos de genes codificam uma vasta família de proteínas que funcionam sob a forma de dímeros, umas inibindo e outras promovendo a apoptose. O primeiro gene antiapoptótico descrito, bcl-2, protege especialmente linfócitos da morte celular programada, sendo uma proteína extremamente importante no processo de seleção clonal de células B30. O aumento de bcl-2 é observado tipicamente em linfomas não Hodgkin. A família bcl também é regulada pelo gene p53. A ativação de p53 aumenta a expressão de bax, o que supera o efeito antiapoptose de bcl-2. 15 2.3 Reparo do DNA Apesar de estarmos expostos constantemente a agentes carcinogênicos no ambiente, o desenvolvimento de câncer é um evento surpreendentemente menos frequente do que se pode imaginar. Sistemas que vigiam a integridade do nosso DNA respondem por essa proteção, compreendendo famílias diferentes de genes — uns são capazes de reparar anormalidades que envolvem grande extensão de material genético, outros atuam em lesões que compreendem um pequeno número de nucleotídeos. Células de diversos tecidos acumulam erros no DNA a cada divisão celular, culminando na aquisição de mutações ativadoras de oncógenes ou inativadoras de genes supressores de tumor. A frequência de mutação nestes genes em neoplasias hematológicas adquiridas parece ser baixa. Um grupo de doenças autossômicas recessivas associadas a sistemas diferentes de reparo do DNA está implicado na origem de doenças hematológicas. Portadores de doenças raras como a síndrome de Bloom, a ataxia-telangiectasia e a Anemia de Fanconi apresentam uma grande suscetibilidade para o desenvolvimento de leucemia mieloide aguda. Apesar de raras, estas doenças constituem fortes indicadores de que existe um papel importante em sistemas de reparo na gênese de leucemias e o seu estudo poderá esclarecer uma série de etapas iniciais da leucemogênese. 2.4 Tipos de reparo Reparo direto: repara alterações por troca de base. Reparo da quebra da dupla: repara lesões causadas por agentes químicos. Reparo por excisão (mismatch): repara mutações pontuais. O aparecimento de sintomas clínicos originários de diversas doenças humanas incluindo o câncer, relacionados aos tipos de reparo como a Anemia de Fanconi, revela que o eficiente sistema de reparo do DNA é de grande importância para manter-se a integridade da molécula de DNA e assim evitar o surgimento do câncer. 16 Figura 6 – DNA sofrendo danos e apoptose promovida por p53 funcionante. P53 não funcionante e proliferação de células modificadas geneticamente, ou seja, desenvolvimento do tumor. 2.5 Mutações Oncógenes como RAS, genes supressores de tumor como p53 e genes de reparo de DNA como MSH2 podem ser afetados por trocas de aminoácidos em posições críticas da proteína. Estas anormalidades são detectadas por técnicas de biologia molecular ou, em alguns casos, por imuno-histoquímica, valendo-se de alterações nas propriedades da proteína conferidas pela mutação. Por exemplo, p53 mutado tem meia- vida prolongada na célula e sua concentração aumentada pode ser detectada por meio de anticorpos monoclonais, tarefa impossível de ser realizada na proteína normal. Figura 7 – Lâmina de imuno-histoquímica em que a roseta assinala o processo tumoral. 17 2.6 Alterações citogenéticas Figura 8 – Núcleo do cromossomo, DNA e Gen. As anormalidades citogenéticas estão intimamente relacionadas ao processo neoplásico, representando tanto causa como consequência do tumor. Quanto às suas características, as anormalidades cromossômicas podem ser: 2.6.1 Numéricas Perdas ou ganhos de cromossomos completos, resultando clones hiperdiploides (com mais de 46 cromossomos), hipodiploides ou pseudodiploides (tem perdas e ganhos equivalentes, resultando em clone com 46 cromossomos). 18 Figura 9 – Hiperdiploide na Síndrome de Klinefelter. 2.6.2 Estruturais Estáveis, como as translocações (simples ou complexas), deleções, inserções e inversões. Figura 10 – Deleção do cromossomo X. Figura 11 – Translocação. 2.6.3 Qualitativas Instáveis, ou seja, anormalidades estruturais que não podem ser transmitidas pela célula para suas descendentes, em geral revelando agressão metabólica química, viral ou por irradiação, como fraturas, gaps minúsculos, pulverização, figuras radiais. 2.7 Anormalidades clonais 19 São alterações numéricas ou estruturais similares que ocorrem em um conjunto de células — presumivelmente todas de uma única origem — constituindo um clone. A identificação da anomalia em várias células torna pouco provável que tenha aparecido repetidas vezes em células independentes. Sendo mais provável que tenha surgido uma única vez, e transmitida a todas as células descendentes daquela mutante. De modo geral, nas leucemias mieloides agudas o prognóstico é pior nos casos que exibem anormalidades citogenéticas do que naqueles em que não há alterações. No entanto, algumas anormalidades, como t (8;21) e inv (16), estão associadas a uma sobrevida maior do que apresenta a média dos pacientes; enquanto outras, como t (15;17) na leucemia promielocítica, prenunciam uma excelente resposta terapêutica e, quando tratadas adequadamente, uma sobrevida muito maior do que a média. Entre as leucemias linfoides agudas, o grupo que tem o melhor prognóstico é representado pelos pacientes que têm um clone hiperdiploide com mais de 50 cromossomos; entre crianças com esta anormalidade a probabilidade de cura excede a 60%. Por outro lado, a presença da translocação t (4;11) ou do Ph está associada a uma probabilidade muito baixa ou nula de cura. Exemplos de anormalidade clonal: Figura 12 – Inversão do cromossomo 16 indica bom prognóstico. 20 Figura 13 – Translocação 9,22(Cromossomo Filadélfia – Ph) indica mau prognóstico. 21 3 NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS As doenças neoplásicas hematológicas podem comprometer as linhagens linfoide ou mieloide. As doenças que comprometem as diversas linhagens diferem não apenas quanto ao seu quadro citomorfológico, mas também quanto ao aspecto clínico, incluindo evolução e resposta ao tratamento. Figura 14 – Hematopoiese. 3.1 Neoplasias linfoides Compreendem doenças que apresentam características clínicas e morfológicas bastante variáveis. Originam-se de linfócitos das linhagens T, B ou NK que podem estar em diferentes estágiosde maturação. 