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Escoamentos externos viscosos: camada limite Introdução O escoamento é considerado externo quando se estuda os efeitos causados sobre um corpo totalmente envolvido pelo escoamento de um fluido. Em um estudo de um escoamento externo, em geral, procura-se obter as forças de arrasto e sustentação produzidas pelo escoamento sobre o corpo. Essas forças se devem aos efeitos da viscosidade e aos efeitos de pressão. A força de arrasto atua na direção do escoamento e a força de sustentação atua na direção normal ao escoamento. As forças que atuam sobre corpos imersos em um fluido que apresenta movimento é um resultado a interação entre o corpo e o fluido. - Em algumas ocasiões o fluido ao longe do corpo está estacionário e o corpo se move através do fluido com uma velocidade U (ex. carro, avião). - Em outras, o corpo está estacionário e o fluido passa por ele com uma velocidade U (ex. vento sobre um prédio). - Em ambos os casos, o sistema de coordenadas pode ser fixado no corpo e tratar como se o fluido estivesse escoando em torno do corpo estacionário com velocidade ao longe U. O estudo de escoamentos externos (ao redor de corpos imersos) pode ser tratado como dois escoamentos distintos: - ao longe do corpo sólido, onde o escoamento não é afetado pelos efeitos da viscosidade, podendo ser tratado com inviscido; - próximo à parede sólida e na esteira, onde os efeitos da viscosidade são dominantes. Os efeitos do cisalhamento (tensão produzida pela viscosidade) estão presentes em uma região próxima ao corpo sólido, onde um gradiente de velocidades é estabelecido desde a velocidade do corpo até o valor da velocidade do escoamento ao longe. camada limite A espessura da camada limite é definida como o lugar geométrico dos pontos em que a velocidade u paralela ao corpo sólido atinge 99% da velocidade externa U. O conceito de camada-limite foi introduzido por Ludwig Prandtl em 1904. Antes disso, o estudo de escoamento era dividido na hidrodinâmica teórica, que tratava os fluidos como invíscidos - de acordo com essa abordagem o escoamento não era capaz de produzir esforços sobre os corpos. E a hidráulica, criada pelos engenheiros, baseada em dados experimentais que era capaz de prever os esforços de cisalhamento. Essa divergência nos resultados era conhecida como paradoxo de d’Alembert. Existem duas abordagens para a obtenção das informações sobre as forças causadas pelo escoamento sobre o corpo imerso. - técnicas teóricas: analíticas e numéricas - técnicas experimentais. Camada limite A geração de camada limite está diretamente relacionada ao Número de Reynolds, que é um grupo adimensional que relaciona os efeitos de inércia com os efeitos viscosos presentes no escoamento. O escoamento sobre uma placa plana aguda de comprimento L com números de Reynolds baixos (entre 1 e 103) produzem uma região viscosa ampla que se estende a montante e para os lados do corpo. O corpo retarda a corrente de aproximação e pequenas variações do escoamento causam grandes mudanças na distribuição de pressões. Para esses casos a justaposição de um escoamento invíscido ao longe e uma camada limite próxima ao corpo não resultam em soluções adequadas. Esses escoamentos são, geralmente, estudados experimentalmente ou por modelagem numérica computacional. Para números de Reynolds mais elevados, de acordo com a solução de Blasius (1908), as fórmulas para camada limite são: - Para regime laminar ( 103 < Rx < 10 6) - Para regime turbulento (106 < Rex) Onde Rx é o Reynolds local. Alguns resultados: Rx 10 4 105 106 107 108 (δ/x)lam 0,050 0,016 0,005 (δ/x)turb 0,022 0,016 0,011 Como as camadas limites são muito delgadas: - o seu efeito de deslocamento sobre a camada não viscosa externa é desprezível; - a distribuição de pressões ao longo da placa pode ser calculada usando a teoria não viscosa, como se a camada limite não estivesse presente. Para corpos rombudos, como o escoamento sobre um cilindro, há outros efeitos envolvidos. O escoamento não viscoso prevê o escoamento da figura (a), contudo isso não é o que acontece. O escoamento real é dado pela figura (b). A camada limite é delgada no lado de montante, onde a pressão decresce ao longo da superfície (gradiente de pressão favorável). A partir da posição diametral, inicia o aumento da pressão (gradiente de pressão adverso) que em um determinado momento provoca um colapso na camada limite, causando a separação e produzindo uma esteira pulsante. O escoamento principal é defletido por essa esteira, de modo que o escoamento externo é muito diferente daquele previsto pela teoria não viscosa. Geração de camada-limite Diversos fenômenos ocorrem em um escoamento externo sobre um corpo. O escoamento da corrente livre divide-se no ponto de estagnação e circunda o corpo. O fluido em contato com a superfície adquire a velocidade do corpo como resultado da condição de não deslizamento. Camadas-limite formam-se tanto na superfície superior como na superfície inferior do corpo. O escoamento na camada-limite é inicialmente laminar. A certa distância do ponto de