Buscar

Identidades e Diversidades Étnico Raciais.pdf trabalho 1

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 29 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 29 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 29 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 1/29
Introdução
Antes de iniciar seus estudos, reflita sobre as seguintes questões:
o que significa a nacionalidade brasileira? Na prática, representa
uma unidade? Ou seja, você acredita que a nacionalidade nos
identifica como um só povo? 
Pois saiba que, na realidade em que vivemos, a identidade como
brasileiro ou brasileira perpassa por inúmeras questões e fatores
que demarcam diferenças e nuances diversas. Quase sempre
determinadas, também, por relações de poder. Portanto, a
identidade do ser brasileiro está relacionada ao lugar de origem,
ao grupo a que pertence, às vivências, à memória individual e
coletiva, aos níveis de consciência, à análise crítica e ao
conhecimento histórico. Todas essas nuances que incidem sobre
a formação identitária das pessoas de forma geral, são
trabalhadas direta e indiretamente, subentendidas nos moldes da
educação.
Para que você possa entender as complexidades sobre as
questões que envolvem os processos identitários e as relações
étnico-raciais, especialmente no Brasil, neste capítulo você
conhecerá importantes aspectos históricos que, não por acaso,
são comumente excluídos dos livros didáticos. A partir de uma
breve análise desses dados, acompanhará discussões sobre
quem são os verdadeiros donos do Brasil. Nesse sentido,
entenderá que o contexto histórico no qual os povos indígenas
foram tratados, e os africanos trazidos para o Brasil, nos
proporcionam conhecimentos e significações importantes que
fazem muita diferença em nossos processos identitários de lutas,
sobrevivência e relações humanas.
Dessa maneira, durante a leitura deste capítulo você
compreenderá que, no atual contexto histórico brasileiro,
sobretudo no que tange à estruturação da educação – e devido às
questões políticas atuais de derrubada dos direitos constituídos –,
não é mais possível romantizar as relações sob a falácia da
democracia racial.
Bom estudo!
1.1 Os povos indígenas e a invasão do
Brasil
 Atualmente, as relações são frequentemente perpassadas pelo
sentimento de posse ou pelas relações de poder, mais do que o
sentimento de pertencimento ou de identificação. Analisar, refletir
e discutir sobre essa “posse” pode ser um dos primeiros
movimentos de libertação e descolonização, que possibilitará um
entendimento mais assertivo sobre quem realmente somos e qual
identidade diz mais sobre nós. 
Quando os colonizadores chegaram ao Brasil, encontraram
nativos aos quais deram o nome, a todos indistintamente,
de índios. No entanto, na terra recém-descoberta existia um
grande número de povos diferentes, organizados em diversas
etnias, com costumes e tradições bastante diversificados. Como
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 2/29
não houve um estudo aprofundado desses povos, estima-se que
muitas etnias foram dizimadas pelos colonizadores.
Mas, afinal, quem eram esses primeiros habitantes? De onde
vieram esses povos?
A história e os cientistas de diversas áreas fornecem algumas
teorias ou hipóteses de como esses primeiros habitantes
chegaram ao Brasil. Segundo Neves et al. (1997), uma hipótese
seria um grande deslocamento de pessoas pelo estreito de
Bering, com datas possivelmente entre 50.000 e 13.000 anos
antes de Cristo. Acredita-se que a região da Sibéria, que hoje
pertence à Rússia, e a do Alasca, que hoje pertence aos Estados
Unidos, estavam ligadas por uma faixa de terra, que tinha uma
extensão de cerca de 80 mil km. É possível que os primeiros
habitantes tenham passado por essa faixa, chegando assim na
América. Outra hipótese seria uma migração pelo mar saindo da
Polinésia, atravessando o Oceano Pacífico, chegando à América
do Sul em pequenas embarcações.
Tais hipóteses vão se confirmando à medida que comprovações
vão se consolidando ao fato de que todos os povos tiveram início
no continente africano. Como indica o documento “Novas bases
para o ensino da História da África no Brasil”, há uma série de
dados, fatos e objetos cujos minuciosos estudos científicos
direcionam à confirmação de que os seres humanos dos quais
descendemos surgiram primeiro no continente africano
(WEDDERBURN, 2005). 
Assim como em outras regiões da América do Sul, no Brasil
também foram encontrados diversos sítios arqueológicos; um
deles fica no estado do Piauí, próximo à cidade de Raimundo
Nonato, no local é conhecido por Serra da Capivara. Em 1974, a
arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire encontrou
dezenas de crânios e outros ossos humanos, no sítio chamado
Lapa Vermelha IV, que fica entre as cidades de Lagoa Santa e
Pedro Leopoldo, na região metropolitana de Belo Horizonte (MG).
O mais famoso de todos é o crânio que Walter Neves, biólogo,
arqueólogo, professor e antropólogo da Universidade de São
Paulo (USP) batizou de Luzia. Walter realizou pesquisas que
possibilitaram a reconstituição muscular e caraterísticas físicas
desse crânio que data mais de 13 mil anos. Essa reconstituição
demarca seus traços físicos negroides, deixando claro sua
semelhança com os povos africanos (NEVES et al., 1997).
 
O documento “Novas bases para o ensino da História da África no Brasil” foi
escrito por Carlos Moore Wedderburn em 2005. Doutor em Etnologia e em
Ciências Humanas, é ativista dos movimentos negros na diáspora africana em
Cuba e no Brasil. Para ler, acesse o endereço:
<http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-content/uploads/2012/11/novas-bases-
para-o-ensino-do-hist%C3%B3ria-da-%C3%A1frica.pdf>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 3/29
Cerca de 11 mil anos atrás, estima-se que, também migrando já
de outras partes do mundo, vieram os ancestrais dos indígenas
que não mais teriam características africanas depois de alguns
milhares de anos de adaptações biológicas, aos diferentes climas,
pelos quais passaram na região da Oceania e Polinésia. Os
dados indicam que durante um tempo coexistiram dois tipos de
povos nas Américas, os descendentes dos que aprendemos a
chamar de indígenas e os ainda com características negroides.
Por isso havia uma rica diversidade de povos etnicamente
diferentes quando os colonizadores aqui chegaram (NEVES et al.,
1997).
O termo etnia, segundo define Cashmore (2000) em seu
“Dicionário de Relações Étnicas e Raciais”, vem do
grego ethnikos, adjetivo de ethos, referente a povo ou nação, e
pode significar coletivo familiar ou grupo social que compartilha
Figura 1 - Apesar de existirem dados que confirmem a origem do ser humano
ancestral, há teorias hipotéticas sobre como as diferentes etnias descendentes
se espalharam pelo mundo. Fonte: doom.ko, Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 4/29
tanto características físicas, quanto culturais, linguísticas ou
identitárias. 
1.1.1 A chegada dos colonizadores
 O processo de colonização portuguesa no Brasil teve um caráter
semelhante a outras colonizações europeias, como a colonização
espanhola, que também explorou e exterminou povos indígenas
em toda a América. Os primeiros contatos dos colonizadores
europeus com os povos que aqui viviam foram de grandes
estranhamentos. A curiosidade e receio por conhecer aqueles tão
diferentes, se deu de forma similar e simultânea tanto para os que
aqui estavam como para os que chegavam.
 
