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DIREITO DE FAMÍLIA

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DIREITO DE FAMÍLIA – PARTE I
INTRODUÇÃO
 
CAPÍTULO ÚNICO – Direito de Família
 
Noção de direito de família
 
O direito de família é o ramo mais intimamente ligado à própria vida, pois as pessoas provêm de um organismo familiar e a ele conservam-se vinculadas durante a sua existência. A família é uma realidade sociológica e constitui a base do Estado, sendo uma instituição necessária e sagrada amplamente protegida.
 
Latu sensu, a palavra família abrange todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue, bem como as unidas por afinidade e pela adoção. Já para os fins sucessórios, o conceito de família limita-se aos parentes consangüíneos. A lei, por sua vez, refere-se à família como um núcleo mais restrito, constituídos pelos pais e sua prole. Identificam-se na sociedade conjugal estabelecida pelo casamento três ordens de vínculos: (a) o conjugal; (b) o de parentesco; e (c) o de afinidade (estabelecido entre um cônjuge e os parentes do outro)
 
O direito de família regula as relações entre os seus diversos membros e as conseqüências que delas resultam para as pessoas e bens. Seu objeto é, pois, o complexo de disposições, pessoais e patrimoniais, que se origina do entrelaçamento das múltiplas relações estabelecidas entre os componentes da entidade familiar.
 
 
Conteúdo do direito de família.
 
Os direitos de família são os que nascem do fato de uma pessoa pertencer a determinada família, na qualidade de cônjuge, pai, filho, etc. Contrapõem-se aos direitos patrimoniais, por não terem valor pecuniário. Distinguem-se dos obrigacionais, pois caracterizam-se pelo fim ético e social. Contudo, podem esses direitos ter conteúdo patrimonial (ex.: alimentos). Mas isso acontece apenas indiretamente, em casos em que apenas aparentemente assumem a fisionomia de direito real ou obrigacional.
 
Tal direito regula ora as relações entre as pessoas da mesma família; ora disciplina as relações patrimoniais que se desenvolvem no seio da família; ora, finalmente, assume a direção das relações assistenciais, e novamente têm em vista os cônjuges entre si, os filhos perante os pais, o tutelado em face do tutor, o interdito diante de seu curador. Relações pessoais, patrimoniais e assistenciais são, por tanto, os três setores em que o direito de família atua.
 
No Código, destacam-se os institutos do casamento, da filiação, do poder familiar, da tutela, da curatela, dos alimentos e da união estável. O casamento, pelos seus efeitos, é o mais importante, pois embora existam relações fora do casamento, essas ocupam plano secundário. O casamento é o centro, de onde irradiam as normas básicas do direito de família.
 
Os institutos de proteção e assistência desdobram-se em tutela dos menores que se sujeitam à autoridade de pessoas que não são os seus genitores, e curatela, que, embora não se relacione com o instituto da filiação, é regulada no direito de família pela semelhança com o sistema assistencial de menores.
 
 
Princípios do direito de família
 
(a)     Princípio do respeito à dignidade da pessoa humana: garantindo o pleno desenvolvimento e a realização de todos os seus membros, principalmente da criança e do adolescente.
(b)    Princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros: os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher
(c)     Princípio da igualdade jurídica de todos os filhos: os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias.
(d)    Princípio da paternidade responsável e planejamento familiar: o planejamento familiar é livre decisão do casal, fundado nos princípio da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.
(e)     Princípio da comunhão plena de vida baseada na afeição entre os cônjuges ou convenientes: tem relação com o aspecto espiritual do casamento e com o companheirismo que nele deve existir.
(f)      Princípio da liberdade de constituir uma comunhão de vida familiar: sem qualquer intervenção estatal ou particular. Tal princípio abrange também a livre decisão do casal no planejamento familiar, intervindo o Estado apenas para propiciar recursos educacionais e científicos ao exercício desse direito.
 
 
Natureza jurídica do direito de família.
 
No direito de família há um acentuado predomínio das normas imperativas (cogentes), ou seja, normas que são inderrogáveis pela vontade dos particulares. Embora em alguns outros casos a lei conceda liberdade de escolha e decisão aos familiares, a disponibilidade é relativa, limitada.
 
Em razão da importância social, predominam no direito de família as normas de ordem pública, impondo antes deveres do que direitos. Daí por que se observa uma intervenção crescente do Estado no campo do direito de família, visando-lhe conceder maior proteção e propiciar melhores condições de vida às gerações novas. Mas essa ligação não retira o caráter privado, pois está disciplinado num dos mais importantes setores do direito civil, e não envolve diretamente uma relação entre o Estado e o cidadão.
 
Esses direitos têm natureza personalíssima: são irrenunciáveis e intransmissíveis por herança
 
 
Família e casamento.
 
Com a CF/88, o conceito de família foi alargado, passando a integrá-lo as relações monoparentais. Isso acabou afastando da idéia de família o pressuposto casamento. Para a sua configuração, deixou-se de exigir a necessidade de existência de um par, o que, consequentemente, subtraiu de sua finalidade a proliferação. Foi reconhecida como família a união estável.
 
 
Evolução histórica do direito de família.
 
No direito romano a família era organizada sob a autoridade do pater famílias, o qual exercia sobre os filhos, até, o direito de vida e de morte. A família era simultaneamente uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional. Com o tempo foi-se restringindo progressivamente a autoridade do pater, dando-se maior autonomia à mulher e aos filhos. Durante a Idade Média as relações de família regiam-se exclusivamente pelo direito canônico, sendo o casamento religioso o único conhecido.
 
A família brasileira sofreu influência romana, da família canônica e família germânica. Só recentemente o direito de família passou a seguir rumos próprios, com as adaptações à nossa realidade, perdendo aquele caráter canonista e dogmático intocável e predominando a natureza contratualista, numa certa equivalência quanto à liberdade de ser mantido ou desconstituído o casamento.
 
 
O direito de família na Constituição de 1988 e no Código Civil de 2002.
 
A CF/88 absorveu as novas transformação e adotou uma nova ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana, realizando verdadeira revolução no Direito de Família, a partir de três eixos básicos:
(1) art. 226 – entidade familiar é plural e não mais singular, tendo várias formas de constituição;
(2) art. 227, §6º - alteração do sistema de filiação, de sorte a proibir as designações discriminatórias;
(3) art. 5º, inciso I e art. 226, §5º - princípio da igualdade entre homens e mulheres.
 
A CF abriu ainda outro horizontes ao instituto jurídico da família, dedicando especial atenção ao planejamento familiar e à assistência direta à família. Estabeleceu também que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integra, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
 
Essas mudanças culminaram com o CC de 2002, com a convocação dos pais a uma paternidade responsável e a assunção de uma realidade familiar concreta, onde os vínculos de afeto se sobrepõem à verdade biológica. Prioriza-se a família socioafetiva, a não-discriminação de filhos, a co-responsabilidade dos pais quanto ao exercício do poder familiar, e se reconhece o núcleo monoparental como entidade familiar. O novo diploma amplia, ainda, o conceito de família, com a regulamentação da união estável como entidade familiar, reafirma a igualdade entre os filhos, dentreoutras várias alterações.
 
 
DO DIREITO PESSOAL
 
Título I – DO CASAMENTO
 
CAPÍTULO I – Disposições Gerais.
 
Conceito.
 
O casamento, como todas as instituições sociais, varia com o tempo e povos. Para PONTES DE MIRANDA, resumidamente, casamento é o contrato de direito de família que regula a união entre marido e mulher.
 
GONÇALVES adere ao conceito de JOSÉ DE OLIVEIRA: casamento é o negócio jurídico de Direito de Família por meio do qual um homem e uma mulher se vinculam através de uma relação típica, que é a relação matrimonial, que é relação personalíssima e permanente, que traduz a ampla e duradoura comunhão de vida.
 
 
Natureza jurídica.
 
Não há consenso, na doutrinam a respeito da natureza jurídica do casamento.
(a)     Concepção clássica: considera o casamento civil um contrato.
(b)    Concepção institucionalista: prevalece no casamento o caráter institucional (conjunto de regras determinadas pelo Estado, de forma que as partes têm apenas a faculdade de aderir), pois casamento é uma instituição social, no sentido de que reflete uma situação jurídica cujos parâmetros se acham preestabelecidos pelo legislador.
(c)     Concepção mista (doutrina majoritária): considera o casamento ato complexo, ao mesmo tempo contrato e instituição. Trata-se de um contrato especial (de direito de família), pois não gira somente em torno de interesses econômicos, mas elevados valores morais e pessoais. Portanto, é inegável sua natureza contratual; mas, como complexo de normas que governam os cônjuges durante a união conjugal, predomina o caráter institucional.
 
 
Caracteres do casamento.
 
