Prévia do material em texto
Caminhos da INCLUSÃO | 1 caminhos para inclusão.indd 1caminhos para inclusão.indd 1 23/8/2011 11:01:5923/8/2011 11:01:59 Universidade do Estado do Pará Marília Brasil Xavier Maria das Graças da Silva Jofre Jacob da Silva Freitas Ruy Guilherme Castro de Almeida Mariane Cordeiro Alves Franco Manoel Maximiano Junior Editora da Universidade do Estado do Pará Josebel Akel Fares Nilson Bezerra Neto Marco Antonio da Costa Camelo Jessiléia Guimarães Eiró Hudson Maik Campos da Silva Flávio Cardoso de Araújo Odivaldo Teixeira Lopes Willame de Oliveira Ribeiro Bruna Toscano Gibson Elizabeth Teixeira Hebe Morganne Campos Ribeiro Ivanilde Apoluceno de Oliveira Jofre Jacob da Silva Freitas Joelma Cristi na Parente Monteiro Alencar Josebel Akel Fares Maria das Graças da Silva Marília Brasil Xavier Norma Ely Santos Beltrão Tânia Regina Lobato dos Santos Reitora Vice-Reitora Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Pró-Reitor de Graduação Pró-Reitora de Extensão Pró-Reitor de Gestão Coordenadora Revisor Designer Gráfi co Diagramador Apoio Técnico Conselho Editorial caminhos para inclusão.indd 2caminhos para inclusão.indd 2 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 Caminhos da INCLUSÃO | 3 caminhos para inclusão.indd 3caminhos para inclusão.indd 3 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Diretoria de Biblioteca Central da UEPA ______________________________________________________________________________ Caminhos da inclusão / Ana Irene Alves de Oliveira, Danielle Alves Zaparoli, Juliana Maciel de Queiroz Lourenço, Rafael Luiz Morais da Silva, (orgs.). _ Belém : EDUEPA, 2011. 192 p. : il. Inclui bibliografi as ISBN: 978-85-88375-75-8 1.Educação inclusiva. 2. Educação especial. 3. Inclusão em educação. I. Oliveira, Ana Irene Alves de, Org. CDD 22. ed. 371.9 _____________________________________________________________________________ caminhos para inclusão.indd 4caminhos para inclusão.indd 4 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 APRESENTAÇÃO A inclusão representa nos dias de hoje uma ampla tarefa frente a nossa realidade. Vivemos num país de grandes diferenças sociais, que re- quer uma educação de qualidade para todos, e incluímos neste contexto os portadores de qualquer ti po de necessidade especial. No dicionário, ‘incluir’ signifi ca ato ou efeito de incluir. Para chegar à inclusão pensamos que, muitas vezes, precisamos inovar. Porém a ino- vação não necessariamente se faz através da criação de algo novo, fre- quentemente faz-se necesário repensar algo que já existe e trazer para a efeti vidade na busca de estratégias que possibilitem à pessoa com defi ci- ência construir seus conceitos e aplicá-los a sua realidade. Não deixa de ser uma inovação. É uma reinvenção. Os caminhos da pedagogia da inclusão apontam para uma cons- trução do conhecimento baseada na interação dos sujeitos envolvidos neste processo, cabendo, neste momento, estratégias que tornem certos conceitos acessíveis ao nosso “aluno”, considerando os diversos graus de potencialidades. Neste contexto, vários indivíduos interessados no crescente estudo das perspecti vas, inovações e refl exões acerca da inclusão reuniram-se no III Fórum de Tecnologia e Inclusão Social da Pessoa Defi ciente e so- cializaram o fruto do seu trabalho nesta área, que tende a crescer a cada nova experiência que surge. Este livro, composto por 21 capítulos, aborda os caminhos da in- clusão frente à realidade dos autores, suas vivencias, refl exões e suas práti cas do processo de inclusão da pessoa defi ciente. São experiências e relato de casos que tornam a leitura grati fi cante, e levam o leitor a pen- sar em outras estratégias frente a sua vivência diária. Esperamos que todos aproveitem deste substrato de conhecimen- to e, a parti r desta proposta, refl itam e mudem suas realidades ou aper- feiçoem suas ideias e estratégias. Assim cresce a ciência da TECNOLOGIA ASSISTIVA e INCLUSÃO. Ana Irene Alves de Oliveira Danielle Alves Zaparoli Juliana Maciel de Queiroz Lourenço Rafael Luiz Morais da Silva caminhos para inclusão.indd 5caminhos para inclusão.indd 5 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 caminhos para inclusão.indd 6caminhos para inclusão.indd 6 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 PREFÁCIO O leitor vai encontrar no livro Caminhos da Inclusão, organizado por Ana Irene Alves de Oliveira, uma variedade de textos, produzidos de forma coleti va, que tratam sobre o processo de inclusão social e edu- cacional de pessoas surdas, auti stas, com síndrome de down, paralisia cerebral, entre outras necessidades especiais. O livro trata, com riqueza de informações, sobre o tema inclusão, em seus 21 arti gos, perpassando pelo debate de questões referentes à aprendizagem, à tecnologia assisti va e à acessibilidade, bem como a prá- ti cas inclusivas e à formação de professores. Apresenta a inclusão em di- ferentes contextos (clínicos e educacionais) e abordagens teórico-meto- dológicas, contribuindo de forma signifi cati va para o estudo da inclusão no cenário brasileiro. Caminhos da Inclusão está organizado em três partes. Na primeira, inti tulada “Pessoas com defi ciência e procedimentos de aprendizagem”, Marilice Garotti , Karina Montenegro e Raphaella Albuquerque, em seu estudo sobre “Funcionalidade dos Sistemas Parentais de Mães Surdas e ouvintes e seus bebês ouvintes durante o primeiro semestre”, buscam identi fi car os sistemas parentais, em situação de brincadeira livre, de duas díades mãe-bebê, sendo uma das mães surda; Ruth Daisy Souza e Grauben de Assis em “Aprendizagem de relações ordinais em crianças surdas” objeti vam verifi car, por meio de estudo experimental, o contro- le do comportamento por relações ordinais com discriminação simples, sob controle condicional e contextual em crianças surdas; Cinti a Sanchez e Amauri Gouveia Junior no arti go “Inclusão diagnósti ca do surdo”, tra- ta sobre a questão da avaliação psicológica do surdo, sendo destacada a difi culdade do diagnósti co dessa população pela falta de instrumento adaptado para a avaliação; Ana Irene Oliveira, Rafael da Silva e Sayuri Fernandes Toda em “O uso do conto e reconto de histórias na inserção de símbolos gráfi cos: ampliando a comunicação de um indivíduo com para- lisia cerebral” relatam experiências no atendimento de um usuário com paralisia cerebral por meio da comunicação alternati va, uti lizando como estratégia a narração de histórias, adaptada por simbologia pictográfi ca. Por fi m, Marcilene Pinheiro, Luana de Sena, Ana Irene de Oliveira e Rafael da Silva no texto “ Era uma vez...: as narrati vas infanti s como recurso de esti mulação cogniti va de uma criança síndrome de down” analisam as caminhos para inclusão.indd 7caminhos para inclusão.indd 7 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 possibilidades de uti lização das narrati vas infanti s como recurso terapêu- ti co ocupacional na esti mulação cogniti va de uma criança com Síndrome de Down. A segunda parte congrega arti gos sobre “Tecnologias de Apoio à Inclusão Social”. Dalva Watanabe, Lília Giacomini, Marcia Souza, Sandra Stanziani, Higino Mesquita, Shirley Maia e Vula Ikonomidis em “O uso de tecnologia assisti va para favorecer a aprendizagem da pessoa com surdo- cegueira e defi ciência múlti pla” relatam o processo de triagem, avaliação e parti cipação nas ofi cinas de comunicação do Programa de Reabilitação de Ahimsa e Grupo Brasil e no treinamento de uso de tecnologia assis- ti va de duas pessoas com surdo-cegueira adquirida;Mariana Miccione e Grauben Assis no texto “Contribuições da análise do comportamento para compreensão de repertórios acadêmicos e comportamentos clinica- mente relevantes”, apontam a relevância da análise do comportamento por meio do estudo sistemáti co das variáveis circunscritas no processo de Ensino-Aprendizagem, na compreensão de comportamentos com- plexos, especialmente aqueles envolvidos com a leitura, a matemáti ca e clinicamente relevantes; Jaci de Souza e Grauben Assis, no arti go “Esta- belecendo comportamento textual em função da ordenação de letras”, analisam o efeito de um procedimento de ensino por encadeamento de respostas para apresentar formas não representacionais e instalar os pré-requisitos do comportamento textual (ordenação de símbolos do alfabeto para formar palavras dissílabas) em alunos que apresentavam atraso no desenvolvimento cogniti vo; Marília Gonçalves, Sebasti ão Mira- glia, Vania Ulbricht, Claudia de Macedo e Josiane Vieira, no texto “Aces- sibilidade na Educação - Visuak GD, relatam a pesquisa realizada com o intento de adequar o conteúdo de Representação Gráfi ca Espacial para a WEB respeitando os requisitos de acessibilidade e uti lizando a cons- trução de objetos de aprendizagem considerados ainda hoje como um conceito novo; Hildebrando Esteves Neto, Ana Irene Oliveira, Anna Ka- ren Mendes, Márcia Hellen Santos, Ermelinda Melo, Direlene da Silva e Herika Pereira, em “Multi mídia biblioteca virtual inclusiva”, apresentam o projeto de criação de uma biblioteca virtual inclusiva acessível, vincu- lada aos Núcleos de Atendimento a Pessoas com Necessidades Especí- fi cas (NAPNEs), com obras relevantes e materiais de interesse didáti co- -pedagógico, disponibilizadas ao público em formato digital e que atenda 8 caminhos para inclusão.indd 8caminhos para inclusão.indd 8 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 Caminhos da INCLUSÃO | 9 aos estudantes com necessidades educacionais específi cas matriculados nos Insti tutos Federais e redes parceiras – Universidade do Estado do Pará (UEPA) e Coordenadoria de Educação Especial do Estado do Pará (COEES); Aline de Albuquerque, Danielle Zaparoli e Ana Irene de Oliveira debatem sobre “Soft ware Educati vo: o que é? Para que? e Por quê?”, revisando os paradigmas das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) e suas dimensões no âmbito da escola; Jorgeane Pantoja; Ana Irene Oliveira; Rafael Luiz Morais; Deyse Pinheiro; Elson Costa e Luísa Monteiro abordam no texto “Uso da Comunicação alternati va com crianças auti s- tas: uma contribuição da Terapia Ocupacional” os défi cits de linguagem de crianças auti stas, sem desconsiderar as característi cas clínicas do au- ti smo infanti l. Na terceira parte o foco é para as “Práti cas em contextos inclusi- vos.” Alessandra Souza, Daniel da Cruz, Giordana Calado, Victor Soares, Alberto Luiz Aramaki e Gismeire Ribeiro discutem sobre “Acessibilidade no contexto escolar” relatando a experiência de avaliação da acessibili- dade de escolas da rede pública de ensino do Programa Escola Acessível implantado pelo Laboratório Integrado de Tecnologia Assisti va da Univer- sidade Federal do Triângulo Mineiro (LITA/UFTM); Christi ne Magalhães e Ramon Panades, no texto “Centro de Atenção Psicossocial da Infância e da Adolescência (CAPSI) de Ouro Preto, MG: ati vidades intersetoriais e interdisciplinares, saúde mental, educação e família”, apresentam a his- tória de um Centro de Atenção Psicossocial da Infância e da Adolescên- cia (CAPSI) em Ouro Preto, MG, a parti r da reforma psiquiátrica, e conta uma trajetória envolvendo as ações para a construção de uma Políti ca Pública em Saúde Mental, no município de Ouro Preto, para a Infância e a Adolescência; Nonato Márcio Sá e Adriana Valery Sá debatem, em “Hanseníase: um olhar psicossocial”, sobre a questão do preconceito e da exclusão que permeia o contexto das pessoas acometi das pela hansení- ase, destacando os aspectos sociais e psicológicos e os desafi os da inclu- são social dessas pessoas; José Anchieta Bentes e Rita Souza-Bentes, no arti go “Avaliação de alunos na sala de recurso multi funcional: discussões em torno da (dis) normalidade”, apresentam uma proposta de avaliação de alunos com necessidades educacionais especiais tendo como base o discurso disnormalizador; Christi ne Magalhães, Franclin do Nascimento e Anna Karen Mendes, em “Orientações pedagógicas na educação de alu- caminhos para inclusão.indd 9caminhos para inclusão.indd 9 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 10 nos com Transtornos Globais do Desenvolvimento na Rede Federal de Educação Profi ssional e Tecnológica”, apresentam o trabalho de orien- tação referente à educação inclusiva aos Insti tutos Federais pela Comis- são Técnica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais de Desenvolvimento; Ana Irene de Oliveira, Rafael Luiz da Silva, Amanda Peixoto, Sayuri Toda, Thalita Melo e Marcilene Pinheiro, no texto “Formação de professores e o uso de tecnologias de apoio à comunica- ção: experiências em escolas da Região Metropolitana de Belém”, rela- tam a experiência de formação de professores do ensino regular na uti - lização de recursos de Comunicação Alternati va e/ou suplementar com crianças com disfunção motora; Adriane Giugni da Silva, Karina Portal e Lilian Cristi na Araújo, em “Inclusão x exclusão: a práxis em uma brin- quedoteca pública de Belém”, apresentam resultados de uma pesquisa em que investi gam o processo dialéti co inclusão-exclusão mediado pela práxis educati va com crianças na faixa etária de 4 a 6 anos de idade, em uma brinquedoteca pública de Belém; Aline Monteiro, Gisely Gabrieli de Souza, Ana Irene de Oliveira e Rafael Luis da Silva, no texto “A compreen- são da inclusão do defi ciente visual na rede regular de ensino: um estudo sob o olhar de quem a vivencia”, relatam a pesquisa realizada com uma jovem cega em uma escola pública de Ananindeua, com o objeti vo de co- nhecer suas reais necessidades e analisar percepção da aluna sobre o seu processo de inclusão escolar. Por fi m, Solange Rabelo de Souza, Ana Irene de Oliveira, Rafael Luiz da Silva e Marcilene Pinheiro, no arti go “Relação terapeuta-paciente: o principal objeti vo do terapeuta ocupacional - rela- to de um caso”, evidenciam a importância da relação terapeuta-paciente na evolução do tratamento, a parti r do relato da experiência com uma criança com Síndrome de Down assisti da no NEDETA. Assim, neste livro, os autores tratam da inclusão de diferentes gru- pos sociais e em diversas facetas, levando-nos a refl eti r sobre a necessi- dade e importância da inclusão na sociedade e educação brasileira. Convido os leitores a adentrarem neste signifi cati vo debate acadê- mico. Ivanilde Apoluceno de Oliveira Belém, agosto de 2011 caminhos para inclusão.indd 10caminhos para inclusão.indd 10 23/8/2011 11:02:0823/8/2011 11:02:08 SUMÁRIO PARTE I Pessoas com deficiência e procedimentos de Aprendizagem FUNCIONALIDADE DOS SISTEMAS PARENTAIS DE MÃES SURDAS E OUVINTES E SEUS BEBÊS OUVINTES DURANTE O PRIMEIRO SEMESTRE 15 APRENDIZAGEM DE RELAÇÕES ORDINAIS EM CRIANÇAS SURDAS 23 INCLUSÃO DIAGNÓSTICA DO SURDO 31 O USO DO CONTO E RECONTO DE HISTÓRIAS NA INSERÇÃO DE SÍMBOLOS GRÁFICOS: AMPLIANDO A COMUNICAÇÃO DE UM INDIVÍDUO COM PARALISIA CEREBRAL 39 ERA UMA VEZ...: AS NARRATIVAS INFANTIS COMO RECURSO DE ESTIMULAÇÃO COGNITIVA DE UMA CRIANÇA COM SÍNDROME DE DOWN 47 PARTE II Tecnologias de Apoio à Inclusão Social O USO DE TECNOLOGIA ASSISTIVA PARA FAVORECER A APRENDIZAGEM DA PESSOA COM SURDOCEGUEIRA E DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA 59 CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA COMPREENSÃO DE REPERTÓRIOS ACADÊMICOS E COMPORTAMENTOS CLINICAMENTE RELEVANTES 69 ESTABELECENDO COMPORTAMENTO TEXTUAL EM FUNÇÃO DA ORDENAÇÃO DE LETRAS 79 ACESSIBILIDADENA EDUCAÇÃO ͳ VISUAL GD 87 MULTIMÍDIA BIBLIOTECA VIRTUAL INCLUSIVA 95 SOFTWARE EDUCATIVO: O QUE É? PARA QUE? E POR QUÊ? 101 USO DA COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA COM CRIANÇAS AUTISTAS: UMA CONTRIBUIÇÃO DA TERAPIA OCUPACIONAL 107 caminhos para inclusão.indd 11caminhos para inclusão.indd 11 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 PARTE III Práticas em contextos Inclusivos ACESSIBILIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR 117 CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DA INFÂNCIA E DA ADOLESCÊNCIA !CAPSI" DE OURO PRETO, MG: ATIVIDADES INTERSETORIAIS E INTERDISCIPLINARES, SAÚDE MENTAL, EDUCAÇÃO E FAMÍLIA 125 HANSENÍASE: UM OLHAR PSICOSSOCIAL 133 AVALIAÇÃO DE ALUNOS NA SALA DE RECURSO MULTIFUNCIONAL: DISCUSSÕES EM TORNO DA !DIS” NORMALIDADE 143 ORIENTAÇÕES PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO DE ALUNOS COM TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA 151 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E O USO DE TECNOLOGIAS DE APOIO A COMUNICAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM ESCOLAS DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM 159 INCLUSÃO X EXCLUSÃO: A PRÁXIS EM UMA BRINQUEDOTECA PÚBLICA DE BELÉM 169 A COMPREENSÃO DA INCLUSÃO DO DEFICIENTE VISUAL NA REDE REGULAR DE ENSINO: UM ESTUDO SOB O OLHAR DE QUEM A VIVENCIA 177 RELAÇÃO TERAPEUTAͳPACIENTE: O PRINCIPAL OBJETIVO DO TERAPEUTA OCUPACIONAL “ RELATO DE UM CASO” 185 caminhos para inclusão.indd 12caminhos para inclusão.indd 12 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 Caminhos da INCLUSÃO | 13 caminhos para inclusão.indd 13caminhos para inclusão.indd 13 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 caminhos para inclusão.indd 14caminhos para inclusão.indd 14 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 FUNCIONALIDADE DOS SISTEMAS PARENTAIS DE MÃES SURDAS E OUVINTES E SEUS BEBÊS OUVINTES DURANTE O PRIMEIRO SEMESTRE1 Marilice F. Garotti2, Karina S. Montenegro3, Raphaella D. L. de Albuquerque4 Universidade Federal do Pará INTRODUÇÃO Avanços recentes em pesquisas da Psicologia Transcultural e da Psi- cologia Evolucionária vêm documentando que as primeiras interações do bebê com seus cuidadores primários são adaptati vas e podem afetar, de forma positi va ou negati va, seu desenvolvimento [1],[2]. Inter-relações entre estruturas fí sicas do ambiente, parâmetros populacionais e estruturas socioeconômicas criam orientações culturais com objeti vos desenvolvimentais específi cos, refl eti dos nas etnoteorias parentais [3]. Estas fazem referência a um conjunto de ideias a respeito da natureza e necessidades da criança, envolvendo tanto as metas de so- cialização, quanto as práti cas parti lhadas pela comunidade sobre a forma de alcançar essas metas [4]. Assim, diferentes práti cas parentais ou estra- tégias de socialização podem ser identi fi cadas não apenas em diferentes culturas, mas também dentro de uma mesma cultura. A literatura identi fi ca dois principais modelos culturais relaciona- dos a diferentes estratégias de socialização e a diferentes trajetórias de individualização (self) [5,6,7]. Os modelos de independência são observa- dos em famílias urbanas de classe média de sociedades ocidentais, com educação formal entre média e alta. Geralmente, as estratégias parentais 1 Os dados deste trabalho foram coletados pela terceira autora para sua dissertação de mestrado, parcialmente fi nanciada pela CAPES. 2 Docente orientadora do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento, UFPA, mari- licegarotti@uol.com.br. 3 Terapeuta Ocupacional, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento, UFPA, karinasmonte@yahoo.com.br. 4 Psicóloga, Docente do Campus de Castanhal da Universidade Federal do Pará, rdla@ufpa.br caminhos para inclusão.indd 15caminhos para inclusão.indd 15 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 16 valorizam objeti vos, necessidades e direitos individuais, enfati zando o desenvolvimento de indivíduos autônomos e independentes. Os mode- los de interdependência podem ser observados em famílias rurais, com pouca instrução e educação formal. As estratégias parentais priorizam valores coleti vos, obediência a regras e deveres, enfati zando o desenvol- vimento de indivíduos sociocêntricos e relacionais. Um terceiro modelo, o autônomo-relacional, combina dimensões dos dois anteriores e é observado em famílias educadas de sociedades historicamente interdependentes. As estratégias de parentagem refor- çam educação e competi ti vidade em ambientes de trabalho (próprias do modelo independente), e proximidade e respeito à hierarquia e obriga- ções em outros ambientes [8]. Para compreender as variações culturais em estratégias de parenta- gem, Keller [7] propôs um modelo de investi mento parental5 organizado em seis sistemas individualmente modulados pelos mecanismos interacionais de atenção, conti ngência e calorosidade. Os sistemas parentais cuidados primários, contato corporal, esti mulação corporal, esti mulação por objeto, contato face a face e envelope narrati vo foram avaliados em diferentes culturas. Os resultados indicaram, para todos os ambientes culturais, que sistemas parentais e mecanismos interacionais ocorriam em diferentes fre- quências, expressando diferentes esti los parentais. Os sistemas face a face e esti mulação por objeto (esti los parentais distais) estavam relacionados a trajetórias de socialização para independência. Os sistemas contato corpo- ral e esti mulação corporal (esti los parentais proximais) estavam associados a trajetórias de socialização para interdependência. 5 O sistema de cuidados primários visa atender às necessidades básicas do bebê e tem a função de reduzir estres- se, mais do que eliciar estados comportamentais positivos ou compartilhar momentos agradáveis. Está associado ao desenvolvimento de segurança e confi ança. O contato corporal consiste em favorecer posições em que o contato corporal é predominante, carregando o bebê junto ao corpo. Promove experiência de calor emocional e está associado à aceitação de normas e valores da geração anterior e preparação do indivíduo para uma vida baseada em hierarquia e harmonia na família e no grupo social primário. O sistema de estimulação corporal tem caráter diádico e envolve qualquer estimulação motora, cinestésica, tátil e/ou do equilíbrio do bebê. Sua função é estimular o desenvolvimento motor e a intensifi cação da percepção corporal, infl uenciando a descoberta da auto- -efi cácia corporal em relação a recursos do ambiente. O sistema de estimulação por objetos é identifi cado quan- do a mãe tenta atrair a atenção do bebê utilizando um objeto e/ou evento externo, sendo a interação é mediada por ele. Seu foco são processos atencionais extradiádicos, e está relacionado a atividades exploratórias, ligando o bebê ao mundo de objetos e ao ambiente físico em geral. Parece estimular o desenvolvimento cognitivo e a auto- nomia, promovendo o desengajamento parcial do bebê da dependência de relações iniciais. O sistema face a face é caracterizado pelo contato visual mútuo e uso frequente da linguagem. Sua função é promover proto-diálogos, oferecendo ao bebê a experiência de percepção contingente. Finalmente, o envelope narrativo consiste em toda a mediação simbólica em que o bebê é envolvido por meio da fala da mãe caminhos para inclusão.indd 16caminhos para inclusão.indd 16 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 Caminhos da INCLUSÃO | 17 Assim, o modelo proposto acima fornece uma ferramenta teórico- -metodológica que permite compreender o desenvolvimento humano como interface entre a biologia e cultura [9], na medida em que per- mite compreender como as interações iniciais entre cuidadores e seus bebês estabelecem bases para trajetórias ontogenéti cas. Nesse senti do, o modelo também poderia ser uti lizado em pesquisas relacionadas ao desenvolvimento de linguagem e comunicação, dado queseria possível separar, a parti r das interações cuidador–bebê, os elementos culturais daqueles que realmente mereceriam atenção. Em Belém, estudos recentes identi fi caram, por meio de entrevistas e questi onários, uma combinação de autonomia e sociocentrismo nas metas de socialização das mães [10,11]. Até o momento, nenhum estudo observacional focalizando os sistemas parentais foi conduzido em Belém, especialmente com díades caracterizadas pelo uso de disti ntos canais sensoriais em suas interações. Esse estudo teve como objeti vos: a) identi fi car os sistemas paren- tais de duas díades mãe-bebê, sendo uma das mães surda, em situação de brincadeira livre; e b) identi fi car prováveis diferenças entre as díades com relação ao sistema parental priorizado em cada idade. As díades fo- ram acompanhadas dos três aos seis meses de idade do bebê. Nosso grupo de pesquisa optou por díades de mães surdas e bebês ouvintes por apresentarem característi cas que habilitam estudos longi- tudinais envolvendo componentes culturais e algumas característi cas atí picas com relação ao desenvolvimento da linguagem e comunicação quando comparadas com díades que uti lizam mesmos canais sensoriais (mãe ouvinte-bebê ouvinte, mãe surda-bebê surdo). Mães surdas que uti lizam língua de sinais (Libras) podem pertencer à cultura surda (por opção), bem como à cultura ouvinte, por fazerem parte, geralmente, de famílias ouvintes [12]. Além disso, suas metas de sociali- zação foram modeladas em contextos culturais mais amplos, de indepen- dência e/ou interdependência. Os bebês, por sua vez, podem ser bilíngues e bi-culturais, aos quais, no entanto, falta o estí mulo auditi vo durante as interações com a mãe. Alguns dados [13,14] indicam para essas díades, por exemplo, desempenhos mais pobres em compreensão durante a comuni- cação, bem como em trocas recíprocas (turn-taking) entre 12 e 18 meses, quando comparados a díades mãe surda-bebê surdo. caminhos para inclusão.indd 17caminhos para inclusão.indd 17 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 18 MÉTODO Parti cipantes Dois bebês, meninos, e suas mães, uma delas surda e outra ouvin- te. Ambas eram primíparas. MS foi selecionada com a ajuda da ASTILP e MO foi selecionada por conveniência, para emparelhamento da idade do bebê, nível educacional e socioeconômico. A mãe surda (MS) ti nha 36 anos, graduada, apresentava perda neu- ro-sensorial bilateral severa, diagnosti cada aos dois anos, assim como o pai, 35 anos (diagnosti cado aos cinco). Ambos eram fl uentes em Libras, mas não a uti lizavam com o bebê; uti lizavam prótese auditi va, com ora- lização pouco fl uente. Viviam na casa da avó materna, que parti cipou de todas as observações. A mãe ouvinte (MO) ti nha 34 anos e vivia com o pai da criança (27 anos) no mesmo terreno da casa da avó materna; am- bos cursavam a faculdade. Categorias de observação Contato Corporal (CC). Computado quando contato corporal pre- dominava sobre o não-contato corporal e incluia posições como segurar o bebê no colo, carregá-lo, sentado nas pernas. Esti mulação Corporal (EC). Computado com a ocorrência de esti - mulação vesti bular, motora, cinestésica e/ou táti l. Esti mulação por Objeto (EO). Registrado quando a mãe tentava atrair a atenção do bebê com um objeto e este era tocado pela criança. Face a Face (FF). Registrado quando havia contato visual mútuo e trocas recíprocas (vocalizações, sorrisos) por pelo menos três segundos. O ângulo de posicionamento entre a face da mãe e a face e ombro do bebê era de 45º, no máximo. caminhos para inclusão.indd 18caminhos para inclusão.indd 18 23/8/2011 11:02:0923/8/2011 11:02:09 Caminhos da INCLUSÃO | 19 Procedimentos Após a aprovação pelo Comitê de Éti ca e a assinatura do Termo de Consenti mento Livre e Esclarecido eram agendadas as entrevistas. As entrevistas foram realizadas em duas partes. Na primeira, as mães respondiam a um questi onário sociodemográfi co e preenchiam o Inventário de Comparação de Metas de Socialização; na segunda, era conduzida uma anamnese. Com MS as entrevistas eram realizadas junto com uma intérprete em Libras. Sessões de observação Eram marcadas com antecedência e conduzidas na casa das mães. Foram registradas em vídeo as interações das díades em situação de brin- cadeira livre. Nesta, pedia-se às mães que interagissem com sua criança como faziam normalmente, ‘tentando ignorar a presença da pesquisa- dora’. Amostra observacional O período analisado variou entre as idades, mas foi equiparado entre os parti cipantes pelo de menor duração para uma dada idade. As sessões eram divididas em intervalos de 5 segundos para registro de fre- quência e duração das instâncias de CC, EC, EO e FF. RESULTADOS E DISCUSSÃO O índice de concordância entre observadores variou entre 83% (BC) e 100%. A Figura 1 indica a duração dos sistemas parentais para as duas dí- ades parti cipantes. Para cada díade (MS-BO, MO-BO) e idade (3, 4, 5, 6 meses) foi calculada a duração das instâncias de CC, EC, EO e FF obser- vadas individualmente e em combinação. Os dados são apresentados como percentagem da duração total de cada sessão. caminhos para inclusão.indd 19caminhos para inclusão.indd 19 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 20 Figura 1. Duração, plotada como percentagem do tempo total da sessão, de cada siste- ma parental (contato corporal [CC], esti mulação corporal [EC], esti mulação por objeto [EO] e face-to-face [FF] para as díades MS-BO (mãe surda-bebê ouvinte) e MO-BO (mãe ouvinte-bebê ouvinte), observado isoladamente ou de forma combinada entre os 3 e 6 meses dos bebês. Mãe surda-bebê ouvinte. Nem todos os sistemas parentais foram observados para essa díade. Esti mulação por objeto, um esti lo parental distal foi priorizado aos três (31,2%) e quatro (48,2%) meses, enquan- to contato corporal (39,6%) seguido por esti mulação corporal (29,8%) foram os sistemas priorizados aos cinco e seis meses, respecti vamente. Essa mudança de esti lo parental para proximal pode ser confi rmada pela combinação CC-EC, que ocupou 44.7% do tempo da interação aos cinco meses, sugerindo um perfi l cultural interdependente. Mãe ouvinte-bebê ouvinte. Todos os sistemas parentais foram ob- servados para essa díade. Esti mulação corporal foi priorizada aos três (32,5%) e, principalmente, aos quatro meses (79,4%), bem como combi- nações envolvendo contato corporal, esti mulação corporal e face a face nessas mesmas idades (47,5% e 20,6% aos três e 4 meses, respecti vamen- te). CC também foi priorizado aos cinco e seis meses, porém com menor duração (28,9% e 17, 4%, respecti vamente), juntamente com a combina- ção CC-EC. Os esti los parentais proximais, priorizados desde os três meses para essa díade, sugerem um perfi l cultural interdependente. caminhos para inclusão.indd 20caminhos para inclusão.indd 20 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 Caminhos da INCLUSÃO | 21 Sistemas parentais e metas de socialização. A díade MS-BO, a parti r do quarto mês, modifi cou sua estratégia parental de distal para proximal, enquanto a díade MO-BO manteve o mesmo esti lo proximal. Assim, os sistemas parentais priorizados sugerem perfi s interdependente para as duas mães. Por outro lado, as escolhas dessas mães feitas ao Inventário de Comparação de Metas de Socialização indicaram tanto metas dirigidas para o desenvolvimento de autonomia e independência, quanto dirigidas para o desenvolvimento de valores sociocêntricos, como obedecer aos mais velhos e priorizar a harmonia do grupo, sugerindo perfi s autônomo- -relacionais, como indicado por estudos anteriores [10,11]. No entanto, a escassez de parti cipantes torna os dados inconclusivos. Variações nos esti los parentais. As mães uti lizavam os mesmos sis- temas parentaiscom diferentes objeti vos. Contato corporal era uti lizado por MS para reduzir o distress do bebê, enquanto MO o uti lizava como meio para promover esti mulação corporal e para colocar o bebê em con- tato com o mundo externo. As observações indicaram diferenças na frequência duração dos sistemas parentais para as duas díades como consequência de fatores contextuais da interação. De modo geral, todos os sistemas parentais mostraram característi cas que permitem isolar elementos culturais de elementos que merecem atenção em episódios interati vos. Contudo, de- fi nições do modelo original devem ser revistas para incluir característi cas de mães surdas como, por exemplo, o contexto face a face, que deve considerar os gestos que sempre acompanham as vocalizações da mãe. Nesse estudo consideramos uma distância de até 50 cm. Outro ponto a ser considerado é a necessidade de observações longitudinais, pois, como observado para a díade MS-BO, os sistemas se alteram ao longo do tempo e alguns podem nem mesmo ser observados. REFERÊNCIAS [1] Belsky J, Bakermans-Kranenburg MJ, Van Ijzendoorn MH. For bett er and for woorse – Diff erenti al suscepti bility to environmental infl uences. Current Directi ons in Psychologi- cal Science. 2007; 16(6): 300-4. [2] Keller H, Yovsi RD, Borke J, Kärtner J, Jensen H, Papaglioura Z. Developmental con- caminhos para inclusão.indd 21caminhos para inclusão.indd 21 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 22 sequences of early parenti ng experiences: Self regulati on and self recogniti on in three cultural communiti es. Child Development. 2004; 75:1745-60. [3] Keller H, Kuensemueller P, Abels M, Voelker S, Yovsi R et al. Parenti ng, Culture, and development: A comparati ve study. San Jose, CR: Insti tuto de Investi gaciones Psicológi- cas; 2005. [4] Keller H, Borke J, Yovsi R, Lohaus A, Jensen H. Cultural orientati ons and historical changes as predictors of parenti ng behavior. Internati onal Journal of behavioral Devel- opment. 2005; 29:229-37. [5] Greenfi eld1 PM, Keller H, Fuligni H, Maynard A. Cultural pathways through universal development. Annu. Rev. Psychology. 2003; 54 : 461–90. [6] Keller H. Culture and development: Developmental pathways to individualism and interrelatedness. In: Lonner WJ, Dinnel DL, Hayes SA, Satt ler DN, editors. Online Rea- dings in Psychology and Culture (Unit 11, Chapter 1). Center for Cross-Cultural Research, Western Washington University, Bellingham, Washington USA; 2002. htt p://www.wwu. edu/culture. Acesso em: 31 jan. 2010. [7] Keller H. Cultures of infancy. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates; 2007. [8] Kagitcibasi C. Autonomy and relatedness in cultural context: Implicati ons for self and family. Journal of Cross-Cultural Psychology. 2005; 36: 403-22. [9] Keller H. Development as the interface between biology and culture: a conceptu- alizati on of early ontogeneti c experiences. In: Keller H, Poorti nga YH, Schölmerich A (Orgs.), Between culture and biology: perspecti ves on ontogeneti c development. Cam- bridge, Mass.: Cambridge University Press; 2002. p. 320-340. [10] Seidl de Moura ML, Lordelo E, Vieira ML, Piccinini CA, Magalhães CMC, Pontes FAR, Rímoli AO, Salomão NMR. Metas de socialização de mães de sete cidades brasileiras: uma análise de conteúdo. Cadernos de Resumos da X Semana Cientí fi ca do Laboratório de Psicologia; 2007. p. 3-4. [11] Silva RA. Cognições parentais: crenças, metas e estratégias de socialização de mães primíparas. [Dissertação]. Belém (PA): Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesqui- sa do Comportamento da Universidade Federal do Pará, 2008. [12] Singleton JL, Titt le MD. Deaf parents and their hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Educati on. 2000; 5(3): 221-36. [13] Meadow-Orlans KP. Eff ects of mother and infant hearing status on interacti ons at twelve and eighteen months. Journal of Deaf Studies and Deaf Educati on. 1997; 2(1): 26-36. [14] Schiff NB, Ventry IM. Communicati on problems in hearing children of deaf parents. Journal of Speech and Hearing Disorders. 1976; XLI: 348-58. caminhos para inclusão.indd 22caminhos para inclusão.indd 22 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 APRENDIZAGEM DE RELAÇÕES ORDINAIS EM CRIANÇAS SURDAS Ruth Daisy Capistrano Souza1 e Grauben José Alves de Assis2 INTRODUÇÃO Procedimentos de ensino voltados para o estabelecimento de ha- bilidades acadêmicas básicas há muito tempo são uma preocupação de educadores e de pesquisadores, dentre os quais analistas do comporta- mento. Mais especifi camente o ensino de habilidades matemáti cas tem sido um desafi o para estes profi ssionais. Assim, de acordo com Skinner [1], o ensino da Matemáti ca implica colocar respostas verbais sob controle de diversos estí mulos: “as respos- tas são todas verbais. Consistem em falar e escrever certas palavras, al- garismos e sinais que, grosso modo, se referem aos números e operações da aritméti ca” (p.14). Portanto, resolver uma operação aritméti ca é um comportamento complexo que envolve, pelo menos, uma série de discri- minações simples. Os operantes que o aluno emite durante a resolução de um pro- blema aritméti co são verbais. Por exemplo, em uma operação de adição envolvendo quanti dades de objetos, a criança pode contar os objetos do conjunto que consti tui a primeira parcela, contar os objetos do conjunto que consti tui a segunda parcela, juntar os dois conjuntos e contar quan- tos objetos existem ao todo, chegando ao resultado da operação. O ensino de relações ordinais O termo ordenação vem sendo usado na literatura para designar um ti po de resposta sequencial na presença de um conjunto de estí mulos apresentados simultaneamente [2], [3]. A emergência de relações ordi- nais é importante para a compreensão de sequências complexas como a 1 Ruth Daisy Capistrano Souza, docente das Faculdades Integradas Ipiranga/Universidade Estadual Vale do Acaraú; Profa. Especialista em Defi ciência Auditiva da SEDUC-PA, ruthcapistrano@yahoo.com.br 2 Doutor em Psicologia Experimental pela USP. Professor Associado III da UFPA. Bolsista de Produtividade em Pesquisa pelo CNPq, ggrauben@gmail.com caminhos para inclusão.indd 23caminhos para inclusão.indd 23 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 24 organização de frases e sentenças [4] ou uma rede de relações numéricas equivalentes [5]. A defi nição de classes ordinais baseia-se nas propriedades das re- lações de ordem. A proposta de Green et al. (1993) expande o paradigma de equivalência [6] para o estudo de relações entre estí mulos em sequ- ências e entre sequências ensinadas separadamente, com testes com- portamentais que avaliam se tais relações apresentam as propriedades de uma relação ordinal (i.e: irrefl exividade, assimetria, transiti vidade e conecti vidade). Green, Stromer e Mackay [7] defi niram essas propriedades a parti r da matemáti ca: Irrefl exividade é a propriedade segundo a qual um dado elemento da sequência não se segue a ele mesmo. Assim, não é possível a relação A1Æ A1. Assimetria se caracteriza por uma relação unidirecional, por exem- plo, se A2 Æ A3 (lê-se A2 é seguido por A3), então A3Æ A2 (lê-se A3 é seguido por A2) não pode ser válida para a mesma sequência. Transiti vidade quando, por exemplo, A2Æ A3 e A3Æ A4, então A2 Æ A4. Conecti vidade prevê relações entre todos os pares de estí mulos dentro de uma sequência e entre sequências ensinadas separadamente. Relações que exibem conecti vidade são necessárias (mas não são sufi cientes) para o arranjo de estí mulos dentro de um conjunto. Por exemplo, se A1Æ A2ÆA3, então A1ÆA2, A1ÆA3, e A2ÆA3. A emergência de classes ordinais pressupõe que todos os estí mu- los sejam mutuamente substi tuíveis no controle de uma resposta e que qualquer propriedade controladora exercida por ummembro da classe deva ser comparti lhada por todos os outros membros da mesma classe. Portanto, a formação de classes ordinais, assim como na formação de classes de equivalência proposta por Sidman e Tailby [6], pressupõe rela- ções arbitrárias entre estí mulos. Nenhum estudo examinou o Paradigma de Equivalência em classes ordinais sob controle contextual, não havendo dados na literatura que evidencie esse fenômeno com crianças surdas. Dada a escassez de resul- tados experimentais com surdos, três estudos foram programados com o objeti vo de verifi car o controle do comportamento por relações ordi- nais com discriminação simples, sob controle condicional e contextual em crianças surdas. caminhos para inclusão.indd 24caminhos para inclusão.indd 24 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 Caminhos da INCLUSÃO | 25 MÉTODO Parti cipantes Parti ciparam, no total, 9 alunos surdos de uma classe de alfabeti za- ção, com idade variando entre 6 e 8 anos, matriculados em uma Unidade de Ensino Especializada para surdos, com perda auditi va acima de 91 dB (surdez profunda), identi fi cada a parti r de exames com laudo emiti do por médico otorrinolaringologista. Para o recrutamento dos parti cipantes, realizou-se uma reunião com seus responsáveis, na qual foi explicitado o objeti vo da pesquisa e fornecidos também esclarecimentos para que pudessem assinar com segurança, nos termos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, um Termo de Consenti mento Livre e Esclarecido, aprovado pelo Comitê de Éti ca da UFPA, autorizando a parti cipação de cada aluno no experimento. Nos experimentos, o ensino das tarefas foi realizado através da Co- municação Total e Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Ambiente experimental O ambiente experimental foi uma sala de informáti ca, localizada em uma Unidade de Ensino Especializada. Material e equipamento Nas etapas de treino e testes, apresentação dos estí mulos, núme- ro de tentati vas, número de posições de cada estí mulo na tela, registro de respostas corretas e incorretas foi uti lizado um soft ware (REL 4.0 for Windows) especialmente construído para esta pesquisa. Estí mulos Foram uti lizados três conjuntos de estí mulos: O conjunto “A”, for- mado por numerais em LIBRAS. O conjunto “B”, com quanti dades corre- spondentes de fi guras não representacionais e o conjunto “C”, formado pelo nome escrito dos números, todos nos valores de 1 a 5. A fi gura 1 apresenta os estí mulos que foram usados. caminhos para inclusão.indd 25caminhos para inclusão.indd 25 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 26 Figura 1. Conjunto de estí mulos que foram uti lizados nos três Experimentos. PROCEDIMENTO GERAL Ensino Experimentadora e o parti cipante sentavam-se em frente ao mi- crocomputador, e aquela mostrava a tela do computador e fornecia as instruções ao parti cipante quanto aos procedimentos iniciais. Para a apresentação dos estí mulos, houve a divisão da tela do com- putador em duas partes: “Área de Escolha” (parte inferior da tela), com- posta de 8 quadrados onde os estí mulos foram apresentados de forma aleatória, e a “Área de Construção” (parte superior da tela do computa- dor) que consisti a na formação completa da sequência após o “tocar” no estí mulo que se encontrava na “área de escolha”. Acima da “Área de Construção” havia uma janela, na qual o parti cipante tocava e apareciam os estí mulos de escolha. O parti cipante deveria tocar em um estí mulo e, em seguida, no ou- tro. Ao tocar a fi gura, esta se deslocava da área de escolha para a “Área de Construção”. Caso o parti cipante respondesse corretamente, uma ani- mação gráfi ca era apresentada na tela por 2s e, paralelamente, sinais em LIBRAS – feitos pela experimentadora – indicavam o acerto. Caso a sequência fosse outra, havia o escurecimento da tela por 2s e a mesma confi guração de estí mulos era reapresentada na “Área de Escolha”. Para cada parti cipante estava previsto o ensino de cada sequência três vezes consecuti vas sem erro (critério de acerto) ou até dez vezes com caminhos para inclusão.indd 26caminhos para inclusão.indd 26 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 Caminhos da INCLUSÃO | 27 erro. A diferença entre os experimentos 1, 2 e 3 consisti a: no primeiro, o parti cipante deveria tocar em uma janela com a palavra TOQUE e selecio- nar os estí mulos na ordem crescente; no segundo, na presença de uma janela com a cor verde, o parti cipante deveria selecionar os estí mulos na ordem crescente e, na presença da janela com a cor vermelha, na ordem decrescente; no terceiro, na presença do círculo e da janela com a cor verde, o parti cipante deveria selecionar os estí mulos na ordem crescente, na presença do círculo e da janela com a cor vermelha, na ordem decres- cente, na presença do triângulo e da janela com a cor verde, o parti cipante deveria selecionar os estí mulos na ordem decrescente e, na presença do triângulo e da janela com a cor vermelha, na ordem crescente. Sonda Na fase de sonda, os mesmos pares de estí mulos do ensino eram apresentados, mas não havia consequências para acerto ou erro. As dife- renças entre os experimentos nos parâmetros uti lizados na ordenação de estí mulos foram os mesmos do ensino. Teste de transiti vidade Nestes testes, eram apresentados pares de estí mulos não adjacen- tes, por exemplo, A1 e A3. Não havia consequência para acerto ou erro. As diferenças entre os experimentos nos parâmetros uti lizados na orde- nação de estí mulos foram os mesmos do ensino. Revisão da linha de base As revisões de linha de base eram realizadas sempre com dois con- juntos de estí mulos, antes de cada teste de conecti vidade envolvendo estes conjuntos de estí mulos. Portanto, foram realizadas duas revisões de linha de base: com os estí mulos dos conjuntos “A” e “B” e, posteri- ormente, com os estí mulos dos conjuntos “B” e “C”. As diferenças entre os experimentos nos parâmetros uti lizados na ordenação de estí mulos foram os mesmos do ensino. Teste de conecti vidade Nesse teste, os estí mulos dos dois conjuntos “A” e “B”; “B” e “C” caminhos para inclusão.indd 27caminhos para inclusão.indd 27 23/8/2011 11:02:1023/8/2011 11:02:10 28 eram apresentados na “área de escolha”, randomizados, por exemplo, A1ÆB2 e o parti cipante deveria selecioná-los na ordem de acordo com a conti ngência programada. Não havia consequência para acertos ou erro. As diferenças entre os experimentos nos parâmetros uti lizados na orde- nação de estí mulos foram os mesmos do ensino. RESULTADOS E DISCUSSÃO No experimento 1, o ensino por sobreposição, pelo menos em al- gumas tentati vas, os parti cipantes precisaram ser expostos mais de uma vez para que pudessem ati ngir o critério de acerto de três respostas con- secuti vas sem erro. Os parti cipantes responderam prontamente na maioria das tenta- ti vas dos testes de transiti vidade e conecti vidade (Figura 2). Os dados corroboram o estudo de Stromer e Mackay [8], que considera as relações derivadas do procedimento de ensino por sobreposição de estí mulos como relações verdadeiramente transiti vas. Figura 2. Porcentagem de acerto dos parti cipantes do experimento 1 nos testes No experimento 2, na fase de ensino, foi observado melhor desem- penho dos parti cipantes na presença da “cor verde”, que foi a ordem en- sinada por primeiro, o que confi rma os resultados de Lopes e Agosti ni [9] sobre as difi culdades apresentadas na aprendizagem de relações ordinais quando há reversão das funções dos estí mulos. Nos testes de transiti vidade, os parti cipantes demonstraram res- ponder consistente com a linha de base, corroborando os resultados ob- ti dos por [10] (Figura 3). caminhos para inclusão.indd 28caminhos para inclusão.indd 28 23/8/2011 11:02:1123/8/201111:02:11 Caminhos da INCLUSÃO | 29 Figura 3. Porcentagem de acerto dos parti cipantes do experimento 2 nos testes. No experimento 3, tanto no ensino sob controle contextual “círcu- lo” quanto do “triângulo”, todos os parti cipantes ati ngiram o critério de acerto, embora tenham sido reexpostos em algumas tentati vas. Nas ten- tati vas com a cor vermelha, em que os estí mulos deveriam ser selecio- nados na ordem “decrescente” diante do estí mulo contextual “círculo”, a maioria dos parti cipantes obteve mais acertos. Nos testes, apesar da variabilidade comportamental em algumas ten- tati vas, apresentadas por alguns parti cipantes, houve emergência de rela- ções ordinais. Os parti cipantes demonstraram a emergência de relações transiti vas ao responderem aos pares de estí mulos não adjacentes, permit- indo a verifi cação de relações não ensinadas diretamente, corroborando os resultados obti dos por Holcomb, Stromer e Mackay [10] (Figura 4). Figura 4. Porcentagem de acerto dos parti cipantes do experimento3 nos testes. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos três experimentos, a produção de novos desempenhos ordi- nais sem qualquer treino adicional, por sobreposição de estí mulos sob caminhos para inclusão.indd 29caminhos para inclusão.indd 29 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 30 controle discriminati vo simples, condicional e contextual, foi consistente com o ensino apresentado na linha de base. Uma característi ca comum nos resultados dos três experimentos refere-se à emergência gradual de relações ordinais. Nos experimentos aqui relatados, houve emergência de relações entre estí mulos funcionalmente equivalentes entre diferentes sequên- cias de estí mulos, sob controle condicional, inferindo-se as propriedades de transiti vidade e conecti vidade, sugerindo a formação de relações or- dinais em que os estí mulos ocupavam a mesma posição em diferentes sequências. Esses dados mostram o pioneirismo da pesquisa e a importância da uti lização do procedimento de ensino por sobreposição de estí mulos na emergência de relações ordinais com pares de estí mulos não adjacentes, sob controle condicional, em crianças com surdez. REFERÊNCIAS [1] Skinner BF. Tecnologia do ensino. AZZI R. Tradutor. São Paulo: EPU; 1972. [2] Assis GJA. Comportamento de ordenação: uma análise experimental de algumas variáveis. Psic.: Teor. e Pesq. 1987; 3: 197-302. [3] Assis GJA, Costa LCA. Emergência de relações ordinais em crianças. Inter. em Psic. 2004; 8 (2): 199-216. [4] Ribeiro MPL, Assis GJA, Enumo SRF. Comportamento matemáti co: Relações ordinais e inferência transiti va em pré-escolares. Psic.: Teor. e Pesq. 2007; 23: 25-32. [5] Carmo JS. Comportamento conceitual numérico: um modelo de rede de relações equi- valentes. [Tese de Doutorado], Educação. Universidade Federal de São Carlos, 2002. [6] Sidman M, Tailby W. Conditi onal discriminati on vs matching to sample: an expansion of the testi ng paradigm. J Exp Anal Behav. 1982; 37: 5-22. [7] Green G, Stromer R, Mackay H. Relati onal learning in sti mulus sequences. Psychol Rec. 1993; 43: 599-616. [8] Stromer R, Mackay H. Human sequenti al behavior: relati ons among sti muli, class formati on, and derived sequences. Psychol Rec. 1993; 43:107-131. [9] Lopes J, Agosti ni MF. Aquisição e emergência de relações ordinais por crianças da segunda série do ensino fundamental. In: Rodrigues OMPR, do Valle TGM, Almeida- Verdu ACM, Lopes J, Júnior, MR Cavalcante, Editores. Psicologia do desenvolvimento e aprendizagem: Investi gações e análises. São Carlos: Rima; 2004. p. 95-127. [10] Holcomb WL, Stromer R, Mackay H. Transiti vity and emergent sequence perfor- mances in young children. J Exp Child Psycho. 1997; 65: 96-124. caminhos para inclusão.indd 30caminhos para inclusão.indd 30 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 INCLUSÃO DIAGNÓSTICA DO SURDO Cintia N. Madeira Sanchez1, Amauri Gouveia Junior2 INTRODUÇÃO No diagnósti co de transtornos mentais e clínica psicológica diferen- temente das outras áreas da medicina que se uti liza de exames laborato- riais e métodos de imagens, seu diagnósti co é clínico, no qual o pesquisa- dor ou o clínico estabelecem os limites entre o estado de normalidade e de doença mental. Na práti ca diagnósti ca estes profi ssionais se diferem, o pesquisador uti liza-se comumente de avaliações padronizadas como entrevistas estruturadas ou escalas e o clínico baseia-se na sua experiên- cia profi ssional e impressão pessoal [1]. As escalas de avaliação são instrumentos padronizados de avaliação quanti tati va, para fornecer medidas acuradas, reproduti vas e relevantes [1]. Elas servem para medir e caracterizar a depressão, traduzindo o fenô- meno clínico em informações objeti vas e quanti tati vas, essas informações das escalas de avaliação podem ser usadas para auxiliar o diagnósti co, do- cumentar o estado clínico do deprimido em um determinado momento [2]. Esses instrumentos de avaliação em psiquiatria no Brasil não são válidos e padronizados para avaliação de população com necessidades educacionais especiais, difi cultando o diagnósti co [3]. Esta realidade também ocorre com a surdez, na qual existe uma difi culdade para o diagnósti co dessa população devido à falta de instru- mento adaptado para a avaliação. Independente da forma de classifi cação, um fato inerente a surdez é a impossibilidade de detecção da fala humana, total ou parcialmente, e este é o maior impacto na vida do indivíduo surdo, pois interfere na interação social e na principal forma de acesso ao conhecimento, que é a interação verbal [4]. Ao considerar a importância dos processos comunicati vos nas inte- rações sociais, no processo de avaliação é fundamental a compreensão 1 Doutoranda em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA); 2 Doutor, professor do Curso de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA). caminhos para inclusão.indd 31caminhos para inclusão.indd 31 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 32 do instrumento de avaliação e de comunicação. Os surdos poderão ter difi culdades de compreensão nas interações verbais e no português es- crito dos instrumentos padronizados, e isto poderá acarretar barreiras em seu processo de diagnósti co e de reabilitação. Devido esta difi culdade de comunicação, os testes não verbais são incluídos na avaliação, porém não assegura o desempenho da criança, o surdo precisa compreender exatamente as instruções da tarefa para conseguir realizá-la [5]. Ao avaliar a população de surdos deve-se considerar sua forma de co- municação bilíngue, ou seja, a criança surda adquire duas línguas: a primeira é a língua de sinais, que permiti rá a criança aprender a segunda língua que será a língua ofi cial do seu país e poderá ser na modalidade escrita ou oral [6]. Assim o Bilinguismo pode ser dividido em duas abordagens: 1) Bi- linguismo: língua de sinais e língua oral; e 2) Bilinguismo: língua de sinais e língua escrita. Ambas, no entanto, consideram a importância da língua de sinais para o desenvolvimento da criança surda [7]. Na abordagem língua de sinais e língua oral, o acesso à língua de sinais ocorre naturalmente através da interação comunicati va da criança surda com o adulto surdo. A língua oral é aprendida como segunda língua junto a um adulto ouvinte [8]. Na abordagem bilinguismo - língua de sinais e língua escrita é pro- posto que a escola torne acessível, ao aluno surdo, as duas línguas, e os conteúdos devem ser trabalhados em língua de sinais e a língua portu- guesa ensinada em momento específi cos da aula [9]. Uma proposta bilíngue para surdos necessita da uti lização de uma língua de sinais própria da comunidade surda. No Brasil, esta se deno- mina LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), pois os sinais quedesignam as propriedades linguísti cas variam de cultura para cultura [9]. A LIBRAS é considerada uma língua por possuir estrutura e gramá- ti ca própria, considerando o conceito de língua como um conjunto de convenções necessárias adotadas por uma comunidade [10]. A diferença da língua de sinais da língua oral é que sua modalidade é espaço-visual, ou seja, o uso dessa língua se dá através da visão e da uti lização dos movimentos no espaço. Os sinais são formados pela inte- ração de movimentos das mãos com suas formas e dos pontos no espaço ou no corpo onde estes movimentos são feitos [9]. Portanto os instrumentos de avaliação para serem adaptados para caminhos para inclusão.indd 32caminhos para inclusão.indd 32 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 Caminhos da INCLUSÃO | 33 essa população de surdos devem ser em língua de sinais ofi cial do país. Na década de 80, surgiram os primeiros estudos para adaptações dos instrumentos psicométricos para Língua Americana de Sinais (ASL). O Teste Stroop Color e o Teste de Palavras foram adaptados para ASL por Wolff e Radecke[11], para investi gar as respostas em ASL do Stro- op padrão em um grupo de surdos adultos. Os testes foram aplicados em vinte surdos e vinte e nove adultos fl uentes em língua de sinais, que respondiam o teste uma vez usando sinais e outra usando a linguagem. Para os sujeitos ouvintes as respostas em sinais eram signifi camente mais lentas que as verbais em ambas as condições palavra e cor, mas não na condição cor-palavra. Estes resultados demonstram que as respostas do Stroop em sinais não são dadas tão rapidamente como no verbal, por- tanto, as normas padrão desenvolvidas para a amostra ouvinte são ina- propriadas para sujeitos surdos. Não foram encontradas diferenças sig- nifi cati vas quando comparado a média em sinais para surdos e ouvintes. O Stroop pode ser um instrumento usado com surdos adultos para res- postas em ASL. Bullis e Reiman[12] realizaram um estudo para desenvolver as pro- priedades psicométricas do Transiti on Competence Batt ery (TCB) para ado- lescentes e adultos surdos. Foi desenvolvida uma versão em vídeo dos trin- ta itens do teste em Língua Americana de Sinais (ASL). O TCB foi o primeiro teste de bateria padronizado e desenvolvido especifi camente para popu- lação de surdos. Parti ciparam da padronização do TCB aproximadamente 230 sujeitos, com idades entre 18 e 19 anos e de diferentes estados dos Estados Unidos. A confi ança dos dados era minuciosamente analisada e os itens analisados pelo programa de Stati sti cal Package para Ciências Sociais. O TCB demonstrou sati sfatória propriedade psicométrica inicial. O Minnesota Multi phasic Personality Inventory (MMPI) foi traduzi- do em vídeo para Língua Americana de Sinais, por Brauer[13]. O inventá- rio é composto por trinta e oito itens, cada item era traduzido para língua de sinais e mostrado no monitor com o número no canto esquerdo, e o sujeito ti nha 10 segundos para gravar sua resposta no papel. Em um ví- deo, os itens eram mostrados na sequência original do MMPI traduzido para ASL. No outro vídeo os itens eram mostrados de forma aleatória. O propósito do segundo vídeo era controlar os efeitos da memória durante o estudo. O sujeito respondia um vídeo e depois de um intervalo de trinta minutos respondia o outro, a ordem era aleatória, mas todos os sujeitos caminhos para inclusão.indd 33caminhos para inclusão.indd 33 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 34 responderam os dois vídeos. Conclui-se que os resultados demonstraram um sub-escore úti l e práti co para futuros estudos de testes traduzidos para língua de sinais. Para traduções futuras incluem a necessidade de um refi namento da tradução e o uso de nati vos da língua de sinais com treino apropriado em Psicologia. Brauer[14] deu conti nuidade em seu trabalho de traduzir o MMPI, com o objeti vo de determinar a equivalência linguísti ca do inventário em Língua Americana de Sinais para o uso deste teste psicológico com popu- lação de surdos. Foi uti lizada a técnica de reteste bilingual, na qual ambas as formas do instrumento eram aplicadas em vinte e oito sujeitos surdos bilíngues (ASL- inglês). Os resultados do estudo demonstraram que os itens do MMPI traduzido apresentavam equivalência ao do MMPI padrão. Pollard e Rediess[15], desenvolveram e validaram um teste de memó- ria e aprendizado verbal (fundamentado em língua de sinais) para surdos, o Signed Associates Test (SPAT), que tem a estrutura e administração análoga ao da Escala de Memória do Wechsler. O teste foi aplicado em uma amos- tra de trinta e oito surdos adultos, que se denominou de amostra saudável (sem défi cit cogniti vo), e em uma amostra clínica de trinta e cinco surdos com suspeita de défi cit cogniti vo. O SPAT mostrou-se úti l como um teste de aprendizagem verbal e memória para usuários da língua de sinais e evidente validade na detecção de défi cit cogniti vo verbal nesta população. O Youth Self-Report (YSR), foi traduzido para Língua Australiana de Sinais (Auslan) em formato de CD interati vo, com objeti vo de desenvol- ver um instrumento válido para avaliar distúrbios psiquiátricos em surdos usuários da língua de sinais. Foram avaliados com o instrumento adap- tado cinquenta e três surdos com idades entre onze e dezoito anos. Para analise estatí sti ca dos dados foi usado Crobach`s e no reteste o Pearso`s r.Os resultados eram comparados com os dados publicados pela Ameri- can da amostra normati va de ouvinte.Concluiu-se que a versão do YSR em língua de sinais é fi dedigno, fácil de preencher por adolescentes sur- dos, mais adequado e mais fi dedigno na avaliação de distúrbios psiquiá- tricos que o questi onário escrito padrão [16]. Kvam, Loeb e Tambs[17], pesquisaram a situação da saúde mental entre surdos, comparando com uma amostra controle de ouvinte. Para avaliação uti lizaram uma versão reduzida do Hopkins Symptom Checklist e um questi onário com dados pessoais traduzido para a Língua de Si- nais Norueguesa. Os resultados revelaram que as respostas dos surdos caminhos para inclusão.indd 34caminhos para inclusão.indd 34 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 Caminhos da INCLUSÃO | 35 mostraram signifi camente mais sintomas de problemas de saúde mental comparado com as respostas dos ouvintes. Conclui-se que é necessário dar uma maior atenção a saúde mental de adultos e crianças surdas. Pollard, Rediess e Dematt eo[18], desenvolveram o Prose Recall Test Using Storie (SPAT) que era composto de duas histórias em Língua Ameri- cana de Sinais para avaliar memória, baseadas no sub-teste de memória da Escala Wechsler. Parti ciparam do estudo quarenta e um surdos fl uen- tes em ASL, e nos resultados eram usados o coefi ciente de correlação inter-classe como medida de confi ança entre-média para o escore de memória imediata e retrógada no Train Story and Kidnap Story. Conclu- íram que os escores dos resultados foram fi dedignos e que na amostra de surdos indicaram que o SPAT funciona de maneira similar ao sub-teste verbal do Weschsler. Munro e Rodwel[19], examinaram a validade, a confi ança e a acei- tabilidade da versão em Língua Australiana de Sinais (Auslan) do Outcome Rati ng Scale (ORS-Auslan), que é uma medida de funcionamento geral. A ORS-Auslan foi aplicada em quarenta e quatro surdos que ti nham a Auslan como primeira língua e eram membros da comunidade de surdos (amostra clínica) e cinquenta e cinco surdos da comunidade geral (amostra da comu- nidade). Também foi aplicado em ambas as amostras a versão em Auslan da Depression Anxiety StressScale-21(DASS-21). Os resultados indicaram uma diferença signifi cati va entre a média dos escores entre a amostra clínica e da comunidade. A aceitabilidade do ORS-Auslan era evidente comparando sua média total de 93% com ado DASS-Auslan de 63%. Concluíram que o ORS-Auslan é a única medida de avaliação em Auslan que pode ser usada amplamente na saúde mental e na clínica. Este instrumento é uma medida de funcionamento geral fi dedigna e válida que pode disti nguir signifi ca- mente entre clínica e não clínica os membros da comunidade de surdos. No Brasil, a adaptação de instrumentos para Língua Brasileira de Si- nais (LIBRAS) é escassa, Sanchez e Gouveia[20], adaptaram a Escala Ana- lógica de Humor para LIBRAS e realizaram um estudo com quinze surdos, (Grupo Experimental) e quinze ouvintes (Grupo Controle). Nos surdos foi aplicada a escala adaptada e, nos ouvintes, a escala padrão, e os escores foram comparados. Não houve diferenças signifi cati vas entre os grupos, concluiu-se que a escala adaptada é equivalente à escala padrão para me- dir ansiedade na amostra estudada. Este trabalho demonstrou a importân- cia da possibilidade de se adaptar escalas e teste para surdos, que muitas caminhos para inclusão.indd 35caminhos para inclusão.indd 35 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 36 vezes têm suas avaliações e diagnósti cos prejudicados pela falta de mate- rial adequado. Tabela 1: Apresenta os dados dos instrumentos adaptados para popula- ção de surdos resumidamente. Autor Ano Teste Adaptação Resultados Evans 1980 Wisc comparado com Matrizes Progressivas Não foram realizadas adaptações Wisc mostrou-se fi dedigno, mas não em crianças menores Bourg 1980 Stroop Color As respostas eram em sinal, verbal ou pressionando um botão Foram encontradas diferenças nas respostas entre surdos e ouvintes dadas em sinal e verbal, mas não ao apertar o botão de resposta. Harman e Austi n 1985 Escala de auto-avaliação Tennessee Simplifi cação linguísti ca das frases Apresentou fi dedignidade comparada com a original Robins e Leigh 1988 Inventário de Depressão de Beck Simplifi cação linguísti ca dos itens Apresentou fi dedignidade comparada com a original Wolf, Radecke, Kammerer e Gardner 1989 Stroop Color e o Teste de Palavras Respostas em Língua Americana de Sinais O Stroop pode ser usado com surdos adultos para respostas em sinais Bullis e Reiman 1992 Transiti on Competence Batt ery Versão em vídeo em Língua Americana de Sinais Demonstrou sati sfatória propriedade psicométrica inicial. Brauer 1992 Minnesota Multi phasic Personality Inventory Versão em vídeo em Língua Americana de Sinais Sub-escore úti l e práti co para futuras pesquisas Brauer 1993 Minnesota Multi phasic Personality Inventory Versão em vídeo em Língua Americana de Sinais Os resultados do instrumento traduzido são equivalente ao padrão Rediess e Matt eo 2005 Signed Associates Test (SPAT) Desenvolveram o teste em ASL baseados no teste de memória do Wechsler Valido na detecção de défi cit cogniti vo em surdo Cornes; Rohan; Napier e Rey 2005 Youth Self-Report (YSR) Um CD interati vo em Língua Australiana de Sinais Fidedigno e de fácil preenchimento para adolescente surdo Kvam, Loeb e Tambs 2006 Hopkins Symptom Checklist Um a versão reduzida em Língua Norueguesa de Sinais Surdos apresentam mais sintomas de distúrbio de saúde mental caminhos para inclusão.indd 36caminhos para inclusão.indd 36 23/8/2011 11:02:1123/8/2011 11:02:11 Caminhos da INCLUSÃO | 37 Pollard, Matt eo e Lentz 2007 Prose Recall Test Using Storie (SPAT) Desenvolveram um teste de história em ASL baseado no Wechsler O teste mostrou fi dedigno Muro e Rodwell 2009 Outcome Rati ng Scale (ORS-Auslan) Língua Australiana de Sinais Instrumento de medida do funcionamento geral fi dedigno Sanchez e Gouveia 2007 Escala Analógica de Humor Língua Brasileira de Sinais A escala adaptada é equivalente a padrão para medir ansiedade CONCLUSÃO Pode-se observar na Tabela 1 que a preocupação com a avaliação psicológica do surdo concentra-se no século XX, inicia-se na década de 60, porém os instrumentos adaptados para língua de sinais surgiram na década de 80. As escalas de avaliação do surdo são adaptadas para vários fatores psicométricos, como para medida da depressão, ansiedade e inteligên- cia. No entanto, tais adaptações, em geral, não são feitas para a língua de sinais. As avaliações psicológicas baseadas em instrumentos de avaliação não adaptados para língua de sinais são frequentemente inválidas quan- do usadas na população de surdos [21]. O uso destes testes não adaptados contribui para interpretação errada dos escores, e, em muitos casos, subesti ma-se o funcionamento intelectual do surdo [22]. Portanto, a importância do uso de instrumentos de avaliação e diagnósti co psicológicos é indiscutí vel e a necessidade de adaptação des- tes instrumentos é de interesse cientí fi co. A possibilidade de adaptação pode tornar as pesquisas nesta área reaplicáveis e propiciar um diagnós- ti co mais fi dedigno no trabalho práti co do psicólogo que atende surdos. REFERÊNCIA [1] Jorge MR, Custódio O. Uti lidade das escalas de avaliação para clínicos e pesquisado- res. Revista de Psiquiatria Clínica 26(1)Edição Especial, 1998. [2] Moreno AR, Moreno DH. Escalas de depressão de Montgomery & Asberg (MADRS) e de Hamilton (HAM-D). Revista de Psiquiatria Clínica25(5), 240-4, Edição Especial, 1998. [3] Nascimento E, Flores-Mendonça CE. WISC-III e WAIS-III na avaliação da inteligência de cegos. Psicologia em Estudo, Maringá, 12, 3. Dez/2007. caminhos para inclusão.indd 37caminhos para inclusão.indd 37 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 38 [4]Fernandes SF. Práti cas de letramento na educação bilingue para surdos. Curiti ba: SEED; 2006 [5]Youniss J. Psychological Evaluati on of the Deaf Child: Observati ons of a Researcher. The Eye, Ear, Nose and Throat Monthly, 46,458-61,1967 [6] Goldfeld M. A criança surda: linguagem e cognição numa perspecti va sócio-intera- cionista. São Paulo: Plexos Editora LTDA; 1997. [7] Goldfeld M. O desenvolvimento da criança surda sob o enfoque sócio-interacionista. Dissertação de mestrado, Departamento de Psicologia da PUC-RJ, 1996. [8] Ruschel MAM. Discursos atuais sobre a surdez: II Encontro a propósito de fazer, do saber e do ser na infância. Organizado por Rosi |Isabel Bergamaschi , Ricardo Vianna Marti ns, 15-28, La Salle, Canoas, 1999 [9] Quadros RM. Educação de Surdos. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul LTDA; 1997. [10] Saussure F. Curso de linguísti ca geral. São Paulo: Cultrix; 1987. [11] Wolff AB, Radecke DD. Adaptati on of the Stroop Color and Word Test for Use with Deaf Adults. The Clinical Neuropsychologist, 3, 369-74, 1989. [12] Bullis M, Reiman J. Development and Preliminary Psychometric Properti es of the Transiti on Competence Batt ery for Deaf Adolescents and Young Adults. Exepti onal Chil- dren, 59, p.12-26, 1992. [13] Brauer BA. The signer eff ect on MMPI performance of deaf respondents.Journal of Personality Assessment, 58, 380-88, 1992. [14] Brauer BA. Adequacy of a Translati on of the MMPI into American Sing Language for Use with Deaf Individuals: Linguisti c Equivalency Issues, 38, 247-59, 1993. [15]Pollard RQJR, Rediess S. Development and Validati on of the Signed Paired Associates Test. Reabilitati on Psychology,50,258-65,2005. [16] Cornes A, Rohan MJ, Napier J, Rey JM. Reading the signs: impact of signed versus writt en questi onnaires on the prevalence of psychopathology among deaf adolescents. Australian and New Zealand Journal of Psychiatry, 40, 665-73, 2006. [17] Kvam MH, Loeb M, Tambs K. Mental Health in Deaf Adults: Symptoms of Anxiety and Depression among Hearing and Deaf Individuals. Journal of Deaf Studies andDeaf Educati on, 12, 1-7, 2006. [18] Pollard RQJR, Rediess SE, Dematt eo A. Development and Validati on of the Signed Paired Associates Test. Reabilitati on Psychology,50, 258-65, 2005. [19] Munro L, Rodwel J. Validati on of an Australian sing language instrument f outcome measurement for adults in mental health setti ng. Australian and New Zealand Journal of Psychiatry, 43, 332-39, 2009. [20] Sanchez CNM, Gouveia GJR. Adaptação da EAH para população de surdos falantes de LIBRAS. Revista de Terapia Comportamental e Cogniti va, X, 2, Belo Horizonte, 2008. [21]Pollard RQ. Ethical conduct in research involving deaf people. In: Gutman VA (Ed.). Eth- ics in mental health and deafness,162-78.Washington, DC: Gallaudet University Press; 2002. [22]Wills KE. Test Reviews. Jounal of Pediatric Psychology, 10(2), 251-55,1985. caminhos para inclusão.indd 38caminhos para inclusão.indd 38 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 O USO DO CONTO E RECONTO DE HISTÓRIAS NA INSERÇÃO DE SÍMBOLOS GRÁFICOS: AMPLIANDO A COMUNICAÇÃO DE UM INDIVÍDUO COM PARALISIA CEREBRAL Ana Irene Alves de Oliveira1, Rafael Luiz Morais da Silva2, Sayuri Fernandes Toda³ INTRODUÇÃO A paralisia cerebral abrange uma série de transtornos de eti ologia neurológica. Os diferentes casos podem apresentar diferenças importan- tes quanto ao ti po de alteração motora, assim como em seu grau de com- prometi mento. A sintomatologia é bastante variável, podendo ocorrer desde impossibilidade de caminhada autônoma e sustentação de cabe- ça a uma ligeira inabilidade no andar, o que pode passar despercebido por um leigo. Tal diversidade quanto ao comprometi mento motor geral também pode ocorrer na linguagem, ou seja, pode haver fala adequa- da e fl uente, ocorrer prejuízos na comunicação de uma maneira global (compreensão e expressão) ou específi ca (expressão) e, dessa forma, a paralisia cerebral destaca-se como uma das disfunções neurológicas que mais necessita de recursos de tecnologia assisti va [1]. Muitas vezes as sequelas da Paralisia Cerebral são agravadas pelas difi culdades que esses indivíduos apresentam em explorar o meio e em se comunicar com o mundo externo. Não raro são considerados defi cien- tes mentais por não conseguirem se expressar e nem interagir funcio- nalmente, além de fi carem limitados ou impedidos de realizar suas ati vi- dades mais básicas – as Ati vidades de Vida Diária (AVDs) –, tais como se vesti r, comer, brincar, e comunicar-se, já que são, na grande maioria dos 1 Terapeuta Ocupacional, doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento, docente da UEPA e coordenadora do NEDETA; 2 Terapeuta Ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, Mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA); 3 Acadêmica do 7º semestre do curso de graduação em Terapia Ocupacional da UEPA e estagiária do NEDETA. caminhos para inclusão.indd 39caminhos para inclusão.indd 39 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 40 casos, incapazes de arti cular a fala ou de segurar um lápis para aprender a escrever, comprometendo o processo de aprendizagem e de alfabeti za- ção. Apesar desses comprometi mentos, demonstram interesse em inte- ragir com o mundo e se comunicar com as pessoas [2]. A comunicação é uma necessidade do ser humano e uma exigência social. É através dela que os homens estabelecem as relações sociais e tornam-se capazes de expressar seus desejos, senti mentos, necessida- des. A criança com difi culdade de comunicação terá problemas para de- senvolver suas interações sociais desde as primeiras fases da vida, pelo fato de não conseguir produzir gestos e sons, os quais são requisitos fun- damentais para as funções comunicati vas socialmente usuais [3]. Para auxiliar o desenvolvimento cogniti vo dessas crianças, podemos fazer uso da comunicação alternati va para compensar, temporária ou per- manentemente, as difi culdades de pessoas com desordens severas de co- municação expressiva oral ou escrita. O objeti vo é permiti r e/ou facilitar a parti cipação dos usuários nos mais variados contextos comunicati vos (in- teração social; situação educacional ou de trabalho; lazer), desenvolvendo ou favorecendo sua habilidade para interagir e se comunicar, possibilitan- do que os usuários expressem seus desejos e necessidades, facilitando o desenvolvimento de conceitos, da linguagem oral e/ou escrita, e facilitan- do ainda a inclusão de crianças com defi ciências na escola regular [4]. Pelosi [5] faz a seguinte descrição sobre os recursos para comuni- cação: A comunicação Alternati va e Suplementar é uma área da práti ca clínica que tem como objeti vo com- pensar temporariamente ou permanentemente a incapacidade ou defi ciência do indivíduo com de- sordem severa de comunicação expressiva oral ou escrita. Para o desenvolvimento de comunicação alternati va e suplementar são uti lizados os sistemas de comunicação habitualmente empregados pe- las pessoas sem difi culdades comunicati vas, como os gestos manuais e as expressões faciais. Além disso, pode-se dispor de sistemas criados ou adap- tados especialmente com fi nalidade educati va ou terapêuti ca, como a língua de sinais, as pranchas de alfabeto ou símbolos pictográfi cos, os comunicado- res, até sistemas sofi sti cados de computador com voz sinteti zada [6]. caminhos para inclusão.indd 40caminhos para inclusão.indd 40 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 Caminhos da INCLUSÃO | 41 É importante levar em consideração se o recurso uti lizado realmen- te atende as necessidades comunicati vas do usuário, ou seja, se possibili- ta uma comunicação funcional e favorece o estabelecimento das relações sociais. Caso o recurso não esteja sendo funcional é necessário identi fi car se isso ocorre por difi culdade da criança ou por fatores externos (inade- quação do recurso, não aceitação por parte das outras pessoas, dente outros). A funcionalidade da comunicação é o principal objeti vo para a uti lização dos sistemas de comunicação alternati va e/ou suplementar. En- tretanto, é necessário investi gar até que ponto este recurso realmente atende as necessidades comunicati vas desse indivíduo [3]. Por isso, antes de introduzir um dos recursos de comunicação al- ternati va disponíveis, é necessário avaliar alguns aspectos quanto às característi cas funcionais do recurso como: a aceitação do recurso pelo usuário (o usuário mostra-se familiarizado com o recurso, independente da situação de uso), aceitação do recurso pelos parceiros comunicati vos (as pessoas com quem convive conseguem manter um diálogo uti lizando o recurso), inteligibilidade do recurso pelo usuário (O recurso é de fá- cil compreensão por parte do usuário), inteligibilidade do recurso pelos parceiros comunicati vos (o recurso pode ser compreendido por qualquer pessoa, mesmo que não conviva roti neiramente com o usuário), ampli- tude representacional (atende a capacidade comunicati va sem limitá-la; possibilita ampliar o vocabulário inserindo novos símbolos ou palavras), se os itens estão de acordo com as habilidades cogniti vas do usuário (os símbolos uti lizados estão de acordo com os conceitos já adquiridos pelo usuário ou de acordo com suas possibilidades de aprendizado), e se pos- sibilita diálogos em diferentes contextos (o usuário consegue interagir com as pessoas em todos os ambientes que frequenta). Além disso, ainda avalia-se também se o recurso favorece as habili- dades sociais necessárias para a uti lização do recurso como: expressividade emocional (consegue expressar suas emoções através do recurso), civilidade (é capaz de atender as regras de inserção social de diferentes contextos), asserti vidade (consegue expressar suas vontades através do recurso), capa- cidade de fazer amizades (consegue iniciar e manter diálogos com outras pessoas). E aspectos como custo, material,transporte, tamanho etc. Na experiência aqui relatada o recurso escolhido foi a prancha de comunicação por melhor se encaixar nos aspectos relacionados acima, caminhos para inclusão.indd 41caminhos para inclusão.indd 41 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 42 de acordo com várias avaliações, e por ser um material de baixo custo, de fácil fabricação, fácil transporte e fl exível às necessidades e potencialida- des de cada criança e aos diferentes contextos em que o indivíduo está inserido, por exemplo: prancha de comunicação que contenha informa- ções que a criança uti lizará na escola, prancha para ati vidade de passeio, para contar histórias e músicas infanti s, etc. As pranchas são dispositi vos simples que consistem em superfí cies sobre as quais são disponibilizados os símbolos gráfi cos. Essas pranchas levam em consideração as possibilidades e as difi culdades cogniti vas, vi- suais e motoras de cada usuário e abrangem a interpretação dos senti dos compreendidos pelo interlocutor [7]. Diante desta abrangência abre-se um leque de estratégias para a montagem das pranchas (Figura 1), conforme cada contexto. Assim, po- dem-se ter pranchas de comunicação de roti nas, de histórias, de ati vida- des escolares, para passeio, entre outras. A decisão do modo como será organizada a prancha deve privilegiar a funcionalidade e a estéti ca. A fa- mília e a escola devem ser orientadas, já que com este recurso a criança expressa suas vontades, necessidades, e torna-se questi onadora, situa- ção que modifi ca a roti na, pois a criança deixa de ser um mero receptor de informações para ser ati vo nesse processo [7]. Entretanto, antes de introduzir qualquer recurso, é necessário reali- zar diversos treinos em etapas até que se alcance o objeti vo fi nal. Passando pela avaliação da criança, em que são identi fi cados o “sim” e o “não” da criança, sua compreensão quanto às relações de causa e efeito, o que ela faz quando não é compreendida, sua roti na e interesse, sua comunicação com a família, meio social e fí sico em que vive, escola, expectati vas, se faz uso de outros recursos, se realiza escolhas, quais as formas de comunica- ção, questões visuais, aspectos motores, entre outros. Só depois de pas- sado cuidadosamente por estas etapas é que se vai escolher um recurso e verifi car se este se adéqua aos aspectos relacionados acima. Com a escolha do recurso, inicia-se o processo de moti vação da criança para a aceitação deste, apresentando o de forma natural, fazen- do-o funcionar como linguagem e não como comportamento treinado. No caso de escolha de uma prancha de comunicação, trabalha-se primeiramente com o reconhecimento de símbolos, pessoas e ati vidades de seu coti diano, e busca-se uma forma interessante de introduzi-los aos caminhos para inclusão.indd 42caminhos para inclusão.indd 42 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 Caminhos da INCLUSÃO | 43 atendimentos de modo a torná-los lúdicos, a fi m de despertar o interesse do paciente. Nesta perspecti va são então defi nidas algumas estratégias primordiais para um bom desempenho do processo. No caso em ques- tão, essa estratégia foi a contação de história através dos símbolos. Deste modo foi possível exercitar também a compreensão e interpretação das histórias, viabilizando o reconte. OBJETIVO O presente trabalho tem o objeti vo de relatar experiências no aten- dimento de um usuário com paralisia cerebral na implementação da co- municação alternati va, uti lizando como estratégia a narração de histó- rias, adaptada por simbologia pictográfi ca. MÉTODO Desenvolveu-se um estudo de caso descriti vo. Eram realizados dois atendimentos semanais, com duração de 1 hora, no período de maio de 2007 a junho de 2009 no Núcleo de Desenvolvimento em Tecnologia Assisti va e Acessibilidade (NEDETA). Durante as sessões, eram uti liza- dos recursos de baixo e alto custo, tais como cartelas de comunicação, acionadores artesanais, aplicati vos de Power Point, programas especiais como “Intellipics” e o soft ware “Desenvolve”, a fi m de introduzir o uso de pranchas de comunicação alternati va como recurso para o desenvolvi- mento da comunicação. RELATO DE CASO R.A.C.S, 25 anos, sexo masculino, tem diagnósti co de paralisia cere- bral do ti po quadriparesia espásti ca. Nasceu por parto cesárea, a termo, apresentou icterícia. O pai relata erro médico, pois a criança não recebeu fototerapia ou nenhum outro ti po de assistência após nascer ictérico. A mãe era fumante R. A.C.S é o 3º fi lho, mora com os pais, dois irmãos, as respecti vas cunhadas e três sobrinhos recebe assistência no NEDETA desde maio de 2007. caminhos para inclusão.indd 43caminhos para inclusão.indd 43 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 44 No enfoque cogniti vo, objeti vou-se, para este paciente, construir um álbum de comunicação. Desta forma, buscou-se primeiramente esti - mular as discriminações e identi fi cações das fi guras, objetos e conceitos do coti diano. Durante as sessões foram uti lizados os seguintes recursos: Livro digital¹ de reconhecimento de frutas; Livro digital¹ de frutas e animais; Livro digital¹ de partes do corpo; Cartelas impressas de esquema corpo- ral e peças do vestuário; Livro digital¹ dos números 1 a 10; Cartelas para o reconhecimento das vogais maiúsculas e minúsculas; Conversa com o paciente a fi m de explicar sobre o objeti vo de construir a prancha; Con- soante “B” e suas junções com as vogais formando as sílabas. Com o auxílio de cartelas de comunicação e um livro digital¹ cons- truído especialmente para este paciente, foram apresentados ao pacien- te alguns símbolos que poderiam compor sua prancha de comunicação, dentre eles alguns verbos: Ir para casa; Comer; Beber; Dormir; Assisti r TV; Ir ao banheiro; Escovar os dentes; Vesti r-se. Alguns objetos e luga- res: Cartelas; Computador; NEDETA. E algumas pessoas de seu coti diano: Eu (Rodrigo); Pai (Natalino); Mãe; Irmão 1 (Danilo); Irmão 2 (Eduardo); Cunhada 1 (Kelly); Cunhada 2 (Lucila); Sobrinho 1 (Daniel); Sobrinho 2 (Danielly); Sobrinho 3 (Carlinhos); Amanda; Larissa; Sayuri; Solange; Tha- lita (Estagiárias do NEDETA). Formou-se um total de 34 símbolos, divididos em categorias da se- guinte forma: 9 verbos, 3 objetos ou lugares, e 15 pessoas. Em seguida, o pai introduziu mais 7 símbolos de uso no ambiente domiciliar para a comunicação com a família. Os símbolos eram: “lanche”, “atenção”, “ca- rinho”, água”, “escovar os dentes”, “xixi”, “cocô” e “banho”. Após a introdução desses símbolos e da certeza de sua assimilação, o paciente passou para o estágio de reconte de histórias para verifi car sua compreensão, interpretação, capacidade de escolha e reprodução da ideia. Foram contadas ao paciente 4 histórias, que totalizaram um total de mais 28 símbolos, divididos em categorias da seguinte forma: 5 pessoas; 2 verbos; 5 animais; 4 meios de transporte; 3 cores; 4 comidas; 5 objetos. A metodologia do reconte de histórias se dava dessa forma: inicial- mente, antes de contar a história, todas as fi guras eram apresentadas uma a uma a R, que se esforçava para visualizar cada uma. Ao contar a história pela primeira vez, a estagiária apresentava a fi gura correspondente. caminhos para inclusão.indd 44caminhos para inclusão.indd 44 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 Caminhos da INCLUSÃO | 45 História 1: “Essa é a história de um rei (mostra a fi gura do rei). Este rei ti nha muito dinheiro (mostra a fi gura do dinheiro). Um dia o rei subiu em uma torre (mostra a fi gura da torre). De cima da torre, o rei que ti nha muito dinheiro, viu um leão (mostra a fi gura do leão)!” Na próxima etapa, procedia-se da seguinte forma: A estagiária per- guntava: “Essa é a história de quem?” e mostrava a fi gura de um soldado, de um pintor e de um rei, simultaneamente,R pegou a fi gura do rei. Na segunda parte, a estagiária dizia: “Este rei tem muito... o que este rei tem muito, R?” e mostrava as fi guras de dinheiro, de frutas e outra de óculos. R pegava a fi gura do dinheiro. Na terceira etapa, a estagiária dizia: “Onde o rei subiu?” e mostrava a fi gura da escada e da torre, R escolhia a torre. E por últi mo perguntava o que o rei havia visto do alto da torre, sendo selecionada a fi gura do leão. Em seguida, R deveria lhe contar duas vezes a mesma história atra- vés das fi guras. E ele contou corretamente nas duas vezes. O paciente demonstrava estar super feliz com a nova proposta e com o fato de re- contar uma história. Em seguida, foi proposto ao paciente que contasse a história a mais alguém e, diante da resposta afi rmati va, foi chamado outro terapeuta ocupacional a quem R contou a história corretamente. Desta forma, perceberam-se as capacidades de compreensão, in- terpretação, reprodução de história e expressão do paciente, oferecen- do-lhe mais uma forma de comunicação e expressão de si. CONSIDERAÇÕES FINAIS O reconte de histórias é uma estratégia lúdica que desperta o inte- resse de indivíduos com difi culdade de expressar suas vontades e necessi- dades. Ao dar-se conta de que pode reproduzir ideias de forma que possa ser compreendido pelas outras pessoas, o indivíduo com limitações em sua comunicação sente-se esti mulado a expressar então suas próprias ideias. Desta forma lúdica, a assimilação de símbolos torna-se muito mais fácil, pois se consegue a colaboração e moti vação do cliente neste processo. Foi observada a aquisição de conceitos referentes a conteúdos de alguns símbolos como alimentos, números, animais, algumas letras do alfabeto (vogais e consoantes), cores, partes do corpo, esquema corpo- ral, peças do vestuário, verbos e pessoas. caminhos para inclusão.indd 45caminhos para inclusão.indd 45 23/8/2011 11:02:1223/8/2011 11:02:12 46 R.A.C.S, após passar por este processo, com apenas 4 histórias, au- mentou seu vocabulário de 34 para 69 símbolos de diferentes categorias, sendo que 7 deles foram graças à parceria da família com o terapeuta ocupacional. Antes de qualquer intervenção, é importante realizar conversas abertas com o cliente, apresentando-lhe a proposta do que se pretende trabalhar com ele, com quais objeti vos e na expectati va de quais resulta- dos, percebendo então se a proposta é de seu interesse. Outro aspectos muito importante a ser considerado é a comunicação direta com a famí- lia, que também deve ser o tempo todo informada e consultada quanto a estas estratégias de trabalho. Essa postura que permite que se estabe- leça uma parceria, na qual todos têm muito a ganhar. REFERÊNCIAS [1] Sanclemente M. Problemas de linguagem na paralisia cerebral. In: Sanclemente M.; Argueles P, Almirrall C, Métayer M. A fonoaudiologia na paralisia cerebral. São Paulo: Santos Editora; 2001. [2] Alves de Oliveira AI. Pesquisa em desenvolvimento infanti l. Belém: Conhecimento & Ciência; 2008. [3] Souza IS, Alves de Oliveira AI. Proposta de protocolo de observação das relações sociais de crianças usuárias de recursos de comunicação suplementar e/ou alternati va. Belém: Editora da Universidade do Estado do Pará; 2008. [4] American Speech-Language-Hearing Associati on. Competencies for speech-langua- ge pathologists providing services in argumentative communicati on. Asha31; 1989. p. 107-110. [5] Pelosi MB. Comunicação alternati va e suplementar. In: Cavalcanti A, Galvão C. Tera- pia Ocupacional: fundamentação e práti ca. Rio de janeiro: Guanabara Koogan; 2007. p. 462-486. [6] Glennen SL. Introducti on to argumentati ve and alternati ve communicati on. In: Glen- nen SL & Decoste DC, organizadores. Handbook of augumentati ve and alternati ve com- municati on. San Diego: Singular Publishing Group Inc; 1997. p. 3-20. [7] Alves de Oliveira AI; Garotti MF, Lourenço JMQ. Tecnologia Assisti va: pesquisa e prá- ti ca. Belém: EDUEPA; 2008. caminhos para inclusão.indd 46caminhos para inclusão.indd 46 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 ERA UMA VEZ...: AS NARRATIVAS INFANTIS COMO RECURSO DE ESTIMULAÇÃO COGNITIVA DE UMA CRIANÇA COM SÍNDROME DE DOWN Marcilene Alves Pinheiro1, Luana Xavier de Sena2, Ana Irene Alves de Oliveira3, Rafael Luiz Morais da Silva4 INTRODUÇÃO A Síndrome de Down (SD) é uma alteração genéti ca, não herdada, na qual o indivíduo apresenta três cópias do cromossomo5 21 ao invés de duas, como normalmente ocorre [1]. Essa síndrome é a forma mais frequente de retardo mental [2], e apresenta uma grande variedade de sinais disgenéti cos presentes na face e mãos [3]. Além do fator genéti co supracitado, durante os últi mos 30 anos es- tudiosos investi gam possíveis causas para essa alteração cromossômica, como: a exposição ao raio X; o uso de certas drogas; problemas hormo- nais ou imunológicos, espermatocidas, infecções virais específi cas e a ida- de avançada da genitora ( a média é de quatro vezes mais chances)[4]. O erro na divisão meióti ca é responsável por uma série de alte- rações no desenvolvimento fí sico, cogniti vo, de linguagem e comporta- mental no indivíduo com SD6. Esse indivíduo também pode apresentar: cardiopati a congênita, hipotonia, problemas de audição, de visão, altera- ções na coluna cervical, distúrbios da ti reóide, problemas neurológicos, obesidade e envelhecimento precoce [5, 4]. 1 Acadêmica do 5º ano do curso de graduação em Terapia Ocupacional da UEPA e estagiária do NEDETA. 2 Acadêmica do 5º ano do curso de graduação em Terapia Ocupacional da UEPA; 3 Terapeuta ocupacional, doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento e coordenadora no Núcleo de De- senvolvimento em Tecnologia Assistiva e Acessibilidade; 4 Terapeuta ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, Mestre em Teoria e Pesquisa do Com- portamento (UFPA); 5 Os cromossomos são minúsculas estruturas em forma de barras que portam os genes; estão contidos no núcleo de cada célula e só podem ser identifi cados durante uma certa fase da divisão celular(PUESCHEL, 2007, p.54). 6 Ratifi ca-se que embora a criança com SD tenha características físicas específi cas, elas podem apresentar mais semelhanças do que diferenças com a população em geral, porém, tais características são fundamentais para o diagnóstico médico e nem sempre estarão presentes em sua totalidade, isto é, algumas crianças podem apresentar muitas dessas, enquanto outras quase não as apresentam (BEE, 2003). caminhos para inclusão.indd 47caminhos para inclusão.indd 47 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 No que concerne às habilidades cogniti vas, os indivíduos com SD “não são desprovidos de inteligência, mas têm apenas uma inteligência mal-estruturada” [6]. A maioria das crianças com a síndrome apresenta retardo mental na faixa entre leve a moderado, algumas tem função inte- lectual limítrofe ou na faixa média-baixa, e poucas apresentam defi ciên- cia mental severa [5, 4]. As crianças com SD apresentam boa memória, desenvolvem mais rapidamente a memória visual do que a auditi va; a função mental pen- samento (generalização, discriminação e abstração) se encontra diminu- ída em diferentes níveis, contudo, a grande maioria consegue manejar a abstração de conceitos percepti vos mais simples (forma, cor, tamanho e posição) e, posteriormente, mais complexos simbólicos e gráfi cos (núme- ros e letras) [6]. Quanto às especifi cidades da função mental pensamento, nota-se difi culdades no processo de generalização em decorrência do comporta- mento dispersivo, muitas vezes apresentado por essas crianças; a discri- minação é um processo subsequente à generalização, pois, após conse- guir generalizar, conseguirá assimilar o conceito de igual e diferente; e, na abstração, inicialmente apresentará difi culdades em obter as partes deum todo, porém não impedirão a aquisição do processo de leitura e escrita quando bem esti muladas. As alterações no desenvolvimento da criança com SD provocam a organização de uma nova estrutura biopsicossocial, favorecendo a cria- ção de um novo ser que se torna único. Assim, o desenvolvimento dessa criança não dependerá apenas daquela ati vidade mais global, mas ainda estará relacionada a um ambiente harmonioso [1]. Então, como qualquer outra criança, a criança a com SD estará apta a aprender ao nascer. Entretanto, segue um desenvolvimento peculiar, com ritmos e sequências próprios (desenvolver habilidades motoras grossas para em seguida desenvolver as habilidades motoras fi nas). Contudo, mes- mo diante de suas limitações, a criança com SD passa a explorar o meio que a cerca, caminho básico para o seu desenvolvimento cogniti vo [7]. O desenvolvimento da aprendizagem, a parti r da construção de ações e de conhecimento, como premissa da organização e formação de “esquemas de ação ou cogniti vos” consti tui-se em conhecimento [8]. As- sim, a ação e percepção sobre o mundo acontecerão apenas a parti r da 48 caminhos para inclusão.indd 48caminhos para inclusão.indd 48 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 dimensão dos esquemas de ação que a criança já possui, que, de forma gradati va, se ampliam e se transformam [9]. Por outro lado, ao considerar o desenvolvimento como algo cons- truído pelo ambiente social, temos a aprendizagem como resultado da ação do sujeito no meio e sua capacidade de interagir e adaptar-se ao objeto do conhecimento [10]. Desta forma, a aprendizagem será vista como condutora ao desenvolvimento, e deve ser orientada para os níveis de desenvolvimento que ainda não foram ati ngidos, isto é, para a zona de desenvolvimento proximal. Dentre os recursos que podem ser uti lizados para promover a aprendizagem da criança com défi cits cogniti vos, destaca-se a narrati va infanti l. O ato de contar histórias faz parte do ser humano, ultrapassa as fronteiras da literatura e ati nge a vida real [12]. A literatura infanti l tem como peculiaridades a transformação do ato de ler ou de ouvir uma his- tória em um ato de aprendizagem, pois, para ele, uma mensagem sem- pre é transmiti da entre um locutor (emissor) e um desti natário-criança (receptor) [13]. Dentre as histórias infanti s, o gênero ‘conto de fadas’ ganha des- taque. Este gênero se sobressai dos demais por dois moti vos: primei- ro, os contos de fadas adotam um enredo de estrutura binária7 tí pica do processo de categorização – esperança e desesperança, bem e mal, inteligência e estupidez etc – que viabiliza a aprendizagem ao facilitar a identi fi cação, a discriminação e a classifi cação de objetos do mundo. E ainda apresentam as ideias dispostas conforme a sequência de início, meio e fi m, e desta forma auxilia na aquisição da noção de “sequência dos eventos, o encadeamento de ações, os saberes de que a criança dis- põe, assinalando o fi o da história” [12]. Na compreensão da relação criança com SD e ambiente, as ati vi- dades propostas a essa criança devem estar baseadas em suas necessi- dades e interesses, pois, assim, estará ávida para explorar, experimentar, questi onar e exibir suas habilidades [11]. Daí a importância de um am- biente com materiais que possam ser explorados ao máximo e que tam- bém sejam propulsores de novas experiências, proporcionando então o desenvolvimento integral desta criança. 