Buscar

psicologia e saúde

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 336 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 336 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 336 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

PSICOLOGIA
E SAÚDE
JOSÉ LUÍS PAIS RIBEIRO
C1
placebo
EDITORA
 
JOSÉ LUÍS PAIS RIBEIRO 
PSICOLOGIA E SAÚDE
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Titulo: Psicologia e Saúde. 2ª Edição. Outubro de 2010. 
ISBN: 978-989-8463-04-3. 
Capa: Ricardo Romão 
Lisboa: Placebo, Editora LDA. 
 
.ÍNDICE 
PREÂMBULO 1 
PRÓLOGO 2 
INTRODUÇÃO 5 
A Psicologia e Saúde na unidade do corpo e espírito 6 
O ser humano enquanto sistema 12 
A organização do livro 15 
PARTE I – INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA E SAÚDE 16 
A Psicologia no campo da saúde 16 
Perspectiva histórica 16 
O interesse da psicologia pela saúde e doenças não mentais 18 
Psicologia Clínica, Psicologia da Saúde e 
Psicologia Clínica da Saúde 18 
Psicologias clínicas e da saúde 22 
Aspectos novos da psicologia que se pratica no Sistema de Saúde 23 
A Psicologia Clínica hoje 25 
A saúde e a doença ao longo dos tempos 26 
Importância de uma perspectiva ecológica 26 
Evolução dos sistemas de saúde 29 
História da saúde 31 
Evolução do conceito de saúde e doença 31 
Período pré-cartesiano 33 
Desenvolvimento do modelo biomédico 35 
Primeira revolução da saúde 37 
 
A segunda revolução da saúde 40 
A terceira revolução da saúde 42 
Conceitos principais da segunda revolução da saúde 43 
Promoção da saúde 44 
Definição de promoção da saúde 45 
Promoção da saúde na Europa 46 
Estilo de vida – Nascimento e morte do conceito 47 
Hipóteses de cenários futuros para a saúde e doença 48 
O sistema de saúde no futuro 51 
Regresso a uma consciência ecológica da saúde 53 
Psicologia da Saúde, saúde e doenças 57 
Saúde 57 
Doença 61 
Estados de doença 63 
Relação entre saúde e doença 63 
Qualidade de vida 65 
Bem-estar subjectivo 66 
Saúde, qualidade de vida e bem-estar 67 
Qualidade de vida relacionada com a saúde 68 
Ligações entre saúde e qualidade de vida 69 
PARTE II – ASPECTOS BÁSICOS DA INTERVENÇÃO 71 
Comportamento e Psicologia da Saúde 71 
História da relação comportamento saúde a doenças 71 
O comportamento humano na segunda revolução da saúde 72 
Comportamento de prejuízo de saúde como hábito 76 
Origem dos hábitos 76 
Mudança de hábito 77 
Comportamento nas ciências comportamentais 78 
Comportamentos/Atitudes 79 
Importância de um estilo de vida saudável 80 
 
Comportamento e mortalidade 83 
Factores de risco para a saúde 83 
Consumo de tabaco 83 
Porque fumam as pessoas? 84 
Tabagismo e doenças 85 
Exercício físico 96 
Alimentação 89 
Programas de modificação do comportamento 90 
Comportamento e necessidades de saúde dos jovens 91 
Relações entre comportamentos de saúde 92 
Efeitos perversos do aumento da responsabilidade pessoal 93 
Os limites da medicina 96 
Culpar a vítima 96 
Questões políticas geradas pela mudança 
de conceber o campo da saúde 97 
Limites da responsabilidade individual 99 
Modelos e teorias 100 
Modelos na saúde e doenças 101 
Modelo de crenças de saúde 102 
Teoria da motivação protectora 105 
Teoria da aprendizagem social 106 
Teoria da acção racional de Fishbein’s 106 
Teoria da acção planeada 107 
Teoria do comportamento social de Triandis’ 107 
Teoria da acção social 108 
Modelo da utilidade de multiatributos 109 
Difusão da inovação 110 
Modelo transteórico de mudança do comportamento 110 
Modelo transteórico 110 
Abordagem do processo de acção para a saúde 111 
Áreas de intervenção em Psicologia da Saúde 111 
 
Definição de Psicologia da Saúde 112 
Divisão tradicional do sistema de saúde 113 
Saúde Pública 114 
Psicologia da Saúde e Saúde Pública 117 
Medicina curativa 120 
Funções do psicólogo clínico 120 
Áreas de intervenção 121 
Promoção da saúde 121 
A promoção da saúde na saúde a na doença 123 
Promoção da saúde, qualidade de vida e bem-estar 124 
Protecção da saúde 126 
Prevenção das doenças 128 
Grandes projectos de prevenção de doenças 129 
Intervenção nas doenças 132 
Organização das doenças 133 
As doenças crónicas 134 
Mal-estar e sofrimento 136 
Natureza do sofrimento 137 
Os sentimentos acerca da doença 138 
Doenças de mau prognóstico 141 
O caso Ramon Sampedro 141 
Doenças terminais 142 
As pessoas querem saber se vão morrer? 143 
Reacção psicológica à própria morte 144 
Os doentes terminais e os profissionais de saúde 144 
Cuidados paliativos e apoio a doentes terminais 144 
Psicoterapia com doentes terminais 147 
Filosofia do apoio a doentes terminais 147 
PARTE III – PSICOLOGIA E DOENÇAS 149 
Psicologia da Saúde e índices sanitários 149 
 
Indicadores clássicos do estado da saúde 149 
Mortalidade em Portugal 152 
Análise comparativa entre países 154 
As epidemias em Portugal 156 
Epidemiologia 158 
Discussão sobre o conceito de epidemiologia 159 
Factores de protecção da saúde ou recursos de saúde 161 
Factores de risco 161 
História dos factores de risco 163 
O mito do risco zero 164 
Factores de risco e política 165 
Limitações da aplicação à saúde da noção de factor de risco 166 
Factores de risco, grupos de risco e situações de risco 167 
Consequências populacionais das alterações epidemiológicas 170 
Consequências populacionais das revoluções da saúde 170 
Uma palavra para o meio ambiente 174 
Doenças vasculares cerebrais 175 
Doença vascular cerebral 175 
Acidente vascular cerebral 176 
Acidente isquémico transitório 176 
Consequências dos acidentes vasculares cerebrais 176 
Factores de risco para as doenças vasculares cebebrais 177 
Consequências das doenças vasculares cerebrais 177 
Intervenção nas doenças vasculares cerebrais 178 
Prognóstico nas doenças vasculares cerebrais 179 
Consequências sociais 180 
Impacto da doença na família 181 
Tumores malignos 182 
Perspectiva histórica 182 
O cancro como doença 112 
Factores de risco para o cancro 183 
 
Cura do cancro 185 
Cancro em Portugal 185 
Tipos de tumor 186 
O que há de único no cancro? 187 
Variáveis psicossociais associadas ao cancro 188 
Consequências psicológicas do cancro 189 
Apoio psicológico para doentes com cancro 190 
Aspectos a considerar no apoio psicológico 191 
Aspectos psicológicos na longevidade à doença 193 
Impacto da doença na família 193 
Doença cardíaca coronária 194 
O sistema circulatório 194 
Insuficiência cardíaca 195 
Causas precipitantes da insuficiência cardíaca 195 
Sintomas de falha do sistema cardíaco 196 
A doença cardíaca coronária 196 
Factores de risco 197 
Tabagismo 198 
Obesidade 198 
Hipertensão 198 
Padrão de comportamento Tipo A 200 
Efeitos da alteração do estilo de vida nas DCC 202 
Treino de competências de gestão da angina 204 
Ajustamento psicossocial às doenças cardíacas 204 
Acidentes 205 
Doente em contextos médicos 206 
Reacção psicológica ao contexto médico 207 
Despersonalização 208 
Cuidados-de-saúde-centrados-no-doente 209 
Informação e comunicação 210 
A origem da representação da doença 211 
 
Comunicação médico-doente 212 
Colaboração do doente no tratamento 215 
O que está em jogo 216 
Adesão ao tratamento 218 
Teorias de adesão 218 
Um modelo desenvolvimental 219 
Determinantes psicossociais do empenhamento no tratamento 221 
PARTE IV – TEMAS BÁSICOS 223 
Stress 223 
Apreciação dos stressores 226 
Níveis de apreciação dos stressores 227 
Diferenças individuais na apreciação e reacção ao stress 230 
Tipos de stressores 231 
Stress e sistema imunológico 232 
Acontecimentos de vida, preocupações e stress 236 
Variáveis mediadoras 238 
O contexto profissional como fonte de stress 240 
Doenças provocadas pelo stress 240 
Intervenção psicológica no stress 241 
O stress é hereditário? 244 
Avaliação em Psicologia da Saúde 245 
O psicólogo em contextos de saúde e doença 246 
A prática da avaliação psicológica 248 
Avaliação psicológica na década de 90 250 
O que caracteriza a avaliação psicológica na equipa de saúde 254 
A entrevista psicológica 256 
Entrevistapsicológica em contextos de saúde 258 
Uma novidade fundamental: A avaliação da saúde 258 
Técnicas psicométricas ou clinimétricas 259 
Avaliação da saúde 261 
 
Avaliação do estado da saúde versus dos resultados de saúde 265 
O Medical Outcomes Study 266 
Dor 267 
Definição de dor 268 
Tipos de dor 269 
Comportamento de dor 269 
Dor orgânica versus psicogénica 270 
Teorias sobre a dor 271 
Variáveis psicológicas a considerar 271 
A avaliação da dor 274 
Técnicas de intervenção 275 
LÉXICO 279 
REFERÊNCIAS 284 
 