(a)     É ato eminentemente solene: é repleto de formalidades, que visam dar maior segurança a tal ato (ex.: processo de habilitação e publicação dos editais, cerimônia e registro em livro próprio).
(b)    As normas que o regulamentam são de ordem pública: não podem ser derrogadas por particulares.
(c)     Estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
(d)    Representa união permanente: dividem-se, nesse ponto, os sistemas jurídicos; predominam atualmente os que consagram a sua dissolubilidade (divórcio).
(e)     Exige diversidade de sexos: homem e mulher.
(f)      Não comporta termo ou condição: constitui, assim, negócio jurídico puro e simples.
(g)    Permite liberalidade de escolha do nubente: liberdade nupcial é um princípio fundamental.
 
 
Finalidade do casamento.
 
São múltiplas as finalidades do casamento e variam conforme a visão filosófica, sociológica, jurídica ou religiosa como são encaradas. Exemplos:
(a)     Concepção canônica: procriação e educação da prole e mútua assistência e satisfação sexual.
(b)    Concepção individualista: satisfação sexual
à Sem dúvida, a principal finalidade do casamento é estabelecer uma comunhão plena de vida, impulsionada pelo amor e afeição existente entre o casal e baseada na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges e na mútua assistência.
 
 
CAPÍTULO II – Do Processo de Habilitação para o Casamento.
 
Da capacidade para o casamento.
 
As formalidades preliminares dizem respeito ao processo de habilitação, que se desenvolve perante o Registro Civil. Destina-se este a constatar a capacidade para o casamento, a inexistência de impedimentos matrimoniais e a dar publicidade à pretensão dos nubentes.
 
A incapacidade (impedimento absoluto) significa a inaptidão do indivíduo para casar com quem quer que seja, como sucede no caso do menor de 16 anos, que apenas excepcionalmente pode casar. Já o impedimento (impedimento relativo) se funda na idéia de falta de legitimação, trazida da seara do direito processual para o direito civil (inaptidão para o casamento) (ex.: parentesco - descendente e ascendente).
             
            Requisitos gerais e específicos.
 
No capítulo concernente à capacidade para o casamento, o CC só exige que homem e da mulher tenham 16 anos de idade e exibam autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil (art. 1.517), permitindo o suprimento do consentimento quando a denegação foi injusta (art. 1.519) e autorizando, excepcionalmente, o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (16 anos) (art. 1520). Com a celebração do casamento cessa a incapacidade dos nubentes (desfeito o vínculo patrimonial dos nubentes, mantém-se a capacidade civil).
 
            Suprimento judicial de idade.
 
Art. 1.520. Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art. 1517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez.
(a) Prática de crime contra os costumes: aqueles crimes que o casamento é causa de extinção da punibilidade (estupro, corrupção de menores etc.). Vale lembrar que tal suprimento não dispensa o consentimento dos pais.
(b) Gravidez: objetiva-se proteger a prole vindoura.
 
            Suprimento judicial do consentimento dos representantes legais.
 
Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil.
Art. 1.519. A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz.
 
Trata-se de um remédio contra o despotismo dos pais. Pode-se citar como exemplos de denegação dos pais:
(a)     Injusta: preconceito racial ou religioso, ciúme, etc.
(b)    Justa: costumes desregrados, falta de recursos para o sustento, etc.
 
Caso o pedido de suprimento do consentimento for deferido, será expedido alvará, a ser juntado no processo de habilitação, e o casamento celebrado no regime de separação de bens.
 
 
O procedimento para habilitação.
 
 Tal procedimento tem a finalidade de comprovar que os nubentes preencham os requisitos que a lei estabelece para o casamento. Destina-se a constatar a capacidade para a realização do ato, a inexistência de impedimentos matrimoniais ou de causa suspensiva e a dar publicidade, por meio de editais, à pretensão manifestada pelos noivos, convocando as pessoas que saibam de algum impedimento para que venham opô-lo.
 
Art. 1.527. Estando em ordem a documentação, o oficial extrairá o edital, que se afixará durante quinze dias nas circunscrições do Registro Civil de ambos os nubentes, e, obrigatoriamente, se publicará na imprensa local, se houver.
Parágrafo único. A autoridade competente, havendo urgência, poderá dispensar a publicação.
 
Requisitos essenciais: diversidade de sexo, consentimento dos nubentes e a celebração na forma da lei.
 
Documentos necessários: Art. 1.525. O requerimento de habilitação para o casamento será firmado por ambos os nubentes, de próprio punho, ou, a seu pedido, por procurador, e deve ser instruído com os seguintes documentos:
I - certidão de nascimento ou documento equivalente;
II - autorização por escrito das pessoas sob cuja dependência legal estiverem, ou ato judicial que a supra; (Ex.: pródigo).
III - declaração de duas testemunhas maiores, parentes ou não, que atestem conhecê-los e afirmem não existir impedimento que os iniba de casar;
IV - declaração do estado civil, do domicílio e da residência atual dos contraentes e de seus pais, se forem conhecidos;(memorial)
V - certidão de óbito do cônjuge falecido, de sentença declaratória de nulidade ou de anulação de casamento, transitada em julgado, ou do registro da sentença de divórcio.
 
Eficácia da habilitação: Art. 1.532. A eficácia da habilitação será de noventa dias, a contar da data em que foi extraído o certificado.
 
 
CAPÍTULO III – Dos Impedimentos.
 
Conceito e espécies.
 
Para que o casamento tenha existência jurídica, é necessária a presença dos elementos essenciais (pressupostos fáticos). Para que seja válido e regular, deve preencher outras condições (não só jurídicas como éticas), cuja inobservância fulmina de nulidade o ato.
 
Impedimentos: são circunstâncias ou situações de fato ou de direito, expressamente especificadas nalei, que vedam a realização do casamento. Não se deve confundir impedimento com incapacidade, pois o incapaz não pode casar com nenhuma pessoa; já o impedido apenas não está legitimado a casar com determinada pessoa.
 
Fins dos impedimentos: visam proteger a eugenia (pureza da raça) e a moral familiar (obstando a realização de casamentos entre parentes consangüíneos, por afinidade e adoção) e a monogamia.
Art. 1.521. Não podem casar:
I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II - os afins em linha reta;
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive; (ver Decreto-Lei no. 3.200/41)
V - o adotado com o filho do adotante;
VI - as pessoas casadas;
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
 
 
Impedimentos resultantes do parentesco (consangüinidade, afinidade e adoção).
 
(a)     Consangüinidade: incisos I e IV.
 
O casamento entre consangüíneos próximos pode provocar o nascimento de filhos defeituosos. Portanto, além das razões morais, o impedimento revela preocupação de natureza eugênica.
 
O impedimento resultante do parentesco civil, existente entre adotante e adotado, é justificado pelo fato de a adoção imitar a família. Inspira-se, pois, em razões de moralidade familiar.
 
Os irmãos são parentes colaterais em 2º grau porque descendem de um tronco comum. O impedimento alcança todos os irmãos, unilaterais (uterinos – mãe; consangüíneos - pai) ou bilaterais (germanos).
 
Já tios e sobrinhos são colaterais de terceiro grau, impedidos de casar. Contudo, conforme o princípio da especialidade, o Decreto-Lei nº. 3.200/41 legitima o regime do casamento entre colaterais do terceiro grau, sujeita a algumas especificações. Mas há uma corrente que afirma que esse Decreto-Lei foi derrogado pelo CC/2002. Vale lembrar que os primos são colaterais de quarto grau.
 
(b)    Afinidade: inciso II.
 
Parentesco por afinidade é o que liga um cônjuge ou companheiro aos parentes do outro. Portanto, resulta do casamento ou união estável. Então, p.ex., o viúvo não pode casar-se com enteada, nem com a sogra, pois a afinidade em linha reta não se extingue com a dissolução do casamento que a originou.
 
(c)     Adoção: incisos III e V.
 
Trata-se de proibição de ordem moral, considerando o respeito e a confiança que devem reinar na família.
(1)     Adotado com o filho do adotante: não podem, pois são irmãos (dispositivo desnecessário).
(2)     Adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante: inciso desnecessário, pois se trata de parentes por afinidade na linha reta, já regulado no inciso II.
 
Vale lembrar que a adoção é concedida por sentença constitutiva, sendo, portanto, irretratável (perpétuo).
 
Parentesco:         (a) natural: consangüíneo (linha reta e linha colateral);
                           (b) civil: outra origem (adoção, afinidade, sócio-afetivo, etc., pois o Código deixa em aberto).
 
 
Impedimento resultante do casamento anterior.
 
Não podem casar, ainda, as pessoas casadas (inciso VI). Procura-se, assim, combater a poligamia. Tal impedimento só desaparece após a dissolução do anterior vínculo matrimonial pela morte, invalidade, divórcio ou morte presumida dos ausentes.
 
Tal infração acarreta nulidade do segundo casamento, respondendo ainda o infrator pelo crime de bigamia.
 
O casamento religioso de um ou de ambos os cônjuges, que ainda não foi registrado no registro civil, não constitui impedimento para a celebração do casamento civil, uma vez que, na esfera jurídica, é inexistente.
Mesmo nulo o casamento, necessita o cônjuge, para se casar novamente, obter a declaração judicial de nulidade. Enquanto não se pronuncia a nulidade do primeiro casamento, o posterior é tido como nulo (fica suspenso). Mas é nulo o posterior se o primeiro era apenas anulável, e não passou em julgado a sentença de anulação do primeiro antes de contraído o outro.
 