7 O sistema binário, que prevalece nas narrativas, possibilita classifi car um ser como voador ou não, noturno ou diurno, com descrições minuciosas, o que também se aplica às crianças, porque a mente infantil também usa tal sistema para a compreensão do mundo [12]. Caminhos da INCLUSÃO | 49 caminhos para inclusão.indd 49caminhos para inclusão.indd 49 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 50 Diante disso, temos a narrati va infanti l como um rico instrumento para catalisar o processo de aprendizagem da criança com SD, pois “a narrati va está presente na conversação, no contar e recontar histórias, na expressão gestual e plásti ca, na brincadeira e nas ações que resultam da integração das várias linguagens, dando senti do ao mundo e tornando essencial sua inclusão no coti diano infanti l” [12]. OBJETIVO Analisar as possibilidades de uti lização das narrati vas infanti s en- quanto recurso terapêuti co ocupacional na esti mulação cogniti va de uma criança com Síndrome de Down. Percurso metodológico Este estudo tem na abordagem qualitati va seu principal horizonte de análise. Dessa forma, foi uti lizada a pesquisa do ti po estudo de caso, pois se entende que cada sujeito revela formas parti culares de interação com os diversos fenômenos que lhe são apresentados. O referido estudo foi realizado no Núcleo de Desenvolvimento em Tecnologia Assisti va e Acessibilidade (NEDETA), onde foi selecionada uma criança com síndrome de Down que, por questões éti cas, foi denominada de Branca de Neve. Os instrumentos de coleta de dados foram a fi cha de avaliação do desenvolvimento infanti l, o questi onário socioeconômico, o soft ware Desenvolve®, as narrati vas infanti s (Os três porquinhos, O príncipe sapo e A Branca de Neve e os sete anões) e as ati vidades terapêuti cas, com enfoque lúdico e cogniti vo. Foram realizados cerca de 12 atendimentos semanais, com duração de aproximadamente 60 minutos, no período de abril a junho de 2010, no NEDETA. As principais etapas da pesquisa de campo foram: 1) avaliação do desenvolvimento infanti l e aplicação do questi onário socioeconômico; 2) avaliação cogniti va com o soft ware Desenvolve®; 3) apresentação da narrati va infanti l e de ati vidades terapêuti cas de acordo com o enredo da narrati va infanti l proposta; 4)reavaliação com soft ware Desenvolve®. caminhos para inclusão.indd 50caminhos para inclusão.indd 50 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 Caminhos da INCLUSÃO | 51 Relato do caso Branca de Neve, 11 anos, sexo feminino, tem como diagnósti co clí- nico Síndrome de Down. De acordo com a avaliação do desenvolvimento infanti l, sua genitora apresentou gestação normal, a termo, sem intercor- rências, apesar da gravidez ter sido considerada de risco em virtude da idade da mãe (42 anos). A criança possui uma irmã mais velha que não apresenta a mesma patologia. Atualmente reside em uma casa com boas condições em companhia de sua mãe, sua irmã, suas ti as e seus primos. Iniciou tratamento com os serviços de terapia ocupacional, fi siote- rapia e fonoaudiologia ainda no primeiro ano de vida, e apresenta como característi cas de desempenho ocupacional: estabilidade de aspectos motores; apresenta défi cit visual signifi cati vo, mas, faz uso de óculos; alterações em aspectos cogniti vos; frequenta escola regular, onde apre- senta bom rendimento, além de realizar ati vidades de lazer, como balé e natação. Em avaliação cogniti va com o soft ware Desenvolve®, Branca de Neve apresentou um score total de 96 acertos de um universo de 127 te- las, obtendo um rendimento de 75,59%. A parti r deste resultado, estrutu- rou-se o plano de tratamento terapêuti co ocupacional que atendesse às suas habilidades cogniti vas defi citárias apontadas pelo soft ware (identi - fi cação de ações, noção de tempo, percepção espaço temporal, noção de sequência numérica e identi fi cação de fatos pela sequência de ações) por meio de três narrati vas infanti s do gênero conto de fadas, e de ati vidades ludo-terápicas que seguiam o enredo das histórias. As histórias eram narradas para Branca de Neve, uma por sessão, até que ela demonstrasse ter compreendido (recontar os fatos e/ou iden- ti fi car as personagens, as ações entre outras característi cas do conto – fi gura 1). Para todas as histórias, foram uti lizados livros infanti s contendoimagens da ação e um breve texto sobre a mesma. Branca de Neve ouvia as histórias atentamente e, sempre que um conto chegava ao fi m, gos- tava de manusear o livro e recontar a narrati va livremente, isto é, recon- tava as histórias identi fi cando seus momentos (início, meio e fi m) e as ações que ocorriam neles. caminhos para inclusão.indd 51caminhos para inclusão.indd 51 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 52 Figura1. Apresentação da narrati va à criança Em seguida, eram realizadas as ati vidades terapêuti cas consoantes às característi cas do enredo da história do dia. Nelas, Branca de Neve associava personagens da história as suas respecti vas ações, ordenar as sequências de ações em início, meio e fi m, contar os objetos que a histó- ria apresentava, entre outras (fi guras 2 e 3). Figura 2. Realização de ati vidade terapêuti ca caminhos para inclusão.indd 52caminhos para inclusão.indd 52 23/8/2011 11:02:1323/8/2011 11:02:13 Caminhos da INCLUSÃO | 53 Figura 3. Ati vidade terapêuti ca /reconto da narrati va Após a reavaliação cogniti va com o mesmo soft ware, pode-se ob- servar que o score total de Branca de Neve ati ngiu 104 acertos, o que equivale a um rendimento de 81,88%, obtendo evolução signifi cati va nas habilidades esti muladas do quadro abaixo: Quadro1: Score do soft ware desenvolve®, das habilidades cogniti vas prio- rizadas no tratamento antes e depois da uti lização de narrati vas infanti s Habilidade cogniti va defi citária Pontuação da avaliação Pontuação da reavaliação Percepção espaço temporal 33,3% 50% Noção de sequência numérica 66,6% 100% Identi fi cação de fatos pela sequência de ações acertos 66,6% 100% DISCUSSÃO Este estudo oportunizou a aplicação de um recurso de baixo custo, mas muito rico de informações que é a narrati va infanti l, pois nela esta- vam reti das informações não apenas sobre as personagens, mas de ele- caminhos para inclusão.indd 53caminhos para inclusão.indd 53 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 54 mentos essenciais para a formação dos “esquemas cogniti vos” e da re- lação do leitor/criança com o ambiente, ambos fundamentais para uma esti mulação cogniti va efi caz, catalisadora do processo de aprendizagem. Tal processo é considerado complexo, principalmente para crianças com desenvolvimento atí pico como os casos de SD expostos neste estu- do, pois são crianças que apresentam certa lenti dão para compreensão, identi fi cação, discriminação e classifi cação de objetos do mundo que, por sua vez, são elementos básicos para a efetuação da aprendizagem. Entretanto, por meio das narrati vas infanti s, esti mulou-se não ape- nas esses elementos, mas o ato de contar e recontar histórias, de reali- zar ati vidades ludo-terápicas semelhantes as do contexto escolar. Logo, a ati vidade também auxiliou na inclusão escolar das crianças esti muladas, pois o contato e manuseio direto com os livros despertaram o interesse pelo ato de estudar. Assim, percebeu-se que apresentar novas possibilidades às crian- ças com SD permite que estas alcancem algumas habilidades e possam desenvolver as suas potencialidades, minimizando, assim, as limitações provenientes da patologia, além de favorecer a inclusão social e a quali- dade de vida. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através deste estudo desenvolvido no NEDETA, percebeu-se o po- tencial que a criança com SD apresenta, desmisti fi cando a falta de in- teligência e impossibilidade de aprendizagem, mesmo considerando os défi cits cogniti vos que apresentam em virtude da lenti dão para compre- ensão, aquisição e manutenção de habilidades, daí a importância de ati - vidades graduais e repeti ti vas, como ocorre com as narrati vas infanti s. Observou-se ainda que dispomos atualmente de diversos recursos para esti mulação cogniti va de crianças com SD, mas que podemos tam- bém lançar mão de objetos coti dianos como as narrati vas infanti s, que podem ser até mais acessíveis e prazerosos para a criança, uma vez que propõem a esti mulação de maneira lúdica, gradual, repeti ti va, mas não cansati va e nem desinteressante, sendo muito efi caz na promoção da aprendizagem, da inclusão social e da qualidade de vida dessas crianças. caminhos para inclusão.indd 54caminhos para inclusão.indd 54 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 Caminhos da INCLUSÃO | 55 REFERÊNCIAS [1] Bee H. A Criança em Desenvolvimento. Tradução de Maria Adriana Veríssimo Vero- nese. 9ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2003. [2] Puyuelo M, RONDAL JA. Manual de desenvolvimento e alterações da linguagem na criança e no adulto. Porto Alegre: Artmed; 2007. [3] Assencio-Ferreira VJ. O que Todo Professor Precisa Saber Sobre Neurologia. Coleção Inclusão Escolar – Capacitação para o Ensino Desafi ador. São José dos Campos: Pulso; 2005. [4] Pueschel S (Org.). Síndrome de Down: guia para pais e educadores. 2ª ed. São Paulo: Papirus; 2007. [5] Cooley WC, Graham JM. Down syndrome: An update and review for the primary pediatriacian. Clin Pediat 1991;30:233-53. In: MOREIRA, Lília MA; EL-HANIB, Charbel N; GUSMÃO, Fábio AF. A síndrome de Down e sua patogênese: considerações sobre o de- terminismo genéti co. Rev Bras Psiquiatr 2000;22(2):96-9. Acesso em: 29 de maio de 2010. Disponível em: htt p://www.scielo.br/pdf/rbp/v22n2/a11v22n2.pdf. [6] Werneck C. Muito Prazer, Eu Existo – um livro sobre as pessoas com Síndrome de Down. 3ª ed. São Paulo: WVA; 1993, p 162. [7] Zaumer E. Habilidades motoras fi nas e o brincar: um caminho para a aprendizagem cogniti va. In: PUESCHEL S (Org.). Síndrome de Down: guia para pais e educadores. 2ª ed. São Paulo: Papirus; 2007, p149-158. [8] Piaget J. O nascimento da inteligência na criança. 4ª ed. Rio de Janeiro: Zahar; 1982. [9] Carvalho AV; SALLES F, GUIMARÃES MB. (Orgs.). Desenvolvimento e aprendizagem. Belo Horizonte: UFMG; 2006. [10] Vigotsky, L.S. Vigotsky: aprendizado e desenvolvimento – um processo sócio-histó- rico. São Paulo: Artmed; 2006. [11] Ferreira, CAM et al. Psicomotricidade Clínica. São Paulo: Lovise; 2003. [12] Kishimoto TM. Narrati vas infanti s: um estudo de caso em uma insti tuição infanti l. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.33, n.3, p. 427-444, set./dez. 2007. [13] Coelho NN. Literatura Infanti l: teoria, análise e didáti ca. 6ª ed. São Paulo: Áti ca; 1997. caminhos para inclusão.indd 55caminhos para inclusão.indd 55 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 caminhos para inclusão.indd 56caminhos para inclusão.indd 56 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 Caminhos da INCLUSÃO | 57 caminhos para inclusão.indd 57caminhos para inclusão.indd 57 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 caminhos para inclusão.indd 58caminhos para inclusão.indd 58 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 O USO DE TECNOLOGIA ASSISTIVA PARA FAVORECER A APRENDIZAGEM DA PESSOA COM SURDOCEGUEIRA E DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA Dalva Rosa Watanabe, Lília Giacomini, Marcia Maurilio Souza, Sandra Regina Stanziani Higino Mesquita, Shirley Rodrigues Maia e Vula Maria Ikonomidis INTRODUÇÃO O programa de reabilitação do Centro de Recursos da Ahimsa Asso- ciação Educacional para Múlti pla Defi ciência e do Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múlti plo Defi ciente Sensorial, vem recebendo desde 2004 pessoas jovens, adultos e de terceira idade com síndrome de usher1, que necessitam aprender uma nova forma de comunicação para conti nu- ar parti cipando e recebendo informações dos familiares, dos programas educacionais e culturais, do ambiente de trabalho e da comunidade em geral aos quais pertenciam e/ou parti cipavam. O planejamento de intervenção é organizado para cada pessoa, le- vando em consideração seus resíduos visuais e auditi vos, suas habilida- des motoras e experiências vivenciadas.O uso da tecnologia assisti va foi introduzido para ampliar os meios de comunicação das pessoas com surdocegueira. Para este relato foram selecionadas a maxi lupa, equipamento que promove ampliação de ima- gem em preto e branco e colorido, uti lizado para leitura de textos, livros, músicas e etc; a lupa eletrônica, equipamento de ampliação de imagem que é acoplada a uma televisão em preto e branco, uti lizado para leitura de textos e as placas alfabéti cas, uma placa confeccionada em madeira com o alfabeto em letras maiúscula e em relevo, com sua correspondência no sis- tema Braille, e a outra placa alfabéti ca em papel com o alfabeto impresso em fonte ampliada e com sua correspondência no sistema Braille. 1 Condição genética autossômica recessiva, que apresenta retinose pigmentar e perda auditiva de severa a moderada. (Grupo Brasil 2003) [01]. caminhos para inclusão.indd 59caminhos para inclusão.indd 59 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 60 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Terminologia - Surdocegueira como condição única A visão e a audição são dois senti dos muito importantes. Ambos os senti dos são vitais para a aprendizagem, para comunicar-se adequada- mente, para movimentar-se com confi ança e para aproveitar a compa- nhia de outras pessoas. Em geral, a perda de algum desses senti dos pode ser compensada, de certa forma, uti lizando o outro senti do do modo mais efi caz possível. Por exemplo: as pessoas surdas podem usar a visão para comunicar-se através da leitura dos lábios ou uti lizar a língua de sinais, e as pessoas cegas podem usar a audição para realizar tarefas que para a maioria das pessoas implicam o uso da visão como, por exemplo, usufruir de uma parti da de futebol escutando a narração em áudio. E a pessoa com surdocegueira, por não ter a visão e a audição em condições ideais, receberá as interpretações desses dois senti dos comprometi dos, muitas vezes, de forma distorcida. Os senti dos remanescentes o ajudarão a perceber e reconhecer o mundo ao seu redor, mas não lhes darão pos- sibilidades de compensação de suas perdas sensoriais. [02] Surdocegueira adquirida Segundo a Deafb lind Internati onal [03], São pessoas cegas que desenvolvem uma defi ciência auditi va depois do desenvolvimento da linguagem; as pessoas que já ti nham uma defi ciência auditi va/ surdez e já tem a estruturação de sua linguagem por meio de Libras e que, com o tempo, sofrem uma perda da visão; e, as pessoas que podiam ver e ouvir normalmente, mas que, por alguma razão, como um acidente ou velhice, sofreram uma diminuição con- siderável da visão e da audição. Linguagem É afi rmado por Viñas [04] que: Toda linguagem pressupõe a existência de sinais, independente de qual seja a sua modalidade per- cepti va concreta (nas línguas faladas que seriam as caminhos para inclusão.indd 60caminhos para inclusão.indd 60 23/8/2011 11:02:1423/8/2011 11:02:14 Caminhos da INCLUSÃO | 61 palavras), a linguagem, qualquer linguagem pelo fato de estar composta por gestos/sinais/símbolos, pres- supõe certa capacidade para estabelecer correlações entre signifi cantes e signifi cados (entre o objeto e sua representação), e não deve nunca ser entendida sim- plesmente como a soma dos sinais individuais que a compõem, mas sim, como a combinação sistemati - zada de acordo com regras comparti lhadas com os interlocutores efi cazes nessa linguagem. A aquisição e o desenvolvimento da linguagem ou, se preferir, a aquisição e desenvolvimento de um código ou siste- ma de sinais, está ligado à comunicação e a interação social, a expressão das emoções, o conhecimento da realidade, a conduta voluntária e a capacidade de re- presentação. Sendo assim, devemos considerar que a linguagem é um sistema complexo de símbolos que atua como mediador e instrumento que fa- vorece a interação com os nossos semelhantes nas diferentes áreas de ati vidade (afeti va, cogniti va, social, etc.), e que a sistemati zação da co- municação, para se converter em linguagem é mais efi caz quanto mais a pessoa for exposta a situações de interações sociais interessantes e na medida em que essas situações se desenvolvam enriquecidas. Esse processo já é geralmente estabelecido pelas pessoas com sur- docegueira adquirida, de acordo com as experiências que passaram e pela aquisição de diferentes sistemas de comunicação. Entendemos que comunicação envolve: forma, função, conteúdo, ter um companheiro (parceiro) para comunicação e o ambiente fí sico. No seu processo de re- abilitação para manter a linguagem, o surdocego terá que aprender um novo sistema de comunicação. Esses sistemas podem ter formas táteis, como Libras táti l, alfabeto manual táti l e outros, para se manter informa- do e interagindo com outras pessoas. Reyes [02] afi rma: A comunicação é a chave da inserção social das pes- soas com surdocegueira no ambiente social e cultu- ral no qual vivem. Por essa razão, tudo o que esti ver relacionado com a comunicação é objeto do maior interesse, tanto por parte dos profi ssionais, como caminhos para inclusão.indd 61caminhos para inclusão.indd 61 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 62 das próprias pessoas surdocegas, na busca de siste- mas de comunicação mais rápidos e efi cazes. Tecnologia Assisti va O comitê de Ajudas Técnicas da Secretaria Nacional de Direitos das Pessoas com Defi ciência [05] (SNDPD), defi niu Tecnologia Assisti va [TA], como sendo: Uma área do conhecimento, de característi ca in- terdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práti cas e serviços que objeti vam promover a funcionalidade, relacionada à ati vidade e parti cipação, de pessoas com defi ciên- cia, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social. Descreveremos a seguir as TA que foram uti lizadas pelos parti ci- pantes desse trabalho para conhecimento de todos: - Maxi Lupa - equipamento que promove ampliação de imagem em preto e branco e colorido, pode ser uti lizado para leitura de textos em livros, jornais, cadernos etc. (Figura 1 e 2); Figura 1. Maxi Lupa, Fonte: Acervo Ahi- msa, 2010 Figura 2. Maxi Lupa sendo usada por uma aluna da escola, fonte: Ahimsa, 2010 - Lupa Eletrônica - equipamento de ampliação de imagem que é aco- plada a uma televisão em preto e branco, uti lizado para leitura de textos em livros, jornais, cadernos, etc. (Figura 3) caminhos para inclusão.indd 62caminhos para inclusão.indd 62 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 Caminhos da INCLUSÃO | 63 Figura 3. Aluna usando Lupa Eletrôni- ca, fonte: Acervo Ahimsa, 2010 Figura 4. Placa alfabéti ca, Fonte: Acervo Ahimsa, 2005. - Placas alfabéti cas - Placas confeccionadas com materiais diversos (madeira, papel espesso, plásti co), com o alfabeto impresso ou em relevo em letras maiúsculas, e o alfabeto em Braille (Foto 4). As placas alfabéti - cas são uti lizadas para a comunicação entre a pessoa com surdocegueira adquirida e as pessoas que com ela interagem. O PROGRAMA DE REABILITAÇÃO PARA PESSOAS COM SURDOCEGUEIRA ADQUIRIDA DA AHIMSA E GRUPO BRASIL No Programa de Reabilitação da Ahimsa e Grupo Brasil as pessoas com surdocegueira adquirida passam por uma avaliação, que é realizada durante a triagem para ingresso no programa. Nessa avaliação são obser- vados vários pontos importantes para conhecermos essas pessoas e po- dermos organizar o planejamento das ati vidades a serem desenvolvidas em seu programa individual de reabilitação. Destacaremos dois pontos que são relevantes para o nosso trabalho, pois são os que nos apontam a comunicação e as necessidades de aqui- sição de uma nova forma de comunicação, assim como as adaptações e recursos necessários para a efeti vação de uma comunicação efi caz:Comunicação - Qual forma de comunicação essa pessoa fazia uso antes de adquirir a surdocegueira; - Se a pessoa com surdocegueira adquirida já começou a usar uma nova forma de comunicação; caminhos para inclusão.indd 63caminhos para inclusão.indd 63 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 64 - Se essa nova forma de comunicação está sendo efi ciente para a sua comunicação efeti va com as outras pessoas e para a sua aprendizagem. Orientação e Mobilidade - Como está a autonomia da pessoa com surdocegueira adquirida em relação a sua orientação e mobilidade nos ambientes fechados (sua casa e lugares que frequenta); - Como está a sua autonomia no que concerne à orientação e mobilidade nos ambientes externos (locais públicos e transportes públicos). Após essa avaliação são planejadas ofi cinas de comunicação, as quais essas pessoas frequentam durante três meses, uma vez por sema- na, no período de 01 hora e 30 minutos. Depois dos três meses, essas pessoas passam por uma nova ava- liação para observarmos como se desenvolveu a nova forma de comu- nicação. Com isso podemos dar inicio ao uso da tecnologia assisti va que melhor promove a aquisição de informações e que lhe dá melhores con- dições de uso. Algumas pessoas com surdocegueira adquirida passam a frequen- tar duas vezes por semana a ofi cina de comunicação, sendo que em um dia treina a sua nova forma de comunicação e no outro dia treina o uso da tecnologia assisti va. OBJETIVOS Objeti vo Geral Reabilitar e desenvolver uma segunda forma de comunicação para favorecer a parti cipação ati va de pessoas com surdocegueira adquirida. Objeti vos Específi cos Treinar uma segunda forma de comunicação. Treinar o uso de tecnologias assisti vas para apoiar a aquisição de autonomia para a busca de informações. Possibilitar a autonomia nas ati vidades de vida autônoma. caminhos para inclusão.indd 64caminhos para inclusão.indd 64 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 Caminhos da INCLUSÃO | 65 METODOLOGIA Os parti cipantes Para nosso trabalho relataremos a parti cipação no processo de triagem / avaliação, parti cipação nas ofi cinas de comunicação e no trei- namento de uso de tecnologia assisti va de duas (2) pessoas com surdo- cegueira adquirida. - O primeiro parti cipante é D, tem 20 anos, apresenta defi ciência visual e defi ciência auditi va bilateral moderada, apresenta também défi cit cog- niti vo de grau leve. A aquisição de surdocegueira se deu pela síndrome de Bardet-Biedl2, que se caracterizou por distrofi a reti niana com perda progressiva de visão ainda na adolescência. Quando chegou a insti tui- ção para triagem, com 16 anos, sua comunicação expressiva se dava pela fala (era oralizado) e sua comunicação recepti va por fala ampliada. Foi avaliado e encaminhado para as ofi cinas de comunicação, de Braille, de panifi cação e de orientação e mobilidade. D ti nha difi culdade de leitura e escrita, e havia abandonado a escola regular por moti vo de difi culdades para acompanhar os conteúdos ensinados em sala de aula. - O segundo parti cipante é G, tem 12 anos, apresenta defi ciência visual e defi ciência auditi va bilateral profunda. A aquisição da surdocegueira se deu pela síndrome de Usher ti po I, que se caracteriza por defi ciência auditi va primária e a perda progressiva de visão por reti nose pigmentar – no caso dele, perdeu toda a visão ainda criança, por volta dos 4 anos de idade. Quando chegou a insti tuição não ti nha uma forma de comuni- cação sistemati zada, somente comunicação não-verbal, sendo que antes dele ser encaminhado para o Programa de Reabilitação passou por aten- dimento educacional especializado na Ahimsa. Somente depois de 3 anos desse ti po de atendimento começou a frequentar uma escola municipal especial para surdos, e a frequentar a ofi cina de comunicação da Ahimsa e Grupo Brasil. Antes já havia desenvolvido uma forma de comunicação sistemati zada que era a Libras Táti l, assim como já estava alfabeti zado 2 A síndrome de Bardet-Biedl é doença de herança autossômica recessiva caracterizada por distrofi a retiniana, polidactilia, obesidade, retardo mental e hipogenitalismo. Um ou mais dos achados acima que caracterizam a síndrome podem estar ausentes, mas a distrofi a retiniana é achado consistente. Esta se manifesta clinicamen- te na infância com progressiva perda visual, causando grave difi culdade visual na adolescência. Os autores descrevem dois casos de síndrome de Bardet-Biedl, os resultados da acuidade visual, biomicroscopia, oftal- moscopia, angiografi a, campo visual e eletrorretinograma. Foi realizada revisão bibliográfi ca com ênfase na identifi cação dos sinais sistêmicos, envolvimento ocular, testes eletrofi siológicos e avaliação genética [06]. caminhos para inclusão.indd 65caminhos para inclusão.indd 65 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 66 com o sistema braille. Quando do ingresso no Programa de Reabilitação sua comunicação expressiva e recepti va era Libras Táti l. Além da ofi cina de comunicação, G frequenta as aulas de esportes e de educação fí sica na Ahimsa. O processo O parti cipante D, por ter difi culdades de leitura e escrita e estar perdendo visão, além da ofi cina de comunicação, também frequentava a ofi cina de Braille para aprender o sistema e, concomitantemente, sua alfabeti zação se efeti vou. Apesar de estar na ofi cina de Braille, incenti - vamos o aproveitamento de seu resíduo visual nas ofi cinas de comuni- cação. Para isso foi introduzido nas ofi cinas o uso da maxi lupa e da lupa eletrônica, conforme fi guras 5, 6 e 7. Figura 5. Maxi lupa e má- quina Braille Figura 6. Maxi lupa para leitura de jornal Figura 7. Lupa eletrônica para leitura de livro Fonte: Acervo Ahimsa, 2010. D, após treinamento, uti liza a maxi lupa para enxergar detalhes de textos, fotografi as e ampliar a leitura diária. A lupa eletrônica o auxilia nas ati vidades de leitura de livros, jornais e revistas. A uti lização desses equipamentos proporcionou-lhe a oportunida- de de melhoria da sua habilidade de leitura e escrita, assim como a ma- nutenção de leitura de livros, jornais e revistas de sua preferência. Ao parti cipante G, na ofi cina de comunicação, foi oferecido o aten- dimento educacional especializado, pois ele frequenta uma escola regu- lar, associando o aperfeiçoamento da aprendizagem de leitura e escrita no sistema Braille; o aperfeiçoamento do uso de Libras Táti l com a in- trodução de conceitos novos e consequente desenvolvimento de lingua- gem; a oportunização de uma segunda forma de comunicação, as placas de comunicação, para que ele possa ter oportunidade de comunicar-se caminhos para inclusão.indd 66caminhos para inclusão.indd 66 23/8/2011 11:02:1523/8/2011 11:02:15 Caminhos da INCLUSÃO | 67 com pessoas que não dominam a língua de sinais. A professora respon- sável pela ofi cina desenvolveu um treinamento para que ele pudesse uti lizar as placas alfabéti cas, a princípio com a comunidade escolar da Ahimsa e, em seguida, com a comunidade da escola que ele frequenta, e, por últi mo, com a comunidade próxima das escolas, em comércios e com as pessoas que transitam pelo bairro. RESULTADOS O que podemos observar como resultado da parti cipação de D e G nas Ofi cinas de Comunicação do Programa de Reabilitação da Ahimsa e Grupo Brasil é que adquirir uma segunda forma de comunicação, expressi- va e/ou recepti va, para uma pessoa com surdocegueira adquirida propor- ciona e amplia as oportunidades para a aquisição de informações, aprendi- zagem, comunicação com outras pessoas com surdocegueira ou não. Em relação à tecnologia assisti va, podemos afi rmar que: As placas alfabéti cas foram uti lizadas para comunicação entre as pessoas com surdocegueira que sabiam e não sabiam Libras. As placas de comunicaçãoforam uti lizadas na comunicação do dia a dia e nas ati vidades de compras, elas também foram uti lizadas durante as aulas de orientação e mobilidade como apoio de comunicação com as pessoas a quem elas podem pedir ajuda na comunidade durante seus deslocamentos nas vias públicas e nos transportes. A lupa eletrônica e a maxi lupa foram usadas efeti vamente como suporte para aquisição de informações em livros, revistas, jornais; para leitura de textos de interesse individual e também para leitura de materiais para estudo, assim como serviram de suporte para a aprendizagem de leitura e escrita Braille. As pessoas com surdocegueira adquirida planejaram, junto com a professo- ra, os textos e ati vidades que eram trabalhados durante as aulas. Essa Tecnologia Assisti va serviu de apoio para a autonomia na realização de ati vidades do dia a dia, na aquisição de uma nova forma de comunica- ção e para melhorar a qualidade de comunicação entre as pessoas com surdocegueira que somente dominavam a língua de sinais, com outras pessoas com surdocegueira que eram ouvintes e cegas e que não domi- nam a língua de sinais, mas sim o sistema braille. caminhos para inclusão.indd 67caminhos para inclusão.indd 67 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 68 CONSIDERAÇÕES FINAIS As pessoas com surdocegueira adquirida precisam ter oportunida- des de comunicação e, com o uso da tecnologia assisti va, elas consegui- ram alcançar um nível mais elevado de autonomia, assim como consegui- ram buscar informações de seu interesse. Quando a comunidade de pessoas com surdocegueira constata que o uso de tecnologia assisti va é realmente muito positi vo para suas vidas, ela se moti va e se fortalece para buscar, junto a secretarias e órgãos com- petentes, recursos para ter suas próprias tecnologias. REFERÊNCIAS [01] Síndrome de Usher- Carti lha Informati va da Série Surdocegueira e Defi ciência Múl- ti pla Sensorial, editora Grupo Brasil; 2003 p. 3. [02] Reyes DA. La sordoceguera: uma discapacidad singular. Rey ER, Viñas PG. (Coord.), La sordoceguera: Un análisis multi disciplinar. Organización Nacional de Ciegos Españo- les (ONCE). Madrid: Studios; 2004. p. 135-192. [03] DEAFBLIND INTERNATIONAL – Melhores Pautas no atendimento as pessoas com surdocegueira. Lisboa – Portugal, 1999 p. 1. [04] Viñas PG. Consideraciones sobre comunicación y lenguaje en la intervención con niños sordociegos. In: Tercer Senti do. Revista sobre Sordocegueira. Madrid: ONCE, 1999. p. 31 [05] Comitê de Ajudas Técnicas. Tecnologia Assisti va. Brasília: CORDE, 2009. No prelo. [06] Lavinsky J et al. Síndrome de Bardet-Biedl - Relato de dois casos. Disponível em htt p://www.abonet.com.br/abo/665r/rc665_03.htm. Acesso em: ago.2010. caminhos para inclusão.indd 68caminhos para inclusão.indd 68 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PARA COMPREENSÃO DE REPERTÓRIOS ACADÊMICOS E COMPORTAMENTOS CLINICAMENTE RELEVANTES Mariana Miccione1, Grauben Assis2 INTRODUÇÃO A Análise do Comportamento enquanto disciplina cientí fi ca tem investi gado sistemati camente as variáveis envolvidas no processo de Ensino-Aprendizagem de repertórios acadêmicos. Mais especifi camente, a área de estudo que conduz pesquisas experimentais pautadas no para- digma de relações de equivalência entre estí mulos tem mostrado impor- tantes resultados sobre o desempenho de indivíduos que apresentam limitações na linguagem ou algum ti po de atraso no desenvolvimento cogniti vo. O objeti vo deste trabalho foi identi fi car e relatar um conjunto de variáveis relevantes descritas na literatura nessa área do conhecimento. O’Donnel e Saunders [1] descreveram essas contribuições por meio de um trabalho de revisão no qual destacaram que o estudo das Relações de Equivalência exibidas por esse ti po de população forneceu informa- ções de relevância tanto práti ca quanto teórica. As contribuições práti cas são concernentes à produção de resultados positi vos em testes de equi- valência. Já as teóricas, dizem respeito à discussão pautada na necessi- dade de haver ou não um repertório linguísti co estabelecido como um pré-requisito para a constatação desses resultados. Um trabalho pioneiro de Sidman [2] demonstrou a compreensão rudimentar de leitura de 20 palavras por adultos com atraso no desen- 1 Psicóloga, mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela UFPA e doutoranda do Programa de Pós- -Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (Bolsista CNPq.), mariana@miccione.com.br 2 Doutor em Psicologia Experimental pela USP, Professor Associado III da UFPA, bolsista de Produtividade em Pesquisa pelo CNPq. ggrauben@gmail.com www.lacc.ufpa.br caminhos para inclusão.indd 69caminhos para inclusão.indd 69 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 70 volvimento cogniti vo. Um procedimento inicial de verifi cação de reper- tório constatou que os parti cipantes já apresentavam a relação palavra falada–fi gura correspondente, e não apresentavam as relações palavra impressa–fi gura correspondente e palavra falada–palavra impressa. Dessa forma, conduziu-se o ensino da relação palavra falada–palavra impressa. Após essa fase, os parti cipantes demonstraram as relações palavra impressa–fi gura correspondente e vice-versa. Esses resultados indicaram que os parti cipantes estabeleceram novas relações entre estí mulos que não foram correlacionados durante a fase de ensino, ou seja, demons- traram que os parti cipantes aprenderam mais sobre relações comporta- mentais que foram ensinadas diretamente. Quase 10 anos após esse trabalho, Sidman e Tailby [3] organizaram e formalizaram um conjunto de testes que possibilitou, de forma mais sistemáti ca, verifi car empiricamente as relações entre estí mulos equiva- lentes. De acordo com esses autores, sob esse ti po de aprendizagem rela- cional estariam subjacentes algumas propriedades essenciais que, uma vez documentadas, traduziriam a intercambialidade entre os estí mulos arbitrariamente relacionados, isto é, o paradigma de equivalência de es- tí mulos tem sido descrito a parti r da noção analíti co-comportamental de classe de estí mulos no qual uma classe de estí mulos equivalentes pode ser formada quando dois ou mais estí mulos tornam-se substi tuíveis no controle de um mesmo comportamento, podendo haver similaridades fí sicas ou não entre eles. Portanto, a equivalência seria um ti po especial de classe defi nida pelas propriedades matemáti cas da Refl exividade, Simetria e Transiti vi- dade. A primeira propriedade prediz que um estí mulo pode ser relaciona- do com ele mesmo e, por isso, demonstra uma relação de identi dade. A simetria é demonstrada quando os estí mulos-modelo e comparação são reversíveis funcionalmente entre si, ou seja, mudam de lugar. Por últi mo, a transiti vidade é demonstrada quando duas relações entre estí mulos comparti lham um estí mulo comum e, por isso, derivam numa nova rela- ção. Segundo esse paradigma, a relação condicional que apresenta toda essa propriedade pode ser chamada de Relação de Equivalência. caminhos para inclusão.indd 70caminhos para inclusão.indd 70 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 Caminhos da INCLUSÃO | 71 A formulação descrita por Sidman e Tailby [3] tem sido recorren- temente empregada para se descrever o ti po de relação de controle que subsiste nos comportamentos mais complexos. O diferencial dessa análise pousa na compreensão do fenômeno por meio de conti ngên- cias de reforçamento [4], em oposição às explicações mentalistas [5]. A questão que se coloca é como diferentes organismos podem responder a eventos fi sicamente diferentes como se fossem iguais, principalmen- te aqueles que nunca foram relacionados? A presença da linguagem seria um pré-requisito na possibilidade de demonstração derelações de equivalência em organismos não humanos ou em pessoas com re- pertório verbal mínimo? Sobre essas questões O’Donnel e Saunders [1] afi rmam que dados positi vos obti dos em estudos realizados em organismos com essa carac- terização, sugerem não haver uma relação funcional entre o ti po de po- pulação investi gada e o potencial produti vo dos procedimentos. Dizem ainda que esses resultados trazem importantes contribuições para essa área de interesse, pois a limitação verbal do parti cipante propicia uma interpretação mais fi dedigna de seus desempenhos observados nos tes- tes de equivalência. Portanto, a adequação dessa análise possibilita o de- senvolvimento de diferentes estudos que visam investi gar os efeitos de diferentes variáveis sobre a instalação desse ti po de repertório, uma vez que o conceito de equivalência é central para a compreensão de compor- tamentos simbólicos e sua relação com a linguagem e a cognição [6]. Alguns autores [1] realizaram um trabalho de revisão dessa área que contemplou aquelas que contaram com a parti cipação de indivíduos atí picos, isto é, pessoas com algum nível de atraso no desenvolvimento e/ou limitações na linguagem. Os autores objeti varam: i) analisar criti - camente a literatura acerca da discussão da nomeação; ii) determinar se a literatura tem ocultado os resultados dos indivíduos que falharam em demonstrar equivalência; e iii) verifi car se a literatura analisou es- sas falhas ou se apresentou possibilidades para produzir desempenhos emergentes que defi nem as relações de equivalência em indivíduos que não as apresentaram. Primeiramente, compilou-se um conjunto de 20 trabalhos nos quais parti ciparam 55 indivíduos. Em seguida, questões concernentes à: i) caracterização do parti cipante: descrição adequada das habilida- caminhos para inclusão.indd 71caminhos para inclusão.indd 71 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 72 des linguísti cas, história pré-experimental, medida do nível de atraso no desenvolvimento a parti r de instrumentos validados e uso de medica- mentos; ii) natureza dos procedimentos empregados: instalação de repertó- rios já presentes ou não, ensino das relações exclusivamente dentro do contexto experimental e relações entre estí mulos já conhecidos; iii) resultados obti dos nos testes devidamente investi gados e regis- trados. De maneira geral, a análise das informações coletadas apontou, sobretudo, para a necessidade de um melhor registro de dados sobre a caracterização dos parti cipantes e melhor controle das variáveis manipu- ladas durante as fases de ensino. Defi ciência essa que, uma vez atendida, favoreceria o desenvolvimento de estudos futuros em pessoas com atra- so no desenvolvimento. Adicionalmente a isso, os autores discuti ram os resultados obti dos nos testes de equivalência valendo-se das possíveis implicações teóricas e práti cas resultantes. Não obstante a necessidade de se conduzir estu- dos adicionais devido a pouca produção constatada, a acurácia superior a 90% ati ngida no decorrer dos testes por mais da metade dos parti ci- pantes dos estudos questi onaria a função da linguagem sobre esses de- sempenhos [7]. As questões práti cas estariam na possibilidade de uti lizar os testes de equivalência em ambientes aplicados por meio de testes de compre- ensão entre símbolos e seus referentes em sistemas de comunicação al- ternati va, portanto, uma importante ferramenta para o estudo do desen- volvimento da linguagem. Além do paradigma descrito por Sidman e Tailby [3], pesquisas so- bre as relações entre estí mulos equivalentes têm sido realizadas a parti r do estudo de sequências comportamentais em uma área nomeada de Encadeamento [8, 9, 10]. Entretanto, a relação comportamental identi - fi cada em sequências apresentadas na ausência dos elos não pode ser descrita em termos de uma simples cadeia de respostas [11]. Nesse contexto, alguns estudos têm buscado observar como orga- nismos podem responder a estí mulos em sequência sem que esses estí - mulos tenham sido relacionados previamente. Para tanto, o paradigma caminhos para inclusão.indd 72caminhos para inclusão.indd 72 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 Caminhos da INCLUSÃO | 73 de relações ordinais proposto e documentado por Green, Stromer, e Ma- ckay [11] tem sido usado para analisar o efeito de um conjunto de variá- veis de procedimentos de ensino sobre relações ordinais em diferentes populações. A proposta desses autores baseou-se no exame da adequação das noções de cadeia simples e discriminação condicional sobre os desempe- nhos engendrados a parti r de conti ngências que estabelecem a produção de sequências. De acordo com os autores [11], as relações entre os estí - mulos de uma mesma sequência e entre diferentes sequências em con- ti ngências tríplice de reforçamento poderiam ser documentadas a parti r da realização de testes comportamentais que efeti vassem as proprieda- des defi nidoras de uma relação de ordem: irrefl exividade, assimetria, transiti vidade e conecti vidade. Considera-se uma relação ordinal como irrefl exiva aquela que não se mostra refl exiva, isto é, na qual um elemento não pode ser seguido por ele mesmo. Portanto, a relação A1ÆA1 não é verdadeira. A proprie- dade da assimetria postula que uma relação ordinal é unidirecional; logo, A2ÆA3 é uma relação verdadeira, mas o oposto A3ÆA2 não. A transiti vidade é observada quando dois pares de estí mulos ad- jacentes dentro de uma série relacionam-se e derivam num terceiro par não adjacente; assim, A2ÆA3 e A3ÆA4, então A2ÆA4 é correta, na au- sência do A3. Finalmente, uma relação apresenta a propriedade de conecti vida- de se seus elementos relacionarem-se aos pares em todas as prováveis combinações; se A1ÆA2ÆA3, então A1ÆA2, A1ÆA3 e A2ÆA3. As relações investi gadas têm sido conduzidas sem reforçamento di- ferencial e com base nas relações ensinadas, consisti ndo na verifi cação da recombinação de estí mulos positi vamente relacionados em conti n- gências Tríplice de Reforçamento. O modelo comportamental para sequências é basicamente uma expansão da proposta de Sidman e Tailby [3] sobre relações entre estí - mulos em classes equivalentes [12, 4]. Tal modelo fornece uma estratégia para o exame da interação entre equivalência e relações ordinais quando leva à ampliação de repertórios comportamentais que ocorrem em con- dições apropriadas. Dessa forma, a formação de uma classe ordinal ocor- re quando, pelo menos, duas sequências independentes são ensinadas caminhos para inclusão.indd 73caminhos para inclusão.indd 73 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 74 e os estí mulos de cada sequência tornam-se substi tuíveis em uma nova sequência. A ordem de apresentação dos estí mulos torna-se o principal exer- cício sobre a formação das classes de primeiros, segundos, terceiros, etc. Os procedimentos de produção de sequência consistem na apresentação simultânea de dois ou mais estí mulos visuais arbitrários em conti ngên- cias de reforçamento que requerem respostas de ordená-los em sequên- cia, independentemente da sua posição espacial. Em situações de controle experimental, muitos estudos sobre a produção de sequências têm sido realizados pelos pesquisadores do Laboratório de Análise do Comportamento e Cognição (LACC), da Uni- versidade Federal do Pará (www.lacc.ufpa.br), com o objeti vo de com- preender como repertórios sob controle da ordem são estabelecidos e manti dos. Por exemplo, Nunes e Assis [13] investi garam a combinação de dois procedimentos sobre o ensino de classes ordinais em indivíduos com atraso no desenvolvimento cogniti vo. O objeti vo da pesquisa foi verifi car se classes ordinais poderiam emergir após o ensino por emparelhamento arbitrário e de produção de sequência. Dessa forma, por meiodo primei- ro ti po de procedimento, três parti cipantes foram expostos a estí mulos visuais de formas não representacionais indicadoras de numerosidade (conjunto A), aos numerais correspondentes (conjunto B) e aos seus no- mes escritos (conjunto C). Após o ensino das relações AB/AC testou-se a emergência de três classes de equivalência. Posteriormente, foi ensinado, aos mesmos par- ti cipantes, o encadeamento de respostas com estí mulos de um dos con- juntos (A1→A2→A3) e verifi cada a emergência de sequências não ensi- nadas (isto é, B1→B2→B3 e C1→C2→C3). Em seguida, testes de conecti vidade foram conduzidos com o obje- ti vo de avaliar a formação de classes ordinais, como A1→B2→C3. Por fi m, testes de generalização também foram aplicados para verifi car se a res- posta à numerosidade ocorreria na presença de estí mulos novos, como E1→E2→E3. Os resultados produzidos demonstraram que os parti cipantes responderam às novas sequências prontamente ou com emergência gra- dual, mostrando ser um procedimento igualmente efi ciente na transferên- cia de funções ordinais em pessoas com atraso no desenvolvimento. caminhos para inclusão.indd 74caminhos para inclusão.indd 74 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 Outros estudos [14, 15, 16] também investi garam a produção de equivalência sequencial com base na análise experimental das relações ordinais em indivíduos com atraso no desenvolvimento cogniti vo. Apli- cando-se, de forma isolada ou combinada, os procedimentos de ensino por encadeamento, por pareamento com o modelo e por sobreposição de estí mulos, os pesquisadores avaliaram o desempenho ordinal emer- gente relati vo ao controle de estí mulos visuais: numéricos, formas não representacionais e fi guras geométricas. Um exemplo específi co e práti co de sequências comportamentais são as roti nas que estabelecemos no dia a dia. É comum nos engajarmos em ati vidades que requerem que emitamos mais de uma resposta isola- da. Por exemplo, o comportamento de “pegar um ônibus” envolve, no mínimo, duas respostas: ir até o ponto de ônibus e fazer o sinal. Nessa direção, Spradlin [17] considerou que grande parte do com- portamento humano é consti tuído por sequências comportamentais com variações de extensão e complexidade que, por regularidade, foram estabelecidas pela natureza do ambiente fí sico, por treinamento ou por conti ngências acidentais. Sugere então o termo “roti na” para se referir às sequências repeti das de estí mulos e respostas topografi camente diferen- tes envolvidas em diversas ati vidades que diariamente realizamos, a fi m de alcançarmos uma consequência fi nal. Algumas roti nas, como escovar os dentes, são tão determinadas que se torna possível a previsão de ocorrência de seus componentes (abrir a bisnaga de pasta, apertá-la, colocá-la sobre as cerdas da escova e assim por diante). Esse autor admite a possibilidade de variação na ordem dos comportamentos e substi tuição de alguns componentes en- volvidos numa sequência comportamental por outros que sejam funcio- nalmente equivalentes. Além disso, considera possível a ocorrência de comportamentos que oferecem conti nuidade à roti na caso ela seja inter- rompida por algum moti vo. Outros exemplos práti cos foram ressaltados por Assis, Bapti sta e Nunes [18] e Assis, Miccione e Nunes [19] em dois estudos que polariza- ram algumas descrições comportamentais sobre o responder sequencial através da apresentação de alguns aspectos conceituais referentes à re- lação entre topografi a de controle de estí mulos e aprendizagem relacio- nal. De acordo com os autores, a variável Ordem pode ser identi fi cada Caminhos da INCLUSÃO | 75 caminhos para inclusão.indd 75caminhos para inclusão.indd 75 23/8/2011 11:02:1623/8/2011 11:02:16 76 em eventos nos quais a relação entre antecedentes e consequentes é relevante. Por exemplo: a aprendizagem da classifi cação dos fi lhos pela ordem de nascimento; da discriminação do ontem relati vamente ao hoje e ao amanhã; da classifi cação de pessoas segundo o papel social, políti co ou econômico (função na hierarquia); da formação de classes sintáti cas onde a disposição das palavras em uma frase segue uma determinada ordem, estabelecida pela comunidade verbal para serem compreendidas e da aprendizagem da ascendência e descendência de notas musicais. Em contextos aplicados, Sulzer-Azaroff e Mayer [20], Saunders [21] e Refh eldt [22] destacaram importantes implicações dos estudos que descreveram as variáveis envolvidas no ensino de Ati vidades da Vida Co- ti diana (AVD). Segundo esses autores, o procedimento de encadeamento de respostas confi gura-se como método efi caz para o ensino de tarefas que requerem a emissão de uma sucessão de respostas, principalmente, àquelas em pessoas que apresentam um atraso no desenvolvimento cog- niti vo e/ou motor. Tal importância está na ênfase do método às habilidades já apre- sentadas. De que forma? Primeiramente, por meio de observação, faz-se uma avaliação do potencial e, a parti r de então, acrescenta-se gradual- mente comportamentos ainda não manifestados. Dessa forma, através de reforçamento diferencial é possível fortalecer ou ampliar considera- velmente o repertório dessas pessoas. Inúmeros exemplos de comportamentos que necessitam da emis- são de várias respostas podem ser conceituados como Cadeias de Res- postas: resolução de problemas aritméti cos, preparo de uma comida seguindo os passos da receita, ati vidades desporti vas em geral, dirigir, comporta-se em um restaurante, fazer o nó numa gravata, vesti r-se, es- covar os dentes, fazer a cama, lavar louças, manusear um terminal de autoatendimento bancário, entre outros. Enfi m, é vasto o campo de aplicação desse método de ensino. Para ilustrar, vejamos as possíveis respostas envolvidas no exemplo de com- portar-se em um restaurante: solicita-se o atendimento, faz-se o pedido ao atendente, recebe-se a comida solicitada à mesa, come-se o alimento, solicita-se o fechamento da conta e, certamente, paga-se a conta. Vale ressaltar que cada resposta emiti da estabelece a ocasião para a resposta seguinte e que, portanto, a não ocorrência de alguma delas caminhos para inclusão.indd 76caminhos para inclusão.indd 76 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 Caminhos da INCLUSÃO | 77 poderá comprometer a execução sati sfatória da tarefa. No que concerne ao tratamento de comportamentos considerados inadequados e auto- destruti vos como as estereoti pias, esse procedimento pode ser concebi- do como uma estratégia para reduzir ou eliminar esse ti po de conduta no senti do de facultar a ocorrência de comportamentos alternati vos, favo- recendo, assim, a melhoria na qualidade de vida. Como pôde ser avaliado, pesquisas conduzidas usando princípios comportamentais têm lançado diferentes programas e currículos de ensi- no efi cientes e econômicos que podem ser adaptados e concreti zados fora do contexto experimental, como em escolas e em insti tuições especializa- das. Portanto, têm servido também como um modelo de rede de relações de controle de estí mulos e de desempenhos que servem para a análise de pré-requisitos e para o ensino de comportamentos como leitura e escrita com compreensão e comportamento conceitual numérico [23]. Desse modo, por meio do estudo sistemáti co das variáveis circuns- critas no processo de Ensino-Aprendizagem, a análise do comportamento, ao longo de várias décadas, tem demonstrado ser uma disciplina relevante na compreensão de comportamentos complexos, especialmente aqueles envolvidos com a leitura, a matemáti ca e clinicamente relevantes [24]. REFERÊNCIAS [1] O’Donnel J, Saunders KJ. Equivalence relati ons in individuals with language limita- ti ons and Mental retardati on. J Exp Anal Behav. 