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Problema 5 – Módulo 10 1) Compreender a fisiopatologia da carcinogênese (mecanismos) - O processo é multifásico, que se desenvolve em várias etapas. - A iniciação pode ser induzida por uma única aplicação de um agente cancerígeno, mesmo que em dose baixa. A promoção depende de contato mais prolongado com o agente promotor, que precisa ser aplicado após o iniciador. - Observações gerais: (1) a iniciação isoladamente não é tumorigênica, mas, quando seguida de promoção, resulta em tumores; (2) a iniciação promove alteração irreversível no DNA (mutação). Uma célula iniciada pode transformar-se em tumor mesmo quando o promotor é aplicado certo tempo depois; (3) a promoção sozinha ou aplicada antes da iniciação não causa tumores; (4) a promoção é reversível (pois não provoca alterações permanentes no DNA), já que o espaçamento na aplicação do promotor não produz tumores. Iniciação: A iniciação corresponde à transformação celular, ou seja, as mudanças induzidas por cancerígenos físicos, químicos ou biológicos que causam modificações genômicas nas células e alteram suas respostas ao microambiente, tornando-as potencialmente capazes de multiplicar-se de modo autônomo. Uma célula iniciada torna-se menos responsiva a fatores que inibem a proliferação celular, a indutores de diferenciação celular ou à apoptose. No entanto, uma célula apenas iniciada não origina tumor. Por terem ação irreversível, os agentes iniciadores podem gerar tumores quando administrados de uma única vez ou em doses fracionadas (as doses têm efeitos cumulativo e somatório). O iniciador é sempre uma substância mutagênica, e sua potência varia muito entre os vários carcinógenos. Todos os iniciadores são substâncias eletrofílicas, ou seja, têm grande afinidade com compostos nucleofílicos, como são proteínas, RNA e DNA. Tudo indica que a iniciação corresponde a uma alteração genômica em célula-tronco de baixa replicação que mantém essa alteração nas gerações seguintes. No entanto, nem toda agressão ao DNA leva a transformação celular, pois os genes de reparo podem corrigir os defeitos ocorridos. A célula afetada pelo iniciador e cujo defeito no DNA não foi corrigido precisa sofrer pelo menos uma divisão para que a iniciação ocorra. Quando estimulada por agentes promotores, começa a proliferar e dá origem às células transformadas. Mutações espontâneas ou erros de replicação do DNA durante a divisão celular ocorrem com certa frequência e são suficientes para explicar boa parte dos eventos genéticos encontrados em neoplasias. Por isso mesmo, em muitos casos não se consegue identificar um fator externo como causador de mutação. De qualquer modo, os agentes ambientais são de fato muito importantes porque aumentam as taxas naturais de mutação, inibem reparos no DNA ou produzem mutações diretamente. Promoção: A promoção consiste em proliferação ou expansão das células iniciadas. A multiplicação das células iniciadas é fenômeno indispensável para a "fixação" da alteração genômica e para o aparecimento da neoplasia. Ao lado disso, a multiplicação celular aumenta a probabilidade de novas mutações. Ao contrário da iniciação, a promoção é um processo demorado. A ação do promotor é reversível, pois, caso sua aplicação seja interrompida antes de completada a promoção, o efeito não se manifesta. Os agentes promotores atuam pelo tempo de exposição e pela intensidade das reações teciduais que provocam. Os promotores são substâncias que têm em comum a propriedade de irritar tecidos e de provocar reações inflamatória e proliferativa. Aliás, todo agente que produz hiperplasia pode comportar-se como promotor. Por isso mesmo, agentes ou fatores muito variados podem ser promotores: ésteres de forbol, fenóis, hormônios, medicamentos, calor, traumatismos etc. Ao contrário do iniciador, o promotor não se liga ao DNA nem provoca mutações. O agente promotor mais conhecido é o 12-0-tetradecanoilforbol- 13-acetato (TPA). A partir de inúmeros estudos in vitro e in vivo com TPA, sabe-se que ele tem a propriedade de modular a expressão gênica, o crescimento e a diferenciação celular. Entre suas ações, uma das mais importantes é ativar a proteinocinase C (PKC), uma enzima de distribuição universal que catalisa a fosforilação de várias proteínas envolvidas na proliferação celular. Progressão: Após seu surgimento, um câncer sofre, com frequência, modificações biológicas que o tornam, em geral, cada vez mais agressivo e mais maligno. Esse fenômeno é chamado progressão tumoral. Entre outros fatores, a progressão tumoral também depende de mutações sucessivas nas células, as quais resultam na aquisição de propriedades mais agressivas. O câncer é formado por células