 
Impedimento decorrente de crime.
 
VII - Cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte: embora não haja distinção, abrange somente o homicídio doloso, como é tradição no nosso direito. Tal impedimento resulta, em juízo ético de reprovação. Portanto, trata-se de impedimento de ordem moral.
 
Exige-se a condenação do sujeito. Ainda que uma condenação seja posterior ao casamento do sobrevivente com o criminoso, retroagirão seus efeitos para a situação jurídica matrimonial já estabelecida, operando sua nulidade.
 
 
Da oposição de impedimentos.
 
A oposição de impedimento é a comunicação escrita feita por pessoa legitimada, antes da celebração do casamento, ao oficial do registro civil, perante o qual se processa a habilitação, ou ao juiz que preside a solenidade, sobre a existência de um dos empecilhos mencionados na lei.
 
Pessoas legitimadas e momento da oposição dos impedimentos: “Art. 1.522. Os impedimentos podem ser opostos, até o momento da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz. Parágrafo único. Se o juiz, ou o oficial de registro, tiver conhecimento da existência de algum impedimento, será obrigado a declará-lo”.
 
Forma de oposição: “Art. 1.529. Tanto os impedimentos quanto as causas suspensivas serão opostos em declaração escrita e assinada, instruída com as provas do fato alegado, ou com a indicação do lugar onde possam ser obtidas”. Acrescenta o art. 1.530 que o oficial do registro civil “dará aos nubentes ou a seus representantes nota da oposição, indicando os fundamentos, as provas e o nome de quem a ofereceu”. Todavia, o mesmo artigo assegura aos nubentes o direito de “requerer prazo razoável para fazer prova contrária aos fatos alegados, e promover as ações civis e criminais contra o oponente de má-fé (§ único)”.
 
 
 
CAPÍTULO IV – Das Causas Suspensivas.
 
Introdução.
 
Causas suspensivas são determinadas circunstâncias ou situações capazes que não provocam, quando infringidas, a nulidade ou anulabilidade do matrimônio. O casamento é apenas considerado irregular, tornando, porém, obrigatório o regime da separação de bens, como sanção imposta ao infrator. Portanto, opostas as causas, após o casamento, este será válido, mar vigorará entre os cônjuges o regime da separação de bens.
 
Tais causas visam proteger interesses de terceiros, em geral da prole (herdeiros) do leito anterior (evitando a confusão de patrimônios e de sangue), do ex-cônjuge e da pessoa influenciada pelo abuso de confiança ou de autoridade exercido pelo outro (tutela e curatela).
 
A oposição das causas suspensivas deve ser feita no prazo de 15 dias da publicação dos editais, para produzir o efeito de sustar a realização do casamento.
Art. 1.523. Não devem casar:
I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;
II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas.
Parágrafo único. É permitido aos nubentes solicitar ao juiz que não lhes sejam aplicadas as causas suspensivas previstas nos incisos I, III e IV deste artigo, provando-se a inexistência de prejuízo, respectivamente, para o herdeiro, para o ex-cônjuge e para a pessoa tutelada ou curatelada; no caso do inciso II, a nubente deverá provar nascimento de filho, ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo.
 
Mas vale lembrar que somente será necessário comprovar ausência de prejuízo, em todos os casos mencionadosno parágrafo único, se oposta a causa suspensiva por algum interessado, uma vez que não é dado ao oficial do registro ou ao celebrante do casamento declarar de ofício a causa suspensiva.
 
 
Confusão de patrimônios.
 
“O viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros”, pois com a partilha, definem-se os bens que comporão o quinhão dos filhos do casamento anterior, evitando a referida confusão. Além dessa, é imposta outra sanção ao cônjuge infrator no livro concernente ao direito das coisas: a incidência da hipoteca legal em favor dos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior (art. 1.489, II).
 
Mas a jurisprudência, sabiamente, vem afastando a invalidade do regime de comunhão de bens, se o cônjuge falecido não tiver algum filho, assim como, ainda que tenha deixado algum, se o casal não tiver bens a partilhar.
 
 
Divórcio.
 
Para também evita a confusão de patrimônios, o CC estabeleceu previsão específica de causa suspensiva de casamento para o “o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal”.
 
 
Confusão de sangue.
 
Também não devem casar “a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal”, ou seja, trata-se de causa suspensiva que se impõe somente à mulher, cujo objetivo é evitar dúvidas sobre a paternidade.
 
 
Tutela e curatela.
 
Por fim, não devem casar “o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas”, o que visa afastar a coação moral que possa ser exercida por pessoa que tem ascendência e autoridade sobre o ânimo do incapaz. A finalidade da regra é a proteção do patrimônio do incapaz, evitando o locupletamento do representante ou de seus parentes a suas expensas.
 
 
Da oposição das causas suspensivas.
 
Pessoas legitimadas: “Art. 1.524. As causas suspensivas da celebração do casamento podem ser argüidas pelos parentes em linha reta de um dos nubentes, sejam consangüíneos ou afins, e pelos colaterais em segundo grau (irmãos), sejam também consangüíneos ou afins”.
 
Momento da oposição das causas suspensivas: devem ser articuladas no curso do processo de habilitação, até o decurso do prazo de quinze dias da publicação dos proclamas.
 
Forma de oposição: é a mesma da oposição dos impedimentos, mencionada acima.
 
 
CAPÍTULO VI – Da Celebração do Casamento.
 
 
Formalidades.
 
O casamento é cercado de um verdadeiro ritual, com significativa incidência de normas de ordem pública (constitui negócio jurídico solene). Tais formalidades atribuem seriedade e certeza ao ato. A celebração do casamento sem o atendimento dos rigores da lei torna inexistente o ato.
 
Os nubentes, depois de cumpridas as formalidades preliminares e munidos da certidão de habilitação passada pelo oficial do registro, devem peticionar à autoridade que presidirá o ato, requerendo a designação do “dia, hora e local” de sua celebração (art. 1.533).
(a) Local da realização da cerimônia: em geral é a sede do próprio cartório onde se processou a habilitação, mas pode ser escolhido outro, público ou particular (clubes, salões de festa, templos religiosos), “consentindo a autoridade competente”. É importante que as portas permaneçam abertas, permitindo o ingresso de qualquer pessoa no recinto, e que a solenidade se realize com toda a publicidade, a fim de possibilitar a oposição de eventuais impedimentos. O §1º, por sua vez, diz que “Quando o casamento for em edifício particular, ficará este de portas abertas durante o ato”. Mas, conforme a jurisprudência, a publicidade não constitui formalidade essencial do casamento.
(b) Dia e hora: pode o casamento ser realizado durante o dia ou à noite, e em qualquer dia, contanto que a celebração não ocorra de madrugada ou em altas horas noturnas – o que dificultaria a presença de pessoas que pretendessem oferecer impugnações.
 
Testemunhas: é imprescindível sua presença, sendo que o CC exige a presença de pelo menos duas (parentes ou não dos contraentes). Se algum dos contraentes não puder ou souber escrever, colher-se-ão as impressões digitais, e o número de testemunhas será aumentado para quatro. Também será aumentado para quatro se o casamento se realizar em edifício particular. Por fim, conforme o artigo 1.540, “Quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau”. Todas essas testemunhas participam do ato como representantes da sociedade.
 
Autoridade competente: enquanto não criados os juízos de paz mencionados na CF, é o juiz de casamentos do lugar em que se processou a habilitação, regulado pela lei de organização judiciária de cada Estado. Trata-se de função não remunerada
Art. 1.539. § 1o A falta ou impedimento da autoridade competente para presidir o casamento suprir-se-á por qualquer dos seus substitutos legais, e a do oficial do Registro Civil por outro ad hoc, nomeado pelo presidente do ato.
§ 2o O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no respectivo registro dentro em cinco dias, perante duas testemunhas, ficando arquivado.
 
 
Momento da celebração.
 
Art. 1.535. Presentes os contraentes, em pessoa ou por procurador especial, juntamente com as testemunhas e o oficial do registro, o presidente do ato, ouvida aos nubentes a afirmação de que pretendem casar por livre e espontânea vontade, declarará efetuado o casamento, nestes termos: "De acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados".
 
Trata-se do princípio da atualidade do mútuo consenso. A resposta deve ser pessoal e oral, mas admite-se a resposta escrita e por sinais (mudo), pois o importante é o consentimento inequívoco (“sim”).
 
A declaração do celebrante é essencial. Sem ela, o casamento perante o nosso direito é inexistente. Pode-se afirmar, pois, que o ato só se tem por concluído com a solene declaração do celebrante.
Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.
 
Celebrante: o juiz, depois de manifestadas as vontades dos nubentes, deve declará-los casados. Mas o celebrante não é meramente homologatório, pois tem função, até, fiscalizadora, já que deve observar a “qualidade” das vontades manifestadas.
 