2003 jul; 80(1): 131-157. [2] Sidman M. Readingand auditory-visual equivalences. J Speech Lang Hear Res. 1971; 14: 5-13. [3] Sidman M, Tailby W. Conditi onal discriminati on vs. matching to sample: An expan- sion of the testi ng paradigm.J Exp Anal Behav.1982; 37: 5-22. [4] Sidman M. Equivalence relati ons and the reinforcement conti ngency. J Exp Anal Behav. 2000 jul; 74(1): 127-146. [5]Sidman M. Functi onal analysis of emergent verbal classes. In: Thompson T, Zeiler MD. Analysis and integrati on of Behavior Units. Hillsdale (NY): Erlbaum; 1986. p. 213-245. [6] de Rose JC. Classes de estí mulos: Implicações para uma análise comportamental da cognição. Psic.:Teor. ePesq.1993; 9: 283-303. [7] Horne PJ, LoweCF. On the origins of naming and other symbolic behavior. J Exp Anal Behav. 1996 jan; 65(1): 185–241. [8] Catania AC. Aprendizagem: Comportamento, linguagem e cognição (Souza D, Trad.). caminhos para inclusão.indd 77caminhos para inclusão.indd 77 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 78 4ª ed. Porto Alegre: Ed. ArtesMédicas; 1999. [9] Kelleher RT. Chaining and conditi oned reinforcement. In: Honig WK. Operant beha- vior: areas of research and applicati on. New York: Ed. Appleton-Century-Croft s; 1966. p.160-212. [10] Skinner BF. Ciência e comportamentohumano (Todorov JC, Azzi R. Trad.). 11ª.ed. São Paulo: Ed. Marti ns Fontes; 2003. [11] GreenG, StromerR, MackayH. Relati onal learning in sti mulus sequences. Psychol Rec. 1993; 43. p. 599-616. [12] Sidman M. Equivalence relati ons and behavior: A research story. Boston: Ed. Au- thors Cooperati ve; 1994. [13] Nunes AL, AssisGJ. Emergência de classes ordinais após o ensino de relações numé- ricas. Rev. Brasileira Análise Comport. 2006; 2 (2): 209-219. [14] Assis GJ, Sampaio ME. Efeitos de dois procedimentos de ensino para formação de classes sequenciais. Interação Psicol. 2003; 7(2): 52-63. [15] Sampaio ME, Assis GJ. Equivalência de estí mulos sequenciais em portadores de necessidades educacionais especiais. Acta Comport. 2005; 13(2): 111-143. [16] Souza RD, Assis GJ. Emergência de relações numéricas em crianças surdas. Psic.: Teor. e Pesq. 2005; 21(3): 297-308. [17] Spradlin JE. Roti nas: Implicações para a vida e para o ensino. Temas psicol. 1999; 7: 223-234. [18] Assis GJ, Bapti sta MQ, Nunes AL. Formação de sequências: aspectos conceituais e metodológicos. Interação Psicol. 2009; 13(2): 215-227. [19] Assis GJ, Miccione M, Nunes AL. Da produção de sequências comportamentais à equivalência de estí mulos sequenciais. In: Carmo JS, Prado OS (Orgs.). Relações simbóli- cas e aprendizagem da matemáti ca. Santo André, SP: Ed. ESETec; 2010. p. 69-88. [20] Sulzer-Azaroff B, Mayer GR. Teaching new behavior: chaining. Behavior Analysis for Lasti ng Change. Orlando, Flórida: Ed. Harcount Brace College Publishers; 1991. p. 337-349. [21] Saunders RR. The possible role of suported routi nes in the sti mulus controlof aber- rant behavior: A competence modelo f treatment. In: Goyos C, Almeida MA, Souza D. (Orgs.). Temas em educação especial. São Carlos, São Paulo: Ed. UFSCar; 1996. p. 49- 72. [22] Refh eldt R. Chaining. In: Hersen M, Sledge W. (Eds.). Encyclopedia of Psychothera- py. Nova York: Ed. Academic Press; 2002. p. 365-369. [23] Hubner MM, Marinotti M. Análise do comportamento para a educação: Contribui- ções recentes. Santo André: Ed. ESETec; 2004. [24] Miccione M, Assis GJ, Costa TD. Variáveis de controle sobre o responder ordinal: revisitando estudos empíricos. Rev. Perspecti vas Análise Comport. 2010; 1(2): 130-148. caminhos para inclusão.indd 78caminhos para inclusão.indd 78 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 ESTABELECENDO COMPORTAMENTO TEXTUAL EM FUNÇÃO DA ORDENAÇÃO DE LETRAS Jaci Augusta Neves de Souza1, Grauben José Alves Assis2 INTRODUÇÃO Grande parte do repertório comportamental dos organismos ocor- re ti picamente em uma rápida sucessão temporal de respostas individu- ais, tão bem integradas entre si que o padrão resultante é avaliado, tanto pelo indivíduo que está executando quanto pelo observador, como uma unidade. Um comportamento, entretanto, não é uma unidade isolada, mas um fl uxo contí nuo de relações entre o organismo e o ambiente. As cadeias comportamentais têm sido um tópico explorado nos manuais de Psicologia e merecido a atenção dos pesquisadores interessados em identi fi car e analisar o que acontece durante a aquisição dessas suces- sões de respostas [1]. Procedimentos para avaliar a natureza das relações entre estí mulos que geram comportamentos sequenciais têm sido propostos [2]. A tare- fa experimental proposta seria organizar formas não representacionais, introduzidas gradualmente para avaliar se os parti cipantes seriam capa- zes de produzir uma sequência sem consequência diferencial. Resulta- dos consistentes com a linha de base programada pela experimentadora sugerem o estabelecimento de uma relação de ordem entre os estí mu- los, coerentes com a posição que esses estí mulos ocuparam no treino original. Testes avaliam então se os estí mulos da mesma posição ordinal, de duas ou mais sequências disti ntas, são substi tuíveis entre si, forman- do novas classes com os estí mulos que ocuparam a mesma posição em sequências treinadas separadamente. Esta abordagem mostra-se uma estratégia promissora nas pesquisas que ora se desenvolvem para insta- lar as habilidades necessárias à emergência de repertórios sequenciais, como a leitura de frases ou sentenças gramati calmente corretas. 1 Psicóloga, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento da UFPA, docente no Centro Universitário do Norte (UNINORTE/LAUREATE). jaci@uninorte.com.br 2 Doutor em Psicologia Experimental pela USP, professor Associado III da UFPA, bolsista de Produtividade em Pesquisa pelo CNPq. ggrauben@gmail.comwww.lacc.ufpa.br caminhos para inclusão.indd 79caminhos para inclusão.indd 79 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 80 Como exemplo disso, Assis e Sampaio [3] planejaram um estudo com estí mulos usuais (aves e mamíferos) pertencentes ao coti diano dos alunos, com o objeti vo de explicitar a formação de repertórios de or- denação. Os parti cipantes foram alunos regularmente matriculados na APAE Belém, com atraso no desenvolvimento cogniti vo, divididos em dois grupos experimentais e expostos a duas condições experimentais enquanto sujeito único. Os resultados mostraram diferenças relevantes entre os dois grupos e a familiaridade dos estí mulos foi apontada como um fator que contribuiu para esses resultados. Com objeti vo de eliminar o efeito da familiaridade dos estí mulos sobre relações ordinais, Souza e Assis [4] uti lizaram várias formas não re- presentacionais. Alunos com atraso no desenvolvimento cogniti vo, tam- bém da APAE Belém, responderam com base em uma ordem (primeira, segunda, terceira, etc.) defi nida arbitrariamente pela experimentadora. Duas táti cas de ensino foram programadas para avaliar o efeito dos procedimentos sobre o desempenho: ensino por encadeamento e por sobreposição de estí mulos. Os resultados obti dos mostraram a superiori- dade do encadeamento sobre a sobreposição dos estí mulos para a insta- lação de repertórios acadêmicos, especialmente a leitura. Procedimentos de ensino que envolvem a formação de sequências podem se consti tuir em uma ferramenta efi ciente para ensinar compor- tamentos humanos complexos. Os estudos em andamento nessa linha de pesquisa pelo Laboratório de Análise do Comportamento e Cognição (www.lacc.ufpa.br) podem resultar no desenvolvimento de métodos efi cazes para o ensino de frases e sentenças, podendo vir a contribuir também para o desenvolvimento de procedimentos que facilitem a ins- talação de comportamentos socialmente relevantes para pessoas com necessidades educacionais especiais. O objeti vo deste estudo foi verificar o efeito de um procedimento de ensino por encadeamento de respostas para apresentar formas não representacionais e instalar os pré-requisitos do comportamento textual (ordenação de símbolos do alfabeto para formar palavras dissílabas) em alunos que apresentavam atraso no desenvolvimento cogniti vo. caminhos para inclusão.indd 80caminhos para inclusão.indd 80 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 Caminhos da INCLUSÃO | 81 MÉTODO Parti cipantes Parti ciparam do estudo 2 alunos da APAE que frequentavam a tur- ma de alfabeti zação para jovens. Os alunos foram avaliados pelo PPTV-III [5], teste que revela o domínio de vocabulário. Um parti cipante (P1) com idade cronológica de 22 anos e 5 meses apresentou conversação sofi sti - cada, mostrando-se capaz de construir frases na formulação de questões concernentes à ati vidade proposta. O outro (P2), com idade cronológica de 16 anos e 8 meses, apresentou conversação simplifi cada, limitando-se a responder com frases curtas as questões formuladas pela pesquisadora. Ambiente experimental e equipamentos O estudo foi conduzido numa sala de uma insti tuição especializada (APAE) sediada em Manaus, medindo aproximadamente 6 m2, com rela- ti vo isolamento acústi co e climati zada. Um microcomputador IBM PENTIUM II com um soft ware (REL 3.0 for Windows) especialmente desenvolvido para a pesquisa foi usado. O programa foi preparado para controlar e registrar os dados comporta- mentais, apresentar os estí mulos em tentati vas randomizadas (Figura 3) e gerar relatórios das respostas apresentadas pelo parti cipante. Figura 1. Formas não representacionais caminhos para inclusão.indd 81caminhos para inclusão.indd 81 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 82 Palavras de Ensino BOCA MALA PATO Palavras de Generalização BOTO MATO CAMA BOLA CAPA TOCA Tabela 1. Palavras Dissílabas Estí mulos Os estí mulos foram formas não representacionais, organizadas em três conjuntos denominados “A”, “B” e “C”. Cada conjunto conti nha uma forma não representacional em quatro tamanhos diferentes (ver Figura 1). Testes avaliaram os desempenhos resultantes delineando a formação de três sequências de quatro estí mulos. O desempenho previsto era que os parti cipantes selecionassem os quatro estí mulos, um de cada vez, em ordem do maior para o menor, a parti r da substi tuti bilidade entre os es- tí mulos das três sequências ensinadas. Na segunda etapa do estudo foram uti lizadas 9 palavras: 3 durante o ensino e 6 geradas pela recombinação silábica das três originais. A tare- fa era ordenar as letras formando palavras dissílabas (Figura 2). Procedimento geral Inicialmente, foi instalado o repertório de ordenação dos estí mulos com os conjuntos compostos pelas formas não representacionais. Após os testes confi gurarem o estabelecimento das classes ordinais (Figura 4), o parti cipante foi exposto ao conjunto de palavras para a ordenação das letras seguindo o modelo apresentado pela pesquisadora. O estí mulo consti tuído pela palavra impressa foi apresentado para ordenação das letras nos moldes do procedimento de ensino das formas não represen- tacionais, conforme ilustrado pela fi gura 3. caminhos para inclusão.indd 82caminhos para inclusão.indd 82 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 Caminhos da INCLUSÃO | 83 Figura 3. Exemplo de uma Tentati va de Ensino Figura 4. Exemplo de uma tentati va de Teste de substi tuti bilidade Sessões experimentais Cada sessão conti nha uma ou mais tarefas a serem cumpridas pelo parti cipante. Ao início e fi m de cada bloco de sessões, foram aplicados os pré-testes e pós-testes, respecti vamente, visando averiguar o desempenho do aprendiz antes e depois de um conjunto de tarefas. Tanto nos pré-testes caminhos para inclusão.indd 83caminhos para inclusão.indd 83 23/8/2011 11:02:1723/8/2011 11:02:17 84 quanto nos pós-testes, os parti cipantes foram instruídos a ordenar e nome- ar as palavras dissílabas sem nenhum ti po de consequência diferencial. As palavras uti lizadas no procedimento foram divididas em duas categorias: as Palavras de Ensino e Palavras de Generalização (Figura 2). A Linha de Base foi instalada com as três palavras de ensino. Os parti ci- pantes foram ensinados a ordenar as letras seguindo o mesmo procedi- mento de ordenação das formas não representacionais. As palavras de generalização foram usadas para testar a emergência do comportamento textual. Este fenômeno é defi nido pela resposta à palavra impressa, em- bora não se caracterize, ainda, como leitura com compreensão. RESULTADOS Os resultados mostraram uma economia de ensino para ordenar as letras na formação das palavras dissílabas quando o aluno foi primeiro exposto ao ensino uti lizando as formas não representacionais. Foi de- monstrada a transferência de funções ordinais para novos estí mulos, ampliando consideravelmente o potencial do procedimento de ensino através de generalizações das respostas ensinadas para novas respostas. DISCUSSÃO O presente trabalho buscou estabelecer os pré-requisitos para instalar comportamentos de leitura para alunos que apresentam ne- cessidades educacionais especiais. Para o estudo aqui descrito, duas di- mensões do estí mulo foram críti cas no estabelecimento dos repertórios planejados. O tamanho dos estí mulos que variou em quatro níveis (do maior ao menor). Esse treino discriminati vo foi a base para a formação de diferentes classes de estí mulos ou formação de conceitos. E a posição que cada estí mulo ocupou na sequência ensinada, cuja conti ngência na tarefa experimental exigiu o agrupamento dos estí mulos por atributos que caracterizam conceitos de ordem (primeiro, segundo, terceiro, etc.), foi sufi ciente para apresentação desse desempenho pelos parti cipantes. Portanto, classes de estí mulos podem ser estabelecidas a parti r de relações arbitrárias entre estí mulos que não guardam semelhança en- tre si, pois comparti lham a mesma função discriminati va. Para que isso seja evidenciado, é necessário verifi car os efeitos de variáveis sobre um caminhos para inclusão.indd 84caminhos para inclusão.indd 84 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 Caminhos da INCLUSÃO | 85 membro da classe em relação aos demais membros. Quando as funções de um membro transferem-se para qualquer outro, dizemos que eles são funcionalmente equivalentes. Nas classes ordinais, as funções que se transferem são as funções de ordem (primeiro, segundo, terceiro e assim por diante) que um estí mulo ocupou, sendo exercida por outro que ocupou a mesma posição em sequências diferentes. A transferência de funções ordinais para novos estí mulos foi inves- ti gada neste estudo, ampliando consideravelmente o potencial de pro- cedimentos de ensino através de generalizações. Os testes envolvendo novos conjuntos de estí mulos (letras das palavras geradas pela recom- binação das sílabas) com formas diferentes daquelas que foram ensina- das mostraram que os alunos foram capazes de ordenar, inicialmente do maior para o menor (as formas não representacionais) e, em seguida, pela ordem de apresentação do estí mulo (as letras). Esses resultados com indivíduos que apresentaram repertório acadêmico comprometi do são promissores para subsidiar novos estudos envolvendo comportamento conceitual numérico (numerosidade) ou os pré-requisitos de leitura em ambiente não-informati zado. REFERÊNCIAS [1] Catania AC. Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Porto Alegre: ARTMED; 1999. [2] Green G, Stromer R, Mackay H. Relati onal learning in sti mulus sequences. Psychol Rec. 1993; 43. p.599-616. [3] Assis GJ, Sampaio ME. Efeitos de dois procedimentos de ensino para formação de classes sequenciais. Interação Psicol. 2003; 7(2): 52-63. [4] Souza JA,Assis GJ. Efeito de dois procedimentos de ensino sobre o comportamento de ordenar. Psicol.estud.2005; 10(3): 527-536. [5] Dunn LM, Dunn IM. Peabody Picture Vocabulary Test. Circle Pines, MN: American Guidance Service; 1981. caminhos para inclusão.indd 85caminhos para inclusão.indd 85 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 caminhos para inclusão.indd 86caminhos para inclusão.indd 86 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 ACESSIBILIDADE NA EDUCAÇÃO ͵ VISUAL GD Marília Matos Gonçalves1, Sebastião Miraglia2, Vania Ribas Ulbricht3, Claudia Mara Scudelari de Macedo4, Josiane Wanderlinde Vieira5 APRESENTAÇÃO No Brasil, de acordo com informações disponíveis pelo Insti tuto Brasileiro de Geografi a e Estatí sti ca (IBGE), ano 2000, haviam 24,5 mi- lhões de brasileiros portadores de necessidades especiais (14,5% da po- pulação). Estes números tendem a crescer devido a maior expectati va de vida decorrente de melhores condições de saúde da população mundial [1]. Portanto, incluir essas pessoas no processo educacional formal é dar a elas, igualdade de oportunidades. A acessibilidade da Internet caracteriza-se pela fl e- xibilidade da informação e interação relati va ao res- pecti vo suporte de apresentação. Essa fl exibilidade deve permiti r a sua uti lização por pessoas com ne- cessidades especiais, bem como a uti lização em di- ferentes ambientes e situações, e através de vários equipamentos ou navegadores [2]. Já na década de 1990, países como o Canadá, os EUA e a Austrália criaram legislação específi ca para o desenvolvimento de sites acessíveis. Também com o intuito de tornar a web acessível a um maior número de pessoas, levando-a assim a ati ngir um grau máximo de interopera- bilidade, o World Wide Web Consorti oun (W3C) – comitê formado por 1 Professora do Programa de Pós-Graduação em Design e Expressão Gráfi ca da UFSC, marilinhamt@gmail. com 2 Graduando do curso de Design Gráfi co da UFSC, gatiao@gmail.com 3 Professora do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da UFSC, ulbricht@ fl oripa.com.br 4 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da UFSC, claudia. scudelari@gmail.com 5 Professora do Programa de Pós-Graduação em Design e Expressão Gráfi ca da UFSC, wvieira@cce.ufsc.br caminhos para inclusão.indd 87caminhos para inclusão.indd 87 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 88 grandes empresas do ramo criou o Web Accessibility Initi ati ve (WAI), que mantém grupos de trabalho que elaboram diretrizes com o objeti vo de proporcionar a acessibilidade do conteúdo web à pessoas portadoras de necessidades especiais. No Brasil, em 2004, foi elaborado um Modelo de Acessibilidade de Governo Eletrônico com o objeti vo de desenvolver e adaptar conteú- dos federais na internet. Esse modelo atende o Decreto 5.296/2004, que regulamenta as Leis 10.048/2000 e 10.098/2000 as quais estabelecem normas gerais e critérios de inclusão de pessoas portadoras de necessi- dades especiais. A uti lização dos recursos informati zados, obedecendo aos parâme- tros de acessibilidade, fornece aos ambientes da WEB alto grau de usabi- lidade. Considerar Ambientes WEB voltados à aprendizagem um projeto universal é uma necessidade, pois a escola é, por excelência, o ambiente formal de educação brasileira no qual todos os cidadãos brasileiros de 7 a 14 anos, independente de qualquer incapacidade, têm direito de receber ensino de qualidade. A pesquisa apresentada neste arti go tem o intento de adequar o conteúdo de Representação Gráfi ca Espacial para a WEB respeitando os requisitos de acessibilidade6 e uti lizando a construção de objetos de aprendizagem considerados ainda hoje como um conceito novo. O termo objeto educacional (learning object) geral- mente aplica-se a materiais educacionais projetados e construídos em pequenos conjuntos com vistas a maximizar as situações de aprendizagem onde o re- curso pode ser uti lizado. A idéia básica é a de que os objetos sejam como blocos com os quais será cons- truído o contexto de aprendizagem. [3] São característi cas dessa tecnologia a reusabilidade (possibilidade de se uti lizar um mesmo objeto de aprendizagem em diferentes aplicati - vos); adaptabilidade (capacidade de se adaptarem a diferentes ambien- tes de ensino); granularidade (possibilidade de se encapsular o conteúdo em partes); acessibilidade (passível de ser acessado em diferentes plata- formas); durabilidade (pode ser uti lizada independente de alterações e 6 Principalmente aqueles citados pela W3C. caminhos para inclusão.indd 88caminhos para inclusão.indd 88 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 Caminhos da INCLUSÃO | 89 atualizações tecnológicas) e interoperabilidade (atua em diferentes pla- taformas). A Representação Gráfi ca Espacial é uma área do conhecimento, imprescindível para o desenvolvimento da visualização espacial, do pro- fi ssional que irá trabalhar com a relação espaço-forma. Entretanto, por não ser abordada no nível de ensino básico e muito superfi cialmente no ensino médio, é comum que estudantes dos cursos de Engenharias, Arquitetura, Design, Artes e outros, sintam difi culdade em entender a transposição que acontece entre as fi guras do espaço (objetos em geral) e sua representação em duas dimensões. Pesquisas iniciadas por Ulbricht [4 e 5], e com prosseguimento por Gonçalves [6 e 7]; Bulhões [8], Wanderlinde [9], Vanzin [10], entre outros, revelaram que o quadro de repetência nesta área ainda é muito alto e a metodologia uti lizada é, na maioria das vezes, ultrapassada. As pesquisas desenvolvidas viabilizaram uma hipermídia sobre o domínio em questão, denominado VISUAL GD (Figura 1). Entretanto, constatou-se que, mesmo que essa hipermídia tenha sido bem aceita para os estudantes em geral7 foi percebida a necessidade de que esse material se adequasse também aos estudantes com algum ti po de necessidade especial. Figura 1. Tela de conteúdo do Visual GD Assim sendo, procurando resgatar os estudos anteriores, pretende- se desenvolver uma Biblioteca de Objetos de Aprendizagem voltados à 7 O Visual GD foi testado em turmas de Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina [6]. caminhos para inclusão.indd 89caminhos para inclusão.indd 89 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 90 Representação Gráfi ca Espacial com conteúdo acessível e adaptável a di- ferentes plataformas, permiti ndo a reuti lização destes objetos de acordo com o nível do estudante, a especifi cidade do curso e metodologia do professor e que possa ser uti lizada universalmente, isto é, por surdos (in- cluindo no ambiente tradução para LIBRAS), cegos (permiti ndo o uso de leitores de tela), Terceira Idade, entre outros. PROPOSTA A uti lização de TICs no processo Ensino-Aprendizagem presencial e, sobretudo, nos processos de ensino a distância têm contribuído para inúmeras pesquisas na tentati va de se desenvolver ambientes virtuais de aprendizagem que permitam a estruturação de conteúdos didáti cos mais organizados. A Internet permite disponibilizar conteúdos em diferentes formatos (hipertexto, vídeo, animação, etc.). Considerando que todo ambiente hipermídia de aprendizagem respeita o ritmo parti cular de cada aluno no processo de aquisição do conhecimento, optou-se pela escolha do VISUAL GD julgando viável sua transformação em um material que venha interferir positi vamente no aprendizado da GD por alunos com algum ti po de necessidade especial. Como pesquisa que aqui se apresenta, no ensino auxiliado por computador, na tentati va de propor recursos de qualidade aos alunos, pretende-se fazer uso da tecnologia que vem se destacando na criação de material didáti co digital – os objetos de aprendizagem, conceituados por Wiley [11] como sendo “qualquer recursodigital que possa ser uti - lizado para o suporte ao ensino”. Tarouco [2] coloca ainda que o termo objeto educacional (learning object) geralmente aplica-se a materiais educacionais projetados e construídos em pequenos conjuntos com vis- tas a maximizar as situações de aprendizagem onde o recurso pode ser uti lizado. A ideia básica é a de que os objetos sejam como blocos com os quais será construído o contexto de aprendizagem. Uma tentati va de tornar o conteúdo apresentado no visual GD aces- sível é o módulo desti nado a estudantes que apresentam algum grau de surdez. Para tanto, a interface inicial do ambiente (apresentada na fi gura 1) foi alterada. A resolução da tela foi alterada de 640 x 480 pixels para 800 x 600 (resolução de tela suportada pela maioria de monitores web caminhos para inclusão.indd 90caminhos para inclusão.indd 90 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 Caminhos da INCLUSÃO | 91 na atualidade). Essa modifi cação trouxe um ganho de espaço úti l na área de trabalho, que permiti u a inserção do espaço para os vídeos com a ver- são do conteúdo em LIBRAS. As fi guras 2 e 3 e 4 apresentam a interface do Visual GD adequada para LIBRAS. Figura 2. Tela do Visual GD adaptada para surdos. Figura 3. Telas do Visual GD adaptada para surdos (apresentação do conteúdo). caminhos para inclusão.indd 91caminhos para inclusão.indd 91 23/8/2011 11:02:1823/8/2011 11:02:18 92 Figura 4. Telas do Visual GD adaptada para surdos (módulo de ati vidades). A cada início de interpretação, o efeito de “FADE IN” (a imagem parte do preto total até a imagem pura) indica ao usuário que o vídeo está começando. Do mesmo modo no fi nal da interpretação, o efeito de “FADE OUT” (a imagem parte da imagem pura até o preto total) indica o término do vídeo. Figura 5. Efeito “fade in”. Foi permiti da a maximização dos elementos visuais (vídeos, anima- ções, textos e imagens) possibilitando ao usuário uma visão melhor do conteúdo apresentado. Basta que ele clique sobre o item desejado e o conteúdo aparecerá individualmente com sua visualização maximizada na tela, sendo que o mesmo ato faz retornar a tela com as quatro áreas estabelecidas. caminhos para inclusão.indd 92caminhos para inclusão.indd 92 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 Caminhos da INCLUSÃO | 93 CONSIDERAÇÕES FINAIS Há situações-problema que geram incômodo na vida humana e que são traduzidas como obstáculos difí ceis de serem vencidos, no entanto, com a pesquisa que aqui se apresenta (em parte) é possível mostrar que estas situações agregam conhecimento para o alcance de um passo à frente. Conclui-se que, com isso, abrem-se perspecti vas de apoio a presen- ça de alunos que possuam algum ti po de defi ciência em ambientes for- mais de ensino, fazendo com que estes se sintam inseridos de fato em um contexto educacional. Espera-se, assim, que este trabalho sirva de exem- plo moti vador a outros professores e pesquisadores na busca da evolução dos estudos sobre acessibilidade em prol da Educação Inclusiva. REFERÊNCIAS [1] IBGE – Insti tuto Brasileiro de Geografi a e Estatí sti ca [htt p://www.ibge.gov.br]. Acesso em: 17/09/2009. [2] Melo AM, Baranauskas MC. Avaliação de Acessibilidade na Web com a Parti cipação do Usuário. VI Simpósio sobre Fatores Humanos em Sistema Computacionais: Anais do VI Simpósio sobre Fatores Humanos em Sistema Computacionais, 2004 Out 17-20; Curiti ba, Paraná, SC, Brasil; 2004. p. 181 – 184. [3] Tarouco LMR, Fabre MCJM, Tamusiunas FR. Reusabilidade de objetos educacionais. RENOTE, 2003, v. 1, n. 1, fev 2003. [4] Ulbricht VR. Modelagem Cogniti va em vista da Concepção do Módulo Avaliação do Estudante de um Sistema de Ensino Inteligente Auxiliado por Computador para a Ge- ometria Descriti va. [Dissertação] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina, 1992. [5] Ulbricht VR. Modelagem de um ambiente hipermídia de construção do conhecimen- to em Geometria Descriti va. [Tese] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina, 1997. [6] Gonçalves MM. Ambiente Hipermídia como Auxiliar na Aprendizagem de Geometria Descriti va. [Dissertação] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina, 1999. [7] Gonçalves MM. Avaliação das Contribuições da Aplicação do Visual GD em Situação O Ensino da Geometria Descriti va para Alunos Surdos Apoiado em um Ambiente Hiper- mídia de Aprendizagem - Visual GD.Real de Ensino. [Tese] Florianópolis: UFSC - Univer- sidade Federal de Santa Catarina, 2005. [8] Bulhões G. Ambiente Hipermídia para Aprendizagem de Geometria Descriti va: Mó- caminhos para inclusão.indd 93caminhos para inclusão.indd 93 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 94 dulo do Estudo das Posições de Duas Retas entre Si a ser Implementado no Visual GD. Florianópolis: [Dissertação] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catari- na, 2004. [9] Wanderlinde J. [Tese] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina, 2005. [10] Vanzin T. Modelo de Ambiente Hipermídia com Tratamento de Erros apoiado na Teoria da Cognição Situada. [Tese] Florianópolis: UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina, 2005. [11] Wiley DA. Connecti ng learning objects to instructi onal design theory: a defi niti on, a metaphor, and a taxonomy. Utah State University, 2000. caminhos para inclusão.indd 94caminhos para inclusão.indd 94 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 MULTIMÍDIA BIBLIOTECA VIRTUAL INCLUSIVA Hildebrando Esteves Neto1, Ana Irene A. Oliveira2, Anna Karen S. Mendes3, Márcia Hellen S. M. Santos4 Ermelinda N. de M. Melo5, Direlene Ramalho da Silva6, Herika Renally S. Pereira7 INTRODUÇÃO Com a disponibilidade oferecida pela internet, tende-se a deixar as bibliotecas um pouco de lado, pois na internet encontra-se tudo o que é necessário para pesquisas, trabalhos, modelos, relatórios, textos, ideias, resumos, biografi as, imagens, fontes, dicas, obras, linha do tempo e da vida de muitas pessoas, curiosidades, fofocas e atualidades. A internet é também usada como Biblioteca Virtual e gratuita, nela tem-se o necessário para realizar tarefas. As páginas e sites proporcio- nam buscas, pesquisas e as mais atuais informações sobre assuntos e temas de vários campos do conhecimento. Com a expansão da internet e seu uso constante no ambiente esco- lar, a WEB torna-se cada vez mais popular, seja para aprender ou para se diverti r. Mas sempre que há o empenho na busca por material educati vo para fi ns de pesquisa acadêmica, enfrentam-se grandes difi culdades em 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 Membros do Grupo Pesquisa Viver Diferente, mas não desigual, com Certifi cado Institucional CNPq/IFMT. 1 Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Professor Biólogo e Sani- tarista do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso (IFMT). 2Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA), Terapeuta Ocu- pacional da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará e Professora Assistente III, da Universidade do Estado do Pará. 3 Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA), Psicóloga do Núcleo de Atendimento Educacional Especializado aos Transtornos Globais – NATEE, da Secretaria de Estado de Educação do Pará. 4 Especialista em Análise de Sistemas (UFPA), Professora da Universidade do Estado do Pará (UEPA) 5 Professora do Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA - Campus Belém), Assessora de Projetos de Inclusão – APRIN – (IFPA) 6 Técnica Administrativa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso (IFMT). Campus Cuiabá. 7Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Agrícola (UFRRJ); Técnica em Assuntos Educa- cionais – Coordenadora do Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais – NAPNE. IFMT - Campus Cáceres. caminhos para inclusão.indd 95caminhos para inclusão.indd 95 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 96 localizar o material necessário, pois a internet, em toda a sua grandeza estrutural globalizada, dispõe desse material de forma não centralizada e não indexada, e geralmente em formato não acessível, principalmente às pessoas com defi ciência. Portanto, a criação de uma biblioteca virtual que seja acessível às pessoas com defi ciência poderá contribuir, com agilidade e efi ciência, na busca de materiais, apresentados através de variadas mídias com áudio e/ou video, digitalização, catalogação, indexação e centralização, dispo- níveis no servidor de dados do IFMT-Campus Cuiabá. De acordo com o pronunciamento do Presidente da Índia, Avul Pakir Jainulabdeen Abdul Kalam, “Uma biblioteca digital é onde o passado en- contra o presente e cria o futuro” [1]. E esse material pode e deve estar acessível a pessoas com defi ciência e/ou necessidades específi cas [2]. OBJETIVOS Pretende-se criar uma biblioteca virtual inclusiva acessível, vincula- da aos Núcleos de Atendimento as Pessoas com Necessidades Específi cas (NAPNEs), com obras relevantes e materiais de interesse didáti co-pedagó- gico, disponibilizadas ao público em formato digital e que atenda aos estu- dantes com necessidades educacionais específi cas matriculados nos Insti - tutos Federais e redes parceiras – Universidade do Estado do Pará (UEPA) e Coordenadoria de Educação Especial do Estado do Pará (COEES). A parti r da viabilidade deste projeto, busca-se possibilitar às biblio- tecas dos campi do IFMT a consulta desse material, dando preferência às pessoas com defi ciência e que possam acessar conteúdos em áudio, digi- talizados e vídeos educati vos legendados ou com audiodescrição. Busca- se, também, conscienti zar e esti mular a atuação/parti cipação de servido- res (professores e técnicos administrati vos) na execução do projeto. Proporcionar à pessoa com necessidades educacionais específi cas uma maior independência, qualidade de vida e inclusão social, através da ampliação da comunicação em meio digital, mobilidade, controle do seu ambiente, habilidades de seu aprendizado, é a primazia deste projeto. REVISÃO DE LITERATURA A implementação de políti cas inclusivas que pretendam ser efeti - vas e duradouras deve incidir sobre a rede de relações que se materiali- caminhos para inclusão.indd 96caminhos para inclusão.indd 96 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 Caminhos da INCLUSÃO | 97 zam por meio das insti tuições, já que as práti cas discriminatórias que elas produzem extrapolam em muito os muros e regulamentos dos territórios organizacionais que as evidenciam [3]. A agitação mundial pela inclusão, como uma ação políti ca, cultural, social e pedagógica, trouxe a tona à defesa do direito de todos os alunos pertencerem a uma mesma escola, aprendendo e parti cipando juntos sem nenhum ti po de discriminação. De acordo com Mantoan [4], a sociedade inclusiva é aquela que tem por objeti vo o de oferecer oportunidades iguais para que cada pes- soa seja autônoma e autodeterminada. Uma sociedade aberta a todos, que esti mula a parti cipação de cada um, aprecia as diferentes experiên- cias humanas e reconhece o potencial de todo cidadão. As Insti tuições buscam a formatação de um ensino que venha aten- der os anseios da sociedade em geral, e é sua obrigação procurar co- nhecer a sociedade local para entender esses anseios. Faz-se necessário então ouvir e compreender as pessoas e atender ao apelo dos defi cien- tes quando dizem: “Nada sobre nós sem nós” [5]. Sob essa perspecti va, observa-se que existe a necessidade de preencher essa lacuna. O MEC/SETEC, por meio da Diretoria de Políti cas e Arti culação Ins- ti tucional, desenvolve o Programa TECNEP (Programa Educação, Tecno- logia e Profi ssionalização para Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais), e busca intervir de forma efeti va nessa realidade instrumen- talizando a Rede Federal de Educação Profi ssional e Tecnológica para garanti r o acesso, permanência e conclusão dessa clientela em cursos oferecidos pela Rede. Saliente-se o papel de destaque das Insti tuições Federais como um espaço promissor na viabilização de políti cas públicas de inclusão de alu- nos com necessidades educacionais específi cas. De acordo com o Censo Escolar do INEP [6], 46,3% dos alunos com necessidades educacionais especiais estão matriculados no ensino regu- lar (Estudantes com necessidades educacionais especiais são aqueles ci- tados na lei educacional brasileira para se referir às pessoas com alguma defi ciência, mas também incluindo os superdotados – pessoas com altas habilidades e os Transtornos Globais do Desenvolvimento). Perini [7] nos diz que a inclusão não é uma questão de solidarie- dade, mas um Direito. Aprender é uma ação humana que pode ser rea- caminhos para inclusão.indd 97caminhos para inclusão.indd 97 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 98 lizada por todos, cabe à escola fazer sua parte para que a sociedade não conti nue promovendo a exclusão em suas formas mais suti s e cruéis. Assim, a criação da Biblioteca Virtual Inclusiva ora proposta, além de identi fi car as representações sociais envolvidas, surge para contri- buir também no fomento às tecnologias para a efeti vação da inclusão educacional. Tendo como pano de fundo os Núcleos de Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais Especifi cas (NAPNE) dos Insti tu- tos Federais, possibilitará, na área da Educação Inclusiva, a ampliação do Programa TECNEP. Portanto, é uma ação oportuna para que as insti tui- ções de ensino sejam benefi ciadas com o atendimento especializado na educação inclusiva. O “Portal Biblioteca Virtual Inclusiva”, a ser lançado em outubro de 2010 (com um acervo inicial de 200 obras), propõe o comparti lhamento de conhecimentos de forma equânime, colocando à disposição de todos os usuários defi cientes dos insti tutos uma biblioteca virtual que deverá se consti tuir em referência para professores, alunos, pesquisadores, para a população defi ciente e para as pessoas que lidam com ela. Esse portal se consti tuirá em um ambiente virtual que permiti rá a coleta, integração, preservação e o comparti lhamento de conhecimentos, sendo seu principal objeti vo promover o amplo acesso às obras literárias, artí sti cas e cientí fi cas (na forma de textos, sons, imagens e vídeos), já em domínio público ou que tenham a sua divulgação devidamente autoriza- da ou permiti da de acordo com a lei de direitos autorais, que consti tuem o patrimônio cultural brasileiro e universal. Desta forma, também pretende contribuir para o desenvolvimento da educação e da cultura, assim como poderá aprimorar a construção da consciência social, da cidadania e da democracia no Brasil. Segundo Fernando Haddad [8], “ao disponibilizar informações e conhecimentos de forma livre e gratuita, busca incenti var o aprendizado, a inovação e a cooperação entre os geradores de conteúdo e seus usuá- rios, ao mesmo tempo em que também pretende induzir uma ampla dis- cussão sobre as legislações relacionadas aos direitos autorais – de modo que a ‘preservação de certos direitos incenti ve outros usos’ –, e haja uma adequação aos novos paradigmas de mudança tecnológica, da produção e do uso de conhecimentos.” caminhos para inclusão.indd 98caminhos para inclusão.indd 98 23/8/2011 11:02:1923/8/2011 11:02:19 Caminhos da INCLUSÃO | 99 PASSOS METODOLÓGICOS Os parti cipantes deste projeto são os estudantes do IFMT, demais Insti tutos e redes parceiras. Oprojeto será desenvolvido em duas dimen- sões estruturantes, assim compreendidas. Primeiramente o desenvol- vimento de estratégias tecno-pedagógicas que envolvem as orientação sobre a pesquisa para usuários PNE’s, para torná-los co-parti cipes desta ação, cujo efeito favorece a dimensão seguinte, que é a busca pela cida- dania ati va de pessoas com necessidades específi cas [9]. Adotar-se-á os princípios metodológicos do sócio-construti vismo [10], cuja ação favorecerá aos usuários condições de desenvolver os co- nhecimentos necessários para o seu projeto de vida a parti r da vivência de valores, refl exões, trabalhos em grupo, ati vidades de raciocínio lógico, tomadas de decisões, análise críti ca da realidade, da convivência social; bem como através de orientações e aprofundamentos específi cos para pesquisa por meio de equipamentos e sistema computadorizado adapta- dos ao sistema para a acessibilidade. O projeto apresenta em seu design a acessibilidade ao computador, que engloba programas (soft ware) e aplicati vos de acesso, incluindo ti pos de aju- das técnicas e pedagógicas para uso genérico de acesso aos computadores e periféricos; a acessibilidade ao Navegador, os quais podem ser genéricos como o Internet Explorer e o Firefox. Contudo, existem navegadores específi cos que oferecem facilidade de acesso a diferentes usuários como o navegador só de texto LYNX para cegos e a acessibilidade ao planejamento de páginas WEB, que envolve várias dimensões como conteúdo, estrutura e formato. RESULTADOS ESPERADOS Propiciar aos estudantes com diferentes graus de comprometi - mento motor, sensorial e/ou de comunicação e linguagem o acesso a uma biblioteca multi mídia, com a fi nalidade de possibilitar a interação e pesquisa por meio do computador/internet. Espera-se a adesão e a parti cipação de pelo menos 30% dos NAPNE’s, cerca de 30 núcleos, uma clientela inicial de 100 alunos, 50 professores e 30 administrati vos. Ao fi nal do ano de 2011, espera-se ter disponibilizado no site da Biblioteca Virtual Inclusiva cerca de 500 obras em formatos acessíveis e um cadas- tro de pelo menos 500 usuários. caminhos para inclusão.indd 99caminhos para inclusão.indd 99 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 100 REFERÊNCIAS [1] Portal da Ufpa/Fabib [site na Internet]. Faculdade de Biblioteconomia. Citações, htt p://www.ufpa.br/biblio/02/index.php?opti on=com_content&view=arti cle&id=71. Acesso: 9/10/2010 [2] Brasil, Lei 9610/98- Direitos Autorais, Capítulo IV, Art.46. [3] Paulon SM. Documento subsidiário à políti ca de inclusão. Brasília: Ministério da Edu- cação – MEC, Secretaria de Educação Especial – SEESP; 2005. [4] Mantoan MTE, Prieto RG. Inclusão escolar: pontos e contrapontos. São Paulo: Su- mus; 2006. [5] ONU, United Nati onal Enable [site na Internet]. Nothing About Us Without Us (Nada Sobre Nós Sem Nós). htt p://www.un.org/disabiliti es/ Acesso em 10 out. 2010 [6] MEC. Insti tuto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP, 2006. [7] Perini CMB. Inclusão social e educacional. Todos somos diferentes, e porque não aceitar a diversidade humana? Rede Saci Internet Res. 2008;4(2):e8. htt p://saci.org.br/ index.php?modulo=akemi¶metro=14105. Acesso em 17 nov. 2009. [8] Brasil. Portal Domínio Público [site na Internet]. Biblioteca Digital. Missão. htt p:// www.dominiopublico.gov.br/Missao/Missao.jsp. Acesso em: 11 set. 2010 [9] Haddad S. Educação de Jovens e Adultos, a promoção da Cidadania Ati va e o desen- volvimento de uma consciência e uma cultura de paz e direitos humanos. In: Agenda for the future six years later – ICAE Report. Internati onal Council for Adults Educati on – ICAE. Montevideo. 