1 
 
PREÂMBULO 
O presente livro constitui uma cópia do que foi publicado na década de 90. 
Na sua origem estava a tese de doutoramento iniciada na década de 80 e 
terminada na primeira metade da década de 90. Na época, em Portugal 
como na Europa, com ligeiro atraso relativamente aos Estados Unidos da 
América, estavam a publicar-se livros equivalentes (p. ex., J. Ogden de 
1996, depois traduzido em Português). Enquanto as versões em edição 
estrangeira continuaram a publicar-se (o de Ogden publicou este ano a 4ª 
edição), em Portugal o presente livro não foi reeditado. 
São livros datados no sentido que focam a psicologia da saúde na sua 
perspectiva original ampla e globalizante, numa disciplina, a psicologia, 
que facilmente tende a especializar-se. 
A reedição do texto de 1998 propõe-se salientar estes dois aspectos: a 
época em que a psicologia da saúde assumia aquela perspectiva abrangente 
e a própria perspectiva abrangente que nos parece integradora em vez de 
fragmentadora. Embora reconhecendo que a especialização, a visão focal, é 
útil e necessária, não temos dúvidas que é necessário manter uma 
perspectiva que enquadre e dê sentido a uma psicologia da saúde que sirva 
de moldura às visões mais parciais, quer as explicativas ou compreensivas, 
quer à própria investigação. 
Por outro lado responde a diversas solicitações tanto em Portugal como 
noutros países de língua Portuguesa, sobre como aceder a este livro. 
A iniciativa da editora Placebo merece assim todo o nosso apoio e 
reconhecimento, por facilitar o acesso a um texto que por alguns é 
reconhecido como um clássico escrito em Português. 
José Luís Pais Ribeiro 
2 
 
PRÓLOGO 
O livro Psicologia e Saúde que o Professor Pais Ribeiro elaborou destina-
se aos alunos da licenciatura em Psicologia, especialidade Psicologia da 
Saúde. 
Não é habitual, em Portugal, o professor universitário editar livros 
destinados aos alunos das disciplinas que lecciona. As razões são múltiplas 
e variam com a natureza dos cursos. Contudo, trata-se de uma das mais 
responsáveis actividades dos docentes de qualquer nível de ensino pois se 
permite que os formandos tenham acesso à opinião escrita do professor 
que, desse modo, assume pontos de vista e opiniões com frontalidade e sem 
subterfúgios. 
Referindo os manuais recentemente elaborados sobre a Psicologia da 
Saúde, o autor afirma que «este manual constitui uma introdução a esses 
inúmeros manuais mais ou menos especializados». Contudo, as qualidades 
científica e pedagógica deste livro vão torná-lo também obrigatório a todos 
os que pretenderem fazer reflexões e estudos sobre um dos mais actuais 
campos de conhecimento interdisciplinar, num sector de grande 
importância social, como é o da Saúde, entendida num sentido lato. 
Na Introdução, o autor diz-nos de imediato “que se pretende salientar a 
ultrapassagem da dicotomia corpo espírito inerente à intervenção 
tradicional que se faz no campo da saúde”. 
No decorrer do texto, numa perspectiva histórica da evolução do 
pensamento dominante em cada época, encontram-se os conceitos 
fundamentais que presidiram às soluções dos problemas relacionados com 
a doença e com a saúde. 
A importância da relação dinâmica do homem e dos ambientes em que se 
desenrola a vida é focada em diversas perspectivas e dela se extrai um 
conjunto de conceitos fundamentais para a intervenção multiprofissional de 
quadros clínicos prevalentes nas sociedades modernas. 
Salienta o regresso a uma consciência ecológica na abordagem da Saúde 
pela necessidade de dar resposta aos problemas que a medicina biomédica 
não resolve. Afirma que essa circunstância pretende resolver “uma prática 
paradoxal: a maioria dos investimentos na saúde, quer económicos quer 
3 
 
científicos, são dirigidos para os cuidados médicos apesar de se reconhecer 
que o que determina a saúde das pessoas são factores que actuam fora do 
domínio da medicina”. 
Este paradoxo condiciona uma progressiva aplicação de recursos 
financeiros na medicina curativa, em todas as sociedades modernas e, 
contudo, aumenta a insatisfação perante a resposta conseguida. 
Por isso, o sentido do fluxo, na relação entre os sistemas de saúde e os 
cidadãos está a ser invertido nos países mais avançados, nos quais a 
abordagem está a ser centrada na saúde das comunidades, como também se 
afirma neste livro. 
A discussão dos conceitos de saúde e doença é apresentada com grande 
suporte de bibliografia actual e pertinente, permitindo ao leitor uma visão 
correcta dos planos de observação em que se podem colocar na análise da 
aplicação desses conceitos. 
Descreve a valorização dos padrões culturais, dos hábitos e costumes no 
processo de manter a saúde ou aquisição da doença, o que nos leva à 
discussão das ciências comportamentais, ao conceito de factor de risco e à 
responsabilidade individual na preservação da saúde. 
Necessariamente discute as implicações políticas e sociais destas 
perspectivas que atribuem papel activo do cidadão na qualidade de vida 
individual e colectiva. 
O desenvolvimento de modelos e teorias para “explicar as relações entre o 
pensamento e comportamento individuais e a saúde e doença”, permitiu 
delinear processos para aumentar a eficácia de intervenção do psicólogo, 
abrindo as áreas de intervenção em psicologia da saúde. 
Estabelece a relação entre Saúde, Qualidade de vida e Bem-estar, numa 
visão ecológica dos factores intervenientes que relaciona com a promoção 
da saúde e a prevenção da doença. 
As implicações destes conceitos na definição de factor de risco, no 
pensamento epidemiológico e nas consequências das medidas tomadas 
sobre as variáveis demográficas dão a dimensão das preocupações que se 
desenham no pensamento do autor. 
A parte terminal do livro vai focar a relação entre o doente, num contexto 
médico, nos nossos dias, destacando a progressiva tendência para a 
cronicidade das soluções conseguidas pelos meios modernos de análise 
biomédica das patologias. 
4 
 
Por esta via, chega-se à análise das situações delicadas que representam o 
doente terminal e os grandes síndromes como o stress e a dor. Estas 
situações definem a necessidade de uma acção multidisciplinar em que o 
psicólogo clínico desempenha um papel fundamental. 
Saliento o sub-capítulo em que o Prof. Pais Ribeiro aborda a dificuldade de 
avaliação em psicologia e saúde, pois a especificidade e a multiplicidade 
das informações que caracterizam cada situação é tão grande que o 
aleatório representa um dos factores a ponderar na análise dos resultados da 
intervenção. 
Penso que este livro tem ainda a qualidade de aparecer num momento 
decisivo da definição do sentido a dar aos sistemas de saúde em todo o 
mundo. Assim sendo, será uma das referências necessárias para os que se 
interessam por essa problemática. 
Nuno Grande 
5 
 
INTRODUÇÃO 
A Intervenção Psicológica no Campo da Saúde tem sofrido nos últimos 100 
anos mudanças notáveis. Se no início a intervenção praticamente não 
existia, a partir de certa altura começou a participar, primeiro com a sua 
especialidade, a avaliação, mais tarde intervindo na doença mental e, 
finalmente, participando globalmente em interacção com todos os 
profissionais que trabalham nesse Campo. 
Esta evolução está estreitamenteassociada às mudanças que ocorreram no 
modo de pensar o Campo da Saúde, assim como às mudanças sociais, 
políticas e económicas verificadas a partir dos anos 60. Uma das 
características dessas mudanças na maneira de pensar foi o retorno a uma 
consciência ecológica. 
Se a perspectiva ecológica esteve subjacente a quase todas as práticas 
médicas das civilizações e dos povos antigos, ela foi quebrada com a 
adopção do modelo científico com predominância da vertente analítica 
sobre a vertente sintética, esta, por definição, mais sistémica ou 
ecológica. 
O título adoptado para este livro, “Psicologia e Saúde” pretende salientar 
que a Psicologia que se aborda neste livro não se refere à orientação 
tradicional de uma psicologia que se dedicava ao diagnóstico de doenças 
mentais, ou que se dedicava ao tratamento ou ao ajustamento no campo da 
saúde mental. 
Por outro lado também pretende ultrapassar a Psicologia que ficou expressa 
no relatório publicado em 1976 pelo grupo que deu início à especialidade 
de Psicologia da Saúde, como uma especialidade que se aplicava às 
doenças físicas. Ou seja pretende-se salientar a ultrapassagem da 
dicotomia corpo espírito inerente à intervenção tradicional que se faz no 
campo da saúde. 
Na realidade, desde o início da sua aplicação, na década de 80, a Psicologia 
da Saúde dedicada à saúde física e a tradicional Psicologia Clínica dedicada 
à saúde mental, convergiram para, na prática, deixarem de se diferenciar. 
Expressões como Psicologia Clínica da Saúde pretendem, exactamente, 
salientar essa aproximação. 
6 
 
Por outro lado e no espírito do que ficou conhecido por Segunda Revolução 
da Saúde, o termo Saúde abrange não apenas as doenças mas principalmente 
a intervenção a montante, a que se faz com as pessoas que estão saudáveis de 
modo a reduzir a probabilidade de virem a adoecer. Incluem-se nesta área a 
Promoção e a Protecção da Saúde e a Prevenção das doenças. 
O presente livro é destinado aos estudantes universitários que nos seus 
currículos têm disciplinas que abordam a interface entre Psicologia e Saúde 
e a psicólogos ou outros profissionais do Campo da Saúde que se 
interessam pelo comportamento humano aplicado à saúde e às doenças. 
Ele tem intenções didácticas e faz, desde uma abordagem genérica à 
origem e evolução dos conceitos, até temas genéricos mais específicos e 
escolhidos como importantes. A expansão que este domínio conheceu nos 
últimos anos levou à publicação de inúmeros manuais de aplicação, a 
praticamente todos os domínios e níveis na saúde e nas doenças. Este 
manual constitui uma introdução a esses inúmeros manuais mais ou menos 
especializados. 
A Psicologia e Saúde na unidade do corpo e espírito 
Como acontecimento não normativo (Baltes, Reese, & Lipsit, 1980), a 
Saúde é um factor decisivo no desenvolvimento humano, um domínio 
fundamental na vida das pessoas ao longo de todo o ciclo de vida. 
Acompanha o desenvolvimento humano da concepção à morte. Para 
Bronfenbrenner e Crouter (1983), “o desenvolvimento humano envolve 
a mudança, durante o ciclo de vida, dos padrões de comportamento ou 
de percepção, resultantes da interacção, entre as características 
biológicas do indivíduo em desenvolvimento e as do meio ambiente 
onde vive” (p. 359). 
Ao considerar a Saúde do ponto de vista do desenvolvimento humano, dois 
processos assumem uma posição importante: os processos de desequilíbrio 
e os processos homeoréticos ou heterostáticos. Os primeiros referem-se à 
estimulação que o organismo deve receber, os segundos às reacções 
adaptativas. 
A psicologia do desenvolvimento tem conceptualizado o modo como as 
mudanças ocorrem no ser humano e, simultaneamente, o modo como se 
podem influenciar essas mudanças. Por exemplo, Piaget é um dos autores 
que assume uma perspectiva sistémica do desenvolvimento humano. Ao 
referir-se ao desenvolvimento mental considera que ele depende dos 
7 
 