 
Suspensão da cerimônia.
 
Art. 1.538. A celebração do casamento será imediatamente suspensa se algum dos contraentes:
I - recusar a solene afirmação da sua vontade; II - declarar que esta não é livre e espontânea; III - manifestar-se arrependido.
Parágrafo único. O nubente que, por algum dos fatos mencionados neste artigo, der causa à suspensão do ato, não será admitido a retratar-se no mesmo dia.
 
Se apesar da recusa, a cerimônia prosseguir e o ato for concluído e registrado, o casamento será inexistente por falta de elemento essencial: o consentimento.
 
No caso do parágrafo único, a retratação não será aceita ainda que o nubente provocador do incidente declare tratar-se de simples gracejo. O certo é designar-se o casamento para o dia seguinte ou para nova data, dentro do prazo de eficácia da habilitação, para permitir uma serena reflexão do nubente indeciso.
 
Além dos casos mencionados no artigo 1.538, a celebração do casamento se interromperá se os pais, tutores ou curadores revogarem a autorização concedida (art. 1.518), bem como se, no decorrer da solenidade,for devidamente oposto algum impedimento legal, sério e com sua respectiva prova.
 
 
Assento do casamento no livro de registro.
 
Completando o ciclo das formalidades, que se inicia com o processo de habilitação e prossegue com a cerimônia solene, lavrar-se-á, logo depois da celebração, “assento no livro de registro” com os elementos elencados nos arts. 1.536 do CC e 173 da Lei dos Registros Públicos. Deve ainda constar, se for o caso, a autorização para casar e transcrever-se-á, integralmente, a escritura antenupcial (art. 1.537).
 
Tal assento destina-se a dar publicidade ao ato e, precipuamente, a servir de prova de sua realização e do regime de bens. A falta de tal solenidade apenas dificultará a prova do ato, mas não o tornará inválido. Entretanto, diversamente ocorre no casamento religioso com efeitos civis, em que o registro no livro próprio é condição de sua eficácia, devendo ser realizado no ofício competente.
Art. 1.536. Do casamento, logo depois de celebrado, lavrar-se-á o assento no livro de registro. No assento, assinado pelo presidente do ato, pelos cônjuges, as testemunhas, e o oficial do registro, serão exarados:
I - os prenomes, sobrenomes, datas de nascimento, profissão, domicílio e residência atual dos cônjuges; II - os prenomes, sobrenomes, datas de nascimento ou de morte, domicílio e residência atual dos pais; III - o prenome e sobrenome do cônjuge precedente e a data da dissolução do casamento anterior; IV - a data da publicação dos proclamas e da celebração do casamento;
V - a relação dos documentos apresentados ao oficial do registro; VI - o prenome, sobrenome, profissão, domicílio e residência atual das testemunhas; VII - o regime do casamento, com a declaração da data e do cartório em cujas notas foi lavrada a escritura antenupcial, quando o regime não for o da comunhão parcial, ou o obrigatoriamente estabelecido.
 
 
Casamento por procuração.
 
Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com poderes especiais.
§ 1o A revogação do mandato não necessita chegar ao conhecimento do mandatário; mas, celebrado o casamento sem que o mandatário ou o outro contraente tivessem ciência da revogação, responderá o mandante por perdas e danos.
§ 2o O nubente que não estiver em iminente risco de vida poderá fazer-se representar no casamento nuncupativo.
§ 3o A eficácia do mandato não ultrapassará noventa dias.
§ 4o Só por instrumento público se poderá revogar o mandato.
 
Tal dispositivo possibilita ao contraente que esteja impossibilitado de comparecer pessoalmente perante a autoridade competente, ou que prefira adotar essa forma, nomear procurador com poderes especiais para representá-lo no ato de celebração do casamento. A permissão se justifica plenamente, quando inadiável o casamento ou inconveniente o seu retardamento, não seja possível a presença simultânea dos nubentes perante a autoridade que irá celebrar o ato.
 
No tocante à revogação, faz-se mister esclarecer que o mandato reputa-se válido até a ciência do representante. Contudo, tais noções não se aplicam à procuração ad nuptias, em razão da natureza personalíssima do casamento. O CC considera o casamento realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, anulável. Já no caso de morte do representado, considera-se o casamento posterior inexistente, pois a morte faz cessar qualquer mandato.
 
DIREITO DE FAMÍLIA – PARTE II
CAPÍTULO VII – Das Provas do Casamento.
 
Introdução.
 
Como todo negócio jurídico, o casamento está sujeito a comprovação. A lei estabelece um rigoroso sistema de prova da sua existência, chamado sistema da prova pré-constituída. Regra geral, a prova se faz especificamente pela certidão do registro. Todavia, ela abre exceções ao princípio geral estatuído, para permitir a demonstração da existência de casamento realmente ocorrido, mas que, por alguma razão, não podem ser comprovados pelo meio inicialmente aludido.
 
 
Prova específica: certidão do registro.
 
Art. 1.543. O casamento celebrado no Brasil prova-se pela certidão do registro..
Parágrafo único. Justificada a falta ou perda do registro civil, é admissível qualquer outra espécie de prova.
 
Trata-se do sistema da prova pré-constituída. Mas justificada a falta ou perda do registro civil (ex., incêndio, inundação ou fraude no cartório), admite-se qualquer outra prova.
 
 
Posse do estado de casados: conceitos e elementos.
 
Posse do estado de casados é a situação de duas pessoas que vivem como casadas e assim são consideradas por todos. Tal modus vivendi, em regra, não constitui meio de prova do casamento, a não ser excepcionalmente, em benefício da prole comum (art. 1.545), e nas hipóteses em que ele é impugnado e a prova mostra-se dúbia, funcionando nesse último caso como elemento favorável a sua existência (art. 1.547).
 
Não se trata de conferir o status de casamento a circunstância de mera convivência ou coabitação, ainda que haja filhos, mas de induzir a existência do casamento, que não pode ser provado por certidão do registro em face das aludidas circunstâncias. Apenas serve como prova que tenha sido efetivamente celebrado.
 
Elementos que caracterizam a posse do estado de casados: (a) nomen, indicativo de que a mulher usava o nome do marido; (b) tractatus, de que se tratavam publicamente como marido e mulher; e (c) fama, de que gozavam de reputação de pessoas casadas.
 
Validade como prova do casamento de pessoas falecidas ou que não possam manifestar vontade: o casamento de pessoas, na posse do estado de casadas, em tais hipóteses não pode ser contestado “em prejuízo da prole comum, salvo mediante certidão do Registro Civil que prove que já era casada alguma delas, quando contraiu o casamento impugnado”. Tal situação somente poderá ser alegada pelos filhos e se mortos ambos os cônjuges, pois se um está vivo, deve indicar o local onde se realizou o casamento para a obtenção da certidão.
 
Importância na solução da dúvida entre as provas favoráveis e contrárias à existência do casamento (art. 1.547): a posse do estado de casados também poderá ser alegada em vida dos cônjuges quando o casamento for impugnado, neste caso, se houver dúvida entre as provas favoráveis e contrárias à celebração do casamento. Assim, a alegada posse do estado de casados serve para se provar a existência do casamento, nunca para convalescer vício que o invalida.
 
 
Prova do casamento celebrado no exterior.
 
Prova-se o casamento celebrado no estrangeiro de acordo com a lei do país onde se celebrou. O documento estrangeiro deverá ser autenticado, segundo as leis consulares, para produzir efeitos no Brasil. Mas o cidadão brasileiro que resida no exterior pode optar por se casar pela lei brasileira, perante autoridade consular. Vale lembrar que o prazo de 180 dias para o registro do casamento no Brasil é mera recomendação burocrática.
 
Casamento entre estrangeiros celebrado no exterior: a lei não exige o registro no Brasil desses casamentos, pois, em princípio, os atos e fatos ocorridos em outro país não entram no registro civil. Basta aos cônjuges apresentar a certidão do casamento autenticada pela autoridade consular, para provarem seu estado civil. Porém, pode haver problemas de ordem prática na hipótese de o casal aqui se divorciar, por não ter acesso ao registro civil. No entanto, o STF já decidiu ser admissível a transcrição do registro no Brasil de casamento de estrangeiros, celebrado no exterior.
 
 
Casamento cuja prova resultar de processo judicial (art. 1.546).
 
Tal dispositivo trata das hipóteses em que, diante das dificuldades encontradas para provar a existência do matrimônio, recorrem os cônjuges ao processo judicial. A ação declaratória se mostra adequada para provar.
 
 
CAPÍTULO VIII – Espécies de Casamento Válido.
 
Casamento válido.
 
Antes de se verificar se o casamento é válido ou inválido, deve-se verificar se ele existe. São espécies de casamento inválido a nulidade e a anulabilidade.São espécies de casamentos válidos o putativo, o nuncupativo, o religioso com efeitos civis, o consular e o por procuração, desde que presentes os elementos essenciais e observados todos os requisitos legais.
 
 
Casamento putativo.
 