2003. [10] Teberosky A, Coll C, Bolivar A. O Construti vismo na Práti ca 9 - Col. Inovação Peda- gógica. Porto Alegre: Artmed; 2007. caminhos para inclusão.indd 100caminhos para inclusão.indd 100 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 SOFTWARE EDUCATIVO: O QUE É? PARA QUE? E POR QUÊ? Aline Mary Vasconcelos de Albuquerque1, Danielle Alves Zaparoli2, Ana Irene Alves de Oliveira3 INTRODUÇÃO Atualmente, com o desenvolvimento da tecnologia, uma ampla variedade de meios de comunicação passou a estar presente nos mais diversos lugares e classes sociais. A Escola deixou de ser a única respon- sável pela oferta de conhecimento. Assim, faz-se necessário uma revisão dos paradigmas e das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), e suas dimensões dentro da Escola [1]. A introdução dos computadores nas escolas requer uma ação fun- damental, necessária e imprescindível, que é a formação e capacitação conti nuada dos educadores para a uti lização das ferramentas computa- cionais em sua práti ca de ensino. A incorporação dos recursos da informáti ca no contexto educacio- nal vai além da disponibilidade dos produtos nas escolas, mas implica essencialmente em mudanças educacionais que possam romper com os paradigmas de educação meramente instrucionais. A leitura de uma pequena amostra da obra de diversos autores[2, 3, 4, 5, 6] proporcionou o estudo acerca das TIC – mais especifi camente os soft wares educati vos –, sendo constatada a efi cácia desse instrumen- to para a transformação da educação. Este trajeto consiste de desafi os concretos, força de vontade e romper de fato com o modelo fabril e, principalmente, muito investi mento cientí fi co para não se alienar num novo modelo. Como ressalta Toffl er [7], a mudança não é algo fácil. Para haver essa 1 Terapeuta Ocupacional, especialista em Saúde Pública pela UVA, mestranda em Educação pela UMA, aline- mary_to@yahoo.com.br 2 Terapeuta Ocupacional, danizaparolli@gmail.com 3 Terapeuta Ocupacional, doutora em Teoria e Análise Comportamental pela UFPA, docente da UEPA e coor- denadora do NEDETA, cedi@uol.com.br caminhos para inclusão.indd 101caminhos para inclusão.indd 101 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 102 quebra, o radicalismo nas práti cas deverá ser adotado, portanto, as inova- ções nas práti cas pedagógicas serão a opção viável para a mudança e favo- recimento do ponto forte desta refl exão, que é a aprendizagem do aluno. Portanto, refl eti r sobre as mudanças na educação é analisar e ava- liar as TIC e seus impactos na Escola. Nesse caso, para que nela aconte- çam transformações, é preciso que o foco da aprendizagem esteja vol- tado para o aluno, daí então a necessidade de perceber suas nuances e contextualizá-los. O SOFTWARE EDUCATIVO Soft ware Educati vo (SE), conforme conceituado por Giraff a [8], como “todo programa que uti liza uma metodologia que o contextualize no processo ensino e aprendizagem, pode ser considerado educacional”. Existem inúmeros conceitos de soft ware educati vo, porém todos nos re- metem a um programa de informáti ca [9]. Segundo Valente [10], existem vários ti pos de soft wares educati vos e eles são classifi cados em: tutoriais, que são soft wares onde a informa- ção apresenta uma sequência pedagógica escolhida pelo estudante; os de exercício de pergunta-resposta dando o reforço; os aplicati vos são as plani- lhas; os de multi mídia e internet que fazem um mix entre imagens, textos e músicas; existem também os de simulação, os quais simulam a realidade como o simulador de vôo; e, por fi m, os jogos com intuito lúdico. Entretanto, nem todos favorecem a aprendizagem, os tutoriais e os de exercícios, por exemplo, corroboram com a práti ca tradicional ou a es- cola fabril. Teixeira afi rma que os SE de jogos e de simulação podem ser descritos como construti vista, pois neles os alunos constroem o seu conhe- cimento, são livres e próximos da realidade, do coti diano dos alunos. Um aspecto relevante a ser lembrado é que os soft wares educati vos não se reduzem ao computador, há uma variedade de SE como o telefone móvel (celular), pois elesapresentam soft wares sofi sti cadíssimos com opções de in- ternet com site de busca, bate papo, jogos, fi lmadoras, rádio, etc. [9] Contudo, Gomes e Zardini alertam quanto a um ponto relevante a ser refl eti do sobre os SE: os critérios de avaliação e sua periodicidade. Esses SE precisam ser avaliados paulati namente e existem pontos a serem observados, como fatores moti vacionais, facilidade do uso, interati vi- dade social, fundamentação pedagógica [13], programação e conteúdo [14]. caminhos para inclusão.indd 102caminhos para inclusão.indd 102 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 Caminhos da INCLUSÃO | 103 Porém, essa avaliação não deve ser meramente tecnológica, de- vendo levar-se em conta os fatores moti vacionais, interati vidade social e fundamentação pedagógica [14]. Fino [5] destaca que os SE e seus critérios de uti lização devem aten- der ao embasamento do Construcionismo, porque assim o aluno constrói o seu processo de interação e contextualização com o Soft ware Educati - vo. E então os SE favorecerão a aprendizagem e autonomia do aluno. SOFTWARE EDUCATIVO E A INOVAÇÃO PEDAGÓGICA: UM DIÁLOGO INTERESSANTE Podem ser percebidos [6, 7, 15, 16, 17 18, 19, 20] alguns aspectos importantes como critérios de avaliação e uti lização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC). Destaca-se também a infl uência da tec- nologia na vida do aluno e da sociedade, e, consequentemente, sua in- fl uência na Escola. E deve-se notar que, para que ocorra a mudança de paradigma e a inserção contextualizada das TIC, não é condição necessá- ria que os SE precisem ser novos para serem inovadores. Essa tão almejada inovação pedagógica não tem molde, no entan- to, ela visa uma aprendizagem signifi cati va, centrada no sujeito e suas necessidades e interesses [4]. Portanto, se faz necessário a quebra de paradigma, romper com as amarras tradicionais convertendo-se para o construcionismo, contextualizando os SE de forma heterogênea e singu- larizada para uma comunidade, bairro, cidade, região, etc. Então, os edu- cadores devem se preocupar com a metodologia aplicada. A forma em rede pela qual serão inseridas as TIC irá dizer se há inovação ou não. Culmina-se esta refl exão mostrando que não se pode defi nir um modelo igual para todas as escolas. Morus [21] fala sobre isso ao dizer que “quem conhece uma cidade, conhece todas, porque são exatamente semelhantes”. Tal comparação provoca um impulso, tal qual um vulcão em erupção, capaz de mudar a Escola. Deste modo, cada professor, cada Escola deverá analisar seu pú- blico-alvo e averiguar as necessidades de cada um, sendo necessário um projeto individualizado por aluno e por Escola. Assim, a Escola estará mais próxima daquela que se deseja, onde os alunos poderão opinar e cons- truir a metodologia aplicada, tendo o poder para gerir e direcionar sua construção do conhecimento. Então, a Escola estará focada na relação caminhos para inclusão.indd 103caminhos para inclusão.indd 103 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 104 aluno-mundo e seu coti diano e a aprendizagem como construção diária do sujeito imersos na cultura e tecnologia, isso quer dizer alunos-mundo inseridos numa comunidade e na sociedade. Portanto, alunos-aprendizes de vida e conhecimento, isto é uma via de mão dupla, construtores de ensino-aprendizagem. O USO DO SOFTWARE EDUCATIVO PARA ESTIMULAR A APRENDIZAGEM O desenvolvimento infanti l acontece, de forma complexa, estan- do associado às infl uências das vivências motoras, afeti vas, cogniti vas e sociais. Portanto, a criança precisa ser compreendida de forma holísti ca, e não fragmentada, considerando a qualidade e a quanti dade dos estí - mulos, bem como as infl uências que recebe do ambiente, no qual são levados em conta os fatores familiares, econômicos, culturais, sociais e o espaço fí sico em que ela vive. Desta forma, entende-se que os soft wares educati vos têm um pa- pel importante na esti mulação de crianças, sobretudo daquelas com difi - culdade de aprendizagem. Para Vygotsky, o desenvolvimento se processa através da interação do indivíduo com o meio (ambiente e suas relações). Vygotsky destaca a lingua- gem e as relações com o ambiente como fator necessário para que ocorra o desenvolvimento. Para Piaget [22] “o interesse verdadeiro surge quando o eu se identi fi ca com uma ideia ou um objeto, quando encontra nela um meio de expressão e eles se tornam um alimento necessário à sua ati vidade”. Então se acredita que a construção do conhecimento deva ser contextualizada para que o indivíduo esteja em relação constante com o objeto. Para isso o soft wa- re será uma óti ma alternati va, pois sua inserção será realizada mediante uma contextualização que provocará interesse necessário para a aprendizagem do aluno. Esta será favorecida através das trocas entre o sujeito e o objeto (sof- tware educati vo), de forma que “o primeiro possa incorporar a si o segundo levando em conta suas parti cularidades” [23]. Diante disso, a aprendizagem está ligada à constante construção da relação entre o sujeito e o objeto. Assim, constata-se que Piaget desejava entender a construção do conhecimento. Portanto, os soft wares têm seu papel nesse processo de aprendi- zagem, pois dinamizarão o processo de esti mulação e de Ensino-Apren- caminhos para inclusão.indd 104caminhos para inclusão.indd 104 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 Caminhos da INCLUSÃO | 105 dizagem, porque atuam sobre ponto mais relevante nesse processo que é o interesse da criança. Essa aprendizagem deve acontecer de forma prazerosa e espontânea, com a criança se fazendo viva e atuante no seu processo de aprendizagem. As limitações do indivíduo com defi ciência tendem a tornar-se uma barreira ao aprendizado. Desenvolver recursos de acessibilidade seria uma maneira concreta de neutralizar as barreiras causadas pela defi ci- ência e inserir esse indivíduo nos ambientes ricos para a aprendizagem, proporcionados pela cultura. Os soft wares educati vos de abordagens pedagógicas trazem diver- sas ati vidades como: colorir, pintar, jogo da memória, quebra-cabeça, histórias, sequências, além de conteúdos específi cos da área de Portu- guês e Matemáti ca. São possíveis de serem uti lizados com crianças com diversas difi culdades, podendo esti mular habilidades e comportamentos que favoreçam a aprendizagem. É importante que o educador propicie ao aluno condições e oportuni- dades de explorar seu potencial intelectual nas diferentes áreas do conhe- cimento e realizar sucessivas ações e refl exões. O uso do computador em ambientes de aprendizagem deve enfati zar a construção do conhecimento. CONSIDERAÇÕES FINAIS A refl exão desta temáti ca elucidou pontos plausíveis sobre a inserção das TIC, especifi camente os soft wares educati vos nas Escolas, corroborando com o Construti vismo. Tornou-se evidente que, para uti lização das TIC, deve haver uma preocupação com a metodologia aplicada e a avaliação dos sof- twares educati vos uti lizados, para que não seja reproduzido o modelo fabril. Conclui-se esta revisão com uma citação de Toffl er [24] ao falar que não se pode mais retroceder, mas seguir em frente: O mundo que está emergindo rapidamente do cho- que de novos valores e tecnologias, novas relações geopolíti cas, novos esti los de vida e novos modos de comunicação, exige ideias e analogias novas, novas classifi cações e novos conceitos. [14] Então, esses novos conceitos precisam ser uti lizados adequada- mente, como o construcionismo e a inovação pedagógica. caminhos para inclusão.indd 105caminhos para inclusão.indd 105 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 106 REFERÊNCIAS [1] Fino CN. Escola da Pena: o emergir de uma cultura ‘nova’. Lisboa: Universidade de Lisboa; 2001.p.4 [2] Fino CN.O Lugar das tecnologias na formação inicial de professores: o caso da Uni- versidade da Madeira. Funchal: [s.d.] A, p.4. [3] Fino CN. O futuro da escola do passado. Funchal: Universidade da Madeira; 1998. p.9 [4] Fino CN. Novas Tecnologias, Cognição e Cultura: um estudo no primeiro ciclo do Ensino Básico. [Tese] Lisboa: Universidade de Lisboa, 2000. [5] Fino CN, Sousa JM. As TIC redesenhando as fronteiras do currículo. Revista Galego- Portuguesa, Lisboa, v.10, n.8, p.2051 -2063, ano 7, 2003. [6] Papert SM. A Máquina das Crianças. Porto Alegre: Artmed; 2008 [7] Toffl er AO. Choque do Futuro. [Tradução de Eduardo Francisco Alves] 7ª Ed. Rio de Janeiro: Record; 2001. [8] Giraff a LMM. Uma arquitetura de tutor uti lizando estados mentais. [Tese] Porto Ale- gre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1999. [9] Lyra AR et al. Ambiente virtual para análise de soft ware educati vo. In: IX Workshop de Informáti ca na Escola. Pernambuco: WIE, 2001. p.236-247. [10] Valente JA. Diferentes usos do computador na educação. Brasília: Em Aberto, ano 12, n.57, jan/mar,1993. p.3-16 [11] Teixeira JF. Uma discussão sobre a classifi cação de soft ware educacional. Revista Infotec: Campinas, s.d.A. [12] Gomes AS. Referência Teórico Construti vista para avaliação de Soft ware Educati vo. Revista Brasileira de Informáti ca na Educação. v.16, n.2, p.9-21, mai/ago, 2008. [13] Zardini AS, Lamounier F. Critérios de avaliação de soft ware educati vo. [Dissertacão] Minas Gerais: Cefet, 2001. [14] Lyra ARL, Leitão DA, Amorim GBC; Gomes AS. Ambiente Virtual para Análise de Soft ware Educati vo.” In: Anais do Workshop Brasileiro de Informáti ca Educati va (WIE 2003), Campinas: SBC. [15] Piaget J. A linguagem e o Pensamento da Criança. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura; 1956. [16] Piaget J. O nascimento da inteligência na criança. 2ª ed. Rio de Janeiro: ZAHAR; 1975. [17] Piaget J. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora; 1973. [18] Piaget Jean. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2008. [19] Vygotski LS. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Marti ns Fontes; 2000. [20] Vygotsky LS. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psico- lógicos superiores. São Paulo: Marti ns Fontes; 2008. [21] Morus T. Utopia. s.d.A, p. 24 [22] Piaget Jean. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2008.p.162 [23] Piaget, Jean. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2008.p.157 [24] Toffl er A. O Choque do Futuro. Tradução de Eduardo Francisco Alves - 7ª edição - Rio de Janeiro: Record; 2001.p. 16 caminhos para inclusão.indd 106caminhos para inclusão.indd 106 23/8/2011 11:02:2023/8/2011 11:02:20 USO DA COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA COM CRIANÇAS AUTISTAS: UMA CONTRIBUIÇÃO DA TERAPIA OCUPACIONAL Jorgeane Pedrosa Pantoja1; Ana Irene Oliveira2; Rafael Luiz Morais da Silva3; Deyse Modesto Pinheiro4; Elson Ferreira Costa4; Luísa Sousa Monteiro4 INTRODUÇÃO Terapia Ocupacional é a arte e ciência de conduzir a parti cipação de indivíduos em tarefas selecionadas, para resti tuir, reforçar e aumentar a performance, facilitar o aprendizado de habilidades e funções essenciais para a adaptação e a produti vidade, com o propósito de diminuir e corri- gir as disfunções e preservar a saúde [1] Entre as áreas de atuação, destaca-se a Tecnologia Assisti va, que possibilita ao Terapeuta Ocupacional esti mular a função e reduzir a inter- ferência das limitações na realização de ati vidades funcionais de maneira independente [1]. A comunicação alternati va, como recurso do terapeuta ocupacional, é fundamental para aquisição de habilidades e funcionali- dade da criança auti sta, além do que, favorece a esta criança a realização de uma das maiores necessidades do homem, a linguagem, contribuindo assim para a melhora da sua função pessoal, familiar, educacional e, so- bretudo, social. O presente estudo se deterá em abordar os défi cits de linguagem, embora considere importante todas as característi cas clínicas do auti smo infanti l. AUTISMO O auti smo foi identi fi cado por Leo Kanner em 1943, que usou o substanti vo “auti smo” para descrever um grupo de crianças que ti nham 1 Estagiária do NEDETA e acadêmica do 4° ano de Terapia Ocupacional da UEPA. E-mail: jorgeanepantoja@ gmail.com; 2 coordenadora do NEDETA. Terapeuta Ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, Mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA) 3 Terapeuta Ocupacional do NEDETA; 4 Acadêmicos do 5° ano de Terapia Ocupacional da UEPA. caminhos para inclusão.indd 107caminhos para inclusão.indd 107 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 108 característi cas comuns: auti smo extremo, obsessividade, estereoti pias e ecolalia. Esse conjunto de sinais foi por ele visualizado como uma doença específi ca relacionada com fenômenos da linha esquizofrênica, portanto como psicose [3]. O auti smo é considerado hoje uma síndrome comportamental (e não um ti po de defi ciência) com causas múlti plas. Trata-se de um transtor- no defi nido por alterações presentes antes dos três anos de idade [2]. É um distúrbio de desenvolvimento caracterizado pela difi culda- de de interação social, expresso pela inabilidade em relacionar-se com o outro e usualmente combinado com difi culdades de linguagem e de comportamento [3]. Encontram-se défi cits de comportamento no auti smo infanti l, uma preocupação circunscrita a um interesse especial, dependência compul- siva de roti nas, estereoti pias motoras e preocupação com partes de ob- jetos [3]. Segundo o DSM-IV, o transtorno auti sta consiste na presença de um desenvolvimento comprometi do ou acentuadamente anormal da in- teração social e da comunicação e um repertorio muito restrito de ati vi- dades e interesses. As manifestações do transtorno variam e dependem do nível de desenvolvimento e da idade cronológica do indivíduo. O CID- 10 classifi ca o auti smo como um transtorno global do desenvolvimento caracterizado por: a) um desenvolvimento anormal ou alterado, mani- festado antes da idade de três anos, b) apresentando uma perturbação característi ca do funcionamento em cada um dos três domínios se- guintes: interações sociais, comunicação, comporta- mento focalizado e repeti ti vo Além disso, o transtorno é comumente acompanhado de nume- rosas outras manifestações inespecífi cas, como: fobias, perturbações de sono ou da alimentação, crises de birra ou agressividade (auto-agressivi- dade). Segundo a ASA (Auti sm Society of American), indivíduos com auti s- mo usualmente exibem pelo menos metade das característi cas listadas a seguir: caminhos para inclusão.indd 108caminhos para inclusão.indd 108 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 Caminhos da INCLUSÃO | 109 1. Difi culdade de relacionamento com outras crian- ças; 2. Riso inapropriado; 3. Pouco ou nenhum con- tato visual; 4. Aparente insensibilidade à dor; 5. Pre- ferência pela solidão; modos arredios; 6. Rotação de objetos; 7. Inapropriada fi xação em objetos; 8. Perceptí vel hiperati vidade ou extrema inati vidade; 9. Ausência de resposta aos métodos normais de ensino; 10. Insistência em repeti ção, resistência à mudança de roti na; 11. Não tem real medo do peri- go (consciência de situações que envolvam perigo); 12. Procedimento com poses bizarras (fi xar objeto fi cando de cócoras; colocar-se de pé numa perna só; impedir a passagem por uma porta, somente liberando-a após tocar de uma determina maneira os alisares); 13. Ecolalia (repete palavras ou frases em lugar da linguagem normal); 14. Recusa colo ou afagos; 15. Age como se esti vesse surdo; 16. Difi cul- dade em expressar necessidades - usa gesti cular e apontar no lugar de palavras; 17. Acessos de raiva - demonstra extrema afl içãoem razão aparente; 18. Ir- regular habilidademotora - pode não querer chutar uma bola, mas pode arrumar blocos. COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA Comunicação alternati va e/ ou suplementar vem sendo uti lizada para designar um conjunto de procedimentos técnicos e metodológicos direciona- dos às pessoas acometi das por alguma doença, defi ciência, ou alguma outra situação momentânea que impede a comunicação com as demais pessoas por meio dos recursos usualmente uti lizados, mais especifi camente a fala [4]. Sua uti lização desti na-se a compensar os défi cits e proporcionar capacidades equivalentes aos da maioria das pessoas, envolvendo o uso dos gestos manuais, expressões faciais e corporais e símbolos gráfi cos, como fotografi as, gravuras, desenhos, objetos, além de pranchas com símbolos pictográfi cos, pranchas de alfabeto, comunicadores de voz, gra- vada ou sinteti zada, até sistemas sofi sti cados de computador. A comunicação alternati va dispõe de sistemas criados ou adapta- dos especialmente com fi nalidade educati va ou terapêuti ca [5]. A comunicação alternati va e ampliada, portanto, é defi nida como uma maneira alternati va à comunicação oral e escrita [6]. Os recursos caminhos para inclusão.indd 109caminhos para inclusão.indd 109 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 110 de comunicação alternati va devem ser iniciados o mais precocemente possível, a fi m de se evitar a diferença entre a linguagem recepti va e ex- pressiva, bem como suas consequências no desenvolvimento global da pessoa com difi culdade de expressão, tanto no aprendizado, como no nível de autonomia e integração social [7]. Os objeti vos são variados e complexos, mas o principal é o de capa- citar o indivíduo a se comunicar com efi ciência, de forma que ele possa tomar parte ou retornar à sociedade como um indivíduo parti cipati vo e produti vo, apto à interação interpessoal e social [8]. Diante disso, funciona como uma ponte que conduz ou amplia o acesso à comunicação, permiti n- do ao individuo a maior independência possível em sua vida coti diana. A comunicação alternati va funciona como uma vertente da Tecno- logia Assisti va, que, por sua vez, tem como objeti vo principal promover a autonomia e independência dos indivíduos [9] A LINGUAGEM DO AUTISTA A ideia inicial que se tem de conceito de comunicação é que nos co- municamos por palavras, pela fala. Por meio da fala, haveria troca de in- formações, sensações, senti mentos. Porém, numa interação face a face, o ser humano exibe uma infi nidade de recursos verbais e não-verbais que se misturam e se completam [10]. O homem apresenta uma necessidade de compreender o mundo, logo, busca diferentes formas de se comunicar, desde gestos até palavras e escrita. Percorrendo este caminho, interage com o meio fí sico e social. A comunicação serve de vinculo para a linguagem, ou seja, consti tui um instrumento social usado em interações visando à comunicação [11]. A criança com auti smo apresenta distúrbios de comunicação verbal e não verbal, já que é caracterizada por uma ecolalia imediata e retarda- da ou pela repeti ção de frases estereoti padas, uma inversão pronominal (uti lização do “Tu” quando o signifi cado é “Eu”), uma afasia nominal [12]. Segundo Schirmer [12], é possível ainda verifi car a ausência, incapacida- de, ou mesmo limitação de simbolização, como a não uti lização de ter- mos abstratos. No que se refere à comunicação verbal, esta também é limitada, senão ausente [3]. Os défi cits de linguagem trazem consigo não somente as limitações caminhos para inclusão.indd 110caminhos para inclusão.indd 110 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 Caminhos da INCLUSÃO | 111 para o desenvolvimento cogniti vo da criança, mas também para o seu desenvolvimento social e de personalidade. A comunicação, seja ela ver- bal ou não, é um instrumento primordial para o processo de integração social e é adquirida desde o nascimento por bebes com desenvolvimento tí pico ou normal [9]. COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA E AMPLIADA ATUAÇÃO DO TERAPEUTA OCUPACIONAL Na práti ca do Terapeuta Ocupacional, pode-se uti lizar a Comuni- cação Alternati va como estratégia para auxiliar o sujeito a uti lizar outro meio para se comunicar no lugar da linguagem falada. Tal recurso favo- rece a possibilidade da aquisição da percepção e comunicação, potencia- lizando a autoesti ma da criança ao se perceber capaz de realizar ações outrora impossíveis. Na comunicação alternati va o terapeuta ocupacional considera os aspectos motores, cogniti vos, sensoriais, emocionais e sociais envolvidos na uti lização de um determinado símbolo, recurso, estratégia ou técnica para determinar o sistema mais adequado ao usuário. Em cada um dos aspectos que compreendem o sistema de comunicação, o papel do tera- peuta ocupacional é fundamental [13]. O terapeuta ocupacional, na fase inicial da intervenção, por meio da comunicação alternati va, observa os comportamentos naturais da criança, percebendo suas necessidades, interesses, moti vação, e, princi- palmente, sua organização para ati ngir um objeti vo. É importante que o terapeuta ocupacional proporcione à criança a capacidade de tornar-se ati va, e que por sua vontade e uma ação realizada ela crie outras ações que irão esti mulá-la a experimentar, acomodar e elaborar os processos de pensamento no intuito de interagir cada vez mais com o ambiente. As cartelas e comunicação alternati va, como recurso do terapeuta ocupacional, podem se consti tuir como a oportunidade da criança auti s- ta avançar em sua escala de desenvolvimento, de modo a suprir suas ne- cessidades fí sicas e sociais. A intenção aqui não é apenas promover um meio para expressar suas necessidades e pedidos, mas também permiti r a interação com a informação, contribuindo para uma maior evolução em termos sociais [14]. caminhos para inclusão.indd 111caminhos para inclusão.indd 111 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 112 CONSIDERAÇÕES FINAIS A comunicação é essencial ao sujeito, facilitando sua integração so- cial; quando se fala em linguagem não se remete apenas à fala, mas sim a esta associada ao gesto, expressão facial, e corporal, caracterizando a condição humana. No auti smo as crianças são privadas inicialmente daquela habilidade humana, de modo que as tornam crianças atí picas, sem expressão e com comportamento estranho, bizarro, o que gera uma esti gmati zação perante a sociedade, que os vê como incapazes ou defi - cientes, e deles são reti rados qualquer chance de conviver em sociedade. A terapia ocupacional, sendo uma ciência da saúde na qual uma de suas apti dões é por meio das ati vidades humanas, planejar e organizar o coti diano, possibilitando melhor qualidade de vida ao indivíduo, pode fazer uso da comunicação alternati va que, neste contexto, foi apresen- tada como uma vertente da Tecnologia Assisti va. Esta, por sua vez, tem por objeti vo compensar temporária ou permanentemente a difi culdade do indivíduo em se comunicar, auxiliando as pessoas que não uti lizam a comunicação verbal para se expressarem. Na práti ca do Terapeuta Ocupacional pode-se uti lizar a Comuni- cação Alternati va como estratégia para auxiliar o sujeito a uti lizar outro meio para se comunicar no lugar da linguagem falada. Contribui para o aumento da possibilidade de aquisição da percepção e comunicação, afe- tando positi vamente a autoesti ma a autoesti ma da criança, ao se perce- ber capaz de realizar ati vidades outrora pensadas impossíveis. Tendo em vista todas as difi culdades de comunicação apresenta- das pelos auti stas, percebe-se nesse ti po de intervenção, uma gama de possibilidades para promover o desenvolvimento da criança no que se refere à linguagem e as suas interações sociais. Favorece o processo de inclusão e autonomia destas crianças, que passam a ser entendidas e atendidas conformesua necessidade, respeitando suas especifi cidades e singularidade. caminhos para inclusão.indd 112caminhos para inclusão.indd 112 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 Caminhos da INCLUSÃO | 113 REFERÊNCIAS [1] Associação Americana de Terapia Ocupacional (AOTA ), 1972 In : Cavalcanti A, Galvão C. Terapia Ocupacional: Fundamentação e práti ca. RJ: Guanabara Koogan; 2007 [2] Cavalcanti A, Galvão C. Terapia Ocupacional: Fundamentação e práti ca. Rio de Janei- ro: Guanabara Koogan; 2007. [3] Gauderer EC. Auti smo e outros atrasos do desenvolvimento: guia práti co para pais e profi ssionais. Rio de Janeiro: Revinter; 1997 [4] Leboyer M. Auti smo Infanti l: fatos e modelos. 6ª ed. Papirus; 2007. [5] Menzini EJ. Portal de ajuda técnicas para educação: Equipamentos e material peda- gógico especial para a educação, capacitação e recreação de pessoas com defi ciência fí sica: Recuros de Comunicação Alternati va. 2ª ed. Brasília: MEC, SESP; 2006. [6] Nunes LROP, Pelosi MB, Gomes MR (Orgs). Um retrato da comunicação alternati va no Brasil: relatos de pesquisas e experiências. Vol. 1, Rio de Janeiro: Quatro Pontos/ FINEP, 2007. [7] Glenner A. Caderno de Terapia Ocupacional da UFSCar, v 13, n° 1, Jan/ Jun. 2005. [8] Fernandes AS. A comunicação alternati va na escola especial. Temas sobre desenvol- vimento, v. 10, n° 58-9, p. 85-88, 2001. [9] Guanella. Obra Dom...E se falta à palavra, qual comunicação, qual linguagem? Dis- cursos sobre comunicação alternati va. MENNON, São Paulo: 1999. [10] Manzini EJ. Conceitos básicos em comunicação alternati va e suplementar. In: K Car- rara (Org). Educação, Universidade e Pesquisa. Marília: Unesp-Marília-Publicações, São Paulo: Fapesp; 2001. p. 161-178 [11] Souza IS, Oliveira AIA. Proposta de protocolo de observação das relações sociais de crianças usuárias de recursos de comunicação suplementar e/ ou alternati va. In: Olivei- ra AIA, Lourenço JMQ, Garroti MF. Tecnologia Assisti va: pesquisa e práti ca 2008. [12] Schirmer CR, Fontoura DR, Nunes ML. Distúrbios da aquisição da linguagem e da aprendizagem. Jornal de Pediatria - Vol. 80, Nº2(Supl.), 2004. [13] Schuwarizan JS. Auti smo Infati l. São Paulo: Memnon; 1995. [14] Pelosi MB. Comunicação alternati va e Suplementar. In: Cavalcanti A, Galvão C. Tera- pia Ocupacional: fundamentação e práti ca. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. [15] Tavares APS, Silva MM, Pavezzi MF, Campaner NB, Antonelli RT. A terapia ocupacio- nal uti lizando-se da comunicação alternati va e ampliada, como mediadora em uma es- cola de educação especial visando favorecer as habilidades de comunicação e interação de uma criança com paralisia Cerebral. Unisalesiano de Lins, 2007. [16] ITS (Insti tuto de Tecnologia Social). Tecnologia Assisti va nas escolas: Recurso bási- cos de Acessibilidade Sócio-Digital para pessoas com defi ciência, 2008. caminhos para inclusão.indd 113caminhos para inclusão.indd 113 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 caminhos para inclusão.indd 114caminhos para inclusão.indd 114 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 Caminhos da INCLUSÃO | 115 caminhos para inclusão.indd 115caminhos para inclusão.indd 115 23/8/2011 11:02:2123/8/2011 11:02:21 caminhos para inclusão.indd 116caminhos para inclusão.indd 116 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 ACESSIBILIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR Alessandra Cavalcanti A. Souza1,3, Daniel Marinho Cezar da Cruz1,4, Giordana Chaves Calado 1,5, Victor Ruan Carvalho Soares 1,6, Alberto Luiz Aramaki1,6, Gismeire de F. Portes Ribeiro2,7 ACESSIBILIDADE NO TERRITÓRIO BRASILEIRO A adoção de ações e estratégias pela União para concreti zar a aces- sibilidade (acesso universal), aos diversos espaços que consti tuem uma cidade, vem sendo realizada e implementada com afi nco pelos gestores públicos há 20 anos. A acessibilidade é o desafi o imposto a todos os municípios brasilei- ros como parte de uma políti ca de mobilidade urbana que aspira a inclu- são social, a equiparação de oportunidades e a efeti vação da cidadania tanto das pessoas com defi ciência, quanto das pessoas com mobilidade reduzida como, por exemplo, um idoso ou uma gestante. Desde 1989, com a publicação daquela que seria a disposição inicial sobre as responsabilidades do poder público na área de acesso às edifi ca- ções: a Lei n. 7.853/1989 regulamentada pelo Decreto n. 3.298/1999, aos dias atuais, inúmeras normati zações foram postas em vigor impulsionan- do ati tudes e aperfeiçoando decisões de dirigentes sobre o pleno acesso de todos aos diferentes contextos fí sicos que compreendem edifi cações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos [1] [2]. A este cenário somaram-se a Lei n. 10.048/2000 e a Lei n. 10.098/2000, regulamentadas pelo Decreto n. 5.296/2004. Com a im- plementação deste, a parti r do ano de 2004 dá-se, com maior ênfase, início às apreciações e proposições sobre os direitos de ir e vir e sobre a cidadania [1]. 1 Laboratório Integrado de Tecnologia Assistiva da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (LITA/UFTM), lita@to.uftm.edu.br 2 Departamento de Inclusão Educacional e Diversidade da Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Uberaba. 3 Profa. Assistente do curso de Terapia Ocupacional da UFTM, pesquisadora do LITA/UFTM. 4 Prof. Assistente do Departamento de Terapia Ocupacional da UFSCar. 5 Arquiteta, Pesquisadora do LITA/UFTM. 6 Acadêmico do curso de Terapia Ocupacional da UFTM. 7 Assessora Pedagógica, Prefeitura Municipal de Uberaba. caminhos para inclusão.indd 117caminhos para inclusão.indd 117 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 118 Ações de conscienti zação congregam valores relacionados à digni- dade, diversidade e direitos e passam a ser moti vadas em todo o territó- rio nacional através de veiculação de campanhas na mídia como também na imprensa. A palavra Acessibilidade alcança reconhecimento entre os pares e passa a compor o diálogo entre a sociedade civil e os dirigentes, nas ações e intenções de mobilização em respeito às diferenças e aos direitos fundamentais garanti dos consti tucionalmente. Como ferramenta norteadora das diretrizes impostas pelo Decre- to n. 5.296/2004, que proporciona referência sobre acessibilidade, tem- se a Norma Brasileira NBR 9050, elaborada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Criada em 1985, tendo passado até o presente momento por duas revisões, uma em 1994 e a últi ma em 2004. A NBR 9050 consti tui o rol de apontamentos que auxilia no pro- cesso de estruturação da acessibilidade para profi ssionais, enti dades go- vernamentais ou não governamentais e usuários [3]. A literatura disponibilizada pela União amplia as considerações em- basadas nas diretrizes apresentadas. Elas fundamentam o que a Acessibi- lidade é, representa e desti na-se, ou seja, condição para uti lização, com segurança e autonomia, total ou assisti da, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edifi cações, dos serviços de transporte e dos dispositi vos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de defi ciência ou com mobilidade reduzida [1]. Recentemente, com o desdobramento das ações advindas à de- fi nição de acessibilidade, incluíram-se as ações para a promoção e ga- ranti a do acesso universal, em especial, no ambiente escolar. O Decreto n. 6.571/2008 (que regulamenta o parágrafo único do art. 60 da Lei n. 9.394/1996) que, ao dispor sobre o atendimento educacional especiali- zado na rede pública de ensino regular, objeti va, entre outras, a “adequa- ção arquitetônica de prédios escolares para acessibilidade” [4]. O acesso a prédios escolares, por eliminação das barreiras ou pela ade- quação dos espaços fí sicos das escolas, contempla as questões vinculadas às facilitações de chegar à insti tuição (com implementação de rotas acessíveis),permanecer neste ambiente com conforto, uti lizar dos mobiliários e produ- tos nele implementados (com autonomia) e encerram as discussões sobre a limitação de ati vidades e a restrição de parti cipação, ligadas à inadequação dos espaços, usados na práti ca por todos, seja com limitações ou não. caminhos para inclusão.indd 118caminhos para inclusão.indd 118 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 O AMBIENTE ESCOLAR A educação é uma das áreas de ocupação humana que ilustra algu- mas das ati vidades coti dianas como ler e escrever, nas quais as crianças se envolvem. Crianças com defi ciência (fí sica, sensorial, intelectual ou múlti pla), bem como aquelas com transtornos globais do desenvolvimen- to e com altas habilidades, têm direito à educação e são o público-alvo da Educação Especial que, enquanto um sistema de ensino, recebe apoio para a manutenção e o desenvolvimento de sistemas inclusivos [4 e 5]. A Educação Inclusiva abarca também a adequação de prédios es- colares para a acessibilidade e, na atualidade, possui um cenário promis- sor, cheio de informações que favorecem o desempenho, primariamente o escolar, daqueles que possuem defi ciência e nele estão inseridos. As questões ligadas à mobilidade na comunidade e à uti lização do transpor- te público e privado centralizam discursos, atuações e fomentam o campo de aprimoramento para estas ações diretamente vinculadas à práti ca de Tecnologia Assisti va; práti ca que é focada nas questões de acessibilidade e de adaptação (promoção de acesso e uti lização do ambiente) [4]. Assim, o ambiente escolar encerra, como outros meios urbanos e edifi cados, espaços caracterizados por áreas de (i) circulação externa; (ii) circulação interna; (iii) mobiliário urbano; (iv) rampas e escadas; (v) esta- cionamento [6]. Disti nta de outros espaços, na sua totalidade, os critérios para a promoção de acesso e uti lização do ambiente escolar perpassam e tem como parti cularidades [7]: • O espaço urbano, desti nado à circulação de pessoas e veículos, sejam eles de transporte individual de carga ou passeio, caracterizado pelas vias públicas – compreende passeio, pista, acostamento e canteiro. • As rotas de acesso conectando os ambientes, incorporando corredores, pisos, rampas, elevadores, escadas com os sistemas de sinalização. • Os ambientes: salas de aula, sala de informáti ca, laboratórios, biblioteca, banheiros e vesti ários, hortas, cozinha e refeitório, espaços de recreação e lazer (como um páti o, quadra ou um parque), canti na ou refeitório e os espaços para funcionamento da administração e direção. • O mobiliário e equipamentos, ou seja, telefone público, Caminhos da INCLUSÃO | 119 caminhos para inclusão.indd 119caminhos para inclusão.indd 119 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 120 bebedouros e as carteiras escolares. • O material didáti co e outras ajudas técnicas necessárias ao processo de Ensino-Aprendizagem. De acordo com o Decreto n. 5.296/2004, os estabelecimentos de ensino devem proporcionar condições de acesso e uti lização de todos os seus ambientes para pessoas com defi ciência e/ou com mobilidade reduzi- da, incluindo espaços como salas de aula, bibliotecas, auditórios, ginásios e instalações desporti vas, laboratórios, áreas de lazer e sanitários [8]. A NBR 9050/2004 complementa que deve existi r pelo menos uma rota acessível interligando o acesso de alunos às áreas administrati vas, assim como acesso às áreas de práti ca esporti va, de recreação, de ali- mentação, salas de aula, laboratórios, bibliotecas, centros de leitura e demais ambientes pedagógicos [3]. Desta forma, as determinações são voltadas para a promoção de acesso e de condições para uma educação de qualidade especial que, na práti ca, é construída na efeti vidade de ações pautadas na acessibili- dade. Então, no contexto escolar, a acessibilidade é focada nos materiais didáti cos, nos espaços e equipamentos, nos sistemas de comunicação e informação e no conjunto das ati vidades escolares. Sob essa perspecti va tem-se o Programa Escola Acessível, que busca adequar o espaço das escolas estaduais e municipais, a fi m de promover acessibilidade nas redes públicas de ensino. As ações podem ser de ade- quação arquitetônica ou estrutural do espaço fí sico reservado às salas de recursos multi funcionais (sala de aula que possuem material de Tecnolo- gia Assisti va para o processo de Ensino-Aprendizagem), de adequação de sanitários, alargamento de portas e via de acesso, construção de rampas, instalação de corrimãos e colocação de sinalização táti l e visual, de aquisi- ção de mobiliário acessível, cadeira de rodas, material desporti vo acessível e outros recursos de Tecnologia Assisti va [4]. ESCOLA ACESSÍVEL A fi m de promover acessibilidade nas redes públicas de ensino, foi implementada ati vidade de extensão através do Laboratório Integrado de Tecnologia Assisti va, em parceria com ações públicas, visando acompa- caminhos para inclusão.indd 120caminhos para inclusão.indd 120 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 Caminhos da INCLUSÃO | 121 nhamento especializado na área de Tecnologia Assisti va às escolas da rede municipal de ensino que realizam atendimento educacional especializado. Uma equipe foi composta por profi ssionais das áreas de Terapia Ocupacional, Pedagogia, Arquitetura e Engenharia Civil e, em um em- penho contí guo, procedeu-se a avaliação da acessibilidade das escolas municipais contempladas pelo programa de implantação de salas de re- cursos multi funcionais MEC/SEESP nos anos de 2005 a 2008. Realizou- se a avaliação da acessibilidade com respeito aos princípios de desenho universal e às normas técnicas brasileiras para edifi cação e urbanização de 11 escolas, no intuito de favorecer a promoção da acessibilidade e da inclusão escolar. A inadequação do ambiente às condições de acessibilidade foi percebi- da prati camente em todos os espaços e mobiliários/equipamentos constantes nas escolas visitadas. Os principais apontamentos foram em relação à: • Calçada (circulação externa): passeio com desníveis e falta de rebaixamento da calçada para travessia de pedestres. • Rota de acesso interna (circulação interna): piso com grelhas e juntas de dilatação, no fl uxo principal de circulação, com vão de dimensão superior a 15 mm e em má conservação. • Sinalização visual e táti l (verti cal): ausência de sinalização visual e táti l (em relevo e em Braille) nas entradas (Figura 1), nas áreas e vagas de estacionamento de veículos; áreas acessíveis de embarque/desembarque e sanitários com informação do ambiente. • Banheiros: os sanitários e vesti ários apresentados como acessíveis não obedecem aos parâmetros da NBR 9050/2004 ou a escola não possui banheiro acessível (Figura 2). • Salas de aula: porta de acesso sem vão livre mínimo para passagem de uma pessoa em cadeira de rodas. • Canti na/Refeitório: balcão de atendimento e mobiliário (mesa) não possui altura adequada para uti lização do aluno em cadeira de rodas (Figura 3). • Mobiliário: ausência de mobiliário escolar (mesa e cadeira) acessível para pessoas com defi ciência; bebedouros não permitem aproximação frontal da pessoa em cadeira de rodas e seus comandos não atendem a altura (0,90 m) estabelecida na NBR 9050:04 (Figura 4) e telefone público sem sinalização de alerta. caminhos para inclusão.indd 121caminhos para inclusão.indd 121 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 122 Figura 1. Escola pública sem identi fi cação na entrada. Fonte: LITA/UFTM Figura 2. Banheiros de escola pública fora das determinações da NBR9050/2004. Fonte: LITA/UFTM Figura 3. Área desti nada à canti na/refeitório sem oferta de local para usuários de cadeira de rodas. Fonte: LITA/UFTM. caminhos para inclusão.indd 122caminhos parainclusão.indd 122 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 Caminhos da INCLUSÃO | 123 Figura 4. Bebedouros (mobiliário) em escola pública em desacordo com a NBR 9050:04. Fonte: LITA/UFTM CONSIDERAÇÕES FINAIS Os critérios para a promoção de acesso e uti lização do ambien- te escolar perpassam pelo entorno urbano (ruas, meio de transporte e identi fi cação da escola), pela edifi cação escolar (acessos e circulação; orientação e sinalização), pelos diversos ambientes (salas de aula, salas de informáti ca, laboratórios, biblioteca, banheiros e vesti ários, hortas, cozinha e refeitório e parque); pelo mobiliário e equipamentos (telefone público, bebedouro e carteira escolar, pelo material didáti co e pelas aju- das técnicas necessárias ao processo de Ensino-Aprendizagem. As adequações que se fazem necessárias devem ser pautadas não somente nos princípios de Desenho Universal, mas também devem estar de acordo com a NBR 9040/2004, que pontua as regulamentações bra- sileiras referentes à acessibilidade arquitetônica e urbanísti ca. Para a efeti vação de estratégias, práti cas e serviços que objeti vam a inclusão educacional, tendo como referência o emprego da Tecnologia Assisti va, a adequação dos contextos escolares amplia as condições de acessibilidade ao meio fí sico, promovendo autonomia, ati vidade e parti - cipação das crianças com defi ciência. Sugere-se iniciar a acessibilidade de escolas modifi cando o aces- so às salas de aula com alargamento de porta, construção de rampa no desnível da porta e colocação de sinalização visual e táti l; implantação de rotas acessíveis a todos os ambientes com piso anti derrapante, regular e estável e adequação das grelhas de acordo com os parâmetros da Norma de Acessibilidade; implantação de guias rebaixadas e aquisição de mobi- liário acessível com dimensões de acordo com a NBR 9050/2004. caminhos para inclusão.indd 123caminhos para inclusão.indd 123 23/8/2011 11:02:2223/8/2011 11:02:22 124 REFERÊNCIAS [1] Brasil. Coordenadoria Nacional da Pessoa Portadora de Defi ciência. Acessibilidade. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2005. [2] Brasil. Ministério das Cidades. Brasil Acessível – Programa Brasileiro de Acessibili- dade Urbana. Caderno 1. Brasília: Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana; 2004. [3] ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9050/2004 – Acessibilidade a edifi cações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos, 2 ed. Rio de Janeiro: ABNT; 2004 [4] Presidência da República. Brasil. Decreto n° 6.571, de 17 de setembro de 2008. Brasí- lia: Diário Ofi cial da União; 18/09/2008. [5] AOTA – American Occupati onal Therapy Associati on. Occupati onal Therapy Practi ce Framework: Domain and Process. (2ed). American Journal of Occupati onal Therapy, v. 62, n. 6, p. 625-683, nov/dez; 2008. [6] Torres FPT. Guia de Acessibilidade Urbana. Belo Horizonte: CREA/MG, Prefeitura Mu- nicipal de Belo Horizonte; 2006. [7] Calado GC. Acessibilidade no Ambiente Escolar: refl exões com base no estudo de duas escolas municipais de Natal-RN. [Dissertação] Centro de Tecnologia Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal; 2006. [8] Lima, N.M. Pessoa Portadora de Defi ciência - Legislação Federal Básica. Brasília: SEDH, Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Defi ciência; 2007. caminhos para inclusão.indd 124caminhos para inclusão.indd 124 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DA INFÂNCIA E DA ADOLESCÊNCIA ΈCAPSIΉ DE OURO PRETO, MG: ATIVIDADES INTERSETORIAIS E INTERDISCIPLINARES, SAÚDE MENTAL, EDUCAÇÃO E FAMÍLIA Christine Vianna Algarves Magalhães1 Ramon Alfenas Panades2 INTRODUÇÃO Este arti go apresenta a história de um Centro de Atenção Psicos- social da Infância e da Adolescência (CAPSi) em Ouro Preto, MG, a parti r da reforma psiquiátrica, e conta uma trajetória envolvendo as ações para a construção de uma Políti ca Pública em Saúde Mental, no município de Ouro Preto, para a Infância e a Adolescência É iniciati va do grupo de profi ssionais da Saúde Mental, intervir nas ações e acompanhar o processo de inclusão educacional e social de crian- ças e adolescentes em tratamento no Centro de Atenção Psicossocial da Infância e Adolescência de Ouro Preto MG (CAPSi) , de acordo com as diretrizes da Educação Nacional [1]. Quando surge o lema “Por uma sociedade sem manicômios” com a parti cipação de profi ssionais da Saúde Mental, o modelo de assistência aos usuários se modifi ca e possibilita novas intervenções. O projeto de lei de autoria do deputado Paulo Delgado, de 1987, sugeriu mudanças na legislação psiquiátrica e tornou-se catalisador dos debates acerca da questão anti manicomial, mas somente foi aprovado em abril de 2001, consolidando o novo modelo assistencial dos CAPS. A Lei n. 10.216/2001, da Reforma Psiquiátrica, a Portaria MS n. 336/2002 e a Portaria MS n. 189/2002 incorporam os avanços ocorridos na condução dos equipa- mentos substi tuti vos. O Ministério da Saúde (2004) defi ne que os ser- 1 Coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial da Infância e da Adolescência (CAPSi.) de Ouro Preto, MG. Presidente da Comissão Técnica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) e Defi ciências Múltiplas (DMU) da ação TECNEP/SETEC/MEC, christinevianna9@ gmail.com 2 Psicólogo do Centro de Atenção Psicossocial da Infância e da Adolescência de Ouro Preto, MG, ralfpana- des@gmail.com caminhos para inclusão.indd 125caminhos para inclusão.indd 125 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 126 viços substi tuti vos ti po CAPS devem, necessariamente, oferecer ofi cinas terapêuti cas, uma das principais formas de tratamento encontradas nes- ses estabelecimentos [4][5]. A Reforma Psiquiátrica tem possibilitado que se desvelem proces- sos de inclusão. São processos difí ceis, mas que, muitas vezes, possibili- tam mudanças, pequenos acontecimentos que potencializam a luta por sua qualidade de vida. A parti r de 2008, teve início o atendimento do serviço de Saúde Mental do município para a Infância e a Adolescência, com o trabalho interdisciplinar dos profi ssionais em ati vidades individuais e em grupo no CAPSi de Ouro Preto. O serviço inicia as suas ati vidades em parcerias com as Secretarias de Educação e Assistência Social e os Conselhos Tutelar e Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA). Sendo assim, possibilitou-se a am- pliação com o trabalho em grupo e diversifi cado. Em consonância com as diretrizes do Ministério da Saúde, o mu- nicípio vem desenvolvendo uma políti ca de consolidação do CAPS e de implantação do CAPSi, o que permite concluir que o município, nesse novo modelo de gestão, acompanha a evolução que vem ocorrendo na Clínica e na Políti ca para lidar com o sofrimento psíquico, consti tuindo- se em uma experiência inédita na história dos CAPS, conforme pode-se verifi car nos resultados obti dos no serviço, com as ati vidades oferecidas aos usuários, a forma de tratar e lidar. Esta proposta é inovadora, com atendimento multi disciplinar e in- terdisciplinar entre os profi ssionais dentro e fora dos serviços em outros espaços da comunidade, na sede e nos distritos. Entre eles, as escolas, o Posto da Saúde da Família (PSF), a Secretaria de Assistência Social e a Secretaria de Educação com diversos dispositi vos. A Reforma Psiquiátrica aparece como movimento constantemen- te em construção. Inclusive nos novos serviços substi tuti vos, onde as relações de poder ainda dão espaço para a dominação de uma disci- plina sobre as outras e de todas as disciplinas envolvidas (Psiquiatria, Psicologia, Terapia Ocupacional, Serviço Social, Enfermagem, artesão, arti stas, entre outras).Como lidar com as diferenças e a loucura? O saber de cada profi ssional? As interpretações dos usuários, da família e da escola? caminhos para inclusão.indd 126caminhos para inclusão.indd 126 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 Caminhos da INCLUSÃO | 127 A Saúde Mental brasileira, nas duas últi mas décadas, passou por transformações através de avanços que consti tuíram e consti tuem o pro- cesso contemporâneo de atendimento. Programam-se e criam-se dispo- siti vos com novas estratégias nos serviços de Saúde Mental. Na perspecti va de ampliação do objeto de intervenção proposto pela Reforma Psiquiátrica, o trabalho ganha novos contornos como, por exemplo, a necessidade de que a esse objeto redesenhado, reconstruído, correspondam novos instrumentos e mecanismos. Nesse senti do, que aconteçam algumas modifi cações nas práti cas terapêuti cas. OBJETIVOS • Possibilitar o atendimento integral à infância e adoles- cência na Saúde Mental. • Acompanhar os usuários do serviço de Saúde Mental na educação e na família. • Desenvolver ati vidades nos diversos espaços da comuni- dade em parceria com os outros setores. • Ampliar as ati vidades em grupo. • Criar estratégias para o atendimento interdisciplinar. • Realizar acolhimento em grupo. • Introduzir conceitos da Análise Insti tucional que possam colaborar nas práti cas educacionais, objeti vando um sa- ber e um fazer que venham de encontro às difi culdades que a Educação Inclusiva se depara constantemente. • Defl agrar processos de autoanálise e autogestão nos co- leti vos educacionais. • Proporcionar um melhor entendimento nos processos de interação humana e no funcionamento social. DESENVOLVIMENTO As ati vidades no serviço de Saúde Mental, no CAPSi em Ouro Preto, vêm sendo realizadas pelos profi ssionais da área de Saúde e Educação. Hoje, a equipe é formada por 2 Psicólogos, 1 Psiquiatra, 1 Fonoaudiólogo, caminhos para inclusão.indd 127caminhos para inclusão.indd 127 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 