seguintes factores: maturação, experiência física, experiência lógico-
matemática, experiência e transmissão social e equilibração. Este último 
factor é o que dá uma perspectiva sistémica à teoria. Com efeito, a 
equilibração, é o mecanismo que regula a interacção dos restantes factores 
e que garante que eles se desenvolvam de forma equilibrada. Uma nova 
aquisição, por exemplo, a maturação do sistema nervoso facilita, ou 
precede, a aquisição de experiência física que, por sua vez, se repercute em 
experiência lógico matemática mais complexa e assim sucessivamente, 
ocorrendo, então, desenvolvimento pelo estabelecimento de equilíbrios em 
patamares cada vez mais complexos. O desenvolvimento não ocorre porque 
um dos factores se desenvolve isoladamente, mas sim porque todos os 
factores se desenvolvem equilibradamente. 
O desenvolvimento que se manifesta como equilíbrio temporário, em 
patamares cada vez mais complexos, diz-se homeorético (ao invés de 
homeostático). Homeoresis é uma palavra de origem latina, composta por 
homéo que significa constante, ou o mesmo e rhéo, que significa fluxo, ou 
corrente contínua. Assim, ao invés da homeostasia que defende a ideia de 
um estado constante, a ideia de homeoresia defende a de uma mudança 
constante, de um fluxo constante. 
Num ponto de vista dinâmico, implícito na ideia de desenvolvimento, deve-
se considerar que o organismo humano está em entropia ou em desordem e 
que, através das propriedades que são próprias dos sistemas vivos, tende a 
organizar-se e a reconstruir-se, para novamente entrar em desordem. Este 
processo é inerente à vida e tem-se mantido ao longo dos últimos biliões de 
anos. A evolução humana, como a dos organismos em geral, resulta de 
interacção do indivíduo com o meio ambiente e, devido às propriedades de 
sistema aberto dos organismos vivos – auto-organização e auto-construção 
– há um processo constante de estabelecimento de equilíbrio entre os 
diversos componentes do sistema. 
Como já foi referido, o processo de estabelecimento de equilíbrio não é um 
processo homeostático. A manutenção de um estado estável – a 
homeostasia – é evidente e essencial, em determinados sistemas biológicos 
mais simples, tais como o nível do ph ou da temperatura corporais. 
Vários autores têm, no entanto, achado o conceito de homeostasia 
insuficiente para explicar o equilíbrio dinâmico inerente ao comportamento 
e desenvolvimento de sistemas mais complexos. Em vez do conceito de 
homeostasia proposto por Cannon (1936), Waddington (1968) propõe o 
8 
 
conceito de homeoresia e Selye (1974) o de heterostasia1. Ambos os 
conceitos significam a restauração de equilíbrio, já não num mesmo nível, 
ou num nível absoluto, mas sim em níveis cada vez mais complexos, ou 
mais adequados à nova situação: são conceitos desenvolvimentais por 
excelência e ecológicos, ao invés de estáticos. Homeoresia implica 
aumento de complexidade. 
O conceito de homeoresia foi apresentado por Waddington para designar 
sequências de desenvolvimento. Uma reacção homeorética tenderia a puxar 
para a via apropriada de desenvolvimento, qualquer organismo que, devido 
a uma qualquer influência externa, se tivesse desviado dela; o 
desenvolvimento processava-se através de uma sequência de creodos que 
funcionavam como marcadores do caminho a percorrer (Waddington, 
1968). Nesta perspectiva embriológica o desenvolvimento percorreria uma 
sequência prédeterminada, num calendário preciso. A noção de creodo 
salienta a importância da trajectória do desenvolvimento, em vez do estado 
final e a homeoresia salienta a constância de uma trajectória, um fluxo, em 
vez de um estado (Waddington, 1968). 
O desenvolvimento pode ser conceptualizado de modo quantitativo ou 
qualitativo. Numa perspectiva quantitativa considera-se que, até certa 
altura, as mudanças tendem a ser incrementais, resultando em aumento da 
capacidade funcional para, a partirde certo momento, esta tender a 
diminuir. Numa perspectiva qualitativa reconhece-se que há mudança na 
qualidade da produção mas não na quantidade: o sistema, ou o indivíduo, 
tende a produzir de maneira diferente e não mais ou menos. 
A sociedade em geral, foi dominada por modelos quantitativos até há bem 
pouco tempo. Subjacente a esses modelos estava a ideia que o crescimento 
era infindável, quer se referisse ao crescimento económico das sociedades, 
ao populacional, à produção industrial, quer se referisse à prática 
desportiva: seria sempre possível correr cada vez mais rápido, saltar cada 
vez mais alto, ou lançar mais longe. A emergência da consciência ecológica 
tende a fazer substituir os modelos quantitativos por modelos qualitativos. 
 
1 Entre os autores que defendem a perspectiva sistémica não há 
concordância quanto ao significado dos conceitos que utilizam. Por 
exemplo, enquanto Nicholas e Gobble (1990) utilizam o termo 
heterostesia para se referirem a desregulação conducente a doença, como 
sinónimo de declínio, Selye (1974) define-o como o estabelecimento de 
um novo estado de equilíbrio, alcançado por força de acções que 
estimulam e aumentam as capacidades, de maneira a elevar o nível de 
resistência do organismo. 
9 
 
Referindo-se ao ser humano, era suposto que o decrescimento fosse o estado 
natural desde muito cedo, normalmente após a década dos 20-30 anos. Por 
exemplo, quando se estudava a inteligência humana, considerava-se que esta 
crescia até cerca dos 25 anos e depois diminuía de forma constante. No 
entanto, investigações recentes desmistificaram esta perspectiva. Por 
exemplo, Schaie (1990) numa investigação longitudinal que durou sete anos, 
no âmbito do Seattle Longitudinal Study, no qual foi avaliado o nível de 
funcionamento intelectual de indivíduos que no final desse período tinham 
entre 60 e 81 anos, concluiu que “dependente do grupo etário, entre 60 e 
85% de todos os participantes permaneceram estáveis ou aumentaram as 
suas capacidades específicas” (p. 296). Este tipo de resultados alerta para 
que o desenvolvimento não termina no primeiro quarto do ciclo de vida, 
podendo prolongar-se até ao fim da existência. 
O senso comum tende a aceitar que, se tal desenvolvimento é possível para 
a dimensão psicológica, não o é para a dimensão física. Ou seja, se alguns 
processos psicológicos podem aumentar em complexidade durante toda a 
vida, há tendência para aceitar que a nível físico o que predomina são os 
processos decrementais: o idosismo (conceito pejorativo) tende a aceitar o 
processo de envelhecimento como um processo fatal. No entanto, a 
investigação não vai no mesmo sentido e o padrão verificado para o 
funcionamento intelectual aplica-se a dimensões não intelectivas. Por 
exemplo, Spirduso e MacRae (1990) referem que, num estudo do National 
Center for Health Statistics dos Estados Unidos, em que 38,3 milhões de 
indivíduos foram avaliados quanto à sua capacidade de trabalho em 
diferentes situações, verificou-se que, entre os 55 e 74 anos, aumenta a 
percentagem de indivíduos que têm dificuldades nas diferentes situações, 
mas que 58% deles não tinha dificuldade em nenhuma delas. De uma 
maneira geral e referindo-se à dimensão física, a investigação constata que 
os idosos (grupos entre os 50 e os 79 anos) respondem positivamente à 
quantidade de estimulação (Cononie, Graves, Pollock, Phillips, Summers, 
& Hagberg, 1991; Cress, Thomas, Johnson, Kasch, Cassens, Smith, & 
Agre, 1991; Perri & Templer, 1985; Peterson, Peterson, Raymond, 
Gilligan, Checovich, & Smith, 1991). Segundo Nicholas e Gobble (1990), 
o que parece ocorrer com o passar do tempo é uma dificuldade de 
restabelecimento de equilíbrios e um aumento de processos desregulatórios, 
característico da senescência. 
Como conclusão deste tipo de investigação, parece que a estimulação, a 
prática, mantém os sistemas em níveis óptimos de funcionamento: no caso 
das investigações referidas, a diferença era notória entre os indivíduos que 
se mantinham inactivos e os activos. A estimulação, a carga, provoca um 
desiquilíbrio a que um processo de adaptação responde, restaurando o 
equilíbrio num nível mais adequado, em resposta aos estímulos. 
10 
 