CONCEITO:
 
Casamento putativo (do latim putare) é o que, embora anulável ou mesmo nulo, foi contraído de boa-fé por um ou por ambos os cônjuges. Por isso, produz, para o de boa-fé e os filhos, todos os efeitos civis até passar em julgado a sentença anulatória. No caso, boa-fé significa ignorância da existência de impedimentos. Casamento putativo é aquele que as partes e os terceiros reputam ter sido legalmente celebrado.
 
A ignorância da existência de impedimentos decorre de erro, que tanto pode ser de fato como de direito. Muito embora o erro de direito seja inescusável, em geral, pode, todavia, ser invocado para justificar boa-fé.
 
O juiz declara a putatividade ex officio ou a requerimento das partes, e tem natureza declaratória. A sentença anulatória declara putativo o casamento, em relação a ambos os cônjuges, ou a um deles, se somente em relação a este milita a boa-fé. Vale lembrar que uma vez reconhecida a boa-fé, o casamento é putativo.
 
EFEITOS:
 
Os efeitos da putatividade são todos os normalmente produzidos por um casamento válido, para o cônjuge de boa-fé, até a data da sentença que lhe ponha termo (o STF, inclusive, decidiu que há o direito de alimentos sem limitação de tempo). A eficácia dessa decisão manifesta-se ex nunc, sem retroatividade, não afetando os direitos até então adquiridos. Essa situação faz com que o casamento putativo assemelha-se à dissolução do matrimônio pelo divórcio. Os efeitos do casamento cessam para o futuro, sendo considerados produzidos todos os efeitos que se tenham verificado até a data da sentença anulatória. Nesse caso, por exemplo, se morre um dos cônjuges de um casal sem filhos e sem ascendentes vivos antes da sentença anulatória transitar em julgado, o sobrevivo herda, além de receber sua meação, ou concorrerá com eles, se existirem e se o regime de bens permitir.
 
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
§ 1o Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.
§ 2o Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.
Produzem-se todos os efeitos do regime de bens, operando-se a dissolução da eventual comunhão pelas mesmas regras previstas para a separação judicial. Já sem putatividade por parte de ambos os cônjuges, entende-se jamais ter havido comunhão.
 
Art. 1.564. Quando o casamento for anulado por culpa de um dos cônjuges, este incorrerá:
I - na perda de todas as vantagens havidas do cônjuge inocente;
II - na obrigação de cumprir as promessas que lhe fez no contrato antenupcial.
O cônjuge de má-fé perde as vantagens econômicas auferidas com o casamento (inclusive uma possível emancipação). Partilham-se, apenas, os bens adquiridos pelo esforço comum, sendo que o inocente terá direto, ainda, à participação no acervo que o culpado trouxe para o casamento.
 
Ao casamento inexistente não se aplicam as regras sobre o casamento putativo, restrita ao nulo e ao anulável.
 
 
Casamento nuncupativo e em caso de moléstia grave.
 
O CC abre duas exceções quanto às formalidades para a validade do casamento:
 
(a) Caso de moléstia grave de um dos nubentes (art. 1.539):
 
Nesse caso pressupõem-se que já estejam satisfeitas as formalidades preliminares do casamento e o oficial do registro civil tenha expedido o certificado de habilitação ao casamento, mas a gravidade do estado de saúde de um dos nubentes o impede de locomover-se e de adiar a cerimônia. Nesse caso, o juiz irá celebrá-lo na casa dele ou onde se encontrar, em companhia do oficial, ainda que à noite, perante duas testemunhas que saibam ler e escrever. Então, só havendo urgência é que o casamento será realizado à noite.
 
(b) Casamento nuncupativo - hipótese de estar um dos nubentes em iminente risco de vida (arts. 1.540 e 1.541):
 
Tal hipótese ocorre quando se permite a dispensa do processo de habilitação e até a presença do celebrante. Assim ocorre, por exemplo, quando o nubente é ferido por arma de fogo, ou sofre grave acidente, em que não há a mínima esperança de salvação, e a duração da vida não poderá ir além de alguns instantes ou horas. Nessas desesperadoras circunstâncias, pode a pessoa desejar a regularização da vida conjugal que mantém com outra, ou pretender se efetive o casamento já programado e decidido, mas ainda não providenciado o encaminhamento. O casamento deverá ser celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau.
 
 
Casamento religioso com efeitos civis.
 
Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.
 
O casamento religioso é, no CC, equiparado ao casamento civil. O Código disciplina expressamente que o casamento religioso pode ser de duas espécies (ambas as formas exigem o processo de habilitação, sendo que somente a celebração é feita por autoridade religiosa da religião professada pelos nubentes):
 
(a) Com prévia habilitação (art. 1516, º1º e 2º): obtido o certificado de habilitação, será ele apresentado ao ministro religioso, que o arquivará. Celebrado o casamento, deverá ser promovido o registro, dentro de noventa dias (decadencial) de sua realização, mediante comunicação do celebrante ao ofício competente, ou por iniciativa de qualquer interessado. O falecimento de um dos nubentes não constituirá obstáculo ao registro.
 
(b) Com habilitação posterior à celebração religiosa (art. 1.516, §2º): celebrado o casamento religioso, os nubentes requererão o registro, a qualquer tempo, instruindo o pedido com certidão do ato religioso e com os documentos exigidos pelo art. 1.525 do CC. Processada e homologada a habilitação e certificada a inexistência de impedimento, o oficial fará o registro do casamento religioso, lavrando o assento. O registro, então, produzirá efeitos jurídicos a partir da data da realização do ato religioso.
 
 
Casamento consular.
 
Casamento consular é aquele celebrado por brasileiro no estrangeiro, perante autoridade consular brasileira.
 
Art. 1.544. O casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros, deverá ser registrado em cento e oitenta dias, a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio, ou, em sua falta, no 1o Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir.
 
A exigência, portanto, é a mesma na hipótese de casamento de brasileiro, realizado fora do País de acordo com as leis locais.
 
 
Conversão da união estável em casamento.
 
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
 
Em vez de recorrer ao Judiciário, mais fácil será simplesmente casar, máxime considerando-se que a referida conversão não produz efeitos pretéritos, valendo apenas a partir da data em que se realizar o ato de seu registro.
 
 
CAPÍTULO IX – Da Inexistência e da Invalidade do Casamento.
 
Casamento inexistente (ausência de pressupostos fáticos).
 
O plano da existência antecede o da validade. Por isso, antes de verificar se o ato jurídico e o casamento são válidos, faz-se mister averiguar se existem. E para que o casamento exista, é necessária a presença dos elementos essenciais ou estruturais (pressupostos fáticos, que não estão no CC): diferença de sexo, consentimento e celebração na forma da lei.
 
Em razão de o ato inexistenteconstituir um nada no mundo jurídico, não reclama ação própria para combatê-lo. No entanto, se, apesar da falta de um dos requisitos, ignorada pelo celebrante, houve celebração e lavratura do registro, far-se-á necessária a propositura de ação para cancelamento do registro. Admite-se o reconhecimento da inexistência a qualquer tempo, não estando sujeito a prescrição ou decadência.
 
Não se deve confundir:         
 
(a) falta de consentimento (inexistente) com consentimento viciado (anulável).
(b) falta de celebração (inexistente) com a feita por autoridade incompetente (anulável). Mas será inexistente quando o celebrante tiver incompetência absoluta em razão da matéria.
 
Hipóteses que acarretam a inexistência do casamento:
(a) Diversidade de sexos: ainda que de forma indireta, a CF só admite casamento entre pessoas do mesmo sexo. Contudo, parece inegável a possibilidade de o transexual casar-se com pessoa pertencente ao seu anterior sexo.
(b) Falta de consentimento: a coação absoluta insere-se na falta de consentimento.
(c) Ausência de celebração na forma da lei: a Lei dos Registros Públicos regula as formalidades da celebração do casamento; as autoridades competentes para exercer a presidência do ato solene são indicadas nas leis de organização judiciária dos Estados. Mas, no caso de casamento celebrado por autoridade incompetente em razão do lugar ou em função do domicílio dos nubentes, o casamento é considerado anulável.
 
 
Casamento inválido (ausência de pressupostos jurídicos).
 
O casamento inválido pode ser nulo ou anulável, dependendo de inobservância dos requisitos de validade exigidos na lei. Consoante SILVIO RODRIGUES, quando um casamento se realiza com infração de impedimento imposto pela ordem pública, por ameaçar diretamente a estrutura da sociedade, esta reage violentamente fulminando de nulidade o casamento. Nos casos em que a infração se revela mais branda ferindo apenas o interesse de pessoas que a lei quer proteger, o legislador apenas defere a estas uma ação anulatória, para que seja por elas usada, se lhes aprouver. Se o cônjuge, que podia anular o enlace não prejudicial à ordem pública, se mantém inerte, o casamento convalesce e ganha validade, não mais podendo ser infirmado.
 
A doutrina proclama que não se admitem nulidades virtuais em matéria de casamento, sustentando que este somente se invalida nas condições e nos casos definidos em lei.
 