128 1 Pedagogo, 1 Terapeuta Ocupacional, 1 Coordenador, 3 Administrati vos, 2 estagiários do programa Jovens de Ouro e 3 estagiários do curso de Medicina, 1 estagiário de Terapia Ocupacional e 1 Enfermeiro. Desenvolve-se o projeto Saúde Mental na Educação com visitas periódicas nas escolas da sede e dos distritos e com a parti cipação nas ati vidades de grupo dos professores e gestores. É elaborado um estudo de caso para discussão de, por exemplo, como abordar a família; como intervir nas situações de agressividade do aluno na escola; como proceder com o aluno que apresenta difi culdades de aprendizado; como encaminhar o aluno com transtorno de conduta de comportamento, etc. para o serviço especializado. Com esse objeti vo, no presente trabalho, os profi ssionais, buscam sumariar algumas das dicas que podem auxiliar os professores do Ensi- no Básico no ensino de alunos com necessidades educacionais especiais, principalmente, com transtornos. Todavia, é aqui que residem as maiores difi culdades do professor, ao lidar com alunos com transtornos: os professores não possuem o co- nhecimento específi co, muitas vezes, desconhecem a legislação da Edu- cação Inclusiva e precisam saber como eles aprendem. Os professores aprenderam a reproduzir o conhecimento de uma só maneira, desejando que ele nos seja regurgitado de uma mesma for- ma, igual ao que oferecem aos alunos; e mais, que esse conhecimento, supostamente ensinado, nos retorne, ao mesmo tempo e com a mesma velocidade, nas provas e testes escolares. É comum que os professores tornem-se ansiosos em relação ao aprendizado do aluno. Cada aluno aprende ao seu modo e manifesta o conhecimento à sua maneira, ao seu tempo e de acordo com sua vontade e prazer. Reconhecer isso requer grande esforço, visto que contraria o modo condicionado de pensar a educação. Historicamente, aprende-se que é o professor o de- tentor do conhecimento, e desti tuí-lo desse poder implica numa aparente perda de status. No entanto, essa perda é apenas aparente, visto que o professor aprende muito com o aluno, inclusive como ensiná-lo. Destarte, cumpre-se com a verdadeira função do professor, que vai muito além de ensinar as primeiras letras, as primeiras contas, os primei- ros desenhos e o primeiro signifi cado da palavra amor. Entender isso, que esses alunos podem de fato ensinar ao profes- sor é, portanto, romper barreiras ati tudinais – historicamente produzidas caminhos para inclusão.indd 128caminhos para inclusão.indd 128 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 Caminhos da INCLUSÃO | 129 – que limitam e mesmo impedem esses alunos de alcançarem os níveis mais superiores da educação e sua completude como cidadãos plenos e humanos na sociedade. Mais que oferecer um conjunto de orientações de como ensinar ao aluno com necessidades educacionais especiais, o projeto objeti vou trazer princípios com os quais o profi ssional pode fortalecer-se no ensino para todos, assim como lidar com as parti cularidades apresentadas por eles. Esses princípios norteadores da escola para todos devem ser vivi- dos, mais do que aprendidos. A metodologia uti lizada neste processo de intervenção interseto- rial na educação visa primeiramente identi fi car as difi culdades em duas fases disti ntas: uma cogniti va e outra relati va à subjeti vidade do aluno. Com esta contribuição e as especifi cidades dos problemas, uma lei- tura com abordagens da teoria com a práti ca faz surgir as parti cularida- des do sujeito para além das demandas identi fi catórias propostas pelos especialistas da educação. Nos espaços do CAPSi também são realizadas ati vidades semanais de grupo com as famílias e de psicomotricidade com as crianças e com os adolescentes, como as ofi cinas de artes, grupo de leitura, grupo de ati vidades sensoriais, entre outras. As ati vidades em grupo, sempre com mais de um profi ssional e de especialidades diferentes, podem intervir com seus saberes e favorecer o atendimento adequado, atendendo as necessidades de cada um. A escuta é um dos recursos muito uti lizados na Saúde Mental pe- los profi ssionais e de grande importância. Foi interessante nas ati vidades com os profi ssionais da educação e nos outros grupos com a atenção primária, nos PSF, aprender a escutar o que a próprio aluno, ou o usuário (paciente) ou a família, tem a dizer sobre a sua difi culdade. Isso é o que possibilita não apenas a elucidação de elementos de subjeti vidade ou de senti do inconsciente, acrescendo o mínimo de signifi cação que deve ter, como também a invenção de um método de intervenção [2]. Sendo assim, introduziu-se um instrumento de investi gação dos processos pedagógicos com as especialidades clínicas, na construção de um equipamento terapêuti co e de intervenção. É fundamental a constru- ção dos laços afeti vos para a efeti vação das intervenções, seja individual ou em grupo. Com o trabalho de reinserção, a criança e o adolescente passam a caminhos para inclusão.indd 129caminhos para inclusão.indd 129 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 130 fazer parte deste processo educacional e social da clínica de Saúde Men- tal. Uma das técnicas uti lizadas neste projeto de Saúde Mental na Edu- cação foi o Esquizodrama como instrumento de discussão e expressão. Uma estratégia educacional a parti r da análise insti tucional no serviço. A Esquizoanálise que, para Guatt ari, tem como principal característi ca a liberdade de inventar, criar, senti r, sempre irrepetí vel, numa dinâmica singular que tem infl uenciado diversas áreas do saber desde então. O Esquizodrama, segundo Baremblitt , em suma, esquizodramati zar consiste em desmontar o que não funciona (para a vida de todos) e inten- sifi car o que funciona com essa fi nalidade [2]. Este projetoprocura atender às especifi cidades da clínica com a parceria da educação. Busca-se uma compreensão dessas duas modali- dades para o entendimento de ambos no processo de Ensino-Aprendiza- gem destes alunos que apresentam necessidades educacionais especiais. Segundo a Declaração de Salamanca, de 1994 [3]: - Toda pessoa tem direito fundamental à educação, e deve ser dada à oportunidade de ati ngir e manter o nível adequado de aprendizagem; - Toda pessoa possui característi cas, interesses, habilida- des e necessidades de aprendizagem que são únicas; - Os sistemas educacionais devem ser designados e programas educacionais devem ser implementados no senti do de se levar em conta a vasta diversidade de tais característi cas e necessidades; - Aqueles com necessidades educacionais espe- ciais devem ter acesso à escola regular, que deve acomodá-lo dentro de uma pedagogia centrada no aluno, capaz de sati sfazer a tais necessidades; - Escolas regulares que possuam tal orientação inclu- siva consti tuem os meios mais efi cazes de combater ati tudes discriminatórias criando-se comunidades aco- lhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcan- çando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efeti va à maioria das pessoas e aprimoramento à efi ciência e, em últi ma instância, o custo da efi cácia de todo o sistema educacional. caminhos para inclusão.indd 130caminhos para inclusão.indd 130 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 Caminhos da INCLUSÃO | 131 Figura 1. Grupo interdisciplinar. Figura 2. Grupo de Família. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para que uma Políti ca de Saúde seja coesa e alcance resultado po- siti vo, diversos fatores compõem a atenção integral ao usuário de Saúde Mental como a intersetorialidade, a atenção integral, a prevenção e a promoção. Sabe-se que todas as pessoas são merecedoras de tratamen- tos especiais na sociedade, ou seja, nelas há de se identi fi car uma relação direta entre a sua individualidade e suas necessidades específi cas. Todo esse processo tem como fi nalidade aproximar o educador de recursos de extrema relevância e perti nência se uti lizados com a perspi- cácia necessária, transformando as ações do Ensino-Aprendizagem mais favoráveis no desenvolvimento dos alunos que necessitam de um acom- panhamento especializado. É importante que não haja discriminações. Na interdisciplinaridade, o que está em questão é um novo saber gerado pelo trabalho conjunto, coleti vo, parti cipati vo das diversas espe- cifi cidades em cada intervenção. Assim, torna-se possível uma éti ca co- mum, consti tuindo um olhar transdisciplinar do Saber. Durante o desenvolvimento do projeto, os professores e gestores e os pro- fi ssionais da saúde, parti ciparam das ati vidades propostas nos grupos e consegui- ram identi fi car o problema com um novo olhar. Criaram diferentes maneiras para representar e solucionar os problemas emergentes de sala de aula, de forma que seja garanti do o aprendizado do aluno e a implantação da Educação Inclusiva. Com este trabalho, reduz-se a demanda no serviço de Saúde Men- tal, no CAPSi, relacionada às difi culdades de aprendizado e, em alguns casos, passam a ser uma consequência dos transtornos já identi fi cado. Sabe-se que o trabalho em grupo necessita de um tempo para a cons- caminhos para inclusão.indd 131caminhos para inclusão.indd 131 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 132 trução das relações pessoais e para que obtenha os resultados esperados. Esta iniciati va dos profi ssionais da Saúde Mental em desenvolver ações na educação é muito positi va e pode obter bons resultados com a interdisci- plinaridade e intersetoriedade, ou seja, com os diferentes saberes. Esta perspecti va, ao mesmo tempo em que amplia suas possibilida- des de ação, desafi a-o a se relacionar com as outras áreas, com o usuário e a família, não apenas restrita aos problemas específi cos de uma única ins- ti tuição educacional ou de uma especialidade. Saber trabalhar em equipe torna-se essencial na construção de soluções e práti cas coleti vas. A ação do profi ssional contribuiu para a conscienti zação de papéis, funções e res- ponsabilidades dos parti cipantes das complexas redes interati vas que per- meiam o contexto escolar e insti tucional, da saúde e da educação. A intervenção é a ação transformadora prati cada segundo uma éti - ca e uma políti ca e formalizada em uma teoria aplicada segundo certas regras metodológicas e uma série de recursos técnicos [2]. Todo este pro- cedimento parte de uma avaliação logísti ca de disponibilidades e é plani- fi cado segundo uma estratégia que se decompõe em táti cas. Seu objeti vo central é propiciar nos coleti vos intervindos a ação do insti tuinte. A construção de uma políti ca pública voltada para a população de crianças e adolescentes conti nua sendo um dos maiores desafi os para o campo da Saúde Mental. Desenvolver um trabalho em rede é uma das necessidades estratégicas para a consolidação de uma políti ca pública para este segmento no município. REFERÊNCIAS [1] Brasil. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Edu- cação Nacional. Diário Ofi cial [da República Federati va do Brasil], Brasília, dez. 1996. [2] Baremblit G. Compêndio de Análise Insti tucional e outras correntes. 5ª ed. Belo Ho- rizonte - MG: Insti tuto Felix Guatt ari; 2002. [3] Conferencia Mundial da educação especial. Declaração de Salamanca. Salamanca, Espanha, 1994. [4] Ribeiro RCF. Ofi cinas e redes sociais na reabilitação psicossocial. In: C. M. Costa & A. C. Figueiredo (Orgs.). Ofi cinas terapêuti cas em saúde mental: Sujeito, produção e cida- dania. Rio de Janeiro; 2004. 105p [5] Ministério da saúde. Caminhos para uma Políti ca de Saúde Mental Infanto-juvenil. Brasília/DF: Editora MS; 2005. caminhos para inclusão.indd 132caminhos para inclusão.indd 132 23/8/2011 11:02:2323/8/2011 11:02:23 HANSENÍASE: UM OLHAR PSICOSSOCIAL Nonato Márcio Custódio Maia Sá1, Adriana Valery de Oliveira Sá2 INTRODUÇÃO A hanseníase é uma doença sistêmica dermatoneurológica infec- ciosa, transmiti da de pessoa para pessoa através do convívio com doen- tes das formas contagiantes (virchowiana ou dimorfa) sem tratamento. Apresenta sinais e sintomas clínico-neurológicos específi cos caracterís- ti cos de cada uma das formas clínicas em que pode se apresentar esta enfermidade [1,2,3]. Ressalta-se que a Molésti a de Hansen (MH) é uma doença de evo- lução lenta. Caracteriza-se por manifestações dermatológicas e neuroló- gicas. Acomete os nervos periféricos dos membros e da face, promoven- do, após longa evolução, perdas de funções sensiti vas e motoras. Pode causar deformidades permanentes nos mais variados graus, muti lações, limitações fí sicas, psicossociais e incapacidade grave, principalmente, nos casos de diagnósti co tardio e tratamento inadequado [3]. A doença pode ati ngir prati camente todos os órgãos e sistemas onde haja macrófagos, exceto o sistema nervoso central. Evolui de forma crônica, podendo apresentar períodos de agudização denominados rea- ções. É potencialmente incapacitante e, embora curável, seu diagnósti co causa grande impacto psicossocial, pelos preconceitos e esti gmas que a envolvem [4]. O Bacilo de Hansen tem um tropismo especial pelos nervos peri- féricos, ati ngindo desde as terminações da derme aos troncos nervosos, podendo gerar, nas mãos, garra ulnar e medial e punho caído e, nos pés, garra nos dedos e pé caído. Estas manifestações podem ser acompanha- das de dor intensa, hipersensibilidade do nervo, edema, défi cit motor e sensiti vo, acarretando, após longo período de evolução, deformidades, incapacidades e muti lações [5]. 1 Terapeuta Ocupacional, doutorando em Doenças Tropicais (UFPA/UEPA), professor Assistente II do Depar- tamentode Terapia Ocupacional da UEPA. 2 Terapeuta Ocupacional da Secretaria de Estado de Assistência e Desenvolvimento Social (SEDES), especia- lista em Saúde Pública. caminhos para inclusão.indd 133caminhos para inclusão.indd 133 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 134 É uma doença que pode afetar pessoas de todas as idades e ambos os sexos, no entanto, raramente ocorre em crianças. Há uma incidência maior da doença nos homens do que nas mulheres, na maioria das regi- ões do mundo. [5] Além das condições individuais, outros fatores relacionados aos ní- veis de endemia e às condições socioeconômicas desfavoráveis – assim como condições precárias de vida e de saúde e o elevado número de pessoas convivendo em um mesmo ambiente – infl uem no risco de ado- ecer. [6] ASPECTOS HISTÓRICOS A hanseníase é conhecida como uma doença cuja história remete as leis prescritas por Deus na Bíblia Sagrada. Esses registros podem ser observados no livro de Levíti co, capítulos 13 e 14, respecti vamente, os quais tratam das leis acerca da lepra e do leproso depois de sarado [7]. Mais amplamente conhecida pela designação de lepra, parece ser uma das mais anti gas doenças que acomete o homem e acredita-se que seja originária da Ásia [8]. De acordo com Opromolla [9], “é difí cil afi rmar, com certeza, a época do aparecimento de uma doença baseada em textos anti gos, a não ser que haja uma descrição razoável da mesma com citações dos as- pectos que lhe são mais característi cos. Se não for assim, confi ar apenas em dados fragmentários e em suposições dos tradutores desses textos, o assunto se torna confuso e gera uma série de falsas interpretações”. Ressalta-se a difi culdade de encontrar, nos textos anti gos, uma descrição clara e precisa dos aspectos clínicos da doença, possibilitando algumas confusões a respeito de sua história e evolução ao longo do tempo em diferentes regiões do mundo. Em que pese às conjecturas textuais anti gas, autores avançam em discussões sobre a regiao onde se originou a molésti a da lepra [10]. Nesse senti do, a África é considerada como berço desta doença. Porém, ainda hoje se discute se a hanseníase é de origem asiáti ca ou africana. Embora conhecida há muitos anos na Índia, China e Japão, no Egito já existi am registros de 4.300 anos a.C. [11]. Há, também, evidências objeti vas da doença em esqueletos desco- caminhos para inclusão.indd 134caminhos para inclusão.indd 134 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 Caminhos da INCLUSÃO | 135 bertos no Egito, datando do segundo século antes de Cristo [10]. Skinsnes [12] ressalta que uma das mais autênti cas descrições da hanseníase é encontrada no manuscrito chinês inti tulado “Remédios secretos comple- tos”, escrito por volta de 190 a.C., no qual se encontra a descrição de uma doença que provocava a perda de sensibilidade e o aparecimento de manchas vermelhas que inchavam e depois se ulceravam, ocorrendo em seguida queda de sobrancelhas, cegueira, deformidade nos lábios, rouquidão, ulceração das plantas dos pés, desabamento de nariz e deslo- camento de arti culações. Segundo Opromolla [13], admite-se que a hanseníase era desco- nhecida na Europa na época de Hipócrates (467 a.C). Acredita-se que o exército de Alexandre o Grande, ao retornar da Europa após conquistar o mundo então desconhecido, possa ter trazido indivíduos contaminados da Índia (300 a.C.). Aretaeus e Galeno, por volta do ano 150 d.C, fi zeram referências a doença, embora fosse bastante conhecida na Grécia. Segundo Jopling e McDougall [8], da Grécia a doença de Hansen foi gradati vamente alcan- çando a Europa por intermédio de soldados infectados, comerciantes e colonizadores, tornando-se mais prevalente entre os séculos X e XV. O primeiro trabalho sobre a doença, inti tulado “Terapêuti ca de Afec- ções Crônicas”, designa a hanseníase como elephas ou elefantí ase. Esta obra fala sobre a semelhança da pele doente à pele do elefante, que é es- pessada. Nesta mesma obra foi introduzido o termo facies leonina para de- signar o aspecto da face do paciente, infi ltrada pela patologia. Nesta obra, nota-se um conhecimento avançado a respeito da hanseníase virchowiana, sem, contudo, fazer referências a distúrbios de sensibilidade [13]. O termo lepra absorveu, então, outras designações da doença como elefantí ase. Daniellsen e Boeck [14] comentam que a palavra le- pra era usada para designar diferentes patologias cutâneas, uma vez que os médicos anti gos não ti nham conhecimentos mais precisos sobre as doenças dermatológicas. Para se ter uma ideia doenças como o líquen, a psoríase, a escabiose, o impeti go e a hanseníase eram agrupadas na mesma categoria. Registros da Idade Média apontam que [10] a hanseníase teve alta incidência na Europa e Oriente médio. De acordo com Pinto [15], “os médicos medievais consideravam a lepra simultaneamente uma doença caminhos para inclusão.indd 135caminhos para inclusão.indd 135 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 136 contagiosa e hereditária, ou oriunda de uma relação sexual consumada durante a menstruação”. Para Opromolla [13], há referências de que a hanseníase existi a em muitos outros lugares da Terra durante a anti guidade. Porém, o fato é que esses registros mais anti gos revelaram traduções errôneas de ter- mos designando diferentes molésti as. Há, também, registros históricos da chegada da hanseníase em ter- ras brasileiras. Eidt [16] sugere que a hanseníase entrou no Brasil por vá- rios pontos do litoral, trazida pelos primeiros colonizadores portugueses, ou açorianos, os quais colaboraram para sua disseminação. Ressalta-se ainda que outros povos europeus também contribuíram para o avanço da doença no território brasileiro. No Brasil, os primeiros casos da doença foram noti fi cados no ano de 1600, na cidade do Rio de Janeiro, onde, anos mais tarde, seria criado o primeiro lazareto, local desti nado a abrigar os doentes de Lázaro, laza- rentos ou leprosos [10]. De acordo com Maurano [18], após a introdução da molésti a por di- versos pontos da costa brasileira, a infecção teria acompanhado a marcha da colonização. De Pernambuco, um dos mais anti gos centros da agricul- tura usineira, teria a hanseníase se estendido à Paraíba e a Alagoas de- vido ao desenvolvimento agrícola dessas regiões. E ao Ceará, Maranhão, Pará e Amazonas por ocasião da ocupação desses Estados. Esses são alguns registros da trajetória histórica da hanseníase. A trajetória da doença não para por aqui. Outros fatos e acontecimentos são verifi cados no mundo e nas diferentes regiões do Brasil. Este cenário contribuiu para a evolução de avanços na administração, manejo e con- trole da doença, mas, distante de alcançar a tão esperada erradicação. O OLHAR PSICOSSOCIAL A hanseníase, ao longo de sua história, mostrou-se uma temáti ca polêmica, pois esteve, em vários momentos, permeada por valores so- cioculturais controversos. Entende-se que muitos desses valores consti - tuíram uma expectati va de como deveriam viver os hansenianos ou, até então, leprosos. A segregação, o isolamento, o esti gma, ou até mesmo o medo, fi zeram parte dessa trajetória histórica [6]. caminhos para inclusão.indd 136caminhos para inclusão.indd 136 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 Caminhos da INCLUSÃO | 137 Nesse contexto, pode-se dizer que um inimigo poderoso da pes- soa com hanseníase, além da própria doença, é o preconceito. A doença carrega consigo a marca do preconceito, discriminação e exclusão social desde o seu surgimento. Sabe-se que durante um longo tempo os indi- víduos foram rejeitados pela sociedade, família e amigos e condenados a viver em total situação de privação, perdendo o contato com o mundo externo para evitar a contaminação [6]. Atualmente, as pessoas acometi das pela doença nãonecessitam mais de internação. No passado, em consequência da inexistência de medicamentos efi cazes, era imprescindível a internação da pessoa com hanseníase. No momento em que eram diagnosti cadas como “leprosas”, as autoridades de saúde providenciavam o encaminhamento para ins- ti tuições afastadas das cidades, onde prati camente perdiam o contato com a sociedade, denominadas de “leprosários” [19]. No Brasil, até 1969, o tratamento para a hanseníase ou Lepra con- sisti a no isolamento de doentes em colônias de leprosos. Em 1986, as colônias foram “reestruturadas”. Porém, após anos de confi namento, sem estrutura familiar, fi nanceira ou orgânica, a maioria dos pacientes permaneceu nesses lugares [20]. Embora atualmente a hanseníase tenha tratamento e cura, o es- ti gma e o preconceito permanecem enraizados em nossa cultura. Essa realidade cria obstáculos para o indivíduo no enfrentamento da doença, remetendo essas pessoas ao tabu da morte, muti lação e incapacidade. Em consequência, acarreta sérias repercussões na vida pessoal e pro- fi ssional da pessoa com hanseníase: medo, preconceito, senti mento de exclusão, baixa autoesti ma, comprometi mento do auto-conceito e autoi- magem [5,6]. A hanseníase é uma patologia que ultrapassa a necessidade de um olhar apenas biológico ou médico. As consequências sociais e psicológi- cas revelam à necessidade urgente de se promover uma atenção voltada para um olhar holísti co, integral e não dicotomizado ou unilateral [6]. Entender a hanseníase apenas como um bacilo signifi ca reduzir a capacidade de pensar críti ca e refl exivamente aspectos de elevada im- portância para o tratamento da pessoa acometi da pela doença. Sabe- se que os conhecimentos da microbiologia são de extrema importância. Porém, faz-se necessário a compreensão do ser humano como um todo. caminhos para inclusão.indd 137caminhos para inclusão.indd 137 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 138 Como se faz necessário, também, imprimir um olhar capaz de enxergar as múlti plas dimensões que envolvem o problema da hanseníase. Um olhar sensível para as questões psicossociais da hanseníase. Um olhar que autenti ca e redimensiona uma perspecti va inclusiva, descaracteri- zando, defi niti vamente, o caráter de exclusão que, durante séculos, foi atrelado à doença [19, 20, 21]. Sobre a questão do preconceito que permeia o contexto das pes- soas acometi das pela hanseníase, Borenstein [19] comenta que ele surge devido à falta de esclarecimento no âmbito geral da população. De um modo geral, levando-se em consideração as diferenças biop- sicossociais, pode-se esperar dois ti pos de reações do indivíduo acome- ti do pela doença: a ausência de esclarecimento do que é a hanseníase; e a associação imediata que se faz com a lepra e com todo seu contexto sociocultural. Não se deve esquecer que a história da pessoa com hanse- níase foi marcada pela exclusão, preconceito e medo [22]. E, em muitos casos, pela perda gradati va da parti cipação social, principalmente marca- da pela discriminação. As consequências nos aspectos sociais e psicológicos que envolvem a hanseníase demandam uma atenção global, cuja assistência deve ultra- passar a visão reducionista, primando por uma visão biopsicossocial do indivíduo [22]. Nesse cenário, outro aspecto relevante diz respeito ao que Cunha [22] comenta: a falta de esclarecimento sobre o modo de transmissão, controle e cura da Hanseníase, bem como o medo da exclusão social, contribui signifi cati vamente para que a doença conti nue sendo temida ao longo dos tempos, e marcada por uma série de difi culdades em lidar com o esti gma imposto a essa enfermidade. Segundo Baialardi [6], o esti gma revela-se como sendo um fenô- meno real, que pode acometer o indivíduo nos aspectos fí sicos, psicoló- gicos, sociais e econômicos, além de representar o conjunto de fatores como crenças, medos, preconceitos, senti mento de exclusão que ati nge as pessoas acometi das pela hanseníase. Para Eidt [16], o esti gma e o preconceito estão relacionados à vi- são histórica de ameaça e de morte da hanseníase que permanecem no imaginário da sociedade, sujeitando os indivíduos ao medo da morte e muti lação. Essa compreensão pode provocar sofrimento psíquico às pes- caminhos para inclusão.indd 138caminhos para inclusão.indd 138 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 Caminhos da INCLUSÃO | 139 soas acometi das pela doença, além de sérias repercussões na vida social e profi ssional. Com relação ao auto-esti gma, Garcia [22] revela que o seu surgi- mento se dá a parti r de situações semelhantes ao esti gma. O autor asse- vera que o próprio sujeito hanseniano passa a não se aceitar, rejeitando- se e negando-se. Como consequência, enfrenta seu problema afastando- se do convívio social ou, em outras situações, aproximando-se de pesso- as acometi das pela doença na tentati va de comparti lhar seu processo de adoecimento, trocando experiências. No âmbito do esti gma e preconceito, cabe direcionar o olhar psicos- social para uma concepção baseada nos princípios da inclusão. O olhar inclusivo sobre a pessoa com hanseníase é um olhar que demonstra uma justa preocupação com o ser defi ciente, mas, sobretudo, o ser cidadão, o ser humano. Esse olhar sensibiliza-se com as diferenças, acolhe o medo, a angústi a, a frustração, na perspecti va de transformar a realidade pre- conceituosa imposta a essa parcela da sociedade. Inclusão é uma palavra rica, que envolve compreensão, um novo olhar para o outro e, sobretudo, um novo olhar para nós mesmos. A in- clusão social defende simultaneamente a igualdade e as diferenças. Po- rém, com o entendimento de que a igualdade se refere à dignidade e aos direitos, e de que as diferenças se referem à singularidade de cada ser humano. Todas as pessoas são iguais em dignidade humana e direitos. Cada ser humano é único em termos psicológicos, emocionais, fí sicos, in- telectuais, sociais, culturais etc. Esta singularidade implica que a socieda- de tradicional, para ser justa igualitária e inclusiva, deve ser modifi cada para acolher e contemplar as diferenças individuais [24]. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) afi rma, nos seus dois primeiros arti gos, os grandes princípios que sustentam até hoje a ideia de direitos humanos: liberdade, igualdade, fraternidade e diversidade [24]. Teoricamente, as pessoas com hanseníase usufruem os mesmos di- reitos que os demais cidadãos. Mas a discriminação por elas enfrentada, resultado de longo processo, histórico, de exclusão, faz desse grupo da população um dos mais vulneráveis da sociedade atual. A inclusão da pessoa com hanseníase deve consti tuir um dos mais árduos desafi os da sociedade hodierna. Deve parti r de práti cas inclusivas em todas as áreas de direitos. caminhos para inclusão.indd 139caminhos para inclusão.indd 139 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 140 No entanto, o processo de construção dos direitos humanos das pessoas com hanseníase, assim como o de outros grupos discriminados da população, não começa com a legalidade de textos, mas com a legi- ti midade de ações de pessoas e grupos organizados que, por meio da pressão social, reivindicam direitos humanos e impulsionam a mudança, adequação e implementação da legislação. Essa é a essência da nova ci- dadania reivindicada, vivenciada, exercida e prati cada por pessoas e mo- vimentos sociais em todo o mundo. CONSIDERAÇÕES FINAIS O esti gma na hanseníase se efeti vou a parti r do isolamento social que envolveu a doença. Nos dias atuais é evidenciado através do cla- ro preconceito que acomete as pessoas com hanseníase, que preferem manter-se caladas a respeito do diagnósti co e ocultar seu corpo, na ten- tati va de esconder a doença, para evitar a rejeição e o abandono. As in- capacidades eas deformidades fí sicas também fazem parte do coti diano, e contribuem para que os indivíduos com a doença se sintam envergo- nhados frente à sociedade. Essa mesma sociedade, por sua vez, pode entender suas sequelas como fonte de contágio e rejeição [19]. A hanseníase foi acompanhada por um forte esti gma desde os mais remotos tempos, e deixou marcas sociais e culturais até os dias atuais. Por isso, é importante lembrar que, associado ao preconceito social das pessoas com defi ciência, a pessoa curada da hanseníase, mas que per- manece com a sequela da doença, fi ca duplamente esti gmati zada. “Bacurau”, um dos fundadores do MORHAN, declarou em um con- gresso internacional de hanseníase em Orlando, EUA, em 1993, o seguin- te: “(...) perder um dedo da mão numa guerra, por exemplo, pode trazer orgulho; mas se for por causa da hanseníase, marginaliza. Apertar a mão que perdeu um dedo na guerra é uma coisa; apertar a mão que perdeu um dedo por causa de uma doença contagiosa é outra. A mão de um “guerreiro” é diferente da mão de um “leproso”, mesmo que o trauma fí sico seja igual (...) [25].” Sob a perspecti va histórica da hanseníase, percebe-se a necessida- de de imprimir uma leitura críti ca, refl exiva e contextualizada das múl- ti plas dimensões e visões que envolvem homem, mundo e sociedade. caminhos para inclusão.indd 140caminhos para inclusão.indd 140 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 Caminhos da INCLUSÃO | 141 Essa perspecti va possibilita desenvolver um imaginário que traduz uma diversidade de interpretações acerca da doença. O olhar histórico contri- bui para revelar as demandas, as carências e as necessidades da pessoa acometi da pela hanseníase, tornando-se úti l na construção de uma con- cepção que resgata o passado, compreende o presente e projeta-se para o futuro. A perspecti va histórica potencializa o olhar da doença e sobre a doença, à medida que repousa sobre o imaginário humano uma mul- ti plicidade de conceitos e preconceitos em torno da hanseníase. Desse modo, o olhar psicossocial sobre a enfermidade vai além do imaginário, perpassando pelo olhar histórico-concreto, real e tangível, ou seja, o es- ti gma, o pré-conceito, a segregação, a muti lação do “eu”. Nesse senti do, o olhar psicossocial possibilita o desenvolvimento da impressão e interpretação de marcas indeléveis deixadas nas pessoas acometi das pela hanseníase, suscitando mudanças e transformações que envolvem o ser biopsicossocial e espiritual. Isto é, um olhar biopsicosso- cial contribui inexoravelmente para o exercício de práti cas terapêuti cas mais humanizadas. REFERÊNCIAS [1] Talhari S, Neves RG. Hanseníase. 3ª ed. Manaus: Gráfi ca Tropical; 1997. [2] World Health Organizati on [WHO]. Leprosy: global situati on. Wkly Epidemiol Rec 2000, 75 : 226 - 31. [3] Sampaio SAP, Rivitti EA. Dermatologia. 3ª ed. São Paulo: Artes médicas; 2007. [4] Azulay RD. Micobacterioses. In: ______. Dermatologia. 5ª ed. Rio de Janeiro: Guana- bara Koogan, 2008. p. 322-343. [5] Bergmo MA, Toldrá RC et al. Hanseníase: experiência de grupos terapêuti cos. VIII Encontro Lati no Americano de Iniciação Cienti fi ca e IV Encontro Lati no Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba. 2008 [6] Baialardi KS. O esti gma da hanseníase: relato de experiência em grupo com pessoas portadoras. Hansen Int. 2007; 32(1): 27-36. [7] Almeida. A Bíblia Sagrada. Revista e atualizada no Brasil. Barueri, São Paulo: Socie- dade Bíblica do Brasil; 1999. [8] Jopling WH, McDougall AC. Manual de hanseníase. 4ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Atheneu Editora; 1991. caminhos para inclusão.indd 141caminhos para inclusão.indd 141 23/8/2011 11:02:2423/8/2011 11:02:24 142 [9] Opromolla DVA. Noções de hansenologia. Bauru: Centro de Estudos Dr. Reynaldo Quagliato; 2000. [10] Brasil. Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989. Diário Ofi cial da União, Poder Execu- ti vo, Brasília, 25 de dez. 1989. [11] Serviço Nacional de Lepra. Manual de leprologia. Rio de Janeiro: Departamento Na- cional de Saúde; 1960. [12] Skinsnes O. Imunopathology os leprosy: the century in review. Internati onal Journal Leprosy, Washington, v. 42, p. 329-360, 1973. [13] Opromolla DVA. Noções de hansenologia. Bauru: Centro de Estudos Dr. Reynaldo Quagliato; 1981. [14] Danielsen DC, Boeck W. Traité de la Spédalskdhed. Paris: Chez. J.B. Bailliére; 1848. [15] Pinto PGHR. O esti gma do pecado: a lepra durante a Idade Média. PHYSIS – Revista de Saúde Coleti va, Rio de Janeiro, v. 5, n. 1, p. 131-144, 1995. [16] Eidt LM. O mundo da vida do ser hanseniano: senti mentos e vivências. [Disserta- ção] Porto Alegre - Faculdade de Educação da PUCRS. [17] Yamanouchi [18] Maurano F. Tratado de leprologia. Rio de Janeiro: Serviço Nacional de Lepra, 1944. V. 1 – História da lepra no Brasil e sua distribuição geográfi ca. [19] Borenstein MS, Padilha MI et al. Hanseníase: esti gma e preconceito vivenciados por pacientes insti tucionalizados em Santa Catarna (1940-1960). Revista Brasileira de Enfermagem: Brasília 2008; 61 [20] Faria AR. Hanseníase, experiência de sofrimento e vida coti diana num ex-leprosá- rio. Dissertação de Mestrado em Antropologia social. Universidade de Brasilia. Brasilia; 2009. [21] Gazabim ML, Carvalho FB. Considerações acerca da reabilitação psicossocial: aspec- tos históricos, perspecti vas e experiências. In Cavalcanti A, Galvão C. Terapia Ocupacio- nal: fundamentação e práti ca. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. [22] Garcia JRL et al. Considerações Psicossociais sobre a Pessoa Portadora de Hanse- níase. In: Opromolla DVA, Baccarelli R. Prevenção de Incapacidades e Reabilitação em Hanseníase. Bauru: Insti tuto Lauro de Souza Lima; 2003. p. 25-30. [23] Cunha AZS. Hanseníase: aspectos da evolução do diagnósti co, tratamento e contro- le. Ciência & Saúde Coleti va, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 235-42, 2002. [24] Sassaki RK. Inclusão: Construindo uma sociedade para todos. 7ª ed. Rio de Janeiro: WVA; 2006. [25] Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Defi ciência, 2006, Brasília. Subsí- dios para o conferencista. Caderno de Textos. Brasília, 2006. caminhos para inclusão.indd 142caminhos para inclusão.indd 142 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 AVALIAÇÃO DE ALUNOS NA SALA DE RECURSO MULTIFUNCIONAL: DISCUSSÕES EM TORNO DA ΈDISΉ NORMALIDADE José Anchieta de Oliveira Bentes1, Rita de Nazareth Souza-Bentes2 INTRODUÇÃO A concepção teórica que orienta este trabalho são os Estudos So- cioculturais da Defi ciência. Esses estudos fazem parte dos Estudos Cul- turais e questi onam os padrões de normalidades divulgados a respeito dos corpos e, por conseguinte, formulam proposições contra o discurso homogeneizador de ser humano [1]. O fato de ser contra o discurso homogeneizador implica o combate a qualquer modelo de corpo perfeito, que acaba por rejeitar as pessoas defi cientes. É com base nesse discurso que se pode entender o porquê das pessoas defi cientes serem avaliadas negati vamente nas escolas e na sociedade em geral. Explicando melhor: é como se esse discurso confi gurasse uma linha comparati va, estabelecendo padrões médios valorizados e dados des- viantes, os quais, por estarem nas extremidades, comporiam os excluídos na sociedade em função da normalidade. Alguns exemplos: a) No início do século XX, os padrões valorizados eram os do Quo- ciente de Inteligência. As pessoas normais estavam entre 90 a 110 de QI. Os que esti vessem abaixo eram caracterizados de idiotas, os que esti ves- sem acima desses valores eram caracterizados como brilhantes [2]. b) Na atualidade, conforme as informações das medidas dos principais modelos divulgados pela mídia, as medidas de altura das mulheres estão en- tre 1,73 a 1,79 m. Nos homens, a medida é quase igual: entre 1,72 a 1,80 m. A massa,nas mulheres, deve estar entre 48 a 59 kg; nos homens, deve estar entre 72 a 77 kg. O busto, nas mulheres, deve estar entre 82 a 89 cm; nos homens, entre 85 a 90 cm. 1 Doutor em Educação Especial, mestre em Linguística, docente da UEPA, anchieta2005@yahoo.com.br 2 Mestre em Educação, docente da UEPA e da SEDUC- PA, ritasbentes@yahoo.com.br caminhos para inclusão.indd 143caminhos para inclusão.indd 143 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 144 A cintura, nas mulheres, entre 62 a 70 cm; nos homens, entre 60 a 77 cm. O quadril bastante valorizado, além do busto, nas mulheres, deve estar entre 88 a 90 cm. Desta forma, quem está acima ou abaixo da massa, da altura, do tamanho dos bustos, da cintura ou do quadril está em situação inferiori- zada em relação aos padrões de beleza valorizados. d) Na atualidade pós-moderna, diversos grupos são discriminados: • mulheres – por conta da ideologia machista, que prega a superioridade do homem; • negros, os índios e as demais pessoas consideradas como minorias – que lutam contra a xenofobia e o racismo; • homossexuais – por conta das ideologias sexistas; • pessoas que não falam o padrão ‘culto’ – que é a língua insti tuída como ideal, ‘perfeita’, pura; • pessoas que professam religiões minoritárias e não ofi ciais e ainda aqueles que não professam nenhuma religião; • pessoas defi cientes – que podem ser excluídas pelos discursos capaciti stas que as consideram inaptas para qualquer ti po de trabalho, que as discriminam pelo seu jeito de ser, falar, aparência ou, geralmente, são invisibilizados – fi cam invisíveis aos olhos dos defensores das ideologias homogeneizadoras. Também podem ocorrer discriminação e exclusão em função do modelo de produção capitalista. A própria sociedade brasileira é caracte- rizada por exclusões abissais de natureza econômica. Do ponto de vista econômico, isto acontece, em parte, devido à ocorrência da “hegemonia do mercado da globalização do pensamento único – o grande poder he- gemônico do capitalismo neoliberal avassalador, que é o grande ‘deus’ contemporâneo e juiz de todas as verdades – liderado pelos países cen- trais e suas agências” [3]. Os excluídos são os explorados no trabalho, no processo produti vo, consti tuindo o ‘exército’ de desempregados à espera de um emprego e os ex- cluídos da cidadania são os “sem vez” e os “sem voz” na sociedade, resultan- te do apartheid social: as pessoas que passam fome ou se alimentam muito mal, as pessoas que não tem moradia e/ou vivem precariamente em áreas inundáveis sem infraestrutura, os adultos que vivem de esmola, as crianças que vivem pedindo dinheiro ou trabalhando para ter que sustentar a família, as mulheres que são obrigadas a se prosti tuir para poder sobreviver. caminhos para inclusão.indd 144caminhos para inclusão.indd 144 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 Caminhos da INCLUSÃO | 145 Em oposição às realidades expostas e rati fi cadas por discursos que estabelecem a segregação como, por exemplo, das pessoas defi cientes, tem-se os estudos socioculturais da defi ciência. Estes relacionam diver- sas áreas como a Sociologia, a Linguísti ca, a Pedagogia, a Antropologia e outras, com a ressignifi cação da concepção de corpo como o lugar da normalidade, criti cando quaisquer formas de preconceitos capaciti stas. O capaciti smo é um discurso generalizador que estabelece um ideal de pessoa, ao afi rmar que é melhor andar com duas pernas do que sobre uma cadeira de rodas, oralizar fl uentemente do que usar qualquer outro sistema de simbolização como a língua de sinais ou símbolos alternati vos, escrever orto- grafi camente do que usar símbolos do Braille, enfi m, ser uma pessoa confor- me um padrão de beleza e um padrão de inteligência estabelecido [4]. Para reverter esse discurso capaciti sta é preciso travar um deba- te transdisciplinar, discuti ndo o tema Identi dade e Diferença nas escolas para que um novo discurso contra a discriminação e o preconceito possa emergir e prosperar. Depois, é preciso centrar-se nas relações (de grupo) que legiti mam a desigualdade e nas relações dos que se opõem, por meio de textos e falas a serem trabalhadas em sala de aula, a fi m de se descobrir o que está implícito nos discursos. Centrar-se nas estratégias de manipulação, legiti mação, criação de consensos e outros mecanismos discursivos que infl uenciam a refl exão e as ações que promovem essas divisões e exclu- sões das pessoas com diferenças fí sicas, sensoriais e mentais. Para isso, a escola deve tratar das relações sociais de classe, gênero, língua, raça e diferença sensorial no seu currículo coti dianamente. Neste quadro teórico, a avaliação do aluno é um instrumento fun- damental na práti ca docente. Esse instrumento tem que servir para reco- nhecer as capacidades atuais do aluno e também para desenvolver novas potencialidades, é o que se pretende discuti r a seguir. PROPOSTA DE AVALIAÇÃO COM BASE NO DISCURSO DISNORMALIZADOR A proposta ora apresentada não pretende ser um instrumento nor- malizador, no senti do de estabelecer comparações entre um suposto aluno que tenha dicção, visão, audição, movimentos corporais e escrita ideais, e um aluno defi ciente, que é o aluno real. Se fosse essa a intenção, o ti po de avaliação seria para medir a quanti dade de acertos e erros, a parti r de questões ou informações solicitadas. Não se tem aqui essa intenção. caminhos para inclusão.indd 145caminhos para inclusão.indd 145 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 146 Pretende-se fazer constatações, que são discursos fl exíveis, que buscam a cienti fi cidade uma vez que se baseiam em evidências e fatos concretos e comprovados e não no senso comum. Algumas informações obti das com os familiares podem ainda refl eti r generalizações ou compa- rações com outras crianças. Neste caso, cabe ao professor discuti r formas de romper com essas representações normalizadoras e avançar em no- vas concepções: as Concepções Disnormalizadoras. A avaliação será feita em um quadro que permite identi fi car: a) as característi cas do aluno, os gostos e não gostos, os desejos e sonhos dos familiares para com esse aluno com defi ciência; b) os modos como o aluno se expressa e recepciona as informa- ções em uma interação com o professor – observam-se característi cas em relação à visão, à audição e ao movimento desse aluno; c) as sugestões que o avaliador pode fazer para desenvolver poten- cialidades e o que deve evitar nos ambientes escolares e familiares. A seguir, a proposta de avaliação: Quadro 1. Instrumento de avaliação do aluno na sala de recurso multi funcional FATORES OBSERVADO SUGESTÕES DE ATIVIDADES Necessidades e preferências do aluno e da família Uso da fala Uso da visão Uso da audição Uso do tato Uso da escrita Habilidade de movimentos Habilidade cogniti va Comportamentos de hiperati vidade Fonte: Adaptado de Cormedi e Silva [5]. A primeira parte, o item ‘a’ é feito com os familiares, por meio de um mapa de comunicação. Para Cormedi [5], “o mapa de comunicação mostra quais são os interesses dos (as) alunos (as), o que gosta e o que caminhos para inclusão.indd 146caminhos para inclusão.indd 146 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 Caminhos da INCLUSÃO | 147 não gosta [...], mostra também o desejo da família”. O enfoque não é somente no professor, naquilo que sabe planejar, mas “passa a ser no aluno, naquilo que ele precisa aprender e no que a família quer”. A seguir, a avaliação de duas alunas, a primeira é Ana, de 10 anos, que possui diagnósti co de Síndrome de Down. É estudante de uma escola municipal e parti cipa no “atendimento” na Sala de Recursos Multi funcio- nais, às quartas-feiras. A avaliação ocorreu com Ana e com a sua irmã, no dia 18 de agosto de 2010. Quadro 2.Avaliação da aluna Ana FATORES OBSERVADO SUGESTÕES DE ATIVIDADES Necessidades e Preferências do Aluno / Família Tem medo de cachorro, gato e macaco. Gosta de laranja, banana e maçã. Chama nome para a ti a. Sai de sala. Não gos- ta de fi car na cama. Gosta de bombom Trabalhar frutas e animais. Trabalhar situações de res- peito. Incenti var a alimentação saudável. Uso da Fala Oraliza poucas palavras. Difi cul- dade de se expressar. Usar pranchas comunicati vas. Conversar com a aluna, dar instruções. A expressão da aluna será principalmente pelo apontar e pelo uso de gravuras. Trabalhar com a pintura, uti li- zando ti nta a base d’água. Uso da Visão Não tem problemas visuais. Uso da Audição Não tem problemas auditi vos. Uso do Tato Usa o apontar. Identi fi ca e classifi ca imagens do corpo, de lugares, etc. Uso da Escrita Não escreve alfabeti camente. Consegue identi fi car fi guras. Habilidade de Movimentos Não tem difi culdade de andar. Gosta de correr. Corre pela escola. Trabalhar com ati vidades de tempo curto, que seja envol- vente. Ter várias ati vidades. Habilidade Cog- niti va Pouca concentração. Comportamentos de Hiperati vidade É extroverti da. Muito agitada. Em alguns momentos, agressi- va. Inquieta. Dispersa com faci- lidade (uns 30 segundos). Fonte: Esquema idealizado pelo autor. A aluna Ana, do Ciclo I, do 2o ano, tem muita difi culdade de se ex- pressar: sua forma de comunicação é por meio de identi fi cação de fi guras. caminhos para inclusão.indd 147caminhos para inclusão.indd 147 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 148 Algumas vezes, a aluna é muito dispersa, inquieta e agressiva, em outras vezes, aceita alguns comandos discursivos propostos pela professora. Sua tolerância é limitada com relação ao tempo didáti co. Por exem- plo, em ati vidades de leitura, o professor de Sala de Recurso solicitou que ela escolhesse um texto para ser lido. A aluna escolheu e entregou-o ao professor, que começa a ler. Dentro de trinta segundos, aproximada- mente, Ana puxa o livro da mão do professor e escolhe outro livro para ser lido, ou pega um brinquedo e se levanta, indicando que tem pouca tolerância em escutar histórias. Em um outro exemplo, na escola, a aluna corre pelas dependências e entra, por exemplo, na Secretaria ou fi ca no portão, meio aborrecida, aguardando a chegada do pai para buscá-la. Segundo o relato da profes- sora, depois do recreio, a aluna não aceita voltar para a sala. Ainda segundo a sua professora, a aluna não tem autonomia nas ati vida- des de pintura, colagem e de “amassar bolinhas” em sala de aula. A única coisa que faz sozinha é riscar as folhas do caderno. Se deixá-la sozinha, começa a fazer o que a professora chamou de “tolices” pela escola: correr, entrar na sala e na Secretaria para mexer em papéis e nas coisas que vê pela frente. As sugestões de ati vidades, postas no quadro 2, favoreceram a ex- pressividade e a recepti vidade da aluna, permiti ndo maior concentração e checagem sobre os seus saberes, comportamentos e desejos. Tais ati vi- dades foram realizadas na sala de recurso multi funcional, principalmen- te, com o uso dos recursos Pranchas de Comunicação Alternati va e Pintu- ra uti lizando ti nta a base de água. A segunda parti cipante, Lia, tem 19 anos, e apesar da idade, está no Ciclo I, 3o ano. A justi fi cati va da idade avançada para o primeiro ciclo é que começou a estudar muito tarde, há três anos, porque não ti nha cadeira de rodas para vir à escola. Este fato de não ter cadeira de roda é a razão do seu irmão não estudar ainda. Lia mora com o pai e o irmão em uma humilde casa, próximo da escola. O pai afi rma que não tem condições de trazer os dois fi lhos cadeiran- tes, por isso, ainda não o matriculou na escola. A avaliação de Lia é a seguinte: caminhos para inclusão.indd 148caminhos para inclusão.indd 148 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 Caminhos da INCLUSÃO | 149 Quadro 3. Avaliação da aluna Lia FATORES OBSERVADO SUGESTÕES DE ATIVIDADES Necessidades e Preferências do Aluno / Família Sorri com facilidade. Realiza as ati vidades com interesse. Uso da Fala Oraliza de forma incompreensível fazendo com que o interlocutor não a compreenda. Não consegue pronunciar completamente as palavras. Uso da Visão Vê bem. Usar o alfabeto manual. Uso da Audição Compreende a fala. Ouve bem. Oralizar para a aluna. Ela compreende. Uso do Tato Tem coordenação motora fi na com a mão esquerda. Uti lizar o teclado adaptado no computador. Uso da Escrita Copia com autonomia. Conhece as letras do alfabeto. Fica muito próxima do papel, fi ca curvada sobre a mesa. Fixar o papel na mesa para evitar que se movimente. Carteira adaptada. Habilidade de Movimentos É cadeirante. Movimenta o lado esquerdo. Não movimenta a cadeira de rodas. Realizar ati vidades de aprendizagem que movimente a cadeira de rodas. Habilidade Cogniti va Não tem nenhum comprometi mento cogniti vo. Comportamentos de Isolamento Não apresenta. Comportamentos de Hiperati vidade Não apresenta. Fonte: Esquema idealizado pelo autor. A aluna Lia desenvolve ati vidades com muito interesse, porque ela não tem comprometi mento cogniti vo, compreende bem os discursos, embora não oralize compreensivamente para o interlocutor: as pronún- cias das palavras não são entendidas. Por isso, usar o alfabeto digital e o teclado adaptado é uma proposta imprescindível para facilitar a sua aprendizagem. Aqui se percebe a importância desses instrumentos que não só aju- dam na aprendizagem como também facilitam os afazeres do coti diano caminhos para inclusão.indd 149caminhos para inclusão.indd 149 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 150 com mais autonomia. O problema da aluna não são suas peculiaridades no processo de apropriar-se do conhecimento, mas é o da necessidade de propor tecnologias que, efeti vamente, a ajudem a acelerar sua apren- dizagem para que seja compatí vel com sua idade e seja considerada no processo de avaliação escolar. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com efeito, os critérios de observação, sugestões de ati vidades são instrumentos discursivos e materiais importantí ssimos que revelam ao professor o modo como os alunos se manifestam nas suas formas singu- lares de linguagem. Esse quadro de avaliação permite ao professor, por meio desses cri- térios de caráter disnormalizador, elaborar um perfi l inicial de cada aluno e do entorno familiar no qual está inserido; além do que, as ati vidades propostas são refutadas ou aceitas, permiti ndo ao professor elencar um conjunto de ati vidades de natureza diversa, adaptáveis às condições dos alunos e mais propícias ao processo de Ensino-Aprendizagem. Tais ati vi- dades garantem, além das aprendizagens, o envolvimento dos professo- res e demais parti cipantes do processo com concepções diferentes e com novas expectati vas de vida, bem mais dignas e respeitáveis às pessoas nas suas condições específi cas de ser e de se expressar. REFERÊNCIAS [1] Bentes JAO. Formas do trabalho docente na educação de surdos: estudos históricos e de representações sociais. [Tese] São Carlos: Programa de Pós-Graduação em Educa- ção Especial da Universidade Federal de São Carlos, 2010. [2] Herrnstein R, Murray C. The bell curve. New York: Free Press; 1994. [3] Moita Lopes LP. Linguísti ca aplicada e vida contemporânea: problemati zação dos construtos que têm orientado a pesquisa. In: Moita Lopes LP (Org.) Por uma linguísti ca aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola Editorial; 2006, p. 85-108. [4] Gabel SL. Introducti on: Disability study in educati on. In: Gabel SL, editor. Disability studies in educati on: Readings in theory and method. New York: Peter Lang;2005. p. 1-20. [5] Cormedi MA, Silva MS. Capacitação de profi ssionais nas áreas da surdo-cegueira e da defi ciência múlti pla na Educação Inclusiva: Módulo II. Belém: PA, 10 a 13 de agosto de 2000 (Texto Impresso). caminhos para inclusão.indd 150caminhos para inclusão.indd 150 23/8/2011 11:02:2523/8/2011 11:02:25 ORIENTAÇÕES PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO DE ALUNOS COM TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA Christine Vianna Algarves Magalhães1, Franclin Costa do Nascimento2, Anna Karen Soutello Mendes3 INTRODUÇÃO Historicamente, a educação para a diversidade se concreti za na Rede Federal de Educação Profi ssional e Tecnológica com a criação do Programa Educação, Tecnologia e Profi ssionalização para Pessoas com Necessidades Especiais – TECNEP. Criada como instrumento de políti ca voltado para as “classes desprovidas”, a Rede Federal se confi gura na atu- alidade como importante estrutura para que os cidadãos tenham efeti vo acesso às conquistas cientí fi cas e tecnológicas. A rede teve sua origem em 1909 quando o então presidente da República, Nilo Peçanha, criou 19 Escolas de Aprendizes e Artí fi ces que, mais tarde, dariam origem às Escolas Técnicas Federais, Escolas Agrotéc- nicas Federais e aos Centros Federais de Educação Profi ssional e Tecno- lógica (CEFETs). A parti r da década de 80 um diferente cenário econômico e produ- ti vo se estabeleceu, com o desenvolvimento e emprego de tecnologias complexas, agregadas à produção e à prestação de serviços, as empre- 1 Coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial da infância e da adolescência (CAPSi.) de ouro Preto, MG. Presidente da Comissão Técnica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais do Desen- volvimento (TGD) da ação TECNEP/SETEC/MEC. 2 Coordenador de Educação Profi ssional Tecnológica Inclusiva. Gestor Central da Ação Ministério da Educa- ção – MEC/Secretaria de Educação Profi ssional e Tecnológica - SETEC/Tecnologia, Educação, Cidadania e Profi ssionalização para Pessoas com Necessidades Especiais – TECNEP - TECNEP/SETEC/MEC. 3 Psicóloga da COEES/Núcleo de Atendimento Educacional Especializado aos Transtornos Globais – NATEE. Membro da Comissão Técnica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais do Desen- volvimento (TGD) da ação TECNEP/SETEC/MEC. caminhos para inclusão.indd 151caminhos para inclusão.indd 151 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 152 sas passam a exigir trabalhadores com níveis de educação e qualifi cação cada vez mais elevados. [1] Em 2008, a Rede Federal de Educação Tecnológica passa por um processo de ressignifi cação dando origem aos Insti tutos Federais de Edu- cação, Ciência e Tecnologia, que são insti tuições de educação superior, básica e profi ssional, pluricurriculares e multi campi, especializados na oferta de educação profi ssional e tecnológica nas diferentes modalida- des de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e tec- nológicos às suas práti cas pedagógicas. Os Insti tutos Federais compõem, na atualidade, a Rede Federal de Educação Profi ssional e Tecnológica. Em 2009, a parti r da identi fi cação de casos de alunos com Transtor- nos Globais do Desenvolvimento e defi ciências Múlti plas pelo TECNEP, alunos estes matriculados nos Insti tutos Federais, cria-se a Comissão Téc- nica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais de Desenvolvimento – mais uma ação do TECNEP/SETEC/MEC que busca criar, nos Insti tutos Federais, a cultura da “educação para a convivência”, aceitação da diversidade e, principalmente, buscar a quebra das barrei- ras arquitetônicas, educacionais e ati tudinais. [2] Abordar os aspectos referentes à educação de alunos com TGD é promover a refl exão sobre os conceitos de inclusão, transtornos globais do desenvolvimento e práti cas educacionais mais fl exíveis. Sobre inclusão, compreende-se como o processo pelo qual a socie- dade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão consti tui-se então num pro- cesso bilateral, no qual as pessoas ainda excluídas e a sociedade buscam, por meio de parcerias, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efeti var a equiparação de oportunidades para todos [3]. Em 2008, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Edu- cação – SEESP/MEC [4] passa a adotar o conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), para se referir aos alunos que apresentam al- terações qualitati vas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e ati vidades restrito, estereoti pado e repeti - ti vo. Neste grupo estão os alunos com auti smo, síndrome do espectro do auti smo e psicose infanti l. caminhos para inclusão.indd 152caminhos para inclusão.indd 152 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 Caminhos da INCLUSÃO | 153 A análise e refl exão dos conceitos acima mencionados estão dentre os pontos principais das ações da Comissão TGD. A parti r deles é possível favorecer a permanência com êxito destes alunos em seus cursos. Conse- quentemente, os profi ssionais da educação envolvidos têm como desafi o constante a contextualização de ati vidades e a construção de novas e adequadas metodologias educacionais, que incluam os alunos em todas as instâncias de aprendizado. [5] Estas ações do TECNEP, por meio da Comissão TGD, estão sendo desenvolvidas junto aos Insti tutos Federais por um grupo consti tuído de profi ssionais pertencentes aos Insti tutos e Rede parceiras, que auxiliam na problemati zação das discussões e nas possíveis soluções de cunho te- órico-práti cas que valorizam a criação, a descoberta, a construção do co- nhecimento pelos alunos com Necessidades Educacionais Especiais, cuja ação forti fi ca o trabalho desenvolvido pelos Núcleos de Atendimento às Pessoas com Necessidades Específi cas (NAPNEs) [6]. Oferecer subsídios para compreensão do processo da Educação In- clusiva e as arti culações entre os variados aspectos que a consti tuem – o aluno, a escola e a família – são as demandas mais presentes no interior dos Insti tutos. Por meio de conteúdos teóricos e práti cos, contribui-se para a formação conti nuada dos profi ssionais da Rede com o aprimoramento e a melhoria no processo ensino-aprendizagem e a consequente melhora no desempenho escolar dos alunos com necessidades educacionais espe- cífi cas. A compreensão dos processos de construção do conhecimento e de aprendizagem, da relação entre ambos e dos fatores que neles podem intervir são também abordados no decorrer desta ação de formação. Os constantes avanços da ciência e da tecnologia, e de como estes vêm modifi cando as formas das relações sociais até então conhecidas, nos levam a reforçar a o papel da escola e do fazer pedagógico que se vê comprometi do com a formação humana. Nesta perspecti va, a esco- la se consti tui em um espaço privilegiado para encontrar pessoas, para estabelecer relações de interação, para desvelar a realidade e construir novos conhecimentos. A educação, na abordagem histórico-cultural tem a função de contribuir para a integração social através da apropriação da cultura e a função de construção da própria identi dade do sujeito [7]. A discussão sobre a educação inclusiva de alunos com defi ciências ou com necessidades educacionais especiais tem se intensifi cado nestas caminhos para inclusão.indd 153caminhos para inclusão.indd 153 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 154 duas últi mas décadas no Brasil e no mundo, levando a uma refl exão sobre como a defi ciência é encarada e vivenciada no contexto escolar. Esta in- cursão exploratória no mundo da “escola que procura ser inclusiva” tem sidoinspirada pela necessidade de uma nova avaliação do ensino, sob a infl uência de transformações paradigmáti cas que defendem a educação de qualidade para todos. A inclusão é um processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus pa- péis na sociedade. OBJETIVOS A Comissão apresenta como princípios orientadores da educação inclusiva aos Insti tutos Federais o fortalecimento das relações humanas em respeito à diversidade e às diferenças entre as pessoas, possibilitando a inclusão e o conhecimento com a criação de estratégias para o ensino. Propõe oportunizar aos alunos com necessidades educacionais especí- fi cas um atendimento adequado, apoiando-os de forma a garanti r sua permanência na insti tuição, promovendo uma educação de qualidade e encaminhando-os ao mercado de trabalho. Compete a Comissão: a) orientar as insti tuições da Rede Federal de Educação Profi ssio- nal, Cientí fi ca e Tecnológica quanto aos procedimentos de acolhimento de alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento – TGD na Rede Federal de Educação Profi ssional, Cientí fi ca e Tecnológica; b) acompanhar, discuti r e avaliar, com os setores envolvidos, os procedimentos didáti co-pedagógicos que possibilitem a permanência e conclusão de alunos com TGD em cursos desenvolvidos na Rede Federal de Educação Profi ssional, Cientí fi ca e Tecnológica; c) subsidiar os Núcleos de Atendimento às Pessoas com Necessida- des Educacionais Especiais – NAPNEs para a lida diária com alunos iden- ti fi cados com TGD. caminhos para inclusão.indd 154caminhos para inclusão.indd 154 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 Caminhos da INCLUSÃO | 155 DESENVOLVIMENTO O trabalho da Comissão Técnica Nacional de Acompanhamento de Alunos com Transtornos Globais de Desenvolvimento é de orientar e fa- cilitar aos profi ssionais uma abordagem abrangendo toda a diversidade, de acordo com a necessidade de cada aluno com TGD e a demanda do Insti tuto Federal, para a construção de metas e soluções no dia a dia. O processo de ensino aprendizagem deve possibilitar o desenvolvi- mento das capacidades do aluno. É determinante entender as habilida- des em primeiro lugar e não as difi culdades. O aluno deve ter a oportuni- dade de desenvolver-se de acordo com seu ritmo. Com respaldo nos dados e nas informações sobre as difi culdades vivenciadas pelos profi ssionais dos Insti tutos é que são propostas as ati - vidades, a fi m de favorecermos o acesso à permanência dos alunos com TGD. Criar estratégias e valorizar as habilidades por meio das ati - vidades propostas no ensino aprendizagem é construir o respeito com o fazer da diferença, de acordo com a individualidade e a histó- ria de vida de cada um. Referencia-se a construção da subjeti vida- de, direcionado ao desenvolvimento do aluno e não ao diagnósti co. Em relação ao acesso a educação, Cury [8] afi rma que este é um meio do indivíduo se autoconstruir, de se reconhecer em relação às suas próprias capacidades e adquirir esti ma e críti cas em relação a si. Neste senti do, todos os alunos devem ter acesso à escola sem que haja barreiras para o processo ensino-aprendizagem, preservando, desse modo, sua digni- dade. A realidade atual exige do educador novas posturas, entre elas, o retomar constante de sua práti ca pedagógica e um novo olhar. Segundo Sassaki [3], “a educação inclusiva se desti na às pessoas com necessidades especiais no campo da aprendizagem, originadas quer de defi ciência fí sica, sensorial, mental ou múlti pla, quer de característi - cas como altas habilidades, superdotação ou talentos”. O trabalho da Comissão é desenvolvido por meio de um conjunto de ações inclusivas e planejado no intuito de dar respostas a uma deman- da pela facilitação do processo do ensino aprendizagem dos alunos com TGD na Rede Federal de Educação Profi ssional e Tecnológica. A efeti va in- clusão escolar destes alunos requer várias mudanças, tanto nas questões caminhos para inclusão.indd 155caminhos para inclusão.indd 155 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 156 das adaptações, das adequações metodológicas e nas políti cas públicas da educação, quanto no que se refere ao conhecimento e as possibilida- des de criar estratégias. Por iniciati va dos professores e dos gestores que colaboraram com o trabalho da comissão, novas ações foram incorporadas nas insti tuições onde se viam “fi xadas” práti cas excludentes. Buscou-se, a parti r daí, cons- truir conceitos fundamentais sobre a educação inclusiva e a elaboração de um “Documento Orientador”, fruto das visitas técnicas aos insti tutos. O Documento Orientador aborda, de modo específi co e individualizado, após a visita técnica no Insti tuto, as mudanças de ati tudes e as adequa- ções metodológicas necessárias para o ensino-aprendizagem dos alunos com transtornos globais de desenvolvimento. (Figuras 1 e 2 - Foto do Alu- no F. do Curso Técnico em Zootecnia) CONCLUSÃO Nos diversos Insti tutos, nos dispositi vos e nas práti cas com os quais a Comissão manteve contato direto e indireto, detectamos, parti cipamos e protagonizamos uma série de tentati vas de exercício de concepções e realizações, experiências e vivências francamente inspiradas e impulsio- nadas por um intuito inovador, renovador e, às vezes, quase revolucioná- rio. Tais tentati vas vieram acompanhadas por seus respecti vos sucessos e demandas. Mesmo tentando centrar-nos nessas novidades, não poderíamos fazê-lo sem enfati zar também as peculiaridades produti vas que exigiram nossa intervenção nos processos metodológicos. Nessa experiência foi possível perceber e possibilitar aos profi ssionais da educação o conheci- mento específi co e vários estudos de caso de alunos com Necessidades Educacionais Específi cas – NEE. As condições históricas e o conhecimento que permiti ram as abor- dagens metodológicas que problemati zam a relação entre os profi ssio- nais e ato de pesquisar propõem uma comparação entre as fi nalidades da pesquisa-ação e da pesquisa-intervenção, uma proposta de efeti var a teoria e a práti ca da inclusão escolar. Depoimento do aluno F com NEE, acompanhado pela Comissão Técnica Nacional TGD. “Se não fosse o “Insti tuto” eu não teria chegado caminhos para inclusão.indd 156caminhos para inclusão.indd 156 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 Caminhos da INCLUSÃO | 157 onde eu queria que é a minha formatura no curso técnico. Eu gosto mui- to de lidar com o gado, aprendi a lidar com os animais ajudando o meu avô. Meu sonho é ser Zootecnista.” A ati vidade docente no contexto da inclusão escolar implica o uso de metodologia e avaliação que reconheçam às especifi cidades de cada aluno, o seu tempo e o seu ritmo. Os profi ssionais da educação e as práti cas sociais têm como de- safi o constante a contextualização de ati vidades, para as intervenções e a construção de novas e adequadas metodologias educacionais, que incluam os professores e gestores e os alunos nos conteúdos da educa- ção inclusiva. A relevância deste trabalho é, principalmente, mostrar as possibilidades da inclusão escolar na Rede Federal de Educação Profi s- sional e Tecnológica, criando estratégias com adaptações curriculares e a aplicação de uma políti ca de inclusão Para que todos tenham condições de enfrentar este desafi o, os professores e gestores da insti tuição precisam contar com ajuda e apoio de outros profi ssionais, mediante ati vidades de formação e assessora- mento. O projeto políti co-pedagógico é um instrumento técnico e políti co que orienta as ati vidades da escola, delineando a proposta educacional e a especifi cação da organização e os recursos a serem disponibilizados para sua implementação.As adaptações curriculares, propriamente ditas, são modifi cações do planejamento, objeti vos, ati vidades e formas de avaliação, no currí- culo como um todo, ou em aspectos dele, para atender os alunos com necessidades educacionais especiais na perspecti va da inclusão escolar. A realização de adaptações curriculares deve atender as necessi- dades específi cas de aprendizagem dos alunos. No entanto, identi fi car essas “necessidades” requer que os sistemas educacionais modifi quem não apenas as suas ati tudes e expectati vas em relação a esses alunos, mas que se organizem para construir uma real escola para todos, que dê conta dessas especifi cidades. Uma escola que se propõe inclusiva necessita ter uma defi nição operacional do processo de avaliação escolar do aluno com necessidades especiais e das adaptações de acesso ao currículo, ou seja, eliminação de barreiras arquitetônicas e metodológicas. caminhos para inclusão.indd 157caminhos para inclusão.indd 157 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 158 REFERÊNCIAS [1] CNE/CEB. Parecer nº 02/97. Dispõe sobre os programas especiais de formação peda- gógica de docentes para as disciplinas do currículo do ensino fundamental, do ensino médio e da educação profi ssional em nível médio. [2] Ação TECNEP, documento base, seção 4 ano, 2010. [3] Sassaki RK. Inclusão: Construindo uma sociedade para todos. 7ª ed. Rio de Janeiro: WVA; 2006. [4] Brasil MEC/SEESP, Inclusão: R. Educ. esp., Brasília, v. 4, n. 1, p. 1-61, jan./jun. 2008. [5] Brasil. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Ofi cial [da República Federati va do Brasil], Brasília, p.5-72 dez. 1996. [6] Lei nº. 11.892, de 29 de dezembro de 2008. [7]Teberosky A, Coli C, Bolívar A. O Construti vismo na Práti ca 9 - Col. Inovação Pedagó- gica. Porto Alegre: Artmed; 2007. [8] Cury A. Organização e métodos: uma visão holísti ca. 8ª ed. São Paulo: Atlas; 2005. caminhos para inclusão.indd 158caminhos para inclusão.indd 158 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E O USO DE TECNOLOGIAS DE APOIO A COMUNICAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM ESCOLAS DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM Ana Irene Alves de Oliveira1; Rafael Luiz Morais da Silva2; Amanda de Aquino Peixoto3; Sayuri Fernandes Toda3; Thalita Mesquita Melo4; Marcilene Alves Pinheiro5 INTRODUÇÃO A educação é um direito garanti do pela Consti tuição Federal do Brasil, a qual estabelece a permanência de toda criança na escola, res- peitando suas diferenças, sejam estas sociais, culturais, fí sicas, étnicas ou econômicas. A escola proporciona à criança a possibilidade de desen- volver-se cogniti va e sócio-culturalmente, oportunizando experiências únicas. Além disso, é nesse ambiente que são estabelecidas as primeiras relações sociais fora do contexto familiar, as quais se desenvolvem duran- te toda a vida. No caso das crianças que apresentam défi cits cogniti vos, motores ou sensoriais, esse direito tem sido conquistado ao longo do processo histórico da educação e dos direitos humanos voltado para a inclusão so- cial. Atualmente defende-se que, independente da difi culdade que apre- 1 Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA), Terapeuta Ocu- pacional da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará e Professora Assistente III, da Universidade do Estado do Pará (UEPA) e coordenadora do Núcleo de Desenvolvimento em Tecnologia Assistiva e Acessibi- lidade (NEDETA) 2 Terapeuta Ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, Mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA); 3 Acadêmica do 4ºano do curso de graduação em Terapia Ocupacional na UEPA, estagiária do NEDETA e bolsista do projeto “Capacitação de professores do ensino regular para o uso da Comunicação Alternativa e/ou Suplementar no processo de inclusão”. 4 Acadêmica do 4ºano do curso de graduação em Terapia Ocupacional na UEPA, estagiária do NEDETA e voluntária do projeto “Capacitação de professores do ensino regular para o uso da Comunicação Alternativa e/ ou Suplementar no processo de inclusão”. 5 Terapeuta Ocupacional e voluntária do projeto “Capacitação de professores do ensino regular para o uso da Comunicação Alternativa e/ou Suplementar no processo de inclusão”. caminhos para inclusão.indd 159caminhos para inclusão.indd 159 23/8/2011 11:02:2623/8/2011 11:02:26 160 sente, o aluno tem necessidades acadêmicas, sociais e adaptati vas como qualquer outra criança. Para Silveira e Neves [1], o desenvolvimento da criança com algum ti po de defi ciência se dá de forma parti cularmente criati va. Apesar de seus limites em relação às trocas sociais, os mesmos encontram uma forma compensatória, ou seja, alternati va para processar suas experi- ências. Percebe-se então que a presença desse aluno na escola e a convi- vência com outras crianças, além de promover as trocas sociais, podem favorecer a aprendizagem. O que irá diferir será a forma como esse aluno recebe ou expressa o conteúdo acadêmico. Para tanto, basta que sejam respeitadas suas potencialidades e limitações, e que se tenha a consciência de que nem todos conseguirão absorver por completo o currículo escolar, porém a interação professor-aluno e aluno-aluno é fundamental para o desenvolvimento de habilidades necessárias para o convívio e o desenvol- vimento humano, o que já é um ganho para qualquer indivíduo. Discute-se então algo muito mais abrangente que apenas a inclu- são escolar, pensa-se em inclusão social. Acerca deste tema, Travassos e Souza [2] fazem a seguinte consideração: A inclusão social representa o reconhecimento dos direitos de todas as pessoas à cidadania indepen- dente das diferenças e das necessidades individu- ais, seja de que ordem for, como estabelece a De- claração Universal dos Direitos Humanos (1948), a Consti tuição Federati va do Brasil (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), Declaração de Salamanca (1994), dentre outros documentos de âmbito federal, estadual e municipal. O Estatuto da Pessoa com Defi ciência é um projeto de lei trami- tando no Congresso Nacional. Dentre esses avanços legislati vos, cabe destaque a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) n. 9.394/96. Ela garante a educação e o atendimento especializado, prefe- rencialmente, na rede regular de ensino com o apoio necessário. O aluno com defi ciência já tem assegurado, conforme a Lei n. 7.853/89, a ma- trícula compulsória em estabelecimentos públicos e privados de ensino, sendo considerado crime recusar, suspender, procrasti nar, cancelar ou fazer cessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento caminhos para inclusão.indd 160caminhos para inclusão.indd 160 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, por moti vos derivados da sua defi ciência. Já se percebe mudanças em relação à permanência de alunos com defi ciências na sala de aula de ensino regular. Este processo vem amadu- recendo de forma gradual, entretanto ainda existem inúmeros obstácu- los a serem transpostos. A perspecti va atual é que a escola seja um ambiente acolhedor e que proporcione um ensino de qualidade para todos os alunos, consi- derando suas necessidades e potencialidades. Entretanto, é necessário ressaltar que não basta que este aluno esteja presente na sala de aula, é imprescindível primeiramente que a escola tenha se preparado para receber essas crianças. Caso contrário, não haverá inclusão e sim a sim- ples integração da criança ao sistema educacional. E integração não é um sinônimo de inclusão, como muitos acreditam e mesmo algumas biblio- grafi as referem. Mitt ler [3] assim defi ne tais termos: Na Integração o aluno deve adaptar-se a escola, enão há necessariamente uma perspecti va de que a escola mudará para acomodar uma diversidade cada vez maior de alunos [...] A inclusão implica em um reforma radical nas escolas em termos de currículo, avaliação, pedagogia e formas de agrupamento dos alunos nas ati vidades de sala de aula. Desta forma, verifi ca-se que a integração está muito aquém do que se espera para um sistema educacional adequado para receber crianças com alguma defi ciência, pois deposita neste aluno a total responsabilida- de em adequar-se ao ambiente escolar, eximindo a função da escola em viabilizar esse processo. Já a inclusão envolve um sistema bem mais com- plexo que o anterior, pois permeia mudanças em toda estrutura educa- cional, na qual a escola se adequa para receber este aluno, confi rmando a ideia de que é o meio que deve se adaptar ao aluno e não vice-versa. A escola passa por uma redefi nição de seu papel social, o que a transforma não apenas em uma insti tuição responsável por transmiti r conteúdos didáti cos aos alunos, mas também capacitada para atender de forma integral o seu público e preparada para conviver com as diversi- dades fí sicas, sociais, educacionais, econômicas e culturais. Caminhos da INCLUSÃO | 161 caminhos para inclusão.indd 161caminhos para inclusão.indd 161 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 162 A chamada Escola Inclusiva deve proporcionar a qualquer aluno a inserção em classes regulares de ensino. E a insti tuição deverá dar-lhe todas as condições (ambientais, estruturais, recursos humanos, dentre outros) para sua parti cipação nesse contexto. Dentro desta perspecti va, Travassos e Souza [2] expõem: A escola inclusiva é aquela que valoriza as diferenças individuais e a diversidade humana, como elemento enriquecedor do processo educati vo, favorecendo a aprendizagem e o desenvolvimento pessoal e social não só dos educandos e educadores, mas de toda comunidade escolar. A inclusão do aluno com defi ciência é uma realidade ainda muito discreta no Brasil e muito se tem discuti do sobre este tema. O objeti vo principal da inclusão é assegurar que todas as crianças possam se bene- fi ciar das oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola, o que inclui currículo corrente, avaliação, registros, relatórios, esporte, lazer, recreação, dentre outros [3]. A implementação de uma escola para todos é uma ati tude com- plexa e deve ser viabilizada de forma global. Ao se uti lizar este termo refere-se, inicialmente, a eliminação de todas as barreiras para o ensino- aprendizagem, as quais incluem qualquer condição que interfi ra, direta ou indiretamente, no contexto educacional, quais sejam: difi culdade de acessibilidade; mobiliário inadequado; falta de recursos humanos, mate- riais e fi nanceiros; currículo inadequado, dentre outros. Os recursos tecnológicos podem oferecer possibilidades lúdicas, e serem instrumentos mediadores entre a criança e o mundo real. Enten- dendo por mediação “o processo de intervenção de um elemento inter- mediário numa relação” [4]. Estes recursos tecnológicos apresentam a possibilidade da comuni- cação alternati va, podendo levar a uma interação mais sati sfatória com o mundo, favorecendo expressões signifi cati vas de pensamento que, por comprometi mentos motores a sua linguagem oral (fala) e linguagem grá- fi ca (escrita), podem estar prejudicadas, mas a sua linguagem interna, isto é os seus pensamentos, ideias, senti mentos e desejos encontram-se em processo de construção. caminhos para inclusão.indd 162caminhos para inclusão.indd 162 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 Caminhos da INCLUSÃO | 163 A comunicação oral é uma exigência social. A cultura existente é de que o indivíduo de qualquer idade e lugar do mundo necessita da capa- cidade da linguagem oral e escrita para sua interação nos mais variados contextos (familiar, escolar, profi ssional, recreati vo e comunicati vo). Entretanto, muitos ainda não percebem que, embora algumas pes- soas tenham a expressão oral prejudicada ou inexistente, como no caso de crianças com Disfunção motora, a sua interação é possível, desde que haja uma compreensão das diferenças individuais e que lhes sejam pro- porcionados recursos adequados. Tais recursos auxiliam a comunicação e têm por objeti vo substi tuir ou ampliar a linguagem oral, garanti ndo o maior grau de funcionalidade, comunicação e interação social. Os recursos ou sistemas para promover a comunicação se enqua- dram em um ramo de conhecimento específi co, denominado de Tecno- logia Assisti va. Swenson[5] assim a defi ne: Tecnologia Assisti va pode ser defi nida como qual- quer item, peça de equipamento ou sistema de produtos, quer adquirido comercialmente de um estoque de fabricação em série, quer modifi cado, quer feito sob medida, que é usado para aumentar, manter ou melhorar capacidades funcionais de indi- víduos com incapacidades. A área da Tecnologia Assisti va tem merecido papel de destaque en- tre as mais recentes pesquisas envolvendo habilitação e reabilitação fí si- co-funcional. Dentre o vasto leque de possibilidades de uti lização desta tecnologia, as ajudas técnicas têm aparecido como um efi ciente recurso para a (re) habilitação das capacidades funcionais de portadores de dis- funções neuromotoras. Esclarecendo que, quando se fala em capacida- des funcionais, refere-se a recursos que promovam comunicação, mobili- dade, controle ambiental, aprendizagem, trabalho e integração social. A oportunidade de comunicação e promoção de recursos que fa- cilitem tal capacidade são direitos garanti dos pela Legislação Nacional. Entre os quais podem ser citados: O decreto nº 5.296 que regulamenta as Leis nº 10.048, de 8 de maio de 2000, e 10.098 de 19 de dezembro de 2000, que estabelecem normas gerais e critérios básicos para a pro- moção da acessibilidade das pessoas portadoras de defi ciência ou com mobilidade reduzida [5]. caminhos para inclusão.indd 163caminhos para inclusão.indd 163 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 164 Desta forma, os recursos para comunicação vêm a ser uma forma de promover a inserção social do indivíduo que, por diversos moti vos, apresenta algum ti po de difi culdade na sua comunicação, garanti ndo a acessibilidade a várias situações do coti diano. Esses recursos podem ser uti lizados em qualquer ambiente, no entanto, enfati za-se neste estudo a sua uti lização no ambiente escolar, como uma forma de promover me- lhor interação do aluno com Disfunção motora junto ao professor e cole- gas de classe, favorecendo a aprendizagem acadêmica e a sociabilidade. Os sistemas e sinais de ajudas técnicas para a comunicação classi- fi cam-se em sistemas sem auxílio e com auxílio, conforme a necessidade ou não de um auxílio fí sico. Além dessa classifi cação, consideram-se tam- bém os sistemas que envolvem tecnologia avançada e baixa tecnologia, ao serem analisados os ti pos de materiais uti lizados [6]. Uma alternati va encontrada por professores e terapeutas é o uso de re- cursos de fácil acesso e que se encontram dentro das possibilidades do usuá- rio, bem como dentro das limitações das escolas, as quais, no geral, carecem tanto pela falta de uma infraestrutura inadequada como a não especialização técnica necessária, são os recursos denominados de baixa tecnologia. Para a Secretaria de Educação Especial – SEESP [7], baixa tecnologia compreende recursos que podem ser confeccionados a parti r de materiais que fazem parte do coti diano escolar como tabuleiro de comunicação que contenha símbolos gráfi cos como fi guras, letras, números, dentre outros sistemas; de modo que o usuário se faça entender no ambiente escolar. Percebe-se um vasto número de possibilidades que podem propor- cionar, ao indivíduo que necessita de uma comunicação alternati va, uma formamais fácil de interagir com os outros e se desenvolver, tanto em relação às habilidades cogniti vas, avançando no conteúdo escolar, como no aspecto da interação social. Uma escola que não possui um recurso como um computador poderá ter sucesso no uso dos recursos de baixa tecnologia. No entanto, ressalta-se a necessidade de um profi ssional capaz de avaliar e compreender as poten- cialidades e as necessidades daqueles que irão fazer uso de tais recursos. OBJETIVO Capacitar e assessorar professores das escolas do ensino regular para a uti lização de recursos de Comunicação Alternati va e/ou Suplementar caminhos para inclusão.indd 164caminhos para inclusão.indd 164 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 Caminhos da INCLUSÃO | 165 com crianças com disfunção motora, além de favorecer ao professor bases conceituais sobre a epistemologia da inclusão e sua importância para o desenvolvimento da criança com disfunção motora, instrumentalizando-o com bases teóricas sobre a importância da tecnologia assisti va para o favo- recimento da inclusão escolar. Demonstrar aos professores os recursos das técnicas em Comunicação Alternati va e /ou Suplementar, de baixo e alto custo, mais uti lizados com alunos com disfunção motora e treiná-los para a confecção e uso dos recursos de Comunicação Alternati va e/ou Suplemen- tar de baixo custo (pranchas de comunicação, cartelas, etc.). METODOLOGIA As capacitações foram realizadas no Campus II da Universidade do Estado do Pará, Bloco D, sala 10, nas dependências da Unidade Ambula- torial de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (UEAFTO); e em escolas pre- viamente selecionadas, somando uma carga horária total de 12h, com 8h teóricas e 4h práti cas nas quais os professores ti veram a oportunidade de confeccionar e treinar o recurso que poderá ser uti lizado no ambiente escolar. A programação dos cursos tem os seguintes conteúdos: Tabela 1. Demonstração da programação dos cursos. TEMA OBJETIVO 1) Conhecendo o aluno com dis- função motora e a Educação In- clusiva. Conhecer noções básicas sobre os aspectos clíni- cos da disfunção motora e os princípios episte- mológicos da educação inclusiva. 2) Introdução ao Campo da Tec- nologia Assisti va e bases concei- tuais em CSA. Conhecer as modalidades da tecnologia assisti va e a aplicação teórico-práti ca da Comunicação Al- ternati va e/ou Suplementar. 3) Confecção de recursos de baixo custo em CSA. Oportunizar vivências na confecção de recursos de CSA de baixo custo. 4) Socialização de experiências e discussão de casos clínicos. Favorecer a refl exão dos assuntos abordados e a relação teoria-práti ca. caminhos para inclusão.indd 165caminhos para inclusão.indd 165 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 166 RESULTADOS Desde maio de 2010, o NEDETA desenvolveu 7 ações com os profes- sores para uso da tecnologia assisti va, sendo 2 na Unidade de Ensino e As- sistência de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (UEAFTO), onde funciona o NEDETA, e 5 em escolas de crianças atendidas pelo NEDETA, chegando a um total de aproximadamente 180 professores capacitados. Observou- se que os cursos têm ati ngido seu objeti vo no senti do de sensibilizar os professores para a importância do uso da CSA além de viabilizar o uso do recurso no processo de inclusão do aluno com disfunção motora. Figura 1. Curso de capacitação de professores para o uso da CSA no processo de inclu- são. O referido estudo tem oportunizado compreender um dos mo- ti vos pelos quais a inclusão escolar ainda não é efi caz, pois durante as vivências os professores queixavam-se da maneira abrupta como a educação inclusiva fora proposta a eles. Tal situação é refl exo das leis tardias e, na maioria das vezes, mal elaboradas que buscam contemplar problemas superfi ciais, que, por sua vez, desconsideram as condições estruturais do ambiente escolar proposto à criança com defi ciência, além da falta de capacitação adequada dos professores e demais pro- fi ssionais para lidar com essa demanda, pois não conhecem a patologia de seus alunos e, consequentemente, não sabem como auxiliá-lo – es- pecialmente no que se refere à compreensão da comunicação, que na maioria das vezes não é oral, verbalizada, e em como se fazer compre- ender por eles. Durante as práticas propostas, os participantes relatavam tam- bém as dificuldades de algumas famílias em compreender o progres- so lento de suas crianças. Além disso, as famílias dos outros alunos, caminhos para inclusão.indd 166caminhos para inclusão.indd 166 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 Caminhos da INCLUSÃO | 167 na maioria das vezes, não aceitam que o professor volte sua atenção àquela criança com deficiência e nem a relação de seus filhos com essa criança. Diante disso, o estudo vem oportunizando a socialização dessas difi culdades, vivências por meio das quais os profi ssionais experimenta- ram, por alguns momentos, as difi culdades que seus alunos enfrentam para efeti var seu processo de aprendizagem. E, ainda, esclarecimentos a respeito da patologia, de recursos viáveis e de baixo custo que podem confeccionar para auxiliar na oti mização da relação professor-aluno, da aprendizagem desses alunos, e, consequentemente, para tentati va de catalisar a inclusão escolar. CONSIDERAÇÕES FINAIS O uso de recursos de fácil acesso, denominados de baixa tecnolo- gia, e que se encontram dentro das possibilidades do usuário, é a melhor alternati va encontrada, dentro das limitações da escola – as quais, no geral, possuem uma infraestrutura inadequada, bem como não dispõem de profi ssionais com a especialização técnica necessária. Percebe-se um vasto número de possibilidades para que seja pro- porcionado ao indivíduo que necessite de um sistema de comunicação alternati va uma forma de interagir mais facilmente com os outros e de- senvolver-se potencialmente tanto em relação às habilidades cogniti - vas, avançando no conteúdo escolar, como em nível de interação social. Desta forma, os recursos para comunicação vêm a ser uma for- ma de promover a inserção social do indivíduo que, por diversos mo- tivos, apresenta algum tipo de dificuldade na sua comunicação, ga- rantindo a acessibilidade a várias situações de cotidiano. Podem ser implementados em qualquer ambiente, no entanto enfatiza-se neste estudo sua utilização no ambiente escolar, como uma forma de pro- mover melhor interação do aluno com disfunção motora junto ao pro- fessor e colegas de classe, favorecendo a aprendizagem acadêmica e a sociabilidade. caminhos para inclusão.indd 167caminhos para inclusão.indd 167 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 168 REFERÊNCIAS [1] Silveira FF, Neves MMBJ. Inclusão escolar de crianças com defi ciência múlti pla: con- cepções de pais e professores. Psicologia: teoria e pesquisa. Brasília. Jan-abr 2006, vol. 22 n. 1, pp. 079-088.htt p://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0102 772200600010 0010&script=sci_artt ext. Acesso em: 25 ago. 2006. [2] Travassos VLG, SOUZA NJS. Inclusão social. In: Teixeira E, Fernandes M, Santos MR, organizadores. Travessias inclusivas de saberes: a educação cabana em Belém (1997- 2004). Prefeitura municipal de Belém. Secretaria Municipal de Educação e Cultura, Coordenadoria de Educação Especial, Coordenadoria de esporte, arte e lazer. Belém; 2004, p. 49-59. [3] Mitt ler P. A educação inclusiva: contextos sociais. Porto Alegre: ARTMED; 2003. p. 264. [4] Kohl MO. Vygotsky – aprendizado e desenvolvimento um processo sócio – histórico. São Paulo: Scipione; 1999. p. 111. [5] Damasceno & Galvão Filho, Alves T. Educação especial e novas tecnologias: o alu- no construindo sua autonomia. In: htt p://infoesp.vila.bol.com.br. Acesso em: 04 jun. 2002. [6] Pelosi MB. A comunicação alternati va ampliada nas escolas do rio de janeiro:for- mação dos professores e caracterização dos alunos com necessidades educacionais es- peciais. Rio de Janeiro: Pós-graduação em educação - universidade estadual do rio de janeiro; 2000. [7] Santos MR (Org.). Travessias inclusivas de saberes: a educação cabana em Belém (1997-2004). Prefeitura municipal de Belém. Secretaria municipal de educação e cultu- ra, coordenadoria de educação especial, coordenadoria de esporte, arte e lazer. Belém; 2004. p. 49-59. caminhos para inclusão.indd 168caminhos para inclusão.indd 168 23/8/2011 11:02:2723/8/2011 11:02:27 INCLUSÃO X EXCLUSÃO: A PRÁXIS EM UMA BRINQUEDOTECA PÚBLICA DE BELÉM Adriane Giugni da Silva1, Karina Nayara Rego Portal2, Lilian Cristina Santos Araújo3 INTRODUÇÃO O presente arti go é resultado de uma pesquisa em processo de re- alização, a qual tem como objeti vo examinar uma brinquedoteca pública de Belém, com a fi nalidade de investi gar o processo dialéti co inclusão/ exclusão, mediado pela práxis educati va realizada com crianças na faixa etária de 4 a 6 anos de idade. Para proceder este estudo, busca-se responder a seguinte ques- tão fundante: a brinquedoteca pública examinada promove inclusão por meio da práxis? Esta problemati zação surgiu a parti r da necessidade de uti lizar a brinquedoteca pública como um espaço inclusivo direcionado a essas crianças, ambiente este capaz de promover a ati vidade livre, criado- ra e autocriadora, e, dessa forma, poder incluir os indivíduos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, dependendo da maneira como são realizadas as ati vidades didáti co-pedagógicas e lúdicas nesse local. O estudo da brinquedoteca como espaço inclusivo por meio da práxis é relevante por proporcionar uma análise diferenciada no tocante à práti ca dos profi ssionais atuantes no espaço da brinquedoteca, assim 1 Doutora em Educação na área de Ensino, Avaliação e Formação de Professores – UNICAMP/SP. Líder/Coor- denadora do Grupo de Políticas Públicas, Educação e Inclusão Social – GPPEIS; Pesquisadora do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Diversidade – LEPED/UNICAMP; Pesquisadora do Grupo de Educação Popular – UEPA; Professora da Universidade do Estado do Pará – UEPA; Orientadora da Pesquisa – PIBIC/CNPq/UEPA. 2 Graduanda do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do Pará – UEPA; Dis- cente Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas, Educação e Inclusão Social, Graduanda do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do Pará – UEPA; Discente Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas, Educação e Inclusão Social – GPPEIS; Bolsista do PIBIC – CNPq/UEPA GPPEIS; Bolsista do PIBIC – CNPq/UEPA. 3 Graduanda do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do Pará – UEPA; Dis- cente Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas, Educação e Inclusão Social – GPPEIS; Bolsista do PIBIC – CNPq/UEPA. caminhos para inclusão.indd 169caminhos para inclusão.indd 169 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 170 como no que se refere à formação intelectual das crianças envolvidas no processo ensino-aprendizagem. Espera-se com esta investi gação fornecer novos pareceres sobre a questão da inclusão norteada pela práxis lúdica, vivenciada em uma brin- quedoteca pública, expandindo a refl exão sobre o assunto e ao mesmo tempo sobre a relevância desse espaço lúdico-pedagógico nos ambientes escolares e não escolares. Nessa perspecti va, a brinquedoteca, mediante seu caráter lúdico, criati vo, coleti vo e cooperati vo, possibilita a promoção da inclusão. O brin- car não se reduz a jogos individuais, passivos, alienantes e exclusivos, pelo contrário, eles podem esti mular a criança a pensar de forma ati va, críti ca e criati va de modo a promover, por meio da ação coleti va, a inclusão advinda de ati vidades lúdicas e cooperati vas, realizadas na brinquedoteca. Nesse contexto, pode-se afi rmar que a práxis social de brincar, vi- venciada na brinquedoteca, produz seres ati vos, críti cos-criati vos, seres pensantes que, segundo Dias[1], sejam capaz de fazer frente à educação reproduti va e opressora, presente na maioria das escolas. Parti ndo-se da convicção de que a consciência estéti ca das pessoas é construída ao longo de suas vivências, Dias[1] assinala que [...] Um dos caminhos para fazer frente à realidade congelada e opressiva de muitas escolas e trazer a vida à tona é a busca de uma educação políti co- estéti ca, que tenha como cerne a visão do homem como ser simbólico, que se constrói coleti vamente e cuja capacidade de pensar está ligada à capacidade de sonhar, imaginar, jogar com a realidade. Percebe-se, nessa perspecti va, a relevância da ati vidade lúdico-cria- ti va no processo de formação social das crianças e, assim, oferecer esta “capacidade de sonhar, imaginar, jogar com a realidade” conforme diz a autora, abandonando o caráter individual, exclusivo e reprodutor dos in- teresses dominantes. Dessa forma, a brinquedoteca assume a real função proposta pela práxis social de brincar, que, como afi rma Bott omore[2], se consti tui na “[...] ati vidade livre, universal, criati va e auto-criati va, por meio da qual o homem cria, (recria) e transforma seu mundo humano, histórico e a si mesmo”. caminhos para inclusão.indd 170caminhos para inclusão.indd 170 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 Caminhos da INCLUSÃO | 171 REFERENCIAL TEÓRICO O referencial teórico foi construído a parti r das concepções de au- tores que norteiam a discussão deste estudo e propiciam uma refl exão críti ca, além de favorecer o trabalho que se desenvolverá durante o pro- cesso de pesquisa a respeito da brinquedoteca pública selecionada. Kishimoto [3], ao se referir ao jogo na educação infanti l, menciona que este “transporta para o campo do ensino-aprendizagem condições para maximizar a construção do conhecimento, introduzindo as pro- priedades do lúdico, do prazer, da capacidade de iniciação e ação ati va e moti vadora”, assinalando assim a relevância de ati vidades lúdicas no processo ensino-aprendizagem e na formação global das crianças, como elemento capaz de construir a intelectualidade