O conceito de Promoção da Saúde tem implícita a ideia que esta pode 
desenvolver-se ao longo do ciclo de vida e que esta evolução é qualitativa. 
No ciclo de vida humano (e nos sistemas vivos em geral), há mudanças 
constantes nas possibilidades e no funcionamento dos diversos 
componentes dos sistemas de vida: finalmente, estas mudanças 
manifestam-se de modo muito diferente nos vários sub-sistemas que 
suportam a vida, de tal modo que nuns casos são incrementais, noutros se 
mantém e, noutros, são decrementais. A Promoção da Saúde pressupõe a 
ideia que a saúde é um processo em vez de um estado, processo dependente 
do jogo de estimulação-reacção constante do organismo. 
Quererá isto dizer que, se devidamente estimulado, o indivíduo nunca 
morre? Admitir tal hipótese seria contrariar os princípios ecológicos e 
sistémicos assumidos. Mesmo supondo que Matusalém existiu e viveu mais 
de 900 anos, ele acabou por morrer. Os seres humanos colocam questões 
acerca da imortalidade do espírito que remetem para o foro da fé, da 
religião, mas não questionam a imortalidade do corpo. Aceitar a morte 
como inerente ao processo de desenvolvimento é essencial para o próprio 
bem-estar do indivíduo: tal perspectiva é parte integrante, por exemplo, da 
teoria de desenvolvimento humano de Erik Erikson (1968). 
A Promoção da Saúde, conceptualizada como desenvolvimento, não se 
propõe imortalizar o corpo, não se propõe, sequer, dar mais anos à vida, 
embora a investigação demonstre claramente que um estilo de vida 
saudável junta mais anos à vida. O elemento essencial consiste, sim, em dar 
mais vida aos anos. 
As mudanças que se podem considerar desenvolvimentais tendem, 
portanto, a ser mais qualitativas do que quantitativas: elas variam, quer 
quanto ao momento em que ocorrem, quer quanto à sua natureza. Embora 
haja tendência para considerar como sinónimos desenvolvimento e 
incremento, o desenvolvimento, ao invés de ser considerado como mero 
incremento, deve ser visto como uma situação de equilíbrio, em patamares 
cada vez mais complexos: desenvolvimento é, essencialmente, aumento de 
complexidade. O equilíbrio consiste na forma mais económica de 
interacção entre os diversos sub-sistemas em presença (biológicos, 
psicológicos, sociais, ambientais, etc.). O desenvolvimento deve ser 
concebido como a restauração do fluxo de desenvolvimento, da homeoresia 
entre todos os componentes do sistema de vida, quer os pessoais, quer os 
ambientais e sociais, ao longo do ciclo de vida. 
A interacção com o meio ambiente proporciona aos organismos uma 
quantidade de estimulação que, se adequada, desencadeia processos de 
adaptação e promove o desenvolvimento. Diversos autores têm salientado esta 
11 
 
necessidade de estimulação adequada para que exista desenvolvimento, 
psicológico ou físico. Na área do desenvolvimento cognitivo, por exemplo, a 
noção de Zona de Desenvolvimento Próximo (ZDP), de Vigotsky (1978) e da 
sua escola sócio-histórica ou cultural, defende e demonstra que a estimulação 
intelectual adequada (dentro de uma zona que denomina ZDP) permite ao 
indivíduo aumentar a sua capacidade cognitiva. No domínio corporal, Harre 
(1982) define um processo semelhante: referindo-se à utilização de estímulos 
(ou cargas) com vista a promover o desenvolvimento, a capacidade física, 
processo a que chama “sobrecompensação”. Este autor define adaptação 
como “ajustamento funcional, dos sistemas psicológicos e físicos, a um 
padrão de realização mais elevado e a condições externas específicas, através 
da influência de cargas externas” (p. 54). Selye (1974),ao explicar a teoria do 
stress, apresenta o Síndrome Geral de Adaptação (SGA) como um processo 
essencial à vida, numa perspectiva muito semelhante à do autor anterior, 
embora aplicada a contextos diferentes. O SGA é uma resposta não específica 
(enquanto a referida por Harre é específica) a um estímulo, que inclui três 
fases: reacção de alarme, fase de resistência e fase de esgotamento. A 
heterostasia – restabelecimento do equilíbrio num novo patamar – depende do 
jogo entre estas três fases, da escolha da intensidade dos estímulos ou cargas e 
é, como o próprio Selye refere, um processo activo do organismo. A ausência 
de estimulação, tal como a estimulação exagerada provocam dano e 
conduzem à morte. 
Utilizaremos frequentemente os termos “sistémico” e “ecológico”. O termo 
“ecologia” refere-se, grosso modo, às interrelações entre os organismos e o 
seu meio ambiente. Embora este último seja um termo da moda, em 
psicologia existe uma área designada por “psicologia ecológica”. A 
psicologia ecológica, é uma sub-área da psicologia ambiental, que foca, 
particularmente, a actividade humana que ocorre num período de tempo e 
num espaço determinados (Stokols, 1978). Os princípios que lhe estão 
subjacentes são os dos modelos sistémicos. 
Com raízes na biologia, o paradigma ecológico estendeu-se a todas as 
disciplinas, fornecendo um quadro de referência que facilita a compreensão 
da natureza das relações das pessoas com o seu meio físico e sociocultural 
(Stokols, 1992). Segundo este autor, uma perspectiva ecológica da saúde e 
da promoção da saúde implica alguns princípios, a saber: 
a) uma situação conducente à saúde e bem-estar é influenciada por 
inúmeros factores, físicos (p. ex., geografia, arquitectura e tecnologia), 
sociais (p. ex., cultura, economia e política), pessoais (p. ex., biologia, 
psicologia); 
b) a análise da saúde e da promoção da saúde deverá reflectir a 
complexidade multidimensional dos ambientes humanos, descritos em 
12 
 
termos dos seus componentes físicos e sociais, tanto quanto às suas 
qualidades objectivas como às suas qualidades percebidas, imediatas ou 
a longo prazo, cada uma por si e em interacção umas com as outras; 
c) tal como os ambientes podem ser descritos em vários níveis, também os 
indivíduos devem ser vistos em vários níveis de agrupamentos, do 
indivíduo, família, pequeno grupo, organizações, até aos grandes 
aglomerados populacionais, recorrendo a várias metodologias (e.g., 
exame médico, questionários, observações comportamentais, registos do 
ambiente, análises epidemiológicas); 
d) a perspectiva ecológica incorpora os conceitos derivados da teoria dos 
sistemas. 
Uma orientação ecológica implica considerar, simultaneamente: nível de 
suporte social (ou seja, ligações pessoais próximas), estratégias para lidar 
com a vida do dia-a-dia (ou seja, grau de racionalidade, flexibilidade, 
expectativas, planificação, etc.), nível de empenhamento (nível de 
continuidade, coesão, controlo) e nível de identidade pessoal, na interacção 
com o contexto cultural, ambiental, histórico e social (Stokols, 1992). 
O ser humano enquanto sistema 
Outro grande componente do bloco ecológico é o homem cuja composição 
e organização se passa a explicar de seguida. Ford (1987, 1990) propõe um 
modelo sistémico, aplicado à compreensão do homem e das suas relações 
com o meio, que tem, subjacente, duas proposições básicas: 
a) o ser humano é um sistema auto-organizado; 
b) o ser humano é um sistema auto-construído. 
A estrutura física e, a organização dos sistemas vivos, torna possível quatro 
conjuntos de funções: 
a) funções biológicas – crescimento; manutenção; operação e reparação da 
estrutura biológica; produção de energia. 
b) funções transaccionais – troca de materiais essenciais para o 
funcionamento biológico; movimento do corpo e outros processos de 
troca de energia; recolha e transmissão de informação. 
c) funções excitatórias – que adaptam a quantidade, frequência, ou 
intensidade da actividade do sistema para ir ao encontro das exigências 
do meio. 
13 
 
d) funções de governo – organização e coordenação do sistema (i.e., 
direcção controlo e regulação do comportamento; processamento e 
armazenamento de informação). 
Estas funções, que são garantidas por vários sub-sistemas – biológico, 
transaccional, excitatório e de governo – aplicam-se, também, ao sistema 
humano e, são todos importantes para a acção individual. Todos estão em 
interacção contínua uns com os outros e com o meio, de uma forma 
dinâmica. 
No sub-sistema biológico, que garante as funções biológicas, identificam-
se todas as estruturas constituintes do organismo humano (sistema 
circulatório, sistema músculo-esquelético, sistema nervoso, sistema 
digestivo, sistema endócrino, sistema respiratório, entre outros) concebidas, 
tanto isoladamente como em interacção. Deficiente funcionamento destas 
estruturas, originam fadiga e baixa no ritmo de acção: determinados 
contextos são exigentes relativamente à capacidade de movimentação. No 
mundo moderno, a consciência ecológica emergente, exige uma nova 
forma de relacionamento do homem com a natureza, apelando para uma 
maior disponibilidade e mobilidade do sistema biológico. O stress afecta 
estas estruturas provocando danos que podem conduzir à morte. 
No sub-sistema de governo, que garante as funções de governo, 
identificam-se três processos (Ford, 1987): 
a) processos directivos – organizam e elaboram cognições que representam 
as consequências desejadas e emitem sinais para o resto do sistema, de 
modo a coordenar e organizar a actividade que conduza o indivíduo para 
essas consequências; 
b) processos reguladores – avaliam em que grau a pessoa atingiu, está em 
vias de atingir, ou caminha para a consecução de resultados desejados, 
assim como o grau em que os recursos disponíveis foram, são, ou 
deverão ser utilizados para atingir certos fins socialmente apropriados, 
adequados consoante a situação e com eficiência. Este processo pode 
levar à modificação dos objectivos ou a definir novos objectivos. 
c) processos de controlo – são responsáveis pela avaliação das 
representações cognitivas, pela construção das consequências desejadas 
e pelo estabelecimento de planos adequados para atingir os fins 
perseguidos e activados pelos processos directivos, tendo em conta as 
limitações impostas pelos processos reguladores. 
No sub-sistema transaccional identificam-se três conjuntos responsáveis 
pela acção, correspondentes aos três tipos de recursos de que os sistemas 
14 
 
vivos necessitam para manter o funcionamento corrente e para conseguir 
novas capacidades funcionais: 
a) material – que lida com a troca de materiais (i.e., comer, beber, respirar, 
excretar); 
b) energia – que lida com o movimento do corpo, com a manipulação do 
meio e outros processos de troca de energia (i.e., andar, correr, segurar, 
bater, lançar, levantar, carregar, usar ferramentas); 
c) informação – que lida com a troca de informação com o meio (i.e., ver, 
ouvir, tocar, experimentar, cheirar, falar, escrever, gesticular, sorrir). 
No sub-sistema excitatório, que garante as funções excitatórias identificam-
se três processos: 
a) processos de activação energética – lidam com a variação do nível de 
vigor e esforço necessários para a acção, em função das circunstâncias 
exigidas pelo meio e das mudanças decididas nos sistemas directivos. A 
actividade do dia-a-dia exige variações sensíveis no nível de activação; 
b) processos atencionais – são responsáveis pela variação nos níveis de 
consciência e de concentração. Actuam variando as sensações, as 
percepções e as cognições, fornecendo mais ou menos energia para a 
realização das tarefas, filtrando o “ruído” e amplificando o “sinal” na 
direcção adequada. Os processos atencionais estão intimamente ligados 
ao sub-sistemade governo e por isso têm um papel particularmente 
importante; 
c) processos emocionais – são processos especializados que ajudam a 
regular o comportamento em diferentes condições do meio. Por 
exemplo, a raiva fornece energia à acção, de tal modo que, se pode lidar 
mais eficientemente com os obstáculos para atingir os objectivos. A 
tristeza e a depressão, por outro lado, inibem a actividade de tal modo 
que pode-se deixar de perseguir os objectivos propostos. A culpa pode 
servir as mesmas funções para os fins considerados inaceitáveis. 
Emoções positivas, tais como interesse, satisfação e esperança, 
promovem comportamentos eficazes, na medida em que, fornecem 
energia para a procura de novos objectivos ou para manter os actuais. 
As emoções são, em geral, adaptativas. 
Concluindo, podem-se conceber quatro sub-sistemas que caracterizam o ser 
humano: biológico, excitatório, de governo e transaccional. Estes sub-
sistemas, interdependentes, garantem um conjunto de funções que resultam 
em acção, em contextos que podem ser concebidos em diversos níveis. 
15 
 