As intenções das expedições colonialistas erambuscar e explorar
riquezas em novas terras. Já os indígenas, segundo Cunha
(2012), estavam acostumados a um sistema comunitário de
modos de vida de partilha e vivências coletivas. Neste sentido,
podemos inferir que os então chamados índios teriam sido
acolhedores e bastante receptivos aos colonizadores, que
naquele momento se mostraram simpáticos e amistosos. Os
nativos tinham uma forte noção de respeito e alteridade aos
povos diferentes de si, mesmo quando em situações de guerra.
Os colonizadores trataram de conquistar a amizade e a confiança
dos povos que chamaram de indígenas. Os padres Jesuítas
acompanhavam todas as expedições e eram os responsáveis
Figura 2 - Em 1500, os colonizadores portugueses aportaram no local que
chamaram de Porto Seguro, no atual estado da Bahia. Fonte: John Copland,
Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 5/29
pela conversão religiosa desses povos ao cristianismo. A religião
era usada, neste contexto, como forma de aculturação para
facilitar o domínio. Não é por acaso que uma das imagens mais
conhecidas, sobre a chegada dos portugueses ao Brasil, seja a
da primeira missa. Através da crença impunham também a cultura
e a língua, neste caso a portuguesa. Mais tarde outros povos
europeus também se fixariam no Brasil, porém o predomínio e a
língua dominante continuaria sendo a portuguesa (CUNHA,
2012).
Os padres jesuítas fundaram os chamados aldeamentos, eram
vilas protegidas como fortes, para onde levavam os índios
sobreviventes dos massacres realizados pelos colonizadores.
Além dos jesuítas outros portugueses foram enviados para
“desbravar” o Brasil. Esses desbravadores eram portugueses
recrutados em Portugal com promessas de muitas riquezas no
Brasil. Tinham a missão de demarcar o território das novas terras
como de posse da coroa portuguesa, instituindo a presença da
bandeira de Portugal. São os chamados bandeirantes que tinham
também a função de identificar as riquezas, especialmente os
metais e as pedras preciosas, tratadas e utilizadas como adorno
por alguns povos nativos do interior do Brasil. Desta forma iam
abrindo e “limpando” os caminhos ao mesmo tempo que
exploravam e retirarem tais riquezas. 
Esse “limpar os caminhos” pressupunha exterminar os “bravios”,
os povos indígenas que resistissem ou se negassem aos
trabalhos e mandos, ou seja, que resistissem ou se negassem
aos trabalhos escravos. Os que sobreviviam ou que se
entregavam aos bandeirantes, eram utilizados nos trabalhos mais
pesados e encaminhados aos aldeamentos para serem
domesticados e aprenderem os trabalhos. Em uma grande
proporção e não por acaso, restavam quase sempre crianças,
estas que deveriam ser “civilizadas” para o trabalho escravo.
Neste sentido os jesuítas ficaram responsáveis por esta tarefa,
uma vez que “educavam” através do que chamavam de
catequese. Estes foram os primeiros moldes e objetivos da
educação instituída pelos colonizadores em terras brasileiras.
Os jesuítas utilizavam técnicas violentas e desumanas com a
justificativa dos sacrifícios e sofrimentos purificadores. Desta
forma mantinham o controle e garantiam a aculturação. Os
indígenas aldeados eram obrigados a aprenderem a língua
portuguesa e a religião católica através de elementos que
garantissem a subserviência, a obediência e a devoção pelos
colonizadores. Pregavam que bom era ser europeu, católico e
branco ou pelo menos agir como eles. Profetizavam os costumes
nativos como errados e que, portanto, deveriam ser “civilizados”.
Durante a retirada do pau-brasil ofereciam presentes de interesse
dos indígenas, depois com práticas violentas e truculentas
obrigavam os mesmos aos trabalhos forçados, com castigos
quando estes deixam de atender às demandas dos
colonizadores. 
Os nativos eram tidos como preguiçosos. É importante lembrar
que este foi um estigma pesado sobre os povos nativos, aplicado
preconceituosamente até os dias de hoje. Ao falarmos de povos
indígenas, ou de qualquer outra etnia, em geral, baseamos
apenas em “nossa” própria cultura, forma de ver e pensar o
mundo, julgando culturas diferentes, segundo exclusivamente
nossos valores. Quando os colonizadores começaram a impor o
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 6/29
sistema de trabalho escravo, os nativos não entendiam por que e
para quê trabalharem tanto.
Os colonos colocavam para Portugal um cenário desfavorável dos
nativos. Diziam que os nativos, por terem vidas simples em que
se misturavam e respeitavam animais e plantas, não poderiam ser
vistos como humanos. Também por não terem ambições por
riquezas materiais, viverem nas florestas e matas, terem casas
feitas de folhas e palhas, por pintarem seus corpos ao invés de
roupas, por não conhecerem a pólvora ou o espelho.
A justificação ideológica da conquista e da destruição do mundo
indígena foi feita por meio da desumanização, descaracterização
e coisificação do índio. Se não fosse assim, teriam problemas de
consciência e enfrentariam sérias resistências dentro do próprio
sistema. (SANTOS, 1998, p. 88).
Os indígenas estavam acostumados a defender seus territórios de
outras aldeias inimigas. Usavam a terra de forma sustentável,
conheciam as plantas e seus poderes medicinais, tinham uma
organização política, que determinava a conduta de seu povo.
Antes da colonização, conforme dados disponíveis no site da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI, 2017), existiam mais de 3
milhões de nativos espalhados por todo território brasileiro, com
aproximadamente 1.000 idiomas diferentes. Esses povos não
eram e não são iguais em seus costumes. Ao contrário, cada
povo possuía e possui, sua própria forma de agir, suas próprias
regras e modo de vida, suas formas de relações sociais e
familiares entre si e com a natureza. 
Nesse sentido, vale a reflexão: como os colonizadores
conseguiram escravizar os povos indígenas se estavam em
menor número? 
Os colonizadores após conhecerem um pouco mais sobre os
nativos, perceberam que embora fossem aos milhares, não eram
unidos. Havia grandes rivalidades entre os nativos. Os europeus
portugueses passaram a agir e a criarem situações para incitar,
promover e patrocinar a guerra entre os nativos, causando um
extermínio em massa. Além dos soldados portugueses matarem
guerreiros, mulheres e até as crianças. Dizimando inúmeras
aldeias. Esses povos tinham ainda que sobreviver às doenças
trazidas com os colonizadores. Sendo assim, os que sobreviviam
passava a ser escravizado. 
Há também o fato de que nem todos os povos que aqui viviam,
praticavam a guerra. Seria impossível, mesmo para os indígenas
que tinha práticas de guerra, lutar de igual para igual, com
homens que articulavam seus interesses econômicos ao potencial
bélico e estratégias como as armas de fogo, canhões e até
mesmo as doenças que também serviram para o extermínio. 
Na concepção indígena que se entendiam como parte intrínseca
da natureza, não tinham o sentimento de posse a nenhum
elemento da mesma, isso incluía a terra, o território. Eles não
possuem a terra, eles a usam como forma de subsistência. E por
isso não viam como problema se outros povos, no caso, o homem
branco quisesse retirar alguma coisa dela. Portanto os nativos
inicialmente, não tiveram o sentido de expulsar ou de barrar a
expansão dos colonizadores continente adentro. Apenas se
afastaram migrando para o interior, na medida em que
conseguiam se antecipar ao extermínio. 
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html7/29
De uma população estimada em mais de 3 milhões no ano de
1500, temos hoje, depois de inúmeras políticas públicas de saúde
e sobrevivência indígena, menos de 1 milhão, apenas cerca de
817.963 de acordo a informações do último censo do IBGE, em
2010. Embora, possa parecer um número muito pequeno, mas ele
já foi bem menor. 
O fato é que, essa população vem lutando para preservar seus
costumes resgatando a identidade de seu povo. Esse número é
com certeza muito maior, mas muitos indígenas devido ao grande
sofrimento com o preconceito, não se declaram no censo como
indígena ou descendente de índio. Mesmo porque durante muito
tempo, o não se apresentar ou não se declarar indígena era um
fator de autoproteção, pois, se nos tempos de hoje a falta de
conhecimento sobre os mesmos ainda é motivo de preconceitos e
discriminações, imaginemos no início da república em que se
disseminava o ódio contra os nativos em defesa do que
chamavam de “nacionalismo” brasileiro. O fator identificação aqui
era um problema bem mais complexo do que o simples
reconhecimento de suas origens e ou dos elementos que
conotam sentimentos de pertencimento. 
Os dados do IBGE mostram que, desses 817.963, estima-se que
502.783 vivem em zonas rurais, e 315.180 vivem em zonas
urbanas. O censo de 2010 também constatou que populações
indígenas existem em todos os estados da federação inclusive no
Distrito Federal, a capital do Brasil. O mesmo censo constatou
que ainda existem 274 línguas faladas, ou seja 17,5% da
população indígena brasileira fala línguas próprias e
provavelmente falam também o português. Compõem ainda 305
etnias diferentes. Mas, onde estão esses indígenas? Por que com
274 línguas faladas no Brasil muitos de nós nunca tínhamos
ouvido ainda, falar sobre esse assunto?
Os povos indígenas são importantes, para a manutenção da vida
no Brasil. Graças às suas contribuições, temos hoje a agricultura
com toda a sua diversidade. Essas comunidades têm por hábito o
conhecimento integral da região em que eles vivem, o que nos
propicia uma riqueza de informações sobre as plantas e animais
desse lugar. Segundo a antropóloga Manuela Carneiro Cunha,
que há décadas estuda a vida e a contribuição dos indígenas no
Brasil, a principal contribuição dos povos indígenas está na
preservação da floresta e de tudo que há nela (CUNHA, 2012). 
 
Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), existem cerca
de 107 povos indígenas que ainda não têm contato com não-
índios. Possivelmente esses povos se afastaram depois de
períodos de grandes conflitos, se interiorizando para o meio da
mata. Eles não querem contato nem com outros indígenas.
Para saber mais sobre a Funai, visite o endereço:
<http://www.funai.gov.br/>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 8/29
As regiões mais verdes do país se concentram exatamente nas
áreas onde vivem os povos indígenas. Eles necessitam da mata
para sua subsistência. Por exemplo, o povo Baniwa que vive às
margens do Rio Içana, no alto do Rio Negro, no estado do
Amazonas, distinguem mais de 53 tipos de paisagens, onde um
ecólogo distinguiria cerca de 10 ou 12. O mesmo se repete com
outros conhecimentos e outros povos. Nos diferentes estudos e
pesquisas coordenados por ela, Manuela Carneiro Cunha ressalta
que o conhecimento dos indígenas é muito fino e apurado.
Quando se trata de plantio, por exemplo, e em épocas de
mudanças climáticas como o aquecimento global, são os
conhecimentos indígenas sobre as espécies e suas resistências
climáticas que irá nos garantir alimentos. Ela ainda lembra que
muitos povos indígenas já faziam isso a muito tempo, e que o fato
de ainda termos alguns alimentos como o amendoim, a mandioca,
o guaraná, o pequi e outros, é porque foram cultivados por
diversos povos anteriormente (CUNHA, 2012).
 