estagnação ocorre o início da transição para escoamento turbulento. Essa distância depende, entre outras coisas, das condições do escoamento livre (ao longe), da rugosidade da superfície e do gradiente de pressão. A camada-limite turbulenta se desenvolve mais rapidamente do que a camada-limite laminar. As linhas de corrente do escoamento externo sofrem um leve deslocamento devido ao engrossamento das camadas limites. Uma região onde a pressão é crescente é denominada de gradiente de pressão adverso, pois ele se opõe ao movimento do fluido, tendendo a desacelerar as partículas fluidas. Esse gradiente pode ser o responsável por uma separação da camada limite (descolamento). Nesse caso, o fluido que estava nas camadas-limite sobre a superfície do corpo forma uma esteira viscosa atrás dos pontos de separação. Características da camada limite A borda da camada limite, definido como espessura δ(x), não é claramente definida no escoamento real. Considera-se, arbitrariamente, como o conjunto de pontos nos quais a velocidade é igual a 99% da velocidade da corrente livre. Como a camada limite é muito delgada, a pressão na camada limite é considerada como a pressão p(x) na parede, como previsto pela solução do escoamento não-viscoso. Em um escoamento sobre uma placa plana, a camada-limite começa como um escoamento laminar de espessura zero na borda frontal. Após uma distância x que depende da velocidade e do nível de flutuação da corrente livre, da viscosidade, do gradiente de pressão, da rugosidade e da rigidez da parede, o escoamento laminar passa por um processo de transição e, após, em um escoamento turbulento. Esse processo de transição ocorre quando: - para escoamento sobre placas rugosas ou com alta intensidade de flutuação da corrente livre; - para escoamento sobre placas rígidas lisas com baixa intensidade de flutuação na corrente livre. Para o ar na condição padrão, com velocidade de corrente livre U = 30 m/s, isso corresponde a x = 0,24 m. A espessura da camada-limite turbulenta aumenta muito mais rapidamente que a da camada laminar. Ela também apresenta um cisalhamento na parede substancialmente maior. O processo de transição envolve instabilidade do campo de escoamento. Pequenas perturbações impostassobre a camada limite, como vibrações na placa, rugosidade da superfície, pulsações no escoamento principal aumentam ou diminuem a instabilidade dependendo do lugar onde a perturbação for introduzida: - Se a perturbação ocorre em Rex < Rec são amortecidas fazendo com que a camada limite retorne ao regime laminar - Se a perturbação ocorre em Rex > Rec irão crescer transformando o escoamento em regime turbulento. A mudança do escoamento laminar para turbulento também provoca uma mudança na forma do perfil médio de velocidades. Equações de camada limite Considerando um escoamento bidimensional, permanente em um espaço x-y. As equações que regem qualquer escoamento nestas condições são: - Os termos de gravidade podem ser desprezados, pois esse termo só é importante em escoamentos em que o empuxo do fluido é importante. - Como a camada limite é muito fina para números de Reynolds elevados, pode-se afirmar que: Aplicando em (3), resulta pequeno pequeno muito peq. pequeno assim: ou a pressão varia ao longo da camada limite e não através dela. Para a equação (2): Como a espessura da camada limite é pequena, a pressão pode ser conhecida a partir do escoamento externo através da Equação de Bernoulli: Diferenciando em relação a x resulta Além disso, as hipóteses para camada limite delgada: Portanto, as equações para camada limite ficam: A equação (2a) pode também ser escrita como: onde: As equações devem ser resolvidas para: u(x,y) e v(x,y), sendo U(x) uma função conhecida. As condições de contorno são: y = 0 u = v = 0 y = δ(x) u = U(x) Soluções para escoamento em camada limite: 1) Escoamento laminar: solução analítica - Blasius 2) Solução usando equação integral de Von Karman 2.1) Escoamento laminar (perfil parabólico) 2.2) Escoamento turbulento (perfil de lei de potência) Exercício: para os três métodos, encontrar expressões para: - (espessura adimensional) - coeficiente de atrito local (cf) - coeficiente de atrito superficial (Cf) Efeito de Gradientes de Pressão Uma placa plana infinita tem um gradiente de pressão nulo: as partículas fluidas têm suas velocidades reduzidas por tensões de cisalhamento apenas, resultando no crescimento da camada limite. Sobre corpos com formas diferentes da placa plana, um gradiente de pressão não nulo é gerado nos escoamentos. Um gradiente de pressão favorável é aquele no qual a pressão diminui no sentido do escoamento . Ele é chamado de favorável porque tende a agir contra a redução da velocidade das partículas fluidas na camada limite. Esse gradiente de pressão aparece quando a velocidade da corrente livre U está aumentando com x. Por exemplo, o escoamento sobre a parte esquerda da esfera. Um gradiente adverso de pressão é aquele no qual a pressão cresce no sentido do escoamento . Ele provoca uma redução da velocidade das partículas fluidas a uma taxa maior do que aquela devido ao atrito