heterogêneas. Numerosas evidências indicam que, com o tempo, vão surgindo continuamente populações celulares diferentes dentro da massa neoplásica. Muitos desses novos clones celulares não sobrevivem; os que adquirem propriedades mais vantajosas para seu crescimento expandem-se e passam a ser a população predominante. Por essa visão, a partir do clone original da neoplasia vão surgindo outros mais ou menos adaptados, que são diferentes sob os aspectos citogenéticos, de imunogenicidade, de velocidade de crescimento, de exigência de fatores de crescimento, de receptores de superfície, do poder de invasão e metastatização e de resistência a medicamentos. Em geral, à medida que o tempo passa, vão sendo selecionados clones mais agressivos e mais malignos. A progressão tumoral está relacionada com sucessivas modificações na expressão gênica das células neoplásicas, o que se deve a mutações sucessivas. Células malignas são geneticamente mais instáveis do que as correspondentes normais, o que pode explicar maior taxa de novas mutações que resultam no caráter mais agressivo da lesão. Tanto in vivo como in vitro, há evidências de que células cancerosas são mais suscetíveis a diversas anormalidades cromossômicas, que inclusive tendem a aumentar com a progressão tumoral. Além da aquisição de novas características intrínsecas das células tumorais, a progressão dos tumores depende também de fatores do hospedeiro. A resposta imunitária, por exemplo, tem papel de destaque. Se os novos clones celulares adquirirem forte antigenicidade, provavelmente serão eliminados. O estado hormonal é outro elemento na evolução das neoplasias dependentes de hormônio, como se verifica em alguns tumores da mama e da próstata. Esses dois são exemplos de que a progressão dos tumores, assim como a carcinogênese como um todo, é um processo de seleção natural (darwiniano) em que há predomínio de clones e subclones que adquirem propriedades que oferecem vantagens na proliferação e na invasão. A progressão tumoral tem enorme interesse prático. As alterações genômicas que condicionam a variabilidade no comportamento biológico das neoplasias são adquiridas, e, portanto, quanto mais prolongado for o período entre o surgimento de um tumor e sua detecção clínica, maior a probabilidade de já terem ocorrido várias mudanças genômicas. Com o passar do tempo, o comportamento do tumor tende a se tornar mais agressivo, a velocidade de crescimento aumenta, a resposta ao tratamento diminui e surgem clones com alto potencial de disseminação e metastatização. A progressão tumoral foi mostrada como um fenômeno em que o câncer evolui para um estágio mais agressivo. Nem sempre é assim. Existem exemplos, infelizmente raros, de involução espontânea de tumores. Nesses casos, provavelmente surgem clones menos adaptados ao crescimento tumoral ou que podem ser eliminados pelo hospedeiro, pois sua resposta defensiva sobrepuja a capacidade de escape das células tumorais. Outra possibilidade é que células malignas sofrem diferenciação, perdendo a capacidade de proliferação. Pelo princípio da instabilidade genética, durante a evolução de uma neoplasia é perfeitamente possível restabelecer-se a expressão de genes que condicionam a diferenciação celular normal. Um bom exemplo disso é a diferenciação espontâneaque acontece no ganglioneuroblastoma, que pode transformar-se em ganglioneuroma e perder seu caráter maligno. Esse fenômeno abre a possibilidade de uma outra modalidade terapêutica do câncer por meio de agentes indutores de diferenciação celular. Em algumas leucemias, foram obtidos resultados promissores. 2) Analisar a genética tumoral (fatores de predisposição) - A carcinogênese é um processo complexo, multifásico e dependente de fenômenos genéticos e epigenéticos que culminam no surgimento de clones de células imortalizadas que adquirem a capacidade de se multiplicar autonomamente, de invadir os tecidos vizinhos e de dar metástases. - O aparecimento de tumores em tecidos com células que não se renovam deve-se a alterações em células-tronco (p. ex., transformação de neuroblastos, originando neuroblastoma no cerebelo). - A demonstração recente de que células diferenciadas podem originar células-tronco pelo processo de desdiferenciação levanta a possibilidade de que células já diferenciadas sofram alterações genômicas e originem células cancerosas ou células-tronco do câncer, responsáveis por gerar progenitores de diferentes subclones que formam o tumor. - O desenvolvimento de um câncer, em qualquer órgão, é um processo evolutivo do tipo darwiniano, no qual alterações genéticas e epigenéticas originam clones celulares que, ao adquirirem vantagem de proliferar, sobreviver, destruir e invadir os tecidos, formam os