A organização do livro 
O livro está organizado em quatro partes. A primeira parte introduz a 
Psicologia e Saúde, fazendo referência ao conceito, à legislação que define 
o seu campo de acção em Portugal, a interpretação que é feita à interface da 
Psicologia e Saúde com os contextos tradicionais de saúde. Seguidamente 
apresenta-se uma perspectiva histórica da saúde e das doenças, para se 
compreender porque é que no virar do milénio se chegou a esta Psicologia 
e Saúde. Finalmente abordam-se alguns conceitos básicos. 
Na segunda parte aborda-se a relação entre comportamento saúde e 
doenças, os modelos principais que têm sido desenvolvidos para 
compreender a relação entre Psicologia saúde e doenças e a intervenção 
que deve ser considerada nos diversos contextos de saúde e de doença. 
Na terceira parte abordam-se os indicadores sanitários, epidemiologia e 
factores de risco e de recurso de saúde, assim como as principais causas de 
mortalidade. Descrevem-se as quatro principais causas de mortalidade os 
factores de risco que lhes estão subjacentes e pistas para a intervenção de 
psicólogo. Seguidamente discute-se o papel da adesão dos indivíduos ao 
tratamento. 
Na quarta parte abordam-se três temas básicos que são comuns às doenças 
e à saúde. Apresenta-se, ainda, um léxico com os termos mais importantes 
e as referências bibliográficas que são referidas ao longo do livro. 
16 
 
PARTE I – INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA E SAÚDE 
A psicologia no campo da saúde 
Na década de 70 ocorreu uma mudança radical no modo dos políticos e dos 
cientistas pensarem a saúde, dando origem ao que ficou conhecido por 
Segunda Revolução da Saúde (Michael, 1982; Richmond, 1979). Esta 
revolução teve duas características essenciais: (a) passou a centrar-se sobre 
a saúde ao invés de sobre a doença e, (b) reconheceu que, nos países 
desenvolvidos, o comportamento humano era a principal causa de 
morbilidade e mortalidade. Foi no contexto desta mudança radical que 
emergiu a Psicologia da Saúde. 
A Psicologia da Saúde define-se como “domínio da psicologia que recorre 
aos conhecimentos provenientes das diversas áreas da psicologia, com vista 
à promoção e protecção da saúde, à prevenção e tratamento da doença, à 
identificação da etiologia e diagnóstico relacionados com a saúde, com as 
doenças e disfunções associadas, à análise e melhoria do sistema sistema de 
cuidados de saúde e ao aperfeiçoamento da política de saúde (Matarazzo, 
1982, p. 4). Nesta definição de Psicologia da Saúde identificam-se quatro 
objectos ou objectivos diferenciados – promoção, protecção, prevenção e 
tratamento – e dois domínios distintos – saúde e doenças. 
Perspectiva histórica 
Formalmente, a origem da Psicologia da Saúde remonta à década de 70. 
Em 1973, nos Estados Unidos da América, foi criada no seio da 
American Psychological Association uma task force on health research, 
com o intuito de estudar “a natureza e a extensão da contribuição dos 
psicólogos para a investigação básica e aplicada sobre os aspectos 
comportamentais nas doenças físicas e na manutenção da saúde” (APA 
task force on health research, p. 263). Em 1976 publicavam um relatório 
sobre as relações entre a psicologia e os contextos tradicionais de saúde 
e doença, propondo orientações doutrinárias para a área em estudo. Este 
relatório constituiu o embrião da nova área da psicologia que ficou 
17 
 
conhecida por Psicologia da Saúde. Em 1978, criou-se a Divisão de 
Psicologia da Saúde da American Psychological Association (Divisão 
38) que, a partir de 1982, fez sair o primeiro número do seu periódico – 
Journal of Health Psychology. Depois deste inúmeros jornais 
especializados aparecem, quer publicados pelas divisões nacionais de 
Psicologia da Saúde quer por editoras. Na Europa surge o Psychology & 
Health, até mais recentemente o Psychology Health & Medicine, ou 
ligados a domínios específicos como o Psycho-Oncology. 
Por esta época, movimento semelhante ocorria na Europa. O Regional Office 
for Europe da Organização Mundial de Saúde, sediado em Copenhaga, 
publica em 1984 um documento da autoria da European Federation of 
Professional Psychologists Association, que esclarece a contribuição da 
psicologia para a saúde. Em Portugal, um artigo de Pereira (1980) aborda a 
relação entre comportamento, saúde e doenças e, durante a década, outros 
artigos são publicados sobre o tema (D’Almeida, 1985; Ribeiro, 1989). No 
seio da Associação dos Psicólogos Portugueses (APPORT) cria-se uma 
divisão dedicada à Psicologia da Saúde e publica-se uma colectânea de 
artigos sobre o tema; a partir de 1992 a Análise Psicológica publica vários 
números temáticos sobre Psicologia da Saúde; organizam-se reuniões 
científicas, quer por iniciativa da APPORT, quer das escolas de formação, 
em 1994 tem lugar o Primeiro Congresso Nacional de Psicologia da Saúde 
com a participação organizativa de elementos de todas as escolas de 
psicologia do país. Em 1995 cria-se a Sociedade Portuguesa de Psicologia da 
Saúde (SPPS), sociedade científica baseada nos organizadores do Primeiro 
Congresso de Psicologia da Saúde. Em 1997 organiza o 2º Congresso 
Nacional de Psicologia da Saúde que contou com a presença da presidente 
da divisão de Psicologia da Saúde da American Psychological Association e 
com a presidente da The European Health Psychology Society. A SPPS edita 
e apresenta na abertura do congresso o livro de actas que engloba parte 
substancial das comunicações apresentadas. 
O interesse da Psicologia pelos ambientes tradicionais de saúde e doença é 
paralelo ao desenvolvimento da consciência acerca do papel do 
comportamento na saúde e nas doenças mais comuns, área de interesse 
conhecida como Medicina Comportamental. Nesta área surgiram títulos 
especializados de que é exemplo, o Journal of Behavioral Medicine, cuja 
publicação se iniciou em 1978 editado pela Academy of Behavioral 
Medicine dos Estados Unidos da América, enquanto outros periódicos 
mudam de nome para se adaptarem às novas perspectivas, caso do Journal 
of Human Stress que passa, em 1988, a chamar-se Behavioral Medicine. 
18 
 
O interesse da psicologia pela saúde e doenças não mentais 
Uma questão interessante a colocar é porquê o aparente interesse súbito da 
psicologia pelas áreas tradicionais da saúde? Segundo Millon (1982), desde 
os primórdios da psicologia havia exemplos de colaboração entre os 
domínios médicos e psicológicos: no final do século XIX são conhecidas as 
colaborações de Wundt com Kraepelin, nos EUA e de Heymans com 
Weirsma, na Europa, embora estas colaborações focassem primordialmente 
as psicopatologias. Já dentro do século XX esboçaram-se relações 
institucionais entre a Psicologia e a Medicina: em 1911, na reunião anual 
da American Psychological Association,houve encontros formais entre 
psicólogos e médicos com o intuito de discutir a participação dos 
profissionais de psicologia nos contextos tradicionais de saúde e doenças. 
Apesar destas tentativas, as relações entre os dois domínios mantiveram-se 
incipientes até ao final da década de 70, concluindo o relatório da APA task 
force on health research (1976), que os psicólogos americanos não se 
sentiam atraídos para as áreas das doenças físicas e da saúde. 
Subitamente, na década de 80 verifica-se uma explosão do interesse dos 
psicólogos pela área. O que é que aconteceu que provocou tal mudança? 
Belar, Deardorff e Kelly (1987) enumeram algumas das razões possíveis 
para este interesse: 
a) fracasso do modelo biomédico na explicação das doenças e da saúde; 
b) crescimento da preocupação com a qualidade de vida e com a prevenção 
da doença; 
c) mudança da atenção dos profissionais de saúde das doenças infecciosas 
para as doenças crónicas, com o reconhecimento do papel fundamental 
do estilo de vida; 
d) maturidade da investigação nas ciências comportamentais; 
e) aumento dos custos dos cuidados de saúde e procura de alternativas aos 
cuidados de saúde tradicionais. 
Psicologia Clínica, Psicologia da Saúde e Psicologia Clínica da Saúde 
Etimologicamente o termo “clínico” tem origem no latim clinicus, 
emprestado do grego Klinicos e significa “o que visita o doente na cama”, 
por sua vez com origem na palavra klinein que significa “estar deitado”. 
Segundo Mucchielli e Mucchielli (1969) o termo, com aplicação mais 
19 
 