22 Figura 15 – Blasto linfoide na Leucemia Linfoide Aguda. Assim, as leucemias linfóides agudas originam-se dos precursores linfoides primitivos, enquanto as leucemias linfoides crônicas e o mieloma múltiplo derivam de linfócitos diferenciados. As neoplasias podem, no inicio, ser localizadas - como ocorre nos linfomas, que comprometem predominantemente os linfonodos. Figura 16 – Plasmócitos no mieloma. Figura 17 – Linfócitos maduros. Alternativamente, a infiltração neoplásica pode ser generalizada, desde seu início, como acontece nas leucemias, em que existe a infiltração da medula óssea e de outros órgãos. Do ponto de vista histórico, as neoplasias linfoides originadas da medula óssea são denominadas leucemias, enquanto as originadas de qualquer órgão linfoide são identificadas como linfomas. 23 O Linfoma de Hodgkin é definido pela presença das células malignas de Reed-Sternberg e células de Hodgkin, em um substrato celular apropriado, e comprometem, em 80% dos casos, os linfonodos cervicais. Por outro lado, os linfomas não Hodgkin são um grupo heterogêneo de doenças clonais das linhagens T, B ou NK que podem se originar em qualquer órgão do sistema linfoide (linfonodos, timo, baço, pele ou tecido linfoide associado ao sistema digestivo) ou então ter uma origem extralinfoide, como o pulmão, cérebro, tireoide ou gônadas. Figura 18 – Célula de Reed-Sternberg que caracteriza o Linfoma de Hodgkin. Figura 19 – Célula do Linfoma de Burkitt — um dos tipos de linfomas não Hodgkin. Nas leucemias linfoides agudas, a proliferação e o acúmulo de linfoblastos na medula óssea determinam a supressão da hematopoiese normal, que resulta em anemia, neutropenia e plaquetopenia. Estes parâmetros podem ser observados por meio do hemograma. Além disso, a infiltração extramedular resulta em esplenomegalia, hepatomegalia e no comprometimento de meninges e gônadas. 24 A Leucemia Linfoide Crônica (LLC) é uma doença acumulativa de linfócitos B CD5+ na medula óssea, sangue periférico e órgãos linfoides. Outras doenças linfoproliferativas crônicas devem ser consideradas no diagnóstico diferencial da LLC, incluindo as leucemias de linfócitos grandes granulares (LGL) e a fase leucêmica dos linfomas da zona marginal, linfoma da zona do manto, linfoma centrofolicular e o linfoma linfoplasmocitoide. As neoplasias de células plasmocitárias (fig.11) representam a proliferação clonal de plasmócitos e plasmoblastos e são, geralmente, acompanhadas de proteinemia monoclonal. O mieloma múltiplo compromete predominantemente a medula óssea de forma generalizada, sendo pouco comum que se dissemine, invadindo o sangue periférico e outros órgãos. Ao contrário, a leucemia plasmocítica infiltra desde o seu início a medula óssea e o sangue periférico. Entretanto, o acompanhamento destes pacientes revela que anualmente 1% dos casos progride para neoplasia. Existem ainda algumas doenças que exibem gamopatia monoclonal, mas a apresentação clínica varia desde uma forma linfomatosa até leucemia. 3.2 Neoplasias mieloides As doenças mieloproliferativas clonais resultam da mutação de uma célula progenitora pluripotencial que mantém a capacidade, embora de maneira imperfeita, de diferenciação e maturação para cada uma das linhagens mieloides. Por outro lado, o clone neoplásico suprime a multiplicação e a diferenciação das linhagens normais, levando habitualmente à anemia, neutropenia e plaquetopenia, que são reversíveis. As síndromes mielodisplásicas compartilham uma propensão a citopenias, medula hiperplásica e alterações displásicas. Nas leucemias mieloides agudas, os blastos leucêmicos podem ter características morfológicas e imunofenotípicas das células eritroides, monocíticas, megacariocíticas ou de mieloblastos ou promielócitos. 25 Figura 20 – Blasto mieloide. As leucemias crônicas de linhagem mieloide incluem a leucemia mieloide crônica clássica, a leucemia neutrofílica crônica, a leucemia eosinofílica crônica/síndrome hipereosinofílica, a leucemia mielomonocítica juvenil e a leucemia mielomonocítica crônica. A mielofibrose idiopática constitui também proliferação neoplásica da linhagem mieloide que apresenta fibrose de medula óssea acompanhada de esplenomegalia. A proliferação de fibroblastos é reacional, resultante da liberação de citocinas por megacariócitos anormais. 3.3 Neoplasias de mastócitos As mastocitoses são doenças raras caracterizadas pela infiltração anormal de mastócitos na pele, medula óssea, sangue, linfonodos, fígado, baço e trato gastrintestinal. A apresentação clínica varia de uma doença indolente (mastocitose indolente), passando pelas mastocitoses associadas a doenças hematológicas, e chegando a formas agressivas como a leucemia de mastócitos e a mastocitose agressiva. Figura 21 – Mastócitos. 26 4 ROTEIRO DIAGNÓSTICO DAS LEUCEMIAS LINFOIDES E MIELOIDES Hemograma e citomorfologia; Mielograma: citologia e citoquímicas; Imunofenotipagem: marcação de antígenos intracitoplasmáticos e antígenos de superfície celular através de citometria de fluxo; Quantificação de DNA - incorporação de iodeto de propídeo (índice de DNA); Cariotipagem: análise numérica, presença de translocações, deleções ou outras anormalidades; Estudos moleculares: rearranjos estruturais (TCR, IgH), quimerismos genéticos, translocações cromossômicas, mutações gênicas, polimorfismos; Estudos sorológicos: EBV, HTLV-I, HCV; Quantificação de transcritos através de real-time PCR. 27 5 MARCADORES IMUNOFENOTÍPICOS (IMUNOFENOTIPAGEM) A caracterização das doenças hematopoiéticas sofreu um grande progresso com a introdução da tecnologia para produção de anticorpos monoclonais. Anteriormente a esta, a determinação da linhagem celular das células neoplásicas era feita com base na técnica de formação de rosetas com hemácias de carneiro (linhagem T), na detecção da expressão da imunoglobulina (linhagem B) e pela citoquímica (linhagem mieloide e linfoide). Atualmente numerosos antígenos foram descritos e caracterizados quanto a sua distribuição na hematopoese normal e nas diferentes neoplasias e sua pesquisa pode ser feita por técnicas de imunocitoquímica ou por citometria de fluxo. 