infanti l por meio da prá- xis inclusiva e transformadora. Nessa perspecti va, o lúdico atua como uma ação social e coleti va que pode servir como um mecanismo favorecedor na formação da crian- ça, fomentando a inclusão e a responsabilidade social, uma vez que, de maneira alegre, reúne interesses e sati sfações coleti vas. Wajashop [4] complementa a ideia expressa por Kishimoto [3] quando discute o brincar por meio da práxis, entendendo-a como “a brincadeira na perspecti va sócio-histórica e antropológica [...] conside- rando que se trata de uma ati vidade social humana que supõe contextos sociais e culturais, a parti r dos quais a criança recria a realidade através da uti lização de sistemas simbólicos próprios”. É parti r dessa ati vidade humana que se consti tui a expressividade infanti l, que pode ser observada durante as brincadeiras, e a forma de as crianças se organizarem entre elas, demonstrando o quanto é impres- cindível à existência de um espaço como a brinquedoteca para formação global e inclusiva destes sujeitos sociais. A aquisição da cultura por meio do lúdico como retrata Wajashop [4] é uma das consequências dessa formação críti co-criati va que sensibiliza e auxilia na aproximação da criança ao mundo. A respeito do lúdico na construção da cultura e do conhecimento, Snyders [5] considera que o acesso à cultura permite a formação do sujeito social críti co-criati vo. A esse respeito afi rma que: caminhos para inclusão.indd 171caminhos para inclusão.indd 171 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 172 [...] uma cultura que abre o mundo diante de nós, que nos abre para o mundo, que deixaver e enten- der o mundo: presença do mundo e por isso pre- sença no mundo; nossa sensibilidade pode ampliar- -se ao desti no do mundo, nossa consciência pode tornar-se consciência mundial. Aprender mil formas de vida e não só o que os olhos vêem, o que os vi- zinhos dizem; vale à pena perceber o que se passa em outros lugares. O mundo está próximo de nós, penetra-nos, entra em nós. Essa aproximação do sujeito ao mundo, que penetra e entra no ser, estabelece a perspecti va críti ca necessária ao educando, conforme expressa Freire [6]: Os educandos necessitam descobrir o que há por trás de muitas de suas ati tudes em face da realidade cultural para assim enfrentá-la de forma diferente. A admiração de sua anterior admiração da realidade é necessária para que isto se faça. A capacidade que têm os educandos de conhecer em termos críti cos - de ir além da mera opinião - se vai esti mulando no processo de desvelamento de suas relações com o mundo histórico-cultural. Mundo de que os seres humanos são os criadores. Nesse senti do, a inclusão concebida neste estudo pode ser objeti - vo das ati vidades lúdicas realizadas na brinquedoteca examinada, tendo em vista que, por meio da práxis, o homem promove o desvelamento do mundo histórico cultural e vai além da mera opinião, tornando-se, assim, ator, produtor e (re) criador de sua realidade social. METODOLOGIA Este estudo fundamenta-se em uma abordagem qualitati va que, segundo Severino [7], consiste em “um conjunto de metodologias, en- volvendo, eventualmente, diversas referências epistemológicas”. Para completar este conjunto de metodologias procedeu-se a pesquisa biblio- gráfi ca a parti r da leitura de autores renomados como: Dias [1], Bott omo- caminhos para inclusão.indd 172caminhos para inclusão.indd 172 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 Caminhos da INCLUSÃO | 173 re [2], Kishimoto [3], Wajashop [4], Snyders [5], Freire [6], entre outros; além do levantamento de informações conti das em monografi as e livros, que contribuirão para aprofundamento destas pesquisadoras no estudo referente a esta temáti ca. A investi gação é do ti po descriti va, pois, durante seu desenvolvi- mento, serão apresentadas análises e resultados parciais referentes ao andamento do estudo de caso, em que se examinará uma realidade par- ti cular em meio a várias outras. Como instrumento para coleta de dados serão uti lizadas técnicas como questi onários e entrevistas, além da observação parti cipante que tem por fi nalidade examinar a práxis realizada pelos brinquedistas nas ati vidades desenvolvidas no espaço investi gado; assim como verifi car se a brinquedoteca proporciona a formação global das crianças como sujei- tos sociais e também identi fi car se o processo de aprendizagem destas corresponde à formação esperada na perspecti va da práxis. As entrevistas e os questi onários serão realizados com as brinque- dista no intuito de analisar se há, no espaço em questão, a implementa- ção de ações teórico-práti cas inclusivas das crianças por meio da práxis. Concomitantemente será examinado o material didáti co-pedagógi- co uti lizado na brinquedoteca, o espaço fí sico, assim como o planejamen- to das brinquedista para realização das ati vidades lúdicas implementadas no processo. O registro fotográfi co será uti lizado para ilustrar a realidade em exame, tendo em vista a necessidade de se obter, a parti r das imagens, informações e dados concretos uti lizados na brinquedoteca em questão. Posteriormente à coleta de dados, estes serão transcritos e cruzados, a fi m de relatá-los e divulgá-los de forma fi dedigna, e, ao fi nal do processo de pesquisa, socializá-los entre estudiosos, pesquisadores e demais inte- ressados no assunto. RESULTADOS ESPERADOS De acordo com a temáti ca abordada, espera-se realizar um exame críti co relacionado com a práxis e o processo de inclusão vivenciado na brinquedoteca pública em Belém. Para efeti vação da pesquisa, serão ma- nipulados e classifi cados os dados coletados no decorrer da investi gação, caminhos para inclusão.indd 173caminhos para inclusão.indd 173 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 174 os quais serão uti lizados para realizar análises e descrições deste estudo, com base nos autores selecionados para discuti r a temáti ca em questão. Nessa etapa da pesquisa serão relatadas as observações perti nen- tes à abordagem adotada, a fi m de observar a atuação dos profi ssionais inseridos nesse espaço, assim como as ati vidades desenvolvidas pelas crianças envolvidas no processo. Dessa forma, serão apresentados os re- sultados obti dos a parti r do cruzamento das informações coletadas, que resultarão na produção de um relatório fi nal de pesquisa, em diversos trabalhos e na publicação de arti gos. Com esta pesquisa espera-se promover, por meio da práxis, uma refl exão críti ca a respeito da atuação das brinquedista no ambiente estu- dado, no intuito de contribuir com a formação global de cada indivíduo, tornando-o sujeito social, ator e transformador de sua vida real, além de verifi car se há de fato inclusão desses sujeitos no espaço investi gado. Espera-se, também, expandir o conhecimento destas pesquisa- doras ao longo da investi gação, a parti r das discussões favorecidas pela parti cipação em eventos de caráter local, nacional e internacional, assim como pela publicação de arti gos e construção dos relatórios parcial e fi - nal sobre a pesquisa. Nesse contexto, pretende-se, ao fi nal do estudo, contribuir para refl exão a respeito da referida brinquedoteca pública nesta cidade, em especial com os brinquedistas atuantes, no intuito de favorecer a forma- ção global e a responsabilidade social destas crianças que vivem coleti - vamente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Reconhecer a escola e a brinquedoteca como formadores de su- jeitos sociais é desafi ante, mas é imprescindível, pois, sendo a escola o espaço (hipoteti camente) em que a criança passa a maior parte do seu tempo, o brincar, por meio do lúdico vivenciado na escola, pode incitar nas crianças um conhecimento inovador capaz de possibilitar a criação e produção de uma nova realidade mediante a refl exão. Para superar a individualidade, o egoísmo e as diferenças sociais que marcam a sociedade capitalista, penetram à educação das crianças e deformam o ser, perpetuando os interesses de classes, é necessário va- caminhos para inclusão.indd 174caminhos para inclusão.indd 174 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 Caminhos da INCLUSÃO | 175 lorizar e saber uti lizar a ludicidade como ferramenta para modifi car essa realidade social. Refl eti ndo-se sobre as relações na fase infanti l, percebe-se que as crianças, se esti muladas ao convívio em grupo, conseguem se desenvol- ver, adquirindo hábitos de respeito e convívio social, fundamentados na cooperação e na solidariedade com os outros. Nesse intento, defende-se que a cultura, associada ao trabalho lú- dico e à conscienti zação social é capaz de demolir, recusar, arruinar e renegar a realidade social excludente, pois é a parti r do saber consti tuído que se pode conseguir superá-la e transformá-la em uma realidade social inclusiva, tornando os indivíduos melhores e responsáveis por sua parti - cipação na vida coleti va. REFERÊNCIAS [1] Dias MCM. Metáfora e Pensamento: considerações sobre a importância do jogo na aquisição do conhecimento e implicações para educação pré-escolar. In: Kishimoto TM. Jogo, Brinquedoteca, Brincadeira e a Educação. São Paulo: Cortez; 2007. [2] Bott omore T. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Zahar; 1988. [3] Kishimoto TM. Jogo, Brinquedoteca, Brincadeira e a Educação. São Paulo: Cortez; 2007. [4] Wajskop G. Brincar na pré-escola. 7ª ed. São Paulo: Cortez; 2007. [5] Snyders G. A alegria na escola. São Paulo:Manole; 1988. [6] Freire P. Ação Cultural para a Liberdade e outros escritos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1981. [7] Severino AJ. Metodologia do Trabalho Cientí fi co. 23ª ed. São Paulo: Cortez; 2007. caminhos para inclusão.indd 175caminhos para inclusão.indd 175 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 caminhos para inclusão.indd 176caminhos para inclusão.indd 176 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 A COMPREENSÃO DA INCLUSÃO DO DEFICIENTE VISUAL NA REDE REGULAR DE ENSINO: UM ESTUDO SOB O OLHAR DE QUEM A VIVENCIA1 Aline Damasceno Monteiro2, Gisely Gabrieli Avelar de Souza3, Ana Irene Alves de Oliveira4 e Rafael Luiz Morais da Silva5 INTRODUÇÃO A defi ciência visual é explicada por duas categorias: a Baixa Visão, também denominada Visão Subnormal, e a Cegueira. A Baixa Visão ou Visão Subnormal consiste em uma condição de diminuição funcional da capacidade visual, que pode ocorrer por uma signifi cati va diminuição da acuidade visual, redução do campo da visão, alterações visuais das cores e/ou da sensibilidade a contrastes que difi - cultam ou limitam o desempenho da visão[1]. A cegueira ocorre – de acordo com a Organização Mundial da Saú- de (OMS) – quando a pessoa possui acuidade visual desde 3/60 (0,05), no melhor olho e melhor correção óti ca possível, indo até a ausência de percepção de luz ou a perda de campo visual no melhor olho com a me- lhor correção possível [2]. Durante muito tempo, o defi ciente visual que buscava o serviço educacional deparava-se com uma realidade em que suas oportunida- des estavam voltadas para um sistema de educação especializado. Nesse sistema, esses indivíduos eram alfabeti zados em classes que agregavam pessoas com alguma defi ciência, fosse ela visual ou não. Os defi cientes visuais [3], desde 1950, já recebiam apoio pedagó- gico dos professores especializados ou habilitados em Educação Especial 1 Artigo extraído da pesquisa desenvolvida na disciplina Trabalho de Conclusão Anual (TCA), da grade curri- cular do curso de Terapia Ocupacional, da UEPA. 2 Terapeuta Ocupacional, graduada pela UEPA. 3 Terapeuta Ocupacional, graduada pela UEPA, ex-bolsista do NEDETA. 4 Terapeuta Ocupacional, doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA), docente da UEPA, coor- denadora do NEDETA. 5 Terapeuta Ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, Mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA); caminhos para inclusão.indd 177caminhos para inclusão.indd 177 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 178 nessa área. Na época, esses profi ssionais da educação atuavam em duas modalidades de ensino: Classe Braille, que mais tarde recebeu a denomi- nação de Sala de Recursos e Ensino Iti nerante, cujo objeti vo era integrar esses alunos nas classes regulares de ensino. No entanto, a Consti tuição Federal do Brasil de 1988 assegurou o atendimento educacional especializado às pessoas com defi ciência inse- ridas, preferencialmente, na rede regular de ensino [4]. E a Conferência Mundial de Educação para Todos na Tailândia, na década de 1990, deu início às ações de nível internacional na Educação Inclusiva, pois propi- ciou a conti nuidade de debates e transformações nessa área [5]. Mas foi a parti r da declaração de Salamanca, em 1994, que o Brasil criou as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica [6]. Em 1996, criou a Lei 9.394, que determinou que a Educação Inclusiva não excluísse a Especial, mas sim que cada uma delas passasse a adquirir funções específi cas na atenção às pessoas defi cientes; a Lei 10.845, de março de 2004, garanti u atendimento especializado aos alunos que não possuíam habilidades para a inclusão na rede regular de ensino, no en- tanto, fortaleceu sua progressiva inclusão no ensino comum [7]. Acredita-se que a inclusão, por ser um acontecimento relati vamen- te novo no cenário brasileiro, tem encontrado barreiras para ser concre- ti zada de maneira sati sfatória no ensino regular. E entre os sujeitos envol- vidos, encontram-se os alunos com defi ciência visual, que provavelmente não estão fora desse contexto de difi culdades. Nesse senti do, questi ona-se como tem sido a inclusão de pessoas com defi ciência visual na rede regular de ensino? Como essas pessoas percebem esse processo? CAMINHO METODOLÓGICO Trata-se de um estudo de caso do ti po observacional-descriti vo, sendo um recorte do projeto inti tulado O processo inclusivo do defi ciente visual na rede regular de ensino: um estudo de caso sob o olhar terapêu- ti co ocupacional, aprovado pelo Comitê de Éti ca da Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV). A pesquisa foi realizada no período de agosto a novembro de 2008, desenvolvendo-se um estudo com uma jovem – que doravante será chama- da de T.R.M – de 14 anos, apresentando cegueira em decorrência de Reti no- caminhos para inclusão.indd 178caminhos para inclusão.indd 178 23/8/2011 11:02:2823/8/2011 11:02:28 Caminhos da INCLUSÃO | 179 pati a da Prematuridade, estudante da 7ª série da Escola Municipal de Ensino Fundamental Antônio Teixeira Gueiros, da cidade de Ananindeua, Pará. Uti lizou-se como instrumento para a coleta de dados o roteiro de observação das condições de acessibilidade da insti tuição, baseado no Manual de Normas Técnicas de Acessibilidade (NBR 9050), sendo tam- bém realizada uma entrevista semiestruturada com o sujeito da pesqui- sa. A fi cha de entrevista conti nha dados de identi fi cação, história da do- ença atual e 8 perguntas direcionadas à T.R.M., objeti vando conhecer suas reais necessidades, bem como analisar a percepção quanto a sua inclusão no ensino regular. Primeiramente, fez-se a análise situacional das condições de aces- sibilidade da escola que atendessem principalmente às necessidades do defi ciente visual. Em seguida, realizou-se a entrevista com T.R.M., tendo duração de aproximadamente 30 minutos, na qual foi uti lizado aparelho audiodigital. Ao fi nal, fez-se a transcrição integral das respostas obti das. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS Nos dados coletados por meio da entrevista com T.R.M., ressalta-se a colocação referente à acessibilidade, ela afi rmou não possuir difi culda- des de locomoção no espaço escolar relacionadas às questões arquitetô- nicas (acessos com placa de identi fi cação em Braille, espaços de circula- ção interna com piso táti l ou linha guia, escadas adaptadas). As difi culdades de T.R.M. relacionavam-se aos instrumentos uti liza- dos no processo de Ensino-Aprendizagem (computador com alto relevo e sonorizador de voz), que também compreendem recursos de acessibi- lidade para pessoas com defi ciência visual. Ela afi rmou que o único pro- blema na locomoção está relacionado ao momento do intervalo, e tratou sobre os defi citários recursos de informáti ca que a escola dispõe: Não tenho difi culdade nenhuma. A única ‘mais’ difi culdade é na hora do intervalo que as pessoas passam correndo, mas é normal [...] já conheço o espaço. [...] a aula de informáti ca, porque não tem o vocalizador de voz [...] aí eu fi co tremendo no te- clado porque eu não sei o que ‘tô’ escrevendo, eu conheço as letras, mas eu não sei o que eu ‘tô’ aper- tando. caminhos para inclusão.indd 179caminhos para inclusão.indd 179 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 180 Ressalta-se que T.R.M. faz acompanhamento desde os 3 anos de idade na Unidade Técnica José Álvares de Azevedo, em Belém, que ofe- rece atendimento especializado a defi cientes visuais. Considera-se que este fato, somado ao tempo que ela estuda nesta escola (2 anos), te- nham contribuído para a criação de mecanismos adaptati vos ao ambien- te escolar, espaço este que, de acordo com as normas da NBR 9050, encontra-se inadequado, pois não existem placas de identi fi cação em Braille nas portas da escola.No que diz respeito à circulação interna, os corredores não apresentam nem piso táti l e nem linha-guia; a insti tui- ção possuía 1 escada que não apresentava corrimão e nem borda no de- grau; no que refere-se ao computador, enquanto instrumento de Ensino- Aprendizagem, constatou-se que ele não possuía teclas em relevo e nem sonorizador de voz. Quando questi onada sobre como avalia seu relacionamento inter- pessoal na escola, disse ser esta sua maior difi culdade nesse contexto: A minha maior difi culdade é com os alunos... com a maioria! Porque sempre são algumas pessoas que me ajudam, outras não entendem, passam direto, não se,o me conhecem como eu sou [...] já tentei... conversei normal, mas só foi uma vez, eles não che- gam pra conversar comigo normal, sempre são as mesmas pessoas [...]. Diante do exposto, foi indagado se T.R.M. tentava ou mesmo pos- suía iniciati va para interagir com os outros educandos. Ela afi rmou que difi cilmente tentava. Ainda sobre esta temáti ca, questi onou-se como ocorriam os trabalhos escolares em grupo, ela relatou que: [...] a professora pede pra eles me colocarem na equipe aí eu vou pra equipe, faço trabalho com eles [...] Teve um trabalho que a professora pediu pra ‘mim’ fazer só, que era pra ler um livro, era em equi- pe mas ela pediu pra ‘mim’ fazer só, ela me deu um pequeno, porque fi ca mais fácil pra ‘mim’ passar em braille. Ano passado teve uma vez que eu perdi pon- to porque não me colocaram em equipe nenhuma. Diante de sua colação, buscou-se conhecer como T.R.M. percebia tais situações: caminhos para inclusão.indd 180caminhos para inclusão.indd 180 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 Caminhos da INCLUSÃO | 181 Me sinto um pouco ruim... porque as pessoas não entendem. E ano passado, aí ela [professora] falou várias vezes com o pessoal da sala,..., agora que eles ‘tão’ entendendo mais. Mudou os alunos, entrou alunos de outra turma... isso ajudou muito! [...] Ano passado eu tava até conversando com as pessoas e dizendo que eu me dava melhor com as pessoas das outras turmas do que da minha mesmo, com as pes- soas do meu convívio. [...] as pessoas deveriam me colocar numa equipe porque tem prazer não porque são obrigadas! No tocante à relação com os professores, apontou algumas difi cul- dades: Como o professor de Arte, ele não me dita aí ele diz que depois vai me dar o assunto, às vezes ele me dá, às vezes ele não me dá..., aí a Êda [professora de Matemáti ca], falou pro pessoal me emprestar o caderno, mas ninguém queria me emprestar [...] Os outros professores me ajudam muito. Todos eles! [...]. A professora Eliana [Língua Portuguesa] falou pra perguntar se eu ti nha alguma difi culdade, pra eles se colocarem no meu lugar [...]. No que se refere ao processo de Ensino-Aprendizagem, fez impor- tantes considerações, expondo que: Eles [professores] ‘dão’ aula como ‘dão’ pros outros alunos, normal![...] eu não gosto de ser... eu me sin- to ruim, assim me senti ndo melhor que eles. Porque, na verdade, eu não sou melhor que eles, todos nós somos iguais [...] Sinto difi culdade só porque a pro- va nunca ‘tá’ pronta no mesmo dia..., aí eu levo as coisas e fi co escutando no cd, aí eu demoro às vezes pra responder algumas perguntas. [...] aí quando eu consigo falar antes com eles [professores] pra saber qual o capítulo que eles vão falar na próxima aula, isso me ajuda a estudar. Quando relata o descontentamento em senti r-se melhor que os outros alunos, T.R.M. trata de situações em que, possivelmente, neces- sitaria de maior auxílio e/ou atenção por parte dos docentes. Portanto, considera proveitoso o fato de seu processo de Ensino-Aprendizagem caminhos para inclusão.indd 181caminhos para inclusão.indd 181 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 182 não ser diferenciado dos outros alunos como, por exemplo, nas aulas que são ditadas e nas leituras de texto. Vale ressaltar que T.R.M. vai à Fundação Cultural Tancredo Neves (CENTUR), em Belém, para gravar os livros escolares em CDs, pois os que vieram em Braille para a escola não são os mesmos uti lizados pelos profes- sores em sua turma, o que, segundo ela, difi culta seu rendimento escolar. Outro questi onamento abordado na entrevista foi quanto a sua sa- ti sfação em estar no ensino regular, T.R.M. disse: Me sinto bem com certeza, porque as pessoas tem que aprender... como é que é a nossa vida, como é que a gente se comunica, como é a nossa relação... porque a gente tem uma relação normal como as ou- tras pessoas. Já chegou gente que me perguntou se era difí cil ser adulto sem enxergar [...] aí eu disse que eu não sabia por que eu nunca enxerguei! [...] Aí isso é bom pros alunos, e os professores ‘têm’ a aprender com a gente [...] Ensinar e aprender. [...] É ‘bom’ a es- cola especial, mas é ruim também, porque é preciso que tenha alguém que enxergue na turma. A parti r dos dados coletados, foi possível perceber que, mesmo a es- cola não possuindo estrutura arquitetônica adequada para alunos com DV, T.R.M. não apresentou difi culdades relacionadas a esse aspecto. Enquanto que, no processo de Ensino-Aprendizagem, foi possível constatar problemas de acessibilidade (o computador, por exemplo, pela ausência do vocalizador digital e do teclado em alto- relevo), como na metodologia de alguns profes- sores que uti lizavam a lousa para ministrar suas aulas, ao invés de fazer leitu- ra ou ainda o ditado como instrumentos que facilitassem a aprendizagem de T.R.M.; a escassez de recursos adaptados também foi um ponto importante: os livros em Braille que vieram errados, a esporádica visita do professor iti ne- rante que a auxiliava nos assuntos dados em sala de aula; T.R.M. necessitava ir constantemente ao CENTUR para gravar em CD os livros uti lizados em sua classe; as provas em Braille, que comumente não estavam prontas nos dias de avaliação, entre outros relatos que demonstraram os problemas enfren- tados diariamente por T.R.M. no ambiente escolar. A capacidade funcional não está atrelada somente aos fatores visu- ais, porém, deve ser considerada a reação da pessoa à perda visual, assim como os fatores ambientais que difi cultam seu desempenho [4]. caminhos para inclusão.indd 182caminhos para inclusão.indd 182 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 Dessa forma, destacam-se como maiores obstáculos, segundo T.R.M., o fator relacionamento interpessoal com outros educandos da turma. Identi fi cou-se que o círculo de amizade, ou ainda o grupo de T.R.M., era composto principalmente por 3 alunas que a auxiliavam nos trabalhos grupais, cediam seus materiais quando necessário e questi ona- vam-na se precisava de ajuda; estavam com ela nas aulas de Informáti ca e no intervalo. No entanto, eram as únicas pessoas que se dispunham a ajudar. O restante da turma não manti nha contato e hesitava em fazer ati vidades com T.R.M., fazendo-as somente nos casos em que os profes- sores solicitavam. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo permiti u compreender que, no caso de T.R.M., as ques- tões arquitetônicas, para ela, não eram barreiras como o eram as rela- ções sociais nesse ambiente, principalmente com as outras pessoas da classe. A idealização que se faz para a escola da atualidade é de um espaço acolhedor que permita uma educação de qualidade a todos os usuários, levando em conta suas necessidades e potencialidades. Contudo, vale ressaltar que o fato do aluno estar na sala de aula não é o sufi ciente. É de suma importância que, em primeiro lugar, a Escola tenha se preparado para receber esse aluno. Se isso não ocorrer, a inclusão não acontecerá, e sim apenas a integração da criança à rede regular de ensino, o que não é o objeti vo da nova proposta de educação [6]. Neste senti do, acredita-se que não é sufi ciente apenas colocar o alunoportão adentro na escola, proporcionando-lhe somente um espaço fí sico dentro de uma sala de aula. É necessário muito mais que isso. A Es- cola, como insti tuição, deve viabilizar formas de atendimento a essa pes- soa por meio das quais ela tenha não somente o direito à educação, mas, também, o direito às oportunidades educacionais que implicam atender a extensa gama de diferenças individuais existentes entre os educandos. Por meio destes aspectos, o Terapeuta Ocupacional busca intervir junto à Escola como facilitador e colaborador da acessibilidade, pensan- do tanto nas condições fí sicas, materiais e de comunicação necessárias para que o aluno com defi ciência visual possa receber educação sati s- fatória, como no Ambiente Escolar, para que ele possa parti cipar com Caminhos da INCLUSÃO | 183 caminhos para inclusão.indd 183caminhos para inclusão.indd 183 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 184 autonomia. Isso tudo implica na eliminação de barreiras arquitetônicas e ati tudinais, referentes à equipe que assiste esses alunos, como no auxílio à socialização entre esse educando, os outros alunos e a equipe escolar. Mesmo não sendo, ao longo da história, parte da Educação Regu- lar, a realidade vivenciada atualmente tem impulsionado o profi ssional da Terapia Ocupacional a aprofundar a relação e integração entre o cam- po da saúde e o educacional, buscando um consenso entre a clínica e a educação. Assim, o Terapeuta Ocupacional pode adaptar as demandas do de- sempenho de tarefas, tornar o ambiente mais adequado e ensinar um novo repertório de habilidades, ou ajudar o indivíduo a readquirir habi- lidades perdidas [5]. Portanto, a inclusão dos alunos com defi ciência em escolas regulares é relevante e, no tocante ao defi ciente visual, a possi- bilidade de acesso à escolarização traz ganhos inquesti onáveis, pois, fa- vorece a relação e a integração social, a exploração ambiental, o que a auxilia na construção do seu processo de Ensino-Aprendizagem. REFERÊNCIAS [1] Bruno MMG. A inclusão da criança com baixa visão e múlti pla defi ciência na educa- ção infanti l. In: Alves de Oliveira AI, Lourenço JMQ, Lourenço MGF (Orgs.). Perspecti vas da Tecnologia Assiti va no Brasil: teoria e práti ca. Belém: EDUEPA, 2008. [2] Monti lha RCL, Temporini ER, Nobre MIRS. Uti lizati on of opti cal devices and equi- pments by students with visual impairment. Arq. Bras. Oft almol., Mar./Abr. 2006, vol.69, n.2, p.207-211. htt p://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_artt ext&pid= S0004- 27492006000200014&lng en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 27 ago. 2008. [3] De Masi I. A Educação Inclusiva e os Diferentes Olhares. htt p://www.mj.gov.br/sedh/ ct/conade/palestras_ sub.asp. Acesso em: 10 maio 2008. [4] Ribeiro LB. Disfunção Visual. In: Cavalcanti A, Galvão C (Orgs.). Terapia Ocupacional: fundamentação e Práti ca. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. [5] Alves de Oliveira AI, Garotti MF, Najjar EA.O processo de Inclusão Escolar e a Tecno- logia Assisti va. In: Alves de Oliveira AI (Org.). Pesquisas em Desenvolvimento Infanti l. v. 9 Belém: Conhecimento e Ciência, 2008. [6] Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Especial. Números da Educação Especial no Brasil. 2001. htt p: // www.mec.gov.br /seesp. Acesso em: 20 abr. 2009. [7] Munguba MC. Inclusão Escolar. In: Cavalcanti A, Galvão C (Orgs.). Terapia Ocupacio- nal: Fundamentação e Práti ca. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. caminhos para inclusão.indd 184caminhos para inclusão.indd 184 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 RELAÇÃO TERAPEUTAͳPACIENTE: O PRINCIPAL OBJETIVO DO TERAPEUTA OCUPACIONAL ͵ RELATO DE UM CASO Solange Rezende Rabelo de Souza1; Ana Irene Alves de Oliveira2; Rafael Luiz Morais da Silva3; Marcilene Alves Pinheiro4 INTRODUÇÃO A Síndrome de Down (SD) se caracteriza, em sua eti ologia, por ser uma alteração na divisão cromossômica usual, resultando na triplicação – ao invés da duplicação – do material genéti co referente ao cromossomo 21. A causa dessa alteração ainda não é conhecida, mas sabe-se que ela pode ocorrer de três modos diferentes. Em 96% dos casos, essa trisso- mia se apresenta por uma não-disjunção cromossômica total: conforme o feto se desenvolve, todas as células acabam por assumir um cromos- somo 21 extra. Em cerca de 4% dos casos, entretanto, ou os portadores não têm todas as células afetadas pela trissomia, sendo denominados como casos “mosaico” (entre 0,5 e 1%), ou desenvolvem a síndrome de Down por translocação gênica (entre 3,0 – 3,5%), caso em que parte ou todo o cromossomo 21 extra se encontra ligado a um outro cromossomo, geralmente o cromossomo 14. A síndrome de Down frequentemente acarreta complicações clí- nicas que acabam por interferir no desenvolvimento global da criança portadora, sendo que as mais comumente encontradas são alterações cardíacas, hipotonia, complicações respiratórias e alterações sensoriais, principalmente relacionadas à visão e à audição [1]. Pesquisas recentes comprovam que crianças com Síndrome de 1 Acadêmica do 3º ano do Curso de graduação em Terapia Ocupacional da UEPA, estagiária do NEDETA – solsouza_55@hotmail.com. 2 Terapeuta Ocupacional, doutora em Teoria e Análise Comportamental pela UFPA, docente da UEPA. 3 Terapeuta Ocupacional e Professor da Universidade do Estado do Pará, mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento (UFPA); 4 Acadêmica do 5º ano do curso de graduação em Terapia Ocupacional da UEPA, estagiária do NEDETA. caminhos para inclusão.indd 185caminhos para inclusão.indd 185 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 186 Down podem alcançar estágios avançados do desenvolvimento psicomo- tor, de linguagem e cogniti vo. Portanto, o acompanhamento de algumas especialidades como a Fonoaudiologia, a Fisioterapia, a Terapia Ocupa- cional, a Psicologia, entre outras, é essencial para a orientação dos pais sobre o melhor estí mulo a ser dado aos seus fi lhos e, através de técnicas especializadas, desenvolver suas potencialidades [2]. A Terapia Ocupacional uti liza da ati vidade como um instrumento terapêuti co para avaliar e tratar pessoas que tenham algum ti po de difi - culdade, tanto no aspecto fí sico, mental ou social, que esteja interferindo no seu coti diano. Os objeti vos gerais da Terapia Ocupacional são propor- cionar funcionalidade e o máximo de independência possível no ambien- te escolar, familiar, social, de trabalho, de lazer, entre outros. E para que o tratamento seja sati sfatório é essencial que a relação terapeuta-paciente seja bem estabelecida [2]. O vínculo com alguém é imprescindível para o acontecer humano, este se estabelece por meio de um sistema de poderosas conexões – su- perfí cies corporais, linguagem, olhares, senti mentos, constância, inten- sidades, sensações, realizações, conti nuidade são formas de sua mani- festação. O trabalho terapêuti co ocupacional oferece uma oportunidade ímpar para que esse processo ocorra [3]. Pretende-se demonstrar com este estudo a importância da relação terapeuta-paciente na evolução do tratamento, a parti r do relato da expe- riência com uma criança com Síndrome de Down assisti da no NEDETA. REFERENCIAL TEÓRICO A SD é uma alteração genéti ca que ocorre na formação do feto, mais especifi camente no período de divisão celular. A maioria dos ca- sos de portadores da trissomia do cromossomo 21 é causada pela não- -disjunção, resultando em um cromossomo extra. Em outros casos, pa- cientes possuem anormalidades cromossômicas, as quais apresentam um número normal de cromossomo, porém, a alteração é do ti po trans- locação e mosaicismo. No entanto, este últi mo ti po é raro com ocorrên- cia aproximada de 1 a 2% [4]. A SD é uma alteração genéti ca, não herdada, na qual o indivíduo apresenta três cópias do cromossomo 21 ao invés de duas,como normal- caminhos para inclusão.indd 186caminhos para inclusão.indd 186 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 mente ocorre. A trissomia do cromossomo 215 é resultante da falta ou excesso de cromossomos no embrião devido um processo de meiose im- perfeita do espermatozoide ou do óvulo [5]. Embora a maior incidência de nascimento de bebês com a SD ocorra a parti r da idade materna de 35 anos, qualquer casal pode gerar um fi lho com esta patologia, indepen- dente de raça ou condição social [6]. Em geral, os indivíduos apresentam característi cas que lhe são pe- culiares, como: hipotonia muscular; os olhos apresentam-se com pálpe- bras estreitas e levemente oblíquas, com presença de prega epicânti ca; a íris, frequentemente, apresenta-se pigmentada (manchas de Brushfi eld); achatamento occipital (a moleira pode ser um pouco maior, demorando mais para se fechar); protrusão de língua; orelhas, geralmente, pequenas e de implantação baixa (o conduto auditi vo é estreito) [7]. Os atributos como amabilidade, docilidade, obediência e sensibili- dade são considerados inerentes aos portadores da SD. Tais característi - cas são vistas como normas existentes para o convívio social e, por essa razão, são apreciadas e valorizadas pelas mães e pela sociedade. Entre- tanto, as pessoas com SD podem apresentar variações em sua persona- lidade e temperamento. Nesse senti do, pode-se afi rmar que as pessoas com SD são disti ntas entre si em todos os aspectos, assim como é próprio ao desenvolvimento de qualquer ser humano [8]. Conforme Chevallier [9], o comportamento social da pessoa com SD é infl uenciado pelo ambiente, onde os resultados dessa interação po- dem limitar ou ampliar as oportunidades do seu desenvolvimento e de suas possibilidades de integração social. Os problemas de comportamen- to apresentados por alguns indivíduos portadores podem ser ameniza- dos a parti r da atuação conjunta entre os profi ssionais e a família, em uma perspecti va de processo de esti mulação. A sequência de desenvolvimento da criança com SD geralmente pode ser bastante semelhante à de crianças consideradas “normais”, e as etapas e os grandes marcos poderão ser ati ngidos, embora em um ritmo mais lento. Durante muito tempo, elas foram privadas de experiên- cias fundamentais para o seu desenvolvimento porque não se acreditava que eram capazes. Todavia, atualmente já é comprovado que crianças e jovens com SD podem alcançar estágios muito mais avançados de racio- cínio e de desenvolvimento [10]. 5 O cromossomo 21, apesar de ser o menor de todos os cromossomos, contém cerca de 40 milhões de partes de códigos – aproximadamente 329 genes (1% do genoma humano total) (CUNNINGHAM, 2008). Caminhos da INCLUSÃO | 187 caminhos para inclusão.indd 187caminhos para inclusão.indd 187 23/8/2011 11:02:2923/8/2011 11:02:29 188 E para que estas crianças alcancem signifi cati vos progressos em seu desenvolvimento fí sico, cogniti vo e psicossocial é necessário que haja um acompanhamento com profi ssionais qualifi cados, que trabalhem junto aos pacientes considerando não só suas necessidades, como também as habilidades pré-existente valorizando-as durante o processo; vale ressal- tar, ainda, a importância do envolvimento dos familiares no tratamento dessa criança, pois com eles é estabelecido o primeiro vínculo afeti vo e de comunicação social, de importância incontestável na vida de qualquer indivíduo [5]. Nos primeiros momentos do encontro paciente-terapeuta, atenção e acolhimento são atos inaugurais que guiam e orientam o processo. Nes- se momento, as singularidades que rodeiam a vida do paciente estarão presentes: característi cas biológicas, potencialidades psíquicas, sua his- tória, suas marcas, experiências anteriores e sua cultura. Estarão envol- vidos, também, aspectos relacionados à pessoa do terapeuta: corporei- dade, os senti dos, as percepções, as formas de expressão, a organização da escuta, os cuidados com os tempos e os espaços, as observações, as proposições teóricas e práti cas, as experiências culturais, sua história de vida conferem qualidade à relação terapeuta-paciente [11]. O vínculo se constrói na experiência interpessoal do relacionamento que vai se estabelecendo e, portanto, paciente e terapeuta viverão uma experiência comparti lhada que favorece uma aproximação. A ação do tera- peuta no campo vincular é intuiti va. Ele trabalha manejando a intensidade dos estí mulos, acertando o pulso na possibilidade do paciente, ajustando o próprio comportamento e suas ati tudes. Ele age em constante feedback facilitando os investi mentos do paciente no mundo, sem forçá-los. Nesse processo, o terapeuta inevitavelmente cometerá erros, necessários e po- tencialmente de grande valor, pois ajudam o paciente no desenvolvimento de seus próprios modos de lidar com uma variedade de experiências [11]. É possível pensar que, em todo ato ou ati vidade, faz-se imprescindí- vel a presença da intenção, da vontade e da liberdade, para que se possa estabelecer um grau de reciprocidade entre os elementos envolvidos nesse “encontro”. O terapeuta se ocupa em habilitar, capacitar e realçar questões, mas nunca pode impor ou exigir soluções. Para tanto emprega uma exclusiva combinação de vivência profi ssional, conhecimento cientí fi co, habilidades e sistemas de crenças ou valores para formar sua práti ca profi ssional [12]. Não se pode pensar na relação terapeuta-paciente sem envolver a análise de ati vidade e a ati vidade terapêuti ca. Chamone considera a Terapia Ocupacional, um método de intervenção que permite a constru- caminhos para inclusão.indd 188caminhos para inclusão.indd 188 23/8/2011 11:02:3023/8/2011 11:02:30 ção de vínculos por meio das ati vidades ou ‘ocupações livres e criati vas’ condicionadas aos elementos materiais, ferramentas, objetos concretos, como ‘problemas em si’ [12]. Uma das característi cas mais importantes da Terapia Ocupacional, segundo Ruy Chamone, está na condição de permiti r ao cliente a chance de decidir, de escolher, de intervir na realidade externa segundo sua in- tenção, vontade e com liberdade [13]. OBJETIVOS Pretende-se, através deste estudo, demonstrar a importância da relação terapeuta-paciente na evolução do tratamento, a parti r do relato de experiência com uma criança com SD assisti da no NEDETA. METODOLOGIA O presente estudo é descriti vo, do ti po relato de caso, tendo como referência a realização de 10 (dez) atendimentos, sendo dois sema- nais, com duração de 40 minutos, no período de setembro a dezembro de 2009. Além disso, realizou-se revisão bibliográfi ca em consulta a livros e arti gos cientí fi cos; e pesquisa documental, através de coleta de dados clínicos da paciente (anamnese e avaliação), planejamento e discussão dos dados. Os atendimentos foram realizados no Núcleo de Desenvolvi- mento em Tecnologia Assisti va e Acessibilidade, situado na UEPA. No de- correr das intervenções foram uti lizados recursos de Tecnologia Assisti va de baixo a alto custo, como acionadores artesanais, aplicati vos de Power Point e jogos lúdicos e educati vos. RELATO DO CASO Z.S.F.D.M., 6 anos, sexo feminino, procedente do município de Be- lém. Ingressou no NEDETA em setembro de 2008, com diagnósti co clíni- co de Síndrome de Down, apresentando também um quadro de atraso em seu desenvolvimento cogniti vo, fato pelo qual foi encaminhada ao Núcleo. É importante ressaltar que, desde o início dos atendimentos da criança no Núcleo, já havia sido atendida por diversos estagiários, fato este que provavelmente tenha se tornado fator desencadeante para que a mesma não estabelecesse facilmente um vínculo terapêuti co sati sfató- rio para evolução de seu quadro nos atendimentos. Com a estagiária atual, a criança foi atendida no período de setem- Caminhos daINCLUSÃO | 189 caminhos para inclusão.indd 189caminhos para inclusão.indd 189 23/8/2011 11:02:3023/8/2011 11:02:30 190 bro de 2009 a dezembro de 2009. Através da observação das habilidades apresentadas na avaliação inicial e análise das evoluções dos atendimen- tos anteriores, foi realizado um plano de ati vidades que desenvolvesse os aspectos cogniti vos da criança, como atenção, concentração e memória e ainda favorecer percepção de formas geométricas, além é claro de es- tabelecimento sati sfatório da relação paciente e estagiária. Durante as intervenções, percebeu-se que a criança demonstrava- se pouco acessível às condutas propostas a ela. E, portanto, optou-se pela uti lização de recursos (como jogos educati vos e lúdicos que pudes- sem ser realizados em pares) que manti vessem sempre o contato direto entre estagiário e paciente, de modo que pudessem interagir e, ao mes- mo tempo, alcançar os objeti vos traçados no plano terapêuti co. RESULTADOS E DISCUSSÃO Sabe-se que é no vínculo terapeuta-paciente que estas possibilida- des se (re) atualizam e amadurecem. Afi nar e refi nar a existência, possi- bilitar o amadurecimento vincular, criar disti nções/aprofundar, favorecer experiências de aproximação e inti midade, ampliar os espaços de liber- dade; fundamentalmente proporcionar relações consigo mesmo, com o outro, e com o ambiente onde se vive, são aspectos que consti tuirão e defi nirão o trabalho de criar vínculo entre pacientes e terapeutas no campo da Terapia Ocupacional. Portanto, os atendimentos iniciais foram desti nados ao estabeleci- mento do vínculo entre a criança e a estagiária responsável, já que a pa- ciente apresentava histórico de resistência ao início de ati vidades com es- tagiários diferentes. O que pode ser explicado pelo fato de que, desde sua entrada no Núcleo, a paciente passara por vários estagiários, difi cultando, assim, o estabelecimento concreto de um vínculo terapêuti co. Isto era percebido através da resistência da mesma ao início de qualquer ati vidade proposta que envolvesse recurso com o qual pudesse interagir sozinha. Durante a terapêuti ca, foram uti lizados também CD ROM contendo aplicati vos educati vos, jogos variados (objetos de encaixe, quebra-cabeça, de memória, de colorir, desenhar, dominó, entre outros), especialmente os que representassem um estí mulo ao uso da memória, concentração e ra- ciocínio; tesoura sem ponta, papéis, cartolina, cola, caneti nha, lápis de cera, papel crepom de várias cores, vídeos animados e brinquedos em geral. Inicialmente, foram propostas ati vidades que usassem o meio com o qual a criança interagia melhor. Portanto, foram escolhidos aplicati vos caminhos para inclusão.indd 190caminhos para inclusão.indd 190 23/8/2011 11:02:3023/8/2011 11:02:30 em Power Point com conteúdo de cores, animais e esquema corporal, nos quais a criança reconhecia as fi guras presentes nos aplicati vos e, pos- teriormente, as mesmas eram relacionadas com o coti diano da criança, favorecendo maior entendimento e memorização por parte desta. Foram uti lizadas, também, sequências lógicas de fi guras para que fosse feita a associação e criação de história. Neste momento, a criança respondeu de forma sati sfatória à habilidade de memorização e associação de situ- ações. Tendo em vista a difi culdade da criança na percepção de formas, foram desti nados três atendimentos para o desenvolvimento desta ha- bilidade. Neles foram propostas ati vidades com quebra-cabeças, com diferentes desenhos, tamanhos e números de peças. Em um primeiro momento, a criança apresentou grandes difi culdades em terminar o de- senho, apesar da ajuda da estagiária. Posteriormente, ainda com a ajuda da estagiária, a criança já conseguia associar as formas de maneira mais sati sfatória e sem pedir que a responsável montasse o jogo no seu lugar. Vale ressaltar que, em todos os atendimentos, foram analisadas pro- postas de intervenção que a criança pudesse realizar com independência e autonomia, mas que ao mesmo tempo esta esti vesse em contato direto constante com a estagiária responsável, para que os objeti vos traçados no plano terapêuti co pudessem ser alcançados da melhor forma possível. CONSIDERAÇÕES FINAIS As ati vidades desenvolvidas no NEDETA visam, principalmente, proporcionar aos usuários a aquisição e aprimoramento de habilidades que possam lhes dar qualidade de vida em suas ati vidades coti dianas, sejam estas escolares ou não. Durante os atendimentos realizados, foi possível perceber que a criança apresentou evoluções nos aspectos de memorização, percepção de formas e associação das mesmas, atenção e ansiedade. Apresentou, ainda, avanços no estabelecimento do vínculo terapêuti co, apesar da presente resistência em algumas ati vidades, foi possível perceber que a mesma, com o decorrer dos atendimentos, se mostrou mais acessível às propostas de ati vidade. Destaca-se, ainda, que é através do vínculo estabelecido, não so- mente com o paciente, mas também com a família, é que se obtêm re- sultados sati sfatórios, pois, no caso demonstrado, foi a parti r da mãe (em Caminhos da INCLUSÃO | 191 caminhos para inclusão.indd 191caminhos para inclusão.indd 191 23/8/2011 11:02:3023/8/2011 11:02:30 192 específi co) que se adquiriu os dados necessários para que uma interven- ção adequada fosse proposta e se alcançasse os resultados esperados. REFERÊNCIAS [1] Bazon FM, Campanelli E, Blascovi-Assis SM. A importância da humanização profi ssio- nal no diagnósti co das defi ciências. Revista Psicologia – Teoria e Práti ca [periódico on- line]. 2004; 6(2): 89-99. Disponível: www3.mackenzie.com.br/editora/index.php/ptp/ arti cle/view/1167/0. Acesso em: 14 fev. 2010. [2] Bissoto M. O desenvolvimento cogniti vo e o processo de aprendizagem do portador de síndrome de Down: revendo concepções e perspecti vas educacionais. Ciências & Cognição [periódico online] 2005; 2(4): 80-88. Disponível em: htt p://www.cienciase- cognicao.org/pdf/v04/ m11526.pdf. Acesso em: 12 abr. 2010. [3] Castro EDD. Relação terapeuta – paciente. In: Cavalcanti A, Galvão C. Terapia Ocupacio- nal: fundamentação e práti ca. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2007. 28 – 34p. [4] Thompson M, Mclnnes R, Willard H. Thompson&Thompson: Genéti ca Médica. 5ªed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1993. [5] Bee H. A criança em desenvolvimento. 9ª ed. São Paulo: ARTMED; 2003, 612p. [6] Monteiro MIB, Camargo EA, Blascovi ASM. Síndrome de Down: orientação a pais. Campinas; 2006. [7] Marcondes E, Ramos A. Pediatria Básica: pediatria clínica especializada. 9ª ed. São Paulo (SP): Savier; 2002, 776p. [8] Rodriguez FT. Síndrome de Down e inclusão familiar. O Povo online [internet], 2006 Ago. Disponível em: htt p://www.opovo.com.br/opovo/cienciaesaude/html. Acesso em 08 nov. 2009. [9] Serrão MDCPN. Síndrome de Down: uma abordagem psicossocial. [Disserta- ção]. Paraíba: Universidade Federal da Paraíba. Disponível em: htt p://www.ufpb. br/150.165.241.35/biblioteca. Acesso em: 3 ago. 2007. [10] Fundação Síndrome de Down – FSDOWN [homepage]. O que é Síndrome de Down. Campinas: W2F Publicidade. Disponível em: htt p://www.fsdown.org.br/sindrome_ down.php. Acesso em: 09 dez. 2009. [11] Castro EDD. Inscrições da relação terapeuta-paciente no campo da terapia ocupa- cional. São Paulo. Rev. Ter. Ocup. Univ. [periódico online]. 2005, 16(1): 14-21. Disponível em: htt p://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?script=sci_artt ext&pid=S141591042 005000100004&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 12 out. 2010 [12] Bastos P, Pedral C. Terapia Ocupacional: metodologia e práti ca. Rio de Janeiro (RJ): Rubio; 2008, 322p. [13] Faria MBDSRD. Referencial de Rui Chamone Jorge. In: Cavalcante A, Galvão C. Te- rapia Ocupacional: fundamentação e práti ca. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN; 2007, p. 171-183.