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CURSO DE A´LGEBRA VOLUME II (Versa˜o Preliminar) Abramo Hefez 12 de novembro de 2002 2 Suma´rio 1 POLINOˆMIOS 7 1.1 Se´ries de Poteˆncias e Polinoˆmios . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.2 Divisa˜o de Polinoˆmios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 1.3 Polinoˆmios com Coeficientes em Corpos . . . . . . . . . . . . . 25 1.4 Polinoˆmios sobre C e sobre R . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 1.5 Polinoˆmios em Va´rias Indeterminadas . . . . . . . . . . . . . . 32 2 DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 41 2.1 Derivada Primeira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.2 Divisa˜o por X − a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 2.3 Derivadas de ordem superior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 3 POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU 57 3.1 Ra´ızes em K de polinoˆmios em D[X] . . . . . . . . . . . . . . 57 3.2 O Teorema de Gauss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 3.3 Me´todo de Kronecker para fatorac¸a˜o em Z[X] . . . . . . . . . 66 3.4 Crite´rios de divisibilidade em Q[X] . . . . . . . . . . . . . . . 69 3.5 A Resultante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 4 AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 81 4.1 A Equac¸a˜o do Segundo Grau . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 4.2 A Equac¸a˜o do Terceiro Grau . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 4.3 A Equac¸a˜o do Quarto Grau . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 5 O GRUPO SIME´TRICO 95 5.1 Relac¸o˜es Entre Coeficientes e Ra´ızes . . . . . . . . . . . . . . 95 5.2 Grupos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 5.2.1 A noc¸a˜o de grupo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 3 4 SUMA´RIO 5.2.2 Subgrupos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105 5.2.3 Grupos C´ıclicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 5.3 Estrutura de O´rbitas de uma Permutac¸a˜o . . . . . . . . . . . . 114 5.3.1 Decomposic¸a˜o de uma permutac¸a˜o em um produto de ciclos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114 5.4 O Grupo Alternante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121 5.5 Func¸o˜es Sime´tricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124 5.6 Conjugac¸a˜o em Sn . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 6 O ME´TODO DE LAGRANGE 133 7 EXTENSO˜ES DE CORPOS 147 7.1 A A´lgebra Linear da Extensa˜o de Corpos . . . . . . . . . . . . 147 7.2 Construc¸o˜es com Re´gua e Compasso . . . . . . . . . . . . . . 156 SUMA´RIO 5 NOTAC¸O˜ES Anel = Anel comutativo com unidade N = {1, 2, 3, . . .} = Conjunto dos nu´meros naturais Z = {. . . ,−2,−1, 0, 1, 2, . . .} = Anel dos nu´meros inteiros Z+ = {0, 1, 2, 3, . . .} = Subconjunto dos nu´meros inteiros na˜o negativos Q = Corpo dos nu´meros racionais R = Corpo dos nu´meros reais C = Corpo dos nu´meros complexos Y X = Conjunto da func¸o˜es de X em Y A∗ = Conjunto dos elementos invert´ıveis do anel A Kern ϕ = nu`cleo do homomorfismo ϕ 6 SUMA´RIO Cap´ıtulo 1 POLINOˆMIOS Neste Cap´ıtulo iniciaremos o estudo das propriedades alge´bricas ba´sicas dos polinoˆmios com coeficientes num anel comutativo com unidade. Nas disciplinas de Ca´lculo os polinoˆmios sa˜o vistos como func¸o˜es particu- lares de varia´vel real e como tal sa˜o estudados. A necessidade de se distinguir os polinoˆmios das func¸o˜es polinomiais surge pela considerac¸a˜o de polinoˆmios com coeficientes em corpos finitos, de uso cada vez mais frequ¨ente por causa de suas inu´meras aplicac¸o˜es pra´ticas. Muito do estudo das propriedades dos polinoˆmios em uma indeterminada esta´ relacionado com o desenvolvimento da Teoria das Equac¸o˜es Alge´bricas a` qual esta˜o associados os nomes de Tartaglia, Lagrange, Ruffini, Gauss, Abel, culminando com as contribuic¸o˜es fundamentais de Abel e Galois. As propriedades dos polinoˆmios em va´rias indeterminadas foram pesqui- sadas inicialmente por suas conexo˜es com a Geometria Anal´ıtica, evoluindo no que hoje se chama Geometria Alge´brica. Atualmente os polinoˆmios desempenham papel relevante em muitas par- tes da Matema´tica. 1.1 Se´ries de Poteˆncias e Polinoˆmios Seja A um anel, considerado, uma vez por todas, comutativo com unidade, e seja X uma indeterminada sobre A. Uma se´rie de poteˆncias f(X) com coeficientes em A e´ uma soma formal infinita do tipo: f(X) = ∞∑ i=0 aiX i = a0X 0 + a1X 1 + a2X 2 + · · · 7 8 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS com ai ∈ A, para todo i ∈ Z+. Os X i sa˜o provisoriamente vistos apenas como s´ımbolos indicadores de posic¸a˜o. Duas se´ries de poteˆncias f(X) = ∑∞ i=0 aiX i e g(X) = ∑∞ i=0 biX i sa˜o con- sideradas iguais se ai = bi para todo i ∈ Z+. Os elementos ai sa˜o chamados de coeficientes e a parcela aiX i de monoˆmio de grau i. Convenciona-se omitir o monoˆmio aiX i quando ai = 0 e costuma-se denotar a0X 0 por a0 e a1X 1 por a1X. O conjunto de todas as se´ries de poteˆncias com coeficientes em A e´ de- notado por A[[X]] e nele definimos as seguintes operac¸o˜es: Adic¸a˜o: ∞∑ i=0 aiX i + ∞∑ i=0 biX i = ∞∑ i=0 (ai + bi)X i. Multiplicac¸a˜o:( ∞∑ i=0 aiX i ) · ( ∞∑ i=0 biX i ) = ∞∑ i=0 ( i∑ j=0 ajbi−j ) X i. Note que com esta definic¸a˜o de produto, temos que X i · Xj = X i+j, para todo i e j, dando assim um sentido de poteˆncia ao s´ımbolo X i. PROPOSIC¸A˜O 1.1. O conjunto A[[X]] com as operac¸o˜es acima definidas e´ um anel. DEMONSTRAC¸A˜O: A associatividade e a comutatividade da adic¸a˜o sa˜o de verificac¸o˜es imediatas. O elemento neutro da adic¸a˜o e´ 0 = ∑∞ i=0 0X i, enquanto que o sime´trico de f(X) = ∑∞ i=0 aiX i e´ −f(X) = ∑∞i=0(−ai)X i. A comutatividade da multiplicac¸a˜o e´ imediata e a propriedade distributiva e´ fa´cil de ser verificada. A u´nica propriedade que merece verificac¸a˜o e´ a associatividade da multiplicac¸a˜o. Sejam f(X) = ∞∑ i=0 aiX i, g(X) = ∞∑ i=0 biX i e h(X) = ∞∑ i=0 ciX i. 1.1. SE´RIES DE POTEˆNCIAS E POLINOˆMIOS 9 Temos que (f(X) · g(X)) · h(X) = ∞∑ i=0 diX i, onde di = i∑ k=0 ( k∑ j=0 ajbk−j ) ci−k = ∑ λ+µ+η=i aλbµcη. Por outro lado, f(X) · (g(X) · h(X)) = ∞∑ i=0 eiX i, onde ei = i∑ k=0 ak ( i−k∑ j=0 bjci−k−j ) = ∑ λ+µ+η=i aλbµcη. Portanto, di = ei, para todo i, provando assim a associatividade da mul- tiplicac¸a˜o. E´ claro que A ⊂ A[[X]], pois todo elemento a ∈ A pode ser visto como a0 + 0X + 0X 2 + · · · e portanto como elemento de A[[X]]. Ale´m disso, se f(X) = a e g(X) = b, temos que f(X) + g(X) = a+ b e f(X) · g(X) = a · b, onde as operac¸o˜es nos primeiros membros sa˜o efetuadas em A[[X]] e as dos segundos membros o sa˜o em A. Vemos com isto que as operac¸o˜es definidas em A[[X]] estendem as operac¸o˜es definidas em A, fazendo com que A seja um subanel de A[[X]]. Um outro subanel de A[[X]] que se destaca e´ o anel A[X] dos polinoˆmios em uma indeterminada com coeficientes em A. Como conjunto, este anel e´ descrito como A[X] = { a0 + a1X + a2X 2 + · · · ∈ A[[X]] | ∃ n tal que ai = 0 se i > 0 } Todo elemento de A[X] e´ chamado de polinoˆmio e pode ser representado como soma finita, p(X) = ∑n i=0 aiX i , para algum n ∈ Z+. 10 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS PROPOSIC¸A˜O 1.2. A[X] e´ um subanel de A[[X]]. DEMONSTRAC¸A˜O: Basta, de acordo com I-7, Proposic¸a˜o 1, mostrar que 1 ∈ A[X], o que e´ o´bvio; e que se p(X)q(X) ∈ A[X], enta˜o p(X) − q(X) ∈ A[X] e p(X) · q(X) ∈ A[X]. De fato, se p(X) = ∑n i=0 aiX i e q(X) = ∑n i=0 biX i, enta˜o p(X)− q(X) = max{n,m}∑ i=0 (ai − bi)X i ∈ A[X] e p(X) · q(X) = n+m∑ j=0 cjX j ∈ A[X] onde cj = ∑ i+k=j ai · bk. Dado um polinoˆmio p(X) = a0+ a1X + · · ·anXn ∈ A[X]−{0}, define-se grau de p(X) como sendo o inteiro gr(p(X)) = max{i ∈ Z+; ai 6= 0}.Note que o polinoˆmio nulo e´ o u´nico polinoˆmio que na˜o possui grau e que gr(p(X)) > 0 se, e somente se, p(X) ∈ A[X]− A. O coeficiente do teˆrmo de grau igual ao gr(p(X)) e´ chamado de coeficiente l´ıder de p(X). Um polinoˆmio cujo coeficiente l´ıder e´ igual a 1 e´ chamado de polinoˆmio moˆnico. Um polinoˆmio nulo ou de grau zero sera´ chamado de polinoˆmio constante. Vejamos agora como a hipo´tese sobre A de ser domı´nio se reflete sobre A[X]. PROPOSIC¸A˜O 1.3. Seja A um domı´nio. Se p(X), q(X) ∈ A[X] − {0}, enta˜o p(X) · q(X) 6= 0 e gr(p(X) · q(X)) = gr(p(X)) + gr(q(X)). DEMONSTRAC¸A˜O: Considere os polinoˆmios p(X), q(X) ∈ A[X] dados por p(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn e q(X) = b0 + b1X + · · ·+ bmXm onde an 6= 0 e bm 6= 0. Enta˜o, p(X) · q(X) = a0 · b0 + (a0 · b1 + a1 · b0)X + · · ·+ an · bmXn+m. Como A e´ domı´nio, segue que an · bm 6= 0, logo p(X) · q(X) 6= 0 e gr(p(X) · q(X)) = n+m = gr(p(X) + q(X)). 1.1. SE´RIES DE POTEˆNCIAS E POLINOˆMIOS 11 COROLA´RIO 1.1. Se A e´ um domı´nio, enta˜o A[X] e´ domı´nio. Em particular, se K e´ um corpo enta˜o K[X] e´ um domı´nio. COROLA´RIO 1.2. Seja A um domı´nio. Se p(X), q(X) ∈ A[X]− {0} sa˜o tais que t(X) divide p(X), enta˜o gr(t(X)) ≤ gr(p(X)). DEMONSTRAC¸A˜O: Existe por hipo´tese, um polinoˆmio na˜o nulo q(X) em A[X] tal que t(X) · q(X) = p(X) . Logo pela Proposic¸a˜o 3, segue que gr(p(X))− gr(t(X)) = gr(q(X)) ≥ 0 . Da´ı segue a desigualdade desejada. COROLA´RIO 1.3. Seja A um domı´nio. Um elemento p(X) ∈ A[X] e´ invert´ıvel se, e somente se, p(X) ∈ A e e´ invert´ıvel em A. Em s´ımbolos, (A[X])∗ = A∗. DEMONSTRAC¸A˜O: Se p(X) ∈ A[X] e´ invert´ıvel, enta˜o p(X) 6= 0 e existe q(X) ∈ A[X]−{0} tal que p(X) · q(X) = 1. Tomando graus e usando a Proposic¸a˜o 3 temos que gr(p(X)) + gr(q(X)) = 0 . Logo gr(p(X)) = gr(q(X)) = 0 e, portanto p(X), q(X) ∈ A e p(X) e´ invert´ıvel em A. A rec´ıproca e´ imediata. Um fato que merece ser evidenciado e´ a diferenc¸aa existente entre po- linoˆmios e func¸o˜es polinomiais, dois conceitos que frequ¨entemente sa˜o inde- vidamente confundidos. A um polinoˆmio p(X) ∈ A[X] associa-se uma func¸a˜o p ∈ AA chamada func¸ao polinomial, definida por p : A −→ A a 7−→ p(a) = a0 + a1 · a + · · ·+ an · an. O elemento p(a) de A e´ chamado de valor de p(X) em a. E´ evidente que a dois polinoˆmios iguais sa˜o associadas duas func¸o˜es polinomiais iguais. Em contrapartida, dois polinoˆmios distintos podem dar origem a duas func¸oes po- linomiais iguais. Por exemplo, p(X) = X2−X e q(X) = 0, como polinoˆmios de Z2[X] sa˜o distintos, pore´m, as func¸o˜es polinomiais a eles associadas sa˜o iguais. Mais geralmente, se p e´ um nu´mero primo positivo, decorre do Pe- queno Teorema de Fermat (I-6, Problema 1.10) que os polinoˆmios Xp − X 12 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS e 0¯ de Zp[X] determinam a mesma func¸a˜o polinomial. Veremos na pro´xima sec¸a˜o 2, Corola´rio 4 do Teorema 1, que se A e´ infinito tal fato na˜o ocorre. Uma te´cnica muito u´til ao lidarmos com polinoˆmios e´ o chamado me´todo dos coeficientes a determinar que utiliza basicamente as definic¸o˜es da igual- dade e das operac¸o˜es no anel de polinoˆmios. Ilustraremos o me´todo com alguns exemplos. EXEMPLO 1 : Mostraremos neste exemplo que X4 + 4 pode ser escrito como produto do dois polinoˆmios de segundo grau com coeficientes inteiros. De fato, escreva, X4+4 = (aX2 + bX + c) · (a′X2+ b′X + c′). Efetuando o produto, tem-se que X4+4 = a·a′X4+(a·b′+a′ ·b)X3+(a·c′+b·b′+c·a′)X2+(b·c′+c·b′)X+c·c′. Pela igualdade de polinoˆmios acima, obte´m-se o sistema de equac¸o˜es: a · a′ = 1 a · b′ + a′ · b = 0 a · c′ + b · b′ + c · a′ = 0 b · c′ + c ·+c · b′ = 0 c · c′ = 4 Procuremos as soluc¸o˜es inteiras deste sistema de equac¸o˜es. Da primeira equac¸a˜o, obte´m-se que a = a′ = ±1. Da segunda, segue que b + b′ e da quarta, b · (c′ − c) = 0, logo b = 0 ou c = c′. Caso 1: b = 0. Da terceira equac¸a˜o tem-se que c+ c′ = 0, donde c′ = −c. Substituindo na quinta equac¸a˜o tem-se c2 = −4, o que e´ imposs´ıvel. Caso 2: c = c′. Da quinta equac¸a˜o tem-se que c = c′ = ±2. Da segunda, segue que b+ b′ = 0, logo da terceira obte´m-se b · b′ = −2a · c = −4 . Donde b = −b′ = ±2. Testando os valores obtidos temos que X4+4 = (X2−2X+2) · (X2+2X+2) = (−X2+2X−2) · (−X2−2X−2). EXEMPLO 2 : Determinaremos a e b em Z7 de modo que X 4 + 4¯X3 + aX2 − 4¯X + b ∈ Z7[X] seja o quadrado de um polinoˆmio de Z7[X] . Da igualdade, X4 + 4¯X3 + aX2 − 4¯X + b = (X2 + cX + d)2 = X4 + 2¯cX3 + (2¯d+ c2)X2 + 2¯cdX + d2 1.1. SE´RIES DE POTEˆNCIAS E POLINOˆMIOS 13 obtemos o sistema: 2¯ · c = 4¯ 2¯ · d+ c2 = a 2¯ · c · d = −4¯ d2 = b que resolvido, nos fornece c = 2¯, d = −1¯, b = 1¯ e a = 2¯. Portanto, X4 + bar4X3 + 2¯X2 − 4¯X + 1¯ = (X2 + 2¯X − 1¯)2 PROBLEMAS 1.1. 1. Um elemento a 6= 0 de um anel comutativo com unidade A e´ chamado regular ou na˜o divisor de zero em A se a · b 6= 0, para todo b ∈ A−{0}. Em particular, todo elemento invert´ıvel de A e´ regular. (a) Se p(X), q(X) ∈ A[X], com coeficiente l´ıder de p(X) ou de q(X) regular, enta˜o gr(p(X) · q(X)) = gr(p(X)) + gr(q(X)). (b) Se p(X), t(X) ∈ A[X], com coeficiente l´ıder de t(X) regular e se t(X) | p(X), enta˜o gr(t(X)) ≤ gr(p(X)). (c) Calcule gr(p(X) · q(X)) onde p(X) = 3¯X3 + 2¯X + 1¯ e q(X) = 2¯X2 + 3¯X + 1 em Z6[X]. (d) Mostre que (2¯X2 + 2¯X + 1¯) | 3¯ em Z6[X] . 2. Determine a ∈ Z tal que (a) O polinoˆmio X4−aX3+8X2+a seja o quadrado de um polinoˆmio de Z[X]. (b) O polinoˆmio X4 + X3 + aX2 + X + 1 seja o produto de dois polinoˆmios do segundo grau em Z[X]. 3. Determine a, b ∈ Z7 tais que (a) O polinoˆmio X4 + 3¯X3 + 5¯X2 + aX + b seja o quadrado de um polinoˆmio de Z7[X]. (b) O polinoˆmio X3+aX+5¯ seja divis´ıvel por X2+5¯X+6¯ em Z7[X]. 14 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS 4. Mostre que a func¸a˜o avaliac¸a˜o em a ∈ A: Ava : A[X] −→ A p(X) 7−→ p(a) e´ um homomorfismo de ane´is. 5. Seja p um nu´mero primo positivo e f(X) ∈ Zp[X]. Mostre que f(X) e f(Xp) determinam a mesma func¸a˜o polinomial. Sugesta˜o: Use o Pequeno Teorema de Fermat. 6. Sejam p(X) ∈ C[X ] e ξ uma raiz n-e´sima primitiva da unidade em C . (a) Se gr(p(X)) < n, mostre que p(X) + p(ξX) + p(ξ2X) + · · ·+ p(ξn−1X) = n · p(0). (b) Deduza uma fo´rmula para esta soma se gr(p(X)) ≥ n . 7. Mostre que f(X) = ∑ ∞ i=0 aiX i ∈ A[[X ]] e´ invert´ıvel em A[[X ]] se, e somente se, a0 e´ invert´ıvel em A[X ]. Sugesta˜o: Seja g(X) = ∑ ∞ i=0 biX i. Tem-se que f(X) · g(X) = 1 se, e somente se, a0 · b0 = 1 e ∑i j=0 ajbi−j = 0, para todo i ≥ 1. Mostre que se b0 = a−10 , enta˜o a equac¸a˜o acima determina bi em func¸a˜o dos a ′ js e de b0, b1, . . . , bi−1, determinando assim g(X) = (f(X))−1. 8. Seja K um corpo. Mostre que 1−X e´ invert´ıvel em K[[X ]] e que (1 −X)−1 = ∞∑ i=0 X i. Se a ∈ K − {0}, determine (a−X)−1. 9. Seja f(X) = ∑ ∞ i=0 aiX i ∈ A[[X ]]− {0}. Defina a ordem de f(X) com sendo ord(f(X)) = min{i | ai 6= 0}. Mostre que se A e´ um domı´nio e se f(X), g(X) ∈ A[[X ]]− {0}, enta˜o ord(f(X) · g(X)) = ord(f(X)) + ord(g(X)). Isto prova que se A e´ um domı´nio, enta˜o A[[X ]] tambe´m e´ um domı´nio. 10. Seja K um corpo. (a) Dado f ∈ K[[X ]]− K, mostre que existem m ∈ N e u invert´ıvel em K[[X ]] tais que f = Xm · u. 1.2. DIVISA˜O DE POLINOˆMIOS 15 (b) Mostre queK[[X ]] e´ um domı´nio principal. Conclua queK[[X ]] e´ um domı´nio de fatorac¸a˜o u´nica (DFU). Sugesta˜o: Veja I-Teorema 2, Cap´ıtulo 4. (c) Descreva o corpo de frac¸o˜es de K[[X ]]. 11. Sejam fi(X) ∈ A[[X ]], i ∈ Z+, tais que ord(fi(X)) ≥ i. Mostre que ∑ ∞ i=0 fiX i e´ bem definido como elemento de A[[X ]]. Mostre que se f(X), g(X) ∈ A[[X ]] com f(X) = ∑ ∞ i=0 aiX i, enta˜o ∞∑ i=0 aiX i · g(X) = f(X) · g(X). 12. Suponha que B seja um subanel de A. Mostre que B[[X ]] e B[X ] sa˜o respectiva-mente subaneis de A[[X ]] e de A[X ]. 1.2 Divisa˜o de Polinoˆmios Mostraremos nesta sec¸a˜o que sob certas condic¸o˜es, a` semelhanc¸a dos in- teiros, e´ poss´ıvel efetuar a divisa˜o com resto ”pequeno”de um polinoˆmio por outro. TEOREMA 1.1. (ALGORI´TMO DA DIVISA˜O) Seja A um anel e sejam p(X) e t(X) polinoˆmios em A[X]. Se t(X) 6= 0 possui coeficiente l´ıder invert´ıvel, enta˜o existem q(X) e r(X) em A[X] tais que p(X) = t(X) · q(X) + r(X), com r(X) = 0 ou gr(r(X)) < gr(t(X)). Ale´m disso, q(X) e r(X) sa˜o univocamente determinados por estas condic¸o˜es. DEMONSTRAC¸A˜O : Sejam p(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn e t(X) = b0 + b1X + · · ·+ bmXm, com an 6= 0 e bm invert´ıvel. Existeˆncia: Se p(X) = 0 ou n < m, fac¸a q(X) = 0 e r(X) = p(X). Suponha agora p(X) 6= 0 e n ≥ m. Tomando q1(X) = b−1m anXn−m ∈ A[X] tem-se que p(X)− q1(X) · t(X) = r1(X), (1.1) 16 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS com r1(X) = 0 ou gr(r1(X)) < gr(p(X)). Se r1(X) = 0 ou se gr(r1(X)) < gr(t(X)), o problema fica resolvido tomando r(X) = r1(X) e q(X) = b −1 m anX n−m . Se gr(r1(X)) ≥ gr(t(X)), repete-se o procedimento acima com r1(X) no lugar de p(X), obtendo r1(X)− q2(X) · t(X) = r2(X), (1.2) com r2(X) = 0 ou gr(r2(X)) < gr(r1(X)). Se r2(X) = 0 ou se gr(r2(X)) < gr(t(X)), o problema fica resolvido pois p(X) = (q1(X) + q2(X)) · t(X) + r2(X). Se gr(r2(X)) ≥ gr(t(X)), repete-se o procedimento acima com r2(X) no lugar de r1(X), obtendo r2(X)− q3(X) · t(X) = r3(X), (1.3) com r3(X) = 0 ou gr(r3(X)) < gr(r2(X)). E assim sucessivamente, obtendo r1(X), r2(X), r3(X), . . . tais que gr(r1(X)) > gr(r2(X)) > gr(r3(X)) > · · · Segue enta˜o que para certo s ∈ N, tem-se rs(X) = 0 ou gr(rs(X)) < gr(t(X)). Levando em conta (1), (2), (3), . . . temos que p(X) = (q1(X) + q2(X) + · · ·+ qs(X)) · t(X) + rs(X) bastando enta˜o tomar q(X) = q1(X))+q2(X)+ · · ·+qs(X)) e r(X) = rs(X). Unicidade: Suponha que t(X) · q(X) + r(X) = t(X) · q1(X) + r1(X) com r(X) = 0 ou gr(r(X)) < gr(t(X)) e r1(X) = 0 ou gr(r1(X)) < gr(t(X)). Da igualdade acima, obtemos que t(X)[q(X)− q1(X)] = r1(X)− r(X) (1.4) Pelas condic¸o˜es impostas a r(X) e r1(X) temos que r1(X)− r(X) = 0 ou gr(r1(X)) < gr(t(X)). 1.2. DIVISA˜O DE POLINOˆMIOS 17 Se r1(X)− r(X) 6= 0, segue de (1.4) e do Problema 1.1 (b) que gr(r1(X)− r(X)) ≥ gr(t(X)), o que e´ uma contradic¸a˜o. Portanto r1(X) = r(X) e consequ¨entemente de (1.4) temos que q1(X) = q(X). OBSERVAC¸A˜O 1: Seguindo os passos da demonstrac¸a˜o do Teorema, obtemos o algoritmo da divisa˜o longa de dois polinoˆmios: anX n + an−1Xn−1 + · · · · · · · · ·+ a0 bmXm + · · ·+ b0 −anXn − b−1m bm−1anXn−1 − · · · − b−1m b0anXn−m b−1m anXn−m + · · · r1(X) ... OBSERVAC¸A˜O 2: Se A e´ um corpo enta˜o e´ sempre poss´ıvel efetuar a divisa˜o por qualquer polinoˆmio t(X) 6= 0. OBSERVAC¸A˜O 3: Suponha que p(X), t(X) ∈ B[X] onde B e´ um su- banel de A e o coeficiente l´ıder de t(X) e´ invert´ıvel em B. Enta˜o q(X) e r(X) calculados pelo algoritmo da divisa˜o em A[X] tera˜o necessa`riamente coeficientes em B. OBSERVAC¸A˜O 4: Os polinoˆmios p(X), t(X), q(X) e r(X) no algoritmo da divisa˜o sa˜o chamados respectivamente de dividendo, divisor, quociente e resto. EXEMPLO 1 : E´ poss´ıvel efetuar a divisa˜o de 3X5+2X3+X2− 5X +7 por 2X3 + 3X + 1 em Q[X] mas na˜o e´ poss´ıvel fazeˆ-lo em Z[X] . 18 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS 3X5 + 2X3 + X2 − 5X + 7 2X3 + 3X + 1 −3X5 − 9 2 X3 − 3 2 X2 3 2 X2 − 5 4 −5 2 X3 − 1 2 X2 − 5X + 7 5 2 X3 + 15 4 X + 5 4 −1 2 X2 − 5 4 X + 33 4 Neste caso q(X) = 3 2 X2 − 5 4 e r(X) = −1 2 X2 − 5 4 X + 33 4 . EXEMPLO 2 : O fato de bm na˜o ser invert´ıvel na˜o quer dizer que na˜o se possa efetuar a divisa˜o. Por exemplo, sejam dados p(X) = 2X3 − 3X2 + 1 e t(X) = 2X + 1, temos em Z[X]: 2X3 − 3X2 + 1 2X + 1 −2X3 −X2 X2 − 2X + 1 −4X2 + 1 4X2 + 2X 2X + 1 −2X − 1 0 Neste caso q(X) = X2 − 2X + 1 e r(X) = 0. Damos a seguir alguns corola´rios do Teorema, cuja importaˆncia ficara´ mais clara na pro´xima secc¸a˜o. COROLA´RIO 1.4. Sejam a, b ∈ A com a invert´ıvel e p(X) ∈ A[X]. O resto da divisa˜o de p(X) por aX + b e´ p (− b a ) . 1.2. DIVISA˜O DE POLINOˆMIOS 19 DEMONSTRAC¸A˜O : Pelo Teorema 1, existem q(X), r(X) ∈ A[X] tais que p(X) = (aX + b) · q(X) + r(X) com r(X) = 0 ou gr(r(X)) < 1. Em qualquer caso r(X) e´ um polinoˆmio constante, logo p ( − b a ) = 0 · q ( − b a ) + r ( − b a ) = r(X). COROLA´RIO 1.5. Sejam a, b ∈ A com a invert´ıvel e p(X) ∈ A[X]. O polinoˆmio p(X) e´ divis´ıvel por aX + b se, e somente se p (− b a ) = 0. DEFINIC¸A˜O 1.1. Se p(X) ∈ A[X] e α ∈ A sa˜o tais que p(α) = 0, dizemos que α e´ raiz do polinoˆmio p(X). Segue do Corola´rio 2 que α e´ raiz de p(X) se e somente se (X−α) divide p(X). COROLA´RIO 1.6. Seja A um domı´nio. Se p(X) ∈ A[X]− {0} tem grau n, enta˜o p(X) tem no ma´ximo n ra´ızes distintas. DEMONSTRAC¸A˜O : Vamos provar isto por induc¸a˜o em n. Se n = 0, enta˜o p(X) e´ uma constante na˜o nula e portanto tem zero ra´ızes, estabe- lecendo o resultado neste caso. Suponha agora o resultado va´lido para n e seja p(X) um polinoˆmio de grau n + 1. Se p(X) na˜o tem ra´ızes, nada temos a provar. Se p(X) tem uma raiz α, enta˜o p(X) = (X − α) · q(X), com q(X) ∈ A[X] e gr(q(X)) = n. Pela hipo´tese de induc¸a˜o, q(X) tem no ma´ximo n ra´ızes distintas e sendo A um domı´nio, as ra´ızes de p(X) sa˜o as ra´ızes de q(X) e as ra´ızes de (X−α), logo p(X) tem no ma´ximo n+1 ra´ızes. COROLA´RIO 1.7. Seja A um domı´nio infinito. Se p(X), q(X) ∈ A[X] sa˜o tais que p(a) = q(a) para todo a ∈ A (i.e. as func¸o˜es polinomiais sa˜o iguais), enta˜o p(X) = q(X) (i.e. os polinoˆmios sa˜o iguais). DEMONSTRAC¸A˜O : Suponha por absurdo que p(X)−q(X) 6= 0. Enta˜o, pelo Corola´rio 3, p(X)−q(X) tem um nu´mero finito de ra´ızes. Isto contradiz a hipo´tese p(a) = q(a) para todo a ∈ A pois A e´ infinito. Considere a aplicac¸a˜o ϕ : A[X] −→ AA p(X) 7−→ func¸a˜o polinomial associada a p(X) 20 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS Usando o exerc´ıcio 1.4 e´ fa´cil verificar que ϕ e´ um homomorfismo de ane´is. O Corola´rio 4 mostra que se A e´ um domı´nio infinito, enta˜o N(ϕ) = {0}. DEFINIC¸A˜O 1.2. Dizemos que um corpo K e´ algebricamente fechado se todo polinoˆmio na˜o constante de K[X] tem pelo menos uma raiz em K. COROLA´RIO 1.8. Seja K um corpo algebricamente fechado e seja ainda p(X) ∈ K[X] um polinoˆmio na˜o constante. Se gr(p(X)) = n, enta˜o existem elementos α1, α2, . . . , αn ∈ K e a ∈ K tais que p(X) = a · (X − α1) · (X − α2) · · · (X − αn) DEMONSTRAC¸A˜O : A prova pode ser feita por induc¸a˜o sobre n e a dei- xamos a cargo do leitor. PROPOSIC¸A˜O 1.4. Se K e´ um corpo algebricamente fechado, enta˜o K e´ infinito. DEMONSTRAC¸A˜O : Suponha por absurdo que K seja finito, digamos que K = {a0, a1, . . . , an−1} onde a0 = 0 e a1 = 1. Considere o polinoˆmio p(X) = (X − a0) · (X − a1) · · · · · · · (X − an−1) + a1. Verifica-se diretamente que p(X) na˜o tem ra´ızes em K o que e´ uma con- tradic¸a˜o, pois p(X) e´ na˜o constante e K e´ algebricamente fechado. Nem todo corpo e´ algebricamente fechado, por exemplo, se p e´ um nu´mero primo positivo, o corpo Zp na˜o e´ algebricamente fechado por ser finito. O corpo R , apesar de infinito, na˜o e´ algebricamente fechado pois o polinoˆmio na˜o constante X2 + 1 ∈ R[X] na˜o possui ra´ızes em R. O famoso Teorema Fundamental da A´lgebra garante que C e´ algebrica- mente fechado. Este Teorema possui uma longa histo´ria e muitas demons- trac¸o˜es, nenhuma delas pore´m se faz com me´todos puramente alge´bricos, devendo-se sempre usar me´todos da ana´lise. Vamos ao longo do texto admi- tir este resultado cuja demonstrac¸a˜o encontra-se no Apeˆndice 1. 1.2. DIVISA˜O DE POLINOˆMIOS 21 EXEMPLO 3 : O polinoˆmio p(X) = 2X4 − 7X3 − 2X2+ 13X + 6 e´ di- vis´ıvel pelo polinoˆmio X2 − 5X + 6 em Z[X]. De fato, tem-se que X2−5X+6 = (X−2)·(X−3). Como p(2) = 0, temos que p(X) = (X − 2) · q(X) com q(X) ∈ Z[X]. Por outro lado, p(3) = 0, logo q(3) = 0 e portanto q(X) = (X − 3) · q1(X) com q1(X) ∈ Z[X]. Conclui-se que p(X) = (X − 2) · (X − 3) · q1(X). Pede-se ao leitor generalizar a argumentac¸a˜o acima mostrando que se A e´ um domı´nio, p(X) ∈ A[X] e α1, α2, . . . , αn sa˜o elementos distintos de A tais que p(αi) = 0, i = 1, 2, . . . , n, enta˜o (X − α1) · (X − α2) · · · · · (X − αn) divide p(X). EXEMPLO 4 : O polinoˆmio p(X) = X3k+2+X3m+1+X3n com n,m, k ∈ N e´ divis´ıvel por X2 +X + 1 em Z[X]. De fato, podemos escrever X2 + X + 1 = (X − w) · (X − w2) em C[X] onde w e´ uma raiz cu´bica primitiva de 1. Temos tambe´m que p(w) = w3k+2 + w3m+1 + w3n = w2 + w + 1 = 0 e p(w2) = w6k+4 + w6m+2 + w6n = w + w2 + 1 = 0 Portanto pela argumentac¸a˜o acima, temos que (X2+X+1) | p(X) em C[X], logo p(X) = (X2+X+1) ·q1(X) para algum q1(X) ∈ C[X]. Pela Observac¸a˜o 3 temos que q1(X) ∈ Z[X], provando assim a nossa afirmac¸a˜o. EXEMPLO 5 : Seja ξ = cos 2pi n + i sen 2pi n . Vamos provar a identidade 1 +X +X2 + · · ·+Xn−1 = (X − ξ) · (X − ξ2) · · · · · (X − ξn−1). De fato, sendo p(X) = 1+X+X2+· · ·+Xn−1 e ξ uma raiz n-e´sima primitiva da unidade, temos que ξ, ξ2, . . . , ξn−1 sa˜o distintos e p(ξ) = p(ξ2) = · · · = p(ξn−1) = 0. Logo p(X) e´ divis´ıvel por (X − ξ) · (X − ξ2) · · · · · (X − ξn−1). Por serem do mesmo grau p(X) e este u´ltimo polinoˆmio, segue que existe a ∈ C− {0} tal que p(X) = a · (X − ξ) · (X − ξ2) · · · · · (X − ξn−1). 22 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS Comparando os coeficientes dos termos de mais alto grau dos polinoˆmios acima, conclui-se que a = 1, provando assim a identidade. PROPOSIC¸A˜O 1.5. (POLINOˆMIO DE INTERPOLAC¸A˜O DE LAGRANGE). Seja K um corpo. Sejam ai, bi ∈ K, i = 1, 2, . . . , n, com os ai dois a dois distintos e os bi na˜o todos nulos. Considere os polinoˆmios pi(X) = bi (X − a1) · · · (X − ai−1) · (X − ai+1) · · · (X − an) (ai − a1) · · · (ai − ai−1) · (ai − ai+1) · · · (ai − an) , para i = 1, 2, . . . , n. Enta˜o o polinoˆmio p(X) = n∑ i=1 pi(X) e´ o u´nico polinoˆmio de grau menor do que n tal que p(ai) = bi, para todos i = 1, 2, . . . , n. DEMONSTRAC¸A˜O : O polinoˆmio p(X) e´ de grau menor do que n e e´ tal que p(ai) = bi, ∀ i = 1, 2, . . . , n, pois pi(aj) = { 0 se i 6= j bj se i = j Agora so´ falta provar a unicidade de p(X). Suponha que q(X) seja um polinoˆmio que satisfaz as mesmas condic¸o˜es que p(X) satisfaz. Segue enta˜o que p(X) − q(X) e´ um polinoˆmio de grau menor do que n com n ra´ızes a1, a2, . . . , an, logo, pelo Corola´rio 3 do Teorema 1, tem-se que p(X) = q(X). O polinoˆmio p(X) acima e´ chamado Polinoˆmio de Interpolac¸a˜o de La- grange e desempenha papel importante na apresentac¸a˜o de Galois da sua Teoria das Equac¸o˜es. PROBLEMAS 1.2. 1. Ache q(X) e r(X) nas seguintes situac¸o˜es: (a) p(X) = 3X2 + 5X + 7, t(X) = X3 + 7X2 + 9 em Z[X]. (b) p(X) = X4 +X3 +X2 +X + 1, t(X) = X4 −X3 +X2 −X + 1 em Z[X]. 1.2. DIVISA˜O DE POLINOˆMIOS 23 (c) p(X) = X7+3X6−X5+4X2+1, t(X) = X4−X +1 em Z[X]. (d) p(X) = X10 +X5 + 1, t(X) = X2 +X + 1 em Z[X]. (e) p(X) = X5+3X4+X3+X +1, t(X) = 2X2+3X +1 em Z[X]. (f) p(X) = X3 + 3¯X2 +X + 3¯, t(X) = X2 + 4¯X + 3¯ em Z5[X]. 2. Ache os poss´ıveis valores de a para que o polinoˆmio a2 ·X4 + 4X3 + 4 · a ·X + 7 seja divis´ıvel por X + 1 em Z[X]. 3. Sejam A um domı´nio e a ∈ A− {0}. (a) Mostre que o polinoˆmio Xn − an e´ divis´ıvel por X − a em A[X]. (b) Sob que condic¸o˜es Xn + an e´ divis´ıvel por X + a em A[X] ? (c) Sob que condic¸o˜es Xn − an e´ divis´ıvel por X + a em A[X] ? 4. Sem efetuar a divisa˜o, mostre que (a) 2X6 + 2X5 +X4 + 2X3 +X2 + 2 e´ divis´ıvel por X2 + 1 em Z[X]. (b) X6 + 4X5 + 3X4 + 2X3 +X2 + 1 e´ divis´ıvel por X2 +X + 1 em Z[X]. (c) X444+X333+X222+X111+1 e´ divis´ıvel por X4+X3+X2+X+1 em Z[X]. (d) Para n ∈ N, (X + 1)2n −X2n − 2X − 1 e´ divis´ıvel por X · (X + 1) · (2X + 1) em Q[X]. 5. Para quais valores de n ∈ N tem-se que (a) 1 +X2 +X4 + · · ·+X2n−2 e´ divis´ıvel por 1 +X + · · ·+Xn−1? (b) 1 +X3 +X6 + · · ·+X3n−3 e´ divis´ıvel por 1 +X + · · ·+Xn−1? (c) Generalize. 6. Sejam K um corpo e sejam p(X) ∈ K[X] e a, b ∈ K com a 6= b. Mostre que o resto da divisa˜o de p(X) por (X − a) · (X − b) e´ p(a)− p(b) a− b X + ap(b)− bp(a) a− b . 24 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS 7. Determine o polinoˆmio p(X) ∈ Q[X] de grau 7 tal que p(1) = p(2) = · · · = p(7) = 8 e p(0) = 1 8. (a) Resolva a equac¸a˜o 20X3 − 30X2 + 12X − 1 = 0 sabendo-se que 1 2 e´ uma de suas ra´ızes. (b) Uma raiz da equac¸a˜o X3− (2a+1)X2+ a(a+2)X − a(a+1) = 0 e´ a+ 1, ache as outras duas. 9. Ache o polinoˆmio de menor grau que tem ra´ızes 0, 1+ i, 1− i e assume os valores 2 e −2 em −1 e 1 respectivamente. 10. Sejam os polinoˆmios p1(X), . . . , ps(X) ∈ K[X] onde K e´ um corpo. Sejam ainda r1(X), . . . , rs(X) ∈ K[X] os respectivos restos das diviso˜es destes polinoˆmios por t(X) 6= 0. Fixados os elementos α1, . . . , αs ∈ K, mostre que o resto da divisa˜o de p(X) = ∑s i=1 αipi(X) por t(X) e´ o polinoˆmio r(X) = ∑s i=1 αiri(X) . 