Figura 3 - Tribo Kamayura, no Mato Grosso, reúne 400 indígenas. Fonte:
Frontpage, Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
1.2 Por mais humanidade: a luta por
direitos, justiça e respeito
 Depois das invasões e submissões dos povos nativos da América
e do continente africano aos mandos e desmandos da coroa
portuguesa, algumas legislações foram criadas para legitimar o
que chamavam de “guerra justa”, que era a autorização
concedida pela igreja para a caça e o extermínio dos povos
indígenas que oferecessem resistência ou que dificultassem os
trabalhos de exploração das novas terras. A discussão sobre os
direitos dos povos “submetidos” se ampliava no início das
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 9/29
grandes navegações, por volta de 1415, quando os europeus
chegaram para explorar o continente africano e a Índia. 
As Cartas Régias eram documentos organizados pelos papas
para atender aos interesses do Rei e da Igreja. No início havia um
certo dilema religioso sobre a crueldade com os nativos, porém,
logo trataram de tecerem justificativas “em nome de Deus”. Mas a
igreja católica havia passado pela reforma protestante que
resultou numa separação. Em termos de adeptos, isso significava
perda e diminuição do poder, com o risco de o grupo protestante
crescer e ficar mais poderoso.
Na ocasião da reforma protestante, no ano de 1517
aproximadamente, a igreja católica se divide e começa a sentir a
necessidade de ampliar o número de fiéis. Dentre outros fatores,
os papas criam formas que garantem à igreja a conquista de mais
fiéis. É neste pressuposto que a igreja católica romana passa a
acompanhar as expedições marítimas com o objetivo de converter
os povos não europeus que consideravam pagãos. Desta forma
teve nos povos africanos, indianos e indígenas brasileiros, seus
principais interlocutores, que teriam sua autonomia e direito à
liberdade tutelados aos interesses católicos. Os aldeamentos
traziam alta rentabilidade para a igreja, que começa a apresentar
maior poder, devido às estratégias de catequização em que se
ensinava a língua portuguesa para as crianças indígenas órfãs,
sobreviventes às chacinas dos bandeirantes.
Discussões importantes sobre direitos originários surgem na
universidade de Salamanca na Espanha por volta de 1530 a 1540
quando o teólogo Francisco de Vitória, publica suas conferências
em defesa dos povos que estavam sendo dizimados, os
chamados “índios” da América e questiona a atuação dos
cristãos, no caso os padres, como cúmplices dessas atrocidades.
Essa defesa é considerada como o ponto de partida do Direito
Internacional Moderno. Desta forma o teólogo trava uma luta com
as autoridades monárquicas da época. Francisco Vitória inicia
então em 1534 um marco na discussão sobre direitos humanos,
dentro do catolicismo da época, e se coloca totalmente contra o
que estavam chamando de “Guerras Justas”. Ressaltamos aqui a
existência de movimentos contra hegemônicos às condutas dos
colonizadores com os povos nativos das terras “descobertas”. 
É desses movimentos de intelectuais renomados
internacionalmente, que mais tarde seguirá uma linha de
denúncias sobre essas desumanidades mesmo que ainda sem
muito sucesso. Mas a pressão aos poucos e ao longo de séculos,
passa a fazer diferença na defesa e proteção da diversidade
humana. Desde o ano de 1534 muito se discutiu e avançou em
termos da concepção dos Direitos Humanos e das legislações
relacionadas, mesmo que não necessariamente efetivadas. No
mesmo sentido os povos indígenas em alguma medida se unem e
buscam se organizar nas lutas pela sobrevivência e por seus
direitos. Inúmeras batalhas são impetradas, algumas com vitórias
indígenas, mas os portugueses retornavam com exércitos ainda
maiores e mais cruéis.
Mais tarde a legislação volta a reconhecer, a constar osdireitos
congênitos (por nascimento) e originários dos povos indígenas.
Esse movimento internacional pressionava os portugueses, que
passaram a criar formas de constar provas públicas de que o
Brasil reconhecia os povos indígenas como originários. Sempre
sem a intenção de cumpri-las.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 10/29
Enfim, depois de muita pressão política dos movimentos
indígenas e mecanismos dos “Direitos Humanos” e dos povos
brasileiros, na Constituição de 1988, no artigo 231, os povos
indígenas são reconhecidos em seus direitos originários, com
suas diferenças, especificidades a serem mantidas e afirmadas. A
despeito do Estatuto Indígena de 1973, que também previa o fim
de suas culturas em que deveriam ser civilizados e incorporados
à sociedade como trabalhadores. Que seria o mesmo que
continuar como escravizados e aculturados.
É na perspectiva da defesa dos Direitos Humanos que em 1907,
os então governantes brasileiros, são denunciados no Congresso
Internacional dos Americanistas, na cidade de Viena na Áustria,
pelo “extermínio” de inúmeros povos indígenas, suas culturas e
línguas. Isso resultou na criação pelo Governo de Nilo Peçanha,
de um órgão para tratar dos problemas indígenas levantados pela
denúncia. Nilo Peçanha chama Cândido Mariano da Silva Rondon
para criar o Serviço de Proteção ao Índio – SPI. Rondon era um
militar recém-formado pela linha de oficiais científicos do Exército
Brasileiro, que no final de sua vida receberia o título de Marechal.
A escolha de Rondon iria mudar os rumos da história e da
preservação da diversidade indígena brasileira, mesmo que ainda
distante do ideal humanitário. 
Rondon era descendente indígena Terena e Bororo por parte de
seus bisavôs maternos e Guará por parte de sua bisavó paterna,
deveria unir o território, conhecer sua natureza, ser o instrumento
de uma articulação política ao qual estava a serviço. Seria um
símbolo nacional republicano: militar, positivista, patriota e
civilizado. Deveria ainda fazer contato com os povos indígenas do
sertão. Ter formação científica militar na área da engenharia, da
etnologia, da geografia com sensibilidade botânica e estando a
serviço do Estado, foram fatores preponderantes para o sucesso
dos trabalhos de Rondon. O fato de Rondon ser descendente
indígena pode ter influenciado na sensibilidade humanitária e
identificação tanto por parte dele como por parte dos indígenas,
em que ambos desenvolveram reciprocamente, grandes afeições
e respeito. 
O Brasil precisava mostrar ao mundo e aos próprios brasileiros,
uma unidade e integração nacional que respeitasse a diversidade
humana de forma a integrar os índios à civilização sem violentá-
los. Mesmo sendo esse trabalho comparado à mesma finalidade
dos Bandeirantes, que era explorar as potencialidades e riquezas
do interior, com o sentido de civilizar e aculturar os indígenas,
Rondon institui o lema de “Matar nunca, morrer se preciso for”.
O primeiro e único deputado federal indígena foi o Cacique Mário Juruna, eleito
pelo PDT-RJ. Nascido em 3 de setembro de 1943, na aldeia xavante Namakura,
próxima a Barra dos Garças (estado de Mato Grosso), ficou conhecido por sempre
portar um gravador no qual registrava tudo o que as autoridades do “homem
branco” conversassem com ele. Morreu em 17 de julho de 2002, aos 59 anos, em
decorrência de diabetes. Para saber mais, acesse o endereço:
<http://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa/layouts_deputados_biografia?
pk=123254&tipo=0>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 11/29
Sua clareza científica de que não se pode modificar as crenças e
religiões indígenas, junto com seu poder de comunicação através
das linhas telegráficas, do registro fotográfico e videográfico,
inovadores para a época, são de extrema importância para a
mudança da mentalidade selvagem e primitiva sobre os povos
indígenas. Um dos legados mais importantes dos trabalhos e
filosofia de Rondon foi a idealização do primeiro parque indígena
do Brasil, criado em 1961 pelos irmãos Vilas-Bôas, o Parque
Indígena do Xingu, sendo a primeira terra indígena homologada
pelo Governo Federal, mesmo não sendo a terra tradicionalmente
ocupada pelas etnias que o compõem.
 
Rondon cria o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), transformado
em 1967 na Fundação Nacional do Índio (Funai). Na prática, a
Funai deveria identificar, demarcar e monitorar as terras indígenas
e quilombolas. Mas também tinha a tutela sobre os indígenas que,
por exemplo, só podiam sair de suas aldeias se e quando a Funai
autorizasse. Durante os anos da ditadura não puderam registrar
suas crianças com nomes indígenas conforme seus diferentes
costumes. Assim atuou a Funai sob a prestação de apoio e
responsabilidade social. Nesta época também já se consolidava
na legislação brasileira e nas lutas por direito, o movimento negro
e quilombola.
 
A seguir, veremos com mais detalhes sobre a demarcação das
terras indígenas.
 