5.1 Anticorpos A produção de anticorpos monoclonais baseia-se na fusão entre um linfócito B secretor de uma imunoglobulina específica para um único antígeno com um plasmócito de uma linhagem celular imortal mantida em cultura. Na maioria das vezes, estas células são murinas. A linhagem celular híbrida resultante é chamada de hibridoma, é imortal em cultura e capaz de secretar grandes quantidades de anticorpos específicos para um único tipo de antígeno (o mesmo do linfócito B parental). Estes anticorpos são, portanto, monoclonais (originários de uma única célula). Quando aplicados a células do sangue e outras células correlatas, estes anticorpos permitem identificar numerosos antígenos destas células. Diante de grande quantidade de anticorpos monoclonais que formam e continuam sendo introduzidos na prática diagnóstica e na investigação, e correspondentes antígenos, foi criado um sistema de nomenclatura para estes antígenos, o sistema CD ( cluster of differentiation), que lista numericamente os antígenos. 28 Figura 22 - Processo de formação de anticorpos monoclonais. A caracterização imunofenotípica das doenças hematológicas encontra-se descrita nos capítulos específicos para cada doença. A seguir,serão abordados em linhas gerais marcadores relevantes para caracterização das linhagens linfoides B e T e da linhagem mieloide. 5.2 Imunofenotipagem A identificação de antígenos na membrana, no citoplasma ou no núcleo celular pode ser realizada por imunocitoquímica ou por imunofluorescência. Na primeira técnica, os anticorpos são conjugados a enzimas, das quais as mais frequentemente empregadas são a peroxidase e a fosfatase alcalina. A reação entre antígeno e anticorpo é identificada pela produção de compostos coloridos derivados da ação destas enzimas sobre substratos específicos. A reação pode ser amplificada pelo uso em excesso do segundo anticorpo (geralmente, um anticorpo anti-imunoglobulina de camundongo) associado a um complexo de anticorpo antienzima. A vantagem desta técnica está em permitir a avaliação imunofenotípica e morfológica concomitante e poder ser aplicada a tecidos. Na técnica de imunofluorescência, os anticorpos estão conjugados a fluorocromos que, ao serem excitados por um feixe luminoso, produzem ondas de comprimento diverso, ou seja, luminescência de cores diversas. As células a serem estudadas podem estar fixadas a uma lâmina (imunofluorescência in situ) ou em suspensão (citometria de fluxo). A citometria de fluxo permite a avaliação quantitativa da expressão dos antígenos. Esta técnica avalia um grande número de células em um período de tempo curto e pode detectar a presença de vários antígenos numa mesma célula (coexpressão). Portanto, a citometria de fluxo é o método preferencial para a 29 imunofenotipagem das doenças hematológicas malignas, sendo aplicado a: determinação da linhagem celular, análise da clonalidade, análise da diferenciação celular, monitoramento do tratamento (pesquisa da doença residual mínima). COMO FUNCIONA A IMUNOFENOTIPAGEM POR CITOMETRIA DE FLUXO Figura 23 - Em cada fase de maturação, as células apresentam em suas membranas epítopos reconhecidos por anticorpos monoclonais marcados por fluorocromos. Figura 24 - Células analisadas, segundo complexidade e tamanho, medidos por incidência de laser. Informações são processadas em computador. 30 Figura 25 – Ordenamento por fluxo líquido da amostra permite que as células sejam analisadas individualmente. Por meio de incidência de laser, informações serão detectadas, fotomultiplicadas e digitalizadas formando gráficos, para análise e emissão de laudo. 5.3 Marcadores de Linhagem B A presença de moléculas de imunoglobulina na membrana dos linfócitos é a principal característica das células B maduras. A demonstração de que somente um tipo de cadeia leve de imunoglobulina (K=Kappa ou λ =lambda) é expressa na membrana (slg=surface immunoglobulin) de todas as células linfoides neoplásicas é aceita como critério de monoclonalidade. Esta característica é importante na classificação das doenças linfoproliferativas crônicas de células B. Adicionalmente, intensidade de expressão da imunoglobulina também é relevante. Ela é fraca na leucemia linfoide crônica clássica (LLC) e forte na leucemia prolinfocítica B (LPL-B) e nos linfomas não Hodgkin de células B. Como pode ser visto, as células B mais imaturas não expressam imunoglobulinas em sua superfície e, portanto, não é de se estranhar o fato de que apenas minoria das leucemias linfoides agudas B expressam este marcador. Entretanto, a expressão da cadeia pesada da imunoglobulina no citoplasma dos linfócitos antecede, do ponto de vista ontogenético, a expressão da slg. Esta característica é própria das células leucêmicas do subtipo comum de LLA, as quais frequentemente expressam o antígeno comum da LLA 31 (cALLa), encontrado na vasta maioria das LLAs de crianças, e também nos linfomas não Hodgkin do tipo folicular. Os antígenos CD19, CD79b e CD22 são expressos pela maioria dos linfócitos B e seus precursores e são aceitos como indicadores de diferenciação B. O CD22 pode ser identificado no citoplasma dos precursores linfoides B em fases muito precoces da diferenciação B. Por outro lado, os plasmócitos não expressam estes antígenos e não possuem slg, de tal sorte que sua identificação (por exemplo, no mieloma) depende de outros marcadores (como PCA-1, CD38). Outros antígenos importantes na classificação das doenças hematológicas malignas de células B são: CD23, que é um marcador de ativação linfocitária B, frequentemente expresso na LLC, mas não nos linfomas não Hodgkin, o FMC-7 e o CD103, expressos comumente na tricocitoleucemia. O CD5, embora seja um antígeno associado à linhagem T, é expresso na LLC, refletindo a expansão clonal de células B específicas de um estágio intermediário da maturação. Figura 26 – Tricoleucemia. 32 Figura 27 - Esquematização da ontogenia de células B (adaptação de Geraldo B. Cavalcanti). 