antiga na medicina, significa estar à cabeceira do doente salientando, 
simultaneamente, um atendimento personalizado e prático. Na psicologia 
as origens do significado do termo são diferentes. 
No final do século passado, Witmer apresentou um novo método de 
investigação e instrução que designou por Psicologia Clínica (Garfield, 
1965). O termo clínico sublinhava a função prática do psicólogo em 
oposição ao que era a prática tradicional de então que era de laboratório. 
Por esta altura a expressão Psicologia Clínica é também utilizada por Freud 
numa carta escrita a Fliess. 
Como explicam Ribeiro e Leal (1996) a preocupação dos pioneiros da 
Psicologia Clínica visava predominantemente as crianças deficientes. Já 
dentro do século XX a Psicologia foi-se generalizando a outras disfunções, 
nomeadamente às dos indivíduos com ferimentos cerebrais. Entre as 
Primeira e Segunda guerras mundiais, o desenvolvimento de técnicas de 
avaliação psicológica e a afirmação dos psicólogos como os grandes, aliás 
os únicos, especialistas nessa função, arrastou os psicólogos para a área de 
sua maior competência, a avaliação psicológica que, para os menos 
informados, por vezes se tende a identificar com a função principal do 
psicólogo. 
No final da Segunda Guerra Mundial a Psicologia Clínica desenvolve-se no 
auxílio às vítimas da guerra. Data, aliás de 1947, o primeiro programa 
significativo de formação nesta área desenhado por Shakow, na época 
presidente do Committee on Training in Clinical Psychology da American 
Psychological Association (Garfield, 1965). A Psicologia Clínica começava 
a afastar-se do que era a sua zona de segurança – a avaliação psicológica – 
e começava a desenvolver e a implementar modelos de intervenção 
baseados na ciência psicológica. 
A Psicologia começava realmente a aplicar o que verdadeiramente se pode 
chamar o método clínico e o raciocínio clínico. Segundo Isselbacher, 
Adams, Brawnwald, Petersdorf e Wilson (1980), o método clínico é 
idêntico ao método científico, começando com dados de observação que 
sugerem uma série de hipóteses que depois são examinadas à luz de novas 
observações, algumas das quais são feitas na clínica e outras no laboratório. 
Finalmente, chega-se a uma conclusão que em ciência se denomina teoria e 
em medicina diagnóstico operacional. 
Godman (1991) explica que o raciocínio clínico se inicia numa 
investigação das queixas através da análise da história e da observação. 
Num segundo momento recolhe dados a partir de técnicas de diagnóstico 
apropriadas em termos de utilidade, validade e fidelidade. Depois integra 
20 
 
os dados recolhidos nas duas fases anteriores de modo a conhecer 
adequadamente o estado do sujeito. Em quarto lugar estima os custos e 
benefícios da necessidade de realizar mais testes ou de iniciar o processo de 
ajuda. Finalmente as várias opções são discutidas com o sujeito e dá-se 
início ao plano terapêutico. 
A Psicologia Clínica instalava-se e ganhava estatuto nos hospitais 
psiquiátricos onde os psicólogos se estabeleciam com vigor. Shakow 
(1975) definia Psicologia Clínica como “área de conhecimento e de 
habilidades que visa ajudar as pessoas com alterações comportamentais ou 
perturbações mentais a alcançar modos mais satisfatórios de ajustamento 
pessoal ou de auto-expressão” (p. 2376). 
Entretanto, a evolução dos sistemas de saúde, o desenvolvimento de 
medicamentos que controlavam o comportamento dos indivíduos e as 
críticas ferozes ao modelo de internamento, tornaram obsoletos os hospitais 
psiquiátricos. Estes tornaram-se serviços de psiquiatria a par de outros 
serviços em hospitais gerais e os hospitais psiquiátricos começaram a 
desaparecer. Os profissionais que trabalhavam com a doença mental 
começaram a ser solicitados para ajudar pessoas com doenças não mentais 
mas com problemas de adaptação à sua doença, às sequelas da doença, ou 
outras equivalentes. É nesta época que emerge a Psicologia da Saúde. 
De então para cá, nos Estados Unidos da América, na Europa e um pouco 
por todo o mundo, a Psicologia da Saúde tem-se desenvolvido rapidamente 
e emprestado uma nova e interessante dinâmica não só à Psicologia mas 
também ao Campo da Saúde em que está implementada ou se tenta 
implementar. De facto, para lá da perspectiva da Psicologia como “ciência 
da saúde, que contribui para uma melhor compreensão dos factores 
envolvidos na saúde e na doença” (McIntyre, 1994b, p. 19), é de destacar a 
Psicologia como profissão de saúde. Se esta perspectiva é clássica no que 
concerne especificamente ao psicólogo como técnico de saúde mental não 
o é, de modo nenhum, para uma saúde que se pretende geral e preze o papel 
dos próprios indivíduos e das comunidades nos seus estados de saúde e 
qualidade de vida, bem como de muitas das suas formas de ser e estar 
doente. Esta é, aliás, uma das grandes novidades que a legislação que 
define o estatuto e funções do psicólogo clínico traz. Diz este documento 
que o psicólogo clínico “é o profissional habilitado com o grau de 
especialista que desenvolve funções científicas e técnicas no campo da 
saúde”, ou seja, desaparece a palavra mental. 
Então, se desde a Segunda Guerra Mundial a Psicologia Clínica se dirigia 
essencialmente às doenças mentais, a emergência da Psicologia da Saúde, 
visando, no início, essencialmente as doenças físicas, empurrou estes dois 
21 
 
grupos para uma aproximação, visto que o que as separava deixava de ter 
sentido – por um lado a dimensão física e por outro a mental. 
Neste sentido vemos as posições de Milon e de Fox. O primeiro defendia 
que a Psicologia Clínica e a Psicologia da Saúde fossem consideradas como 
apenas uma, dado que, “clinical psychology was misguided in its evolution 
when it followed a dualistic mind-body model and there by itself to 
ministering to the ‘mentally’ disordered. Health psychology came into 
being in great measure as an antidote to the deficits and imbalance this 
created” (Millon, 1982, p. 9). Fox num texto com um título sugestivo – 
The need for a reorientation of clinical psychology – defendia que: 
we devoted 90% of our efforts serving the needs of the 10%-15% of the 
population that suffers from diagnosable mental illness. (...) If psychology 
is to become a true health profession it must greatly expand its concernswith general health issues. Psychologists should be concerned not only 
with helping people to cope with anxiety or emotional disturbances, but 
also with helping people to cope with such physical health problems as 
chronic illness, impending surgery, heart attacks, unhealthy life-styles, and 
so forth. If clinical psychology were defined as the profession devoted to 
enhancing the effectiveness of human coping skills, the profession then 
should be concerned with all human functioning and the ability to cope 
with all types of health conditions (Fox, 1982, p. 1052). 
Estava-se no início da Psicologia da Saúde. A past presidente da divisão 
38 – Health psychology – afirmava em 1987 “obviously, clinical health 
psychologists engage in the same broad range of functions as more 
traditional clinical psychologist” (Belar, Deadorf, & Kelly, 1987, p. 8). 
Ou seja, a partir da década de 70, a intervenção no Sistema de Saúde em 
geral e no de Cuidados de Saúde em particular e a evolução seguinte, 
que consistiu em fechar os tradicionais hospitais psiquiátricos e criar 
Serviços de Saúde Mental a par de todos os outros serviços de cuidados 
de saúde, empurra e obriga a psicologia a repensar a sua postura neste 
campo e, principalmente, a rever o seu arsenal de teorias, técnicas usadas 
e fins. 
Nasce assim o que alguns denominaram “Psicologia Clínica da Saúde”, 
definível como a aplicação dos conhecimentos e métodos de todos os 
campos práticos da Psicologia, na promoção e protecção da saúde física e 
mental do indivíduo e na prevenção, avaliação e tratamento de todas as 
formas de perturbação mental e física, nas quais as influências 
psicológicas podem ser usadas ou podem contribuir para aliviar o mau 
funcionamento ou distress (Bellar et al., 1987; Millon, 1982). 
22 
 
Não se pense no entanto que o que foi dito acima é universalmente aceite. 
Os valores não mudam assim e, tal, nota-se na terminologia utilizada. Para 
alguns a Psicologia Clínica continua a ser a que se faz no âmbito da saúde 
mental enquanto a da Saúde seria a que se pratica com as doenças físicas, 
ou seja a continuação da adopção do dualismo estrito mente-corpo. A par 
desta divisão muitas outras existem e variam de significado em países 
diferentes. 
Psicologias Clínicas e da Saúde 
Com as mudanças que ocorreram na concepção de saúde a partir de década 
de 70, alterou-se concomitantemente o papel da Psicologia no Sistema de 
Saúde. Estas alterações conduziram a uma proliferação de expressões que 
pretendiam intitular o profissional de Psicologia que trabalhava no Sistema 
de Saúde como, por exemplo: Psicologia Clínica do Desenvolvimento que 
expressa o interesse por uma abordagem desenvolvimental no ciclo de vida 
(Bibace & Walsh, 1979); Psicologia Clínica da Criança, que qualifica a 
Psicologia Clínica que se dedica às crianças (Bibace & Walsh, 1979); 
Psicologia da Reabilitação que qualifica actividades orientadas para a 
restauração funcional subsequente a traumatismos ou a deficiência física 
(Millon, 1982), Neuropsicologia Clínica (Belar, Deardorff, & Kelly, 1987) 
que Kaplan e Saccuzzo (1993) definem como a disciplina científica que 
foca as incapacidades do sistema nervoso central e o seu tratamento, ou 
Psicologia da Saúde da Criança (Maddux et al., 1986). 
Outras expressões tendem a confundir-se com a Psicologia Clínica como é o 
caso, por exemplo, de Psicologia Médica, que é um termo geral abrangendo o 
uso de procedimentos e princípios psicológicos no diagnóstico e avaliação da 
doença física e na avaliação do tratamento (Alcorn, 1991) e que, em Portugal, 
tende a ser exercida, quase exclusivamente por médicos; Psicossomática, que 
se interessa pela relação entre variáveis fisiológicas e psicossociais na doença, 
conceito que se baseia na ligação entre explicações psicanalíticas da 
personalidade e o desenvolvimento subsequente de certas doenças (Alcorn, 
1991; Millon, 1982), etc. Por vezes recorre-se a outras expressões como 
“psicologia clínica em contextos médicos”, título do livro de Sweet, Rozensky 
e Tovian (1991). 
Sherr (1996) propõe figurativamente as várias áreas de intervenção da 
Psicologia no Campo da Saúde que resultariam do cruzamento de dois 
eixos em que um representa o tipo de problemas e o outro o tipo de 
intervenção. Deste cruzamento resultariam quatro celas que expressavam 
modos de intervenção diferentes: 
23 
 