11. (a) Mostre que o resto da divisa˜o do polinoˆmio p(X) = ∑n i=0 aiX i por Xn − a e´ r(X) = ∑ni=0 airi(X), onde ri(X) e´ o resto da divisa˜o de X i por Xm − a. Sugesta˜o: use o exerc´ıcio 2.10. (b) Se i = λim+ µi com 0 ≤ µ < m, mostre que ri(X) = aλiXµi . (c) Conclua que r(X) = ∑n i=0 a λiXµi, justificando a seguinte regra pra´tica para calcular r(X): ”Substitua em p(X) todos os Xm que puder por a”. (d) Sob quais condic¸o˜es Xn − an e´ divis´ıvel por Xm − am ? (e) Ache os restos da divisa˜o de X60 − 1 e de X100 − 1 por X3 − 1. (f) Mostre que se a 6= 0, enta˜o (Xn − an, Xm − am) = Xd− ad, onde d = (m,n) . 12. Considere a igualdade do Exemplo 5, 1 +X +X2 + · · ·+Xn−1 = (X − ξ) · (X − ξ2) · · · · · (X − ξn−1), onde ξ = cos 2pi n + i sen 2pi n . 1.3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES EM CORPOS 25 (a) Na igualdade acima, fazendo X = 1 e tomando os mo´dulos em ambos os lados, mostre a seguinte identidade trigonome´trica: sen pi n · sen 2pi n · · · · · sen (n− 1)pi n = n 2n−1 Sugesta˜o: Use a identidade sen θ = 1−cos 2θ 2 . (b) Se p > 2 e´ um nu´mero primo, mostre que (X − 1) · (X2 − 1) · · · · · (Xp−1 − 1)− p e´ divis´ıvel por 1 +X + · · ·+Xp−1. 1.3 Polinoˆmios com Coeficientes em Corpos No que segue estudaremos propriedades espec´ıficas do anel de polinoˆmios com coeficientes num corpo K. Neste caso, o Teorema 1 nos garante que a divisa˜o com resto pode ser efetuada, tendo como dividendo um polinoˆmio qualquer e como divisor um polinoˆmio na˜o nulo arbitra´rio. Note tambe´m que, neste caso, de acordo com o Corola´rio 3 da Proposic¸a˜o 2, u(X) ∈ K[X] e´ invert´ıvel se, e somente se, u(X) ∈ K − {0}, ou seja gr(u(X)) = 0. Por- tanto, dois polinoˆmios p(X) e q(X) sa˜o associados se, e somente se, existe c ∈ K − {0} = K∗ tal que q(X) = cp(X). Segue disto que todo polinoˆmio na˜o nulo de K[X] e´ associado a um u´nico polinoˆmio moˆnico. TEOREMA 1.2. Todo ideal I de K[X] e´ principal. Se I 6= 0 enta˜o I e´ gerado por qualquer um dos seus elementos de menor grau. DEMONSTRAC¸A˜O : Se I = {0}, nada temos a provar. Suponha que I 6= {0} e seja p(X) 6= 0 um polinoˆmio em I de grau mı´nimo. Como p(X) ∈ I segue que I(p(X)) ⊂ I. Por outro lado, se g(X) ∈ I, pelo al- goritmo da divisa˜o, existem polinoˆmios q(X) e r(X) em K[X] com r(X) = 0 ou gr(r(X)) < gr(p(X)) tais que g(X) = p(X) · q(X) + r(X). Segue da´ı que r(X) ∈ I e como p(X) tem grau mı´nimo em I, conclui-se que r(X) = 0 e portanto g(X) ∈ I(p(X)). Isto acaba de mostrar que I = I(p(X)). 26 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS O fato que K[X] e´ um anel principal tem va´rios corola´rios que passamos a enunciar.COROLA´RIO 1.9. Sejam dados os polinoˆmios p1(X), . . . , ps(X) ∈ K[X]. Enta˜o existe um MDC destes elementos. Ale´m disso, todo MDC deles e´ da forma p1(X) · q1(X)+ · · ·+ ps(X) · qs(X) para elementos q1(X), . . . , qs(X) ∈ K[X]. DEMONSTRAC¸A˜O : Isto decorre do Teorema 2 e de I-4, Corola´rio 1 da Proposic¸a˜o 6. Como todo associado de umMDC de dados elementos e´ umMDC destes elementos (cf. I-4, Corola´rio da Proposic¸a˜o 4), segue que dados elementos p1(X), . . . , ps(X) ∈ K[X] na˜o todos nulos, estes elementos possuem um u´nico MDC moˆnico que sera´ chamado de oMDC destes elementos e denotado por (p1(X), . . . , ps(X)). Do fato de K[X] ser principal segue tambe´m que existe MMC de ele- mentos quaisquer de K[X] (Veja I-4, Problema 2.8) COROLA´RIO 1.10. Os polinoˆmios p1(X) e p2(X) em K[X] sa˜o primos entre si, se e somente se, existem q1(X), q2(X) ∈ K[X], tais que p1(X) · q1(X) + p2(X) · q2(X) = 1. DEMONSTRAC¸A˜O : Como p1(X) E p2(X) sa˜o primos entre si, se, e so- mente se, (p1(X), p2(X)) = 1, a relac¸a˜o entre p1(X), p2(X) e 1 segue do Corola´rio 1. COROLA´RIO 1.11. Em K[X] um elemento e´ primo se e somente se ele e´ irredut´ıvel. DEMONSTRAC¸A˜O : Isto decorre do Teorema 2 e de I-4, Proposic¸o˜es 8 e 9. COROLA´RIO 1.12. K[X] e´ um domı´nio de fatorac¸a˜o u´nica. DEMONSTRAC¸A˜O : Isto decorre do Teorema 2 e de I-4, Teorema 2. 1.3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES EM CORPOS 27 COROLA´RIO 1.13. Todo elemento p(X) ∈ K[X]−K pode ser escrito de modo u´nico, a menos da ordem dos fatores, sob a forma p(X) = c · (p1(X))α1 · · · (pr(X))αr onde c ∈ K − {0} e p1(X), . . . , pr(X) sa˜o polinoˆmios moˆnicos irredut´ıveis distintos em K[X] e αi ∈ N, para i = 1, 2, . . . , r. Observe que o Corola´rio 5 na˜o e´ construtivo, pois garante a existeˆncia da fatorac¸a˜o de um polinoˆmio em polinoˆmios irredut´ıveis sem entretanto indi- car como obteˆ-la. O problema de determinar algor´ıtmos ra´pidos para fatorar polinoˆmios e´ importante e atual. Tal como no caso dos inteiros, pelo fato de existir em K[X] um algo- ritmo para efetuar diviso˜es com resto pequeno, pode-se calcular efetivamente o MDC de dois polinoˆmios usando o algoritmo de Euclides. EXEMPLO 1 : Determinaremos o MDC em Q[X] dos polinoˆmios 2X5 + 2X4 +X3 − 2X2 −X − 4 e X3 − 2X2 +X − 2. Efetuando o algoritmo de Euclides, temos 2X5 + 2X4 +X3 − 2X2 −X − 4 = = (X3 − 2X2 +X − 2) · (2X2 + 6X + 11) + 18X2 + 18 X3 − 2X2 +X − 2 = (18X2 + 18) · ( 1 18 X − 1 9 ) + 0. Logo um MDC destes polinoˆmios e´ 18X2 + 18 e portanto MDC ( 2X5 + 2X4 +X3 − 2X2 −X − 4, X3 − 2X2 +X − 2) = X2 + 1 Sejam K e F corpos tais que K e´ um subcorpo de F . Sejam p1(X), p2(X) em K[X]. Em princ´ıpio, o MDC destes elementos em F [X] tem coeficientes em F . Seguindo pore´m, atrave´s do algoritmo de Euclides, o ca´lculo doMDC destes elementos, e´ fa´cil convencer-se que tal MDC esta´ em K[X]. Segue desta observac¸a˜o que dois polinoˆmios de K[X] teˆm um fator comum na˜o constante em F [X] se, e somente se, eles teˆm um fator comum na˜o constante em K[X]. 28 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS EXEMPLO 2 : Considere o homomorfismo de ane´is ϕ : A[X] −→ AA p(X) 7−→ func¸a˜o polinomial associada a p(X) definida no para´grafo 2. Suponha que A = Zp onde p e´ um nu´mero primo positivo. Note que Xp − X ∈ N(ϕ). Note tambe´m que Xp − X tem grau mı´nimo em N(ϕ) pois qualquer polinoˆmio na˜o nulo de N(ϕ), em se anulando em todos os elementos de Zp, tem que ter grau maior ou igual a p. Segue enta˜o do Teorema 2 que N(ϕ) = I(Xp −X). PROBLEMAS 1.3. 1. Determine o MDC dos seguintes pares de polinoˆmios de Q[X]: (a) X5 + 4X3 + 3X2 +X + 1 e X3 +X + 1. (b) X5+10X4+40X3+80X2+80X +32 e X3+6X2+12X +8. (c) X4 +X3 + 2X2 +X + 1 e X4 + 3X3 + 5X2 + 3X + 4. (d) X3 −X2 −X − 2 e X3 − 3X − 2. 2. Seja F uma extensa˜o de um corpo K. Sejam p1(X), p2(X) ∈ K[X] e α ∈ F . Mostre que α e´ raiz comum de p1(X) e p2(X) se e somente se α e´ raiz de (p1(X), p2(X)). Ache as ra´ızes comuns em C dos pares de polinoˆmios do problema 3.1. 3. Resolva em Q[X] a seguinte equac¸a˜o diofantina: (X3+3X2+3X+2)·u+(X3+2X2+2X+1)·v = X4+X3+2X2+X+1. 4. Seja K um corpo. (a) Mostre que todo polinoˆmio de grau 1 e´ irredut´ıvel em K[X]. (b) Sejam a, b ∈ K com a 6= b. Mostre que para todos n,m ∈ N, os polinoˆmios (X − a)n e (X − a)m sa˜o primos entre si. (c) Se K e´ algebricamente fechado, os u´nicos polinoˆmios irredut´ıveis de K[X] sa˜o os de grau 1. 1.4. POLINOˆMIOS SOBRE C E SOBRE R 29 5. (a) Mostre que se um polinoˆmio de grau maior do que 1 em K[X] tem uma raiz em K, enta˜o eˆle e´ redut´ıvel em K[X]. Deˆ um exemplo mostrando que na˜o vale a rec´ıproca. (b) Mostre que um polinoˆmio de grau 2 ou 3 em K[X] e´ redut´ıvel se, e somente se, ele possui uma raiz em K. Este resultado vale para graus maiores do que 3 ? (c) Determine todos os polinoˆmios irredut´ıveis de graus 2, 3 e 4 em Z5[X]. 6. Mostre que aX2 + bX + c ∈ R[X] e´ irredut´ıvel se, e somente se, tem-se ∆ < 0 onde ∆ = b2 − 4ac < 0. 7. Decomponha em C[X] e em R[X] os seguintes polinoˆmios: a) X4 − 1 b) X4 + 1 c) X6 − 1 d) X6 + 1 8. Para que valores de p, q ∈ R X4 + 1 e´ divis´ıvel por X2 + pX + q em R[X] ? Sugesta˜o: Decomponha X4 + 1 em C[X ] ). 9. Mostre que em K[X] ha´ infinitos polinoˆmios irredut´ıveis dois a dois na˜o associados. Sugesta˜o: Fac¸a uma reproduc¸a˜o a demonstrac¸a˜o de Euclides da existeˆncia de infinitos nu´meros primos (cf. I-5, Teorema 1). 10. Sejam p(X), q(X) ∈ K[X] com p(X) irredut´ıvel. Suponha que existe α numa extensa˜o de K tal que p(α) = q(α) = 0. Mostre que q(X) e´ mu´ltiplo de p(X). Se q(X) e´ tambe´m irredut´ıvel, enta˜o p(X) e q(X) sa˜o associados. 1.4 Polinoˆmios sobre C e sobre R Pelo fato de C ser algebricamente fechado (Teorema Fundamental da A´lgebra, Apeˆndice 1) e pelo Corola´rio 5 do Teorema 1, segue que todo po- linoˆmio p(X) ∈ C[X] se escreve de modo u´nico na forma, p(X) = a(X − α1)n1 · · · (X − αr)nr (1.5) com a, α1, . . . , αr ∈ C, αi 6= αj se i 6= j e n1, . . . , nr ∈ N. 30 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS As ra´ızes de p(X) sa˜o os α1, . . . , αr e o inteiro ni, i = 1, . . . , r, e´ chamado de multiplicidade da raiz αi. Como gr(p(X)) = n1+ · · ·+nr, segue que todo polinoˆmio em C[X] de grau n tem exatamente n ra´ızes, desde que contadas com suas multiplicidades. Seja p(X) = a0 + a1X + · · · + anXn ∈ C[X]. Define-se o polinoˆmio conjugado de p(X) como sendo p¯(X) = a¯0 + a¯1X + · · · a¯nXn ∈ C[X] onde a¯i e´ o conjugado de ai, i = 0, 1, . . . , n. A conjugac¸a˜o de polinoˆmios goza das seguintes propriedades, cujas veri- ficac¸o˜es deixamos a cargo do leitor. 1. Se p(X) = p1(X) + p2(X) enta˜o p¯(X) = p1(X) + p2(X). 2. Se p(X) = p1(X) · p2(X) enta˜o p¯(X) = p1(X) · p2(X). 3. p¯(X) = p(X) se, e somente se, p(X) ∈ R[X]. 4. Se a ∈ C[X] enta˜o p¯(a¯) = p(a) Da propriedade (4) acima deduz-se facilmente que α e´ raiz p(X) se, e somente se, α¯ e´ raiz de p¯(X). PROPOSIC¸A˜O 1.6. Seja p(X) ∈ R[X]. Se α ∈ C e´ raiz de multiplicidade m de p(X). enta˜o, α¯ e´ raiz de multiplicidade m de p(X). DEMONSTRAC¸A˜O : Se α ∈ C e´ raiz de multiplicidade m de p(X) enta˜o p(X) = (X −α)m · q(X), com q(X) ∈ C[X] e q(α) 6= 0. Como p(X) ∈ R[X], temos que p(X) = p¯(X) = (X− α¯)m · q¯(X). Note agora que q¯(α¯) = q(α) 6= 0 e portanto α¯ e´ raiz de multiplicidade m de p(X). COROLA´RIO 1.14. Todo polinoˆmio de grau ı´mpar com coeficientes reais tem pelo menos uma raiz real. DEMONSTRAC¸A˜O : As ra´ızes complexas aparecem aos pares e como o polinoˆmio e´ de grau ı´mpar, o resultado segue. 1.4. POLINOˆMIOS SOBRE C E SOBRE R 31 PROPOSIC¸A˜O 1.7. i) aX+b com a, b ∈ R e a 6= 0 e´ irredut´ıvel em R[X]. ii) aX2+ bX + c com a, b, c ∈ R e a 6= 0 e´ irredut´ıvel em R[X] se, e somente se, ∆ = b2 − 4ac < 0. iii) Todo polinoˆmio de grau maior do que 2 e´ redut´ıvel em R[X]. DEMONSTRAC¸A˜O : i) E´ evidente e vale emqualquer corpo. ii) aX2+ bX + c e´ irredut´ıvel se, e somente se, na˜o possui fatores do 10 grau em R[X] e isto equivale a dizer que aX2+ bX+ c na˜o possui ra´ızes em R que por sua vez e´ equivalente ao fato que ∆ < 0. iii) Seja p(X) um polinoˆmio em R[X] de grau maior do que 2. Seja α ∈ C uma raiz de p(X). Se α ∈ R, enta˜o p(X) e´ divis´ıvel em R[X] por (X−α), portanto ele e´ redut´ıvel. Se α ∈ C−R, enta˜o α¯ e´ raiz de p(X), logo (X−α) ·(X−α¯) = X2 − 2Re(α)X + |α|2 esta´ em R[X] e divide p(X) em R[X] com quociente na˜o constante, portanto p(X) e´ redut´ıvel. COROLA´RIO 1.15. Todo polinoˆmio p(X) ∈ R[X] − {0} se escreve de modo u´nico, a menos da ordem dos fatores como p(X) = a(X − α1) · · · (X − αr)(X2 + b1X + c1) · · · (X2 + bsX + cs) com a, α1, . . . , αr, b1, . . . , bs, c1, . . . , cs reais e bi 2 − 4ci < 0, i = 1, . . . , s. PROBLEMAS 1.4. 1. Sejam p(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn e q(X) = b0 + b1X + · · ·+ bnXn polinoˆmios em C[X]. Suponha que eles tenham mesmas ra´ızes com mesmas multiplicidades. Prove que existe a ∈ C− {0} tal que aj = a · bj , j = 1, . . . , n. 2. Uma raiz de X4 + 3X3 − 30X2 + 366X − 340 e´ 3 + 5i, ache as demais ra´ızes. 3. 1 + i e´ raiz mu´ltipla de X6 − 3X5 + 5X4 − 4X3 + 4X2 − 4X + 4 = 0. Ache a multiplicidade desta raiz e as demais ra´ızes. 4. Fatore em R[X] os seguintes polinoˆmios a) X4 + 4X2 + 3 b) X4 + 4X2 + 4 c) X4 −X2 + 1 d) X4 + pX2 + q com p, q ∈ R 32 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS 5. Mostre que se n ∈ N, enta˜o (a) X2n − 1 = (X − 1)(X + 1) ·∏n−1k=1 (X2 − 2X cos kpin + 1). (b) X2n+1 − 1 = (X − 1) ·∏n−1k=1 (X2 − 2X cos 2kpi2n+1 + 1). 6. Fatore em R[X] os seguintes polinoˆmios a) X24 − 1 b) X12 − 1 c) X13 − 1. 1.5 Polinoˆmios em Va´rias Indeterminadas Seja A[X1] o anel dos polinoˆmios a coeficientes em A na indeterminada X1. Se X2 e´ uma indeterminada sobre o anel A[X1], define-se: A[X1, X2] = (A[X1]) [X2]. Pode-se enta˜o definir recorrentemente, A[X1, X2, . . . , Xn] = (A[X1, X2, . . . , Xn−1]) [Xn]. Se A e´ um domı´nio de integridade, pelo Corola´rio 1 da Proposic¸a˜o 3, temos que A[X1] tambe´m e´ um domı´nio de integridade. Usando o mesmo argumento iteradamente, conclui-se que A[X1, X2, . . . , Xn] e´ um domı´nio de integridade. Todo elemento p(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn] pode ser escrito na forma p(X1, . . . , Xn) = ∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn , 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn onde r1, . . . , rn ∈ Z+ e ai1,...,in ∈ A e e´ chamado polinoˆmio em n indetermi- nadas. Cada termo da forma ai1,...,inX i1 1 · · ·X inn e´ chamado monoˆmio e o seu grau e´ definido como sendo i1 + i2 + · · ·+ in. Dois monoˆmios sa˜o semelhantes se eles teˆm o mesmo grau. O grau de um polinoˆmio em n indeterminadas e´ o maior dos graus de seus monoˆmios na˜o nulos. Um polinoˆmio e´ chamado 1.5. POLINOˆMIOS EM VA´RIAS INDETERMINADAS 33 homogeˆneo de grau m se todos os seus monoˆmios teˆm grau m. Dado um polinoˆmio em A[X1, . . . , Xn], a soma dos seus monoˆmios de grau m e´ um po- linoˆmio homogeˆneo de graum chamado componente homogeˆneo de grau m do polinoˆmio. Enta˜o todo polinoˆmio e´ soma de polinoˆmios homogeˆneos de graus dois a dois distintos, pois ele e´ a soma das suas componentes homogeˆneas. O grau de um polinoˆmio p(X1, . . . , Xn) e´ simbolizado por gr(p(X1, . . .Xn)). Exemplo 1 : Seja p(X1, X2, X3) = 3 + 5X1 + 3X2 +X1X2 +X3 2 +X2 3X3 + 7X1 5. Este polinoˆmio e´ de grau 5, suas componentes homogeˆneas sa˜o: • de grau zero: 3; • de grau um: 5X1 + 3X2 ; • de grau dois: X1X2 +X32 ; • de grau treˆs: na˜o tem; • de grau quatro: X23X3 ; • de grau cinco: 7X15 . PROPOSIC¸A˜O 1.8.∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn = 0 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn se, e somente se, ai1...,in = 0 para cada 0 ≤ i1 ≤ r1, . . . , 0 ≤ in ≤ rn. DEMONSTRAC¸A˜O : Em uma direc¸a˜o vamos provar por induc¸a˜o em n. Se n = 1, a asserc¸a˜o e´ verdadeira pela definic¸a˜o da igualdade de polinoˆmios em uma indeterminada. Vamos supor a asserc¸a˜o va´lida para n− 1. Seja∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn = 0, 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn 34 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS podemos escrever, 0 = ∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn = 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn = ∑ ∑ (ai1...inX i1 1 · · ·X in−1n−1 )X inn . 0≤in≤rn 0≤i1≤r1 ... 0≤in−1≤rn−1 Pela definic¸a˜o da igualdade em (A[X1, . . . , Xn−1])[Xn], segue que∑ ai1...inX i1 1 · · ·X in−1n−1 = 0 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn para todo in, 0 ≤ in ≤ rn. Pela hipo´tese de induc¸a˜o, segue que ai1,...,in = 0 para cada 0 ≤ i1 ≤ r1 , . . . , 0 ≤ in ≤ rn. A rec´ıproca e´ imediata. Seja A um domı´nio de integridade. Pode-se verificar facilmente que para p(X1, . . . , Xn), q(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn], tem-se gr(p(X1, . . . , Xn) · q(X1, . . . , Xn)) = gr(p(X1, . . . , Xn)) + gr(q(X1, . . . , Xn)). Portanto e´ imediato se checar que o polinoˆmio p(X1, . . . , Xn) e´ invert´ıvel em A[X1, . . . , Xn] se, e somente se, p(X1, . . . , Xn) ∈ A e e´ um elemento invert´ıvel de A. E´ claro que os polinoˆmios X1, . . . , Xn sa˜o irredut´ıveis em K[X1, . . . , Xn], onde K e´ um corpo. 1.5. POLINOˆMIOS EM VA´RIAS INDETERMINADAS 35 Seja A um domı´nio de integridade. O corpo de frac¸o˜es (cf. I-2) do domı´nio A[X1, . . . , Xn] e´ o corpo A(X1, . . . , Xn) = { p(X1, . . . , Xn) q(X1, . . . , Xn) | p(X1, . . . , Xn), q(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn] e q(X1, . . . , Xn) 6= 0 } E´ fa´cil ver que se K e´ o corpo de frac¸o˜es de A, enta˜o A(X1, . . . , Xn) = K(X1, . . . , Xn). Dado um polinoˆmio p(X1, . . . , Xn) = ∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn ∈ A[X1, . . . , Xn], 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn podemos definir a func¸a˜o polinomial: p : An −→ A (α1, . . . , αn) 7−→ ∑ ai1,...,inα i1 1 · · ·αinn = p(α1, . . . αn). 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn Dois polinoˆmios iguais determinam a mesma func¸a˜o polinomial, mas dois polinoˆmios distintos podem definir a mesma func¸a˜o polinomial. Isto nova- mente na˜o ocorre se A e´ um domı´nio infinito, como veremos adiante. PROPOSIC¸A˜O 1.9. Sejam A e´ um domı´nio infinito e p(X1, . . .Xn) um polinoˆmio em A[X1, . . . , Xn]−{0}. Enta˜o existem infinitos (α1, . . . , αn) ∈ An tais que p(α1, . . . , αn) 6= 0. DEMONSTRAC¸A˜O : Vamos provar por induc¸a˜o em n. Se n = 1, o resul- tado segue do Corola´rio 3 do Teorema 1. Suponha o resultado va´lido para n− 1 e seja p(X1, . . . , Xn) = ∑ ai1...inX i1 1 · · ·X inn = 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn 36 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS = ∑ ∑ (ai1...inX i1 1 · · ·X in−1n−1 )Xnin . 0≤in≤rn 0≤i1≤r1 ... 0≤in−1≤rn−1 Como p(X1, . . . , Xn) 6= 0, para algum in temos que,∑ ai1...inX i1 1 · · ·X in−1n−1 6= 0, 0≤i1≤r1 ... 0≤in−1≤rn−1 logo, pela hipo´tese de induc¸a˜o, existem α1, . . . αn−1 ∈ A tais que,∑ ai1...inα i1 1 · · ·αin−1n−1 6= 0, 0≤i1≤r1 ... 0≤in−1≤rn−1 logo o polinoˆmio p(α1, . . . , αn−1, Xn) = = ∑ ∑ ( ai1...inα i1 1 · · ·αin−1n−1 ) X inn ∈ A[Xn] 0≤in≤rn 0≤i1≤r1 ... 0≤in≤rn e´ na˜o nulo e logo possui um nu´mero finito de ra´ızes. Para infinitos valores de αn ∈ A (os elementos de A que na˜o sa˜o ra´ızes de p(α1, . . . , αn−1, Xn)) temos que p(α1, . . . , αn) 6= 0, o que prova o resultado. COROLA´RIO 1.16. Seja A um domı´nio infinito. Sejam ainda os po- linoˆmios p(X1, . . . , Xn) e q(X1, . . . , Xn) em A[X1, . . .Xn] tais que p(α1, . . . , αn) = q(α1, . . . , αn) ∀ (α1, . . . , αn) ∈ An. Enta˜o p(X1, . . . , Xn) = q(X1, . . . , Xn). 1.5. POLINOˆMIOS EM VA´RIAS INDETERMINADAS 37 DEMONSTRAC¸A˜O : Suponha por absurdo que p(X1, . . . , Xn)− q(X1, . . . , Xn) 6= 0, logo pela proposic¸a˜o 9, existem (α1, . . . , αn) ∈ An tais que p(α1, . . . , αn)− q(α1, . . . , αn) 6= 0. Mas, pela proposic¸a˜o, existem α1, . . . , αn ∈ A tais que p1(α1, . . . , αn)− p2(α1, . . . , αn) 6= 0, o que e´ uma contradic¸a˜o. PROPOSIC¸A˜O 1.10. Seja K um corpo algebricamente fechadoe seja f(X1, . . . , Xn) ∈ K[X1, . . . , Xn]−K com n ≥ 2. Enta˜o o conjunto VK(f) = {(α1, . . . , αn) ∈ Kn | f(α1, . . . , αn) = 0} e´ infinito. DEMONSTRAC¸A˜O : Como f(X1, . . . , Xn) na˜o esta´ em K, enta˜o pelo menos uma das indeterminadas figura em f(X1, . . . , Xn). Sem perda de ge- neralidade, podemos supor que seja Xn. Escrevemos f(X1, . . . , Xn) = f0(X1, . . . , Xn−1) + f1(X1, . . . , Xn−1)Xn + · · ·+ fd(X1, . . . , Xn−1)Xdn como polinoˆmio em (K[X1, . . . , Xn−1])[Xn], com fd(X1, . . . , Xn−1) 6= 0 e d ≥ 1. Pela Proposic¸a˜o 9, existem infinitos elementos (α1, . . . , αn) ∈ Kn−1 tais que fd(α1, . . . , αn−1) 6= 0 e para cada escolha de tais (α1, . . . , αn−1) existe αn ∈ Kn−1 raiz da equac¸a˜o f(α1, . . . , αn−1, Xn) = 0, pois K e´ algebricamente fechado, o que prova a asserc¸a˜o. 38 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS PROBLEMAS 1.5. 1. Sejam A um domı´nio de integridade e p, q ∈ A[X1, . . . , Xn]. Mostre que, (a) gr(p · q) = gr(p) + gr(q). (b) Se p e q sa˜o homogeˆneos, enta˜o p · q e´ homogeˆneo. (c) Se p e´ homogeˆneo e p = p1 · p2 em A[X1, . . . , Xn], enta˜o p1 e p2 sa˜o homogeˆneos. 2. Seja K um corpo. Se Fm, Fm+1 ∈ K[X1, . . . , Xn] sa˜o homogeˆneos de graus respectivamente m e m + 1, sem fatores na˜o constantes em co- mum, mostre que Fm + Fm+1 e´ irredut´ıvel em K[X1, . . . , Xn]. 3. Seja K um corpo. Mostre que Y 2+ p(X1, . . . , Xn) ∈ K[X1, . . . , Xn, Y ], onde p(X1, . . . , Xn) ∈ K[X1, . . . , Xn], e´ irredut´ıvel se, e somente se, p(X1, . . . , Xn) na˜o e´ o quadrado de um polinoˆmio em K[X1, . . . , Xn]. Em particular, mostre que Y 2 − X(X − 1)(X − λ), com λ ∈ K, e´ irredut´ıvel em K[X, Y ] . 4. Seja K um corpo algebricamente fechado. Seja p(X1, X2) ∈ K[X1, X2] um polinoˆmio homogeˆneo de grau m ≥ 1. Mostre que existem αi, βi ∈ K, i = 1, . . . , m tais que, p(X1, X2) = (α1X1 + β1X2) · (α2X1 + β2X2) · · · (αmX1 + βmX2). 5. (a) Seja A um anel. Sejam p(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn] e Y uma indeterminada sobre A[X1, . . . , Xn]. Mostre que p(X1, . . . , Xn) e´ um polinoˆmio homogeˆneo de grau m se, e somente se, p(Y X1, . . . , Y Xn) = Y mp(X1, . . . , Xn) (Como polinoˆmio em A[X1, . . . , Xn]). (b) Seja p(X1, X2, X3) ∈ R[X1, X2, X3]. Mostre que V R(p) e´ um cone com ve´rtice na origem de R3 se, e somente se, p(X1, X2, X3) e´ um polinoˆmio homogeˆneo. 6. O polinoˆmio f(X1, X2) = X 2 1 +X 2 2 e´ irredut´ıvel em R[X1, X2] ? Deter- mine V R(f). Responda a`s mesmas perguntas em C[X1, X2]. 1.5. POLINOˆMIOS EM VA´RIAS INDETERMINADAS 39 7. SejaK um corpo algebricamente fechado e f(X1, . . . , Xn) um polinoˆmio em K[X1, . . . , Xn]. Mostre que VK(f) e´ na˜o vazio se, e somente se, f(X1, . . . , Xn) ∈ K∗. Deˆ um exemplo onde na˜o vale o resultado se K = R. 40 CAPI´TULO 1. POLINOˆMIOS Cap´ıtulo 2 DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 2.1 Derivada Primeira Seja K um corpo. Define-se o operador DX 1 em K[[X]] (i.e. D1X e´ uma aplicac¸a˜o de K[[X]] em si pro´prio) como segue D1X : K[[X]] −→ K[[X]] f(X) = ∑∞ i=0 aiX i 7−→ D1Xf(X) = ∑∞ i=0 iaiX i−1 Este e´ chamado operador de derivac¸a˜o de ordem 1 e tem propriedades nota´veis que o tornam muito u´til. A se´rie de poteˆncias D1X e´ chamada deri- vada primeira ou simplesmente derivada de f(X). Usa-se tambe´m a notac¸a˜o D1X = f ′(X). Segue claramente da definic¸a˜o que D1X(K[X]) ⊂ k[X]. PROPOSIC¸A˜O 2.1. Sejam f(X), g(X) ∈ K[X], a ∈ K e m ∈ N. Temos que 1. D1X(f(X) + ag(X)) = f ′(X) + ag′(X). 2. D1X(f(X) · g(X)) = f ′(X) · g(X) + f(X) · g′(X). 3. D1X((f(X)) m = m(f(X))m−1 · f ′(X) . Demonstrac¸a˜o: 41 42 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 1. A demonstrac¸a˜o deste item segue diretamente da definic¸a˜o. 2. Em virtude do Problema 1.4 do Cap´ıtulo 1, basta provar a fo´rmula para produtos da forma Xng(X). Seja g(X) = ∑∞ i=0 biX i, temos que D1X(X ng(X)) = D1X ( ∞∑ i=0 biX n+i ) = ∞∑ i=0 (n + i)biX n+i−1 = = nXn−1 ∞∑ i=0 biX i +Xn ∞∑ i=0 ibiX i = ( D1XX n ) g(X) +XnD1Xg(X) 3. A demonstrac¸a˜o pode ser feita por induc¸a˜o sobre m e a deixamos a cargo do leitor. O pro´ximo resultado vai caracterizar aquelas se´ries de poteˆncias que teˆm derivada nula. PROPOSIC¸A˜O 2.2. 1. Se car(K) = 0 enta˜o, D1Xf(X) = 0 se, e so- mente se, f(X) ∈ K. 2. Suponha car(K) = p > 0. Enta˜o D1Xf(X) = 0 se, e somente se, f(X) = b0 + b1X p + b2X 2p + · · · , com bi ∈ K, ∀i ∈ Z+ Demonstrac¸a˜o: Seja f(X) = ∑∞ i=0 aiX i ∈ K[[X]]. D1Xf(X) = 0 se, e somente se, iai = 0 para todo i ∈ Z+. Por I-7, Problema 3.1, esta u´ltima condic¸a˜o e´ equivalente a i ≡ 0 mod car(K) ou ai = 0. 1. Se car (K) = 0, isto e´ equivalente a 0 = a1 = a2 = · · · , isto e´, f(X) = a0 ∈ K. 2. Se car (K) = p > 0, isto e´ equivalente a i ≡ 0 mod p se ai 6= 0. Assim, D1Xf(X) = 0 se, e somente se, f(X) = a0 + apX p + a2pX 2p + · · · . O resultado segue definindo bj = ajp, ∀ j ∈ Z+. Se um polinoˆmio p(X) e´ divis´ıvel por (X − α)m, onde α ∈ K e m ∈ N, e na˜o e´ divis´ıvel por (X − α)m+1, dizemos que α e´ raiz de multiplicidade m de p(X). Se m ≥ 2, dizemos que α e´ raiz mu´ltipla de p(X). Note que se (X−α)l divide p(X), enta˜o α e´ raiz de multiplicidade pelo menos l de p(X). Damos a seguir uma caracterizac¸a˜o daqueles polinoˆmios que teˆm ra´ızes mu´ltiplas em termos de derivadas. 2.1. DERIVADA PRIMEIRA 43 PROPOSIC¸A˜O 2.3. Um elemento α ∈ K e´ raiz mu´ltipla de p(X) ∈ K[X] se, e somente se, p(α) = p′(α) = 0. Demonstrac¸a˜o: Por um lado, suponha que p(X) = (X − α)m · q(X) com m ≥ 2. Logo, pela Proposic¸a˜o 1, (2) e (3) temos que p′(X) = (x− α)m · q′(X) +m(X − α)m−1 · q(X). Como m ≥ 2 e´ claro que p(α) = p′(α) = 0. Reciprocamente, Como p(α) = 0, temos que p(X) = (X−α)·q(X). Derivando ambos os lados desta igualdade, temos p′(X) = q(X)+ (X−α) · q1(X). Desta igualdade e de p′(α) = 0 segue que q(α) = 0 e da´ı que q(X) = (X − α) · q1(X) para algum q1(X) ∈ K[X]. Consequ¨entemente p(X) = (X−α)2 ·q1(X) e portanto α e´ uma raiz mu´ltipla de p(X). COROLA´RIO 2.1. Seja K um corpo algebricamente fechado. p(X) ∈ K[X] na˜o tem ra´ızes mu´ltiplas em K se, e somente se, (p(X), p′(X)) = 1. Demonstrac¸a˜o: Sendo K um corpo algebricamente fechado, os polinoˆmios p(X) e p′(X) teˆm raiz comum se, e somente se, eles teˆm um fator na˜o cons- tante comum. O resultado segue enta˜o da Proposic¸a˜o 3. COROLA´RIO 2.2. Se car (K) = 0 e se p(X) ∈ K[X] e´ irredut´ıvel, enta˜o p(X) na˜o pode ter raiz mu´ltipla em nenhuma extensa˜o F de K. Demonstrac¸a˜o: Note inicialmente que se car (K) = 0 e p(X) e´ irredut´ıvel enta˜o p′(X) 6= 0 e (p(X), p′(X)) = 1. A primeira destas asserc¸o˜es segue da Proposic¸a˜o 2. Para a segunda, suponha por absurdo que (p(X), p′(X)) 6= 1, logo p(X) e p′(X) teˆm um fator na˜o constante em comum e como p(X) e´ irredut´ıvel este fator comum e´ um associado de p(X), o que e´ imposs´ıvel pois gr(p′(X)) < gr(p(X)). Como (p(X), p′(X)) = 1 em K[X], o mesmo ocorre em F [X], logo pelo Corola´rio 1, p(X) na˜o tem ra´ızes mu´ltiplas em F . PROPOSIC¸A˜O 2.4. Seja p(X ∈ K[X]) com car(K) = 0. Enta˜o α e´ raiz de multiplicidade m ≥ 1 de p(X) se, e somente se, α e´ raiz de p(X) e raiz de multiplicidade m− 1 de p′(X). 44 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE Demonstrac¸a˜o: Por um lado, suponha que α seja uma raiz de multiplici- dade m de p(X). Temos enta˜o que p(X) = (X − α)mq(X), com q(X) ∈ K[X] e q(α) 6= 0. Segue enta˜o que p′(X) = m(X−α)m−1q(X)+(X−α)mq′(X), portanto temos claramente que (X − α)m−1 | p′(X). Vamos provar que (X −α)m na˜o divide p′(X). De fato, se (X −α)m | p′(X), enta˜o (X − α)m | m(X − α)m−1q(X), logo (X − α) | mq(X) e portanto mq(α) = 0. Como car(K) = 0, segue que q(α) = 0 o que e´ uma contradic¸a˜o. Reciprocamente, suponha que p(α) = 0 e que α e´ raiz de multiplicidade m− 1 de p′(X). Seja r a multiplicidade da raiz α de p(X), logo r≥ 1 e pela primeira parte da demonstrac¸a˜o, α e´ raiz de multiplicidade r− 1 de p′(X) e portanto r − 1 = m− 1 e portanto r = m. Dado um polinoˆmio p(X) ∈ K[X] podemos definir as suas derivadas ite- radas do seguinte modo: p′′(X) e´ a derivada de p′(X), ou seja p′′(X) = D1X(D 1 X(p(X)), p′′′(X) e´ a derivada de p′′(X), ou seja p′′′(X) = D1X(D 1 X(D 1 X(p(X))), ... ... ... p(n)(X) e´ a derivada de p(n−1)(X), ou seja p(n)(X) = D1X(D (n−1) X (p(X)). COROLA´RIO 2.3. Seja car (K) = 0 e p(X ∈ K[X]). Um elemento α ∈ K e´ raiz de multiplicidade m ≥ 2 de p(X) se, e somente se, p(α) = p′(α) = · · · = p(m−1)(α) = 0 e p(m)(α) 6= 0. Demonstrac¸a˜o: Por um lado, se α e´ raiz de multiplicidade m de p(X), enta˜o α e´ raiz de multiplicidade m− 1 de p′(X), logo raiz de multiplicidade (m − 2) de p′′(X), etc. ate´ concluirmos que α e´ raiz de multiplicidade 1 de p(m−1)(X) e portanto p(m) 6= 0. Segue enta˜o que p(α) = p′(α) = · · · = p(m−1)(α) = 0 e p(m)(α) 6= 0. Reciprocamente, sendo p(m−1)(α) = 0 e p(m)(α) 6= 0 tem-se que α e´ raiz de multiplicidade 1 de p(m−1)(X) e portanto de multiplicidade 2 de p(m−1)(X) 2.1. DERIVADA PRIMEIRA 45 e assim sucessivamente ate´ concluirmos que α e´ raiz de multiplicidade m de p(X). Exemplo 1 : A derivac¸a˜o permite obter algumas fo´rmulas interessantes. Por exemplo, derivando ambos os membros a identidade: (X + 1)n = ( n 0 ) Xn + ( n 1 ) Xn−1 + · · ·+ ( n n− 1 ) X + ( n n ) , e fazendo X = 1 obtemos a igualdade n · 2n−1 = n ( n 0 ) + (n− 1) ( n 1 ) + · · ·+ ( n n− 1 ) . Exemplo 2 : Na Proposic¸a˜o 5, Cap´ıtulo 1, demos a fo´rmula de interpolac¸a˜o de Lagrange. Recordando, e´ o u´nico polinoˆmio de grau menor do que n que assume o valor bi quando avaliado em ai onde os ai ′s sa˜o dois a dois distintos e os b′is na˜o sa˜o todos nulos, i = 1, . . . , n e´ o polinoˆmio p(X) = n∑ i=1 bi (X − a1) . . . (X − ai−1) · (X − ai+1) · · · (X − an) (ai − a1) · · · (ai − ai−1) · (ai − ai+1) · · · (ai − an) Podemos reescrever esta fo´rmula, usando derivadas, do seguinte modo mais sinte´tico: p(X) = n∑ i=1 f(X) (X − ai) · bi f ′(ai) , onde f(X) = (X − a1) · · · (X − an). PROBLEMAS 2.1. 1. Ache a multiplicidade da raiz 1 do polinoˆmio X5 − 3X4 + 5X3 − 7X2 + 6X − 2. Determine as demais ra´ızes. 2. Ache as ra´ızes da equac¸a˜o X3−(3+√2)X2+(1+2√2)X+(1+√2) = 0, sabendo-se que esta tem uma raiz dupla. 46 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 3. Mostre que o polinoˆmio X(Xn−1 − nan−1) + an(n − 1) e´ divis´ıvel por (X − a)2, mas na˜o e´ divis´ıvel por (X − a)3, onde a 6= 0 e n ≥ 2. 