A teoria das nulidades apresenta algumas exceções em matéria de casamento. Assim, embora os atos nulos em geral não produzam efeitos, há uma espécie de casamento, o putativo, que produz todos os efeitos de um casamento válido para o cônjuge de boa-fé. E, embora o juiz deva pronunciar de ofício a nulidade dos atos jurídicos em geral, a nulidade do casamento somente poderá ser declarada em ação ordinária.
 
Nulidade X anulabilidade:
 
Ambas são ações de estado e versam sobre direitos indisponíveis.
O prazo para propositura da ação anulatória é decadencial; a ação declaratória de nulidade é imprescritível.
O casamento anulável pode ser passível de ratificação, o que não ocorre com o casamento nulo.
 
(A) CASAMENTO NULO.
 
A declaração de nulidade proclama, retroativamente, jamais ter existido casamento válido (efeitos ex tunc). Assim, os bens que se haviam comunicado pelo casamento retornam ao antigo dono e não se cumpre o pacto antenupcial. O casamento nulo, entretanto, aproveita aos filhos, ainda que ambos os cônjuges estejam de má-fé, e a paternidade é certa.  Se reconhecida a boa-fé de um ou de ambos os cônjuges, ele será putativo.
Art. 1.563. A sentença que decretar a nulidade do casamento retroagirá à data da sua celebração, sem prejudicar a aquisição de direitos, a título oneroso, por terceiros de boa-fé, nem a resultante de sentença transitada em julgado.
 
Casos de nulidade: são dois casos os que o CC considera nulo o casamento (CC, art. 1.548):
(1) quando contraído por “enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil”: caracteriza-se por graves alterações das faculdades psíquicas, que acarretam a incapacidade absoluta do agente.
(2) quando infringe “impedimento”: os impedimentos são somente os elencados no art. 1.521
 
Pessoas legitimadas a argüir a nulidade: qualquer pessoa maior pode opor os impedimentos cuja violação acarrete a nulidade do casamento, mas a ação declaratória de nulidade é permitida somente a quem tenha legítimo interesse, econômico ou moral, e ao MP, cujo interesse é de cunho social.
Art. 1.549. A decretação de nulidade de casamento [...] pode ser promovida mediante ação direta, por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público.
 
Ação declaratória de nulidade: tal sentença tem efeitos ex tunc.
 
(B) CASAMENTO ANULÁVEL.
 
Na maioria dos casos há um consentimento defeituoso, uma manifestação volitiva imperfeita, seja por se tratar de pessoa que se casou inspirada no erro, seja por se tratar de quem, pela sua imaturidade ou defeito mental, não podia consentir desassistido de seu representante.
 
O casamento anulável produz todos os efeitos enquanto não anulado por decisão judicial transitava em julgado. Até então tem validade resolúvel, que se tornará definitiva se decorrer o prazo decadencial sem que tenha sido ajuizada ação anulatória. Porém, a sentença que anula o casamento tem efeitos retrooperantes, fazendo com que os cônjuges retornem à condição anterior, como se jamais o tivessem contraído (produz efeitos iguais à decretação de nulidade, desfazendo a sociedade conjugal como se nunca houvesse existido, salvo no caso de putatividade).
 
Há, contudo, uma corrente que sustenta ser ex nunc os efeitos da sentença anulatória.
 
Dolo: o dolo, em si, isto é, quando não leva a erro essencial, embora vício do consentimento, não conduz à anulabilidade do matrimônio, diversamente do que acontece com os negócios jurídicos em geral. Não seria difícil alegar um dos cônjuges que fora induzido ao casamento pelas manobras fraudulentas, as maquinações, os artifícios do outro, porque o próprio respeito recíproco, a cerimônia, o recato, o desejo de ser agradável, escondem defeitos, que depois se revelam. E dar a essas atitudes morais o valor de dolo nos contratos comuns seria enfraquecer excessivamente a estabilidade do matrimonio e das famílias.
 
 
Hipóteses do artigo 1.550:
 
Art. 1.550. É anulável o casamento:
 
(A) (I) de quem não completou a idade mínima para casar (menor de 16 anos): ação pode ser proposta pelo próprio menor, representantes, ou seus ascendentes, no prazo de 180 dias, contado da data da celebração para os representantes legais ou ascendentes, e, para o menor, da data em que atingir a referida idade mínima. No caso de a ação anulatória for ajuizada pelos representantes legais ou pelos ascendentes do menor (art. 1.552, II e III), poderá este confirmar seu casamento ao perfazer a idade mínima, com efeito retroativo, desde que ainda não tenha transitado em julgado a sentença anulatória, e com autorização de seus representantes, se necessária, ou com suprimento judicial. Deve-se levar em conta o art. 1.551, segundo o qual não se anulará, por motivo de idade, o casamento de que resultou gravidez.
 
(B) (II) do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal (entre 16 e 18 anos): nesse caso a ação anulatória pode ser proposta em 180 dias, por iniciativa do próprio incapaz, ao deixar de sê-lo, das pessoas que tinham o direito de consentir, ou seja, seus representantes legais, desde que não tenham assistido ao ato (valor de consentimento tácito), ou de seus herdeiros necessários. O prazo “será contado do dia em que cessou a incapacidade, no primeiro caso; a partir do casamento, no segundo; e, no terceiro, da morte do incapaz (nesse caso, não terão direito os herdeiros se o desenlace se der após o nubente tornar-se capaz)” (art. 1.555, §1º).
 
(C) (III) por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558:
 
(c.1.) Erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge (1.556 e 1.557):
 
Consoanteo artigo 1.556, o “casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro”. Por sua vez, o artigo 1.557 especifica as hipóteses de erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:
 
O prazo para propositura de ação anulatória é de 3 anos, sendo que somente o cônjuge que incidiu em erro pode demandar a anulação do casamento; mas a coabitação, havendo ciência do vício, valida o ato, ressalvadas as hipóteses dos incisos II e IV, que se referem à ignorância de defeito físico irremediável, moléstia grave e doença mental grave anteriores ao casamento (art. 1.559).
 
Nessa modalidade de vício de consentimento o agente engana-se sozinho. Mas deve-se salientar que não é qualquer erro que torna anulável o negócio jurídico ou o casamento. Para tanto, deve ser substancial, ou seja, deve ser causa determinante (se conhecia a realidade, o casamento não seria celebrado). A essencialidade do erro deve ser vista também do ponto de vista razoável, sensato.
 
Requisitos para o erro essencial:         
(a) existência e essencialidade do “defeito” anterior ao casamento;      
b) desconhecimento anterior;   
(c) descoberta torna impossível a vida em comum.
 
(1) Erro sobre a identidade do outro cônjuge, sua honra e boa fama (I):
Identidade: pode ter por objeto a (a) identidade física (casamento ocorre com pessoa diversa, por substituição ignorada pelo outro cônjuge), e a (b) civil, mais comum, na qual o erro recai sobre o conjunto de atributos ou qualidades com que a pessoa se apresenta no meio social. O erro sobre a identidade civil se manifesta como causa de anulação do casamento quando alguém descobre, em seu consorte, após a boda, algum atributo inesperado e inadmitido. Alguma qualidade repulsiva, capaz de, ante seus olhos, transformar-lhe a personalidade, fazê-lo pessoa diferente daquela querida (exs.: mulher que descobre ter marido toxicômano; homem que casa com mulher, pensando esta estar grávida dele, mas não está; mulher lésbica confessa; falta dos “deveres conjugais”; etc.). (A professora Renata Rauppacrescenta o erro quanto a identidade sexual e o quanto a identidade psicológica – pessoa fumante, p.ex.).
Honra e boa fama: trata-se das qualidades morais do indivíduo. Honrada é a pessoa digna, que pauta a sua vida pelos ditames da moral; boa fama é o conceito e a estima social de que a pessoa goza, por proceder corretamente (exs.: esposa prostituta; marido homossexual; etc.).
(2) Ignorância de crime ultrajante (II): deve-se lembrar que o crime. anterior ao casamento, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal. O dispositivo em análise não exige prévia condenação criminal, pois a existência e autoria do crime podem ser provadas na própria ação anulatória. Mas se o réu é absolvido, já não poderá o cônjuge invocar o erro.
(3) Ignorância de defeito físico irremediável ou de moléstia grave (III):
Defeito físico irremediável: é o que impede a realização dos fins matrimoniais, apresentando-se, em geral, como deformação dos órgãos genitais (exs.: o sexo dúbio, o hermafroditismo, o infantilismo, o vaginismo, a impotência coeundi etc.). O casamento pode ser anulável mesmo que o defeito não impeça a relação sexual, mas imponha sacrifícios à sua realização ou repulsa a uma das partes (exs.: cicatriz grande, falta de seios, etc.). Vale lembrar que a esterilidade não é causa de anulabilidade.
* Moléstia grave e transmissível por contágio ou herança (genética): tal moléstia deve por em risco a saúde do cônjuge ou sua descendência (exs.: tuberculose, lepra, sífilis, AIDS etc.).
(4) Ignorância de doença mental grave (IV): é a doença que se revela grave, suscetível de retirar do paciente o autocontrole de seus atos, a visão da realidade, e torne a vida em comum insuportável ao cônjuge enganado (exs.: esquizofrenia, oligofrenia, paranóia, epilepsia). A prof.ª Renata Raupp lembra que, como no CC/1916 havia quatro dispositivos, o legislador não quis deixar só três, acrescendo este.
 