Problemas 
 Psicológicos Médicos 
Intervenção Psicológica A B 
Intervenção Médica C D 
Assim, a cela A abrangeria problemas psicológicos com intervenção 
psicológica, (seria a área tradicional da Psicologia clínica); a B problemas 
médicos com intervenção psicológica (área da Psicologia da Saúde); a C 
problemas psicológicos com intervenção médica (área da psiquiatria) e a D 
problemas médicos com intervenção médica. 
Todas as expressões passíveis de qualificar práticas profissionais dos 
psicólogos no Sistema de Cuidados de Saúde ou no Sistema de Saúde em 
geral podem ser, genericamente, substituídas por Psicologia Clínica na 
medida em que abrangem as funções que estão definidas para o profissional 
de psicologia que exerce a sua prática no Campo da Saúde. 
Aspectos novos da psicologia que se pratica no sistema de saúde 
As mudanças ocorridas no Campo da Saúde introduziram aspectos novos 
na prática do psicólogo que intervém no sistema de cuidados de saúde. De 
entre estes salientamos: 
1) definição de quem é o cliente; 
2) alteração na relação psicólogo doente; 
3) tempo de intervenção. 
Definição de quem é o cliente 
Não se trata realmente de um aspecto novo. Nos hospitais psiquiátricos 
tradicionais esta questão já existia. No entanto ela existia ao nível dos 
“psi’s” e era, provavelmente, mais fácil de resolver. Lembramos que 
etimologicamente a palavra “cliente” qualifica aquele que pede ajuda. 
Quando alguém se dirige ao gabinete do psicólogo a pedir ajuda na 
resolução de um problema não há dúvidas acerca de quem é o cliente. 
24 
 
Hoje, as equipas onde o psicólogo está incluído, são maiores e mais 
complexas, informadas por conhecimentos mais diversificados. Quando o 
doente se dirige ao sistema de Cuidados de Saúde a pedir ajuda, não o faz 
para aspectos psicológicos. Fá-lo, geralmente, para pedir ajuda para o mal-
estar, o sofrimento, provocado por uma qualquer presumível doença física. 
É no âmbito da relação com o médico, ou outro dos que participam no 
diagnóstico, que surge a eventual necessidade de apoio psicológico ou 
psicoterapêutico. Então o médico ou outro, pedem apoio ao psicólogo. Ora, 
assim, o cliente passa a ser o médico que pediu ajuda para o doente (ou de 
modo mais alargado o próprio sistema de saúde) e não o doente. 
No seio da equipa multidisciplinar surgirá a discussão do caso e o 
psicólogo deverá questionar-se sobre qual a informação que pode partilhar 
com a equipa sem violar o código de ética. Qual é a informação que poderá 
ser útil à equipa e, por conseguinte, ajudar o doente? Qual é a informação 
que nunca deve ser divulgada? 
Alteração na relação psicólogo-doente 
Ainda na continuação do referido anteriormente, quando o psicólogo, no 
seu gabinete perante um cliente que o procura, pode recorrer à expressão 
metafórica “então o que é que o traz por cá?”, quando lhe é pedido que se 
dirija à cama “x” porque um doente está particularmente “nervoso” ou 
ansioso, o normal será que o doente lhe faça aquela pergunta. À primeira 
vista pareceria que o cliente é o psicólogo. Muitos doentes nem sequer 
sabem o que é o psicólogo, outros, não sabem que existem naquele serviço, 
outros pensam que os estão a considerar loucos e muitas outras 
possibilidades. Portanto, esta psicologia que se faz à cabeceira do doente, 
ou seja esta “verdadeira” psicologia clínica (no sentido que se faz à 
cabeceira do doente), este apoio psicológico, implicará, forçosamente, uma 
abordagem diferente.Por outro lado, como os doentes estão em 
enfermarias com outros, os que estão nas camas ao lado estão em posição 
de escutar o apoio do psicólogo ao doente, o que significa que este apoio 
tem limitações. 
Tempo de intervenção 
Finalmente e na sequência dos aspectos anteriores, o apoio que é dado 
nestes casos é normalmente breve. O doente, na maioria dos casos, 
abandona o hospital e o tempo que o psicólogo passa com o doente é muito 
25 
 
curto, não só o que está à cabeceira do doente como o número de vezes que 
está como ele. Este modo de relacionamento está longe dos parâmetros que 
tradicionalmente são considerados na relação de apoio. 
A Psicologia Clínica hoje 
O facto de a Psicologia Clínica só passar a estar regulamentada em 1994 foi 
benéfico na medida em que não foi necessário anular ou acrescentar 
funções à Psicologia Clínica que se deveria praticar na interface com o 
sistema de saúde. O que este Decreto-lei estabelece são as funções que 
modernamente são realizadas pelos psicólogos em contexto ou com 
objectivos de saúde e que, na realidade consiste nas funções do que se 
designou por uma Psicologia Clínica da Saúde e que, mais 
economicamente se passará a chamar Psicologia Clínica. 
Com o Decreto-lei 241/94 de 22 de Setembro de 1994 (com aditamentos da 
Portaria nº 1109/95 de 9 de Setembro) surge em Portugal a consagração da 
prática da Psicologia Clínica no sistema de saúde como profissão que 
desenvolve “funções científicas e técnicas de avaliação, psicodiagnóstico e 
tratamento no campo da saúde” (p. 5671). Mais especificamente 
consagrou-se como funções da Psicologia Clínica no âmbito do sistema de 
saúde, o estudo psicológico de indivíduos e grupos populacionais, a 
participação e elaboração de programas de educação para a saúde, o 
aconselhamento psicológico individual, conjugal, familiar ou de grupo, 
bem como a intervenção psicológica e psicoterapêutica. Estabeleceu-se 
ainda que, além destes níveis de intervenção, é função do Psicólogo Clínico 
no sistema de saúde a elaboração, promoção e coordenação de acções de 
formação complementar, a participação em acções de formação na área 
da especialidade e afins, assim como a participação em programas de 
investigação em aspectos relacionados com a sua área profissional. 
Este Decreto-lei, embora a um primeiro olhar não faça mais do que 
estabelecer legalmente aquilo que são de facto as possibilidades e 
competências específicas dos Psicólogos Clínicos que trabalhem no sistema 
de saúde, introduz dois princípios fundamentais no modo de conceber a 
Psicologia Clínica: 
1) define que a intervenção do Psicólogo Clínico se realiza no Campo da 
Saúde, em geral e já não somente no da saúde mental; e, 
2) coloca o Psicólogo Clínico na dependência funcional de outros 
Psicólogos Clínicos e não, como anteriormente na de outros técnicos. 
26 
 
Estes dois princípios, que do nosso ponto de vista são decisivos, reflectem, 
por um lado, desenvolvimentos importantes que ocorreram no sistema de 
saúde e, por outro, impõem adaptações importantes na prática tradicional 
do Psicólogo Clínico e na sua formação. 
Inquéritos realizados nos Estados Unidos da América mostram que os 
psicólogos que trabalham no sistema de saúde dedicam cerca de 15 a 25% 
do seu tempo profissional à investigação, cerca de 10% ao diagnóstico, 
15% ao ensino, 15% à terapia e 5 a 10% à administração. Estes valores 
variarão para Portugal mas as funções a exercer não serão muito diferentes. 
A saúde e a doença ao longo dos tempos 
Na medida em que a saúde é um recurso pessoal da vida de todos os dias, é 
normal que as pessoas tenham ideias acerca da saúde e das doenças. Essas 
ideias têm variado ao longo dos tempos através das diversas culturas e 
religiões, através de grupos socio-económicos e consoante a instrução das 
pessoas dentro da mesma cultura. 
A formação das ideias dos técnicos implica a compreensão destas 
diferenças e a adopção de um modelo explicativo. A parte que se segue 
visa contribuir para a formação de ideias acerca do que deverá ser 
entendido como saúde e doenças. 
Importância de uma perspectiva ecológica 
As mudanças ocorridas no planeta Terra nos últimos 15 biliões de anos 
permitiram ao homem atingir o ponto em que se encontra hoje. Mudanças, 
muito lentas por vezes, muito rápidas noutras, moldaram a vida na terra tal 
como é conhecida. Nesta lenta viagem, milhares de espécies desapareceram 
e milhares de outras surgiram, em resposta adaptativa, ecológica, às 
mudanças ocorridas. 
Como defendem Katz e Wallace (1974) o equilíbrio ecológico tem sido um 
elemento fulcral no desenvolvimento da humanidade. Estes autores 
explicam que: 
“num sentido evolucionário alargado, o sistema sociocultural humano tem 
sido capaz de proteger e isolar o homem de certos efeitos prejudiciais do 
27 
 