4. Mostre que se n ≥ 3, enta˜o (1−X)3 divide o polinoˆmio (1−Xn)(1 +X)− 2nXn(1−X)− n2Xn(1−X)2 5. Determine os poss´ıveis valores de m, p e q em C de modo que o po- linoˆmio X6 +mX4 + 10X3 + pX + q tenha uma raiz qua´drupla em C. Determine, neste caso, as ra´ızes do polinoˆmio. 6. Seja ξ 6= 1 uma raiz n-e´sima da unidade e seja p(X) = Xn−1 +Xn−2 + · · ·+X + 1. Mostre que: (a) p′(ξ) = n ξ(ξ−1) . (b) ξ + 2ξ2 + · · ·+ (n− 1)ξn−1 = n ξ−1 . 7. (a) Mostre que o resto da divisa˜o de um polinoˆmio p(X) ∈ K[X] por t((X) = (X − x1) · (X − xn), onde x1, . . . , xn ∈ K sa˜o dois a dois distintos, e´ n∑ i=1 t(X) (X − xi) p(xi) t′(xi) (Sugesta˜o: Use a fo´rmula do Exemplo 2) (b) Ache o resto da divisa˜o de X9+3X7+4X6+X4−X3+2X2−X+1 por X(X + 1)(X − 1) 8. Deˆ um contraexemplo para o Corola´rio 1 quando K = R. 9. Deˆ um contraexemplo para a Proposic¸a˜o 4 quando car(K) > 0. 10. (a) Mostre que (X i)(n) = { 0, se i < n i(i− 1) · · · (i− n+ 1)X i−n, se i ≥ n. (b) Mostre que se n ≥ car(K), enta˜o (p(X))(n) = 0 ∀ p(X) ∈ K[X]. (c) Conclua que se car(K) = 2, enta˜o (p(X))(n) = 0 ∀ p(X) ∈ K[X], ∀ n ≥ 2. 2.2. DIVISA˜O POR X − A 47 2.2 Divisa˜o por X − a Frequ¨entemente dividiremos polinoˆmios por X − a, por isso desenvolve- mos um me´todo pra´tico para efetuar tais diviso˜es. Seja p(X) = a0 + a1X + · · · + anXn ∈ A[X], vamos usar o me´todo dos coeficientes a determinar para achar q(X) = b)+b1X+· · ·+bn−1Xn−1 ∈ A[X] e r ∈ A tais que p(X) = (X − a) · (b0 + b1X + · · ·+ bn−1Xn−1) + r = bn−1Xn + (bn−2 − a · bn−1)Xn−1 + (bn−3 − a · bn−2)Xn−2 + · · ·+ + (b0 − a · b1)X + r − a · b0 Igualando os coeficientes correspondentes, obte´m-se bn−1 = an bn−2 = an−1 + a · bn−1 bn−3 = an−2 + a · bn−2 ... b0 = a1 + a · b1 r = a0 + a · b0 Destas igualdades, deduz-se o seguinte dispositivo pra´tico: an an−1 an−2 · · · a1 a0 a an an−1 + a · bn−1 an−2 + a · bn−2 · · · a1 + a · b1 a0 + a · b0 ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ bn−1 bn−2 bn−3 · · · b0 r = p(a) Exemplo 1 : Dividamos p(X) = 8X6 − 7X5 + 4X4 + X3 − 3X2 + 1 por X + 2 8 −7 4 1 −3 0 1 −2 8 −23 50 −99 195 −390 781 48 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE Portanto q(X) = 8X5−23X4+50X3−99X2+195X−390 e r = p(−2) = 781. Exemplo 2 : Dividamos p(X) = X5 + 4X4 + 2X2 +X + 1 por 2X + 1 1 4 0 2 1 1 1 2 1 9 2 9 4 25 8 41 16 73 32 Portanto p(X) = ( X − 1 2 ) · ( X4 + 9 2 X3 + 9 4 X2 + 25 8 X + 41 16 ) + 73 32 , segue da´ı que p(X) = (2X − 1) · ( 1 2 X4 + 9 4 X3 + 9 8 X2 + 25 16 X + 41 32 ) + 73 32 , logo q(X) = 1 2 X4 + 9 4 X3 + 9 8 X2 + 25 16 X + 41 32 e r = p ( 1 2 ) + 73 32 . Exemplo 3 : Dividamos p(X) = Xn − an por X − a 1 0 0 · · · 0 −an a 1 a a2 · · · an−1 0 Portanto q(X) = Xn−1+ a ·Xn−2+ a2 ·Xn−3+ · · ·+ an−1 e r = p(a) = 0. Sejam p(X) ∈ A[X] um polinoˆmio de grau n e a ∈ A. Considere as seguintes igualdades: p(X) = (X − a) · q1(X) + r0 q1(X) = (X − a) · q2(X) + r1 q2(X) = (X − a) · q3(X) + r2 ... = qn−1(X) = (X − a) · qn(X) + rn−1 2.2. DIVISA˜O POR X − A 49 Por considerac¸a˜o de graus, temos que qn(X) ∈ A. Pondo rn = qn(X) e substituindo uma equac¸a˜o na outra, no sistema acima, obtemos p(X) = r0+ r1 · (X − a)+ r2 · (X − a)2+ · · · rn−1 · (X − a)n−1+ rn · (X − a)n. Esta e´ a expressa˜o de p(X) em poteˆncias crescentes de (X − a). As diviso˜es sucessivas por (X − a) nos fornecem um algoritmo pra´tico para determinar tal expressa˜o. Seja p(X) = a0 + a1X + a2X 2 + · · · + anXn. Obtemos r0, r1, r2, . . . , rn como segue an an−1 · · · a1 a0 −an a Coeficientes de q1(X) r0 a Coeficientes de q2(X) r1 ... · · · · · · a Coeficientes de qn(X) rn−1 a rn Exemplo 4 : Vamos expandir X5 − 1 em poteˆncias crescentes de X − 1. 1 0 0 0 0 −1 1 1 1 1 1 1 0 1 1 2 3 4 5 1 1 3 6 10 1 1 4 10 1 1 5 1 Assim, X5−1 = 5(X−1)+10(X−1)2+10(X−1)3+5(X−1)4+(X−1)5. Exemplo 5 : Vamos expandir p(X) = X6+4X5+7X4−3X3+X2−2X+1 em poteˆncias crescentes de X + 2. 50 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 1 4 7 −3 1 −2 1 −2 1 2 3 −9 17 −36 73 −2 1 0 3 −15 47 −130 −2 1 −2 7 −29 105 −2 1 −4 15 10 −2 1 −6 27 −2 1 −8 1 Assim, p(X) = 73− 130(X + 2) + 105(X + 2)2 − 59(X + 2)3+ +27(X + 2)4 − (X + 2)5 + (X + 2)6. Sejam K um corpo, p(X) ∈ K[X] e a ∈ K. Derivando sucessivamente a igualdade p(X) = r0+ r1 · (X − a)+ r2 · (X − a)2+ · · · rn−1 · (X − a)n−1+ rn · (X − a)n. temos que, p′(X) = r1 + 2r2(X − a) + 3r3(X − a)2 + · · ·+ nrn−1(X − a)n−1 p′′(X) = 2r2 + 3 · 2r3(X − a) + 4 · 3r4(X − a)2 + · · · ... pi(X) = i! ri + (i+ 1) · i! ri+1(X − a) + · · · ... p(n)(X) = n! rn Avaliando este polinoˆmios em a, obtemos que r0 = p(a), r1 = p ′(a), r2 = 1 2! p′′(a), ... ri = 1 i! p(i)(a), ... rn = 1 n! p(n)(a). Portanto se car(K) = 0 ou car(K) > n, temos a fo´rmula de Taylor, 2.2. DIVISA˜O POR X − A 51 p(X) = p(a) + p′(a) · (X − a) + p ′′(a) 2! · (X − a)2 + · · ·+ p (n)(a) n! (X − a)n. Observe tambe´m que as derivadas sucessivas p(a), p′(a), . . . , p(n)(a) po- dem ser calculadas a partirde r0, r1, . . . , rn mediante diviso˜es sucessivas por (X − a). Exemplo 6 : Seja p(X) = X6+4X5+7X4− 3X3+X2− 2X +1 ∈ Q[X]. Pela discussa˜o acima e pelos ca´lculos do Exemplo 5, temos que p(−2) = 73, p′(−2) = −130, p′′(−2) = 1 2! · 105105 2 , p′′′(−2) = 1 3! · (−59) = −59 6 , p(4)(−2) = 1 4! · 27 = 9 8 , p(5)(−2) = 1 5! · (−8) = −1 15 p(6)(−2) = 1 6! = 1 720 . PROBLEMAS 2.2. 1. Divida: (a) −X4 + 7X3 − 4X2 por X + 3, (b) X4 + 5X3 + 7X − 1 por X − 3, (c) 10X3 − 2X2 + 3X − 1 por 2X − 3, (d) X4 +X3 −X2 + 1 por 3X + 2. 2. Seja n ∈ N. Ache o quociente e o resto da divisa˜o de (a) nXn+1 − (n+ 1)Xn + 1 por (X − 1)2, (b) nXn+2 − (n+ 2)Xn+1 + (n+ 2)X − n por (X − 1)3. 3. Resolva a equac¸a˜o 2X3 + 3X2 − 4X − 6 = 0, sabendo-se que ela tem uma raiz α = −3 2 . 4. Resolva a equac¸a˜o 2X4 + 5X3 + 5X2 − 2 = 0 sabendo-se que ela tem uma α = −1 e outra raiz β = 1 2 . 5. Seja p(X) = X7 + 2¯X6 +X5 + 3¯X4 − X3 + 4¯X2 − 2¯X + 5¯ ∈ Z13[X]. Desenvolva p(X) segundo as poteˆncias crescentes de X − 1¯. Calcule p(i)(1¯) para i = 0, 1, 2, . . . , 7. 52 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE 2.3 Derivadas de ordem superior Seja K um corpo e seja f(X) ∈ K[[X]]. Se Y e´ uma indeterminada sobre K[[X]], podemos considerar f(X + Y ) como elemento de K[[X]][[Y ]] e como tal tem uma expressa˜o u´nica da forma f(X + Y ) = f0(X) + f1(X)Y + f2(X)Y 2 + · · ·+ fm(X)Y m + · · · , com f0(X), f1(X), f2(X), . . . ,∈ K[[X]]. Definimos uma famı´lia infinita de operadores em K[[X]] como segue, ∀ m ∈ Z+: DmX : K[[X]] −→ K[[X]] f(X) 7−→ DmX f(X) = fm(X) PROPOSIC¸A˜O 2.5. DmXX n = ( n m ) Xn−m ∀ m,n ∈ Z+. Se f(X) = ∑∞ i=0 aiX i ∈ K[[X]], enta˜o DmXf(X) = ∑∞ i=0 aiD m XX i. Demonstrac¸a˜o: Pela fo´rmula do binoˆmio de Newton temos que (X + Y )n = n∑ m=0 ( n m ) Xn−mY m, de onde segue a primeira afirmac¸a˜o. A segunda afirmac¸a˜o segue da ob- servac¸a˜o que o coeficiente de Y m em f(X + Y ) = ∑∞ i=0 ai(X + Y ) i e´ a soma, ∀ i ∈ Z+, dos coeficientes de Y m em ai(X + Y )i (que e´ igual a ai vezes o coeficiente de Y m em (X + Y )i). Segue imediatamente da Proposic¸a˜o 5 que DmX(K[X]) ⊂ K[X] ∀ m ∈ Z+. TEOREMA 2.1. Sejam f(X), g(X) ∈ K[[X]] e c ∈ K. A famı´lia de operadores (DmX )m∈Z+ possui as seguintes propriedades: 1. D0X = Id; D 1 X = derivac¸a˜o de ordem 1; D m Xc = 0 ∀ m ∈ N. 2. DmX(f(X) + cg(X)) = D m Xf(X) + cD m Xg(X) ∀ m ∈ Z+. 3. DmX(f(X) · cg(X)) = ∑m i=0D i Xf(X) ·Dm−iX g(X) ∀ m ∈ Z+. 2.3. DERIVADAS DE ORDEM SUPERIOR 53 4. DmX ◦DnX = ( m+ n n ) Dm+nX ∀ m ∈ Z+. Demonstrac¸a˜o: 1. Da Proposic¸a˜o 5 temos que D0XX n = Xn e D1XX n = nXn−1. Da segunda afirmac¸a˜o da Proposic¸a˜o 5 temos que D0Xf(X) = f(X) e D1Xf(X) = f ′(X). A igualdade DmXc = 0 ∀ m ∈ N segue direta- mente da definic¸a˜o. 2. Segue facilmente da Proposic¸a˜o 5. 3. Denotando por (f · g)(X + Y ) a se´rie de poteˆncias em K[[X]][[Y ]] correspondente a f(X)·g(X) onde se substitui X porX+Y , o resultado segue da seguinte igualdade em K[[X]][[Y ]]: (f · g)(X + Y ) = f(X + Y ) · g(X + Y ). 4. Pela Proposic¸a˜o 5, DmXf(X) e´ calcula´vel por linearidade a partir dos valores de DmXX i, i ∈ Z+. Portanto para provar (4) basta verificar que vale a igualdade quando os dois operadores sa˜o aplicados a X i, para todo i ∈ Z+. De fato, DmX ◦DnXX i = DmX ( i n ) X i−n = ( i n ) · ( i m+ n ) e ( m+ n n ) Dm+nX X i = ( m+ n n ) · ( i m+ n ) X i−(m+n) Uma verificac¸a˜o direta mostra que( i n ) · ( i− n m ) = ( m+ n n ) · ( i m+ n ) , o que prova o resultado. Os operadores DmX permitem generalizar para cacater´ıstica positiva al- guns dos resultados da Sec¸a˜o 1 provados para car(K) = 0. Usaremos a seguinte notac¸a˜o, se α ∈ K, f(X) ∈ K[X] e m ∈ Z, DmXf(α) = Avα(D n Xf(X)) 54 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE onde Avα e´ a func¸a˜o avaliac¸a˜o introdizida no Cap´ıtulo 1, Problema 1.8. O pro´ximo resultado e´ uma generalizac¸a˜o do Corola´rio da Proposic¸a˜o 4. PROPOSIC¸A˜O 2.6. Seja p(X) ∈ K[X]. Um elemento α ∈ K e´ raiz de multiplicidade m ≥ 2 de p(X) se, e somente se, p(α) = D1Xp(α) = · · ·Dm−1X p(α) = 0 e DmXp(α) 6= 0. Demonstrac¸a˜o: Na expressa˜o f(X + Y ) = f(X) +D1Xf(X)Y + · · ·+DmXf(X)Y m + · · · , substituindo X por α e Y por (X − α), temos que f(X) = f(α) +D1Xf(α)(X − α) + · · ·+DmXf(α)(X − α)m + · · · . O resultado segue imediatamente da expressa˜o acima. Do Teorema 1 (4) e por induc¸a˜o, segue facilmente que (D1X) m = D1X ◦D1X ◦ · · · ◦D1X = m! DmX . Portanto, se car(K) = 0, temos que DmX = 1 m! (D1X) m, ∀ m ∈ Z+ e con- sequ¨entemente, os operadores DmX sa˜o todos determinados por D 1 X atrave´s de iterac¸o˜es. Se car(K) = p > 0, o quadro e´ bem diferente. Por exemplo, se p < m, enta˜o (D1X) m = 0, sem que DmX seja nulo. Portanto as iterac¸o˜es de D 1 X na˜o sa˜o suficientes para determinar todos os operadores DmX . Afim de esclarecer a situac¸a˜o temos o seguinte resultado: TEOREMA 2.2. Seja K um corpo de caracter´ıstica p > 0 e seja m ∈ Z. Considere a expansa˜o p-a´dica de m, isto e´, m = ∑s i=0mip i, com 0 ≤ mi < p. Tem-se que DmX = 1 m0! · · ·ms! (D ps X ) ms ◦ · · · ◦ (D1X)m0 . 2.3. DERIVADAS DE ORDEM SUPERIOR 55 Demonstrac¸a˜o: Se 0 ≤ 1 < p e r ∈ Z, temos que (DprX )l = l! Dlp r X . Isto segue do Teorema 1 (4), induc¸a˜o sobre l e a congrueˆncia ( ips ps ) ≡ i mod p (cf. I-6, Problema 1.16). Agora usando argumentos semelhantes temos que Dmip i X ◦Dm0+m1p+···+mi−1p i−1 X = = ( m0 + · · ·mipi m0 + · · ·+mi−1pi−1 ) D m0+···+mi−1pi−1 X = D m0+···+mipi X . Da´ı segue que (Dp s X ) ms ◦ · · · ◦ (D1X)m0 = m0! · · ·ms! Dmsp s+···+m0 X = m0! · · ·ms!DmX , o que prova o resultado. O Teorema 2 em particular nos mostra que os operadores DmX sa˜o gerados por composic¸o˜es dos operadores D1X , D p X , D p2 X , . . . , D ps X , . . . No ca´lculo diferencial em caracter´ıstica p e´ fundamental compararmos os desenvolvimentos p-a´dicos de dois inteiros. Sejam m = m0 +m1p 1 + · · ·+msps, 0 ≤ mi < p, i = 0, 1, . . . , s e n = n0 + n1p 1 + · · ·+ nsps, 0 ≤ ni < p, i = 0, 1, . . . , s Dizemos que n e´ p-adicamente maior ou igual do que m , escrevendo, n≥pm, se, e somente se, ni ≥ mi, ∀ i = 0, 1, . . . , s. Da congrueˆncia fundamental (I-6, Problema 1.16) sabemos que( n m ) ≡ ( n0 m0 ) · · · ( ns ms ) mod p, e, portanto, ( n m ) 6= 0 mod p ⇔ n≥pm. Os operadores DmX foram introduzidos por H. Hasse em 1936, sendo fun- damentais no desenvolvimento da Geometria Alge´brica em caracter´ıstica po- sitiva. Estes operadores, nesta mesma de´cada, foram extensivamente usa- dos por F. K. Schmidt na sua teoria de pontos de Weierstrass para curvas alge´bricas definidas sobre corpos de caracter´ıstica positiva e por isto sa˜o usu- alemnte chamados de operadores diferenciais de Hasse-Schmidt. Fato curioso 56 CAPI´TULO 2. DERIVAC¸A˜O E MULTIPLICIDADE e´ que estes operadores tenham sido independentemente redescobertos entre 1948 e 1950 por J. Dieudonne´ que os chamou de semi-derivac¸o˜es. PROBLEMAS 2.3. 1. Sejam m,n ∈ Z+. Mostre que DmXXn 6= 0 ⇔ n≥pm. 2. Sejam f(X) ∈ K[X] com car(K) = p > 0 e m,n ∈ Z+. Mostre que se m≥pn e DnXf(X) = 0 enta˜o DmXf(X) = 0. 3. Seja car(K) = p e seja s ∈ Z+, determine Ker (Dp s X ) = {f(X) ∈ K[X] | Dp s X f(X) = 0}. 4. Seja f(X) ∈ K[T ] com car(K) = p > 0 e seja q uma poteˆncia de p. Mostre que DnXf(X q) = (D j Tf(T )(X q)), se n = jq 0, se n 6= 0 mod q onde (DjTf(T ))(X q) e´ o polinoˆmio que se obte´m substuindo T por Xq no polinoˆmio DjTf(T ). Cap´ıtulo 3 POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFUDecidir se um polinoˆmio e´ irredut´ıvel ou na˜o em Q[X] e´ bem mais com- plicado do que decidir se e´ ou na˜o irredut´ıvel em C[X] ou em R[X]. Mostra- remos ainda neste cap´ıtulo que existem polinoˆmios irredut´ıveis de todos os graus em Q[X]. Um primeiro passo no sentido de estudar a irredutibilidade de um polinoˆmio em Q[X] sera´ de tentar determinar as suas ra´ızes em Q. Como esta teoria se desenvolve naturalmente em situac¸a˜o mais geral, e´ neste contexto que nos colocamos. Em todo este cap´ıtulo D sera´ um D.F.U. e K o seu corpo de frac¸o˜es. 3.1 Ra´ızes em K de polinoˆmios em D[X ] TEOREMA 3.1. Sejam D um D.F.U. e K o seu corpo de frac¸o˜es. Sejam ainda p(X) = a0 + a1X + · · ·anXn ∈ D[X] e r, s ∈ D primos entre si com s 6= 0. Se r s e´ uma raiz de p(X), enta˜o r | a0 e s | an. Demonstrac¸a˜o: Sendo r s raiz de p(X), tem-se que a0 + a1 r s + · · ·+ an−1 r n−1 sn−1 + an rn sn = 0. Multiplicando ambos os membros desta igualdade por sn segue que sna0 + s n−1ra1 + · · · srn−1an−1 + rnan = 0. 57 58 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU Esta u´ltima igualdade pode ser reescrita nas duas formas seguintes: s(sn−1a0 + s n−2ra1 + · · ·+ rn−1an−1) = −rnan (3.1) e r(rn−1an + srn−2an−1 + · · ·+ sn−1a1) = −sna0 (3.2) Como r e s sa˜o primos entre si, o mesmo ocorre com r e sn e para sn e rn. Como de (5) e (6) temos que s | rnan e r | sna0, segue que s | an e r | a0 (veja I-4, Problema 3.2 (i)). COROLA´RIO 3.1. Se p(X) ∈ D[X] e´ moˆnico, enta˜o toda raiz de p(X) em K, encontra-se em D e divide a0 = p(0). Exemplo 1 : Determinaremos todas as ra´ızes racionais do polinoˆmio se- guinte: p(X) = 4X3 + 11X2 + 45X − 12 ∈ Z[X]. De acordo com o Teorema 1 toda raiz racional r s de p(X) com r, s ∈ Z[X] e primos entre si e´ tal que r | 12 e s | 4. Portanto as possibilidades sa˜o as seguintes: r = ±1, ±2, ±3, ±4, ±6, ±12 e supondo sem perda de generalidade s > 0, s = 1, 2, 4. Em princ´ıpio ter´ıamos 36 valores poss´ıveis para r s a serem testados. Eliminando as repetic¸o˜es, ficamos reduzidos a 20 possibilidades: r s ∈ { ±1, ±2, ±3, ±4, ±6, ±12, ±1 2 , ±3 2 , ±1 4 , ±3 4 } . Apo´s algumas tentativas, podendo ser numerosas, chega-se a` conclusa˜o que p(X) possui uma u´nica raiz racional que e´ 1 4 . O Exemplo acima nos sugere que pode ser muito trabalhoso determinar as ra´ızes racionais de um polinoˆmio. Existem va´rios crite´rios para excluir valores que na˜o sa˜o ra´ızes. O me´todo que descreveremos a seguir e´ particularmente simples e bas- tante eficiente. 3.1. RAI´ZES EM K DE POLINOˆMIOS EM D[X] 59 Seja p(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn ∈ D[X]. Pondo X = Yan obte´m-se, p ( Y an ) = a0 + a1 Y an + · · ·+ an Y nann = = 1 an−1n (a0a n−1 n + a1 · an−2n Y + · · ·+ Y n) = = 1 an−1n q(Y ). As ra´ızes em K (logo em D) do polinoˆmio moˆnico q(Y ) ∈ D[Y ], quando divididas por an nos fornecem as ra´ızes em K de p(X). Podemos enta˜o nos limitar aos polinoˆmios moˆnicos com coeficientes em D. Sejam q(Y ) ∈ D[X], α ∈ D uma raiz de q(Y ) e c ∈ D um elemento qualquer. Como q(Y ) = (Y − α) · t(Y ) com t(Y ) ∈ D[Y ], temos que q(c) = (c− α) · t(c), e portanto (c− α) | q(c). Esta observac¸a˜o nos fornece o seguinte me´todo de exclusa˜o: Para achar as ra´ızes em K de um polinoˆmio p(X) ∈ D[X], basta achar as ra´ızes em D do polinoˆmio moˆnico q(Y ) ∈ D[Y ] e divid´ı-las por an. Pelo corola´rio do Teorema 1, os candidatos a ra´ızes em K (e portanto em D) de q(Y ) sa˜o o divisores do coeficiente do seu termo independente a0a n−1 n . Escolhe-se um candidato c a raiz em D de q(Y ) e calcula-se q(c) usando o me´todo pra´tico de divisa˜o de q(Y ) por Y −c. Dois casos podem se apresentar: 1. Um sucesso, isto e´, q(c) = 0. Tem-se enta˜o uma raiz c de q(Y ) e a procura das outras ra´ızes de q(Y ) se reduz a` procura das ra´ızes do polinoˆmio moˆnico. 2. Um insucesso, isto e´, q(c) 6= 0. Deve-se excluir c dentre os candidatos a ra´ızes de q(Y ). Pela observac¸a˜o feita acima, devem ser exclu´ıdos dentre os candidatos a raiz em D os elementos α tais que c − α na˜o divide q(c). Isto transforma o fracasso em algo extremamente u´til. Daremos a seguir um exemplo da aplicac¸a˜o deste me´todo. Exemplo 2 : Seja p(X) = X4−X3−13X2+16X−48. Procuremos as ra´ızes racionais deste polinoˆmio. Como o polinoˆmio ja´ e´ moˆnico na˜o necessitamos efetuar nenhuma transformac¸a˜o nele. As ra´ızes racionais de p(X) devem ser procuradas entre os inteiros que dividem −48 que sa˜o: 60 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU ±1, ±2, ±4, ±8, ±16, ±3, ±6, ±12, ±24, ±48. Calculemos p(1) e p(−1): 1 −1 −13 16 −48 1 1 0 −13 3 −45 = p(1) −1 1 −2 −11 27 −75 = p(−1) ±1 devem ser exclu´ıdos pois na˜o sa˜o ra´ızes. Se α fosse raiz, dever´ıamos ter (1 − α) | p(1) e (−1 − α) | p(1). Isto nos permite excluir os seguintes valores: ±8, ±16, ±3, ±6, ±12, ±24, ±48. Resta somente testar os seguintes candidatos: ±2, ±4. Calculemos os valores p(2) e p(−2): 1 −1 −13 16 −48 2 1 2 −11 −6 −60 = p(2) −2 1 −3 −7 30 −108 = p(−2) ±2 devem ser exclu´ıdos pois na˜o sa˜o ra´ızes. Se α fosse raiz, dever´ıamos ter (2 − α) | p(2) e (−2 − α) | p(2). Isto na˜o nos permite excluir nenhum outro candidato. Resta enta˜o verificar se ±4 sa˜o ra´ızes de p(X). De fato, 1 −1 −13 16 −48 4 1 3 −1 12 0 −4 1 −1 3 0 Portanto 4 e −4 sa˜o ra´ızes de p(X). Temos que p(X) = (X − 4)(X + 4)(X2 −X + 3). Isto nos permite achar todas as ra´ızes de p(X) que sa˜o 4, −4, 1 2 + √ 11 2 i e 1 2 − √ 11 2 i. 3.1. RAI´ZES EM K DE POLINOˆMIOS EM D[X] 61 Exemplo 3 : Sejam an ∈ N tais que a na˜o e´ poteˆncia n-e´sima de um nu´mero natural. Vamos mostrar que n √ a na˜o e´ um nu´mero racional. De fato, pondo b = n √ a, temos que b e´ raiz do polinoˆmio Xn−a. Se b fosse raci- onal, pelo Corola´rio do Teorema 1, b seria inteiro e portanto a seria poteˆncia n-e´sima do nu´mero natural b, o que e´ uma contradic¸a˜o. Exemplo 4 : Seja p(X) = X5 + 4X4 + 2X3 − 13X2 − 19X − 5. Vamos determinar, se existirem, as ra´ızes em Z[i]. Pelo Teorema 1, tais ra´ızes sa˜o divisores de 5 em Z[i], que sa˜o ±1, ±(1 ± 2i) e ±(1 ± 2i). Dentre estes elementos basta verificar se sa˜o ra´ızes os nu´meros ±1, 1+2i, −1−2i, −2+ i e 2 − i pois os outros sa˜o conjugados destes (lembre-se que p(α) = 0 se, e somente se p(α¯) = 0). Testando estes valores, verifica-se que: p(±1) 6= 0, p(1 + 2i) 6= 0, p(−1− 2i) 6= 0, p(−2 + i) = 0 e p(2− i) = 0. Logo as ra´ızes de p(X) em Z[i] sa˜o −2 + i e −2− i. PROBLEMAS 3.1. 1. Ache as ra´ızes racionais dos seguintes polinoˆmios: a) X4 −X3 −X2 + 19X − 42 b) X3 − 9X2 + 22X − 24 c) 2X3 −X2 + 1 d) 10X3 + 19X2 − 30X + 9 e) 6X5 +X4 − 14X3 + 4X2 + 5X − 2 2. Determine se e´ redut´ıvel ou na˜o em Q[X] cada polinoˆmio abaixo: a) 2X2 − 3X + 1 b) X2 − 2 c) X2 +X + 1 d) 4X3 + 3X2 + 3X − 1 e) X3 + 5X2 + 4X + 1 f) X3 + 6X2 + 8X − 1 3. (a) Mostre que α = √ 2 + √ 3 e´ raiz do polinoˆmio X4 − 10X2 + 1 e prove que α e´ irracional. (b) Mostre que √ 5 + √ 7 e´ irracional. (c) Mostre que 3 √ 2−√3 e´ irracional. 4. (a) Mostre que cos20◦ satisfaz a equac¸a˜o 8X3 − 6X − 1 = 0. (Sugesta˜o: Veja I-9, Problema 3.5). 62 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU (b) Prove que cos20◦ e´ irracional. 5. Determine os inteiros t para os quais a equac¸a˜o X4 − 3X3 + tX2 − 4X + t− 1 = 0 tenha uma raiz racional. 6. (a) Seja p(X) ∈ Z[X], a, b ∈ Z e m ∈ N. Mostre que se a ≡ b mod m enta˜o p(a) ≡ p(b) mod m. (b) Seja {r1, r2, . . . , rm} um sistema completo de res´ıduos mo´dulo m. Mostre que, se p(X) tem uma raiz em Z, enta˜o pelo menos um dos seguintes nu´meros e´ divis´ıvel por m: p(r1), p(r2), . . . , p(rm). (c) Prove que se p(X) ∈ Z[X] e se p(0) e p(1) sa˜o ı´mpares, enta˜o p(X) na˜o tem ra´ızes inteiras. (d)Mostre que se p(X) ∈ Z[X] e se nenhum dos nu´meros inteiros p(−1), p(0) e p(1) e´ divis´ıvel por 3, enta˜o p(X) na˜o tem ra´ızes inteiras. 3.2 O Teorema de Gauss Seja D um domı´nio de fatorac¸a˜o u´nica e seja X uma indeterminada sobre D. Seja p(X) ∈ D[X]. Um conteu´do de p(X) e´ um ma´ximo divisor comum dos seus coeficientes. O polinoˆmio p(X) ∈ D[X] sera´ chamado primitivo se os seus coeficientes sa˜o primos entre si, ou seja, se ele possui um conteu´do invert´ıvel. LEMA 3.1. Seja D um D.F.U. e K o seu corpo de frac¸o˜es. Dado um polinoˆmio p(X) ∈ D[X], existem a ∈ K − {0} e q(X) ∈ D[X] primitivo, u´nicos, a menos de fatores invert´ıveis em D, tais que p(X) = aq(X). Demonstrac¸a˜o: Multiplicando p(X) por um elemento d ∈ D − {0} con- veniente, de modo a eliminar os denominadores dos seus coeficientes, temos que d · p(X) ∈ D[X]− {0}. Pondo em evideˆncia um ma´ximo divisor comum c dos coeficientes de c · p(X), obtemos p(X) = 1 d · d · p(X) = c d · q(X), 3.2. O TEOREMA DE GAUSS 63 com c d ∈ K − {0} e q(X) ∈ D[X] um polinoˆmio primitivo. Provaremos agora a unicidade. Suponha que c1 d1 q1(X) = c2 d2 q2(X) (3.3) onde c1, c2, d1, d2 ∈ D − {0} e q1(X), q2(X) ∈ D[X] sa˜o primitivos. Enta˜o temos que c1d2q1(X) = c2d1q2(X), e como q1(X) e q2(X) sa˜o primitivos, temos que c1 · d2 e´ um conteu´do de c1d2q1(X) e c2 · d1 e´ um conteu´do de c2d1q2(X). Como estes polinoˆmios sa˜o iguais, segue que c1 · d2 e c2 · d1 sa˜o associados em D, isto e´, existe u ∈ D invert´ıvel tal que c1d2 = uc2d1, ou seja c1 d1 = u c2 d2 (3.4) Substituindo (7) em (8) obtemos que q2(X) = uq1(X), o que termina a prova do Lema. Observe no Lema anterior que se p(X) ∈ D[X]−{0}, enta˜o a ∈ D−{0}. LEMA 3.2 (Gauss). Se f(X), g(X) ∈ D[X] sa˜o primitivos enta˜o f(X) · g(X) e´ primitivo. Demonstrac¸a˜o: Escrevamos f(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn e g(X) = b0 + b1X + · · ·+ bmXm. Suponha, por contradic¸a˜o, que f(X) · g(X) = c0 + c1X + c2X2 + · · ·+ cn+m−1Xn+m−1 + cn+mXn+m na˜o seja primitivo e seja d um divisor primo de c0, c1, c2, . . . , cn+m−1, cn+m. Como f(X) e g(X) sa˜o primitivos temos que A = {i ∈ N | 0 ≤ i ≤ n e d na˜o divide ai} 6= Φ e B = {j ∈ N | 0 ≤ j ≤ m e d na˜o divide bj} 6= Φ. Sejam r = min A, s = min B e cr+s = ar+sb0 + · · ·ar+1bs−1 + arbs + ar−1bs+1 + · · ·+ a0br+s. Como por definic¸a˜o de r e s temos que d | cr+s, segue da igualdade acima que d | arbs. Como d e´ primo, segue que d | ar ou d | bs, o que e´ uma contradic¸a˜o com a definic¸a˜o de r e s. 64 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU COROLA´RIO 3.2. Sejam f(X), g(X) ∈ D[X]. Enta˜o todo conteu´do de f(X)·g(X) e´ associado ao produto de um conteu´do de f(X) por um conteu´do de g(X). Demonstrac¸a˜o: Escrevamos f(X) = a1q1(X) e g(X) = a2q2(X), onde q1(X), q2(X) ∈ D[X] e a1, a2 ∈ D sa˜o os conteu´dos de f(X) e g(X) respecti- vamente. Temos enta˜o que f(X) · g(X) = a1a2q1(X)q2(X). Por outro lado, podemos escrever f(X)·g(X) = aq(X), onde a e´ um conteu´do de f(X)·g(X) e q(X) e´ primitivo e portanto, pelo Lema 1, temos que a e a1a2 sa˜o associados em D, o que prova o resultado. LEMA 3.3. Seja p(X) ∈ D[X] primitivo e seja K o corpo de frac¸o˜es de D. Enta˜o p(X) e´ redut´ıvel em D[X] se, e somente se, ele e´ redut´ıvel em K[X]. Demonstrac¸a˜o: Suponha que p(X) seja irredut´ıvel em D[X]. Se p(X) e´ redut´ıvel em K[X], temos que p(X) = p1(X) · p2(X), com p1(X), p2(X) ∈ K[X]− {K}. Pelo Lema 1, existem a1, a2 ∈ K e q1(X), q2(X) ∈ D[X] primitivos tais que p1(X) = a1q1(X) e p2(X) = a2q2(X). Portanto, p(X) = a1a2q1(X)q2(X) (3.5) onde a1, a2 ∈ K e q1(X) · q(X) e´ primitivo (Lema 2). Como p(X) e´ pri- mitivo, pelo Lema 1, temos que a1a2 e´ associado de 1 em D e portanto esta´ em D. Temos enta˜o de (9) que p(X) e´ redut´ıvel em D[X] o que e´ uma contradic¸a˜o. Reciprocamente, Suponha que p(X) seja irredut´ıvel em K[X]. Se p(X) e´ redut´ıvel em D[X], existiriam p1(X), p2(X) ∈ D[X] tais que p(X) = p1(X)p2(X) com p1(X), p2(X) na˜o invert´ıveis em D[X]. Temos que p1(X), p2(X) /∈ D[X], pois caso contra´rio, pelo menos um deles teria conteu´do na˜o invert´ıvel e portanto um conteu´do de p(X) seria na˜o invert´ıvel, o que contradiria o fato de p(X) ser primitivo. TEOREMA 3.2 (Gauss). Sejam D um D.F.U. e X uma indeterminada sobre D. Enta˜o D[X] e´ um D.F.U. Demonstrac¸a˜o: Seja p(X) ∈ D[X]{D}. Podemos escrever p(X) = a·q(X) com a ∈ D{0} e q(X) ∈ D[X] primitivo. Seja a = a1 · · ·ar uma decom- posic¸a˜o de a em fatores irredut´ıveis em D. Seja K o corpo de frac¸o˜es de 3.2. O TEOREMA DE GAUSS 65 D. Como K[X] e´ um D.F.U. (Corola´rio 2 do Teorema 2, Cap´ıtulo 1), pode- mos escrever q(X) = t1(X) · · · ts(X), onde t1(X), . . . , ts(X) sa˜o irredut´ıveis em K[X]. Pelo Lema 1, podemos escrever q(X) = b1 · · · bs · q1(X) · · · qs(X) onde b1, . . . , bs ∈ K − {0} e q1(X), . . . , qs(X) ∈ D[X] − D sa˜o primitivos (Lema 2), logo irredut´ıveis (Lema 3). Como q(X) ∈ D[X] e´ primitivo, e q1(X) · · · qs(X) e´ primitivo (Lema 2), enta˜o da igualdade acima e da unici- dade garantida pelo Lema 1, segue que b1, . . . , bs ∈ D∗. Temos enta˜o que p(X) = a1 · · ·ar · (b1 · · · bs) · q1(X) · · · qs(X) e´ uma decomposic¸a˜o de p(X) em fatores irredut´ıveis em D[X]. Vamos agora demonstrar a unicidade de tal fatorac¸a˜o. Suponha que a1 · · ·ar · q1(X) · · · qs(X) = c1 · · · cl · g1(X) · · · gm(X) onde os elementos de a1, . . . , ar, c1, . . . , cl de D sa˜o irredut´ıveis em D e os po- linoˆmios q1(X), . . . , qs(X), g1(X), . . . , gm(X) sa˜o irredut´ıveis em D[X] (por- tanto primitivos). Usando o Lema 1, temos que a1 · · ·ar e c1 · · · cl sa˜o asso- ciados, e como D e´ um D.F.U., temos que r = l e cada ai e´ associado a um cj e reciprocamente. Por outro lado, pela unicidade da fatorac¸a˜o em K[X], sabe-se que cada qµ(X) e´ associado em K[X] a um qλ(X) e reciprocamente. Como estes polinoˆmios sa˜o primitivos eles diferem por um elemento invert´ıvel de D. Da´ı segue a unicidade da fatorac¸a˜o em D[X]. COROLA´RIO 3.3. Z[X] e´ um D.F.U. COROLA´RIO 3.4. Se D e´ um D.F.U. e X1, . . .Xn sa˜o indeterminadas sobre D, enta˜o D[X1, . . .Xn] e´ um D.F.U. Demonstrac¸a˜o: Pelo Teorema, D[X1] e´ um D.F.U. , logo novamente pelo Teorema, D[X1, X2] = (D[X1])[X2] e´ um D.F.U. etc. COROLA´RIO 3.5. Se K e´ um corpo e X1, . . . , Xn sa˜o indeterminadas sobre K, enta˜o K[X1, . . . , Xn] e´ um D.F.U. PROBLEMAS 3.2. 1. Quais dos seguintes polinoˆmios em Z[X] sa˜o primitivos? 66 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU (a) 2 + 3X + p(X) onde p(X) ∈ Z[X], gr(p(X)) > 1. (b) (3 + 5X + 7X2 + 5X3)54. (c) 2 + 4X + 6X2 + 14X3. 2. Quais dos seguintes polinoˆmios de Z[X] sa˜o irredut´ıveis? a) 2 + 2X b) X3 +X2 +X + 1 c) X3 − 2 d) X4 + 6X2 + 9 3. SejaD umD.F.U. com corpo de frac¸o˜esK. Mostre que se p(X) ∈ D[X] tem uma raiz em K enta˜o p(X) e´ redut´ıvel em D[x]. 4. Determine um M.D.C. em Z[X] para cada par de polinoˆmios abaixo (a) 2X + 4 e 6X2 + 4X + 2 (b) 4X + 12 e 2X4 + 12X2 + 18 (c) 3X3 − 3 e 2X2 + 2X + 2 3.3 Me´todo de Kronecker para fatorac¸a˜o em Z[X ] Na sec¸a˜o anterior vimos que Z[X] e´ um D.F.U. Nada pore´m dissemos sobre fatorar um polinoˆmio p(X) em Z[X] nos seus fatores irredut´ıveis. Des- creveremos abaixo um me´todo devido a Kronecker para realizar esta tarefa. Tal me´todo apesar de conceitualmente simples, na pra´tica e´ muito trabalhoso e, portanto nada eficiente. Existe atualmente um algoritmo muito eficiente, mas na˜o totalmente determin´ıstico envolvendo uma parte probabil´ıstica. Seja um polinoˆmio com coeficientes inteiros. Para decompor p(X) em fatores ir- redut´ıveis basta supor p(X) primitivo e determinar um divisor seu de menor grau, em seguida aplica-se o me´todo ao polinoˆmio quociente de p(X) por tal divisor. a) Procura dos divisores do primeiro grau. Suponha que aX + b ∈ Z[X] seja um fator de p(X). Portanto existe q(X) ∈ Z[X]tal que p(X) = (aX + b)q(X) (3.6) 3.3. ME´TODO DE KRONECKER PARA FATORAC¸A˜O EM Z[X] 67 Seja α um nu´mero inteiro qualquer. Enta˜o p(α) = (aα + b) · q(α) (3.7) e portanto (aα + b) | p(α). O problema e´ determinar a e b de modo que (10) seja verificado. Portanto basta procurar a e b entre os inteiros para os quais aα + b divide p(α) para α arbitrariamente escolhido em Z. Pode-se enta˜o determinar poss´ıveis valores de a e b escolhendo dois inteiros α e β com α 6= β, tais que p(α) 6= 0 e p(β) 6= 0 e em seguida resolvendo todos os sistemas de equac¸o˜es { aα + b = d1 aβ + b = d2 variando d1 (respectivamente d2 ) dentre os divisores de p(α) (respective- mente de p(β)). Assim obtemos todos os poss´ıveis candidatos a divisores lineares aX + b de p(X). A escolha de α e β acima deve ser feita com certa astu´cia pois quanto menores forem os nu´meros dos divisores de p(α) e de p(β), menor sera´ o nu´mero de sistemas de equac¸o˜es que teremos que resolver. b) Procura dos divisores do segundo grau. Para determinar os divisores quadra´ticos aX2+ bX+ c de p(X) em Z[X], escolha treˆs inteiros α, β e γ, dois a dois distintos, e tais que nenhum deles seja raiz de p(X). Se aX2 + bX + c e´ um divisor de p(X) em Z[X], devemos ter, aα2 + bα + c = d1 aβ2 + bβ + c = d2 aγ2 + bγ + c = d3 onde d1 e´ um divisor de p(α), d2 e´ um divisor de p(β) e d3 e´ um divisor de p(γ). A resoluc¸a˜o deste nu´mero finito de sistemas de treˆs equac¸o˜es lineares nas treˆs inco´gnitas a, b e c, nos fornecem os poss´ıveis candidatos a divisores quadra´ticos aX2 + bX + c de p(X). Aqui tambe´m vale a recomendac¸a˜o da escolha astuciosa de α, β e γ. c) Para a determinac¸a˜o dos divisores de grau maior do que 2 procede-se de modo inteiramente ana´logo ao que foi feito nos casos a) e b). 