1.2.1 Você sabe como o processo de
demarcação das terras indígenas
acontece hoje?
 Desde o ano 2000 Movimentos Indígenas e Quilombolas tem
lutado ferrenhamente contra a Proposta de Emenda
O filme Xingu, dirigido por Cao Hamburger, retrata a história dos irmãos Orlando,
Claudio e Leonardo Villas-Bôas que, durante a década de 1940, conseguiram
contatar aldeias indígenas ajudando a passar para mundo uma visão diferente da
que se tinha na época. Para assistir na íntegra, acesse o
endereço: <https://www.youtube.com/watch?v=R7YhzUu6b7k>.
O site do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) disponibiliza
uma coleção de publicações que é fruto da parceria com o Ministério do
Desenvolvimento Agrário e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Coleção Terras de Quilombos reúne um conjunto de narrativas a respeito da
formação e das lutas de comunidades quilombolas brasileiros para se manterem
em suas terras tradicionais. Para ler, acesse o endereço:
<http://www.incra.gov.br/memoria_quilombola#a2017>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 12/29
Constitucional conhecida como PEC 215, que pretendia modificar
os artigos 49 e 231 da Constituição Federal e transferir do
executivo (presidência), para o legislativo (deputados), a
prerrogativa de “demarcar” as terras ocupadas pelos indígenas e
quilombolas. Essa grande mobilização social organizada pelos
Movimentos Indígenas e Quilombolas, era tentativa de dificultar a
aprovação da mesma. A pressão popular incomodava os
deputados da Bancada Ruralista por que ficariam com uma
imagem ruim perante a opinião pública, caso aprovassem a PEC
215 (BRASIL, 2017). 
 
Então, o atual Presidente Michel Temer, assinou no dia
20/07/2017, de forma articulada com alguns ministérios, o que
chamaram de “Parecer Vinculante”, organizado direto da
Advocacia Geral da União – AGU - que entre outras questões
contraditórias aos direitos indígenas e quilombolas, institui, torna
legal e vigente, o marco temporal tão esperado pelos ruralistas na
PEC 215. Desta forma tornam válidas legalmente, as demandas
desta fatídica PEC (BRASIL, 2017).
 
1.2.2 Entendendo melhor o conceito de
marco temporal
 O jurista e professor emérito da Faculdade de Direito da USP,
Dalmo Dallari (2017) explica que o marco temporal significa que
os indígenas só poderiam pedir demarcação de terras se
estivessem vivendo nelas no dia 5 de outubro 1988. Dia em que a
Constituição Federal foi promulgada. Essa ideia segundo o jurista
é absurda, nãotem nenhuma consistência jurídica, além de ser
Figura 4 - Em abril de 2017, mais de 4.000 indígenas se mobilizaram pela luta
e defesa de seus direitos. Fonte: Filipe Frazão, Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 13/29
imoral e inconstitucional, já que a própria Constituição define que
pertencem às comunidades, as terras que, tradicionalmente
ocupam. Ele ainda ressalta que essa ocupação não se restringe
ao lugar onde se estabelecem suas aldeias ou comunidades, mas
refere-se a todo um território onde tradicionalmente circulam, para
o atendimento de suas necessidades fundamentais.
Esse marco temporal mostra, mais uma vez, uma situação
histórica de injustiça contra os povos indígenas e quilombolas. Já
que muitos desses povos não estavam em suas terras na data em
questão – 1988 –, assim como não estão até os dias de hoje,
porque fazendeiros e latifundiários, com extrema violência, os
expulsaram de suas terras.
Mesmo com todas as dificuldades, os movimentos de lutas por
direitos não se intimidam. Entre as conquistas, as leis
10.639/2003 e 11.645/2008 vêm garantir que toda a população
possa conhecer as riquezas das diversidades indígenas e afro-
brasileiras, como também suas lutas por direitos, justiça social e
igualdade (BRASIL, 2003; 2008). 
1.2.3 Propriedade intelectual
 Os conhecimentos e saberes indígenas foram utilizados pelos
portugueses, em todas as áreas e mesmo assim não foram
respeitados. Ao contrário, assim como fizeram com os
conhecimentos africanos, muitos desses conhecimentos foram na
verdade roubados dos povos indígenas. Foram e são utilizados,
sendo divulgados como conhecimentos europeus. 
Os povos indígenas possuem uma riqueza imensa em seus
conhecimentos diversos. Detém vasto conhecimento sobre as
espécies cultiváveis, sobre o solo, o clima, o ciclo das águas, o
uso das ervas, princípios ativos medicinais, dentre tantos outros,
fora um amplo e diversificado repertório artístico cultural,
simbólico, religioso, ritualístico, musical, instrumental, laboral,
autossustentável e ecologicamente correto de manejo dos
recursos naturais, capacidades e características utilitárias de
determinadas plantas e/ou derivados. 
Essas informações são passadas de geração a geração. São
saberes veiculados e compartilhados oralmente, por que dentro
da diversidade humana, há povos grafocêntricos e povos não
grafocêntricos. Essas são algumas configurações em que, a
produção de conhecimentos resultada dos fazeres, viveres
coletivos, modos e técnicas específicas que são parte dos
aspectos culturais de um determinado povo. Por isso tudo
configuram o direito intelectual. O direito intelectual é um aspecto
passível de reinvindicação quando resulta em algum tipo de
produção para outros e/ou que possa ou que venha a ter alguma
relação de consumo comercial. 
Devido ao fato dos conhecimentos, técnicas, objetos, elementos e
produções indígenas serem expostos em vários lugares, podendo
ser reproduzidos por qualquer um, sem necessidade de
autorização e sem pagar direitos autorais, os indígenas criaram
em 2003 o Instituto Indígena Brasileiro da Propriedade Intelectual
(Inbrapi). O Instituto pretende instruir os indígenas alertando para
sua riqueza cultural e que ela só deve ser usada dando crédito a
quem fez com o devido pagamento por sua utilização, segundo os
moldes da cultura ocidental (INBRAPI, 2018). 
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 14/29
Para entender melhor o que foi estudado até aqui, observe o caso
a seguir.
Na sequência, você conhecerá um pouco da história da
escravização dos africanos no Brasil.
 
Dois professores do povo Terena no Mato Grosso, em
2010, conseguiram deslocar o foco da produção de
conhecimento de dentro da Universidade para uma aldeia
indígena, e em sua língua nativa. Com uma pesquisa
intercultural sobre e educação escolar e a língua materna,
conseguiram levantar e entender os elementos da
escolarização brasileira que extinguiram inúmeras e
riquíssimas línguas nativas. Dessa forma, entenderam os
meios em que poderiam desenvolver nas crianças
indígenas o bilinguismo, dentro da valorização do fazer e
viver indígena, no caso da língua terena.
À medida que foram mudando os moldes e fortalecendo o
aprendizado das crianças terenas, em sua própria língua,
elas passaram a entender e a aprender com mais
domínio e fluência, também, a língua portuguesa,
diminuindo assim o alto índice de repetência e evasão
escolar.
A pesquisa teve como objetivo analisar essa experiência.
Os mestrandos realizaram testes de leitura e
compreensão de texto com crianças terenas
alfabetizadas na língua indígena e com outras
alfabetizadas em português. Os resultados foram
surpreendentes: no primeiro caso, as crianças que liam e
escreviam em língua terena, se expressavam com mais
fluência – inclusive em português – e interpretavam textos
com mais facilidade nas duas línguas (FREIRE, 2010).
 