5.4 Marcadores de Linhagem T O receptor de membranas de células T (TcR) assemelha-se, do ponto de vista ontogenético, às lg dos linfócitos B. Ambos marcadores estão presentes na membrana de células maduras, enquanto suas cadeias pesadas são detectadas no citoplasma de células progenitoras. O TcR encontra-se associado à CD3 na membrana celular, e pode ser detectado no citoplasma de células da medula tímica. A expressão do CD3 é considerada como indicativa de diferenciação na linhagem T. A célula precursora da linhagem T origina-se na medula óssea e migra para o timo, onde ocorrem a diferenciação e importantes mecanismos de regulação funcional. Esta célula imatura expressa o marcador CD7, que, embora associado à linhagem T, também pode ser detectado em células precursoras associadas à 33 linhagem mieloide. No timo, a diferenciação ocorre em sentido do córtex para a medula. Timócitos corticais geralmente expressam o antígeno CD1a e a enzima nuclear transferase deoxinucleotidil terminal (TdT). Na medula tímica, os timócitos CD3+ coexpressam inicialmente os antígenos CD4 e CD8, enquanto os linfócitos T maturos no sangue periférico são CD4+ ou CD8+. Do ponto de vista funcional, estes marcadores definem subpopulações distintas. Já entre as doenças linfoproliferativas crônicas de células T, a imunofenotipagem auxilia no diagnóstico. Outros marcadores importantes além dos citados são o CD5, CD25 (receptor alfa da interleucina2), CD2 (receptor para hemácias de carneiro, identificadas anteriormente pela técnica de roseta), CD56, CD57 e CD16 associados a linfócitos NK (natural killer). Figura 28 - Esquematização da ontogenia das células t. MEDULA ÓSSEA TIMO CD34 DR cCD3 CD7 CD2 CD5 cCD3 CD7 CD2 CD5 CD1 cCD3 CD7 CD2 CD5 CD4 CD8 RR sCD3 CD7 CD2 CD5 CD4 RR sCD3 CD7 CD2 CD5 CD8 Célula- tronco Timócito medular Tímócito cortical Célula T madura naive 34 6 MARCADORES MIELOIDES A identificação da mieloperoxidase (MPO), que por citoquímica ou por imunofenotipagem, é ainda hoje o critério mais importante para a demonstração de diferenciação mieloide. Entretanto, deve-se ressaltar que a MPO é negativa pela técnica de citoquímica nos casos de leucemia mieloide aguda (LMA) do subtipo FAB MO e, portanto, a demonstração de diferenciação mieloide deve ser feita pela detecção da MPO por métodos mais sensíveis ou de antígenos mieloides por imunofenotipagem. Além disso, a MPO não é expressanos subtipos de LMA, FAB M5 M6 e M7. Figura 29 - Citoquímica: lâmina positiva para mieloperoxidase em LMA M3 em que se visualizam os bastões de Auer — estruturas determinantes no diagnóstico das leucemias mieloides. Os CD33 e CD13 são considerados antígenos pan-mieloides, ou seja, expressos pela maior parte das células desta linhagem. CD14 e CD11b costumam estar associados à linhagem monocítica, e CD15 à linhagem granulocítica. Existe, porém, uma grande variação na frequência destes antígenos nas leucemias mieloides M1, M2, M4 e M5. Assim, a imunofenotipagem isoladamente não deve ser usada para a distinção entre os subtipos monicítico e mielomonocítico de LMA. A expressão da glicoforina, ao contrário, é bastante específica na identificação de células da linhagem eritroide. O CD42a identifica a glicoproteína Ib e CD61 e a glicoproteína IIIa, ambas expressas pelas células da linhagem megacariocítica. Embora o HLA-DR seja um antígeno ubíquo, sua pesquisa é importante na identificação da leucemia promielocítica aguda (FAB-M3), porque na maioria dos casos não se detecta a expressão do HLA-DR, contrastando com os demais subtipos de LMA. 35 7 LEUCEMIA Tumor hematológico que acomete as células da medula óssea. Estas células podem ser da linhagem linfoide ou mieloide. As leucemias podem ser divididas em LLA/LMA/LLC/LMC. As leucemias são tumores malignos, portanto, têm poder de metástase. 7.1 Introdução O diagnóstico de leucemia aguda é usualmente fácil quando são realizados o estudo da medula óssea, os testes citoquímicos e a imunofenotipagem. Entretanto, muitas vezes o diagnóstico só é confirmado após o estudo citogenético ou de rearranjos dos genes. A subcategorização das leucemias agudas é importante para o estabelecimento da terapêutica apropriada e para o estudo da doença residual mínima. Além disso, é indispensável para a comparação de diferentes estudos em relação à epidemiologia, à terapêutica e aos fatores prognósticos. O diagnóstico citomorfológico da leucemia aguda, bem como o papel da imunocitoquímica, imunofenotipagem e da citogenética serão discutidos na descrição de cada um dos subtipos. De maneira geral, as informações fornecidas pelas diferentes técnicas são complementares. 36 37 8 LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA A leucemia mieloide aguda (LMA) é uma doença do tecido hematopoético pela proliferação anormal de células progenitoras da linhagem mieloide, ocasionando produção insuficiente de células sanguíneas maduras normais. A infiltração da medula é frequentemente acompanhada de neutropenia, anemia e plaquetopenia detectados através do hemograma. O mecanismo que leva a célula progenitora da linhagem mieloide a perder o controle da proliferação celular, ocasionando a expansão do clone leucêmico, permanece incerto. A ativação de proto-oncógenes e mutações em genes supressores que regulam o ciclo celular parecem estar envolvidas na patogênese das leucemias. A LMA é uma doença, presente em ambos os sexos, que acomete indivíduos de quaisquer idades e raças. A incidência de LMA aumenta progressivamente com a idade, sendo que em 50% dos casos os pacientes encontram-se acima dos 55 anos — predominantemente em indivíduos de raça branca e do sexo masculino. Em 1975, o grupo cooperativo Franco-Americano-Britânico (FAB) propôs a classificação em seis subtipos, baseada estritamente em aspectos morfológicos e citoquímicos. Esta classificação foi revisada em 1985 com a inclusão de dois novos subtipos M0 (LMA com mínima diferenciação) e M7 (leucemia megacarioblástica), cujo diagnóstico inclui o uso de marcadores imunofenotípicos. Genericamente, a classificação FAB das LMAs tem base nas características morfológicas e citoquímicas, e objetiva a determinação da linhagem e do grau de maturação das células blásticas. A análise do esfregaço do sangue periférico não era considerada suficiente para o diagnóstico. Em 2001, a Organização Mundial da Saúde publicou a Classificação das Leucemias Mieloides Agudas, na qual é destacada a importância das alterações genéticas para o diagnóstico, resposta ao