(c.2.) Vício de vontade determinado pela coação (1.558):
Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de coação, quando o consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante fundado temor de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares.
 
No caso do dispositivo retrotranscrito, trata-se de coação moral ou relativa, que constitui vício de consentimento. Já a coação física ou absoluta torna inexistente o casamento. O temor reverencial, entretanto, não vicia o consentimento quando desacompanhado de ameaças ou violências (ex.: ameaças de castigo do pai à filha).
 
A ação só pode ser promovida pelo próprio coato, no prazo de 4 anos a contar da celebração (CC, arts. 1.559 e 1.560, IV). Vale lembrar que a prova da coabitação é muito subjetiva, sendo que a própria coabitação pode ter sido obtida mediante coação.
 
(D) (IV) do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento: haverá causa de anulabilidade se houver apenas redução da capacidade, como no caso dos fracos da mente e fronteiriços, como os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil (abrange os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos e os excepcionais sem completo desenvolvimento mental – art.s 4º, II e III, e 1.767, III e IV, do CC). Entretanto, se a incapacidade for duradoura, a hipótese será de casamento nulo. O prazo para tal anulação é de 180 dias, e tem como titular o próprio incapaz e representantes.
 
(E) (V) realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges: hipótese em que o outorgado, estando de boa-fé, utiliza um mandato já anteriormente revogado sem seu conhecimento. O parágrafo único proclama que se equipara à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada (p. único tem raríssima aplicação). O prazo para anulação, conforme o artigo 1.560, é de 180 dias, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da celebração; mas no caso do parágrafo único, o prazo começa a partir do pronunciamento judicial de invalidade do mandato.
 
(F) (VI) por incompetência da autoridade celebrante: a lei não distingue se se trata de incompetência em razão do lugar ou da matéria, mas predomina na doutrina a opinião de que somente acarreta anulabilidade a incompetência em razão do lugar ou em razão da pessoa (quando o celebrante preside a cerimônia nupcial fora do território de sua circuncisão ou o casamento é celebrado perante juiz que não seja o do local da residência dos noivos). Se o presidente não é autoridade competente em razão da matéria o casamento é inexistente (salvo exceção prevista no art. 1.554, que considera subsistente o casamento celebrado por pessoa que, embora não possua a competência exigida na lei, exerce publicamente as funções de juiz de casamentos, aplicando, assim, a hipóteses da teoria da aparência). É anulável de dois anos a contar da data da celebração.
 
 
CAPÍTULO X – Da Eficácia Jurídica do Casamento.
 
Efeitos jurídicos do casamento.
 
Os efeitos produzidos pelo casamento são numerosos e complexos. A união conjugal não é só relação jurídica, mas, antes de tudo, relação moral.
 
O casamento irradia os seus múltiplos efeitos e conseqüências no ambiente social e especialmente nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges, e entre estes e seus filhos, como atos de direito de família puros, gerando direitos e deveres que são disciplinados por normas jurídicas.
 
(a) Efeitos sociais:
O principal efeito é a constituição da família legítima ou matrimonial, que é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado. Insere ainda no contexto social o planejamento familiar, hoje assegurado constitucionalmente ao casal.
Art. 1.565. § 2o O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros parao exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas.
 
(b) Efeitos pessoais:
O principal efeito pessoal do casamento consiste no estabelecimento de uma comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges (art. 1.511). O art. 1.565 dispõe que por meio do casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
 
Do casamento advém uma situação jurídica relevante para os cônjuges, que adquirem um status especial, o estado de casados, que se vem somar às qualificações pelas quais se identificam no seio da sociedade e do qual decorrem inúmeras conseqüências.
 
Sobrenome: o cônjuge, ao se casar, pode permanecer com o seu nome de solteiro; mas, se quiser adotar os apelidos do consorte, não poderá suprimir o seu próprio sobrenome. Essa interpretação se mostra mais apropriada em face do princípio da estabilidade do nome, que só deve ser alterado em casos excepcionais. Deve-se lembrar que é difícil tirar o sobrenome do outro cônjuge depois (salvo se não causar prejuízo). A expressão “acrescer” não significa que o sobrenome deva ser acrescido no final, pois, no caso de ambos os consortes acrescerem, o sobrenome ficará diferente (Ex.: João da Silva Sauro e Maria Sauro da Silva).
Art. 1.565. § 1o Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.
 
Plena igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges: não há mais deveres próprios do marido e da mulher, assumindo ambos condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
Art. 1.567. A direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos. Parágrafo único. Havendo divergência, qualquer dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá tendo em consideração aqueles interesses.
Mas a direção da família caberá exclusivamente a um dos cônjuges, caso:
 Art. 1.570. Se qualquer dos cônjuges estiver em lugar remoto ou não sabido, encarcerado por mais de cento e oitenta dias, interditado judicialmente ou privado, episodicamente, de consciência, em virtude de enfermidade ou de acidente, o outro exercerá com exclusividade a direção da família, cabendo-lhe a administração dos bens.
 
(c) Efeitos patrimoniais:
Tratam-se de conseqüências e vínculos econômicos, consubstanciados no regime de bens, nas doações recíprocas, na obrigação de sustento de um ao outro e da prole, no usufruto dos bens dos filhos durante o poder familiar, no direito sucessório etc.
 
O regime de bens é, em princípio, irrevogável, só podendo ser alterado nas condições mencionadas (mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges).
 
Com o intuito de preservar o patrimônio da entidade familiar, o novo diploma regula a instituição do bem de família nos arts. 1.711 a 1.722. Visando ainda proteger o patrimônio comum e de cada cônjuge, especifica os atos que não podem ser praticados por um dos cônjuges sem a anuência do outro (art. 1.647). E, além de assegurar ao cônjuge sobrevivo os direitos sucessórios, o novel diploma inova ao incluí-lo como herdeiro necessário. O CC/2002 assegura, também, ao cônjuge supérstite, qualquer que seja o regime de bens e sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação, desde que o imóvel seja destinado à residência da família e o único daquela natureza a inventariar.
 
 
Deveres recíprocos dos cônjuges.
 
A infração a cada um desses deveres constitui causa para a separação judicial, ou seja, podem acarretar culpa numa separação litigiosa.
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca: decorrência do caráter monogâmico do casamento, a infração configura o adultério. A denominada “infidelidade virtual” pode caracterizar infidelidade, desde que interfira na vida comum.
II - vida em comum, no domicílio conjugal: trata-se da intimidade dos nubentes como casal, e não da convivência sob o mesmo teto. O art. 1.569 proclama que o domicílio do casal será escolhido por ambos os cônjuges, mas um e outro podem ausentar-se para atender a encargos públicos, ao exercício de sua profissão, ou a interesses particulares relevantes. Por isso, só a ausência do lar conjugal durante um ano constitui, sem essas finalidades, caracteriza o abandono voluntário (art. 1.573).
III - mútua assistência: tal dever obriga os cônjuges a se auxiliarem reciprocamente, em todos os níveis (tanto moral quanto matrimonial e espiritual).
IV - sustento, guarda e educação dos filhos (comuns): o sustento e a educação constituem deveres de ambos os cônjuges; a guarda é, ao mesmo tempo, dever e direito dos pais.
V - respeito e consideração mútuos: incluem-se aí, além da consideração social compatível com o ambiente e com a educação dos cônjuges, o dever, negativo, de não expor um ao outro a vexames e descrédito.
 
 
 
Direitos e deveres de cada cônjuge.
 
O CC/1916 regulava os direitos e deveres do marido e da mulher em capítulos distintos, porque havia algumas diferenças. Em virtude, porém, da isonomia estabelecida pelo art. 226, §5º, da CF, o novo CC disciplinou somente os direitos de ambos os cônjuges.
Art. 1.567. A direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos. Parágrafo único. Havendo divergência, qualquer dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá tendo em consideração aqueles interesses.
Art. 1.568. Os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial.
 
 
O exercício de atividade empresária pelos cônjuges.
 
Consoante o art. 966 do CC, considera-se empresário quem exerce profissionalmente profissão econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. O art. 977 estatui:
Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória.
 
A proibição da contratação de sociedade no regime da comunhão universal de bens deve-se ao fato de que os bens de ambos os consortes já lhes pertencem em comum e, por tal razão, a sociedade seria uma espécie de ficção. No que tange ao regime de separação obrigatória, a vedação ocorre por disposição legal, nos casos em que sobre o casamento possam ser levantadas dúvidas ou questionamentos acerca do cumprimento das formalidades ou pela avançada idade de qualquer dos cônjuges.
DIREITO DE FAMÍLIA – PARTE III
CAPÍTULO XI – Da Dissolução da Sociedade e do Vínculo Conjugal.
 