tumores. - Os tumores são monoclonais, ou seja, formados por um clone que venceu a barreira do controle da proliferação celular e tornou-se imortal; desse clone surgem descendentes (subclones) com capacidade variada de sobreviver, invadir tecidos e se implantar a distância. - Alvos principais dos agentes tumorigênicos: células de reserva ou basais nos epitélios, células-tronco nos tecidos hematopoéticos e as células em G0. - A existência de células-tronco em neoplasias leva a admitir que o tumor é um organismo simplificado em que células-tronco multipotentes originam progenitores dos diferentes tipos celulares do tumor, explicando a heterogeneidade morfológica da neoplasia. Como as células progenitoras têm capacidade limitada de proliferação, admite-se que somente células-tronco do tumor são capazes de se implantar a distância e de originar metástases. Não se sabe se existe um único tipo de células-tronco em cada tumor ou se há várias células-tronco na mesma neoplasia. Células-tronco do câncer podem permanecer quiescentes no seu nicho, o que, em parte, pode explicar, por exemplo, sua resistência aos quimioterápicos e à radioterapia (que atuam mais em células que estão no ciclo celular) e o aparecimento de metástases tardias após retirada do tumor primitivo, as quais se originam em células-tronco que permanecem quiescentes nos órgãos para os quais migraram. Propriedades adquiridas durante a carcinogênese - Marcas fenotípicas de células cancerosas O processo de transformação maligna é multifásico. Há várias tentativas de separar as características fenotípicas mais importantes que marcam o processo de carcinogênese, havendo consenso de que células neoplásicas adquirem as seguintes características fenotípicas: 1)Autonomia de proliferação; 2)Insensibilidade aos sinais inibidores de mitose; 3)Evasão de apoptose; 4)Evasão de senescência replicativa; 5)Autonomia de sobrevivência; 6)Instabilidade genômica; 7)Capacidade de evasão do sistema imunitário; 8)Capacidade de invadir e de metastatizar. • Autonomia de sinais de proliferação resulta de mutações ativadoras em oncogenes, que são frequentes em genes de fatores de crescimento (p. ex., PDGF), de seus receptores (p. ex., EGFR no carcinoma da mama), de moléculas transdutoras de sinal (p. ex., RAS no carcninoma colorretal) e de amplificação em genes que acionam o ciclo celular (p. ex., ciclina D 1). • Insensibilidade aos sinais inibidores de mitose decorre de: (1) mutação inativadora em genes que codificam moléculas reguladoras da via MAPK (p. ex., PTEN, que desfosforila moléculas nessas vias), de fatores de transcrição ativadores de genes que controlam o ciclo celular (p. ex., pRB, inativador natural de E2F, que ativa a entrada em G1); (2) mutação inativadora no gene p53, que inativa complexos ciclina/CDK. • Evasão de apoptose resulta da inibição de genes próapoptóticos, de hiperexpresão de genes antiapoptóticos ou de inativação de genes que fazem a checagem de lesões no DNA (p. ex., p53, frequentemente inativado em vários tumores esporádicos). • Evasão de senescência replicativa deve-se a ativação de telomerase (enzima que impede o encurtamento de telômeros), permitindo a duplicação do DNA. • Proliferação autônoma, insensibilidade a sinais inibidores de mitose e evasão de apoptose e de senescência replicativa conferem às células neoplásicas a propriedade de imortalidade, possibilitando sua multiplicação indefinida. • Instabilidade genômica resulta de estresse oxidativo e durante a duplicação do DNA, favorecendo quebras no DNA em sítios frágeis. O genoma torna-se instável quando lesões induzidas por estresse mitótico não mais emitem sinais para parada do ciclo celular e para apoptose. Instabilidade genômica persistente facilita alterações na regulação genética e epigenética associada a progressão da transformação maligna • Autonomia de sobrevivência de clones imortalizados é possibilitada pela neoformação vascular que permite a nutrição das células. A angiogênese em tumores faz-se por meio dos mesmos mecanismos de angiogênese que ocorre na cicatrização de feridas e em inflamações. Células tumorais e células do estroma do tumor, inclusive leucócitos que nele se infiltram, liberam fatores angiogênicos, como VEGF A e B e FGFb, que atuam no endotélio de capilares vizni hos e induzem suas proliferação, migração e diferenciação em novos capilares. Também precursores de células endoteliais originados na medula óssea participam do processo. HIF induzido por hipóxia é fator importante na ativação da transcrição de genes de fatores angiogênicos. A angiogênese é mais intensa e mais acelerada pela produção de outros fatores de crescimento (HGF) e de quimiocinas (p. ex., CXCL 12) por células tumorais e do estroma, que