tratamento e sobrevida, incluindo LMAs com anormalidades citogenéticas ou displasia de múltiplas linhagens ou associada a síndromes mielodisplásicas, relacionadas ao tratamento prévio, e àquelas não pertencentes às categorias anteriores. No último caso, são aplicados os critérios morfológicos e citoquímicos adotados pela classificação FAB, exceto se a percentagem mínima de blastos considerada como diagnóstica for de 20%, detectáveis na medula óssea ou no sangue periférico. Esta é uma importante mudança em relação à classificação FAB que não incluía a possibilidade de o diagnóstico ser feito apenas pelo sangue periférico. Nos casos em que o aspirado de medula óssea é insuficiente, com punção hipocelular ou de difícil obtenção, o estabelecimento do 38 diagnóstico é feito pelo estudo histológico da medula óssea. Quando a medula óssea é hipercelular ou normocelular e de fácil obtenção, a biópsia de medula não é essencial sendo suficiente o exame citológico do esfregaço de medula óssea. IMUNOFENOTIPAGEM POR CITOMETRIA DE 39 Figura 41 - Posição das células conforme complexidade e granularidade avaliadas pelo citômetro de fluxo na imunofenotipagem. Método que avalia até 1.000.000 de células e detecta o princípio da doença residual mínima — a presença de apenas uma célula maligna. 8.1 Leucemia mieloide aguda MO (com mínima diferenciação) 8.1.1 CARACTERÍSTICA DA LMA-M0 A LMA-M0 é caracterizada pela infiltração da medula óssea por ao menos 20% de células blásticas, com reação citoquímica para mieloperoxidase (MPO) negativa. 8.1.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) Os blastos são pequenos, com cromatina frouxa e nucléolo evidente, apresentando citoplasma agranular, sem bastonete de Auer. Morfologicamente, assemelham–se aos blastos linfóides L2 da classificação FAB. 40 8.1.2.1 Citoquímica Apresentam reação citoquímica para MPO (mieloperoxidase) negativa. 8.1.3 Imunofenotipagem O estudo imunofenotípico revela uma população blástica com relação entre tamanho/grânulo (FSC/SSC) baixa, com positividade para ao menos um dos antígenos de linhagem mieloide CD33, CD13 ou CD11b. A determinação da MPO é positiva. Os antígenos de linhagem linfoide são negativos. Devido à terapêutica, as leucemias mieloides diferem das linfoides. É importante a realização da imunofenotipagem para diferenciar a LMA- M0 da LLA-L2. Figura 42 - Blastos mieloides M0 observados em microscopia e corados por Wright. 8.2 Leucemia mieloide aguda M1 (sem maturação) 8.2.1 Característica da LMA-M1 41 A LMA-M1 é caracterizada pela alta porcentagem de blastos na medula óssea, sem evidências de maturação. Os blastos devem constituir pelo menos 90% das células nucleadas. É essencial a demonstração da natureza mieloide dos blastos, com base em presença de granulações e bastonetes de Auer, ou pela positividade da reação para MPO. 8.2.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) Alguns casos apresentam características óbvias da linhagem mieloide com granulações na maioria dos blastos ou presença inequívoca de bastonetes de Auer e, ainda, alta porcentagem de positividade para MPO. Em outros casos, as células lembram linfoblastos, que na coloração de Wright não apresentam grânulos azurofílicos. A positividade para MPO pode estar presente em umaminoria dos blastos. 8.2.2.1 Citoquímica Para minimizar o erro diagnóstico entre LMA e LLA é necessário o uso de métodos sensíveis para detectar atividade de MPO. E a presença de reação positiva para MPO em pelo menos 3% das células blásticas auxilia no diagnóstico. 8.2.3 Imunofenotipagem A LMA é definida imunologicamente pela expressão de pelo menos três dentre os seguintes marcadores: antiMPO, CD13, CD33, CDw65 ou CD117 (c-kit). Outros marcadores podem frequentemente estar expressos, mas sem especificidade para células da linhagem mieloide: HLA-DR, CD34, CD7, CD4, CD11b. Este subtipo não está associado a pior prognóstico clínico e, como já foi ressaltado, em alguns casos a doença pode ser confundida morfologicamente com a LLA. 42 Figura 43 - Blastos mieloides M1 8.3 Leucemia mieloide aguda M2 (com maturação) 8.3.1 Característica da LMA-M2 A LMA-M2 é caracterizada pela presença de 20% a 90% de blastos na medula óssea; a percentagem de células monocíticas deve ser inferior a 20%, diferenciando-a do subtipo M4. 8.3.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) São blastos grandes com cromatina frouxa e alta relação nucleocitoplasmática, podendo apresentar bastão de Auer (inclusão eosinofílica citoplasmática). 8.3.2.1 Citoquímica Os blastos possuem granulação citoplasmática e reação positiva para MPO. 43 8.3.3 Imunofenotipagem A LMA-M2 apresenta positividade para os antígenos de linhagem mielóide: MPO, CD13, CD33,CDw65 ou CD117 (c-kit). Os marcadores HLA-DR, CD34, CD11b podem, frequentemente, estar expressos. Figura 44 - Blasto mieloide M2. 8.4 Leucemia promielocítica aguda M3 8.4.1. Característica da LMA-M3 A leucemia promielocítica aguda representa de 5% a 8% das LMAs e caracteriza-se pela expansão de promielócitos anormais. Ocorre em qualquer faixa etária, embora seja mais frequente nos adultos. A associação com coagulação intravascular disseminada (CIVD) é comum. 44 8.4.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) 8.4.2.1 Forma clássica Os promielócitos leucêmicos apresentam tamanho e contorno nucleares irregulares e muito variáveis, muitas vezes bilobulados. O citoplasma apresenta-se repleto de grânulos grandes, purpúricos ou avermelhados, que borram o contorno nuclear. Os bastonetes de Auer são frequentes, e células de Faggot (feixes de bastonetes) podem ser detectadas. A mieloperoxidase é fortemente positiva. 8.4.2.2 Forma variante Hipo ou microgranular, os promielócitos apresentam poucos ou mesmo não apresentam grânulos, o núcleo costuma ser bilobulado. Na verdade, a aparente ausência de grânulos relaciona-se ao tamanho submicroscópico dos grânulos. A variante da leucemia promielocítica aguda é frequentemente confundida com a leucemia monocitária aguda. Entretanto, a reação para a mieloperoxidase é fortemente positiva. 8.4.3 Imunofenotipagem A imunofenotipagem pode ser de grande auxílio no diagnóstico, o CD33 é positivo, de padrão homogêneo, enquanto a positividade para o CD13 tem padrão heterogêneo. O HLA-DR e o CD34 são na maioria das vezes negativos. A expressão aberrante dos antígenos CD2 ou CD9 é comum. 