68 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU Exemplo: Vamos fatorar o polinoˆmio p(X) = X4 + 2X3 + X2 − 1 pelo me´todo de Kronecker. A procura dos fatores lineares de p(X) se reduz a` procura das ra´ızes racionais de p(X). E´ fa´cil ver que este polinoˆmio na˜o admite ra´ızes racionais. Resta-nos agora determinar os fatores quadra´ticos de p(X). Tomemos α = 0, β = 1 e γ = −1, temos enta˜o os sistemas: a · 0 + b · 0 + c = d1 a + b + c = d2 a − b + c = d3 onde d1 = ± 1, d2 = ± 1, ±3 e d3 = ± 1. Isto nos fornece 16 sis- temas lineares de treˆs equac¸o˜es nas treˆs inco´gnitas a, b e c, cujas soluc¸o˜es apresentamos na seguinte tabela: d1 d2 d3 a b c 1 1 1 1 0 0 1 2 1 1 −1 −1 1 1 3 1 −1 1 −1 −1 1 4 1 −1 −1 −2 0 1 5 1 3 1 1 1 1 6 1 3 − 0 −2 1 7 1 −3 1 −2 −2 1 8 −1 1 1 0 −2 −1 10 −1 1 −1 1 1 −1 11 −1 −1 1 1 −1 −1 12 −1 −1 −1 0 0 −1 13 11 3 1 3 1 −1 14 −1 3 −1 2 2 −1 15 −1 −3 1 0 −2 −1 16 −1 −3 −1 −1 −1 −1 Como p(X) e´ moˆnico devemos ter a = ± 1, donde os valores das linhas 1, 4, 6, 7, 8, 9, 12, 13, 14 e 15 devem ser exclu´ıdos. Restam as possibilidades correspondentes a`s linhas 2, 3, 5, 10, 11 e 16. A menos de um sinal, a linha 2 fornece o mesmo resultado que a linha 11, a linha 3 fornece o mesmo resultado que a linha 10 e a linha 5 fornece o mesmo resultado que a linha 16. Temos enta˜o somente os treˆs seguintes casos a analisar: X2 +X + 1, X2 −X − 1 e X2 +X − 1 . 3.4. CRITE´RIOS DE DIVISIBILIDADE EM Q[X] 69 Experimentando estes treˆs polinoˆmios, achamos queX2+X+1, e X2+X−1 dividem p(X) e portanto p(X) = (X2 +X + 1)(X2 +X − 1). PROBLEMAS 3.3. 1. Decomponha em fatores irredut´ıveis em Z[X] os seguintes polinoˆmios: a) 2X5 + 3X4 + 3X3 − 2X2 − 1 b) X5 +X3 +X2 + 1. 3.4 Crite´rios de divisibilidade em Q[X ] TEOREMA 3.3 (Crite´rio de Einsenstein). Seja q(X) = a0 + a1X + · · ·+ anXn ∈ Z[X]. Suponha que para algum nu´mero inteiro primo p, se tenha • p | a0, p | a1, . . . , p | an−1, • p na˜o divide an • p2 na˜o divide a0. Enta˜o q(X) e´ irredut´ıvel em Q[X]. Demonstrac¸a˜o: Podemos supor sem perda de generalidade que q(X) seja primitivo. Suponha que exista um nu´mero primo p cumprindo as exigeˆncias das hipo´teses do Teorema. Suponha, por contradic¸a˜o, que q(X) seja redut´ıvel em Q[X]. Logo podemos supor que q(x) = q1(X) · q2(X), com q1(X) = b0 + b1X + · · ·+ brXr e q2(X) = c0 + c1X + · · ·+ csXs polinoˆmios primitivos (Lema 4, sec¸a˜o 3). Como a0 = b0 · c0 e p | a0 mas p2 na˜o divide a0, segue que p | b0 ou p | c0 e divide somente um dos dois. Suponhamos que p | b0 e p na˜o divide c0 (o 70 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU outro caso e´ ana´logo). Como p | a1, a1 = c1 · b0 + c0 · b1 e p | b0, segue que p | c0 · b1 mas p na˜o divide c0, logo p | b1. Como p | a2, a2 = c2 · b0 + c1 · b1 + c0 · b2, p | b0 e p | b1, segue que p | c0 · b2 mas p na˜o divide c0, logo p | b2. Assim sucessivamente, ate´ chegarmos a` conclusa˜o que p | bi para cada i = 0, . . . , r. Isto e´ uma contradic¸a˜o pois q1(X) e´ primitivo, logo q(X) e´ irredut´ıvel em Q[X]. Exemplo 1 : X4+4X2+8X−2 e´ irredut´ıvel em Q[X] pois 2 | (−2), 2 | 8, 2 | 4, 2 | 0 , 2 na˜o divide 1 e 4 = 22 na˜o divide (−2). Exemplo 2 : O polinoˆmio Xn − p, onde p e´ um nu´mero inteiro primo, e´ irredut´ıvel em Q[X] pois p | (−p), p na˜o divide 1 e p2 na˜o divide (−p). Este exemplo nos mostra que em Q[X] ha´ polinoˆmios irredut´ıveis de to- dos os graus. Algumas vezes o crite´rio de Einsenstein na˜o se aplica diretamente, por exemplo, se q(X) = X4 +X3 +X2 +X + 1 , na˜o exite nenhum primo p que satisfac¸a as hipo´teses do Teorema. No entanto, considere o polinoˆmio q(X+1) = (X+1)4+(X+1)3+(X+1)2+(X+1)+1 = X4+5X3+10X2+5X+5 Trata-se de um polinoˆmio irredut´ıvel. Para concluir que q(X) e´ irredut´ıvel nos baseamos na seguinte observac¸a˜o cuja demonstrac¸a˜o deixamos a cargo do leitor. Observac¸a˜o: Sejam q(X) ∈ Z[X] e a ∈ Z. Tem-se que q(X) e´ irredut´ıvel em Z[X] se, e somente se, q(X + a) e´ irredut´ıvel em Z[X]. Exemplo 3 : Se p e´ um nu´mero primo, enta˜o o polinoˆmio q(X) = Xp−1 +Xp−2 + · · ·+X + 1 e´ irredut´ıvel. 3.4. CRITE´RIOS DE DIVISIBILIDADE EM Q[X] 71 De fato, temos que q(X) = X p−1 X−1 , logo q(X + 1) = (X+1) p−1 X = Xp−1 + ( p 1 ) Xp−2 + · · ·+ ( p p− 2 ) X + ( p p− 1 ) . Sendo p primo, e´ fa´cil ver que p divide ( p i ) para todo i = 1, . . . , p−1 (Veja Cap 3 - Problema...). Logo o crite´rio de Einsenstein nos mostra que q(X+1) e´ irredut´ıvel e pela observac¸a˜o acima podemos concluir que q(X) e´ irredut´ıvel. Ale´m do crite´rio de Einsenstein temos um outro crite´rio de irredutibi- lidade para polinoˆmios em Z[X]. Este crite´rio faz uso das classes residuais mo´dulo um nu´mero primo p. Seja q(X) = a0+a1X+· · ·+anXn. Considere o polinoˆmio, q¯(X) = a¯0+ a¯1X+ · · ·+ a¯nXn ∈ Zp[X] onde a¯i e´ a classe residual mo´dulo p de ai, i = 0, . . . , n. Esta passagem de um polinoˆmio q(X) ∈ Z[X] ao polinoˆmio q¯(X) ∈ Zp[X] goza das seguintes propriedades fa´ceis de serem verificadas: a) Se q(X) = q1(X) + q2(X) enta˜o q¯(X) = q¯1(X) + q¯2(X). b) Se q(X) = q1(X) · q2(X) enta˜o q¯(X) = q¯1(X) · q¯2(X). TEOREMA 3.4. Sejam q(X) = a0+a1X+· · ·+anXn ∈ Z[X] e um nu´mero primo p que na˜o divide an. Se q¯(X) e´ irredut´ıvel em Zp[X], enta˜o q(X) e´ irredut´ıvel em Q[X]. Demonstrac¸a˜o: Podemos supor sem perda de generalidade que q(X) e´ um polinoˆmio primitivo. Suponha, por contradic¸a˜o, que q(X) seja redut´ıvel em Q[X], logo existem dois polinoˆmios q1(X) = b0 + b1X + · · · + brXr e q2(X) = c0 + c1X + · · · + csXs em Z[X] tais que q(X) = q1(X) · q2(X). Passando esta igualdade mo´dulo p obtemos q¯(X) = q¯1(X) · q¯2(X) e como an = br · cs e p na˜o divide an, segue que p na˜o divide br e p na˜o divide cs, consequ¨entemente b¯r 6= 0 e c¯s 6= 0 e portanto q¯(X) e´ redut´ıvel em Zp[X], o que contradiz a hipo´tese. Exemplo 4 : Seja q¯(X) = X4 + X3 + 3X2 + 18X + 2. Reduzindo q(X) mo´dulo 3 temos q¯(X) = X4 + X3 + 2¯. Observe que q¯[X] na˜o se anula em Z3[X] e portanto na˜o possui fatoreslineares em Z3[X]. Vamos verificar que q¯(X) tambe´m na˜o possui fatores quadra´ticos. 72 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU Suponha q¯(X) = (X2 + aX + b)(X2 + cX + d) com a, b, c, d ∈ Z3 . Enta˜o ter´ıamos: a + c = 1¯ b+ d+ a · c = 0¯ a · d+ b · c = 0¯ b · d = 2¯ Da primeira e da quarta equac¸o˜es acima, obter´ıamos os seguintes poss´ıveis valores para a, b, c, d que organizamos na tabela abaixo: b d a c 1¯ 1¯ 1¯ 0¯ 1¯ 1¯ 0¯ 1¯ 1¯ 1¯ 2¯ 2¯ 2¯ 2¯ 1¯ 0¯ 2¯ 2¯ 0¯ 1¯ 2¯ 2¯ 2¯ 2¯ Nenhum desses valores acima e´ compat´ıvel com as demais equac¸o˜es. Con- clu´ımos assim que q¯(X) e´ irredut´ıvel em Z3[X] e consequ¨entemente q(X) e´ irredut´ıvel em Q[X]. PROBLEMAS 3.4. 1. Mostre que os seguintes polinoˆmios sa˜o irredut´ıveis em Q[X] : a) X2 − 2X + 6 b) X4 − 2X3 + 6X2 + 8X − 14 c) Xn − 12, n ∈ N d) X3 + 9X2 + 3X + 9 2. Mostre que para todo n ∈ Z, os seguintes polinoˆmios sa˜o irredut´ıveis em Q[X]: a) X4 + 4n+ 1 b) X4 + 4nX + 1 3.5. A RESULTANTE 73 3. Sejam m,n ∈ N com m ≤ n. Mostre que o polinoˆmio Xn + (1 +X)m + (1−X)m e´ irredut´ıvel em Q[X]. 4. Seja p > 2 um nu´mero primo. Mostre que Xp + pX + 1 e´ irredut´ıvel em Q[X]. 5. Mostre que se p e´ um nu´mero primo, enta˜o o polinoˆmio 1 +X + X2 2! + · · ·+ X p p! e´ irredut´ıvel em Q[X]. 6. Seja q(X) = a0 + a1X + · · · + anXn ∈ Z[X]. Suponha que existe um primo p tal que • p | an, p | an−1, . . ., p | a1, • p na˜o divide a0 • p2 na˜o divide an. Mostre que q(X) e´ irredut´ıvel. Aplique este crite´rio para o polinoˆmio 2X4 + 6X3 − 4X + 1 . 7. Mostre que X3 + 2¯X + 1¯ e´ irredut´ıvel em Z3[X]. Conclua que todo polinoˆmio da formaX3+3αX2−X+3β+1, onde α, β ∈ Z, e´ irredut´ıvel em Z[X] e em Q[X]. 8. Mostre que X4 + X2 + 2¯ e´ irredut´ıvel em Z3[X]. Conclua que todo polinoˆmio da forma X4 + 3λX3 + X2 + 3µX − 1, com λ, µ ∈ Z, e´ irredut´ıvel em Z[X]. 3.5 A Resultante Nesta sec¸a˜o damos um crite´rio nume´rico para decidir quando dois po- linoˆmios teˆm, ou na˜o, fatores na˜o constantes em comum. Este crite´rio con- siste em transformar a questa˜o em um problema de sistemas lineares ho- mogeˆneos e reduzindo assim, em u´ltima ana´lise, a` questa˜o de anulamento, ou na˜o, de um certo determinante. 74 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU PROPOSIC¸A˜O 3.1. Sejam K um corpo e p(X), q(X) ∈ K[X] de graus n e m respectivamente. Sa˜o equivalentes: 1. p(X) e q(X) teˆm um fator na˜o constante em comum. 2. Existem polinoˆmios ϕ(X) e ψ(X) de graus n e m respectivamente tais que ψ(X) · p(X) = ϕ(X) · q(X). Demonstrac¸a˜o: Suponha que p(X) e q(X) tenham um fator na˜o cons- tante em comum h(X). Enta˜o existem ϕ(X) e ψ(X) em K[X] tais que p(X) = h(X) · ϕ(X) e q(X) = h(X) · ψ(X). Observe que, sendo h(X) na˜o constante, enta˜o gr(ϕ(X)) < gr(p(X)) = n e gr(ψ(X)) < gr(q(X)) = m e, ale´m disso, ψ(X) · p(X) = h(X) · ψ(X) · ϕ(X) = q(X) · ϕ(X). Reciprocamente, suponha que ψ(X) ·p(X) = ϕ(X) · q(X) para algum par de polinoˆmios ϕ(X) e ψ(X) em K[X] tal que gr(ϕ(X)) < gr(p(X)) = n e gr(ψ(X)) < gr(q(X)) = m. Seja h(X) =M. D. C.(q(X)), ψ(X). Temos que ψ1(X)·p(X) = ϕ(X)·q1(X), onde ψ1(X) = ψ(X) h(X) e q1(X) = q(X) h(X) . Como por hipo´tese, gr(ψ(X)) < gr(q(X)) e como h(X) divide ψ(X), segue que gr(h(X)) < gr(q(X)) e, consequ¨entemente gr(q1(X)) ≥ 1. Por outro lado, sendo M. D. C.(q1(X), ψ1(X)) = 1 da relac¸a˜o ψ1(X) · p(X) = ϕ(X) · q1(X), temos que q1(X) divide ψ1(X)·p(X), e da´ı segue que q1(X) divide p(X). Mas q1(X) divide q(X), logo p(X) e q(X) teˆm o fator comum na˜o constante q1(X). COROLA´RIO 3.6. Sejam p(X), q(X) ∈ K[X] de graus n e m respecti- vamente. Enta˜o estes polinoˆmios teˆm um fator comum na˜o constante se, e somente se, existem polinoˆmios ϕ(X) e ψ(X) de graus menores do que n e m respectivamente, tais que ψ(X) · p(X) + ϕ(X) · q(X) = 0. TEOREMA 3.5. Sejam p(X) = anX n+an−1Xn−1+· · ·+a0 e q(X) = bmXm+bm−1Xm−1+· · ·+b0 3.5. A RESULTANTE 75 com an 6= 0 e bm 6= 0. Enta˜o p(X) e q(X) teˆm um fator comum na˜o constante se, e somente se, e´ nulo o determinante seguinte: an an−1 · · · a2 a1 a0 0 0 · · · 0 0 0 an · · · a2 a1 a0 0 · · · 0 0 ... ... ... ... ... 0 0 · · · 0 an an−1 ... ... 0 0 . . . 0 0 an an−1 · · · · · · · · · a0 R = bn bm−1 · · · b2 b1 b0 0 0 · · · 0 0 bm · · · ... b2 b1 b0 0 · · · 0 ... ... ... ... ... 0 0 · · · bm bm−1 · · · b1 b0 0 0 0 · · · bm bm−1 · · · b1 b0 Demonstrac¸a˜o: Pelo corola´rio da proposic¸a˜o 1, p(X) e q(X) teˆm um fator na˜o constante em comum se, e somente se, existem ϕ(X) = u1 + u2X + · · ·+ unXn−1 e ψ(X) = v1 + v2X + · · ·+ vmXm−1, com pelo menos algum ui 6= 0 e algum vj 6= 0, tais que ψ(X) · p(X) + ϕ(X) · q(X) = 0 Igualando a zero os coeficientes do polinoˆmio do lado lado esquerdo da igualdade acima, obtemos o seguinte sistema: anvm +bmun = 0 an−1vm + anvm−1+ +bm−1un+ bmun−1 = 0 ... ... a0v1 +b0u1 = 0 A existeˆncia de ϕ(X) e ψ(X) na˜o nulos e´ equivalente ao fato de que o sistema das n +m equac¸o˜es lineares homogeˆneas acima nas n +m varia´veis vm, . . . , v1, un, . . . , u1 tem uma soluc¸a˜o na˜o trivial. Isto por sua vez e´ equiva- lente ao fato que o determinante da matriz associada ao sistema e´ nulo, logo 76 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU equivalente a R = 0 (a matriz acima e´ a transposta da matriz associada ao sistema e, portanto possui o mesmo determinante). DEFINIC¸A˜O 3.1. O determinante R que aparece no teorema 1 e´ chamado resultante dos polinoˆmios p(X) e q(X). A resultante de p(X) e p′(X) e´ chamada discriminante de p(X). COROLA´RIO 3.7. Seja K um corpo algebricamente fechado. Os po- linoˆmios p(X), q(X) ∈ K[X] teˆm raizes comuns em K se, e somente se, a resultante de p(X) e q(X) e´ nula. Demonstrac¸a˜o: p(X) e q(X) teˆm ra´ızes comuns em K se, e somente se, p(X) e q(X) teˆm um fator comum na˜o constante em K[X] se, e somente se, a resultante de p(X) e q(X) e´ nula. COROLA´RIO 3.8. Seja K um corpo algebricamente fechado. p(X) ∈ K[X] tem ra´ızes mu´ltiplas em K se , e somente se, o discriminante de p(X) e´ nulo. Demonstrac¸a˜o: p(X) tem ra´ızes mu´ltiplas se, esomente se, p(X) e p′(X) teˆm fator comum na˜o constante se, e somente se, o discriminante de p(X) e´ nulo. Exemplo 1 : Seja p(X) = aX2 + bX + c. Enta˜o p′(X) = 2aX + b e o discriminante de p(X) e´ a b c D = 2a b 0 = −a(b2 − 4ac) 0 2a b Note que D = −a∆, onde ∆ = b2 − 4ac, e portanto o discriminante na˜o e´ mais ∆ = b2 − 4ac. Exemplo 2 : Seja p(X) = X3+aX2+bX+c. Enta˜o p′(X) = 3X2+2aX+b e o discriminante de p(X) e´ 1 a b c 0 0 1 a b c D = 3 2a b 0 0 = − (18abc− 4a3c + a2b2 − 4b3 − 27c2) 0 3 2a b 0 0 0 3 2a b 3.5. A RESULTANTE 77 Exemplo 3 : Seja f(X) = X3 + pX + q. Enta˜o f ′(X) = 3X2 + p e o discriminante de f(X) e´ 1 0 p q 0 0 1 0 p q D = 3 0 p 0 0 = 108 ( q2 4 + p 3 27 ) 0 3 0 p 0 0 0 3 0 p Exemplo 4 : Os resultados que obtivemos sobre resultantes nos permitem tambe´m resolver certos problemas de geometria anal´ıtica como por exemplo, achar os pontos de intersecc¸a˜o de duas curvas alge´bricas planas. Suponha que se queira achar os pontos de intersecc¸a˜o das curvas X2+Y 2+4X−2Y +3 = 0 e X2−Y 2+4XY +10Y −9 = 0. Considerando X como paraˆmetro, as nossas equac¸o˜es, vistas como equac¸o˜es na indeterminada Y , se tornam: Y 2 − 2Y + (X2 + 4X + 3) = 0 e − Y 2 + (4X + 10)Y ++(X2 − 9) = 0. Para achar os pontos de intersecc¸a˜o das duas curvas, determinamos inicial- mente os valores deX, para os quais as equac¸o˜es acima tenham ra´ızes comuns como polinoˆmios em Y . Consideremos a resultante destes dois polinoˆmios: 1 −2 (X + 1)(X + 3) 0 R = 0 1 −2 (X + 1)(X + 3) = −1 4X + 10 (X + 3)(X − 3) 0 0 −1 4X + 10 (X + 3)(X − 3) 1 −2 (X + 1)(X + 3) 0 = 0 1 −2 (X + 1)(X + 3) = 0 4X + 8 (X + 3)(2X − 2) 0 0 −1 4X + 10(X + 3)(X − 3) = 2(X + 3)2(X − 1)(X − 3) + 8(X + 2)(2X + 5)(X + 1)(X + 3) + + 2(X + 32)(X + 1)(X − 1) + 8(X + 2)(X + 3)(X − 3) = = 4(X + 3)(5X3 + 25X2 + 31X + 11) = 4(X + 3)(X + 1)(5X2 + 20X + 11). 78 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU Os dois polinoˆmios tera˜o ra´ızes comuns se, e somente se R = 4(X + 3)(X + 1)(5X2 + 20X + 11) = 0 e isto ocorre se, e somente se, X e´ um dos seguintes valores: −3, −1, −2 + 3 √ 5 5 , −2− 3 √ 5 5 Para determinar os pontos de intersecc¸a˜o das curvas devemos resolver os seguintes quatro sistemas de equac¸o˜es: 1. Se X = −3, temos { Y 2 − 2Y = 0 −Y 2 − 2Y = 0 de onde temos que Y = 0, portanto (−3, 0) e´ um ponto de intersecc¸a˜o das duas curvas. 2. Se X = −1, temos { Y 2 − 2Y = 0 −Y 2 + 6Y − 8 = 0 de onde Y = 2, portanto (−1, 2) e´ um ponto de intersecc¸a˜o das curvas. 3. Se X = −2 + 3 √ 5 5 , temos Y 2 − 2 Y + 4 5 = 0 −Y 2 + ( 2 + 12 √ 5 5 ) Y − 16+12 √ 5 5 = 0 donde Y = 1+ √ 5 5 , portanto ( −2 + 3 √ 5 5 , 1 + √ 5 5 ) e´ ponto de intersecc¸a˜o. 4. Se X = −2− 3 √ 5 5 , temos Y 2 − 2 Y − 4 5 = 0 −Y 2 + ( 2− 12 √ 5 5 ) Y − −16+12 √ 5 5 = 0 donde Y = 1 − √ 5 5 , portanto ( −2− 3 √ 5 5 ,−1− √ 5 5 ) e´ ponto de inter- secc¸a˜o. 3.5. A RESULTANTE 79 PROBLEMAS 3.5. 1. Ache o discriminante de g(X) = aX4 + bX2 + c. 2. Ache a resultante de p1(X) = a1X 2 + b1X + c1 e p2(X) = a2X 2 + b2X + c2. 3. Ache o(s) valor(es) de t para o(s) qual(is) as equac¸o˜es tX2 + (−t− 1)X + 1 = 0 e X2 + (t2 − t)X − 1 = 0 tenham uma raiz comum. Ache a ra´ız comum em cada caso. 4. Ache o(s) valor(es) de t para o(s) qual(is) as equac¸o˜es X3 − t = 0 e X2 + tX + 1 = 0 tenham uma raiz comum. Ache a ra´ız comum em cada caso. 5. Encontre a(s) soluc¸a˜o(o˜es) comum(ns) das equac¸o˜es: (a) X(Y −X)2 − Y 5 = 0 e X4 + Y 3 −X2 = 0 (b) (X2 + Y 2)2 − (X2 − Y 2) e X2 + Y 2 −X + 4 = 0 80 CAPI´TULO 3. POLINOˆMIOS COM COEFICIENTES NUM DFU Cap´ıtulo 4 AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 Neste cap´ıtulo iniciaremos o estudo das equac¸o˜es alge´bricas propriamente ditas. A resoluc¸a˜o das equac¸o˜es do primeiro grau se confunde com a divisa˜o e era conhecida desde a antigu¨idade. Os babiloˆnios sabiam extrair algumas ra´ızes quadradas e, portanto sabiam resolver algumas equac¸o˜es particulares do segundo grau. A fo´rmula resolvente da equac¸a˜o do segundo grau ja´ era conhecida pelos matema´ticos hindus do se´culo 2. Passaram-se muitos se´culos ate´ que se conseguissem resolver as equac¸o˜es do terceiro e do quarto grau, o que foi realizado pelos matema´ticos de Bolonha - Ita´lia, no se´culo 16. O problema da resolubilidade das equac¸o˜es de grau maior ou igual a cinco se constituiu desde enta˜o num dos problemas centrais da Matema´tica ate´ ser totalmente elucidado pela Teoria de Galois na primeira metade do se´culo 19. Neste Cap´ıtulo discutiremos apenas a resolubilidade das equac¸o˜es de grau ate´ quatro, deixando o restante da discussa˜o para os pro´ximos cap´ıtulos. 4.1 A Equac¸a˜o do Segundo Grau Considere a equac¸a˜o aX2+ bX+ c = 0 com coeficientes em C e a 6= 0 . A fo´rmula que fornece as ra´ızes desta equac¸a˜o em func¸a˜o dos seus coeficientes 81 82 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 costuma ser deduzida completando quadrados como segue: aX2 + bX + c = a ( X2 + b a X ) + c = a ( X2 + 2 b 2a X + b 2 4a2 ) + c− b2 4a = a ( X + b 2a )2 + c− b2 4a Portanto, α e´ raiz da equac¸a˜o se, e somente se, a ( X + b 2a )2 + c− b 2 4a = 0, o que nos fornece por extrac¸a˜o de raiz quadrada α = −b±√b2 − 4ac 2a , onde √ b2 − 4ac e´ uma das ra´ızes quadradas do nu´mero complexo ∆ = b2−4ac, chamado discriminante da equac¸a˜o. Observe que este discrimi- nante difere do discriminante D do polinoˆmio aX2+bX+c como foi definido no Cap´ıtulo 3, sec¸a˜o 5. A relac¸a˜o existente entre D e ∆ e´ dada da seguinte forma: D = ∣∣∣∣∣∣ a b c 2a b 0 0 2a b ∣∣∣∣∣∣ = −a(b2 − 4ac) = −a∆ O anulamento de ∆ (ou o que e´ o mesmo de D) nos fornece portanto a condic¸a˜o necessa´ria e suficiente para que a equac¸a˜o do segundo grau tenha uma raiz dupla (igual a − b 2a ). Observe tambe´m que todo o desenvolvimento vale num corpo K algebri- camente fechado com carK 6= 2 no lugar de C Se os coeficientes a, b e c da equac¸a˜o aX2 + bX + c = 0 sa˜o reais, enta˜o pela fo´rmula resolvente temos o seguinte resultado: 1. ∆ > 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem duas ra´ızes reais distintas. 2. ∆ = 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem duas ra´ızes reais iguais. 4.2. A EQUAC¸A˜O DO TERCEIRO GRAU 83 3. ∆ < 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem duas ra´ızes complexas distintas conjugadas. PROBLEMAS 4.1. 1. Sejam x1 e x2 as ra´ızes da equac¸a˜o aX 2 + bX + c = 0. Mostre que x1 + x2 = − ba e x1 · x2 = ca 2. Forme as equac¸o˜es moˆnicas do segundo grau cujas ra´ızes sa˜o a) 1 e − 1 b) 2 e − 3 c) 5 e 7 3. Dada a equac¸a˜o aX2 + bX + c = 0, se x1 e x2 sa˜o as suas ra´ızes, sem resolveˆ-la calcule as expresso˜es: a) x21 + x 2 2, b) x 3 1 + x 3 2, c) (x1 − x2)2. 4. Sejam x1 e x2 as ra´ızes do polinoˆmio aX 2 + bX + c e seja D o seu discriminante. Mostre que D = −a3(x1 − x2)2. 5. Dada a equac¸a˜o aX2 + bX + c = 0, efetue nela a mudanc¸a de varia´vel x = y + d com d escolhido de modo que a nova equac¸a˜o na varia´vel y na˜o tenha termo do primeiro grau. Resolva esta equac¸a˜o e retorne a` equac¸a˜o original na varia´vel x e determine as suas soluc¸o˜es 4.2 A Equac¸a˜o do Terceiro Grau Nesta sec¸a˜o consideraremos a equac¸a˜o geral do terceiro grau com coefici- entes complexos, que sem perda de generalidade podemos supor que esteja na forma: X3 + a2X 2 + a1X + a0 = 0 (4.1) Por meio de uma mudanc¸a de varia´vel vamos coloca´-la numa forma onde na˜o figure o termo do segundo grau. Reduc¸a˜o: Substituindo X por Y + b na equac¸a˜o (12) temos 0 = (Y + b)3 + a2(Y + b) 2 + a1(Y + b) + a0 = Y 3 + (3b+ a2)Y 2 + (3b2 + 2ba2 + a1)Y + (b 3 + b2a2 + ba1 + a0). 84 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 Pondo b = −a2 3 , temos que X3 + a2X 2 + a1X + a0 = Y 3 + pY + q, onde X = Y − a2 3 , p = a1 − a2 2 3 e q = 2a2 3 27 − a1a2 3 + a0 (4.2) Portanto, para achar as ra´ızes da equac¸a˜o (12), basta achar as ra´ızes da equac¸a˜o Y 3 + pY + q = 0 e delas subtrair a2 3 . Exemplo 1 : Vamos eliminar o termo do segundo grau do polinoˆmio p(X) = X3 +X2 +X + 1. Fazendo a substituic¸a˜o X = Y − 1 3 , o polinoˆmio se transforma em Y 3 + 2 3 Y + 20 27 Resoluc¸a˜o: Vamos agora concentrar a nossa atenc¸a˜o na resoluc¸a˜o das equac¸o˜es do tipo Y 3 + pY + q = 0. (4.3) Fac¸amos em (14) a seguinte mudanc¸a de varia´veis: Y = U + V , onde U e V sa˜o duas varia´veis que relacionaremos entre si de acordo com a nossa convenieˆncia. Obtemos enta˜o 0 = (U + V )3 + p(U + V ) + q = (U3 + V 3 + q) + (U + V )(p+ 3UV ). (4.4) Segue enta˜o que cada soluc¸a˜o do sistema{ U3 + V 3 = −q U · V = −p 3 nos fornece uma soluc¸a˜o (u, v) de (15) e portanto uma soluc¸a˜o y = u+ v de (14). Elevando ao cubo a segunda equac¸a˜o de do sistema acima segue que u3 e v3 sa˜o soluc¸o˜es da seguinte equac¸a˜o do segundo grau: Z2 + qZ − p 3 27 = 0. (4.5) Fixando uma das ra´ızes quadradas de q 2 4 + p 3 27 e a denotando por √ q2 4 + p 3 27 , temos que as ra´ızes de (16) sa˜o z1 = −q 2 + √ q2 4 + p3 27 e z2 = −q 2 − √ q2 4 + p3 27 4.2. A EQUAC¸A˜O DO TERCEIRO GRAU 85 Podemos enta˜o escrever u3 = z1 e v 3 = z2. Escolhendo uma das ra´ızes cu´bicas de z1 e denotando-a por 3 √ z1, segue que as soluc¸o˜es de u3 = z1 sa˜o 3 √ z1, w · 3√z1, ew2 · 3√z1, onde w = −1+i √ 3 2 e´ uma raiz cu´bica da unidade. Denotando por 3 √ z2 a raiz cu´bica de z2 tal que tal que 3 √ z1 · 3√z2 = −p3 , (cf. a segunda equac¸a˜o do sistema acima), o referido sistema admite as seguintes soluc¸o˜es: u1 = 3 √ z1, v1 = 3 √ z2 u2 = w · 3√z1, v2 = w2 · 3√z2 u3 = w 2 · 3√z1, v3 = w · 3√z2 Segue enta˜o que a equac¸a˜o (14) possui as seguintes soluc¸o˜es: y1 = u1 + v1 = 3 √ − q 2 + √ q2 4 + p 3 27 + 3 √ − q 2 − √ q2 4 + p 3 27 , y2 = u2 + v2 = w · 3 √ − q 2 + √ q2 4 + p 3 27 + w2 · 3 √ − q 2 − √ q2 4 + p 3 27 e y3 = u3 + v3 = w 2 · 3 √ − q 2 + √ q2 4 + p 3 27 + w · 3 √ − q 2 − √ q2 4 + p 3 27 chamadas fo´rmulas de Cardan. As fo´rmulas resolventes da equac¸a˜o (12) podem ser obtidas pelas fo´rmulas de Cardan mediante as substituic¸o˜es em (13). Observe que o me´todo que utilizamos e´ va´lido em qualquer corpo algebricamente fechado K tal que carK 6= 2, 3. Exemplo 2 : Resolvamos a equac¸a˜o X3 − 3X + 1 = 0 . Esta equac¸a˜o ja´ e´ desprovida do seu termo do segundo grau, logo podemos usar diretamente 86 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 as fo´rmulas de Cardan. Temos enta˜o que x1 = 3 √ −1 2 + √ 3 2 i + 3 √ −1 2 − √ 3 2 i, x2 = w · 3 √ −1 2 + √ 3 2 i+ w2 · 3 √ −1 2 − √ 3 2 i e x3 = w 2 · 3 √ −1 2 + √ 3 2 i+ w · 3 √ −1 2 − √ 3 2 i. Note que 3 √ −1 2 + √ 3 2 i = 3 √ w pode ser escolhido como sendo cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 , portanto, 3 √ −1 2 − √ 3 2 i = 3 √ w¯ deve ser escolhido como sendo cos 2pi 9 − i sen 2pi 9 pois devemos ter 3 √ w · 3√w¯ = −p 3 = 1. Como w = cos 2pi 3 + i sin 2pi 3 , segue que x1 = ( cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) + ( cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) = 2 cos 2pi 3 , x2 = w · ( cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) + w · (cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) = 2 cos 8pi 9 , e x3 = w · ( cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) + w · (cos 2pi 9 + i sen 2pi 9 ) = 2 cos 4pi 9 . No exemplo acima temos que os coeficientes da equac¸a˜o e as ra´ızes sa˜o nu´meros reais. As fo´rmulas de Cardan nos expressam as ra´ızes sob forma alge´brica, pore´m envolvendo nu´meros complexos. Muitas tentativas foram feitas para exprimir as ra´ızes de tais equac¸o˜es em termos de radicais reais, todas fracassando. As equac¸o˜es do do terceiro grau com coeficientes racio- nais, irredut´ıveis em Q[X] e possuindo todas as ra´ızes reais, sa˜o chamadas de caso irredut´ıvel. Foi somente no se´culo 19 que tal miste´rio foi esclarecido, demonstrando-se atrave´s da Teoria de Galois que no caso irredut´ıvel e´ im- poss´ıvel exprimir as ra´ızes da equac¸a˜o em termos de radicais reais apenas. Voltaremos a este assunto no u´ltimo Cap´ıtulo. Exemplo 3 : Resolvamos a equac¸a˜o X3 + 3X − 4 = 0. Pelas fo´rmulas de 4.2. A EQUAC¸A˜O DO TERCEIRO GRAU 87 Cardan, esta equac¸a˜o possui as seguintes ra´ızes: x1 = 3 √ 2 + √ 5 + 3 √ 2−√5, x2 = −12 ( 3 √ 2 + √ 5 + 3 √ 2−√5 ) + i √ 3 2 ( 3 √ 2 + √ 5− 3 √ 2−√5 ) e x3 = −12 ( 3 √ 2 + √ 5 + 3 √ 2−√5 ) − i √ 3 2 ( 3 √ 2 + √ 5− 3 √ 2−√5 ) A equac¸a˜o tem portanto uma raiz real e duas ra´ızes complexas (conjugadas). Por inspec¸a˜o veˆ-se que 1 e´ raiz da equac¸a˜o, da´ı extra´ımos a seguinte igual- dade curiosa: 1 = 3 √ 2 + √ 5 + 3 √ 2−√5. Exemplo 4 : Resolvamos a equac¸a˜o X3 − 6X2 + 21X − 18 = 0. Para eliminar o termo do segundo grau, efetuuamos a substituic¸a˜o X = Y + 2 e obtemos a equac¸a˜o Y 3 + 9Y + 8 = 0, cujas ra´ızes sa˜o: y1 = 3 √ −4 +√43 + 3 √ −4−√43, y2 = w · 3 √ −4 +√43 + w2 · 3 √ −4−√43 e y3 = w 2 · 3 √ −4 +√43 + w · 3 √ −4−√43 Portanto, as ra´ızes da equac¸a˜o original sa˜o: x1 = y1 + 2, x2 = y2 + 2 e x3 = y3 + 2. Observac¸a˜o 1: O polinoˆmio X3 + a2X 2 + a1X + a0 tem discriminante D = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ 1 a2 a1 a0 0 0 1 a2 a1 a0 3 2a2 a1 0 0 0 3 2a2 a1 0 0 0 3 2a2 a1 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = −18a2a1a0 + 4a32a0 − a22 + 4a31 + 27a20. Este polinoˆmio desembarac¸ado do seu termo do segundo grau e´ Y 3+ pY + q, com X = Y − a2 3 , p = a1− a 2 2 3 e q = 2a32 27 − a1a2 3 +a0. O discriminante deste 88 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 u´ltimo polinoˆmio e´ D′ = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ 1 0 p q 0 0 1 0 p q 3 0 p 0 0 0 3 0 p 0 0 0 3 0 p ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = 108 · ( q2 4 + p3 27 ) . Uma verificac¸a˜o direta (leitor fac¸a-a) nos mostra que D = D′ PROPOSIC¸A˜O 4.1. Seja D o discriminante do polinoˆmio X3 + a2X 2 + a1X + a0, cujas ra´ızes sa˜o x1, x2 e x3. Tem-se a seguinte igualdade: D = − [(x3 − x1)(x3 − x2)(x2 − x1)]2 . Demonstrac¸a˜o: Seja Y 3+pY +q o polinoˆmio desembarac¸ado do seu termo do segundo grau. Sejam u1 = 3 √ −q 2 + √ q2 4 + p3 27 e v1 = 3 √ −q 2 − √ q2 4 + p3 27 Sabemos que x1 = u1+v1−a23 , x2 = w·u1+w2·v1−a23 e x3 = w2·u1+w·v1−a23 , logo (x2 − x1) = (w − 1)(u1 − w2 · v1) (x3 − x1) = (w2 − 1)(u1 − w · v1) (x3 − x2) = (w2 − w)(u1 − v1). Usando as igualdades: w − 1 = w2 − 1 = (w − 1)(w¯ − 1) = |w − 1|2 e w2 − w = w¯ − w = −√3 i, obtemos que (x3 − x2)(x3 − x1)(x2 − x1) = −3 √ 3 i (u1 − w2 · v1)(u1 − w · v1)(u1 − v1) = −3√3 i (u31 − v31) = −3√3 i · ( 2 · √ q2 4 + p 3 27 ) = −6√3 i · √ q2 4 + p 3 27 4.2. A EQUAC¸A˜O DO TERCEIRO GRAU 89 Elevando ao quadrado a igualdade acima, obtemos: (x3 − x2)(x3 − x1)(x2 − x1) = −108 ( q2 4 + p3 27 ) = −D. A igualdade agora segue da relac¸a˜o D′ = D, que obtivemos na Observac¸a˜o 1. O resultado da Proposic¸a˜o 1 se generaliza como segue. Se x1, x2, . . . , xn e D sa˜o respectivamente as ra´ızes e o discriminante do polinoˆmio anX n + · · ·+ a1X + a0, enta˜o vale a relac¸a˜o: D = (−1) 12n(n−1)a2n−1n · ∏ i<j (xj − xi)2. A demonstrac¸a˜o deste fato geral pode ser encontrada no Apeˆndice 2. O pro´ximo resultado nos fornecera´ a discussa˜o das ra´ızes de uma equac¸a˜o do terceiro grau com coeficientes reais. PROPOSIC¸A˜O 4.2. Dada a equac¸a˜o X3 + a2X 2 + a1X + a0 = 0, com a0, a1, a2 nu´meros reais, tem-se que: 1. D = 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem raiz mu´ltipla. Neste caso todas as ra´ızes sa˜o reais. 2. D > 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem pelo menos uma raiz na˜o real. Neste caso, uma raiz e´ real e duas sa˜o complexas conjugadas. 