1.3 As raízes arrancadas: uma imigração
forçada de homens e mulheres
 Já entendemos que o viés a qual a história é contada, depende
muito de quem a escreve, e o que se pretende, ao transmitir essa
história. Nos livros didáticos, durante muitos séculos, os negros
escravizados eram contados apenas como mão de obra e força
braçal. Afinal, para quem escreveu essa história, era preciso
torná-los menos humanos para justificar a escravidão. Há muito
pouco dessa história contada pelos próprios escravizados.
O Oceano Atlântico, que até o início das grandes navegações era
uma barreira física difícil de ser superada, tornou-se um imenso
corredor de deslocamentos forçados de pessoas, uma
imensurável diáspora negra. Um sequestro de proporções
históricas irreparáveis. Mesmo com sua longa extensão oceânica
até as Américas, não impediu o repovoamento do território,
depois de ter massacrado seus habitantes nativos. E, a cada
século, as proporções desse quantitativo só crescia, já que
aumentava a exploração das riquezas dessa nova terra. A
exploração agrícola com o cultivo de cana de açúcar absorveu
mais de dois terços de todos os escravizados trazidos para o
Brasil, seguido pela extração do ouro (VOYAGES, 2009).
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 15/29
Diante desse cenário, vale a reflexão: por que escravizar os
africanos?
Por volta do século XVI, na Europa, o conceito de escravidão
forçada de pessoas já tinha sido quase que totalmente abolido
das suas relações de trabalho. O fim do feudalismo e a crescente
industrialização mudavam as relações de trabalho, de cultivo e
abastecimento. Mas a fome e as doenças infectocontagiosas
assolavam e diminuíam a população.
Com a invasão da América, os portugueses tiveram acesso em
grande escala a produtos que, até então, eram escassos ou até
desconhecidos para a maior parte da população, como o açúcar,
o fumo, o ouro, alimentos altamente nutritivos, inúmeras
tecnologias e meios de processamentos inovadores. Depois de
conseguirem terras férteis, não tinham pessoas para a mão de
Figura 5 - A exploração agrícola no Brasil Colônia absorveu a maior parte das
pessoas trazidas da África para serem escravizadas. Fonte: Joseph Sohm,
Shutterstock, 2018.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 16/29
obra necessária. Os nativos da Nova Terra tinham pouca
resistênciaaos trabalhos e às torturas (e por isso quase foram
dizimados) e, na própria Europa, não se encontravam pessoas
suficientes para trabalharem em um local de clima tropical.
Dessa forma, coagir, dominar e obrigar pessoas, ou seja,
escravizar os do continente africano se tornou uma opção para
que pudessem manter sua nova condição de acesso a esses
produtos e consequentemente ao poder. Havia também o fato dos
povos africanos dominarem tecnologias e conhecimentos
essenciais para a exploração também das riquezas naturais, bem
como as pedras e metais preciosos. Os modos de vida e crenças
de cada uma das etnias envolvidas eram extremamente
diferentes entre si. Os portugueses incitavam os conflitos e o
domínio de uma etnia sobre outra, muitas vezes em nome de
Deus inclusive, como fizeram no Brasil. Denotam uma diferença
marcante que vai determinar a relação escravagista. A relação
identidade, alteridade e ética. Para os portugueses tudo se podia
com o outro, que não sejam eles. Por isso não foi difícil construir
justificativas, esconderem ou deturparem fatos, dados e
informações para validar a escravidão indígena e africana. 
Neste sentido identificam-se muitos problemas e dificuldades no
acesso e identificação de dados sobre o tráfico negreiro,
empreendido com o continente africano e o mundo todo.
Estudiosos e pesquisadores se reúnem no sentido de unificar e
complementar suas pesquisas. Contudo, somente no ano de 2009
criou-se um grande e importante banco de dados reunindo todas
e, essencialmente, as pesquisas mais completas sobre essas
longas viagens pelo Atlântico: o Banco de Dados do Tráfico
Transatlântico de Escravos.
A seguir, sintetizamos algumas informações que nos ajudam a
entender um pouco das complexidades que influenciaram e
influenciam as relações e concepções na formação do povo
brasileiro.
Os europeus, especialmente os portugueses incitavam criando
situações em que grupos africanos começaram a eleger, aqueles
dentro do seu povo, que poderiam ser vendidos como escravos
para trabalhar nas Américas. Essas diferenças não se deram por
questões econômicas, mas sim culturais e sociais. Alguns povos
africanos tinham por costume trazer para si, aqueles que eram
derrotados nas batalhas. Muitas vezes como forma de incorporar
a força dos admirados guerreiros. 
Antes de começar a traficar para o Brasil, os europeus já tinham o
costume de traficar africanos para Portugal e Espanha. Para o
Brasil o tráfico começou por volta do século XVI, impulsionado
pelas imensas fazendas de cana de açúcar, substituindo os
indígenas em alguns engenhos. No final do século XVII, as
descobertas de ouro, primeiro em Minas Gerais, mais tarde em
Goiás e em outras partes do Brasil, deram início a uma ampliação
no tráfico de escravos que provocou uma expansão ainda maior
desse comércio. Estima-se que no primeiro século de escravidão
vieram cerca de 34 mil escravizados, no segundo século cerca de
900 mil, no terceiro século cerca de 2 milhões, e entre 1790 e
1830 o Brasil recebeu em média 680 mil escravizados. E mesmo
depois desse ano em que a Inglaterra proibiu o comércio de
escravos, o Brasil continuou a investir, escravizando ainda, cerca
de 700 mil.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 17/29
Com base nos documentos dos próprios escravagistas, estima-se
que mais de 12 milhões de negros africanos vieram para as
Américas, e, destes, 5,5 milhões vieram para o Brasil. Imagine
quantos documentos não se perderam, ou foram
propositadamente destruídos, quantas informações poderíamos
ter desse período triste da história!
Nenhum europeu que foi trazido para as Américas, sendo ele um
condenado, servo temporário, ou imigrante livre miserável, jamais
foi submetido às mesmas condições que eram proporcionadas
aos escravizados africanos. Muito pelo contrário, a maioria
passou a trabalhar e a ter direito sobre a terra. Aos africanos, era
reservado o tratamento desumano, de serem colocados nus,
amontoados, acorrentados pelo pescoço, separados por sexo.
Cerca de 26% eram consideradas crianças. Em uma viagem de
aproximadamente dois meses, com pouquíssima comida, na
maioria das vezes era apenas milho velho cozido e água, e
dividiam o lugar com barris de água doce. Sem falar que as
péssimas condições geravam doenças gastrointestinais
endêmicas e a proliferação de agentes patogênicos epidêmicos. 
Houve muita luta em resistência à escravização. Cerca de 13%
dos que embarcavam não chegavam vivos em terra firme. E
sabendo da alta taxa de mortalidade dentro dos tumbeiros (nome
dados aos navios negreiros) os mercadores colocavam cada vez
mais negros em seus navios, para compensar as perdas.
Mantinham os cativos nos porões dos tumbeiros, por que se
ficassem na parte de cima, poderiam pular no mar, pois muitos,
assim como os indígenas, preferiam o suicídio, a aceitar a
condição de escravizado.
1.3.1 Separar para dominar
 Uma característica do tráfico negreiro era a mistura de diferentes
origens, etnias e línguas. Eles separavam os grupos familiares em
indivíduos, cortando vínculo sanguíneo ou de etnia, e cada
indivíduo era vendido separadamente para escravagistas
diferentes, e dificilmente essas famílias se reencontrariam. A
intenção, ao misturarem pessoas de diferentes etnias e que não
falavam a mesma língua, era dificultar que formassem grupos e
fizessem revoltas nos navios (tumbeiros), ou nas fazendas às
quais seriam destinados. Também se esforçavam para que os
escravizados perdessem suas origens e identificações, cortando
seus cabelos todos iguais, assim que chegavam em terra firme.
Faziam isso com a clara intenção de tirar-lhes a identidade, já que
na África cada povo, de cada território, tinha sua própria forma de
cultivar os cabelos, meio pelo qual reconheciam o território ao
qual cada um pertencia. 
Os que sobreviviam e chegavam em terra firme, eram separados
de acordo com seu estado físico. Alguns chegavam em situação
física tão precária, desnutridos, doentes e feridos, devido aos
extremos maus tratos sofridos na viagem, que era necessário
ficarem em casas de engorda até chegarem ao peso aceitável
para venda – colocados em filas, expostos como novas
mercadorias, para a escolha dos fazendeiros. 
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 18/29
Muitos que aqui chegavam não sobreviviam e eram levados para
o Cemitério dos Pretos Novos (mercadorias novas que não
chegaram a ser usadas), esses corpos eram enterrados e
posteriormente seus restos eram queimados. Isso aconteceu de
formas similares nos diversos portos escravistas, mas no Cais do
Valongo no Rio de Janeiro as quantidades foram notadamente
maiores. Ao serem comprados os escravizados eram marcados
com ferro quente (ferrete), como se marca boi no pasto, para se
saber ao qual fazendeiro pertencia. Os cativos ficavam em uma
espécie de galpão, com poucas janelas e sem divisória,
comumente chamada de senzala.
As senzalas eram galpões em que os escravos ficavam
aprisionados durante as poucas horas em que não estavam
trabalhando. Eram espaços de péssimas condições higiênicas
com pouca ventilação em que amontoavam os escravos para não
fugirem e ou nas situações de castigos em que ficavam
acorrentados quase sempre, com instrumentos torturantes fixados
nos corpos. Dormiam direto no chão e eram vigiados todo o
tempo para que não fugissem. Tinham uma única refeição no final
do dia. As religiões africanas eram expressamente proibidas, para
que não se sentissem fortalecidos psicologicamente. Alguns
fazendeiros permitiam em determinadas ocasiões que fizessem
pequenas celebrações. 
Os homens acordavam muito cedo caminhavam distancias longas
até a lavouraonde passavam o dia inteiro. As mulheres que não
estivessem na lavoura, trabalhavam nas casas dos fazendeiros.
Todos os cativos viviam sobe a vigilância de homens armados,
conhecidos como feitores. Um tronco era erguido sempre em
frente as senzalas para os castigos físicos. O estupro e a
violência comas mulheres negras, eram tão comuns, que muitas
das senhoras brancas, também subjugadas, optavam por fingirem
não saber o que acontecia neste sentido. O comércio
escravagista era tão rentável que um escravizado tinha um
considerável valor econômico. E por isso, cada negro que fugia
ou morria, era uma perda econômica considerável para o
escravagista. 
1.3.2 Lutas e resistências dos
escravizados
 Durante os quase 350 anos em regime de escravidão, o Brasil se
viu em meio a muitas revoltas, além de resistências dentro das
próprias fazendas. Várias foram as formas, encontradas pelos
cativos para combater a escravidão. Uma delas era o suicídio,
meio pelo qual a morte se tornara uma forma de, não só gerar
prejuízo ao fazendeiro, mas também uma forma de acabar com o
próprio sofrimento. Da mesma forma, os abortos, se tornaram
também uma forma de resistência, uma vez que as mulheres
tinham de tomar a decisão de abortar seus filhos para que não
vivessem como escravos. Também eram feitas paralisações
O Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, foi construído em 1811 para o
desembarque de escravos destinados à América do Sul, e por ali chegaram cerca
de 900 mil escravizados. Em 2017, foi reconhecido como patrimônio da
humanidade pela Unesco. Para ler mais sobre essa história, acesse o endereço:
<http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/culture/world-heritage/list-of-world-heritage-
in-brazil/valongo-wharf-archaeological-site/#c1640115>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 19/29
(espécies de pequenas greves), mesmo que terminassem em
severos castigos. 
Foi nesta perspectiva de luta que aconteceu a famosa Revolta
dos Malês. Com base em informações da Fundação Cultural
Palmares (BRASIL, 2016), o levante ocorreu na cidade de
Salvador (BA), entre os dias 24 e 25 de janeiro de 1835. Na
Revolta dos Malês misturavam-se homens livres com ainda
cativos, no caso, escravos africanos de várias etnias, com
protagonismo dos de origem nagô (também conhecidos como
iorubás). A revolta seria para tomar o governo, para libertação dos
escravos africanos de origem mulçumana, mas foi denunciada às
autoridades, que impossibilitou o total sucesso da mesma.
Embora o levante não tenha tido sucesso que pretendiam, essa
revolta, levou um alerta, não somente às ruas da Bahia, mas
também a todo o país. Ficou claro ao Governo e aos fazendeiros
que a união dos escravizados poderia levá-los à liberdade. Outra,
e talvez a mais conhecida forma de resistência eram os
quilombos, que são lugares, formados por escravos fugitivos das
fazendas, assim como homens livres, mas pobres e em alguns
casos também indígenas. Os quilombos eram e são até hoje,
comunidades invisibilizadas em nossa sociedade, não só pelo
racismo, preconceito e discriminação que sofrem, mas
especialmente como forma de resistência, luta e sobrevivência. 
1.3.3 O processo de abolição da
escravatura
 Como resultado de diferentes acordos em que visavam garantir a
não tomada de poder pelos negros e abolicionistas, e também
como forma de atender aos interesses dos países aliados, como a
Inglaterra, que nessa época era uma das maiores potências
econômicas e possuía uma forte área industrial. A abolição como
lei, foi assinada pelo fato de que já não havia mais interesses na
escravidão, especialmente por parte da Inglaterra que agora
almejava obter público assalariado que consumisse seus
produtos. Por isso exigia o fim do tráfico e da escravidão no último
país que ainda mantinha o regime. Também por inúmeras revoltas
negras que se espalharam pelo Brasil, e cada vez mais
frequentes fugas em massa para os quilombos. Havia também
uma forte pressão de pessoas da elite, os abolicionistas, que
pressionavam a Corte Portuguesa a tomar medidas gradativas
que culminou com a “abolição” brasileira apenas no papel, por
que na prática a escravidão permanecia. Essas medidas tinham a
finalidade apenas de modificar alguns aspectos, mantendo o
funcionamento do sistema escravista.
A primeira medida foi a lei do fim do tráfico, de 1831, pela qual
qualquer homem negro que chegasse ao Brasil após a
promulgação da mesma, seria um homem livre. No entanto, foi
mais uma lei criada para não ser cumprida – a chamada “lei pra
inglês ver”. Outra lei para este fim foi aprovada em 4 de setembro
1850, a lei Eusébio de Queiroz, que além de proibir o tráfico de
escravos no Atlântico, instituía o monitoramento pela Inglaterra
dos navios que circulavam, podendo apreender além de multar
qualquer “tumbeiro” que viesse com mais escravizados para o
Brasil. Prado Jr. (1970, p. 149), destaca que: 
[...] a repressão, apesar do direito de visita em alto-mar, lutava
com uma grande dificuldade: é que os navios negreiros, quando
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 20/29
se viam acossados pelo inimigo e não lhe podiam escapar,
lançavam ao mar sua carga humana, destruindo assim o corpo
de delito comprometedor, e inocentando-se com isto perante os
tribunais internacionais que os deviam julgar. 
Outra medida criada, porém, sem efetivamente mudar as relações
escravistas, foi a Lei do Ventre Livre, de 28 de setembro de 1871,
que determinou que os filhos que as escravas estivessem a partir
desta data nasceriam livres da escravidão. A lei dizia ainda que
até os 8 anos de idade a criança estaria sob a guarda do
escravagista, e que a partir daí poderia permanecer nas fazendas
servindo o senhor escravista, até completar 21 anos. 
Aprovada em 1885, a Lei Saraiva-Cotegipe, mais conhecida como
Lei do Sexagenário, libertava aqueles escravizados que
chegassem até os 65 anos de idade. Devido às más condições
das senzalas, péssima alimentação, extremos maus tratos,
trabalho nas piores condições possíveis, pouquíssimos chegavam
até essa idade. E aqueles que ainda o conseguiam, estariam
livres para ir às ruas, sem dinheiro, sem ter onde morar, e com
idade já avançada para conseguir serviço. Na maioria das vezes,
quando os escravistas permitiam, acabavam por continuar nas
fazendas sob o regime da escravidão. Na prática esta lei,
beneficiava os fazendeiros que poderiam se livrar dos escravos
idosos que não tinham mais valor para serem vendidos. 
E finalmente, na última década do período imperial brasileiro, o
contexto era de instabilidade e tensão social. Sob extrema
pressão abolicionista, especialmente pelo risco das organizações,
movimentos negros e quilombolas tomarem o poder, em 13 de
maio de 1888, veio por fim a Lei Áurea. Com um resumidíssimo
texto, de uma página, com letras adornadas e bonitas, como era
de sua época, sendo último país independente a fazer isso depois
de quase 350 anos, se põe fim, em teoria, na dor de pelo menos
700 mil ainda escravizados, no Brasil.
A luta pela liberdade foi apenas uma das inúmeras e diferentes
lutas que herdamos desde a África e que, vão influenciar, não só
na organização social do Brasil, como também na cultura e na
configuração identitária do brasileiro. Uma vez que, o espírito de
luta e resistência dos povos indígenas sobreviventes, se mescla e
integra aos africanos de diferentes formas, dando corpo à cultura
afro-brasileira e disseminando o sentimento quilombista. 
 