atuam em receptores no endotélio, favorecendo a migração e a reorganização dessas células em novos vasos. Esses fatores de crescmi ento e quimiocni as também influenciam a proliferação e a capacidade de deslocamento e de ni vasão das células cancerosas. Em muitos tumores, existe correlação entre angiogênese e malignidade: quantomaior a atividade angiogênica, maior é a potência de metastatização do câncer e mais rápida é a sua progressão. Linfangiogênese também ocorre em neoplasias, embora não se conheça seu significado. A formação de novos vasos linfáticos faz-se por ação de VEGF C e D, induzidos por citocinas pró-inflamatórias. Vasos linfáticos não trazem nutrientes para o tumor, mas são importantes para drenar macromoléculas extracelulares, reduzindo a pressão intersticial na lesão • A capacidade de invadir e de deslocar-se, destruindo tecidos vizinhos, deve-se à ativação de genes que favorecem a produção de metaloproteases (MMP) e inibição de genes que estimulam inibidores de MMP (TIMP). Em células cancerosas, existem alterações em genes que codificam moléculas de adesão, com deleção de alguns e ativação de outros, de modo a facilitar que as células se destaquem da massa primitiva e se desloquem na MEC. Nesse processo, é importante o fenômeno de transição epiteliomesenquimal, em que células ectodérmicas adquirem o fenótipo de células mesenquimais móveis. Ativação de outros genes (p. ex., hedgehog, que ativa fatores de transcrição Gli, e WNT, que ativa -catenina) é também importante nesse processo. • A capacidade de evasão dos mecanismos imunitários deve-se a interação complexa entre células transformadas, células do estroma e células do sistema imunitário, que criam um microambiente supressor da resposta imunitária citotóxica. Nesse ambiente, e ao contráriodo seu papel específico, as células do sistema imunitário são forçadas a cooperar, juntamente com células do estroma, com as células transformadas, favorecendo a progressão da neoplasia • A capacidade de originar metástases é uma propriedade complexa que depende, como foi discutido anteriormente, de características fenotípicas das células transformadas e de modificações no tecido em que ocorre a implantação. - Estroma de neoplasias e carcinogênese: Os carcinógenos induzem alterações não só na célula que origina o câncer (p. ex., epitélio) como também no estroma. O estroma das neoplasias contém células endoteliais, fibroblastos, mastócitos e vários tipos de células originadas da medula óssea, inclusive leucócitos, células-tronco mesenquimais e células supressoras mieloides. O número dessas células varia em cada tipo de tumor, e elas representam o que se denomina células inflamatórias ou células imunitárias no tumor. o câncer induz o sistema imunitário a trabalhar a seu favor. Dados experimentais comprovam que, durante a carcinogênese, o estroma se altera e facilita o processo neoplásico. - Etiopatogênese das neoplasias: Em outras palavras: os tumores são entendidos como o resultado de agressões ambientais em um indivíduo geneticamente suscetível A proliferação e a diferenciação celulares dependem de vários genes, cujos produtos: (1) estimulam a multiplicação celular, como fatores de crescimento, seus receptores, moléculas transdutoras de sinais, fatores de transcrição e moléculas envolvidas diretamente no ciclo celular, como ciclinas e CDK. Nesse grupo estão os chamados oncogenes; (2) controlam a proliferação dentro dos limites fisiológicos para cada tecido, estando aqui os genes que codificam moléculas que inibem a proliferação celular. Incluem os denominados genes supressores de tumor; (3) regulam a apoptose, evento fundamental na limitação da população celular; (4) comandam o reparo do DNA, constituindo os genes "guardiães" do genoma. Capacidade reduzida de reparação do DNA aumenta o número de mutações, aumentando a chance de seu aparecimento em oncogenes e genes supressores de tumor; (5) estão envolvidos nos mecanismos de silenciamento genético, por meio de regulação da metilação do DNA e da desacetilação da cromatina. Esses dois últimos grupos de genes são responsáveis pelo fenômeno de instabilidade genômica observada na maioria das neoplasias, especialmente nos seus estádios mais avançados. Uma neoplasia surge quando ocorrem anormalidades em um ou mais de um desses genes - Oncogenes: Antes de mais nada, é necessário destacar que os genes envolvidos na carcinogênese estão presentes em células normais, têm expressão regulada e participam na proliferação e na diferenciação celulares, processos básicos para a existência das células. Os oncogenes e seus congêneres normais (proto-oncogenes) codificam moléculas que interferem na regulação da proliferação e diferenciação das células