3. D < 0 se, e somente se, a equac¸a˜o tem as ra´ızes reais e distintas. Demonstrac¸a˜o: Pela Proposic¸a˜o 1 temos D = −(x3 − x2)2(x3 − x1)2(x2 − x1)2. (1) E´ claro que D = 0 se e somente se a equac¸a˜o tem pelo menos duas ra´ızes iguais. Neste caso, a equac¸a˜o na˜o pode ter ra´ız complexa na˜o real pois 90 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 caso contra´rio, deveria ter a conjugada com mesma multiplicidade. (2) Se D > 0, como −D e´ um quadrado, alguma das diferenc¸as (xj − xi) deve ser na˜o real. Logo pelo menos uma raiz e´ na˜o real. Neste caso, so´ poderemos ter duas ra´ızes complexas conjugadas e a outra real. Recipro- camente, se uma das ra´ızes e´ α ∈ C − R, enta˜o as outras ra´ızes sa˜o α¯ e β com β ∈ R. Tem-se que: D = −(α − α¯)2(α − β)2(α¯ − β)2. Como (α¯− β)2 e´ o conjugado de (α − β)2, tem-se que o produto (α− β)2(α¯ − β)2 e´ um nu´mero real positivo. Portanto o sinal de D e´ o mesmo sinal de −(α− α¯)2 = (2 i Im(α))2 = 4(Im(α))2 que e´ positivo. (3) Este caso decorre dos anteriores por exclusa˜o. A histo´ria da resoluc¸a˜o da equac¸a˜o do terceiro grau apresenta alguns lan- ces pitorescos. Conta-se que foi Scipio Del Ferro quem primeiro resolveu a equac¸a˜o do terceiro grau sem nuncapublicar o seu resultado, limitando-se apenas a contar o seu feito a alguns amigos. Em 1535, Tartaglia redescobriu a resoluc¸a˜o destas equac¸o˜es, mantendo o seu me´todo em segredo para com ele coroar um tratado de A´lgebra de sua autoria. Tartaglia revelou o seu segredo a Jeroˆnimo Cardan sob juramento de na˜o divulga´-lo. Cardan, na˜o honrando o seu compromisso, publicou em 1545 o livro Ars Magna contendo o me´todo de resoluc¸a˜o da equac¸a˜o do terceiro grau dando, entretanto o devido cre´dito ao seu autor. Por terem sido publicadas pela primeira vez por Cardan, estas fo´rmulas levam o seu nome. O livro de Cardan conte´m tambe´m a resoluc¸a˜o da equac¸a˜o do quarto grau devida ao seu disc´ıpulo Ludovico Ferrari e que sera´ o assunto da pro´xima sec¸a˜o. O me´todo que utilizamos para deduzir as fo´rmulas de Cardan e´ devido a Hudde e data de 1658. As fo´rmulas de Car- dan teˆm mais interesse teo´rico e histo´rico do que pra´tico. Para calcular boas aproximac¸o˜es de ra´ızes de equac¸o˜es alge´bricas dispo˜e-se de me´todos muito mais eficientes. 4.2. A EQUAC¸A˜O DO TERCEIRO GRAU 91 PROBLEMAS 4.2. 1. Usando as fo´rmulas de Cardan, resolva as seguintes equac¸o˜es: a) X3 + 9X − 6 = 0 b) X3 − 9X − 12 = 0 c) X3 − 3X + 2 = 0 d) X3 − 9X2 − 9X − 15 = 0 e) X3 − 5X + 2 = 0 f) X3 − 6X2 − 6X − 14 = 0 g) X3 + 12X − 30 = 0 h) X3 − 3X + i−3 2 = 0 2. Mostre que a) 3 √ 7 + √ 50 + 3 √ 7−√50 = 2 b) 3 √√ 108 + 10− 3 √√ 108− 10 = 2 c) 3 √√ 243 + √ 242− 3 √√ 243−√242 = 2√2 3. Discuta, sem resolver, as ra´ızes das seguintes equac¸o˜es: a) X3 − 1 = 0 b) 2X3 − 5X + 7 = 0 c) X3 − 10X + 1 = 0 d) 2X3 + 3X2 + 6X − 12 = 0 e) X3 − 3X + 2 = 0 f) X3 − 3X2 + 3 (1 + 3√2)X − 3 · 3√2 4. Em cada caso abaixo, construa e determine as outras ra´ızes de uma equac¸a˜o do 30 grau com coeficientes racionais tendo o nu´mero indicado como raiz. a) 3 √ 3− 3 √ 9 b) 3 √ 2 + √ 3 + 3 √ 2− √ 3 5. Mostre que a para´bola Y = X2 e a hipe´rbole XY + 8X + 4Y + 3 = 0 possuem somente um ponto de intersecc¸a˜o com ambas as coordenadas reais. 6. Seja f(X) = X3 + 3aX + 2 ∈ R[X]. (a) Determine os valores reais de a para os quais a func¸a˜o polinomial real y = f(X) tenha tres ra´ızes reais distintas. (b) Determine o valor real de a para o qual esta func¸a˜o tenha uma raiz mu´ltipla e encontre, neste caso, as suas ra´ızes. 92 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 (c) Determine os valores reais de a para os quais esta func¸a˜o tenha duas ra´ızes complexas (conjugadas). (d) Esboce o gra´fico em cada caso um dos casos (a), (b) e (c). 7. Considere o polioˆmio p(X) = X3 + a2X 2 + a1X + a0, com a2, a1, a0 nu´meros reais. Discuta o sinal de p(X) para valores reais de X segundo o sinal de D e da posic¸a˜o de X relativamente a`s ra´ızes reais. 8. Considere a igualdade a3X 3 + a2X 2 + a1X + a0 = a3(X − x1)(X − x2)(X − x3) onde x1, x2 e x3 sa˜o as ra´ızes do polinoˆmio do lado esquerdo da igual- dade. Usando o me´todo dos coeficientes a determinar, mostre que a) x1 + x2 + x3 = −a2a3 b) x1 · x2 + x1 · x3 + x2 · x3 = a1a3 c) x1 · x2 · x3 = −a0a3 9. Sejam y1, y2 e y3 as ra´ızes da equac¸a˜o Y 3 + pY + q = 0. Observando que a fo´rmulas de Cardan se expressam como y1 = u1 + v1, y2 = wu1 + w 2v1, e y3 = w 2u1 + wv1. Mostre que y1 + wy2 + w 2y3 = 3v1, y1 + wy3 + w 2y2 = 3u1. Conclua que valem as seguintes relac¸o˜es: (y1 + wy2 + w 2y3) · (y1 + wy3 + w2y2 = −3p (y1 + wy2 + w 2y3) 3 + (y1 + wy3 + w 2y2) 3 = −27q 10. Sejam x1, x2 e x3 as ra´ızes da equac¸a˜o X 3 + a2X 2 + a1X + a0 = 0. Mostre que valem as igualdades (x1 + wx2 + w 2x3) · (x1 + wx3 + w2x2 = −3a1 + a22 (x1 + wx2 + w 2x3) 3 + (x1 + wx3 + w 2x2) 3 = −2a32 + 9a1a2 − 27a0. (Sugesta˜o: Use o Problema 2.8 e as relac¸o˜es entre x1, x2, x3, a0, a1, a2 e y1, y2, y3, p, q). 4.3. A EQUAC¸A˜O DO QUARTO GRAU 93 4.3 A Equac¸a˜o do Quarto Grau Apresentamos nesta sec¸a˜o o me´todo de Ferrari para resoluc¸a˜o da equac¸a˜o do quarto grau. Considere a equac¸a˜o: X4 + a3X 3 + a2X 2 + a1X + a0 = 0 (4.6) Temos que X4 + a3X 3 = −(a2X2 + a1X + a0). Completanto o quadrado no primeiro membro desta equac¸a˜o e comparando com o segundo membro, temos ( X2 + 1 2 a3X )2 = ( 1 4 a23 − a2 ) X2 − a1X − a0 (4.7) Se o segundo membro desta equac¸a˜o fosse um quadrado perfeito, a resoluc¸a˜o da equac¸a˜o recairia na resoluc¸a˜o de duas equac¸o˜es do segundo grau. O nosso objetivo sera´ agora transformar o seguno membro de (18) em um quadrado perfeito, sem destruir o quadrado perfeito do primeiro membro. Somando a ambos os membros de (18) a expressa˜o Y 2+2Y ·(X2 + 1 2 a3X ) , obtemos,[( X2 + 1 2 a3X ) + Y ]2 = ( 2Y + 1 4 a23 − a2 ) X2 + (Y a3 − a1)X + (Y 2 − a0) (4.8) Vamos agora determinar os valores de Y que transformara˜o o segundo membro de (19) em um quadrado perfeito. Para que isto ocorra devemos ter o discriminante do segundo membro de (19), como trinoˆmio do segundo grau em X, nulo. ou seja, (Y a3 − a1)2 − 4 · ( 2Y + 1 4 a23 − a2 ) · (Y 2 − a0) = 0 Da´ı segue que, 8Y 3 − 4a2Y 2 + (2a1a3 − 8a0)Y + (4a0a2 − a0a23 − a21) = 0 (4.9) Escolhendo Y como sendo uma das ra´ızes da equac¸a˜o (4), a equac¸a˜o (3) nos fornece [( X2 + 1 2 a3X ) + Y ]2 = (αX + β)2 (4.10) 94 CAPI´TULO 4. AS EQUAC¸O˜ES DE GRAU ≤ 4 com α e β convenientes. Esta equac¸a˜o se resolve mediante a resoluc¸a˜o das duas equac¸o˜es do segundo grau:( X2 + 1 2 a3X ) + Y = (αX + β) e ( X2 + 1 2 a3X ) + Y = −(αX + β) Como a equac¸a˜o (17) e´ equivalente a` equac¸a˜o (21), temos que a resoluc¸a˜o de uma equac¸a˜o do quarto grau pode ser reduzida a` resoluc¸a˜o de equac¸o˜es do terceiro e do segundo graus. Exemplo: Resolvamos a equac¸a˜o X4 − 2X3 + 4X2 − 2X + 3 = 0. Determinemos Y satisfazendo a equac¸a˜o (20) que no nosso caso toma a forma: Y 3 − 2Y 2 − 2Y + 4 = 0. E´ fa´cil verificar que y = 2 e´ soluc¸a˜o desta equac¸a˜o. Para este valor de Y a equac¸a˜o (19) passa a ser (X2 −X + 2)2 = X2 − 2X + 1 = (X − 1)2. Obtemos assim as seguintes equac¸o˜es do segundo grau: X2 −X + 2 = X − 1 e X2 −X + 2 = −(X − 1), cujas ra´ızes sa˜o as ra´ızes da equac¸a˜o proposta. Assim, a nossa equac¸a˜o tem as ra´ızes 1 + √ 2 i , 1−√2 i , i e −i. PROBLEMAS 4.3. 1. Resolva as equac¸o˜es: a) X4 − 12X2 + 24X − 5 = 0 b) X4 − 24X2 + 60X + 11 = 0 c) X4 − 15X2 − 12X − 2 = 0 d) X4 − 9X2 − 6X + 4 = 0 e) X4 + 8X2 + 16X + 20 = 0 f) X4 + 2X2 − 4X + 8 = 0 Cap´ıtulo 5 O GRUPO SIME´TRICO Num trabalho publicado em 1771 ceˆrca de dois se´culos apo´s os traba- lhos dos algebristas bolonheses que estudamos no Cap´ıtulo 4, Joseph Louis Lagrange (ou Giuseppe Luigi Lagrangia como reivindicam os italianos), apro- fundou o estudo das relac¸o˜es entre coeficientes e as ra´ızes de um polinoˆmio, mediante a introduc¸a˜o dos grupos sime´tricos e de suas propriedades. Este estudo conduziu-o a achar um me´todo unificado para atacar a resoluc¸a˜o das equac¸o˜es alge´bricas de qualquer grau. O me´todo funcionou maravilhosa- mente no caso das equac¸o˜es do terceiro e quarto graus, como veremos no pro´ximo cap´ıtulo, mas apresentou dificuldades na tentativa de resolver a equac¸a˜o do quinto grau. Apesar de Lagrange na˜o ter conseguido resolver os problemas da Teoria das Equac¸o˜es Alge´bricas, os seus trabalhos criaram instrumentos para que P. Ruffini e N. H. Abel, numa se´rie de trabalhos realizados entre 1799 e 1824, demonstrassem a impossibilidade de resolver a equac¸a˜o geral do quinto grau. Posteriormente, Evariste Galois, retornando a`s ide´ias de Lagrange, escreveu uma das mais belas e importantes pa´ginas da Matema´tica, a Teoria de Galois. 5.1 Relac¸o˜es Entre Coeficientes e Ra´ızes O nosso objetivo nesta sec¸a˜o e´ determinar asrelac¸o˜es existentes entre os coeficientes e as ra´ızes das equac¸o˜es alge´bricas. 95 96 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO Seja K um corpo e X1, X2, . . . , Xn indeterminadas sobre K. Considere o polinoˆmio: (X +X1)(X +X2) · · · (X +Xn) ∈ K[X,X1, X2, . . . , Xn]. Queremos escrever este polinoˆmio como elemento de K[X1, . . . , Xn][X]. Para este efeito, introduziremos os seguintes polinoˆmios de K[X1, . . . , Xn] : s1(X1, . . . , Xn) = ∑ i Xi = X1 + · · ·+Xn s2(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2 Xi1Xi2 = X1X2 +X1X3 + · · ·+Xn−1Xn s3(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2<i3 Xi1Xi2Xi3 = X1X2X3 +X1X2X4 + · · ·+Xn−2Xn−1Xn ... sn−1(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2<···<in−1 Xi1Xi2 · · ·Xin−1 = X1X2 · · ·Xn−1 + · · ·+X2X3 + · · ·+Xn sn(X1, . . . , Xn) = X1X2 · · ·Xn Pede-se ao leitor verificar as seguintes relac¸o˜es, va´lidas para todo n, s1(X1, . . . , Xn) = s1(X1, . . . , Xn−1) +Xn s2(X1, . . . , Xn) = s2(X1, . . . , Xn−1) +Xns1(X1, . . . , Xn−1) s3(X1, . . . , Xn) = s3(X1, . . . , Xn−1) +Xns2(X1, . . . , Xn−1) ... sn−1(X1, . . . , Xn) = sn−1(X1, . . . , Xn−1) +Xnsn−2(X1, . . . , Xn−1) sn(X1, . . . , Xn) = Xnsn−1(X1, . . . , Xn−1) LEMA 5.1. Temos a seguinte relac¸a˜o: (X −X1)(X −X2) · · · (X −Xn) = = Xn − s1(X1, . . . , Xn)Xn−1 + · · ·+ (−1)n−1sn−1(X1, . . . , Xn)X+ +(−1)nsn(X1, . . . , Xn). 5.1. RELAC¸O˜ES ENTRE COEFICIENTES E RAI´ZES 97 Demonstrac¸a˜o: A demonstrac¸a˜o sera´ feita por induc¸a˜o sobre n ≥ 2. Para n = 1, o resultado e´ o´bvio. Vamos supor que a fo´rmula vale para n e provar que vale para n + 1. Multiplicando por (X − Xn+1) ambos os lados da igualdade no enunciado do Lema, obte´m-se: (X −X1)(X −X2) · · · (X −Xn)(X −Xn+1) = = [Xn − s1(X1, . . . , Xn)Xn−1 + · · ·+ (−1)nsn(X1, . . . , Xn)](X −Xn+1) = = Xn+1 − [s1(X1, . . . , Xn) +Xn+1]Xn+ +[s2(X1, . . . , Xn)X n−1 +Xn+1s1(X1, . . . , Xn)]Xn−1 + · · ·+ +(−1)n[sn(X1, . . . , Xn) +Xn+1sn−1(X1, . . . , Xn)]X+ +(−1)n+1Xn+1sn(X1, . . . , Xn) = = Xn+1 − s1(X1, . . . , Xn)Xn + · · ·+ (−1)nsn(X1, . . . , Xn)X+ +(−1)n+1sn+1(X1, . . . , Xn). PROPOSIC¸A˜O 5.1. Se x1, x2, . . . xn sa˜o as ra´ızes de a0 + a1X + · · · + anX n = 0, enta˜o s1(x1, . . . , xn) = −an−1an s2(x1, . . . , xn) = −an−2an ... si(x1, . . . , xn) = (−1)i an−ian ... sn(x1, . . . , xn) = (−1)n a0an Demonstrac¸a˜o: Sendo x1, . . . , xn as ra´ızes da equac¸a˜o a0 + a1X + · · ·+ anXn = 0, temos pelo Lema 1 que a0 + a1X + · · ·+ anXn = an(X − x1) · · · (X − xn) = = an[Xn − s1(x1, . . . , xn)Xn−1 + · · ·+ (−1)n−1sn−1(x1, . . . , xn)X+ +(−1)nsn(x1, . . . , xn). Igualando os coeficientes dos termos de mesmo grau, obte´m-se o resultado. As igualdades na Proposic¸a˜o acima sa˜o chamadas relac¸o˜es entre coefici- entes e ra´ızes da equac¸a˜o dada. Estas relac¸o˜es nos da˜o um sistema de n equac¸o˜es (na˜o lineares) nas n inco´gnitas x1, x2, . . . , xn. E´ natural pensar em resolver o sistema para obter as ra´ızes x1, x2, . . . , xn. Vejamos num exemplo 98 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO o que sucede. Exemplo 1 : Considere a equac¸a˜o X3 +X + 1 = 0, a` qual esta´ associado o sistema: x1 + x2 + x3 = 0 x1x2 + x1x3 + x2x3 = 1 x1x2x3 = −1 Para resolver este sistema procederemos por eliminac¸a˜o. Multiplicando a segunda equac¸a˜o por x3, obtemos x1x2x3 + x1x3 2 + x2x3 2 = x3. Usando a terceira equac¸a˜o segue que −1 + (x1 + x2)x32 = x3. Usando a primeira equac¸a˜o obte´m-se −1 + (−x3)x32 = x3. Portanto para achar x3 devemos resolver a equac¸a˜o x3 2 + x3 + 1 = 0 que e´ precisamente a equac¸a˜o proposta originalmente. Este exemplo nos mostra que na˜o sera´ este o me´todo que nos conduzira´ a` resoluc¸a˜o das equac¸o˜es. Entretanto, se tivermos alguma informac¸a˜o adi- cional sobre as ra´ızes e´ poss´ıvel chegar a`s soluc¸o˜es. Vejamos alguns exemplos. Exemplo 2 : Resolva a equac¸a˜o X3 −X2 − 2X + 2 = 0 sabendo-se que o produto de duas de suas ra´ızes e´ igual a −2. Sejam x1, x2 e x3 as ra´ızes da equac¸a˜o. Acrescentando a condic¸a˜o acima a`s relac¸o˜es entre coeficientes e ra´ızes, obtemos o sistema: x1 + x2 + x3 = 1 x1x2 + x1x3 + x2x3 = −2 x1x2x3 = −2 x1x2 = −2 Da terceira e da quarta equc¸o˜es segue que x3 = 1. Da primeira temos que x1 + x2 = 0 que juntamente com a quarta nos fornece x1 = ± √ 2. Como x2 = −x1, as ra´ızes da equac¸a˜o sa˜o 1, √ 2 e −√2. Exemplo 3 : Resolvamos a equac¸a˜o X3 − 3X2 + X + 1 = 0, sabendo-se que as suas ra´ızes esta˜o em progressa˜o aritme´tica. 5.1. RELAC¸O˜ES ENTRE COEFICIENTES E RAI´ZES 99 Sejam x1 = a− r, x2 = a, e x3 = a+ r as ra´ızes da equac¸a˜o. Temos que, 3 = x1 + x2 + x3 = 3a 1 = x1x2 + x1x3 + x2x3 = 3a 2 − r2 −1 = x1x2x3 = a(a2 − r2) Da primeira dessas equac¸o˜es segue que a = 1. Da segunda temos enta˜o que 3− r2 = 1, logo r2 = 2 e portanto r = ±√2. Tem-se enta˜o que as ra´ızes da equac¸a˜o sa˜o 1−√2, 1 e 1 +√2. Exemplo 4 : Determinaremos a soma dos quadrados das ra´ızes da equac¸a˜o 3X5 − 3X4 + 2X3 +X − 1 = 0 sem resolveˆ-la. Se x1, x2, x3, x4 e x5 sa˜o as suas ra´ızes, temos que x1 2 + x2 2 + x3 2 + x4 2 + x5 2 = = (x1 + x2 + x3 + x4 + x5) 2 − 2(x1x2 + · · ·+ x4x5) = 12 − 2 · (2 3 ) = 1− 4 3 = −1 3 Exemplo 5 : Determinaremos a soma dos inversos das ra´ızes da equac¸a˜o 2X4 − 6X3 + 5X2 − 7X + 1 = 0 sem resolveˆ-la. Se x1, x2, x3 e x4 sa˜o as ra´ızes da equac¸a˜o, temos que 1 x1 + 1 x2 + 1 x3 + 1 x4 = x2x3x4 + x1x3x4 + x1x2x4 + x1x2x3 x1x2x3x4 = 7 2 1 2 = 7 A Proposic¸a˜o 1 e os exemplos 4 e 5 acima nos mostram que certas func¸o˜es das ra´ızes, por exemplo, a soma das ra´ızes, a soma dos produtos dois a dois das ra´ızes, a soma dos produtos tres a tres das ra´ızes etc., a soma dos qua- drados das ra´ızes e a soma dos inversos das ra´ızes podem ser calculadas em func¸a˜o dos coeficientes da equac¸a˜o sem resolveˆ-la. Na sec¸a˜o 4 estudaremos uma classe de func¸o˜es, as func¸o˜es sime´tricas das ra´ızes, que podem ser calculadas em func¸a˜o dos coeficientes sem resolver a equac¸a˜o. Como o conceito de func¸a˜o sime´trica esta´ intimamente ligado a` noc¸a˜o de grupos de permutac¸o˜es, dedicaremos as pro´ximas duas sec¸o˜es a este assunto. 100 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO PROBLEMAS 5.1. 1. Resolva as seguintes equac¸o˜es, dadas as condic¸o˜es adicionais: (a) X3 + 2X2 + 3X + 2 = 0 sabendo-se que x1 + x2 = x3. (b) 3X3 + 2X2 − 19X + 6 = 0 sabendo-se que x1 + x2 = −1. (c) X3 − 7X2 − 42X + 216 = 0 sabendo-se que x32 = x1x2. (d) X3 + 9X2 + 6X − 56 = 0 sabendo-se que x2 = −2x1. (e) 9X3 − 36X2 + 44X − 16 = 0 sabendo-se que as suas ra´ızes esta˜o em progressa˜o aritme´tica. (f) 3X3 − 26X2 + 52X − 24 = 0 sabendo-se que as suas ra´ızes esta˜o em progressa˜o geome´trica. (g) X4 − 2X3 + 2X2 −X − 2 = 0 sabendo-se que x1 + x2 = 1. 2. Sabendo-se que as ra´ızes da equac¸a˜o X3 − 2X2 + aX + 46 = 0 esta˜o em progressa˜o aritme´tica, determine o valor de a e resolva a equac¸a˜o. 3. Sabendo-se que as ra´ızes da equac¸a˜o 2X4−15X 3+aX2−30X+8 = 0 esta˜o em progressa˜o geome´trica, determine o valor de a e resolva a equac¸a˜o. 4. Qual a relac¸a˜o que deve existir entre p, q e r para que as ra´ızes da equac¸a˜o X3 + pX2 + qX + r = 0 (a) estejam em progressa˜o aritme´tica? (b) estejam em progressa˜o geome´trica? 5. Dada a equac¸a˜o 2X5 − 3X4 −X3 + 7X2 − 9X + 8 = 0 , ache (a) a soma dos quadrados de sua ra´ızes (b) a soma dos cubos de suas ra´ızes (c) a soma dos inversos de suas ra´ızes (d) a soma dos quadrados dos inversos de suas ra´ızes. 6. Ache o valor dem para que a soma dos quadrados das ra´ızes da equac¸a˜o 3X5 −mX3 + 2X2 +X − 1 = 0 seja igual a 1. 5.2. GRUPOS 101 7. Sabendo-se que as ra´ızes de 3X3 + 4X2 + 8X + 24 = 0 sa˜o nu´meros complexos de igual mo´dulo, resolva a equac¸a˜o. 8. A equac¸a˜o X5 + 4X4 + 2X3 − 13X2 − 19X − 5 = 0 tem uma ra´ız da forma a+ bicom a e b inteiros, determine a e b. 5.2 Grupos Iniciaremos nesta sec¸a˜o o estudo das propriedades gerais dos grupos. Neste Cap´ıtulo apresentaremos apenas os aspectos mais elementares da teo- ria geral e estudaremos com mais detalhes o chamado grupo sime´trico ou de permutac¸o˜es. Este in´ıcio da teoria e´ essencialmente devido a Lagrange e a Cauchy. Voltaremos ao assunto no Cap´ıtulo 9 para maior aprofundamento. 5.2.1 A noc¸a˜o de grupo Seja C um conjunto na˜o vazio. Define-se SC = {σ : C → C | σ e´ uma bijec¸a˜o} . Um elemento de SC e´ tambe´m chamado de permutac¸a˜o de C. Em SC te- mos a operac¸a˜o de composic¸a˜o de func¸o˜es, que sabidamente tem as seguintes propriedades: 1. E´ associativa 2. Possui elemento neutro, 3. Cada bijec¸a˜o possui um inverso para a composic¸a˜o, que e´ a bijec¸a˜o inversa. Isto motiva a seguinte definic¸a˜o abstrata. DEFINIC¸A˜O 5.1. Um conjunto G munido de uma operac¸a˜o ∗ e´ chamado um grupo se satisfaz as seguintes propriedades: i) Associatividade: a ∗ (b ∗ c) = (a ∗ b) ∗ c ∀ a, b, c ∈ G; ii) Existeˆncia de elemento neutro: ∃ e ∈ G, tal que e ∗ a = a ∗ e = a, ∀ a ∈ G; iii) Existeˆncia de inverso: ∀ a ∈ G, ∃ b ∈ G tal que a ∗ b = b ∗ a = e. 102 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO Exemplos : Sa˜o grupos os seguintes conjuntos com as operac¸o˜es corres- pondentes: 1. (SC , ◦), as permutac¸o˜es de C 6= Φ com a operac¸a˜o de composic¸a˜o de func¸o˜es; 2. ( Z, +), ( Q, +), ( R, +), ( C, +) sa˜o grupos; 3. ( Zn, +), para todo n ∈ N; 4. (A[X], +), onde A e´ um anel; 5. (A∗, ·) o conjunto dos elementos invert´ıveis de um anel com a operac¸a˜o de multiplicac¸a˜o do anel. PROPOSIC¸A˜O 5.2. Num grupo G sa˜o u´nicos o elemento neutro e o ele- mento inverso de um elemento dado. Demonstrac¸a˜o: Se e e e′ sa˜o elementos neutros em G, temos e′ = e′∗e = e. Se a ∈ G e b, b′ sa˜o inversos de a, temos que a ∗ b = a ∗ b′ (= e), logo b ∗ (a ∗ b) = b ∗ (a ∗ b′) e portanto pela associatividade, (b ∗ a) ∗ b = (b ∗ a) ∗ b′. Segue enta˜o que e ∗ b = e ∗ b′, donde b = b′. O u´nico elemento inverso de a sera´ denotado por a−1, se a operac¸a˜o de G for representada multiplicativamente e, por −a, se for representada aditivamente. Neste u´ltimo caso, o elemento neutro e´ representado por 0. E´ fa´cil verificar que a) (a−1)−1 = a ou − (−a) = a; b) (a · b)−1 = b−1 · a−1 ou − (a+ b) = −b+ (−a). Quando C = {1, 2, . . . , n}, o conjunto SC e´ denotado simplesmente porSn e e´ chamado de grupo sime´trico de grau n. Sabemos que Sn tem n! elementos (cf. I-3, Proposic¸a˜o 1). Como toda func¸a˜o e´ determinada quando se conhece a imagem de cada elemento do domı´nio, podemos representar um elemento σ ∈ Sn como σ = ( 1 2 · · · n σ(1) σ(2) · · · σ(n) ) , 5.2. GRUPOS 103 onde σ(1), σ(2), . . . , σ(n) sa˜o os elementos (1, 2, . . . , n) numa determinada ordem, isto e´ uma permutac¸a˜o destes elementos. Exemplo 6 : σ = ( 1 2 3 4 3 2 1 4 ) e´ a bijec¸a˜o 1 7→ 3, 2 7→ 2, 3 7→ 1, 4 7→ 4. O elemento neutro de Sn e´ portanto e = ( 1 2 · · · n 1 2 · · · n ) e a com- posic¸a˜o nesta notac¸a˜o se efetua do seguinte modo: σ ◦ τ = ( 1 2 · · · n σ(1) σ(2) · · · σ(n) ) ◦ ( 1 2 · · · n τ(1) τ(1) · · · τ(n) ) = ( 1 2 · · · n σ(τ(1)) σ(τ(2)) · · · σ(τ(n)) ) Ale´m disso, σ−1 = ( 1 2 · · · n σ(1) σ(2) · · · σ(n) )−1 = ( σ(1) σ(2) · · · σ(n) 1 2 · · · n ) , onde a u´ltima expressa˜o deve ser rearrumada de modo que a primeira linha se transforme em 1, 2, . . . n. Exemplo 7 :( 1 2 3 4 3 2 4 1 ) · ( 1 2 3 4 2 4 3 1 ) = ( 1 2 3 4 2 1 4 3 ) . A maneira de proceder nesta composic¸a˜o e´ da direita para a esquerda: 1 7→ 2, 2 7→ 2, logo 1 7→ 2 2 7→ 4, 4 7→ 1, logo 2 7→ 1 3 7→ 3, 3 7→ 4, logo 3 7→ 4 4 7→ 1, 1 7→ 3, logo 4 7→ 3 Exemplo 8 :( 1 2 3 4 5 3 4 2 5 1 )−1 = ( 3 4 2 5 1 1 2 3 4 5 ) = ( 1 2 3 4 5 5 3 1 2 4 ) . O pro´ximo exemplo e´ muito importante. 104 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO Exemplo 9 : Determinaremos neste exemplo a tabela da multiplicac¸a˜o em S3. Sejam σ1 = ( 1 2 3 1 2 3 ) = e, σ2 = ( 1 2 3 3 1 2 ) , σ3 = ( 1 2 3 2 3 1 ) , τ1 = ( 1 2 3 1 3 2 ) , τ2 = ( 1 2 3 2 1 3 ) e τ3 = ( 1 2 3 3 2 1 ) . Temos que ◦ σ1 σ2 σ3 τ1 τ2 τ3 σ1 σ1 σ2 σ3 τ1 τ2 τ3 σ2 σ2 σ3 σ1 τ2 τ3 τ1 σ3 σ3 σ1 σ2 τ3 τ1 τ2 τ1 τ1 τ3 τ2 σ1 σ3 σ2 τ2 τ2 τ1 τ3 σ2 σ1 σ3 τ3 τ3 τ2 τ1 σ3 σ2 σ1 onde x ◦ y se encontra na linha do x e na coluna do y. Por exemplo, σ2 ◦ τ3 = τ1. Pede-se ao leitor verificar, a t´ıtulo de exerc´ıcio, a tabela acima. Note que em S3 temos que σ2◦τ1 6= τ1◦σ2, isto e´ σ2 e τ1 na˜o comutam. Os grupos nos quais dois elementos quaisquer comutam sa˜o chamados abelianos. Sa˜o abelianos os grupos dos Exemplos 2, 3, 4 e 5. Com relac¸a˜o ao exemplo 1, temos o seguinte resultado. PROPOSIC¸A˜O 5.3. Para todo n ≥ 3, Sn na˜o e´ abeliano. Demonstrac¸a˜o: Sejam σ e τ definidas por σ(1) = 2, σ(2) = 1 e σ(x) = x se x ≥ 3; e τ(1) = 1, τ(2) = 3, τ(3) = 2 e τ(x) = x se x ≥ 4. Temos enta˜o que (σ ◦ τ)(1) = 2 e (τ ◦ σ)(1) = 3, logo σ ◦ τ 6= τ ◦ σ. 5.2. GRUPOS 105 5.2.2 Subgrupos Um subconjunto H de um grupo G e´ chamado subgrupo de G se H com a operac¸a˜o de G for um grupo. Para verificar que um subconjunto H de G e´ um subgrupo de G, basta verificar que i) A operac¸a˜o de G e´ fechada em H, isto e´, a ∗ b ∈ H, ∀ a, b ∈ H. ii) O elemento neutro e de G pertence a H. iii) O inverso de todo elemento de H pertence a H, isto e´, se a ∈ H enta˜o a−1 ∈ H. Na˜o e´ necessa´rio verificar a associatividade da operac¸a˜o em H ja´ que a operac¸a˜o e´ associativa em G. Exemplo 11 : (Z, +) e´ um subgrupo de (Q, +) que e´ subgrupo de (R, +) que por sua vez e´ subgrupo de (C, +). Damos a seguir um crite´rio u´til para verificar se H ⊆ G e´ um subgrupo. PROPOSIC¸A˜O 5.4. Um subconjunto na˜o vazio H de um grupo G e´ um subgrupo de G se, e somente se, para todos a, b ∈ H tem-se que a ∗ b−1 ∈ H. Demonstrac¸a˜o: A implicac¸a˜o direta e´ o´bvia pois sendo a, b ∈ H e H um subgrupo de G, temos que b−1 ∈ H e, portanto a∗b−1 ∈ H . Reciprocamente, sendo H 6= Φ, tome c ∈ H , logo por hipo´tese, e = c ∗ c−1 ∈ H . Seja a ∈ H , como e ∈ H , temos que a−1 = e ∗ a−1 ∈ H . Resta apenas provar o fecha- mento da operac¸a˜o de G em H . Sejam a, b ∈ H , logo pelo que provamos acima b−1 ∈ H e, portanto, pela hipo´tese, a ∗ b = a ∗ (b−1)−1 ∈ H . A ordem de um grupo finito G e´ o nu´mero de elementos de G. Denota- remos a ordem de G por |G|. Queremos comparar a ordem de um subgrupo H com a ordem de G. Uma relac¸a˜o trivial, que decorre da inclusa˜o H ⊆ G, e´ a seguinte: |H| ≤ |G|. Entretanto, por ser H um subgrupo de G, Lagrange provou que existe uma relac¸a˜o bem mais forte do que a acima. Para isto, e´ necessa´rio introduzir um novo conceito. Sejam a ∈ G e H um subgrupo de G. Definem-se aH = {a ∗ h | h ∈ H} e Ha = {h ∗ a | h ∈ H}. 106 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO O conjunto aH e´ chamado classe lateral a` esquerda de a relativamente a H , enquanto que Ha e´ chamado classe lateral a` direita. Em particular, eH = He = H . Na notac¸a˜o aditiva, escreve-se a+H em vez de aH . Se G = Z e H = mZ, a classe lateral de a ∈ Z segundo H e´ dada por a+mZ = {a+mx | x ∈ Z}. PROPOSIC¸A˜O 5.5 (Lagrange). Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e a, b ∈ G. (i) se, e somente se, b−1 ∗ a ∈ H. (ii) Se aH ∩ bH 6= Φ enta˜o aH = bH. (iii) ⋃ x∈G xH = G. (iv) Existe uma bijec¸a˜o entre aH e bH. Demonstrac¸a˜o: (i) Suponha que aH = bH . Como a = a ∗ e ∈ aH , segue que a ∈ bH , logo a = b ∗ h para algum h ∈ H e portanto b−1 ∗ a = h ∈ H . Reciprocamente, suponha que b−1 ∗ a ∈ H , logo a−1 ∗ b = (b−1 ∗ a)−1 ∈ H . Seja c ∈ aH , logo c = a ∗ h com h ∈ H , segue que c = b ∗ b−1 ∗ a ∗ h com h ∈ H , logo c = b∗h com h = b−1 ∗a∗h ∈ H , da´ı vem que c ∈bH , provando assim que aH ⊆ bH . A inclusa˜o bH ⊆ aH e´ semelhante usando a relac¸a˜o a−1 ∗ b ∈ H . (ii) Se aH ∩ bH 6= Φ enta˜o existe c ∈ aH ∩ bH , assim podemos escrever c = a ∗h = b ∗h′, onde h, h′ ∈ H . Portanto b−1 ∗ a = h′ ∗h−1 ∈ H . Pelo ı´tem (i) segue que aH = bH . (iii) E´ claro que ⋃ x∈G xH ⊆ G. Por outro lado, se a ∈ G temos que a ∈ aH ⊆ ⋃x∈G xH e portanto G ⊆ ⋃x∈G xH , provando assim a igualdade. (iv) Basta provar que para todo a ∈ G, existe uma bijec¸a˜o entre eH = H e aH . Considera a func¸a˜o f : H −→ aH h 7−→ a ∗ h que e´ sobrejetiva pois dado y ∈ aH enta˜o y tem a forma y = a∗h com h ∈ H e portanto f(h) = y. Ela e´ injetiva pois se f(h1) = f(h2) enta˜o a∗h1 = a∗h2 5.2. GRUPOS 107 e portanto h1 = h2 (Veja Problema 1 (b)). Na Proposic¸a˜o 5 acima poder-se-ia trabalhar com as classes laterais a` di- reita em vez das classes laterais a` esquerda. TEOREMA 5.1 (Lagrange). Sejam G um grupo finito e H um subgrupo de G. Enta˜o a ordem de H divide a ordem de G. Demonstrac¸a˜o: Da Porposic¸a˜o 5 e do fato de G ser finito, tem-se que G e´ unia˜o de um nu´mero finito de classes laterais disjuntas e cada uma tem o mesmo nu´mero de elementos de H , logo |G| = l|H|, onde l e´ o nu´mero de classes laterais. Portanto |H| divide |G|. Definic¸a˜o: O nu´mero de classes laterais, indiferentemente a` direita ou a` esquerda, e´ chamado de ı´ndice de H em G e e´ denotado por [G : H ]. Temos enta˜o a fo´rmula |G| = [G : H ] · |H|. Exemplo 12 : a+mZ = b+mZ se, e somente se, a−b ∈ mZ se, e somente se, a ≡ b mod m. Assim existem exatamente m classes laterais de mZ em Z que sa˜o 0 +mZ, 1 +mZ, . . . , (m− 1) +mZ. Num grupo G temos a noc¸a˜o de potenciac¸a˜o, ou seja, se a ∈ G e n ∈ Z, define-se na notac¸a˜o multiplicativa an = a · a · · ·a, (n fatores), se n > 0 e, se n = 0 a−1 · a−1 · · ·a−1 (|n| fatores), se n < 0 Na notac¸a˜o aditiva escrevemos na = a+ a + · · ·+ a, (n parcelas), se n > 0 0, se n = 0 (−a) + (−a) + · · ·+ (−a) (|n| parcelas), se n < 0 Temos as seguintes propriedades, para todos a, b ∈ G e todos m,n ∈ Z. 1) an · am = am+n 1′) na +ma = (n +m)a 2) (an)m = an·m 2′) m(na) = (mn)a 3) se a · b = b · a enta˜o (a · b)n = an · bn 3′) n(a+ b) = na +mb. 108 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO O pro´ximo resultado nos mostrara´ que e´ mais fa´cil verificar se um subcon- junto finito de um grupo e´ ou na˜o um subgrupo. PROPOSIC¸A˜O 5.6. Seja G um grupo e H um subconjunto finito de G. Se H e´ fechado em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de G, enta˜o H e´ um subgrupo de G. Demonstrac¸a˜o: Basta mostrar que o elemento neutro e de G esta´ em H e que o inverso de um elemento de H esta´ em H . Seja a ∈ H , enta˜o a2, a3, . . . ,∈ H pois H e´ fechado em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de G. Como H e´ finito, existem dois nu´meros naturais distintos n e m tais que an = am. Suponha, sem perda de generalidade, que n > m, multiplicando por a−m ambos os membros da igualdade acima, obtemos que e = an−m ∈ H . Ob- serve que se n −m = 1, temos que a = e e o seu inverso e´ ele pro´prio, logo esta´ em H. Se n−m > 1, enta˜o a−1 = an−m−1 ∈ H e o resultado esta´ provado. Exemplo 13 : Vamos determinar todos os subgrupos de S3. Pela Pro- posic¸a˜o 6 para verificar que um subconjunto de S3 e´ um subgrupo, basta mostrar que e´ fechado em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de S3. Pelo Teorema de La- grange, Para que H ⊆ S3 seja um subgrupo e´ necessa´rio que |H| divida 6. Portanto temos quatro casos a considerar: 1. |H| = 1. Neste caso temos uma u´nica possibilidade que e´ H = {e}. 2. |H| = 2. As possibilidades sa˜o os conjuntos da forma {e, σi} e {e, τi}, i = 1, 2, 3. Dentre estes, somente os conjuntos {e, τ1 } , {e, τ2} e {e, τ3} sa˜o fechados em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de S3. 3. |H| = 3. Ha´ somente as seguintes possibilidades: H = {e, τi, a}, i = 1, 2, 3, a 6= e, a 6= τi ou H = {e, σ2, σ3}. A primeira possibilidade deve ser exclu´ıda pois, caso contra´rio ter´ıamos que {e, τi} seria um subgrupo de H e pelo Teorema de Lagrange, 2 teria que dividir 3 o que e´ um absurdo. Resta a possibilidade H = {e, σ2, σ3}, que e´ um subconjunto fechado em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de S3. 4. |H| = 6. Neste caso H = S3. Assim, os subgrupos de S3 sa˜o {e}, {e, τ1 } , {e, τ2} e {e, τ3}, {e, σ2, σ3} e S3. 5.2. GRUPOS 109 Exemplo 14 : Vamos determinar todos os subgrupos de Z. Se H e´ um subgrupo de Z, enta˜o (i) H 6= Φ (ii) a+ b ∈ H, ∀ a, b ∈ H (iii) na ∈ H, ∀ n ∈ Z, ∀ a ∈ H. Portanto todo subgrupo de Z e´ um ideal de Z e consequentemente da forma H = I(d) = {nd | n ∈ Z} para algum d ∈ Z (cf. I-4, Teorema 1). A determinac¸a˜o dos subgrupos de um grupo e´ algo bastante complexo e esta´ longe de ter sido resolvida em geral. Voltaremos no Cap´ıtulo 9 a` questa˜o da existeˆncia de certos subgrupos de um grupo finito. 