Memórias do Cativeiro (2005) é um documentário com base nos depoimentos dos
netos de escravos, que descrevem, como era contada por seus avós, a história da
escravidão e da abolição.O vídeo foi produzido pelo Laboratório de História Oral e
Imagem da Universidade Federal Fluminense (UFF/RJ), com roteiro baseado no
livro “Memórias do Cativeiro: família, trabalho e cidadania no pós-abolição”, de
Ana Lugão Rios e Hebe Mattos (2005). Para assistir, acesse:
<https://www.youtube.com/watch?v=P1DgfyI7D9A&t=3255s>.
1.4 O que herdamos da mãe África
Á
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 21/29
 Os europeus iniciam a tomada de território e exploração em África
por volta do século XV. Isso ampliou e acelerou a expansão do
cristianismo no continente, que era imposto como forma de
dominação. Fizeram com os povos africanos, em proporções
ainda maiores, o que fizeram com os indígenas. Especialmente
com aqueles povos africanos que os europeus chamaram de
jagas e imbangalas. Etnias que resultaram da junção de outras
que derrotadas, se uniam e rearticulavam permanecendo em luta
e resistência contra os europeus no interior do continente
africano. Se por um lado os europeus incitavam a guerra de uma
etnia contra a outra, isso também acabava por gerar parcerias e
uniões em combate contra os mesmos. Os indivíduos das etnias
derrotadas se juntavam para recompor e reformular seus
exércitos para assim se defenderem contra os estrangeiros
brancos. 
A resistência e autoproteção natural dos africanos contra as
doenças trazidas pelos europeus, ao contrário dos indígenas
brasileiros, era um fator positivo para a sobrevivência. Diferentes
conhecimentos e habilidades recebiam a mesma importância na
luta pela sobrevivência e pela derrota do inimigo comum. Por isso
conseguiam garantir alimentação e a produção de armas. Foi
desta forma que o reino de Ngola (hoje Angola), deu proteção e
apoio a inúmeras outras etnias que fugiam da devassa europeia. 
Nzinga Mbandi se tornou rainha de Ngola a partir dessa união e
necessidade de luta. Seus conhecimentos, estratégias de guerra
e sentimento unificador possibilitou a estruturação de exércitos
poderosos que assustavam e derrotavam os europeus. Fato que
ficou amplamente conhecido em todo o continente e fora dele. A
rainha Nzinga Mbandi recebia o significado de força e esperança
para os quilombos. O termo quilombo, em África, significava a
organização que estabelecem para a guerra na unificação de
diferentes etnias, representando local de moradia, proteção,
refúgio, fortaleza e união das diferenças, em função da luta pela
vida e pela liberdade, como nos mostra Munanga (1996, p. 60): 
 