Causas terminativas.
 
Art. 1.571. A sociedade conjugal termina:
I - pela morte de um dos cônjuges;
II - pela nulidade ou anulação do casamento;
III - pela separação judicial;
IV - pelo divórcio.
§ 1o O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente.
 
Término da sociedade conjugal X dissolução do vínculo matrimonial: sociedade conjugal é o complexo de direitos e obrigações que formam a vida em comum dos cônjuges. O casamento cria a família matrimonial, passando os cônjuges ao status de casados, como partícipes necessários e exclusivos da sociedade que então se constitui. Já o casamento válido, ou seja, o vínculo matrimonial, somente é dissolvido pelo divórcio e pela morte de um dos cônjuges (real ou presumida). A separação judicial mantém intacto o vínculo matrimonial, apesar de representar abertura do caminho à sua dissolução.
 
 
Morte de um dos cônjuges. Morte real e morte presumida.
 
Com a morte real o cônjuge supérstite é autorizado a contrair novas núpcias, respeitando, quanto à mulher, o prazo do art. 1.523, II (10 meses). O CC incluiu como causa de dissolução do vínculo a morte presumida do ausente, que seconfigura nos casos em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva (após 10 anos de passada em julgado a sentença que conceder a abertura da sucessão provisória ou provando-se que o ausente tem 85 anos, e que de 5 datam as últimas notícias dele). Neste caso, o cônjuge do ausente não necessitará requerer o divórcio, pois estará configurada a morte presumida do ausente e dissolvido o vínculo matrimonial.
 
Mas deve-se lembrar que o cônjuge do ausente não precisa aguardar tanto tempo, pois pode, antes, requerer o divórcio direto com base na separação de fato por mais de 2 anos (art. 1.580, §2º). Contudo, para que a mulher herde alguma parte dos bens do de cujus, ela teria que esperar a abertura da sucessão definitiva.
 
Não traz o novo diploma expressa solução para a eventual hipótese de o presumido morto retornar, estando seu ex-cônjuge já casado com terceira pessoa. No entanto, estando legalmente dissolvido o primeiro casamento, prevalecerá o último. Entende-se, assim, que a declaração judicial da ausência de um dos cônjuges produz efeitos de morte real do mesmo no sentido de tornar irreversível a dissolução da sociedade conjugal.
 
Não é porque a lei estabeleceu essa ficção de morte presumida do ausente que, no caso de seu retorno, irá anular-se o segundo casamento de seu ex-cônjuge. Assim como o legislador estabelecer o prazo de 2 anos de separação de fato como condição para o divórcio direto, poderia, como o fez, fixar o prazo de 10 anos de desaparecimento (ou de 5, se o ausente conta 80 anos), para o término do casamento deste (GONÇALVES).
 
 
Nulidade ou anulação do casamento.
 
A nulidade ou anulação do casamento rompem o vínculo matrimonial, extinguindo a sociedade conjugal e permitindo que os cônjuges se casem novamente. Aduz-se que nada impede a cumulação de ação anulatória com a de separação judicial, em ordem sucessiva.
 
 
Separação judicial.
 
Espécies e efeitos da separação judicial:
A separação judicial, antigamente chamada de desquite, pode ser pedida por um só dos cônjuges ou por mútuo consentimento. Ela “põe termo aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca e ao regime de bens, como se o casamento fosse dissolvido” (art. 3º, Lei do Divórcio). Permanecem, porém, os outros três deveres impostos pelo art. 1.566: mútua assistência; sustento, guarda e educação dos filhos; respeito e consideração.
 
Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens.
 
A CF/88 e a Lei n. 7.841/89 possibilitaram a escolha pelos cônjuges da via de separação judicial e sua conversão em divórcio após um ano, ou o divórcio direto após dois anos de separação de fato, iniciada a qualquer tempo. O CC/2002 manteve essas alternativas, remanescendo as modalidades de separação judicial consensual e a separação judicial litigiosa.
 
Apesar de mais demorada, a separação judicial litigiosa e sua conversão, em face do novo sistema legal, oferece vantagem de nela ser possível a discussão da causa da separação, a permitir daí extraírem-se certas conseqüências jurídicas a benefício do cônjuge inocente (que não lhe deu causa). Contudo, mesmo no divórcio direto, por economia processual, os juizes têm admitido a discussão sobre a culpa, mas somente para os efeitos de perda de alimentos ou da conservação do sobrenome do ex-cônjuge, e não para a decretação do divórcio.
 
Caráter pessoal da ação: Art. 1.576. Parágrafo único. O procedimento judicial da separação caberá somente aos cônjuges, e, no caso de incapacidade, serão representados pelo curador, pelo ascendente ou pelo irmão.
 
Somente os cônjuges têm a iniciativa da ação, que é privativa e intransmissível, não comportando intervenção de terceiro. Assim, se um deles morrer, a ação será extinta. Perde o caráter personalíssimo a ação, todavia, no tocante à repercussão patrimonial da separação, permitindo o seu prosseguimento pelo espólio. Os filhos do casal, embora partes na ação de alimentos, não têm legitimidade para recorrer na ação de separação judicial.
 
Exceção: no caso de incapacidade do cônjuge, este pode ser representado pelo curador, pelo ascendente ou pelo irmão. Tal ordem enunciativa é preferencial (se houver curador, somente cabe a ele; se não houver, cabe ao ascendente; e assim por diante). Entretanto, conforme o parágrafo único do art. 1.582, se o cônjuge incapaz figura no pólo passivo da ação de separação ou divórcio, será representado exclusivamente por seu curador. De outra sorte, vem os tribunais admitindo a representação com poderes especialíssimos, quando há total impossibilidade de comparecimento do interessado à audiência designada pelo juiz, ou ainda quando é impraticável sua vinda (se pode casar-se por procuração, por que não o distrato conjugal?).
 
Tentativa de reconciliação: o art. 447 do CPC determina a realização de audiência previa de conciliação. A Lei do Divórcio preceitua que o juiz deverá promover todos os meios para que as partes se reconciliem ou transijam, ouvindo pessoal e separadamente cada uma das partes e, a seguir, reunindo-as em sua presença. O não comparecimento de qualquer das partes deve ser havido como recusa a qualquer acordo.
 
 
SEPARAÇÃO JUDICIAL POR MÚTUO CONSENSO (amigável ou consensual)
 
Características. Requisito:
 
A separação judicial requerida por ambos os cônjuges é também chamada de amigável ou consensual. É procedimento típico de jurisdição voluntária, pois não há litígio, já que ambos os cônjuges buscam a mesma solução: a homologação judicial do acordo por eles celebrado.
 
A separação consensual é essencialmente um acordo entre duas partes (cônjuges) que têm por objetivo dar fim à sua sociedade conjugal. É, portanto, negócio jurídico bilateral que, para que tenha executoriedade ou gere efeitos queridos pelas partes, necessita de um ato de autoridade, qual seja, a sua homologação através de sentença judicial. A vantagem dessa modalidade é que os separandos não precisam apresentar o motivo da separação.
Art. 1.574. Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges se forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por ele devidamente homologada a convenção.
Parágrafo único. O juiz pode recusar a homologação e não decretar a separação judicial se apurar que a convenção não preserva suficientemente os interesses dos filhos ou de um dos cônjuges.
 
Procedimento. Cláusulas obrigatórias:
 
O art. 34 da Lei n. 6.515/77 dispõe que a separação judicial consensual far-se-á pelo procedimento previsto nos arts. 1.120 a1.124 do CPC, mas acrescentando mais algumas regras. O art. 1.574, parágrafo único, até reproduziu uma dessas regras (recusa de homologação do acordo pelo juiz). Deve ela ser fundamentada, com indicação das modificações que comportariam as cláusulas prejudiciais, porque a parte inconformada pode interpor recurso de apelação ao TJ. É permitido, também, ao juiz cindir a convenção, homologando parcialmente a separação, deixando de lado, p.ex., as cláusulas referentes à partilha, por reputá-la prejudicial a um dos separandos.
 
Prescreve o CPC:
Art. 1.121. A petição, instruída com a certidão de casamento e o contrato antenupcial se houver, conterá:
I - a descrição dos bens do casal e a respectiva partilha;
II - o acordo relativo à guarda dos filhos menores e ao regime de visitas;
III - o valor da contribuição para criar e educar os filhos;
IV - a pensão alimentícia do marido à mulher, se esta não possuir bens suficientes para se manter.
§ 1o  Se os cônjuges não acordarem sobre a partilha dos bens, far-se-á esta, depois de homologada a separação consensual, na forma estabelecida neste Livro, Título I, Capítulo IX.
 
O CC/2002, incompreensivelmente, estabeleceu no art. 1.575 que “a sentença de separação judicial importa (acarreta, como conseqüência necessária) separação de corpos e a partilha de bens”, confrontando com o art. 1.581 do mesmo diploma, que permite a concessão do divórcio “sem que haja prévia partilha de bens”. No entanto, a redação

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