5.2.3 Grupos C´ıclicos Sejam G um grupo e a ∈ G. Vamos definir na notac¸a˜o multiplicativa 〈a〉 = {an | n ∈ Z} ou na notac¸a˜o aditiva 〈a〉 = {na | n ∈ Z} E´ claro que 〈a〉 e´ um subgrupo de G pois e´ fechado em relac¸a˜o a` operac¸a˜o de G, e = a0 ∈ 〈a〉 (ou 0 = 0 · a ∈ 〈a〉 ) e cada an ∈ 〈a〉 ou ( na ∈ 〈a〉 ) tem um inverso a−n ∈ 〈a〉 (ou (−n)a ∈ 〈a〉 ). Este subgrupo sera´ chamado de subgrupo gerado por a. Para simplificar os enunciados, vamos usar apenas a notac¸a˜o multiplica- tiva, deixando para o leitor o exerc´ıcio de formular os resultados na notac¸a˜o aditiva. TEOREMA 5.2. (i) 〈a〉 e´ finito se, e somente se, existe m ∈ Z tal que am = e (ii) Em tal caso, definindo o(a) = min{n ∈ N | an = e}, temos que 〈a〉 = {e, a, . . . , ao(a)−1}, com ai 6= aj se, i 6= j, i, j = 0, . . . , o(a)− 1. 110 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO Demonstrac¸a˜o: (i) Suponha que 〈a〉 seja finito, logo na lista de elementos a, a2, a3, . . . devem ocorrer repetic¸o˜es e portanto existem r, s ∈ N com r < s tais que ar = as e portanto pondo m = s− r, temos que am = e. Reciproca- mente, se existe m tal que am = e, vamos provar que 〈a〉 = {e, a, . . . , am−1}. De fato, a inclusa˜o {e, a, . . . , am−1} ⊆ 〈a〉 e´ o´bvia. Por outro lado, Seja b ∈ 〈a〉, logo b = as para algum s ∈ Z. Pelo algor´ıtmo da divisa˜o de inteiros temos que s = mq + r, com 0 ≤ r < m. Temos portanto que as = amq+r = (am)q·ar = e·ar = ar e consequentemente as ∈ {e, a, . . . , am−1}, provando assim a inclusa˜o 〈a〉 ⊆ {e, a, . . . , am−1}. (ii) Por definic¸a˜o de o()a tem-se que ao(a) = e e portanto a mesma de- monstrac¸a˜o feita acima nos mostra que 〈a〉 = {e, a, . . . , ao(a)−1}. So´ nos resta provar que ai 6= aj se i 6= j com i, j = 0, 1, . . . , o(a)− 1. De fato se ai = aj com j > i, enta˜o aj−i = e com 0 < j − i < o(a), o que e´ uma contradic¸a˜o em vista da minimalidade de o(a). Se 〈a〉 e´ finito, o inteiro o(a) acima definido e´ chamado a ordem de a, e diremos que a tem ordem finita. Caso contra´rio, isto e´, se 〈a〉 e´ infinito, diremos que a tem ordem infinita. PROPOSIC¸A˜O 5.7. Sejam G um grupo e a ∈ G. Enta˜o am = e se, e somente se, o(a) | m. Demonstrac¸a˜o: Considere o conjunto I = {m ∈ Z | am = e} ⊆ Z. E´ fa´cil verificar que I e´ um ideal de Z, portanto por I-4, Teorema 1, e pela definic¸a˜o de o(a), temos que I = I(o(a)), de onde segue o resultado. COROLA´RIO 5.1. Seja G um grupo finito e seja a ∈ G, enta˜o a|G| = e. Demonstrac¸a˜o: Pelo Teorema de Lagrange temos que | 〈a〉 | = o(a) divide |G| e, portanto pela Proposic¸a˜o 7 temos que a|G| = e. COROLA´RIO 5.2 (Pequeno Teorema de Fermat). Seja p ∈ Z um nu´mero primo positivo. Enta˜o para todo a ∈ Z pZ = Zp, tem-se que a p−1 ≡ 1 mod p. 5.2. GRUPOS 111 Demonstrac¸a˜o: Considere o grupo (Zp ∗, ·) que tem p− 1 elementos, logo para todo a ∈ Z, temos que (a¯)p−1 = 1¯, onde a¯ e´ a classe residual mo´dulo p de a, de onde segue o resultado. COROLA´RIO 5.3 (Teorema de Euler). Seja Φ a func¸a˜o de Euler e seja n um inteiro natural. Enta˜o para todo a ∈ Z com (a, n) = 1, tem-se que aΦ(n) ≡ 1 mod n. Demonstrac¸a˜o:Considere o grupo (Zn ∗, ·) que tem Φ(n) elementos. Agora o resultado segue usando a mesma argumentac¸a˜o usada no Corola´rio 2. Definic¸a˜o: Um grupo G e´ chamado grupo c´ıclico se existir a ∈ G tal que G = 〈a〉. Exemplo 15 : Todo grupo c´ıclico e´ abeliano. De fato, se G = 〈a〉 enta˜o dois elementos quaisquer de G podem ser escritos sob a forma ai e aj com i, j ∈ Z. Logo ai ∗ aj = ai+j = aj+i = aj ∗ ai. Exemplo 16 : Z e´ c´ıclico pois Z = 〈1〉. Os grupos Zn sa˜o c´ıclicos pois Zn = 〈1〉. Outros exemplos de grupos c´ıclicos sa˜o os (Un, ·), onde Un e´ o conjunto das ra´ızes n-e´simas da unidade em C e a operac¸a˜o e´ o produto de nu´meros complexos. Um gerador de Un e´ uma raiz n-e´sima primitiva da unidade. Exemplo 17 : Todo grupo de ordem prima e´ c´ıclico. De fato, se G e´ um grupo de ordem prima p, escolha a ∈ G − {e}. Temos que o(a) 6= 1 e pelo Teorema de Lagrange temos que o(a) | p e portanto o(a) = p. Segue enta˜o que | 〈a〉 | = |G| e portanto G = 〈a〉. PROPOSIC¸A˜O 5.8. Seja G um grupo e seja a um elemento de ordem finita de G. Se r ∈ Z, enta˜o o(ar) = o(a) (o(a),r) . Demonstrac¸a˜o: Temos que o(ar) e´ o menor inteiro positivo n tal que (ar)n = e, ou seja, pela Proposic¸a˜o 7, tal que o(a) | rn. Portanto rn e´ o me- nor mu´ltiplo comum de o(a) e de r, ou seja rn = [o(a), r]. Por I-4, Problema 3.10, temos que [o(a), r] = o(a)·r (o(a),r) . Juntando estas duas igualdades temos o resultado. 112 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO LEMA 5.2. Sejam G = 〈a〉 um grupo c´ıclico de ordem n e, s um inteiro positivo. Enta˜o 〈as〉 = 〈a(n,s)〉. Em particular, 〈as〉 = 〈a〉 se, e somente se, (n, s) = 1. Demonstrac¸a˜o: E´ fa´cil verificar que 〈as〉 ⊆ 〈a(n,s)〉. Por outro lado, como (n, s) = λs+ µn para inteiros convenientes λ e µ, temos que a(n,s) = aλs+µn = (as)λ(an)µ ∈ 〈as〉 , consequentemente 〈 a(n,s) 〉 ⊆ 〈as〉 o que prova o resultado. PROPOSIC¸A˜O 5.9. Seja G um grupo c´ıclico de ordem n gerado por a. Se H e´ um subgrupo de G de ordem m enta˜o H tambe´m e´ c´ıclico e e´ gerado por a( n m). Demonstrac¸a˜o: Seja I(oH(a)) = {n ∈ Z | an ∈ H}. Claramente I(oH(a)) e´ um ideal de Z que conte´m I(o(a)). Seja r um gerador de I(oH(a)). E´ fa´cil verificar que H = 〈ar〉. Ale´m disso, pela Proposic¸a˜o 8, m = |H| = o(ar) = o(a) (o(a), r) = n (n, r) . Assim, (n, r) = n m . Pelo Lema 1, H = 〈ar〉 = 〈a(n,r)〉 = 〈a( nm)〉 . Exemplo 18 : (Determinac¸a˜o dos subgrupos de um grupo c´ıclico) Seja G um grupo c´ıclico finito de ordem n gerado por a. Seja H um subgrupo de G de ordem m. Pelo Teorema de Lagrange, m e´ um divisor de n. Pela Pro- posic¸a˜o 9, H e´ gerado por a( n m). Isto mostra que H e´ o u´nico subgrupo de G de ordem m. Por outro lado, se m e´ um divisor de n, digamos, n = mr, enta˜o H = 〈ar〉 e´ um subgrupo de G de ordem m. Isto nos fornece uma descric¸a˜o completa dos subgrupos de G, a saber, os subgrupos de G sa˜o da forma 〈 ad 〉 onde d e´ um divisor de n. 5.2. GRUPOS 113 PROBLEMAS 5.2. 1. Mostre que se a, b e c sa˜o elementos de um grupo G, valem as seguintes relac¸o˜es: (a) Cancelamento a` direita: a ∗ c = b ∗ c ⇒ a = b. (b) Cancelamento a´ esquerda: c ∗ a = c ∗ b ⇒ a = b. (c) (a−1)−1 = a. (d) (a ∗ b)−1 = b−1 ∗ a−1. 2. Sejam σ = ( 1 2 3 4 3 1 4 2 ) e τ = ( 1 2 3 4 2 1 4 3 ) . Determine σ ◦ τ , τ ◦ σ, σ3 ◦ τ 2, σ−1, τ−3, σ ◦ τ ◦ σ−1, σ527 e τ 1001. 3. Seja G um grupo tal que g2 = e para todo g ∈ G. Mostre que G e´ abeliano. 4. Mostre que num grupo finito o produto de todos os elementos e´ igual ao produto dos elementos de ordem 2. Aplique isto a (Zp ∗, ·) onde p e´ um nu´mero primo positivo, para mostrar o Teorema de Wilson: (p− 1)! ≡ (−1) mod p. 5. Sejam G um grupo, H1 e H2 subgrupos de G. Mostre que H1∩H2 e´ um subgrupo de G. Generalize para um nu´mero arbitra´rio de subgrupos de G . 6. Sejam G um grupo, H ⊆ G um subgrupo e a ∈ G. Mostre que aHa−1 = {aha−1 | h ∈ H} e´ um subgrupo de G. 7. (a) Mostre que S1 = {z ∈ C | |z| = 1} e´ um subgrupo de (C∗, ·). (b) Se θ ∈ R, mostre que o conjunto Sθ = {(cos θ + i sen θ)n | n ∈ Z} e´ um subgrupo de S1. (c) Mostre que Sθ e´ finito se, e somente se, θ pi ∈ Q. 8. Sejam G um grupo, K ⊆ H ⊆ G tais que K e´ um subgrupo de H e H e´ um subgrupo de G. Mostre que (a) [G : H ] = 1 se, e somente se, H = G e [G : H ] = |G| se, e somente se, H = {e}. 114 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO (b) [G : H ] = [G : k] · [H : K], mesmo que um destes nu´meros seja infinito. (Note que se K = {e} obte´m-se o Teorema de Lagrange). (c) Se [G : K] e´ um primo, enta˜o na˜o existe H 6= G tal que K ⊂ H e K 6= H . 5.3 Estrutura de O´rbitas de uma Permutac¸a˜o 5.3.1 Decomposic¸a˜o de uma permutac¸a˜o em um pro- duto de ciclos Nesta sec¸a˜o, seguindo o estudo realizado por Cauchy, mostraremos que toda permutac¸a˜o pode ser decomposta num produto de permutac¸o˜es de um tipo bem simples chamados de ciclos e que tal decomposic¸a˜o e´ u´nica. O grupo Sn age sobre o conjunto {1, 2, . . . , n} , isto e´, existe uma func¸a˜o Sn : {1, 2, . . . , n} −→ {1, 2, . . . , n} (σ, x) 7−→ σx = σ(x) tal que (i) ex = x ∀ x ∈ {1, 2, . . . , n}, (ii) σ1(σ2(x)) = (σ1 ◦ σ2)(x), ∀ σ1, σ2 ∈ Sn, x ∈ {1, 2, . . . , n}. Se H e´ um subgrupo de Sn e x ∈ {1, 2, . . . , n}, define-se a o´rbita de x segundo H como sendo o conjunto Orb(x) = {σ(x) | σ ∈ H} ⊆ {1, 2, . . . , n}. Em particular, se H = 〈σ〉 para algum σ ∈ Sn, enta˜o Orb〈σ〉(x) = {σn(x) | n ∈ Z}. PROPOSIC¸A˜O 5.10. Sejam H um subgrupo de Sn e x, y ∈ {1, 2, . . . , n}. Temos que (i) Se OrbH(x) ∩ OrbH(y) 6= Φ enta˜o OrbH(x) = OrbH(y). (ii) ⋃ x∈Sn OrbH(x) = {1, 2, . . . , n}. Demonstrac¸a˜o: (i) Suponha que OrbH(x) ∩ OrbH(y) 6= Φ e seja z um elemento deste conjunto. Logo existem h, h′ ∈ H tais que z = h(x) = h′(y) (5.1) 5.3. ESTRUTURA DE O´RBITAS DE UMA PERMUTAC¸A˜O 115 Seja u ∈ OrbH(x), logo u = h′′ com h′′ ∈ H . Mas de (1) temos que x = h−1◦h′(y) e portanto u = h′′◦h−1◦h′(y) com h′′◦h−1◦h′ ∈ H e consequente- mente u ∈ OrbH(y). Com isto fica provado a inclusa˜o OrbH(x) ⊆ OrbH(y). A inclusa˜o rec´ıproca obte´m-se de modo ana´logo. (ii) Observe que x ∈ OrbH(x) pois e ∈ H e ex = x. Logo {1, 2, . . . , n} ⊆ ⋃ x∈Sn OrbH(x) ⊆ {1, 2, . . . , n}, o que fornece a igualdade dos dois conjuntos. Observe que dado um elemento σ ∈ Sn, temos que σord(σ) = e, logo se x ∈ {1, 2, . . . , n}, o conjunto {m ∈ N | σm(x) = x} e´ na˜o vazio. PROPOSIC¸A˜O 5.11. Seja r = min {m ∈ N | σm(x) = x}. Temos que (i) r | ord(σ). (ii) Orb〈σ〉(x) = {x, σ(x), . . . , σr−1(x)}. Demonstrac¸a˜o: (i) O conjunto I(x) = {m ∈ Z | σm(x) = x} e´ obvia- mente um ideal de Z e conte´m o ideal I(ord(σ)) = {m ∈ Z | σm = e}, de onde segue que r | ord(σ). (ii) Para provar a igualdade, basta provar a inclusa˜o Orb〈σ〉(x) ⊆ {x, σ(x), . . . , σr−1(x)}, uma vez que a outra inclusa˜o e´ o´bvia. Seja z ∈ Orb〈σ〉(x), logo existe m ∈ Z tal que z = σm()x. Pelo algoritmo da divisa˜o de inteiros, podemos escrever: m = rq + t com 0 ≤ t ≤ r− 1, logo como σr(x) = x, segue que σqr(x) = x, e portanto z = σm(x) = σrq+t(x) = σt(σqr(x)) = σt(x) ∈ {x, σ(x), . . . , σr−1(x)}. De acordo com as Proposic¸o˜es 10 e 11 temos que, dada uma permutac¸a˜o σ ∈ Sn, existem elementos x1, . . . , xs ∈ {1, 2, . . . , n} tais que Orb〈σ〉(xl) ∩ Orb〈σ〉(xk) = Φ se 1 ≤ l, k ≤ s e l 6= k, 116 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO e Orb〈σ〉(xl) = {xl, σ(xl), . . . , σri−1(xl)}, onde rl = min{m ∈ N|σm(xl) = xl}, 1 ≤ l ≤ s. Temos enta˜o que o conjunto 1, 2, . . . , n esta´ particionado pelos conjuntos Orb〈σ〉(xl), 1 ≤ l ≤ s. Exemplo 1 : Se σ = ( 1 2 3 4 5 6 2 3 1 6 5 4 ) ∈ S6, enta˜o Orb〈σ〉(1) = Orb〈σ〉(2) = Orb〈σ〉(3) = {1, 2, 3}, Orb〈σ〉(4) = Orb〈σ〉(6) = {4, 6} e Orb〈σ〉(5) = {5}. O tipo de o´rbita mais simples poss´ıvel e´ Orb〈σ〉(x) = {x}. E´ claro que Orb〈σ〉(x) = {x} ⇔ σ(x) = x, e, neste caso, temos que σm(x) = x ∀ m ∈ Z. Neste casodizemos que σ deixa fixo o elemento x, ou que x e´ um elemento fixo para σ. A permutac¸a˜o mais simples do ponto de vista da estrutura das o´rbitas e´ aquela em que cada o´rbita se reduz a um elemento, isto e´ Orb〈σ〉(x) = {x} ∀ x ∈ {1, 2, . . . , n}. E´ o´bvio que esta permutac¸a˜o e´ a identidade. O segundo tipo mais simples de o´rbita e´ Orb〈σ〉(x) = {x, y}, x 6= y. Uma permutac¸a˜o σ ∈ Sn tal que existem x, y ∈ {1, 2, . . . , n} com x 6= y tal que Orb〈σ〉(x) = {x, y} e Orb〈σ〉(z) = {z} ∀ z ∈ {1, 2, . . . , n} , e´ chamada de transposic¸a˜o. Seja r ≥ 2, um r-ciclo ou um ciclo de comprimento r e´ uma permutac¸a˜o com um o´rbita com r elementos e as demais com apenas um elemento. Uma transposic¸a˜o e´ portanto um 2-ciclo. Um r-ciclo pode ser representado por (a− 1, a− 2, . . . , ar), significando σ(a1) = a2, . . . , σ(ar−1) = ar, σ(ar) = a1 e σ(z) = z para todo z ∈ {1, 2, . . . , n} − {a1, . . . , ar}. Exemplo 2 :( 1 2 3 4 1 3 2 4 ) = (2 3), ( 1 2 3 4 2 3 4 1 ) = (1 2 3 4), ( 1 2 3 4 2 3 1 4 ) = (1 2 3), ( 1 2 3 4 2 1 4 3 ) = (1 2)(3 4), ( 1 2 3 4 2 4 3 1 ) = (1 3 4)(3 1 2). 5.3. ESTRUTURA DE O´RBITAS DE UMA PERMUTAC¸A˜O 117 Sejam σ ∈ Sn e x ∈ {1, 2, . . . , n}. Dizemos que σ move x ou que x e´ mo- vido por σ se σ(x) 6= x. Usaremos a notac¸a˜oM(σ) = {x | x e´ movido por σ}. Dizemos que duas permutac¸o˜es σ e τ de Sn sa˜o disjuntas seM(σ)∩M(τ) = Φ. Exemplo 3 : ( 1 2 3 4 5 6 2 3 1 4 5 6 ) e ( 1 2 3 4 5 6 1 2 3 5 4 6 ) sa˜o disjuntas, mas ( 1 2 3 2 1 3 ) e ( 1 2 3 1 3 2 ) na˜o sa˜o disjuntas. LEMA 5.3. Sejam σ e τ duas permutac¸o˜es disjuntas. Se σ(x) 6= x, enta˜o τ(σ(x)) = σ()x. Demonstrac¸a˜o: Observe que se σ(x) 6= x, enta˜o Orb〈σ〉(x) ⊆M(σ) e por- tanto σ(x) ∈ M(σ). Como M(σ) ∩M(τ) = Φ, segue que σ(x) /∈ M(τ) e portanto τ(σ(x)) = σ(x). PROPOSIC¸A˜O 5.12. Duas permutac¸o˜es disjuntas em Sn comutam. Demonstrac¸a˜o: Seja x ∈ 1, 2, . . . , n, devemos provar que σ(τ(x)) = τ(σ(x)). Caso 1: τ move x. Trocando σ com τ no Lema 2 temos que σ(τ(x)) = τ(x). Por outro lado, sendo σ e τ disjuntas, temos que σ(x) = x, logo τ(σ(x)) = τ(x). Juntando estas relac¸o˜es obtemos a igualdade σ(τ(x)) = τ(σ(x)). Caso 2: τ deixa x fixo. Como τ(x) = x, segue que σ(τ(x)) = x. Por outro lado, pelo Lema 2 temos que τ(σ(x)) = { σ(x), se σ move x τ(x) = σ(x), se σ deixa x fixo Juntando estas u´ltimas ralac¸o˜es obtemos que τ(σ(x)) = σ(τ(x)). Portanto σ e τ comutam. 118 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO LEMA 5.4. Sejam σ e τ ciclos em Sn. Se existe x0 ∈ {1, 2, . . . , n} tal que (i) σ e τ movem x0 (ii) σtx0 = τ tx0 ∀ t ∈ Z, enta˜o σ = τ . Demonstrac¸a˜o: Pelas hipo´teses temos que Orb〈σ〉(x0) = Orb〈τ〉(x0) 6= {x0}. Seja x tal que x /∈ Orb〈σ〉(x0)(= Orb〈τ〉(x0)). Temos que σ(x) = τ(x) = x. Seja agora x tal que x ∈ Orb〈σ〉(x0)(= Orb〈τ〉(x0)). Logo por (ii) existe l ∈ Z tal que x = σl(x0) = τ l(x0) . Portanto, σ(x) = σ(σl(x0)) = σ l+1(x0) = τ(τ l+1(x0)) = τ(x). Isto acaba de provar que σ(x) = τ(x) para todo x ∈ {1, 2, . . . n} e portanto que σ = τ . TEOREMA 5.3 (Cauchy). Toda permutac¸a˜o diferente da identidade e´ produto de ciclos disjuntos. Esta fatorac¸a˜o e´ u´nica a menos da ordem na qual os ciclos sa˜o escritos. Demonstrac¸a˜o: Existeˆncia da decomposic¸a˜o: Seja σ ∈ Sn. Escreva {1, 2, . . . , n} = Orb〈σ〉(x1) ∪ · · · ∪Orb〈σ〉(xs) ∪Orb〈σ〉(xs+11) ∪ · · · onde para cada σ ∈ Sn, Orb〈σ〉(xl) = {xl, σxl, . . . , σrl−1xl}, l = 1, 2, . . . , rl = min{m ∈ N | σmxl = xl} e estas o´rbitas sa˜o duas a duas disjuntas. Su- ponha que os xi foram ordenados de modo que rl > 1 se l = 1, 2, . . . , s e rl = 1 se l = s + 1, . . .. Se definimos σ1 = (x1 σx1 · · · σr1−1x1), . . . , σs = (xs σxs · · · σrs−1xs), temos que σ1, . . . , σs sa˜o ciclos disjuntos (veja Problema 3.2) e claramente σ = σ1 · · ·σs. Unicidade: Suponha que σ = σ1 · · · σs = τ1 · · · τm, onde σ1, . . . σs sa˜o dois a dois disjuntos, o mesmo ocorrendo com τ1, . . . , τm. Seja x ∈ {1, 2, . . . , n} um elemento movido por σ (existe pois σ 6= e. Temos enta˜o que algum σi e algum τj movem x, e como pela Proposic¸a˜o 12 ciclos disjuntos 5.3. ESTRUTURA DE O´RBITAS DE UMA PERMUTAC¸A˜O 119 comutam, podemos supor que estes sejam σ1 e τ1. Temos tambe´m pela hipo´tese que os ciclos sa˜o disjuntos que, σ2x = · · · = σsx = τ2x = · · · = τmx = x, e portanto σx = σ1x = τ1x. Novamente pela comutatividade dos ciclos envolvidos temos para todo z ∈ Z, que σt = σt1 · · ·σts = τ t1 · · · τ tm e como σt2x = · · · = σtsx = τ t2x = · · · = τ tmx = x, segue que σtx = σt1x = τ t 1x, ∀t t ∈ Z, portanto pelo Lema 3 temos que σ1 = τ1 e consequentemente σ2 · · · σs = τ2 · · · τm. Repetindo o mesmo argumento, pode-se mostrar que σ2 = τ2, etc. O re- sultado segue repetindo este argumento sucessivamente se tive´ssemos s = m. Mas este e´ efetivamente o caso pois caso contra´rio, por exemplo se m > s, ter´ıamos e = τs+1 · · · τm, o que e´ imposs´ıvel pois τs+1, . . . , τm sa˜o ciclos dis- juntos. COROLA´RIO 5.4. Toda permutac¸a˜o e´ um produto de transposic¸o˜es. Demonstrac¸a˜o: Pelo teorema basta mostrar que todo ciclo e´ produto de transposic¸o˜es. O resultado segue observando que (a1 a2 · · · ar) = (a1 ar)(a1 ar−1) · · · (a1 a3)(a1 a2) Exemplo 4 : ( 1 2 3 4 5 6 2 3 1 5 4 6 ) = (1 2 3)(4 5) = (1 3)(1 2)(4 5)( 1 2 3 4 5 6 3 5 4 1 6 2 ) = (1 3 4)(2 5 6) = (1 4)(1 3)(2 6)(2 5) No Corola´rio acima na˜o se pode exigir que as transposic¸o˜es sejam disjun- tas nem se pode garantir que a escrita seja u´nica. Por exemplo temos (1 2 3) = (2 1)(2 3) = (1 3)(1 2) = (3 2)(1 3) = (2 1)(1 3)(2 3)(1 2). Na pro´xima sec¸a˜o determinaremos um invariante da escrita de uma per- mutac¸a˜o como produto de transposic¸o˜es. 120 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO PROBLEMAS 5.3. 1. Sejam σ, τ ∈ Sn e t ∈ Z. (a) Mostre que M(σt) ⊆M(σ). (b) Mostre que se σ e τ sa˜o disjuntas, enta˜o σt e τ s sa˜o disjuntas 2. Mostre que dois ciclos (a1 · · · ar) e (b1 · · · bs) sa˜o disjuntos se e somente se {a1, . . . , ar} ∩ {b1, . . . bs} = Φ. 3. Mostre que (a1 · · · ar)−1 = (ar · · · a1). 4. (a) Mostre (a1 · · · ar) = (b1 · · · br) se, e somente se, a1, a2, . . . , ar e b1, b2, . . . , br sa˜o iguais como permutac¸o˜es circulares. (b) De quantos modos se pode escrever como r-ciclo o ciclo (a1 · · · ar)? (c) Quantos r-ciclos distintos existem em Sn ? 5. Decomponha as seguintes permutac¸o˜es em produtos de ciclos disjuntos e em seguida as escreva como produto de transposic¸o˜es( 1 2 3 4 5 2 1 3 5 4 ) , ( 1 2 3 4 5 3 2 4 5 1 ) , ( 1 2 3 4 5 5 4 1 2 3 ) , ( 1 2 3 4 5 4 3 2 5 1 ) , ( 1 2 3 4 5 2 3 5 1 4 ) , ( 1 2 3 4 5 5 4 3 2 1 ) . 6. Sejam σ uma permutac¸a˜o e τ uma transposic¸a˜o em Sn. Suponha que σ seja o produto de l ciclos disjuntos. Com quantos ciclos disjuntos se escreve o produto τ · σ ? (Sugesta˜o: Fac¸a uma ana´lise de casos segundo τ e σ sejam disjuntos, ou τ tenha apenas um elemento em comum com um ciclo de σ, ou dois elementos em comum, ou cada elemento de τ seja comum a um ciclo distinto de σ). 7. Uma permutac¸a˜o σ ∈ Sn chama-se regular se e´ a identidade ou se na˜o tem elementos fixos e e´ o produto de ciclos disjuntos de mesmo com- primento. Prove que σ e´ regular se, e somente se, σ e´ a poteˆncia de um n-ciclo. (Sugesta˜o: Note que se l = n r , tem-se que (i1 i2 · · · ir)(j1 j2 · · · jr) · · · (m1 m2 · · · mr) = = (i1 j1 · · · m1 i2 j2 · · · m2 · · · ir jr · · · mr)l, 5.4. O GRUPO ALTERNANTE 121 onde o comprimento de cada uma das sequeˆncias iα, jα, . . . ,mα no segundo mem- bro da igualdade acima vale l). 8. Seja σ = σ1 · · ·σr a decomposic¸a˜o de σ em ciclos disjuntos. Mostre que o(σ) = [o(σ1), . . . , o(σr)]. Ache a ordem das permutac¸o˜es do Problema 3.5. 9. Seja σ ∈ Sn um n-ciclo e seja k ∈ Z. Mostre que (a) σk= e se, e somente se, k e´ mu´ltiplo de n. (b) Se (k, n) = 1 enta˜o σk e´ um n-ciclo e o(σk) = n (c) Se d | n, pondo ld = n enta˜o (i11 i12 · · · i1l)(i21 i22 · · · i2l) · · · (id1 id2 · · · idl) = = (i11 i21 · · · id1 i12 i22 · · · id2 · · · i1l i2l · · · idl)d, (d) Mostre que σk e´ um produto de (n, k) ciclos disjuntos cada um de comprimento n (n, k) 10. Seja G um grupo e S ⊆ G um subconjunto qualquer. O subgrupo gerado por S e´ definido por 〈S〉 = ⋂ H e´ subgrupo de G que conte´m S H. (a) Mostre que 〈S〉 = {a1 · · · ar | ai ∈ S ou a−1i ∈ S}. (b) Mostre que Sn e´ gerado pelas transposic¸o˜es (1 2), (2 3), . . . , (n− 1, n). (Sugesta˜o: (i j) = (i i+ 1) · · · (j − 2 j − 1)(j − 1 j) · · · (i+ 1 i+ 2)(i i+ 1) com i < j. ) 5.4 O Grupo Alternante Seja A um domı´nio e sejam X1, . . . , Xn indeterminadas sobre A. A ac¸a˜o de Sn sobre {1, 2, , . . . , n} que definimos na sec¸a˜o anteior induz uma ac¸a˜o de 122 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO Sn sobre A[X1, . . . , Xn] como segue ρ : Sn × A[X1, . . . , Xn] −→ A[X1, . . . , Xn] (σ , p(X1, . . . , Xn)) 7−→ σ(p(X1, . . . , Xn)) = p(Xσ(1), . . . , Xσ(n)) Esta aplicac¸a˜o tem as seguintes propriedades: (i) e p(X1, . . . , Xn) = p(X1, . . . , Xn). (ii) σ1(σ2(p(X1, . . . , Xn))) = (σ1 ◦ σ2)(p(X1, . . . , Xn)). (iii) σ(p(X1, . . . , Xn) + q(X1, . . . , Xn)) = = σ(p(X1, . . . , Xn)) + σ(q(X1, . . . , Xn)). (iv) σ(p(X1, . . . , Xn) · q(X1, . . . , Xn)) = = σ(p(X1, . . . , Xn)) · σ(q(X1, . . . , Xn)). As duas primeiras propriedades sa˜o caracter´ısticas de ac¸o˜es de grupo sobre conjuntos, enquanto que as quatro propriedades caracterizam a ac¸a˜o de gru- pos sobre ane´is. Seja p(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn]. Considere o subconjunto de Sn G(p(X1, . . . , Xn)) = {σ ∈ Sn | σ(p(X1, . . . , Xn)) = p(X1, . . .Xn)} ⊆ Sn. E´ claro que este conjunto e´ finito e e´ fechado em relac¸a˜o ao produto de Sn, logo pela Proposic¸a˜o 6, e´ um subgrupo de Sn, chamado de grupo de isotropia de p(X1, . . . , Xn). O grupo de isotropia de g(X1, . . . , Xn) = ∏ i<j (Xi −Xj) e´ chamado de grupo alternante de grau n e sera´ denotado por An. Estudamos a seguir a ac¸a˜o de Sn sobre g(X1, . . . , Xn). PROPOSIC¸A˜O 5.13. Se τ e´ uma transposic¸a˜o em Sn, enta˜o τg(X1, . . . , Xn) = −g(X1, . . . , Xn). Demonstrac¸a˜o: Podemos supor que τ = (k l) com k < l (leitor justifique). Podemos escrever g(X1, . . . , Xn) do seguinte modo: g(X1, . . . , Xn) = ∏ i<k (Xk −Xi) · ∏ k<i<l (Xi −Xk)(Xl −Xk) · ∏ i>k (Xl −Xi)· 5.4. O GRUPO ALTERNANTE 123 · ∏ k<i<l (Xl −Xi) · ∏ i>l (Xi −Xl) · p(X), onde p e´ um polinoˆmio que na˜o conte´m nem Xk nem Xl. Temos enta˜o que τg(X1, . . . , Xn) = ∏ i<k (Xl −Xi) · ∏ k<i<l (Xi −Xl)(Xk −Xl) · ∏ i>k (Xk −Xi)· · ∏ k<i<l (Xk −Xi) · ∏ i>l (Xi −Xk) · p(X), Comparando as expresso˜es acima obtemos que τg(X1, . . . , Xn) = (−1)l−k−1 · (−1)l−k−1g(X1, . . . , Xn) = −g(X1, . . . , Xn). COROLA´RIO 5.5. Se σ e´ uma permutac¸a˜o qualquer de Sn, enta˜o σg(X1, . . . , Xn) = ± g(X1, . . . , Xn) Demonstrac¸a˜o: Isto decorre da Proposic¸a˜o e do fato que toda permutac¸a˜o e´ um produto de transposic¸o˜es. Diremos que uma permutac¸a˜o σ ∈ Sn e´ par se σg(X1, . . . , Xn) = g(X1, . . . , Xn) e e´ ı´mpar se σg(X1, . . . , Xn) = − g(X1, . . . , Xn). Assim temos que toda transposic¸a˜o e´ ı´mpar, a identidade e´ par, σ e σ−1 teˆm a mesma paridade, σ1 · σ2 e´ par se, e somente se, σ1 e σ2 teˆm a mesma paridade e An = G(g(X1, . . . , Xn)) = {σ ∈ Sn | σ e´ par }. COROLA´RIO 5.6. Uma permutac¸a˜o e´ par se e somente se ela e´ o produto de um nu´mero par de transposic¸o˜es. Demonstrac¸a˜o: Seja σ ∈ Sn e suponha que σ = τ1 · · · τr onde cada τi e´ uma transposic¸a˜o. Temos que σg(X1, . . . , Xn) = (τ1 · · · τr)g(X1, . . . , Xn) = (−1)rg(X1, . . . , Xn). Da´ı segue que σ e´ par se e somente se r e´ par. Assim, determinamos a propriedade que permanece invariante na escrita de uma permutac¸a˜o como produto de transposic¸o˜es. 124 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO COROLA´RIO 5.7. O nu´mero de transposic¸o˜es em qualquer escrita de uma permutac¸a˜o como produto de transposic¸o˜es tem sempre a mesma paridade. Vamos agora determinar a ordem e o ı´ndice de An em Sn. Se σ ∈ An, enta˜o σAn = eAn = An, portanto as permutac¸oes pares determinam todas a mesma classe lateral. Suponha agora que σ1 e σ2 sejam permutac¸o˜es ı´mpares, logo σ−11 ·σ2 e´ par e portanto σ−11 ·σ2 ∈ An, consequ¨entemente, pela Proposic¸a˜o 5 (i), σ2An = σ1An. Isto acarreta que An possui apenas duas classes laterais a` esquerda distintas, consequ¨entemente, [Sn : An] = 2 e portanto, pelo Teorema de Lagrange temos, |Sn| = [Sn : An] · |An| = 2 |An|. Finalmente temos que |An| = |Sn|2 = n!2 . 5.5 Func¸o˜es Sime´tricas Inversamente ao que fizemos acima, vamos associar a todo subgrupo de Sn um subconjunto de A[X1, . . . , Xn]. Seja H um subgrupo de Sn, o conjunto dos elementos p(X1, . . . , Xn) ∈ A[X1, . . . , Xn] que sa˜o invariantes pela ac¸a˜o dos elementos de H , isto e´, σ(p(X1, . . . , Xn)) = p(X1, . . . , Xn) ∀ σ ∈ H e´ um subanel de A[X1, . . . , Xn (leitor verifique!) que chameremos de anel fixo de H em A[X1, . . . , Xn e denotaremos por Fix[H, A[X1, . . . , Xn]] ou A[X1, . . . , Xn] H Um caso particular importante e´ quando H = Sn. Neste caso, temos que Fix[H, A[X1, . . . , Xn]] e´ o subanel de A[X1, . . . , Xn] dos polinoˆmios que sa˜o invariantes pela ac¸a˜o de Sn. Estes polinoˆmios sa˜o chamados de polinoˆmios sime´tricos. Como exemplo de polinoˆmios sime´tricos temos os chamados po- linoˆmios sime´tricos elementares que introduzimos na sec¸a˜o 1, ou seja s1(X1, . . . , Xn) = ∑ i Xi = X1 + · · ·+Xn s2(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2 Xi1Xi2 = X1X2 +X1X3 + · · ·+Xn−1Xn s3(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2<i3 Xi1Xi2Xi3 = X1X2X3+X1X2X4+· · ·+Xn−2Xn−1Xn 5.5. FUNC¸O˜ES SIME´TRICAS 125 ... sn−1(X1, . . . , Xn) = ∑ i1<i2···<in−1 Xi1 · · ·Xin−1 = X1X2 · · ·Xn−1+· · ·+X2X3 · · ·Xn sn(X1, . . . , Xn) = X1X2 · · ·Xn A verificac¸a˜o deste u´ltimo fato e´ deixada a cargo do leitor que podera´ fazeˆ-la mostrando que cada si(X1, . . . , Xn) e´ invariante pela ac¸a˜o de uma transposic¸a˜o, ja´ que cada permutac¸a˜o e´ produto de transposic¸o˜es. Uma maneira de obter novos polinoˆmios sime´tricos em A[X1, . . . , Xn] e´ descrita a seguir. Sejam Y1, . . . , Yn indeterminadas sobre A e considere a seguinte aplicac¸a˜o ψn : A[Y1, . . . , Yn] −→ A[X1, . . . , Xn] p[Y1, . . . , Yn] 7−→ p(s1(X1, . . . , Xn), . . . , sn(X1, . . . , sn)) E´ claro que ψn e´ um homomorfismo de ane´is e que ψn(A[Y1, . . . , Yn]) = A[s1(X1, . . . , Xn), . . . , sn(X1, . . . , Xn)] ⊆ Fix[Sn, A[X1, . . . , Xn]] Os pro´ximos resultados nos fornecera˜o o nu´cleo e a imagem de ψn. Para fa- cilicilitar as notac¸o˜es denotaremos si(X1, . . . , Xn) por si e si(X1, . . . , Xn−1) por s′i. TEOREMA 5.4 (Teorema das Func¸o˜es Sime´tricas). Para todo n ∈ N temos que (i) Ker(ψn) = {0} (ii) Im(ψn) = Fix[Sn, A[X1, . . . , Xn]]. Demonstrac¸a˜o: (i) Suponha, por absurdo, que existe um n ∈ N tal que Ker(ψn) 6= {0}. Seja n o menor nu´mero natural para o qual isto acontece. Seja p(X1, . . . , Xn) ∈ Ker(ψn) − {0} de menor grau poss´ıvel. Como p(s1, . . . , sn) = 0, se colocarmos Xn = 0 nesta igualdade, obteremos p(s′1, . . . , s ′ n−1) = 0, portanto p(Y1, . . . , Yn−1) ∈ Ker(ψn−1) e pela hipo´tese sobre n temos que p(Y1, . . . , Yn−1, 0) = 0. Portanto p(Y1, . . . , Yn) e´ da forma Ynq(Y1, . . . , Yn) com gr(p(Y1, . . . , Yn)) < gr(p(Y1, . . . , Yn)). Como sabemos que sn 6= 0 temos que q(s1, . . . , sn) = 0. Portanto, pela minimalidade do 126 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO grau de p(Y1, . . . , Yn), segue que q(Y1, . . . , Yn) = 0. Logo p(Y1, . . . , Yn) = 0, o que e´ um absurdo. (ii) Suponha o resultado falso e seja n o menor nu´merointeiro positivo para o qual Im(ψn) 6= Fix[Sn, A[X1, . . . , Xn]]. Seja f(X1, . . . , Xn) um ele- mento de grau menor poss´ıvel m tal que f(X1, . . . , Xn) ∈ Fix[Sn, A[X1, . . . , Xn]]− Im(ψn). (5.2) Certamente n ≥ 2 e m ≥ 2. Escrevemos f(X1, . . . , Xn) segundo as poteˆncias crescentes de Xn: f(X1, . . . , Xn) = f0(X1, . . . , Xn−1) + f1(X1, . . . , Xn−1)Xn + · · ·+ + · · ·+ fr(X1, . . . , Xn−1)Xrn (5.3) com fi(X1, . . . , Xn−1) ∈ A[X1, . . . , Xn−1], i = 0, 1, . . . , r. Por hipo´tese f(X1, . . . , Xn) e´ invariante pela ac¸a˜o de Sn, logo ele e´ invariante por toda permutac¸a˜o do tipo σ = ( 1 2 · · · n− 1 n i1 i2 · · · in−1 n ) Temos enta˜o que f(X1, . . . , Xn) = σf(X1, . . . , Xn) = r∑ i=0 σ′fi(X1, . . . , Xn−1)X in, (5.4) onde σ′ = ( 1 2 · · · n− 1 i1 i2 · · · in−1 ) ∈ Sn−1. Por (2) e (3) obtemos que σ′f0(X1, . . . , Xn−1) = f0(X1, . . . , Xn−1) e como σ′ percorre Sn−1 ao variar σ , temos que σf0(X1, . . . , Xn−1) ∈ Fix[Sn−1, A[X1, . . . , Xn−1]]. Pela hipo´tese sobre n, temos que Fix[Sn−1, A[X1, . . . , Xn−1]] = Im(ψn) , logo existe p(Y1, . . . , Yn−1) ∈ A[Y1, . . . , Yn−1] tal que p(s′1, . . . , s ′ n−1) = f0(X1, . . . , Xn−1). 5.5. FUNC¸O˜ES SIME´TRICAS 127 Como gr(f(X1, . . . , Xn)) = m , temos que gr(p(s′1, . . . , s ′ n−1) = gr(f0(X1, . . . , Xn−1)) ≤ m. Considere o polinoˆmio p(s1, . . . , sn−1) ∈ A[X1, . . . , Xn−1] . Se p(s′1, . . . , s ′ n−1) = ∑ ai1,...,in−1(s ′ 1) i1 · · · (s′n−1)in−1 , temos que p(s1, . . . , sn−1) = ∑ ai1,...,in−1s i1 1 · · · sin−1n−1 , como ai1,...,in−1(s ′ 1) i1 · · · (s′n−1)in−1 e ai1,...,in−1si11 · · · sin−1n−1 sa˜o homogeˆneos de mesmo grau i1+2i2+ · · ·+(n− 1)in−1 e na˜o existe, por (i) nenhuma relac¸a˜o polinomial entre s1, . . . , sn−1 , temos que gr(p(s1, . . . , sn−1)) = gr(p(s′1, . . . , s ′ n−1)) ≤ m. Segue enta˜o que o polinoˆmio sime´trico f(X1, . . . , Xn)− p(s1, . . . , sn) (5.5) tem grau menor ou igual a m. Ao fazermos Xn = 0, esta diferenc¸a, por (2) e (3) se torna igual a f(X1, . . . , Xn−1, 0)− p(s′1, . . . , s′n) = f0(X1, . . . , Xn−1, 0)− p(s′1, . . . , s′n) = 0. Segue que o polinoˆmio em (4) e´ divis´ıvel por Xn e como ele e´ sime´trico, ele e´ tambe´m divis´ıvel por X1, . . . , Xn−1 e, portanto por X1 · · ·Xn, logo f(X1, . . . , Xn)− p(s1, . . . , sn−1) = X1 · · ·Xnq(X1, . . . , Xn) (5.6) com q(X1, . . . , Xn) sime´trico e, se na˜o nulo, de grau menor do que m. Pela nossa hipo´tese sobre m, temos que existe h(X1, . . . , Xn) ∈ A[Y1, . . . , Yn] tal que q(X1, . . . , Xn) = h(s1, . . . , sn), e portanto, de (5) obtemos que f(X1, . . . , Xn) = p(s1, . . . , sn−1) + snh(s1, . . . , sn) ∈ Im(ψn), o que e´ uma contradic¸a˜o com (i). O Teorema afirma que todo polinoˆmio sime´trico em A[X1, . . . , Xn] se es- creve de modo u´nico como p(s1, . . . , sn), onde p(Y1, . . . , Yn) e´ um polinoˆmio em n indeterminadas e s1, . . . , sn sa˜o os polinoˆmios sime´tricos elementares em n varia´veis. 128 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO PROBLEMAS 5.4. 