A palavra quilombo tem a conotação de uma associação de
homens, aberta a todos sem distinção de filiação a qualquer
linhagem, na qual os membros eram submetidos a dramáticos
rituais de iniciação que os retiravam do âmbito protetor de suas
linhagens e os integravam como co-guerreiros num regimento de
super-homens invulneráveis às armas de inimigos (10). O
quilombo amadurecido é uma instituição transcultural que
recebeu contribuições de diversas culturas: lunda, imbangala,
mbundu, kongo, wovimbundu, etc. 
Esses dados e fatos nos levam a entender que os primeiros
escravizados a se aquilombarem no Brasil, eram provenientes
das etnias jagas e imbangalas. Os indivíduos capturados pelos
eram sequestrados, escravizados e enviados para o Brasil nos
navios negreiros, os chamados tumbeiros. No início, para
Portugal e Espanha; depois o destino principal passou a ser o
Brasil. Logo nos primeiros navios carregados de africanos
capturados e enviados para o Brasil, houve lutas quilombolas.
Guerreiros jagas e imbangalas, fortes e bem preparados, ao
chegarem em solo brasileiro, logo se reorganizaram para o
enfrentamento e as fugas. Assim, instituíram os primeiros
quilombos no Brasil. O povo de Zumbi de Palmares seria
descendente do reino da rainha Nzinga Mbandi, cuja história,
feitos e informações chegavam aos escravizados no Brasil
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 22/29
através das contínuas levas dos navios negreiros. Temos uma
mulher africana como heroína e referência de luta e resistência
também para a diáspora.
Os portugueses passaram a misturar ainda mais as etnias na
intenção de dificultar a união e comunicação entre os
escravizados para assim evitar as fugas. Como organização
política, os quilombos e quilombolas no Brasil, dão sequência às
lutas e resistências estabelecidas em África contra esse modelo
colonialista. Portanto, podemos dizer que os quilombos brasileiros
herdaram o espírito de luta, de garra e de sobrevivência de
nossos ancestrais africanos.
Pelo conteúdo, o quilombo brasileiro é, sem dúvida, uma cópia
do quilombo africano reconstruído pelos escravizados para se
opor a uma estrutura escravocrata, pela implantação de uma
outra estrutura política na qual se encontraram todos os
oprimidos. Escravizados, revoltados, organizaram-se para fugir
das senzalas e das plantações e ocuparam partes de territórios
brasileiros não-povoados, geralmente de acesso difícil. Imitando
o modelo africano, eles transformaram esses territórios em
espécie de campos de iniciação à resistência, campos esses
abertos a todos os oprimidos da sociedade (negros, índios e
brancos), prefigurando um modelo de democracia plurirracial que
o Brasil ainda está a buscar. Não há como negar a presença, na
liderança desses movimentos de fuga organizados, de indivíduos
escravizados oriundos da região bantu, em especial de Angola,
onde foi desenvolvido o quilombo (MUNANGA, 1996, p. 63).
Assim, a forçada diáspora africana consolidou-se ao configurar
novas identidades. Os guerreiros resistentes tinham a prática de
rituais de iniciação aos novos integrantes a serem incorporados,
que os retiravam do âmbito protetor de suas linhagens e os trazia
para o sentimento de super-homens invencíveis, essa nova
identidade era levada a cabo como tal, e assim se sentiam os
guerreiros quilombolas. Quando os sequestradores os
capturavam, procuravam quebrar essa identidade através de
práticas e rituais contrários, buscando crenças e costumes ainda
em África que pudessem enfraquecer, no caso, que iriam retirar-
lhes essa “superidentidade”. Fazendo-os perderem a crença em
suas potencialidades e capacidades de luta, de resistência e
braveza. 
Esses sequestradores tentaram usar a árvore do Baobá, que é
uma árvore simbólica do pertencimento, da identidade e
sabedoria africana. É na sombra do Baobá que os Griots,
pessoas responsáveis pelo repasse das histórias de um
determinado povo, cantam, contam e encenam suas histórias.
São as histórias e feitos de um povo que mostram quem é esse
povo. A sombra do Baobá ou em bondeiro, era lugar de
conhecimento e memória dos antepassados, tinha o objetivo de
gerar o sentimento de pertencimento, identidade e continuidade.
Os sequestradores europeus passaram a usar esse fazer cultural
na forma contrária, na tentativa de incutir o esquecimento, e
apagamento das memórias que diziam ao indivíduo quem ele era
para assim lhe incutir uma nova identidade, a de cativo,
escravizado. Porém, como fortes e sábios guerreiros, outras
estratégias também foram criadas em contraposição às
dominações impostas às mentes e sentimentos africanos. Como
consideram Follmann e Pinheiro (2013, p. 27) sobre a árvore do
esquecimento:
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 23/29
A “árvore do esquecimento” não deve ser estritamente ligada à
ideia de alienação (Follmann apud Follmann, 2012), mesmo que
essa fosse a intenção dos traficantes. Era à sombra das árvores
que os “Griots” (sábios, contadores de história), especificamente,transmitiam toda robustez dos ensinamentos culturais passando
seus valores de geração a geração. Tratava-se de uma
referência cultural muito profunda. Pode-se auferir daí que um
ritual de esquecimento tenha, em muitos casos, assumido, na
dor, o significado de ritual de resistência e reafirmação das
raízes culturais, que jamais poderiam ser esquecidas.
Dessa forma, esses guerreiros africanos trazidos para o Brasil
subvertiam a imposição do esquecimento e permaneciam com o
sentido de união e luta, o que no Brasil irá produzir as
africanidades brasileiras na mesma linha dos significados dos
quilombos. Nesse sentido, essa diáspora africana acontece de
forma a que os novos lugares ganham significados de esperança,
renovação das forças de luta e resistência.
 
Foram inúmeras as estratégias para impelir ou para impor aos
guerreiros lutadores a identidade de cativo, de escravizado, e
assim minar suas forças de resistência. Usaram fatores que
pudessem atingir a autoestima naquilo que cultural e socialmente
tivesse importância para os africanos. Por exemplo, para os
povos africanos, os cabelos são símbolos de identidade, status,
realeza, fertilidade e poder, como nos apresenta Gomes (2003, p.
82):
 
Desde o surgimento da civilização africana, o estilo do cabelo
tem sido usado para indicar o estado civil, a origem geográfica, a
Figura 6 - Baobá é a árvore que simboliza o local em que as histórias são
repassadas às novas gerações. Fonte: angelo lano, Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 24/29
idade, a religião, a identidade étnica, a riqueza e a posição social
das pessoas. Em algumas culturas, o sobrenome de uma
pessoa podia ser descoberto simplesmente pelo exame do
cabelo, pois cada clã tinha o seu próprio e único estilo. 
Os africanos tinham suas cabeças raspadas ao chegarem ao
Brasil. Suas identificações, formas de valorização de seu
pertencimento e lugar deixaria de existir sob a imposição de uma
identidade vazia, em que só restava ao indivíduo a servidão e a
subalternidade cultural, religiosa e linguística em que o trabalho e
os conhecimentos tecnológicos seriam as únicas memórias a
serem acionadas. A cultura, a religião e a língua são impostas aos
escravizados, mas não da mesma forma que são repassadas e
valorizadas para os portugueses. Assim como faziam com os
indígenas, que deveriam ser civilizados nos moldes da servidão,
da obediência e do trabalho. Esse é o cerne em que vão chamar
de educação dos cativos. A estética do cabelo liso passa a ser
imposta especialmente às mulheres negras que trabalhavam na
casa grande e acompanhavam as filhas e filhos dos senhores de
engenhos.
 