meio ambiente. Por outras palavras, ao longo do tempo, a população 
humana adapta-se ao seu ambiente nativo, não apenas através de 
determinadas características fisiológicas, geneticamente determinadas, mas 
também através da cultura que, por esse meio mantém um equilíbrio 
dinâmico com os processos de mudança ambientais” (p. 1050). 
Quando este equilíbrio era perturbado surgiam as epidemias que 
dizimavam populações que não estavam preparadas para se defender de 
microorganismos desconhecidos. Exemplos deste tipo ocorreram aquando 
dos descobrimentos: com efeito, em 1519 a população nativa do México 
era estimada em cerca de 30 milhões, tendo caído para 3 milhões em 1568 
após a conquista pelos espanhóis. Esta diminuição ocorreu, em grande 
parte, devido à introdução, pelos conquistadores, de organismos 
patogénicos desconhecidos naquele meio, neste caso a varíola e o sarampo. 
Ao mesmo tempo, o contacto com as civilizações do outro lado do 
Atlântico facilitaram a transformação da bactéria transmissora da sífilis – 
Treponema Pallidium – de modo a que se tornasse eficiente através da 
transmissão sexual, o que não ocorria antes. Esta doença, praticamente 
desconhecida antes das descobertas teve, por sua vez, efeitos devastadores 
no velho mundo. 
A revolução industrial, tal como 200 anos antes os descobrimentos, 
provocaram grandes alterações no modo de vida de grande parte da 
população do planeta e as mudanças que a acompanharam causaram 
grandes alterações no meio físico e social e no estilo de vida do homem. A 
revolução pós-industrial ao reconhecer, pela primeira vez, a necessidade do 
equilíbrio ecológico para a sobrevivência da humanidade, propõe-se 
restabelecer equilíbrios que existiam há centenas de anos. Esta tentativa de 
restabelecimento do equilíbrio ecológico instalada ao nível dos discursos 
não parece acompanhar a acção. 
A crise ecológica está instalada: imagens de fome, guerra e infecções nos 
países do sul, poluição química, espacial, sonora e visual, mecanização da 
vida diária nos países do norte, ocupam diariamente os media. Não se trata, 
agora, de defender qualquer espécie em vias de extinção, ou de salvar uma 
floresta que é pulmão do planeta. Trata-se de uma crise que afecta todo o 
sistema que constitui o planeta Terra. Neste contexto de crise ecológica, 
surgiu a necessidade de estudar as repercussões da ecologia para os seres 
humanos, dando origem ao conceito de “ecologia humana”. 
Segundo Dubos (1979), ecologia humana abarca mais do que a relação 
entre o homem e o meio ambiente. A ecologia ensina-nos que todas as 
forças sociais, físicas e biológicas, actuando sobre o homem, direccionam o 
seu desenvolvimento e moldam a sua natureza. O corpo e a mente estão em 
28 
 
modificação constante e, consequentemente, em formação, devido a 
estímulos que induzem reacções formativas. 
Embora actualmente se estudem, fundamentalmente, os efeitos nefastos das 
alterações ecológicas chegará o dia em que a ecologia humana estará apta a 
dar maisatenção aos efeitos benéficos e positivos do meio, do que aos 
efeitos patogénicos. Segundo Dubos, adoptar uma perspectiva ecológica, 
mais concretamente de ecologia humana, implica a adopção de uma nova 
atitude intelectual e científica diferente da que é considerada adequada na 
biologia em geral e noutras ciências biomédicas, porque ela tem de lidar 
com os efeitos indirectos e a longo prazo, exercidos (no ser humano) pelo 
ambiente e pelo estilo de vida, mesmo se esses factores não tiverem, 
aparentemente, influência imediata. Seria fácil ilustrar a importância desses 
efeitos indirectos e a longo prazo, discutindo, por exemplo, o papel da 
abundância ou falta de alimentos, das várias formas de poluição química e 
microbiana, dos efeitos do ruído ou outros estímulos, da densidade e, 
especialmente, das rápidas mudanças populacionais; em resumo, de todas 
as forças ambientais que actuam sobre o homem de todas as classes sociais, 
em todos os locais. Devemos salientar que os efeitos mais importantes do 
ambiente e do estilo de vida são, frequentemente, difíceis de reconhecer, 
dado só se manifestarem, indirectamente, após muito tempo (Dubos, 1979). 
Saúde e doenças são processos e estados que fazem parte da vida e que 
medeiam entre a concepção e a morte. As doenças são processos em que o 
equilíbrio ecológico está perturbado, enquanto a saúde é um processo em 
que o organismo está em equilíbrio e funcional. Este equilíbrio ecológico 
não pode excluir o meio ambiente ou, dito de outro modo, não parece 
possível manter-se saudável num planeta doente (King, 1990). 
A saúde é um elemento fundamental na evolução das espécies vivas. Com 
efeito, não é suficiente estar vivo: é essencial que haja energia e vigor para 
actuar, que haja relaxamento e calma para reflectir num estado de 
vigilância activo, mesmo na ausência de acção, que haja expectativas de 
futuro, desejo e, finalmente, que haja equilíbrio entre estes diferentes 
aspectos e entre eles e o ambiente onde tudo ocorre. 
Para que tudo isto suceda é necessário Saúde. Com afirmava Sigerist em 
anos longínquos (1941), ser saudável é ser bem equilibrado corporal e 
mentalmente e bem ajustado ao meio físico e social, é estar em controlo 
total dos recursos mentais e físicos, é adaptar-se às mudanças do meio 
(desde que não excedam os limites normais), é contribuir para o bem-estar 
da sociedade de acordo com a sua capacidade. A saúde é algo positivo, uma 
atitude jovial, alegre, perante a vida, é aceitação, bem-disposta, das 
responsabilidades que a vida impõe. 
29 
 
Torna-se, no entanto, necessário definir um modelo alternativo ao modelo 
biomédico que é influenciado pela perspectiva cartesiana, que inclua a 
compreensão dos processos causais mútuos entre o funcionamento 
psicológico, comportamental, biológico, bioquímico e social. 
Dito de outra maneira, é necessário adoptar um modelo conceptual que 
represente o indivíduo como uma unidade estrutural e funcional em 
desenvolvimento, como uma organização complexa, em transacção 
contínua com um meio ambiente (tecnológico, biológico, arquitectural, 
paisagístico, etc.) em mudança. A psicologia do desenvolvimento já se 
defrontou com este problema e produziu modelos que podem ser úteis para 
conceptualizar a Saúde nesta nova perspectiva. 
Evolução dos sistemas de saúde 
As técnicas médicas desenvolvidas entre o final do século XIX e meados 
do século XX, deixaram supor que o caminho para o controlo definitivo das 
principais doenças tinha sido encontrado. A partir de meados do século 
XX, altura em que o desenvolvimento de novos medicamentos começou a 
permitir curar grande parte das doenças infecciosas, dá-se uma alteração 
radical nas causas de mortalidade e morbilidade. As principais causas de 
doença deixaram de ser organismos patogénicos que, introduzidos no 
organismo hospedeiro provocavam doenças, para passarem a ser o 
comportamento humano. 
Embora a partir de meados do século se tivessem começado a notar 
mudanças nos padrões de morbilidade, mortalidade e suas causas, foi na 
década de 70 que se verificou o impacto público destas mudanças e se 
definiram estratégias universais para enfrentar o novo desafio. A 
intervenção sobre este novo agente – o comportamento humano – exige 
soluções, forçosamente mais complexas, substancialmente diferentes das 
adoptadas até então e tende a tornar inadequados os modos tradicionais de 
conceber a saúde e a doença. Simultaneamente impõe aos sistemas de 
saúde existentes mudanças radicais. 
Os países desenvolvidos iniciaram uma revolução no campo da saúde. Esta 
revolução, apelidada por Richmond (1979) de “Segunda Revolução da 
Saúde”, tem exigido grande esforço e estratégias diferentes para enfrentar 
os novos desafios. A principal mudança no modo de conceber a saúde 
consistiu na deslocação do foco das atenções do vector doença, dominante 
desde o advento da medicina científica, para o vector saúde. Esta mudança 
30 
 
ocorreu primeiro entre os cientistas que se debruçavam sobre esta área e 
depois entre os políticos, conduzindo a uma nova concepção de Saúde 
Pública, com consequências importantes para os sistemas de saúde 
tradicionais (Lancet, 1991). 
O primeiro marco do impacto público das mudanças e da intenção política 
de introduzir alterações, consistiu na publicação, em 1974, do relatório “A 
New Perspective on the Health of Canadians” da autoria de Marc Lalonde, 
então ministro da saúde e do bem-estar do Canadá. Este documento, 
considerado um livro branco da saúde, constituindo um marco histórico 
para a nova maneira de conceber a saúde e a doença, justificava do seguinte 
modo a nova maneira de conceber o Campo da Saúde: 
“enquanto se faziam progressos nos cuidados de saúde, no nível de vida em 
geral, na protecção fornecida pela saúde pública e na ciência médica, 
contra-forças nefastas trabalhavam para destruir esse progresso. Esta forças 
do contra constituem o lado negro do progresso económico. Elas incluem 
poluição ambiental, vida citadina, hábitos de indolência, abuso de álcool, 
tabaco e drogas e padrões alimentares que põem os prazeres dos sentidos 
acima das necessidades do corpo humano. Para estas ameaças ambientais e 
comportamentais à saúde, o sistema de cuidados de saúde pode fazer pouco 
mais do que de rede onde caem as vítimas. Médicos, cirurgiões, 
enfermeiras e hospitais despendem muito do seu tempo no tratamento de 
doenças causadas por factores ambientais adversos e riscos 
comportamentais. É evidente que é necessário implementar melhorias no 
ambiente, nos riscos auto-impostos e um maior conhecimento da biologia 
humana, se se pretende que os Canadianos vivam uma vida feliz, plena, 
longa e livre de doenças” (Lalonde, 1974, p. 5). 
No mesmo sentido, reflectindo as mesmas preocupações e com as 
mesmas conclusões, iniciou-se em 1977, nos Estados Unidos da América 
(EUA), a pedido do governo de então, um estudo sobre o estado da saúde 
da Nação. Esse estudo, publicado em 1979 com o título “Healthy People: 
The Surgeon General’s Report on Health Promotion and Disease 
Prevention”, ficou conhecido por relatório Richmond, nome do autor, 
então secretário assistente para a saúde e surgeon-general do titular da 
pasta da saúde. Finalmente, reflectindo esta consciência a nível 
planetário, em 1978 a Organização Mundial da Saúde adoptou a 
Declaração de Alma-Ata, onde se definiram um conjunto de objectivos 
de saúde para a população do planeta e de estratégias para os alcançar – 
Saúde Para Todos no Ano 2000. Estes três marcos, permitem afirmar que 
se está numa nova era, quanto ao modo de conceber a saúde e a doença 
e, quanto ao modo de intervir. 
31 
 
Embora as mudanças reais no modo de funcionamento das estruturas de 
saúde e doença não sejam visíveis, as investigações começaram a reflectir a 
nova perspectiva. Um destes estudos foi o Estudo Alameda, assim

Outros materiais