1. Diga se sa˜o pares ou ı´mpares as seguintes permutac¸o˜es( 1 2 3 3 1 2 ) , ( 1 2 3 3 2 1 ) , ( 1 2 3 4 3 4 2 1 ) , ( 1 2 3 4 3 4 1 2 ) ,( 1 2 3 4 5 3 2 4 5 1 ) , ( 1 2 3 4 5 5 1 4 3 2 ) , ( 1 2 3 4 5 3 2 1 5 4 ) . 2. Determine os elementos pares e os elementos ı´mpares de S3. Determine A3. 3. (a) Escreva os elementos de S4 como produtos de ciclos disjuntos. (b) Mostre que se p1 = (X1 +X2 −X3 −X4)2 enta˜o G(p1) e´ o grupo G8 = {e, (12), (34), (12)(34), (13)(24), (14)(23), (1423), (1324)} (c) Mostre que σ(p1), ao variar σ em S4, assume os valores seguintes: p1 = (X1 + X2 − X3 − X4)2, p2 = (X1 − X2 + X3 − X4)2 e p3 = (X1 −X2 −X3 +X4)2. (d) Mostre que G(p2) e G(p3) sa˜o respectivamente os grupos K8 = {e, (13), (24), (13)(24), (12)(34), (14)(23), (1432), (1234)} e H8 = {e, (14), (23), (14)(24), (13)(24), (12)(34), (1243), (1342)}. 4. Seja p ∈ A[X1, . . . , Xn] e sejam σ, τ ∈ Sn. Mostre que σp = τp se, e somente se, σ e τ pertencem a` mesma classe lateral a` esquerda em Sn relativamente ao subgrupo G(p). Conclua que se [Sn : G(p)] = m, enta˜o σp assume exatamente m valores distintos ao σ em Sn. 5. Mostre que S4 se compo˜e das permutac¸o˜es e, (12)(34), (13)(24), (14)(23) e os oito 3-ciclos. 6. Mostre que, um r-ciclo e´ par se e somente se r e´ ı´mpar. 7. Se n > 2, mostre que todo elemento de Sn e´ produto de um certo nu´mero de 3-ciclos. [Sugesta˜o: (i j)(j k) = (i j k), (i j)(k t) = (k j i)(k t i)]. 5.6. CONJUGAC¸A˜O EM SN 129 8. Mostre que se H e G sa˜o subgrupos de Sn tais que H ⊆ G, enta˜o Fix[G] ⊆ Fix[H ]. 9. (Newton - 1707): Seja p(X) = a0 + a1X + · · · + anXn com n ra´ızes x1, . . . , xn ∈ K. Damos a seguir o me´todo de Newton para calcular as somas s(k) = xk1+ · · ·+xkn com k = 1, 2, 3, . . . em func¸a˜o dos coeficientes a0, a1, . . . , an sem resolver a equac¸a˜o. (a) Mostre que p′(X) = a1+2a2X+· · ·+nanXn−1 = p(X)X−x1+· · ·+ p(X) X−xn . (b) Usando o algoritmo da divisa˜o de p(X) por (X − a) para calcular a expressa˜o no u´ltimo membro da igualdade acima e comparando isto com a expressa˜o do meio, prove que ans (1) + an−1 = 0 ans (2) + an−1s(1) + 2an−2 = 0 ans (3) + an−1s(2) + an−2s(1) + 3an−3 = 0 ... ans (n−1) + an−1s(n−2) + · · ·+ a3s(2) + a2s(1) + (n− 1)a1 = 0 Este sistema de equac¸o˜es permite calcular de modo recorrente os valores de s(1), s(2), . . . , s(n−1) em func¸a˜o dos coeficientes do po- linoˆmio a0, a1, . . . , an. (c) Para obter as expresso˜es de s(n+k) para k ≥ 0, observe que so- mando membro a membro as igualdades xk1p(x1) = 0, x k 2p(x2) = 0, . . . , xknp(xn) = 0, tem-se que ans (n+k) + an−1s(n+k−1) + · · ·+ a0s(k) = 0. Ao variar k, obte´m-se um sistema de equac¸o˜es que permite calcular de modo recorrente os valores de s(n), s(n+1), . . . (d) Aplique o me´todo de Newton para calcular s2, s3, s4, s5 e s6 no caso do polinoˆmio X5 + 7X4 + 3X3 − 2X2 +X − 1 ∈ C[X]. 5.6 Conjugac¸a˜o em Sn Definic¸a˜o: Sejam σ, τ ∈ Sn. Dizemos que σ e´ uma conjugada de τ se existe µ ∈ Sn tal que µσµ−1 = τ . E´ fa´cil verificar que 130 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO 1. σ e´ um conjugado de σ para todo σ ∈ Sn. 2. Se σ e´ um conjugado de τ enta˜o τ e´ um conjugado de σ. 3. Se σ e´ um conjugado de τ e τ e´ um conjugado de µ enta˜o σ e´ um conjugado de µ. Portanto a relac¸a˜o de conjugac¸a˜o e´ uma relac¸a˜o de equivaleˆncia em Sn. Queremos determinar um crite´rio que nos permita verificar facilmente se duas permutac¸o˜es dadas sa˜o conjugadas uma da outra. Isto sera´ obtido apo´s al- guns lemas. LEMA 5.5. Sejam σ = (i1 · · · ir) um r-ciclo de Sn e µ ∈ Sn. Enta˜o µσµ−1 e´ o r-ciclo (µ(i1) · · · µ(ir)). Demonstrac¸a˜o: Coloque τ = (µ(i1) · · · µ(ir)). Queremos verificar que µσµ−1(u) = τ(u) ∀ u ∈ {1, 2, . . . , n}. Seja enta˜o dado u ∈ {1, 2, . . . , n}. Tome x ∈ {1, 2, . . . , n} tal que µ(x) = u. Temos que µσµ−1(u) = µσ(x) (5.7) τ(u) = τµ(x). (5.8) Temos dois casos a serem considerados: Caso 1: x /∈ {i1, . . . , ir}. Neste caso temos que µ(x) /∈ {µ(i1), . . . , µ(ir)} e, portanto, σ(x) = x e τ(µ(x)) = µ(x). Logo, µσµ−1(u) = τσ(x) = µ(x) = τ(µ(x)) = τ(u), e neste caso temos o que queremos. Caso 2: x ∈ {i1, . . . , ir}. Neste caso, por (5), (6) e pela definic¸a˜o de τ , temos τ(u) = τ(µ(x)) = µ(σ(x)) = µσµ−1(u), o que tambe´m prova o resultado nesta situac¸a˜o. Note que todo conjugado de um r-ciclo e´ tambe´m um r-ciclo. Exemplo: Sejam µ = ( 1 2 3 4 5 3 1 4 5 2 ) e σ = (3 5 2). Enta˜o µσµ−1 = (µ(1) µ(4) µ(5)) = (3 4 5). 5.6. CONJUGAC¸A˜O EM SN 131 LEMA 5.6. Sejam σ1σ2 · · ·σl a decomposic¸a˜o de σ em produto de ciclos disjuntos e µ ∈ Sn. Enta˜o (µσ1µ−1)(µσ2µ−1) · · · (µσlµ−1) e´ a decomposic¸a˜o de µσµ−1 em produto de ciclos disjuntos. Demonstrac¸a˜o: Pelo Lema 1, cada µσiµ −1e´ um ciclo de comprimento igual ao comprimento de σi. E´ claro que vale a igualdade do enunciado, portanto so´ falta mostrar que os ciclos µσiµ −1 sa˜o dois a dois disjuntos. De fato, se (i1 · · · ir) e (j1 · · · is) sa˜o ciclos disjuntos, enta˜o µ(i1 · · · ir)µ−1 = (µ(i1) · · · µ(ir)) e µ(j1 · · · js)µ−1 = (µ(j1) · · · µ(js)) sa˜o ciclos disjuntos pois µ e´ uma bijec¸a˜o. Definic¸a˜o: Duas permutac¸o˜es σ e τ sa˜o ditas semelhantes se elas pos- suem a mesma estrutura de o´rbita. Isto e´, σ e τ podem ser escritas na forma: σ = σ1σ2 · · ·σl com os σi sendo ciclos disjuntos e ord(σi) = ri e τ = τ1τ2 · · · τl com os τi sendo ciclos disjuntos e ord(τi) = ri Exemplo: As permutac¸o˜es τ = ( 1 2 3 4 5 2 3 1 5 4 ) e σ = ( 1 2 3 4 5 2 1 4 5 3 ) sa˜o semelhantes pois τ(1 2 3)(4 5) e σ = (3 4 5)(1 2). Ja´ as permutac¸o˜es τ = ( 1 2 3 4 5 2 1 4 5 3 ) e σ = ( 1 2 3 4 5 2 1 3 5 4 ) na˜o sa˜o semelhantes pois τ = (3 4 5)(1 2) e σ = (4 5)(1 2). PROPOSIC¸A˜O 5.14. Duas permutac¸o˜es sa˜o conjugadas se, e somente se, sa˜o semelhantes. Demonstrac¸a˜o: Se duas permutac¸o˜es sa˜o conjugadas elas sa˜o semelhan- tes devido ao Lema 2 e a` definic¸a˜o de permutac¸o˜es semelhantes. Recipro- camente, Suponha que as permutac¸o˜es σ e τ sejam semelhantes, digamos, σ = (i1 · · · ir)(j1 · · · js) · · · (k1 · · · kt) e τ = (i′1 · · · i′r)(j′1 · · · j′s) · · · (k′1 · · · k′t). Defina µ = ( i1 · · · ir j1 · · · js · · · k1 · · · kt i′1 · · · i′r j′1 · · · j′s · · · k′1 · · · k′t ) 132 CAPI´TULO 5. O GRUPO SIME´TRICO e para x /∈ {i1, . . . , ir, j1, . . . , js, . . . , k1, . . . , kt} defina µ(x) de forma que µ seja uma bijec¸a˜o. Agora e´ claro que µσµ−1 = σ. PROBLEMAS 5.5. 1. Determine todos os elementos de S3 conjugados de (1 2 3)(4 5). 2. Encontre µ que realiza a conjugac¸a˜o entre σ = (1 2 3)(4 5) e τ = (1 3 4)(2 5). 3. Mostre que em S5 temos: 01 permutac¸a˜o semelhante a e 10 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2) 20 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2 3) 30 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2 3 4) 24 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2 3 4 5) 15 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2)(3 4) 20 permutac¸o˜es semelhantes a (1 2 3)(4 5) Cap´ıtulo 6 O ME´TODO DE LAGRANGE Nesta sec¸a˜o estudaremos o me´todo de Lagrange para a resoluc¸a˜o das equac¸o˜es de terceiro e quarto graus e a tentativa frustrada de resolver a equac¸a˜o do quinto grau. O me´todo se baseia num Teorema publicado por Lagrange em 1771 e que sera´ o resultado central desta sec¸a˜o. Antes de pas- sarmos ao Teorema faremos alguns preparativos. Seja A um domı´nio de integridade e k o seu corpo de frac¸o˜es. Sejam X1, . . . , Xn indeterminadas sobre k. A ac¸a˜o de Sn sobre A[X1, . . . , Xn] , conforme ja´ foi visto, se estende a k(X1, . . . , Xn) (= corpo de frac¸o˜es de A[X1, . . . , Xn]). Dado um subgrupo H de Sn, define-se Fix(H) = {ϕ ∈ k(X1, . . . , Xn) | σ(ϕ) = ϕ ∀ σ ∈ H}. E´ fa´cil verificar que Fix(H) e´ um subcorpo de k(X1, . . . , Xn) chamado corpo fixo de H . E´ claro que Fix[H ] = {p ∈ A[X1, . . . , Xn] | σ(p) = p ∀ σ ∈ H} esta´ contido em Fix(H) . Temos a seguinte proposic¸a˜o: PROPOSIC¸A˜O 6.1. Fix(H) e´ o corpo de frac¸o˜es de Fix[H ]. Demonstrac¸a˜o: E´ claro que o corpo de frac¸o˜es de Fix[H ] esta´ contido em Fix(H). Reciprocamente, seja ϕ ∈ Fix(H). Podemos escrever ϕ = p q com p, q ∈ k[X1, . . . , Xn], q 6= 0 e p e q primos entre si (lembre-se que k[X1, . . . , Xn] e´ um D.F.U.). Se σ ∈ H , temos que σ(ϕ) = σ ( p q ) = p q , logo 133 134 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE (σ(p)) · q = (σ(q)) · p. Sendo p e q primos entre si e´ fa´cil verificar que σp e σq sa˜o primos entre si, logo da u´ltima igualdade acima segue que σp e´ associado a p e que σq e´ associado a q. Existe enta˜o λσ ∈ k tal que σp = λσp e σ(q) = λσq. Sendo H finito, existe N ∈ N tal que σN = e para todo σ ∈ H , logo p = σNp = λNσ p e portanto λ N σ = 1 para todo σ ∈ H . Tome a ∈ A um mu´ltiplo dos denominadores dos coeficientes de p e de q. Logo ap e aq esta˜o em A[X1, . . . , Xn]. Temos enta˜o que ϕ = p q = ap·(aq) N−1 (aqN ) com ap · (aq)N−1 e (aq)N em A[X1, . . . , Xn] sa˜o tais que σap · (aq)N−1 = aλσp · (aλσq)N−1 = ap · (aq)N−1 e σ(aq)N = (aλσ) N = (aq)N . Portanto ϕ pertence ao corpo de frac¸o˜es de Fix[H ]. COROLA´RIO 6.1. Fix(Sn) = k(s1, . . . , sn). Dado ϕ ∈ k(X1, . . . , Xn), o conjunto G(ϕ) = {σ ∈ Sn | σ(ϕ) = ϕ} e´ um subgrupo de Sn. G(ϕ) e´ o grupo das permutac¸o˜es de Sn que deixam ϕ fixo. A importaˆncia da noc¸a˜o de classe lateral fica reforc¸ada com o seguinte Lema. LEMA 6.1. Sejam ϕ ∈ k(X1, . . . , Xn) e σ, τ ∈ Sn. σ(ϕ) = τ(ϕ) se, e so- mente se, σG(ϕ) = τG(ϕ). Demonstrac¸a˜o: σ(ϕ) = τ(ϕ) se, e somente se, (τ −1σ)(ϕ) = ϕ se, e so- mente se, τ−1σ ∈ G(ϕ) se, e somente se, σG(ϕ) = τG(ϕ). Se σ1G(ϕ), . . . σlG(ϕ), onde l = [Sn : G(ϕ)], sa˜o as classes laterais distin- tas em Sn relativamente ao subgrupo G(ϕ), tem-se que ao variar σ em Sn, σ(ϕ) assume os valores σ1(ϕ), . . . , σl(ϕ) dois a dois distintos. Estas notac¸o˜es sa˜o mantidas no Lema seguinte LEMA 6.2. Sejam ϕ ∈ k(X1, . . . , Xn) e σ1(ϕ), . . . , σl(ϕ) os valores de ϕ 135 pela ac¸a˜o de Sn. (i) Se σ ∈ Sn, enta˜o {σσ1(ϕ), . . . , σσl(ϕ)} = {σ1(ϕ), . . . , σl(ϕ)}. (ii) Seja ψ ∈ Fix(G(ϕ)). Se σσi(ϕ) = σj(ϕ), enta˜o σσi(ψ) = σj(ψ) (iii) Sejam f(X) ∈ k(X1, . . . , Xn)[X] e H um subgrupo de Sn. Se σf(X) = f(X) ∀ σ ∈ H, enta˜o f(X) ∈ Fix(H)[X] (iv) F (X) = (X − σ1(ϕ))(X − σ2(ϕ)) · · · (X − σl(ϕ)) ∈ Fix(Sn)[X] Demonstrac¸a˜o: (i) Seja σ ∈ Sn. Considere as classes laterais σσ1G(ϕ), . . . , σσlG(ϕ). Estas sa˜o duas a duas distintas pois se σσiG(ϕ) = σσjG(ϕ) com i 6= j, ter´ıamos σ−1j σi = σ −1 j σ −1σσi = (σσj) −1(σσi) ∈ G(ϕ), logo σiG(ϕ) = σjG(ϕ), o que e´ uma contradic¸a˜o. Portanto, σσ1G(ϕ), . . . , σσlG(ϕ) sa˜o as classes laterais a` esquerda relativa- mente a G(ϕ). Pelo Lema 1, segue que os valores que ϕ assume sob a ac¸a˜o de Sn sa˜o precisamente σσ1(ϕ), . . . , σσl(ϕ). (ii) Seja ψ ∈ Fix(G(ϕ)). Suponha que se tenha σσi(ϕ) = σj(ϕ), logo σ−1j σσi(ϕ) = ϕ e, portanto, σ −1 j σσi ∈ G(ϕ). Como ψ ∈ Fix(G(ϕ)), segue que σ−1j σσi(ψ) = ψ e consequ¨entemente σσi(ψ) = σj(ψ). (iii) Seja f(X) = a0 + a1X + · · ·+ amXm com ai ∈ k(X1, . . . , Xn) para i = 0, 1, . . . , m. Suponha que para todo σ ∈ Sn se tenha σf(X) = σa0 + (σa1)X + · · ·+ (σam)Xm = f(X). Identificando os coeficientes, obtemos a0 = σ(a0), . . . , am = σ(am) para todo σ ∈ Sn. Logo ai ∈ Fix(H) ∀ i = 0, 1, . . . , m e consequ¨entemente f(X) ∈ Fix(H)[X]. (iv) Pelo item (iii) basta mostrar que σf(X) = f(X) para todo σ ∈ Sn. Seja σ ∈ Sn. Temos que σf(X) = (X−σσ1(ϕ))(X−σσ2(ϕ)) · · · (X−σσl(ϕ)), logo pelo item (i) segue que σf(X) = f(X). TEOREMA 6.1 (Lagrange). Seja k um corpo e X1, . . . , Xn indetermina- das sobre k. Se ϕ ∈ k(X1, . . . , Xn) enta˜o Fix(G(ϕ)) = Fix(Sn)(ϕ). 136 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE Demonstrac¸a˜o: E´ fa´cil observar que Fix(Sn)(ϕ)) ⊆ Fix(G(ϕ)), pois se ψ ∈ Fix(Sn)(ϕ) tem-se que ψ = a0+a1ϕ+···+arϕrb0+b1ϕ+···+bsϕs com os ai e bj em Fix(Sn). Portanto para todo σ ∈ G(ϕ), tem-se que σ(ψ) = a0 + a1σ(ϕ) + · · ·+ ar(σ(ϕ))r b0 + b1σ(ϕ) + · · ·+ bs(σ(ϕ))s = a0 + a1ϕ+ · · ·+ arϕr b0 + b1ϕ+ · · ·+ bsϕs = ψ. Consequentemente ψ ∈ Fix(G(ϕ)). Reciprocamente, Seja ψ ∈ Fix(G(ϕ)). Para provar que ψ ∈ Fix(Sn)(ϕ), construiremos um polinoˆmio f(X) ∈ Fix(Sn)[X] tal que ψ = f(ϕ). Vejamos a propriedade que caracteriza o po- linoˆmio f(X). Sejam σ1G(ϕ), . . . σlG(ϕ) as classes laterais relativamente a G(ϕ). Se f(X) ∈ Fix(Sn)[X] e ψ = f(ϕ), enta˜o σi(ψ) = σi(f(ϕ)) = f(σi(ϕ)), portanto f(X) e´ o polinoˆmio que assume o valor σi(ψ) para x = σi(ϕ), onde i = 1, . . . , l. E´ fa´cil enta˜o construir o polinoˆmio f(X) que pela fo´rmula de interpolac¸a˜o de Lagrange se escreve: f(X) = F (X) (X−σ1ϕ) σ1ψ F ′(σ1ϕ) + F (X) (X−σ2ϕ)σ2ψ F ′(σ2ϕ) + · · ·+ F (X) (X−σlϕ) σlψ F ′(σlϕ) onde F (X) = (X − σ1(ϕ))(X − σ2(ϕ)) · · · (X − σl1(ϕ)). Por construc¸a˜o, f(X) e´ um polinoˆmio tal que ψ = f(ψ) e se σ ∈ Sn, enta˜o pelo Lema 2 (iv), σF (X) = F (X). Logo σf(X) = F (X) (X−σσ1ϕ) σσ1ψ F ′(σσ1ϕ) + F (X) (X−σσ2ϕ) σσ2ψ F ′(σσ2ϕ) + · · ·+ F (X) (X−σσlϕ) σσlψ F ′(σσlϕ) Pelo Lema 2 (i) e (ii), segue que σf(X) = f(X) e por (iii) segue enta˜o que f(X) ∈ Fix(Sn)[X]. A demonstrac¸a˜o acima nos mostra que ψ ∈ Fix(G(ϕ)) se escreve como polinoˆmio em ϕ com coeficientes em Fix(Sn) de grau menor do que l = [Sn : G(ϕ)] e nos fornece um modo pra´tico, por meio do polinoˆmio de interpolac¸a˜o de Lagrange de calcular a expressa˜o de ψ como polinoˆmio em ϕ. A fim de desfrutar do Teorema de Lagrange com toda a sua forc¸a, estabelecemos o seguinte TEOREMA 6.2. Seja A um domı´nio de integridade e X1, . . . , Xn indeter- minadas sobre A. Se H e´ um subgrupo de Sn, enta˜o existe ϕ ∈ A[X1, . . . , Xn] tal que H = G(ϕ). 137 Demonstrac¸a˜o: Primeiramente vamos mostrar que existe um polinoˆmio ξ ∈ A[X1, . . . , Xn] que assume n! valores distintos sob a ac¸a˜o de Sn. Observe que se A e´ infinito, basta tomar ξ = a1X1 + a2X2 + · · · + anXn com os ai ∈ A e dois a dois distintos. Se A e´ finito, e´ poss´ıvel que na˜o se disponha de suficientes elementos de A para formar somas nas condic¸o˜es acima. Para compensar isto, precisaremos tomar ξ de grau maior. Sejam σ1, σ2, . . . , σr, σr+1, . . . , σn! os elementos de Sn ordenados de modo que σ1 = e e H = {σ1, σ2, . . . , σr}. Para cada σi com i 6= j, seja ji um inteiro movido por σi. Tomemos ξ = Xj2 +X 2 j3 + · · ·+Xn!−1jn! . Certamente, σi(ξ) 6= ξ para todo σi ∈ Sn−{e}, logo σi(ξ) 6= σj(ξ) se σi 6= σj (verifique!). Considere agora o polinoˆmio g(T ) = (T − σ1(ξ))(T − σ2(ξ)) · · · (T − σr(ξ)) ∈ A[X1, . . . , Xn][T ] Seja σ ∈ H . Tem-se que σg(T ) = (T − σσ1(ξ))(T − σσ2(ξ)) · · · (T − σσr(ξ)) = g(T ), onde esta u´ltima igualdade segue do fato que se σ ∈ H, σσi assume todos os valores de H ao variar σi em H . Portanto, g(T ) ∈ Fix[H ][T ]. Por outro lado, σr+ig(T ) = (T − σr+iσ1(ξ))(T − σr+iσ2(ξ)) · · · (T − σr+iσr(ξ)), e como cada σr+iσj /∈ H para j = 1, . . . , r, tem-se que {σr+iσ1(ξ), σr+iσ2(ξ), . . . , σr+iσr(ξ)} ∩ {σ1(ξ), σ2(ξ), . . . , σr(ξ)} = Φ. Portanto σr+ig(T ) 6= g(T ) para todo i = 1, . . . n!− r. Considere os polinoˆmios na˜o identicamente nulos Gi(T ) = g(T )− σr+ig(T ) ∈ A[X1, . . . , Xn][T ] Sendo A[X1, . . . , Xn] um domı´nio de integridade, cada Gi(T ) tem no ma´ximo um nu´mero finito de ra´ızes em A[X1, . . . , Xn]. Como Fix[Sn] e´ infinito, ex- cluindo os eventuais zeros de algum dos polinoˆmios Gi(T ), podemos escolher ψ ∈ Fix[Sn] tal que Gi(ψ) 6= 0 para todo i = 1, . . . , n! − r. Logo g(ψ) e´ tal que σg(ψ) = g(ψ) para todo σ ∈ H e σg(ψ) = g(ψ) para todo σ /∈ H . Consequentemente H = G(ϕ) onde ϕ = g(ψ). 138 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE Se H = An, existe uma func¸a˜o ϕ padra˜o tal que An = G(ϕ), a saber ϕ = ∏ i<j (Xj −Xi). COROLA´RIO 6.2. Dado um subgrupo H de Sn, existe ϕ ∈ A[X1, . . . , Xn] tal que Fix(H) = Fix(Sn)(ϕ). Demonstrac¸a˜o: Observe que pelo Teorema 2, existe ϕ ∈ A[X1, . . . , Xn] tal que H = G(ϕ). Agora o Teorema de Lagrange nos permite concluir que Fix(H) = Fix(G(ϕ)) = Fix(Sn)(ϕ). Um caso particular do Corola´rio acima que merece destaque e´ quando A e´ infinito e H = {e}. Neste caso existem a1, a2, . . . , an ∈ A distintos tais que, colocando-se ϕ = a1X1 + a2X2 + · · ·+ anXn, tem-se que G(ϕ) = {e} e enta˜o K(X1, . . . , Xn) = Fix({e}) = Fix(Sn)(ϕ). LEMA 6.3. Sejam H e K subgrupos de Sn tais H ⊆ K. Todo elemento de Fix(H) e´ raiz de um polinoˆmio com coeficientes em Fix(K) de grau [K : H ]. Demonstrac¸a˜o: Sejam σ1H, σ2H, . . . , σrH as classes laterais de H em K, onde r = [K : H ]. Seja ϕ ∈ Fix(H) e considere o polinoˆmio F (X) = (X − σ1(ϕ))(X − σ2(ϕ)) · · · (X − σr(ϕ)). F (X) tem grau r = [K : H ], F (ϕ) = 0 e σF (X) = F (X) para todo σ ∈ K, consequentemente F (X) ∈ Fix(K)[X]. Passamos agora a` descric¸a˜o do me´todo de Lagrange. Sejam k um corpo qualquer e X1, X2, . . . , Xn indeterminadas sobre k. Estas indeterminadas sa˜o ra´ızes da equac¸a˜o a0+ a1X + · · ·+ anXn = 0 onde an−1 = −s1(X1, . . . , Xn), an−2 = s2(X1, . . . , Xn), ... a0 = (−1)nsn(X1, . . . , Xn) 139 O plano de Lagrange era tentar calcular X1, X2, . . . , Xn em func¸a˜o de a1, a2, . . . , an−1, usando a seguinte estrate´gia: Determinar uma sequ¨eˆncia de subgrupos de Sn: {e} ⊆ Hr ⊆ Hr−1 ⊆ · · · ⊆ H1 ⊆ H0 = Sn e polinoˆmios ϕ0, ϕ1, . . . ϕr ∈ k[X1, X2, . . .Xn] tais que Hi = G(ϕi) para i = 0, 1, . . . , n (Teorema 2). Cada ϕi i = 1, . . . , r e´ raiz de um polinoˆmio pi(X) com coeficientes em Fix(Hi) = Fix(Sn)(ϕi) de grau [Hi−1 : Hi] (Lema 3). Estes polinoˆmios se calculam com a te´cnica usada na demonstrac¸a˜o do Lema 3. As equac¸o˜es p1(X) = 0, p2(X) = 0 , . . . , pn(X) = 0. sa˜o chamadas resolventes de Lagrange. Para melhor compreensa˜o fac¸amos o seguinte diagrama k(X1, . . . , Xn) = k(s1, . . . , sn)(ϕr) ← {e} = Hr = G(ϕr) / \ pr(X) = 0 ∪ ∩ [Hr−1 : Hr] \ / k(s1, . . . sn)(ϕr−1) ← Hr−1 = G(ϕr−1) ∪ ∩ ... ... ∪ ∩ k(s1, . . . sn)(ϕ1) ← H1 = G(ϕ1) / \ p1(X) = 0 ∪ ∩ [H0 : H1] \ / k(s1, . . . , sn) = k(s1, . . . , sn)(ϕ0) ← Sn = H0 = G(ϕ0) A esperanc¸a de Lagrange era que as suas resolventes fossem mais simples de se resolver do que a equac¸a˜o original. Para isto conta-se com a possibi- lidade de escolher a sequ¨eˆncia dos subgrupos, os ϕi e tambe´m k segundo as convenieˆncias. Resolvendo-se p1(X) = 0 140 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE onde p1(X) ∈ Fix(H0)[X] = k(s1, . . . , sn) = k(a0, . . . , an−1)[X], calcular-se- ia ϕ1 em func¸a˜o de a0, . . . , an−1. Resolvendo-se p2(X) = 0 onde p2(X) ∈ Fix(H1)[X] = k(s1, . . . , sn)(ϕ1)[X] = k(a0, . . . , an−1)(ϕ1)[X], calcular-se-ia ϕ2 em func¸a˜o de ϕ1 e de a0, . . . , an−1, logo em func¸a˜o de a0, . . . , an−1. Continuando deste modo e finalmente resolvendo a equac¸a˜o pr(X) = 0 calcular-se-ia ϕr em func¸a˜o de a0, . . . , an−1. Como Xi ∈ k(X1, . . . , Xn) que e´ igual a Fix(G(ϕr)) , usando a te´cnica utilizada na demonstrac¸a˜o do Teorema de Lagrange, poder-se-ia calcular Xi em func¸a˜o de a0, . . . , an−1 e de ϕr e portanto em func¸a˜o de a0, . . . , an−1, ficando assim resolvida a equac¸a˜o. Veremos agora como Lagrange utilizou com sucesso esta estrate´gia para resolver as equac¸o˜es gerais do 30 e 40 graus e a dificuldade na qual esbarrou na tentativa de resolver a equac¸a˜o de 50 grau. Exemplo 1 : Resoluc¸a˜o de Lagrange da equac¸a˜o geral do 30 grau. Sejam X1, X2, X3 indeterminadas sobre um corpo k. Supo˜e-se que k seja um subcorpo de C. X1, X2, X3 sa˜o ra´ızes do polinoˆmio a0 + a1X + a2X 2 +X3 (6.1) onde a2 = −s1(X1, X2, X3), a1 = s2(X1, X2, X3) e a0 = −s3(X1, X2, X3). E´ claro que k(a0, a1, a2) = k(s0, s1, s2) = Fix(Sn). Considere a seguinte sequ¨eˆncia de subgrupos de S3: {e} ⊂ A3 ⊂ S3. Sejam ψ = X1 + aX2 + bX3 com a, b ∈ k, a 6= 1, b 6= 1, a 6= b e ϕ = (X2 −X1)(X3 −X2)(X3 −X1). Temos que {e} = G(ψ) e A3 = G(ψ). Temos enta˜o a seguinte situac¸a˜o: 141 k(X1, X2, X3) = k(a0, a1, a2)(ψ) ← {e} \ ∪ ∩ [A3 : {e}] = 3 / k(a0, a1, a2)(ϕ) ← A3 \ ∪ ∩ [S3 : A3] = 2 / k(a0, a1, a2) ← S3 Pelo fato que [S3 : A3] = 2 segue que ϕ e´ raiz de uma equac¸a˜o de grau 2 com coeficientes em k(a0, a1, a2). De fato, ϕ 2 = −D onde D e´ o discriminante do polinoˆmio (1) (veja Proposic¸a˜o 1, Cap´ıtulo ?? sec¸a˜o ??), logo ϕ e´ uma das ra´ızes da equac¸a˜o X2 +D = 0 que simbolizaremos por √−D. Como [A3 : {e}] = 3, segue que ψ e´ raiz de uma equac¸a˜o com coeficientes em k(a0, a1, a2)(ϕ) = k(a0, a1, a2)( √−D) de grau 3. Sendo A3 formado pelas permutac¸o˜es σ1 = ( 1 2 3 1 2 3 ) , σ2 = ( 1 2 3 3 1 2 ) e σ3 = (1 2 3 2 3 1 ) temos que a equac¸a˜o satisfeita por ψ e´ (X − σ1(ψ))(X − σ2(ψ))(X − σ3(ψ)) = 0. Ou seja, X3 − s1(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ)X2 + s2(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ)X − s3(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ) = 0 (6.2) Poder-se-ia calcular facilmente o valor de ψ, se nesta equac¸a˜o os coefici- entes dos termos de 20 e do 10 graus fossem nulos. Como ψ depende de a e b, vejamos como e´ poss´ıvel, com uma escolha adequada destes, alcanc¸ar o que se deseja. Contas diretas, pore´m um pouco longas, nos fornecem s1(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ) = (1 + a+ b) · s1(X1, X2, X3) s1(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ) = (a+ ab+ b) · s21(X1, X2, X3)X+ (1− a− b− ab+ a2 + b2) · s2(X1, X2, X3) 142 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE Para que se anulem estas func¸o˜es das ra´ızes, sendo as func¸o˜es sime´tricas elementares algebricamente independentes (Corola´rio 1 do Teorema 1, sec¸a˜o 4), e´ necessa´rio e suficiente que 1 + a+ b = 0 a+ ab+ b = 0 a2 + b2 − ab− a− b+ 1 = 0 Das equac¸o˜es duas primeiras equac¸o˜es acima obtemos a+b = −1 e ab = 1, logo a e b sa˜o ra´ızes da equac¸a˜o X2 +X + 1 = 0 e estas sa˜o w = −1+ √ 3 i 2 e w2 = −1− √ 3 i 2 . Pomos enta˜o a = w e b = w2 o que e´ compat´ıvel com a u´ltima equac¸a˜o. Passamos agora a` escolha do corpo k de modo que ele contenha w e w2. O menor subcorpo k de C que contem w e w2 e´ k = Q(w). Assim ψ = X1 + wX2 +W 2X3 e s3(σ1ψ, σ2ψ, σ3ψ) = ψ · wψ · w2ψ = ψ3, logo a equac¸a˜o (2) passa a ser X3 − ψ3 = 0 (6.3) Como este polionoˆmio esta´ em k(a0, a1, a2)( √−D), segue que facilmente que ψ3 ∈ k(a0, a1, a2)( √−D). Sendo A3 e τ1A3, onde τ1 = ( 1 2 3 1 3 2 ) , as classes laterais em S3 em relc¸a˜o ao subgrupo A3, tem-se que ψ 3 e´ raiz do polinoˆmio (X − ψ3)(X − τ1ψ3) ∈ k(a0, a1, a2) (6.4) Pelo exemplo 6 e exerc´ıcio 9, Cap´ıtulo 11, sec¸a˜o 1, podemos obter que ψ · τ1ψ = −3a1 + a22 e substituindo os valores de ψ3, τ1ψ3 e ψ3 + τ1ψ3 al´ı encontrados na equac¸a˜o acima, temos que ψ3 e τ1ψ 3 sa˜o ra´ızes da equac¸a˜o X2 − (−2a32 + 9a1a2 − 27a0)X + (−3a1 + a22)3 = 0 (6.5) Temos enta˜o que ψ3 = −2a32+9a1a2−27a0+ √ (−2a32+9a1a2−27a0)2−4(−3a1+a22)3 2 e τ1ψ 3 = −2a32+9a1a2−27a0− √ (−2a32+9a1a2−27a0)2−4(−3a1+a22)3 2 143 Extraindo as ra´ızes cu´bicas das expresso˜es acima, levando em conta que se tem ψ · τ1ψ = −3a1 + a22, obtemos o seguinte sistema de equac¸o˜es lineares X1 +X2 +X3 = −a2 X1 + wX2 + w 2X3 = ψ X1 + w 2X2 + wX3 = τ1ψ cuja resoluc¸a˜o nos fornecem as fo´rmulas de Cardan. Exemplo 2 : Resoluc¸a˜o de Lagrange da equac¸a˜o geral do 40 grau. Sejam X1, X2, X3, X4 indeterminadas sobre um subcorpo k do corpo dos nu´meros complexos. Estas sa˜o ra´ızes do polinoˆmio X4 + a3X 3 + a2X 2 + a1X + a0 onde a3 = −s1(X1, X2, X3, X4) a2 = s2(X1, X2, X3, X4) a1 = −s3(X1, X2, X3, X4) a0 = s4(X1, X2, X3, X4) Considere a seguinte sequ¨eˆncia de subgrupos de S4: {e} ⊂ G4 ⊂ G8 ⊂ S4, onde G8 = {e, (1 2), (3 4), (1 2)(3 4), (1 3)(2 4), (1 4)(2 3), (1 4 2 3), (1 3 2 4)} e G4 = {e, (1 2), (3 4), (1 2)(3 4)} Seja ϕ1 = X1+X2−X3−X4. E´ fa´cil verificar que G8 = G(ϕ21) e G4 = G(ϕ1). Temos enta˜o 144 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE k(X1, X2, X3, X4) ← {e} \ ∪ ∩ [G4 : {e}] = 4 / k(a0, a1, a2, a3)(ϕ1) ← G4 \ ∪ ∩ [G8 : G4] = 2 / k(a0, a1, a2, a3)(ϕ 2 1) ← G8 \ ∪ ∩ [S4 : G8] = 3 / k(a0, a1, a2, a3) ← S4 Como [S4 : G8] = 3, ϕ 2 1 assume tres valores distintos sob a ac¸a˜o de S4, que sa˜o ϕ21, ϕ 2 2 e ϕ 2 3 onde ϕ2 = X1+X3−X2−X4 e ϕ3 = X1+X4−X2−X3. Logo ϕ21 e´ raiz do polinoˆmio (X − ϕ21)(X − ϕ22)(X − ϕ23) = = X3 − σ1(ϕ21, ϕ22, ϕ23)X2 + σ2(ϕ21, ϕ22, ϕ23)X − σ3(ϕ21, ϕ22, ϕ23) ∈ k(a0, a1, a2, a3). Ca´lculos diretos (pore´m tediosos) nos fornecem σ1(ϕ 2 1, ϕ 2 2, ϕ 2 3) = 3a 3 2 − 8a2 σ2(ϕ 2 1, ϕ 2 2, ϕ 2 3) = 3a 4 3 − 16a3a1 + 16a22 − 64a0 σ3(ϕ 2 1, ϕ 2 2, ϕ 2 3) = (a 3 3 − 4a3a2 + 8a1)2 Temos enta˜o que ϕ21, ϕ 2 2 e ϕ 2 3 sa˜o ra´ızes da seguinte resolvente de Lagrange: X3− (3a32−8a2)X2+(3a43−16a3a1+16a22−64a0)X− (a33−4a3a2+8a1)2. Calculando os valores de ϕ21, ϕ 2 2 e ϕ 2 3, os valores de (ϕ1, ϕ2 e ϕ3) se calcu- lam por extrac¸a˜o de ra´ızes quadradas. Temos enta˜o o seguinte sistema: X1 +X2 +X3 +X4 = −a3 X1 +X2 −X3 −X4 = ϕ1 X1 −X2 +X3 −X4 = ϕ2 X1 −X2 −X3 +X4 = ϕ3 145 cuja resoluc¸a˜o nos fornecem as ra´ızes X1, X2, X3 e X4 em func¸a˜o dos coefici- entes a0, a1, a2 e a3. Exemplo 3 : Dificuldade de Lagrange na tentativa de resolver a equac¸a˜o do 50 grau. Sejam X1, X2, X3, X4 e X5 indeterminadas sobre um corpo k. Estas sa˜o ra´ızes da equac¸a˜o X5 + a4X 4 + a3X 3 + a2X 2 + a1X + a0 = 0 com os ai, como de costume, sendo as func¸o˜es sime´tricas elementares em X1, X2, X3, X4 e X5. A dificuldade ocorre na hora de escolher os subgrupos de S5: 10 Caso: Se a sequ¨eˆncia e´ {e} ⊂ · · · ⊂ G ⊂ A5 ⊂ S5, sucede que [A5 : G ≥ 5]. 20 Caso: Se a sequ¨eˆncia e´ {e} ⊂ · · · ⊂ G ⊂ S5 com G 6= A5, sucede que [S5 : G] ≥ 5. Estes fatos sera˜o demonstrados no Cap´ıtulo 9 sec¸a˜o .... Tem-se enta˜o que as primeiras resolventes de Lagrange ja´ sa˜o de grau no mı´nimo 5 e portanto na˜o ocorre abaixamento do grau da equac¸a˜o original. Isto sugere, pore´m na˜o prova, que as equac¸o˜es do 50 grau na˜o possam ser resolvidas por radicais, pois, poderia ocorrer que as resolventes de Lagrange, apesar de grau alto, fossem mais fa´ceis de ser resolvidas do que a equac¸a˜o original. A impossibilidade da resoluc¸a˜o por meio de radicais da equac¸a˜o geral do 50 grau foi demonstrada poucos anos depois por P. Ruffini cuja demonstrac¸a˜o continha ainda algumas falhas. Posteriormente N. H. Abel demonstrou definitivamente este fato. A demonstrac¸a˜o que se usa dar atualmente deste fato e´ a de Galois e sera´ feita no cap´ıtulo 9. 146 CAPI´TULO 6. O ME´TODO DE LAGRANGE Cap´ıtulo 7 EXTENSO˜ES DE CORPOS Iniciaremos neste cap´ıtulo o estudo de um dos assuntos mais importantes da A´lgebra cuja origem se confunde com a Teoia de Galois cujos objetivos sa˜o extenso˜es particulares de corpos relacionados com equac¸o˜es alge´bricas. A teoria elementar que desenvolveremos neste ca´ıtulo sera´ suficiente para discu- tirmos na sec¸a˜o ... alguns problemas geome´tricos cla´ssicos como por exemplo a possibilidade de realizar ou na˜o certas construc¸o˜es geome´tricas com o uso apenas da re´gua e do compasso. Necessitaremos de alguns pre´-requisitos de A´lgebra Linear tais como as noc¸o˜es de espac¸o vetorial, subespac¸o vetorial, dimensa˜o e base com os quais admitimos o leitor familiarizado. 7.1 A A´lgebra Linear da Extensa˜o de Corpos Sejam L e K dois corpos tais que K e´ um subcorpo de L. Recorde que nesta situac¸a˜o dizemos que L e´ uma extensa˜o deK e escrevemos L|K ou L | K . Se L e´ uma extensa˜o de K, enta˜o L e´ um K-espac¸o vetorial. Define-se o grau da extensa˜o L | K, denotando-se por [L : K], como sendo a dimensa˜o de L como K-espac¸o vetorial. Se o grau da extensa˜o L | K for finito, dizemos que L e´ uma extensa˜o finita de K, ou simplesmente que L |K e´ finita. Por exemplo, C | R e´ uma 147 148 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS extensa˜o finita pois {1, i} e´ uma base de C sobre R. Por outro lado, se X e´ uma indeterminada sobre um corpo K, enta˜o a extensa˜o K(X) |K na˜o e´ finita pois {1, X,X2, . . .