8.4.4 Imuno-histoquímica 45 A imuno-histoquímica usando anticorpos antiPML mostra a mudança da distribuição normal desta molécula: em vez da presença de corpúsculos nucleares, observa-se padrão salpicado em todo o núcleo. 8.4.5 Citogenética A t (15;17) produz o gene de fusão PML-RARa, que conserva a maior parte dos domínios funcionais de ambas as moléculas, e por isso atua como uma oncoproteína dominante negativa sobre as vias dos receptores do ácido retinoico (RARs) e do PML. Raramente a leucemia promielocítica aguda pode estar associada a outras translocações cromossômicas que não a t (15;17). 8.4.6 Tratamento A leucemia promielocítica aguda responde ao tratamento com o atRA, que induz à diferenciação granulocitária dos blastos. Desde que tratada com o atRA, associado a antracíclicos, o prognóstico da LM com t (15;17) é favorável. Figura 45 e 46 - Citoquímica fortemente positiva com células de Faggot / blasto promielocítico. 8.5 Leucemia mielomonocítica M4 8.5.1 Característica da LMA-M4 46 A LMA-M4 caracteriza-se pela presença de ambos os componentes, granulocítico e monocítico, nas células leucêmicas do sangue periférico e da medula óssea. Os monócitos e os precursores monocíticos na medula óssea constituem de 20% a 80% das células. Este limite arbitrário de 20% distingue os casos de LMA-M4 dos subtipos M1 e M2. 8.5.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) É de fundamental importância a avaliação do hemograma junto ao mielograma para se determinar o tipo de leucemia mieloide pois a presença de elevado número de monócitos no hemograma pode auxiliar na distinção da M2 Os blastos monócitos podem não ser facilmente distinguíveis pela coloração de Wright e exigem reações citoquímicas. 8.5.2.1 Citoquímica O critério citoquímico para diferenciação monocítica é a presença de atividade esterase. No entanto, a atividade esterase monocítica na LMA-M4 não é tão forte como visto na LMA-M5. 8.5.3 Imunofenotipagem LMA-M4 apresenta os antígenos de linhagem mieloide CD13 e CD33. Os antígenos de linhagem monocítica CD4, CD14, CD15 e CD11b podem estar expressos em porcentagem variável. 47 Figura 47 - Blasto mieloide M4. 8.6 Leucemia mielomonocítica M5 8.6.1 Característica da LMA-M5 A LMA-M5 é diagnosticada quando 80% ou mais das células não eritroides da medula óssea são monoblastos, promonócitos ou monócitos. O subtipo LMA-M5a (sem diferenciação) apresenta mais de 80% das células grandes, com cromatina frouxa e citoplasma agranular, enquanto que no subtipo LMA-M5b (com diferenciação) acima de 20% dos blastos apresentam maturação evidenciada pelo contorno irregular do núcleo e pela presença de grânulos no citoplasma. Pacientes com leucemia monocítica têm maior prevalência de tumor extramedular, com infiltração em gengiva, pele, tubo digestivo e sistema nervoso central. A presença de hepatoesplenomegalia e hiperleucocitose é mais frequente em comparação aos outros subtipos FAB. 8.6.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) Os monoblastos são células grandes com citoplasma abundante e basofilia acentuada. Grânulos azurofílicos finos e vacúolos podem estar presentes. Frequentemente o núcleo é redondo, com cromatina frouxa e presença de um ou mais nucléolos proeminentes. A presença de bastonete de Auer é incomum. Os 48 promonócitos têm núcleo convoluto e irregular. O citoplasma é menos basofílico e algumas vezes tem grânulos e vacúolos mais evidentes. 8.6.2.1 Citoquímica A reação citoquímica para MPO geralmente é negativa. A reação de esterase é fortemente positiva e pode ser inibida pelo fluoreto de sódio, ao contrario das células mieloides não monocíticas. 8.6.3 Imunofenotipagem O achado imunofenotípico característico da LMA-M5 é a presença de população blástica com relação FSC/SSC maior que nas LMAs M0 e M1. O antígeno de linhagem mieloide CD33 é positivo e o CD13, negativo. Os antígenos CD14 e CD15 são positivos. É comum a expressão fraca do antígeno CD4. O marcador CD34 geralmente é negativo. Os antígenos de cadeia leve λ e κ são frequentemente positivos devido à ligação inespecífica,sendo importante realizar o bloqueio destes sítios com soro AB ou soro de coelho. FIGURA 48 – Blasto mieleoide M5. 49 8.7 Eritroleucemia-M6 8.7.1 Característica da LMA-M6 A LMA-M6 é estabelecida quando os eritroblastos na medula óssea constituem mais de 50% de todas as células e a porcentagem de blastos, entre as células não eritroides, for maior que 20%. Assim, em contraste com os outros subtipos FAB de LMA, a LMA-M6 pode ser diagnosticada quando a porcentagem de blastos for menor que 20% de todas as células nucleadas da medula. 8.7.1 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) Adicionalmente aos critérios quantitativos, a presença de diseritropoese é frequente na LMA-M6 que difere das síndromes mielodisplásicas e das anemias megaloblásticas, por apresentar mais de 20% de mieloblastos do total das células não eritroides na medula óssea. Como observado em outros tipos de LMA, grânulos azurofílicos ou bastonetes de Auer podem ser vistos nas células blásticas. A única maneira de separar a LMA-M6 das síndromes mielodisplásicas é pela contagem de blastos na medula óssea. Em casos com mais de 50% de eritroblastos e menos de 20% de blastos em população não eritroide, o diagnóstico é de síndrome mielodisplásica, e não LMA-M6. 8.7.2.1 Citoquímica Uma característica importante observada nos eritroblastos é o padrão granular de positividade na reação citoquímica do PAS. A LMA-M6 progride frequentemente para as formas LMA-M1, M2 ou M4, devido ao aumento do número de blastos na medula óssea. 8.7.2 Imunofenotipagem 50 Os blastos da M6 tem positividade para antígenos associados à linhagem mieloide, como o CD13, CD33, antiMPO, com ou sem os antígenos associados às células precursoras, como o HLA-DR e o CD33. As células eritroblásticas mais diferenciadas podem ser identificadas pela expressão de glicoforina. Figura 49 - Blastoeritroide M6. 