na camada limite. O gradiente adverso pode levar as partículas ao repouso ou até mesmo a uma velocidade contrária ao escoamento principal. Nesse caso, ocorre o fenômeno chamado separação do escoamento. Isso resulta em uma esteira turbulenta a jusante. Como por exemplo na parte à direita da esfera. Efeito do gradiente de pressão sobre os perfis de camada limite. (PI = ponto de inflexão) (White) Escoamento ao redor de um cilindro circular. (a) separação laminar; (b) separação turbulenta; (c) distribuições de pressões teóricas e real sobre a superfície do cilindro. (White) Provocar que a camada limite, inicialmente laminar, chegue a turbulenta o mais rápido possível, é uma forma de aumentar a quantidade de movimento no escoamento fazendo com que o escoamento resista mais ao gradiente adverso de pressão e o descolamento ocorra mais tarde. Isso reduz o arrasto do escoamento. Exemplo da esfera abaixo e bola de golfe. ARRASTO E SUSTENTAÇÃO A interação que ocorre na interface fluido-corpo pode ser descrita por forças que ocorrem em função da tensão de cisalhamento na parede , provocada pelos efeitos visocosos e da tensão normal devida a pressão p. A força de arrasto (drag) atua na direção do escoamento e a força de sustentação (lift) atua na direção normal ao escoamento. Essas forças podem ser obtidas pela integração das tensões de cisalhamento e normais ao corpo que está sendo considerado. A figura mostra distribuições típicas de pressão e tensão de cisalhamento sobre um aerofólio. As forças de arrasto e sustentação são calculadas como: Normalmente é muito difícil obter as distribuições de pressão e tensão de cisalhamento, seja analítica, numérica ou experimentalmente. Grande parte dos escoamentos não dispõe de soluções analíticas e, portanto, as distribuições de pressão e tensão de cisalhamento não são conhecidas. Uma solução alternativa é definir coeficientes adimensionais de arrasto e sustentação e determinar seus valores aproximados através de uma análise simplificada, técnica numérica ou experimental. O coeficiente de sustentação CL e o coeficiente de arrasto CD são definidos como: onde: A é a área característica do objeto, em geral a área frontal do corpo imerso ρ é a massa específica do fluido U é a velocidade relativa fluido/corpo ao longe Exemplo de coeficiente de sustentação CL e coeficiente de arrasto CD. DESPRENDIMENTO DE VÓRTICES Objetos rombudos, como cilindros circulares, exibem um fenômeno particularmente interessante, quando colocados na direção normal a um escoamento de fluido. Vórtices ou turbilhões são desprendidos do objeto de forma regular e alternada entre os lados opostos. O escoamento resultante é conhecido por esteira de vórtices ou esteira de Von Kármán (em homenagem a Theodor Von Kármám – 1881-1963) Para escoamentos com números de Reynolds altos, ou seja, onde as forças viscosas são menos atuantes, a freqüência de desprendimento f, em hertz, depende somente da velocidade e de uma dimensão transversal característica (diâmetro. p. ex.). Essa freqüência, normalmente é expressa como uma quantidade adimensional na forma do número de Strouhal: A partir de dados experimentais,observa-se que o número de Strouhal é praticamente constante de 300 < Re < 105. As oscilações na esteira provocam oscilações no campo de pressão que devem ser levadas em conta na análise dos esforços sobre as estruturas. Além disso, as oscilações no campo de pressão provocam deformações nos corpos que podem afetar o escoamento. Quando as oscilações causadas pelos vórtices atuam em freqüências próximas a freqüência natural da estrutura, pode haver acoplamento conduzindo ao fenômeno da ressonância. MASSA ADICIONADA Quando um corpo acelera em um meio fluido, não somente o corpo é acelerado, mas também uma parte do fluido ao seu redor. A aceleração do fluido que envolve o corpo exige uma força adicional acima da força necessária para acelerar somente o corpo. Uma forma simples de levar em conta a massa de fluido acelerada é adicionar uma massa, chamada massa adicionada (ma) à massa do corpo. Somando as forças na direção do movimento, para um corpo simétrico movendo-se horizontalmente na direção de seu eixo de simetria temos: onde: Vc é a velocidade do corpo FA é a força de arrasto A massa adicionada está relacionada com a massa de fluido mf deslocada pelo corpo através da equação: onde k é coeficiente de massa adicionada que é característica da forma do corpo. - para uma esfera k= 0,5, - para um elipsóide com o eixo maior com o dobro do comprimento do eixo menor e movendo-se na direção do eixo maior, k= 0,2. - para um cilindro longo movendo-se na direção normal ao seu eixo, k = 1,0 Observação: - Corpos que aceleram na atmosfera a massa adicionada é muito pequena e normalmente ignorada. - Massas que aceleram em líquidos são mais influenciadas pela massa adicionada e, normalmente, deve ser levada em conta. - Estruturas em alto-mar, sujeitas aos movimentos de oscilação das ondas, experimentam forças periódicas cuja determinação deve incluir o efeito da massa adicionada.
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