} sa˜o linearmente independentes sobre K, e portanto K(X) na˜o e´ de dimensa˜o finita sobre K. SeM |L e L|K sa˜o extenso˜es de corpos, enta˜o claramenteM |K e´ uma ex- tensa˜o. Vejamos agora como se comporta a finitude das extenso˜es em cadeias. PROPOSIC¸A˜O 7.1. Sejam M | L e L |K extenso˜es finitas. Enta˜o M |K e´ finita e [M : K] = [M : L] · [L : K]. Demonstrac¸a˜o: Sejam B1 = {u1, . . . , un} e B2 = {v1, . . . , vm} respectiva- mente bases de M | L e L |K. Vamos provar que B = {wij = uivj | i = 1, . . . , n, j = 1, . . . , m} e´uma base de M |K. Inicialmente provaremos que B gera M sobre K. Seja γ ∈ M . Como B1 e´ uma base de M | L, existem a1, . . . , an ∈ L tais que γ = n∑ i=1 aiui. Como cada ai pertence a L e como L e´ gerado sobre K por B2, existem bij ∈ K, i = 1, . . . , n, j = 1, . . . , m tais que ai = m∑ i=1 bijvj , i = 1, . . . , n. Substiutuindo a expressa˜o de ai dada acima na expresa˜o de γ obtemos γ = n∑ i=1 ( m∑ j=1 bijvj ) ui = n∑ i=1 m∑ j=1 bijuivj = ∑ i,j bijwij. com bij ∈ K. Isto prova que B gera M sobre K. Vamos agora provar que B e´ um conjunto de elementos deM linearmente independente sobre K. Suponha que para alguns bij ∈ K se tenha∑ i,j bijwij = 0 7.1. A A´LGEBRA LINEAR DA EXTENSA˜O DE CORPOS 149 segue que 0 = ∑ i,j bijwij = ∑ i (∑ j bijvj ) ui. Como ∑ j bijvj ∈ L e {u1, . . . , un} e´ linearmente independente sobre L, temos que ∑ j bijvj = 0 para cada i = 1, . . . , n. Por sua vez, {v1, . . . , vm} e´ linearmente independente sobre K e os bij sa˜o ele- mentos de K, logo bij = 0, para todos i = 1, . . . , n e j = 1, . . . , m, provando assim que B e´ um conjunto de elementos de M linearmente independente sobre K. Sejam L |K uma extensa˜o de corpos e α ∈ L. Diremos que α e´ alge´brico sobre K se existir um polinoˆmio p(X) ∈ K[X]−{0} tal que p(α) = 0. Entre todos os polinoˆmios p(X) tais que p(α) = 0 existe um que se destaca sobre os demais como veremos a seguir. PROPOSIC¸A˜O 7.2. Sejam uma extensa˜o e alge´brico sobre K. Sa˜o equiva- lentes as seguintes condic¸o˜es sobre um polinoˆmio p(X) ∈ K[X]− {0}. (i) p(X) e´ irredut´ıvel em K[X] e p(α) = 0. (ii) Se q(X) ∈ K[X] e q(α) = 0 enta˜o p(X) | q(X). (iii) p(X) e´ um polinoˆmio de menor grau tal que p(α) = 0. Ale´m disso, de todos os polinoˆmios p(X) satisfazendo uma das condic¸o˜es equivalentes acima, existe um u´nico que e´ moˆnico. Demonstrac¸a˜o: Considere o conjunto I = {q(X) ∈ K[X] | q(α) = 0}. E´ fa´cil ver que este conjunto e´ um ideal na˜o nulo de K[X]. Por outro lado, este ideal e´ primo pois se q1(X), q2(X) ∈ K[X] sa˜o tais que q1(X) · q2(X) ∈ I, segue que q1(α) · q2(α) = 0, portanto, q1(α) = 0 ou q2(α) = 0 e consequente- mente, q1(X) ∈ I ou q2(X) ∈ I. Note que K[X] sendo um domı´nio principal, I e´ gerado por um polinoˆmio p(X) caracterizado por (ii) e por (iii). Sendo I primo, I e´ gerado por um elemento primo (cf....), o que e´ o mesmo que irredut´ıvel visto que K[X] e´ um D.F.U. Esta u´ltima condic¸a˜o sobre o gerador de I e´ caracterizado por (i). A unicidade de p(X) moˆnico satisfazendo a uma 150 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS das condic¸o˜es acima decorre da unicidade do gerador moˆnico do ideal I. O u´nico polinoˆmio moˆnico satisfazendo a uma das condic¸o˜es equivalentes da Proposic¸a˜o 2 e´ chamado polinoˆmio mı´nimo de α. Define-se o grau de um elemento alge´brico α ∈ L sobre K como sendo o grau do seu polinoˆmio mı´nimo. Exemplo 1 : √ 2 e´ alge´brico sobre Q pois e´ raiz do polinoˆmio p(X) = X2−2 que tem coeficientes em Q. Como este polinoˆmio e´ irredut´ıvel em Q[X] (jus- tifique!), ele e´ o polinoˆmioo mı´nimo de √ 2. Portanto √ 2 e´ de grau 2 sobre Q. Exemplo 2 : 3 √ 2 e´ alge´brico de grau 3 sobre Q com polinoˆmio mı´nimo p(X) = X3 − 2 ∈ Q[X], que e´ irredut´ıvel pelo crite´rio de Einsenstein. Exemplo 3 : Todo elemento α ∈ K e´ alge´brico de grau 1 sobre K com polinoˆmio mı´nimo p(X) = X − α ∈ K[X]. Exemplo 4 : Todo nu´mero racional gaussiano, isto e´ da forma a+ b i com a, b ∈ Q, e´ alge´brico sobre Q pois e´ raiz do polinoˆmio p(X) = X2 − 2aX + a2 + b2. Logo o grau de a + b i sobre Q e´ menor ou igual a 2. Verifica-se facilmente que o grau e´ dois se e somente se b 6= 0. Exemplo 5 : α = 3 √ 2 + √ 5 e´ alge´brico sobre Q. De fato, elevando-se ao cubo ambos os membros da igualdade α−√5 = 3√2, obtemos imediatamente α3 − 3√5α2 + 15α− 5√5 = 2, donde α3 + 15α− 2 = (3 √ 5α2 + 5) √ 5 (7.1) Elevando ao quadrado ambos os membros desta u´ltima igualdade, vemos que α e´ raiz do polinoˆmio p(X) = X6−15X4−4X3+75X2−60X−121 ∈ Q[X]. Note que nada sabemos ainda sobre a irredutibilidade ou na˜o do polinoˆmio p(X) do exemplo acima. Os crite´rios de irredutibilidade que estudamos no Cap´ıtulo 3 nada nos permitem concluir em relac¸a˜o a isto e o me´todo de fa- torac¸a˜o de Kronecker esta´ fora de cogitac¸a˜o pela extensa˜o dos ca´lculos que sa˜o envolvidos. Veremos mais adiante como o conhecimento da origem de p(X) nos permitira´ provar a sua irredutibilidade. 7.1. A A´LGEBRA LINEAR DA EXTENSA˜O DE CORPOS 151 Uma extensa˜o L |K e´ dita uma extensa˜o alge´brica se todo elemento de L e´ alge´brico sobre K. PROPOSIC¸A˜O 7.3. Toda extensa˜o finita e´ alge´brica. Demonstrac¸a˜o: Sejam L|K uma extensa˜o finita e α ∈ L. Para n = [L : K] temos que e´ {1, α, . . . , αn} e´ linearmente dependente sobre K e isto nos for- nece uma relac¸a˜o a0 + a1α + · · · + anαn = 0 com ai ∈ K na˜o todos nulos. Logo α e´ alge´brico sobre K. Dada uma extensa˜o L |K, todo elemento de L que na˜o e´ alge´brico sobre K e´ dito transcendente sobre K. Todo nu´mero complexo alge´brico sobre Q e´ chamado de nu´mero alge´brico, caso contra´rio ele e´ chamado de nu´mero transcendente. Existem dois nu´meros transcendentes famosos, o nu´mero e, base dos logaritmos naturais, e o nu´mero pi, raza˜o entre o comprimento de uma circunfereˆncia e o seu diaˆmetro. A transcendeˆncia desses nu´meros so´ foi demonstrada no final do se´culo XIX e se constitue em dois teoremas na˜o triviais que se demonstram com te´cnicas de Ana´lise Matema´tica. Com relac¸a˜o aos elementos alge´bricos temos o seguinte resultado funda- mental PROPOSIC¸A˜O 7.4. Seja α um nu´mero alge´brico sobre K e seja n o grau do seu polinoˆmio mı´nimo. Enta˜o [K(α) : K] = n e {1, α, . . . , αn−1} e´ uma base de K(α) sobre K. Demonstrac¸a˜o: Seja p(X) o polinoˆmio mı´nimo de α sobre K. A aplicac¸a˜o ψ : K[X] −→ L f(X) 7−→ f(α) e´ um homomorfismo de ane´is cujo nu´cleo e´ precisamente o ideal I = {g(X) ∈ K[X] | g(α) = 0}, que definimos na demonstrac¸a˜o da Proposic¸a˜o 2. Como α e´ alge´brico, temos que I 6= 0 e e´ gerado por p(X) que e´ primo. Logo I e´ maximal (cf......). Pelo Teorema do Isomorfismo (I-7 ........) temos que K[X] I −˜→ Im(ψ) = K(α) 152 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS Sendo K[X] I um corpo (cf. I-7....) temos que K[α] e´ um corpo e portanto K[α] = K(α). Vamos agora provar que {1, α, . . . , αn−1} gera K(α) sobre K. Seja β ∈ K(α). Pela igualdade K[α] = K(α), existe f(X) ∈ K[X] tal que β = f(α). Pelo algoritmo da divisa˜o em K[X], existem polinoˆmios q(X), r(X) ∈ K[X] com r(X) = a0 + a1X + · · ·+ an−1Xn−1 tais que f(X) = p(X)q(X) + a0 + a1X + · · ·+ an−1Xn−1. Logo f(α) = p(α)q(α)+a0+a1α+· · ·+an−1αn−1 = a0+a1α+· · ·+an−1αn−1, e portanto K(α) e´ gerado por {1, α, . . . , αn−1} sobre K. Falta agora verificar que o conjunto {1, α, . . . , αn−1} e´ linearmente inde- pendente sobre K. Ora, suponha que existam a0, a1, . . . , an−1 ∈ K tais que a0 + a1α+ · · ·+ an−1αn−1 = 0. Como n e´ o grau do polinoˆmio mı´nimo de α, segue que a0 = a1 = . . . = an−1 = 0 . Exemplo 6 : Da Proposic¸a˜o 3 e dos Exemplos 1, 3 e 5 temos que Q (√ 2 ) = {a+ b√2 | a, b ∈ Q} Q ( 3 √ 2 ) = {a+ b 3√2 + 3√4 | a, b, c ∈ Q} Exemplo 7 : Entre Q( 3 √ 2) e Q na˜o ha´ corpos intermedia´rios pois [Q( 3 √ 2) : Q] = 3 e para todo corpo intermedia´rio K, devemos ter: se n = [K : Q] enta˜o n divide 3 e n 6= 1, 3, o que e´ imposs´ıvel. PROPOSIC¸A˜O 7.5. Sejam L|K uma extensa˜o de corpos e α1, . . . , αr ∈ L. As seguintes condic¸o˜es sa˜o equivalentes: (i) α1, . . . , αr sa˜o alge´bricos sobre K. (ii) [K(α1, . . . , αr) : K] <∞. (iii) K(α1, . . . , αr) |K e´ uma extensa˜o alge´brica. Demonstrac¸a˜o: (i) → (ii): Segue das Proposic¸o˜es 1 e 4 e induc¸a˜o, considerando-se as seguintesextenso˜es intermedia´rias K(α1) |K, K(α1, α2) |K(α1) e K(α1, . . . , αr) |K(α1, . . . , αr−1). (ii)→ (iii): Segue da Proposic¸a˜o 3. (iii)→ (i): Segue da definic¸a˜o de extensa˜o alge´brica. 7.1. A A´LGEBRA LINEAR DA EXTENSA˜O DE CORPOS 153 COROLA´RIO 7.1. Seja L |K uma extensa˜o de corpos. O conjunto A dos elementos de L que sa˜o alge´bricos sobre K e´ um subcorpo de L. Demonstrac¸a˜o: Basta mostrar que se α, β ∈ A enta˜o α−β ∈ A e se β 6= 0 enta˜o α β ∈ A (cf. I-7......). Ora, se α, β ∈ A, enta˜o pela Proposic¸a˜o 5 temos que K(α, β) | K e´ finita, logo novamente pela Proposic¸a˜o 5, todo elemento de K(α, β) e´ alge´brico sobre K e portanto α−β ∈ A e se β 6= 0, enta˜o α β ∈ A. Segue do corola´rio acima que o conjunto AQ dos nu´meros reais alge´bricos sobre Q e´ um corpo que e´ uma extensa˜o de Q, chamado corpo dos nu´meros reais alge´bricos. Esta extensa˜o e´ alge´brica mas na˜o finita, mostrando assim que na˜o vale a rec´ıproca da Proposic¸a˜o 3. De fato, o polinoˆmio Xn − 2 ∈ Q e´ irredut´ıvel para todo n ∈ N (Crite´rio de Einsenstein), logo Q[ n√2] e´ um subcorpo de AQ de grau n sobre Q (Proposic¸a˜o 4). Como n e´ arbitra´rio, vemos que [AQ : Q] =∞. Segue disto que [R : Q] =∞ . Exemplo 8 : Vamos determinar o grau da extensa˜o Q(α) | Q introduzida no Exemplo 5, onde α = 3 √ 2 + √ 5. Inicialmente demonstraremos que Q ( 3 √ 2 + √ 5 ) = Q ( 3 √ 2, √ 5 ) . De fato, e´ claro que Q ( 3 √ 2 + √ 5 ) ⊆ Q ( 3√2,√5). Por outro lado, da relac¸a˜o (..) no Exemplo 5, temos que √ 5 = α3 + 15α− 2 3α2 + 5 ∈ Q(α). e portanto 3 √ 2 = α− √ 5 = α− α 3 + 15α− 2 3α2 + 5 ∈ Q(α). Considere agora o seguinte diagrama de extenso˜es com as respectivas di- menso˜es Q ( 3 √ 2 + √ 5 ) = Q ( 3 √ 2, √ 5 ) / \ Q ( 3 √ 2 ) Q (√ 5 ) \ 3 2 / Q 154 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS Como pelo Exemplo 5 temos que [Q(α) : Q] = n < 6 e que pela Proposic¸a˜o 1 2 | n e 3 | n, segue que n = 6. Logo [Q(α) : Q] = 6 e o polinoˆmio p(X) = X6 − 15X4 − 4X3 + 75X2 − 60X − 121 e´ o polinoˆmio mı´nimo de α = 3 √ 2 + √ 5 sobre Q e portanto irredut´ıvel em Q[X]. Ale´m disso temos Q(α) = {a0 + a1α + a2α2 + a3α3 + a4α4 + a5α5 | ai ∈ Q, i = 1, . . . , 5}. Exemplo 9 : Seja K um corpo de caracter´ıstica diferente de 2. Se L |K e´ uma extensa˜o de grau 2, enta˜o existe α ∈ L tal que L = K(α) e α2 ∈ K. De fato, se β ∈ L\K, enta˜o {1, β} e´ uma base de L sobre K e L = K(β). Tem-se portanto que existem a, b ∈ K tais que β2 = a+ bβ, logo( β − b 2 )2 = a + b2 4 . Ponhamos α = β − b 2 . Como α ∈ L\K temos que {1, α} e´ uma base de L sobre K, logo L = K(α) com α2 = a+ b2 4 ∈ K. Os seguintes resultados dizem respeito a`s extenso˜es alge´bricas: PROPOSIC¸A˜O 7.6. SejamM |L e L |K extenso˜es alge´bricas, enta˜o M |K e´ alge´brica. Demonstrac¸a˜o: Seja α ∈M . ComoM |L e´ alge´brica, existe um polinoˆmio p(X) = a0+a1X+· · ·anXn ∈ L[X] tal que p(α) = 0. Segue que α e´ alge´brico sobre K(a0, . . . , an), logo, pela Proposic¸a˜o 5, temos que [K(a0 . . . , an, α) : K(a0, . . . , an)] <∞. Por sua vez, sendo a0, a1, . . . , an ∈ L, eles sa˜o alge´bricos sobre K e portanto, pela Proposic¸a˜o 5, [K(a0, . . . , an) : K] <∞. Pela Proposic¸a˜o 1, segue enta˜o que [K(a0, . . . , an, α) : K] = = [K(a0, . . . , an, α) : K(a0, . . . , an)] · [K(a0, . . . , an) : K] <∞. 7.1. A A´LGEBRA LINEAR DA EXTENSA˜O DE CORPOS 155 Logo, pela Proposic¸a˜o 5, α e´ alge´brico sobre K. A rec´ıproca da Proposic¸a˜o 6 e´ trivialmente verdadeira. PROPOSIC¸A˜O 7.7. Uma extensa˜o L |K e´ alge´brica se, e somente se, todo subanel de L que conte´m K e´ um corpo. Demonstrac¸a˜o: Suponha que L |K seja uma extensa˜o alge´brica e seja A um subanel de L que conte´m K. Queremos provar que 1 α ∈ A para todo α ∈ A− {0}. De fato, sendo L |K alge´brica, existe uma relac¸a˜o polinomial em α com coeficientes em K, a0 + a1α + · · ·+ αn = 0, com a0 6= 0. Logo, 1 α = − ( a1 a0 + a2 a0 α+ · · ·+ an−1 a0 αn−2 + αn−1 ) ∈ A Reciprocamente, suponha que todo subanel A de L que conte´m K seja um corpo. Seja α ∈ L−{0}. Considere o subanel K[α] de L. Por hipo´tese K[α] e´ um corpo, logo 1 α ∈ K[α], e portanto, existem a0, a1, . . . , an ∈ K tais que 1 α = a0 + a1α + · · ·+ anαn, logo, anαn+1 + · · ·+ a1α2 + a0α − 1 = 0 e´ uma relac¸a˜o polinomial na˜o trivial em α com coeficientes em K, logo α e´ alge´brico sobre K. Com isto provamos que L |K e´ uma extensa˜o alge´brica. COROLA´RIO 7.2. Sejam L |K uma extensa˜o de corpos e α1, . . . , αr ∈ L. Os elementos α1, . . . , αr sa˜o alge´bricos sobre K se, e somente se, vale a igualdade K[α1, . . . , αr] = K(α1, . . . , αr). PROBLEMAS 7.1. 1. Para cada nu´mero real α abaixo determine o seu polinoˆmio mı´nimo e uma base de Q[α] | Q. a) α = 3 √ 2 + √ 2 b) α = 4 √ 1 + √ 3 c) α = 1√ 5+ √ 3 d) α = √ 2 + √ 3 e) α = √ 2 + √ 2 + √ 2 f) α = 1 + 5 √ 4 2. (a) Mostre que √ 2 + √ 3 e´ alge´brico sobre Q. (b) Mostre que Q (√ 2 + √ 3 ) = Q (√ 2, √ 3 ) . 156 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS (c) Calcule o polinoˆmio mı´nimo de √ 2+ √ 3 sobre Q e determine uma base de Q (√ 2 + √ 3 ) sobre Q. 3. (a) Mostre que Q ( i, 3 √ 2 ) = Q ( i+ 3 √ 2 ) . (b) Mostre que i+ 3 √ 2 e´ alge´brico sobre Q e determine o seu polinoˆmio mı´nimo. 4. (a) Calcule o grau de Q (√ 2 + √ 2 ) | Q (√2). (b) Mostre que todo elemento de Q (√ 2 + √ 2 ) se escreve de modo u´nico na forma p + q √ 2 + √ 2, onde p e q sa˜o da forma a + b √ 2 com a, b ∈ Q. (c) Represente 3+ √ 2+ √ 2 5−2 √ 2+ √ 2 na forma do ı´tem (b). 5. Seja L |K uma extensa˜o de corpos tal que [L : K] = n(<∞). Mostre que (a) Para todo α ∈ L o grau do polinoˆmio mı´nimo de α sobre K divide n. (b) Se p(X) ∈ K[X] e´ irredut´ıvel tal que gr(p(X)) na˜o divide n enta˜o p(X) na˜o tem ra´ızes em L. (c) X3 − 2 na˜o tem ra´ızes em Q ( 2n√2), para todo n ∈ N. (d) Se n e´ primo, na˜o ha´ corpos intermedia´rios entre K e L, e neste caso, L = K(α) para todo α ∈ L\K. 7.2 Construc¸o˜es com Re´gua e Compasso Os gregos antigos nos legaram alguns problemas relacionados com cons- truc¸o˜es geome´tricas a serem realizadas apenas com re´gua na˜o graduada e compasso. Estes problemas desafiaram a mente humana durante va´rios mileˆnios e so´ tiveram resposta completa e definitiva no se´culo XIX quando a A´lgebra e a Ana´lise ja´ estavam suficientemente desenvolvidas para lhes dar respostas. 7.2. CONSTRUC¸O˜ES COM RE´GUA E COMPASSO 157 Dentre os problemas que os gregos sabiam resolver esta˜o os seguintes: 1. Dados um ponto e uma reta, trac¸ar uma reta perpendicular a` reta dada passando pelo ponto. 2. Dados uma reta e um ponto, trac¸ar pelo ponto uma reta paralela a` reta dada. 3. Divisa˜o de segmentos em quallquer nu´mero de partes iguais A B n 1 2 �� �� �� �� �� �� �� �� �� �� �� � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � 4. Bissecc¸a˜o de um aˆngulo qualquer. O� �� �� �� �� �� � HHHHHHHHHHHH 5. Transportar, somar e subtrair aˆngulos. 158 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS 6. Dados segmentos de comprimentos a e b, construir segmentos de com- primentos a · b e a b b b �� �� �� �� �� �� �� �� �� �� �� � 1 1 a b a a · b a 7. Dado um segmento de comprimento a construir um segmento de com- primento √ a. 8. Construc¸a˜o dos pol´ıgonos regulares inscritos de 3, 4, 5, 6, 8, 10, 12, 15, 16, 20 e de 2n lados. Os problemas geome´tricos sa˜o formulados em geral como segue: Dado um conjunto de pontos no plano, achar a partir destes outros pon- tos do plano que tenhamcertas relac¸o˜es com os pontos dados, usando re´gua e compasso. Um ponto P do plano e´ construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de um conjunto de pontos S = {P1, P2, . . . , Ps}, s ≥ 2, se existir uma sequ¨eˆncia de pontos do plano Q1, Q2, . . . , Qn = P , tais que Qi e´ obtido a partir do conjunto Si = S ∪ {Q1, Q2, . . . , Qi−1} de um dos seguintes modos: 1. Qi e´ ponto de intersec¸a˜o de retas, cada uma delas definida por dois pontos de Si. 2. Qi e´ ponto de intersec¸a˜o de uma reta determinada por dois pontos de Si e de uma circunfereˆncia com centro num ponto de Si e raio igual a` distaˆncia entre dois pontos de Si. 3. Qi e´ ponto de intersec¸a˜o de duas circunfereˆncias com centros em pontos de Si e raios iguais a distaˆncias entre pontos de Si. 7.2. CONSTRUC¸O˜ES COM RE´GUA E COMPASSO 159 Com o propo´sito de algebrizar o problema, identificamos o plano onde esta˜o os pontos de S com C de modo que P1 coincida com z1 = 0, P2 com z2 = 1, P3 com z3, . . . e Ps com zs. Denotaremos por C(z1, . . . , zs) o conjunto dos pontos construt´ıveis com re´gua e compasso a partir de S. E´ claro que z1, . . . , zs ∈ C(z1, . . . , zs). PROPOSIC¸A˜O 7.8. C(z1, . . . , zs) e´ um subcorpo de C, fechado por con- jugac¸a˜o e por extrac¸a˜o de raiz quadrada. Demonstrac¸a˜o: Observe que 0, 1 ∈ C(z1, . . . , zs). Suponhamos que se te- nha a, b ∈ C(z1, . . . , zs). E´ fa´cil construir a partir de a e b a sua diferenc¸a a − b. Se b 6= 0, as construc¸o˜es (5) e (6) nos permitem construir a partir dos nu´meros complexos a e b o nu´mero complexo a b . Logo C(z1, . . . , zs) e´ um subcorpo de C. As construc¸o˜es (4) e (7) nos permitem construir √ a a partir de a, en- quanto que a¯ e´ trivialmente construt´ıvel a partir de a. COROLA´RIO 7.3. Se a, b, c ∈ C(z1, . . . , zs), enta˜o as ra´ızes de aX2+bX+ c = 0 esta˜o em C(z1, . . . , zs). LEMA 7.1. Seja K um subcorpo de C fechado por conjugac¸a˜o e por extrac¸a˜o de raiz quadrada. Enta˜o z ∈ K se, e somente se, Re(z), Im(z) ∈ K. Demonstrac¸a˜o: Se z ∈ K, enta˜o z¯ ∈ K e como −1 ∈ K, temos que i = √−1 ∈ K. Logo Re(z) = z+z¯ 2 ∈ K e Im(z) = z−z¯ 2 ∈ K. Reciprocamente, se Re(z), Im(z) ∈ K, enta˜o z = Re(z) + i Im(z) ∈ K. PROPOSIC¸A˜O 7.9. C(z1, . . . , zs) e´ o menor subcorpo de C que conte´m os elementos z1, . . . , zs e que e´ fechado por conjugac¸a˜o e extrac¸a˜o de raiz quadrada. Demonstrac¸a˜o: Seja K um corpo contendo z1, . . . , zs e fechado por con- jugac¸a˜o e extrac¸a˜o de raiz quadrada. Vamos provar que C(z1, . . . , zs) ⊆ K. Afirmamos que para provar esta asserc¸a˜o basta mostrar que a intersec¸a˜o de duas retas determinadas por pontos de K, a intersec¸a˜o de uma reta 160 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS e de uma circunfereˆncia determinados por pontos de K e a intersec¸a˜o de duas circunfereˆncias determinadas por pontos de K, esta˜o em K. De fato, suponha estas condic¸o˜es verificadas. Se z ∈ C(z1, . . . , zs), existem pontos u1, . . . , un = z ∈ C tais que u1 e´ obtido a partir de z1, . . . , zs por uma das operac¸o˜es (1), (2) ou (3), logo u1 ∈ K. Como u2 e´ obtido a partir de z1, . . . , zs e u1 por uma das operac¸o˜es (1), (2) ou (3), segue que u2 ∈ K e assim suces- sivamente, ate´ concluirmos que z = un ∈ K. Logo, C(z1, . . . , zs) ⊆ K. Vamos agora mostrar que as condic¸o˜es sobre K na afirmac¸a˜o acima sa˜o verificadas. Sejam x0 + i y0, x1 + i y1, x2 + i y2 ∈ K. Pelo Lema 1 temos que x0, y0, x1, y1, x2, y2 ∈ K. A equac¸a˜o da reta que passa por x1 + i y1 e x2 + i y2 e´ dada por (y2 − y1)X + (x1 − x2)Y + x1(y1 − y2)− y1(x1 − x2) = 0, logo e´ da forma aX + bY + c, com a, b, c ∈ K. A equac¸a˜o da circunfereˆncia cujo centro e´ dado por x0 + i y0 e raio dado por √ (x1 − x2)2 + (y1 − y2)2 X2 + Y 2 − 2x0X − 2y0Y + x20 + y20 − (x1 − x2)2 − (y1 − y2)2 = 0, logo e´ da forma X2 + Y 2 + a′X + b′Y + c′, com a′, b′, c′ ∈ K. A intersec¸a˜o de duas retas determinadas por pontos de K e´ um ponto x+ i y satisfazendo a um sistema{ aX + bY + c = 0 a′X + b′Y + c′ = 0 com a, b, c, a′, b′, c′ ∈ K. E´ fa´cil ver que se este sistema admite uma u´nica soluc¸a˜o (x, y) enta˜o x, y ∈ K e portanto x + i y ∈ K. A intersec¸a˜o de uma reta e uma circunfereˆncia ou de duas circunfereˆncias distintas determinados por pontos de K e´ um ponto x+ i y satisfazendo a um sistema{ λ(X2 + y2) + aX + bY + c = 0 X2 + Y 2 + a′X + b′Y + c′ = 0 7.2. CONSTRUC¸O˜ES COM RE´GUA E COMPASSO 161 com a, b, c, a′, b′, c′ ∈ K e λ ∈ {0, 1} conforme os casos considerados acima. E´ fa´cil verificar com as hipo´teses sobre K que toda soluc¸a˜o (x, y) de tal sistema satisfaz a` condic¸a˜o x, y ∈ K, logo x+ i y ∈ K. Sejam z1 = 0, z2 = 1 e z3, . . . , zs ∈ C. De agora em diante usaremos a notac¸a˜o K = Q(z1, . . . , zs, z1, . . . , z) TEOREMA 7.1. O nu´mero complexo z e´ construt´ıvel com re´gua e com- passo a partir de z1, . . . , zs, se, e somente se, existem u1, . . . , ur ∈ C com u1 ∈ K e ui ∈ K(u1, . . . , ui−1) para todo i = 2, . . . , r, tais que z ∈ K(u1, . . . , ur). Demonstrac¸a˜o: Seja L o conjunto dos pontos z ∈ C tais que existem u1, . . . , ur ∈ C como no enunciado do Teorema. Queremos demonstrar que L = C(z1, . . . , zs). Para isto, basta provar que L e´ um corpo que conte´m z1, . . . , zs, que L e´ fechado por conjugac¸a˜o e extrac¸a˜o de raiz quadrada e que L ⊆ C(z1, . . . , zs), o que permitira´ concluir a partir da Proposic¸a˜o 9 que L = C(z1, . . . , zs). A demonstrac¸a˜o prosseguira´ por etapas. a) L e´ um subcorpo de C que conte´m z1, . . . , zs. O fato que z1, . . . , zs ∈ L e´ trivial. Para verificar que L e´ um subcorpo de C sejam z, z′ ∈ L. Temos que z ∈ K(u1, . . . , ur) e z′ ∈ K(u′1, . . . , u′r′), com os ui e u ′ j como no enunciado do Teorema. Segue enta˜o que z−z′ e zz′ (se z 6= 0) sa˜o elementos de K(u1, . . . , ur, u ′ 1, . . . , u ′ r) = K(u1, . . . , ur, ur+1, . . . , ur+r′), onde ur+j = u ′ j, j = 1, . . . , r ′. E´ claro que u1, . . . , ur+r′ cumprem as condic¸o˜es do enunciado e portanto z − z′ e z z′ esta˜o em L. b) L e´ fechado por extrac¸a˜o de raiz quadrada. De fato, se z ∈ L, temos que z ∈ K(u1, . . . , ur) com os ui satisfazendo as condic¸o˜es do enunciado do Teorema, logo √ z ∈ K(u1, . . . , ur, ur+1), com z2r+1 = z ∈ K(u1, . . . , ur). Isto prova que √ z ∈ L. c) K e´ fechado por conjugac¸a˜o. De fato, se z ∈ L, enta˜o temos z ∈ K(u1, . . . , ur) com u21 ∈ K e para cada i = 2, . . . , r, temos, u2i ∈ K(u1, . . . , ui−1). Como K = K enta˜o temos que z¯ ∈ K(u1, . . . , ur) com u12 ∈ K e ui2 ∈ K(u1, . . . , ui−1), i = 2, . . . , r. Segue 162 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS que z¯ ∈ L. d) L ⊆ C(z1, . . . , zs). De fato, seja z ∈ L, logo z ∈ K(u1, . . . , ur) onde u21 ∈ K e para cada i = 2, . . . , r, temos u2i ∈ K(u1, . . . , ui−1). Como K ⊆ C(z1, . . . , zs), u21 ∈ K e C(z1, . . . , zs) e´ fechado por extrac¸a˜o de raiz quadrada, necessariamente K(u1) ⊆ C(z1, . . . , zs). Prosseguindo de pro´ximo em pro´ximo concluimos que z ∈ K(u1, . . . , ur) ⊆ C(z1, . . . , zs), e portanto, L ⊆ C(z1, . . . , zs). COROLA´RIO 7.4. Seja K = C(z1, . . . , zs, z1, . . . , zs). Todo nu´mero com- plexo construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de z1, . . . , zs e´ alge´brico sobre K e o seu grau e´ uma poteˆncia de 2. Demonstrac¸a˜o: Seja z construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de z1, . . . , zs, logo, pelo Teorema 1, existem u1, . . . , ur ∈ C tais que u21 ∈ K e para cada i = 2, . . . , r, temos u2i ∈ K(u1, . . . , ui−1) e z ∈ K(u1, . . . , ur). Temos enta˜o que [K(u1) : K] = 1 ou 2 e [K(u1, . . . , ui) : K(u1, . . . , ui−1)] = 1 ou 2 para i = 2, . . . , r. Logo [K(u1, . . . , ur) : K] = [K(u1, . . . , ur) : K(u1, . . . , ur−1)] · · · [K(u1) : K] = 2m para algum m ∈ N. Como z ∈ K(u1, . . . , ur), segue que z e´ alge´brico sobre K e [K(z) : K] divide [K(u1, . . . , ur) : K], portanto, [K(z) : K] = 2l, para algum l ∈ N. Na maioria das aplicac¸o˜es as construc¸o˜es sera˜o feitas a partir dos dois pontos z1 = 0 e z2 = 1. Neste caso temos que K = Q(0, 1) = Q. A seguir atacaremos os problemas cla´ssicos relacionados com construtibi- lidade com re´gua e compasso. Problema da Duplicac¸a˜o do Cubo. Dada a aresta de um cubo, o problema consiste em construir com re´gua e compasso a aresta de um cubo que tenha o dobro do volume do cubo cuja aresta e´ dada. 7.2. CONSTRUC¸O˜ES COM RE´GUA E COMPASSO 163 Vamos supor que a aresta do cubo dado tenha 0 e 1 como extremidades, logo neste caso K = Q. Se a e´ a aresta procurada temos que a3 = 2, logo a e´ raiz do polinoˆmio X3 − 2 que e´ irredut´ıvel em Q[X] (Einsenstein). Portanto [Q(a) : Q] = 3 e consequ¨entemente, pelo Teorema 1, a na˜o e´ construt´ıvel com re´gua e compasso. Problema da Trissecc¸a˜o de um Aˆngulo. Dado um aˆngulo, queremos trissecta´-lo com re´gua e compasso. Para colocar o problema dentro do novo contexto, supo˜e-se que o aˆngulo seja determinado pelos pontos 1, 0 e z tal que |z| = 1 e z faz um aˆngulo φ com o eixo real. Para trissectar este aˆngulo e´ necessa´rio e suficiente construir um ponto z1 tal que |z1| = 1 e formando um aˆngulo φ3 com o eixo real. Portanto o nosso problema equivale a construir cos ( φ 3 ) a partir de cos(φ). Pela fo´rmula de De Moivre, temos cos(φ) + i sen(φ) = ( cos φ 3 + i sen φ 3 )3 = = cos3 ( φ 3 ) + 3i cos2 ( φ 3 ) sen ( φ 3 )− 3 cos (φ 3 ) sen2 ( φ 3 )− i sen (φ 3 ) . Tomando partes reais na fo´rmula acima, temos que cos(φ) = cos3 ( φ 3 )− 3 cos (φ 3 ) ( 1− cos2 (φ 3 )) = 4 cos3 ( φ 3 )− 3 cos (φ 3 ) . Portanto cos ( φ 3 ) e´ raiz do polinoˆmio 4X3 − 3X − cosφ. PROPOSIC¸A˜O 7.10. O nu´mero real cos ( φ 3 ) e´ construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de cosφ se, e somente se, 4X3−3X− cos φ e´ redut´ıvel em Q(cos φ)[X]. Demonstrac¸a˜o: Se cos ( φ 3 ) fosse construt´ıvel a partir de cosφ, enta˜o ter´ıamos que [ Q ( cos φ 3 ) : Q(cos φ) ] seria uma poteˆncia de 2, assim necessa- riamente 4X3 − 3X − cosφ seria redut´ıvel, pois caso contra´rio, cos (φ 3 ) teria grau 3 sobre Q, o que e´ um absurdo. Reciprocamente, se 4X3 − 3X − cosφ fosse redut´ıvel, enta˜o cos ( φ 3 ) seria raiz de um polinoˆmio de grau menor ou igual a dois com coeficientes em Q(cosφ). Segue trivialmente que cos ( φ 3 ) seria construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de cosφ. 164 CAPI´TULO 7. EXTENSO˜ES DE CORPOS Se φ = 60o, tem-se que cosφ = cos 60o = 1 2 , logo Q(cos φ) = Q, e 4X3 − 3X − cosφ = 4X3 − 3X − 1 2 , que e´ irredut´ıvel em Q[X] (justifique). Logo o aˆngulo de 60o na˜o pode ser trissectado com re´gua e compasso. Quadratura do C´ırculo Este e´ o mais famoso dos problemas de construc¸a˜o com re´gua e compasso e se formula com segue. Dado um c´ırculo de raio 1, construir com re´gua e compasso o lado de um quadrado cuja a´rea seja igual a` a´rea do c´ırculo dado. Neste caso K = Q. Seja a o lado do quadrado, logo a2 = pir2 = pi. Portanto a √ pi. Acontece que √ pi na˜o e´ alge´brico sobre Q (isto decorre do fato de pi ser transcendente). Segue da´ı a impossibilidade de se resolver o problema. Construtibilidade de Pol´ıgonos Regulares Inscritos (Ciclotomia) Este problema foi resolvido por Gauss no livro Disquisitiones Arithmae- ticae de 1801 e se formula como segue. Dada a circunfereˆncia de centro na origem e raio igual a 1, para quais valores de n e´ poss´ıvel construir, com re´gua e compasso, o pol´ıgono regular inscrito nesta circunfereˆncia com n lados? Como dissemos acima, Gauss deu uma resposta completa ao problema quando tinha 17 anos. Como a demonstrac¸a˜o de Gauss e´ muito trabalhosa, apesar de elementar, provaremos este resultado no Cap´ıtulo .... , usando resultados de grupos finitos e da teoria de Galois. PROBLEMAS 7.2. 1. Note que construir o pol´ıgono regular de n lados equivale a construir a raiz n-e´sima primitiva da unidade. 7.2. CONSTRUC¸O˜ES COM RE´GUA E COMPASSO 165 (a) Mostre que o triaˆngulo equila´tero inscrito na circunfereˆncia de raio 1 e´ construt´ıvel com re´gua e compasso. (Sug.: A raiz cu´bica primitiva da unidade w = cos 2pi 3 + i sen 2pi 3 satisfaz a equac¸a˜o 1 +X +X2 = 0). (b) Mostre que o penta´gono regular inscrito e´ construt´ıvel com re´gua e compasso. (Sug.: Uma raiz quinta primitiva da undidade ξ e´ raiz da equac¸a˜o X4 + X3 + X2 + X + 1 = 0; mas isto equivale dizer que ξ e´ raiz da equac¸a˜o ( X + 1 X )2 + ( X + 1 X ) − 1 = 0. Mostre que β = ξ + 1 ξ e´ construt´ıvel com re´gua e compasso e conclua que ξ e´ construt´ıvel com re´gua e compasso). (c) Se n = 2r · 3 ou 2r · 5, mostre que o pol´ıgono regular de n lados e´ construt´ıvel com re´gua e compasso. 2. Prove que um enea´gono regular (pol´ıgono de 9 lados) na˜o e´ construt´ıvel com re´gua e compasso. (Sug.: 2pi 9 = 40o e se 40o e´ construt´ıvel enta˜o 20o tambe´m e´, logo 60o e´ trissecta´vel.) 3. Mostre que e´ imposs´ıvel dividir um aˆngulo de 100o ou de 200o em cinco partes iguais. 4. Se n ∈ N, enta˜o existe um polinoˆmio Pn(X) de grau n com coeficientes inteiros tal que cosnθ = Pn(cos θ). (Veja I-9, Problema 3.3). Mostre que cos(1o) e´ um nu´mero alge´brico. 5. Mostre que 4 √ 2 e´ construt´ıvel com re´gua e compasso a partir de 0 e 1. 6. Em cada caso abaixo decida se pode ou na˜o ser trissectado o aˆngulo φ tal que a) cosφ = 1 4 b) cos φ = − 9 16 c) cosφ = 1√ 2 d) cos φ = √ 2 8 7. Mostre que cos 2pi 7 e´ raiz de 8X3 + 4X2 − 4X − 1 = 0 e que 2 cos 2pi 7 e´ raiz de X3 +X2 − 2X − 1 = 0. Mostre que o pol´ıgono regular inscrito numa circunfereˆncia de raio 1 na˜o e´ construt´ıvel com re´gua e compasso.