8.8 Leucemia megacarioblástica M7 8.8.1 Característica da LMA-M7 A LMA-M7 é definida pela presença de mais de 20% de megacarioblastos entre as células nucleadas na medula óssea. Em alguns casos, a punção é “seca”, sendo necessária a realização de biópsia de medula óssea para firmar o diagnóstico. A LMA-M7 tem maior incidência em crianças com Síndrome de Down. Quando ocorre em pacientes com menos de um ano está associada à resposta terapêutica favorável, o que não é observado em pacientes com mais de um ano de idade, com ou sem a trissomia do cromossomo 21. 8.8.2 Avaliação morfológica (hemograma e mielograma) 51 Os blastos são de tamanhos variáveis, com citoplasma geralmente agranular, podendo apresentar protrusões. A medula óssea frequentemente apresenta aumento das fibras de reticulina, e comumente o aspirado de medular é de difícil obtenção. 8.8.2.1 Citoquímica Apenas com critérios morfológicos e citoquímicos, a LMA-M7 pode ser confundida com as leucemias linfóides agudas ou com a LMA-MO, sendo importante o estudo imunofenotípico para diferenciá- las. 8.8.3 Imunofenotipagem Os marcadores de linhagem mieloide CD13 e CD33 frequentemente estão presentes, e o diagnóstico de LMA-M7 é definido pela positividade para os antígenos de linhagem megacariocítica: CD41, CD42 ou CD61. Alguns casos podem ser HLA-DR negativos. No estudo imunofenotípico da LMA-M7 deve-se ter o cuidado de coletar o material aspirado de medula óssea em frasco contendo EDTA para minimizar a agregação de plaquetas à superfície dos blastos, que pode ocasionar resultado falso-positivo para os antígenos da série plaquetária. Figura 50 - Blasto megacariocítico M7. 52 9 LEUCEMIAS BIFENOTÍPICAS E BILINEARES Um dos aspectos controversos deste subgrupo é a terminologia. O nome bifenotípico foi inicialmente utilizado nos casos de leucemias que expressavam antígenos celulares linfoides e mieloides, com características e denominações variáveis, tais como, bilineal, híbrida e mista. Portanto, o diagnóstico destes casos não é baseado na morfologia, e sim na expressão imunofenotípica das células malignas. Outro ponto é o desconhecimento quanto aos critérios adotados para identificação e classificação destas leucemias, bem como, o valor preditivo destes marcadores aberrantes. A leucemia bifenotípica é aquela na qual a coexpressão de marcadores linfoides e mieloides ocorre na mesma célula. A leucemia bilineal representa casos em que existem duas populações blásticas. Uma proporção de células apresenta característica de células mieloides e outra, de células linfoides, com marcadores imunofenotípicos que não se superpõem. Estas leucemias podem ser sincrônicas, ou seja, as duas populações de blastos podem ocorrer na mesma época (em leucemias de novo), ou metacrônicas, quando há recorrência de um clone leucêmico, com mudanças na expressão celular com novos antígenos ou rearranjo gênico associado a outra linhagem distinta do clone original. Estes casos são frequentes nas leucemias secundárias a tratamentos quimioterápicos, e nas leucemias que recaem com outra linhagem celular. É importante demonstrar a persistência de um marcador citogenético ou molecular igual ao da doença original. Entre as leucemias bilineares, encontram-se aqueles casos de leucemias que apresentam um marcador como LLA-T, por exemplo, com marcador mieloide como CD13 ou CD14 e que recaem como LMA, mantendo os marcadores originais de células T. 53 CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO DE LEUCEMIA BIFENOTÍPICA Pontos B T M 2 cCD22 cCD3 MPO CD79a anti-TCR 1 CD10/CD20 CD5/CD2 CD13/CD33 CD19 CD8/CD10 CD117/CD65w 0,5 TDT/CD24 CD7/TdT CD14/CD15/CD64 Figura 51 - Pontuação para leucemia bifenotípica. 10 LEUCEMIAS AGUDAS INDIFERENCIADAS 54 As leucemias agudas indiferenciadas (AUL) podem ser definidas como leucemias de células progenitoras. Estas leucemias não se incluem nos critérios das classificações FAB e são reconhecidas com o auxílio de marcadores imunofenotípicos. Elas podem ser traduzidas clinicamente como lesões medulares que simulam mielofibrose, mielodisplasias, ou leucemias com linhagens mistas. Na verdade, apesar de todo impacto da biotecnologia moderna, os conceitos e diferenças destas doenças ainda são bastante controversos. Muitos casos de AUL são reclassificados, à medida que um novo marcador é creditado na parafernália dos marcadores biológicos. Por exemplo, alguns casos de AUL foram reclassificados, após resultados de testes positivos com a-MPO, a presença de deleções do braço longo do cromossomo 5 del, (5q) ou 5q- (LMA secundária a mielodisplasia), presença de c-Kit, um proto-oncógene específico de LMA, ou CD117+. Finalmente, ocorrem leucemias que expressam marcadores de múltiplas linhagens, definidas como populações celulares distintas (leucemias mistas) ou coexpressas no mesmo blasto (leucemias bifenotípicas). 11 LEUCEMIA BASOFÍLICA AGUDA 55 Ocorre em menos de 1% dos casos de LMA. No sangue periférico são encontrados blastos e basófilos maduros, que podem ser hipogranulares (Figura 12). Na MO óssea encontramos basófilos maduros e mais de 20% de blastos. Muitas vezes este tipo de leucemia é incluída nos subtipos M2 ou M4 do grupo FAB. Figura 52 – LMA basofílica. 12 CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE LEUCEMIAS MIELOIDES AGUDAS 12.1Clínica 56 Palidez cutâneo-mucosa, febre, hemorragia, adenomegalia, hepatoesplenomegalia, alterações da pele, dor óssea, derrame pleural. A presença de células leucêmicas na medula espinhal condiciona-se ao aparecimento de sintomas semelhantes ao da meningite, como cefaleia, tontura, náuseas, perturbações visuais, papiledema (hipertensão intracraniana). 12.2 Laboratório Utiliza-se inicialmente o hemograma (alterações na série branca, vermelha e plaquetária). Com duas alterações não determinantes de diagnóstico faz-se o mielograma e em casos de difícil diagnóstico solicita-se a biópsia de medula óssea com agulha. Outros exames devem ser feitos como RX, US, RM para detectar infiltrações localizadas. Exames bioquímicos são importantes para avaliar rins, fígado, homeostasia, culturas para identificação de processos infecciosos. Faz-se necessária sorologia para hepatite e HIV. Imunofenotipagem e citogenética são fundamentais. 