1.4.1 Diáspora negra no Brasil
 No Brasil, os guerreiros então escravizados, se rebelam fugindo
para as matas onde trocaram conhecimentos do território e suas
potencialidades com os povos indígenas, interiorizados e ou
fugidos dos aldeamentos jesuítas. Assim fundam seus quilombos,
suas fortalezas incorporando agora, também guerreiros indígenas
brasileiros.
O sentimento quilombista já estava consolidado nas novas terras
e suas notícias corriam também no novo território. É esse
sentimento que gerará identificações positivas como alento
humano e humanitário nesse contexto de crueldades, devastação
e imposições alienantes e aculturativas. É um sentimento que vai
acompanhar os indivíduos onde quer que estiverem. Neste
sentido, a história da rainha Nzinga Mbandi, que durante décadas
comandou os exércitos jaga e imbangala em África, hoje é
homenageada na figura da rainha conga nos congados mineiros,
porém com pouco conhecimento pelos professores. Ainda há
muito desta história a ser conhecida e que nos dirá muito sobre
quem são as mulheres guerreiras quilombistas de África e do
Brasil também nos dias de hoje. Busquemos as histórias contadas
e escritas pelos nossos guerreiros e guerreiras (FONSECA,
2012).
Como já analisado, a abolição da escravatura, no Brasil, foi
direcionada para que acontecesse de forma gradativa e a manter
Único africano escravizado no Brasil a escrever sua própria biografia, Mahomma
Gardo Baquaqua narra os horrores vividos no Brasil desde 1845, quando chegou
ao país em um navio negreiro (MORENO, 2015). Para saber mais, acesse o
endereço: <http://g1.globo.com/educacao/noticia/2015/11/unico-escravo-no-brasil-
publicar-autobiografia-ganha-site-de-memorias.html>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 25/29
as relações de dominação e exploração. O sentimento
quilombista então se mostra e se fortalece de forma mais visível
pressionando a criação de leis e a garantia de direitos. Os
movimentos indígenas e negros, organizados na luta por direitos,
conquistam na legislação brasileira o reconhecimento das
injustiças da escravidão como causadoras das desigualdades
sociais e assim começam a dar corpo e a ampliar a noção de
políticas públicas reparatórias e afirmativas.
O desenvolvimento de identidades positivas tanto para as
populações indígenas como para as negras, são apontadas como
fator importante a fazer parte da educação brasileira no
reconhecimento e valorização dos elementos de matriz indígena,
africana e afro-brasileira como componentes da histórica e
cultural do Brasil. Essa é a base de conquista das leis 10.639 de
2003 e da lei 11.645 de 2008, ambas tornam obrigatória a
inserção no currículo educacional brasileiro da história e cultura
africana, afro-brasileira e indígena (BRASIL, 2003; 2008). E
apesar de terem sido promulgadas no século XXI, são resultado
de mais de 500 anos de luta e atuação quilombista africana e
afro-brasileira.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 26/29
Para entender essas heranças de África e como influenciam na
formação da cultura e identidade do ser brasileiro, é de suma
importância a leitura histórica sobre os processos de geração das
africanidades brasileiras, e dos fatores que vão influenciar na
identificação positiva ou negativa dentro dessa diversidade que
compõem nossa cultura e sociedade, interagindo em nossas
vivências e experiências para, assim, moldaras relações étnico-
raciais.
Nos anos 1980 Abdias do Nascimento, intelectual criador do
Teatro Experimental do Negro e integrante do Movimento Negro
brasileiro, apresenta o quilombismo como uma filosofia da
diáspora africana em que os afro-brasileiros, no caso, os povos
negros e indígenas do Brasil, carregam em si (NASCIMENTO,
1980). 
Figura 7 - A matriz africana que deu origem à cultura afro-brasileira atualmente
é reconhecida por lei. Fonte: YaromirM, Shutterstock, 2018.
Deslize sobre a imagem para Zoom
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 27/29
O quilombismo é uma filosofia ampla que gera um modo de ser e
de estar no mundo que perpassa toda a diáspora negra africana.
É essa filosofia que gera nos indivíduos, ou coletivos, fora da
África, o sentido de luta e resistência nas mais diferentes
situações, contextos, épocas e lugares. Assim, nos mais de 350
anos de escravidão oficial no Brasil, as diferentes identidades
afro-brasileiras foram desenvolvidas a partir desse sentimento
quilombista, que se manifesta em todas as áreas e culturas afro-
brasileiras. As irmandades negras se multiplicam, expressando as
africanidades brasileiras de diferentes formas. São os chamados
MovimentosNegros, que congregam elementos, conhecimentos,
práticas, saberes, costumes, falares, dentre outros aspectos de
origem ou de bases africanas. 
 
As africanidades são geradas por visões de mundo de raiz
africana e as geram, também. Para conhecê-las, estudá-las e
compreendê-las é preciso atentarmos para o fato de que: há
unidade, assim como há distinções, nas visões de mundo
geradas no mundo africano; as visões de mundo de raiz
africana, recriadas sob diferentes condições de existência,
constituem o único fundamento capaz de viabilizar a libertação
das desqualificações impingidas aos negros (OLIVEIRA, 2011, p.
27, apud GONÇALVES; SILVA, 2009).
Dessa maneira, a filosofia quilombista seria, então, a base
geradora das africanidades brasileiras. Gomes (2003) e Oliveira
(2011) apontam essa movimentação, que podemos chamar de
cultura negra, onde se mesclam passado e presente, cultura e
religião, lutas e resistências em que os sujeitos se educam,
aprendem e se fazem sujeitos. Mas não é só isso. Há a
construção de identidades negras, complexas, ambíguas,
multifacetadas, em meio a processos de circulação e recriação de
elementos culturais africanos em diálogo, interação e integração –
também com as culturas dos colonizadores. O cristianismo
imposto pelos colonizadores desde África moldava as mentes em
grande medida, mas também foi moldado conforme interagia com
elementos indígenas e africanos. Assim, a religiosidade imposta
na colônia, originalmente de bases romanas, se mescla a
elementos afro-indígenas, ganhando múltiplas faces, novos
significados e formas de atuações.
No Brasil, o quilombismo se estrutura em diferentes formas
associativas tanto no meio de florestas de difícil acesso e
localização, como também nas diferentes estratégias e formas de
organizações que, à princípio, se mostravam ingênuas e
inofensivas aos olhos do colonizador. Assim foram permitidas ou
toleradas. Mesmo a sociedade brasileira colonizada e
colonizadora ainda sendo, nos dias de hoje, dominada e
controlada pelos herdeiros dos europeus exploradores, essas
organizações configuravam uma rede de estratégias de lutas, de
resistências, de solidariedade e de comunicação. Muitas vezes,
usavam e criavam brechas nas instituições religiosas (católicas),
O Teatro Experimental do Negro foi criado para a valorização
social do negro e a proposição de uma nova dramaturgia, que
engloba o trabalho pela cidadania do ator negro, por meio da
conscientização e também da alfabetização do elenco. Para
saber mais, acesse o endereço:
<http://www.palmares.gov.br/archives/40416>.
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 28/29
que podiam ser recreativas, beneficentes, esportivas, culturais ou
de auxílio mútuo. 
As diferentes irmandades, associações, coletivos e demais
manifestações culturais afro-brasileiras, formam essa rede em
que instituições católicas, terreiros de candomblé, confrarias,
clubes, grêmios, centros, tendas, afoxés, maracatus, escolas de
samba, gafieiras, guardas, congados, grupos de capoeira, de
tambor de crioula, de jongo, da dança do mar abaixo, dentre
inúmeras outras organizações e comunidades negras, foram e
ainda são os quilombos que estrategicamente foram legalizados
sem que a sociedade dominante percebesse. Esse complexo de
significações, práticas e organizações afro-brasileiras constituem
a essência, do ser negro na diáspora africana e na reestruturação
da cultura negra.
Uma das questões mais relevantes para o quilombismo proposto
por Nascimento (1980) foi a definição do ser negro para além da
cor da pele, sobretudo em relação à descendência africana,
deslocando o eixo da negritude para o afrocentrismo, incluindo o
pardo, o moreno e o mulato. Dessa forma, possibilitou a
construção de uma identidade negra mais coesa, unificada e
fortalecida. O ser negro seria, então, muito mais um
posicionamento político do que apenas a conotação da cor da
pele. 
 
No livro “O Movimento Negro Educador: saberes construídos nas lutas por
emancipação”, a autora Nilma Lino Gomes (2017) propõe descolonizar os
currículos, repensar a escola, dar visibilidade às vivências e às práticas dos
sujeitos. 
Síntese
Concluímos esse primeiro estudo, que apresentou uma breve
introdução histórica dos aspectos socioculturais brasileiros, nos
quais as relações étnico-raciais são mediadas por fatores da
memória, sendo estes fatores intrínsecos ao desenvolvimento de
identidades – positivas, ou não. 
 
Neste capítulo, você teve a oportunidade de:
conhecer a base da diversidade humana, e como os
contextos históricos, culturais e sociais, que compõem o
povo brasileiro, implicam para a educação das relações
étnico-raciais; analisar os fatores e complexidades em torno
dos processos de formação identitária;
identificar as nuances e os aspectos históricos, sociais e
culturais indígenas, africanos e afro-brasileiros que
influenciam as relações étnico-raciais e as identidades
individuais;
conhecer pontos de vistas e análises contra hegemônicos
sobre as relações de poder entre os povos que compõem
essa diversidade cultural, social e étnico-racial brasileira;
18/09/2018 Identidades e Diversidades Étnico-Raciais
https://fmu.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/conteudos/identidades_diversidade_etnico_raciais/ebook_html/unidade_1/index.html 29/29
avaliar as concepções de entendimento sobre o que
representou o tráfico e a escravidão negra contextualizada
ao pensamento hegemônico da época, e suas influências no
pensamento atual;
problematizar a concepção de direitos originais, concepção
de propriedade, propriedade intelectual, noção de território,
a relação com a natureza e a produção de conhecimentos
de forma a contextualizar as relações de luta e resistência
dos diferentes povos nativos e da diáspora africana.

Continue navegando