12.3 Tratamento As medidas de suporte visam melhorar as condições gerais do paciente diminuindo assim o risco de complicações (hidratação, transfusões, nutrição adequada, isolamento quando necessário e evitar a hiperuricemia por lise celular). O tratamento específico visa eliminar e/ou controlar a proliferação das células leucêmicas. Baseia-se no uso de quimioterápicos em combinação, atuando nas células que estão em períodos ativos do ciclo celular. O tratamento utiliza protocolos que são seguidos pelo serviço oncológico, com procedimentos similares, seja em São Paulo ou em Mato Grosso do Sul. Existem vários tipos de protocolos e cada serviço utiliza um tipo. 57 13 DEFINIÇÕES Remissão: Ausência de células leucêmicas malignas ou ausência do tumor. Nas leucemias é a ausência de blasto em sangue periférico e menos de 5% na medula óssea. Recidiva: Retorno dos sinais e sintomas da doença clínica e/ou laboratorial. 58 Quimioterapia: Tratamento com qualquer medicamento ou substância química com fins terapêuticos. Denominação hoje empregada para medicamento antineoplásico. HLA (Antígeno Leucocitário Humano): Proteínas que se encontram na superfície das células humanas. Para se fazer transplante de medula óssea, é necessário que haja compatibilidade entre o HLA do doador e do receptor. Este exame de compatibilidade se faz através de punção de sangue periférico. Observação: O transplante de medula óssea será tratado em capítulo específico. RESUMO GERAL DAS LMA LMA NOMENCLATURA CARACTERÍSTICAS M0 Mínima diferenciação MO: Blastos ≥ 30% do total de células nucleadas (TCN); < 3% blastos MPO ou NSB(+). Negatividade para os marcadores das linhagens B e T; Positividade para antígenos: aMPO, CD13/CD33, CD11b, CD15, CD117. 59 M1 Mieloide sem maturação MO: Blastos ≥ 30% do TCN. Somatório de blastos ≥ 90% do TCN, excluídas células nucleadas eritroides (CNE), linfócitos, plasmócitos, mastócitos e macrófagos; MPO e NS ≥ 3% dos blastos; <10% das células podem ser granulocítico + monócitos. M2 Mieloide com maturação MO: Blastos ≥ 30% do TCN; blastos entre 30 e 89% das CNE+; componente monocítico < ou 20% das CNE+; componente granulocítico (promielócitos a segmentados) > 10% das CNE+. M3 M3v Promielocítica MO: Promielócitos anormais são a maioria; % de blastos não obrigatoriamente ≥ 30% do TCN ou das CNE na MO; MPO e NSB ++. M4 M4v Mielomonocítica I) MO: Blastos ≥ 30% do TCN; blastos ≥ 30% das CNE; Soma de mieloblastos a segmentados neutrófilos = 30% a 79% CNE; Monoblastos + promonócitos + monócitos= 20% e 80% CNE; SP: Padrão A - monoblastos a monócitos > 5.000/mm3; Padrão B - monoblastos a monócitos < 5.000/mm3, mas com componente monocítico confirmado por lisozima sérica > 11,5 ug/ml ou urinária > 2,5 ug/ml e αNAE > 20%. II) MO com padrão M2 e SP> 5.000 células monocíticas/mm3 e comprovação por um dos testes laboratoriais (lisozima ou αNAE)* M5 Monocítica MO: Blastos ≥ 30% do TCN. Monoblastos + promonócitos + monócitos ≥ 80% CNE; M5a: ≥ 80% células são monoblastos; M5b: < 80% células são monocíticas diferenciadas. M6 Eritroleucemia MO: Blastos ≥ 30% CNE; eritroblastos > 50% TCN 60 na MO. M7 Megacariocítica MO: Blastos ≥ 30% do TCN, excluindo linfócitos e plasmócitos; blastos M7 identificados por um dos marcadores monoclonais específicos (CD41 ou CD42a ou CD61). Figura 53 - Relação entre tipos de LMA e características morfológicas, citoquímicas e imunofenotípicas. A determinação do diagnóstico precoce, clínico e laboratorial é de fundamental importância para que haja melhora no prognóstico e tratamento das patologias como demonstrado nesta revisão bibliográfica. Assim cabe a todos a percepção de alterações que chamem a atenção determinando a procura precoce de auxílio médico. Sinais e sintomas não são exclusivos das leucemias. O clínico sempre deve ter as leucemias como uma das hipóteses diagnósticas. Portanto febre, sangramentos, anemia, dores articulares, falta de ar, aumento de gânglios geralmente indolores devem chamar sua atenção. A alteração de pelo menos dois parâmetros no hemograma deve ser investigada e, caso o diagnóstico não tenha sido feito, recomenda-se a realização do mielograma. Neste, a presença de células imaturas sugere leucemias agudas; e células maduras, leucemia crônica. Será linfoide, se apresentar blastos pequenos com pouco citoplasma e às vezes nucléolo; e será mieloide, em sua maioria, se apresentar blastos grandes com citoplasma abundante e nucléolo, com exceção de eritroleucemias e megacarioblásticos que possuem características particulares. Exames citoquímicos determinam, em caso de dúvida, se é linfoide ou mieloide. A imunofenotipagem tem importância na determinação de células linfoides T e B e dos blastos indiferenciados principalmente na M0 E M7. A citogenética e a biologia molecular são de fundamental importância pois determinam particularidades nas alterações de cada indivíduo além de demonstrar se há ou não alterações cromossômicas nas leucemias. 15 LEUCEMIA LINFOIDE AGUDA (LLA) 61 É a neoplasia de células linfocitárias. As linfoproliferações agudas são denominadas leucemias linfoides agudas e caracterizadas pela presença de blastos linfoides tanto na medula óssea quanto no sangue periférico. É uma doença resultante da mutação somática do clone precursor linfoide que pode ocorrer em diferentes pontos do seu amadurecimento, assim será determinado nesta revisão bibliográfica. Devido ao fato de a LLA representar 80% dos casos de leucemia no grupo etário pediátrico, o decréscimo da mortalidade reflete: 1) Campanhas de conscientização sobre diagnóstico precoce; 2) Progresso nos protocolos de tratamento das LLA. A mortalidade por leucemia, hoje, corresponde a um terço daquela observada em tumores de sistema nervoso central, que é a segunda causa mais frequente de câncer pediátrico. A sobrevida livre de doença por mais de cinco anos — considerado o critério de cura nessa doença — em pacientes pediátricos com LLA nos últimos anos, tem sido de aproximadamente 80%. 15.1 Epidemiologia A LLA representa 20% de todas as leucemias diagnosticadas no Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), tornando-se a neoplasia mais comum em crianças. Essa incidência decresce após os 15 anos e cresce novamente após os 50 anos e representa 75% a 80% de
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