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Inquérito Policial 1º Conceito Segundo a doutrina, inquérito policial é uma fase preliminar e informativa, pois consubstancia-se numa atividade preparatória para a ação penal. Somente após o inquérito policial é que teremos a fase processual. Dessa forma, pode-se conceituar inquérito policial como o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração da existência de uma infração penal e da sua autoria, fornecendo, assim, elementos para convencer o titular da ação penal a ingressar ou não em juízo. O inquérito policial também pode influenciar na decretação de medidas cautelares no decorrer da persecução penal, pois, com base nele, o magistrado poderá tomar decisões antes mesmo de iniciado o processo. Exemplo: decretação da prisão preventiva ou determinação da intercepção telefônica. 2º Polícia judiciária X polícia administrativa Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. a) Polícia judiciária: a polícia judiciária tem atuação repressiva, pois age após a ocorrência da infração, visando constatação da materialidade delitiva e da sua autoria. Exemplo: polícia civil. b) Polícia administrativa: a polícia administrativa tem atuação preventiva, pois busca impedir a ocorrência da infração. Exemplo: polícia MILITAR estadual. 3º Inquéritos não policiais Art. 4. (…) Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. O inquérito policial, em que pese seja a forma mais comum, não é o único meio de investigação de fatos criminosos. O ordenamento jurídico permite que outras autoridades realizem investigações próprias, destinadas à apuração de infrações penais e à viabilização da ação criminal. As hipóteses mais citadas pela doutrina são as seguintes: a) Inquéritos parlamentares: são os realizados pelas Comissões Parlamentares de Inquérito - CPI, devendo estas, ao final de suas investigações, remeter o relatório com suas conclusões ao Ministério Público ou à autoridade administrativa ou judicial com poder de decisão. O referido inquérito será analisado e, dentro de 30 dias, deverá ser informada à CPI quais as providências adotadas. Se houver tido instauração de um procedimento investigado ou um processo judicial, a autoridade que o presidir deverá, a cada 06 meses, informar à CPI como se encontra o procedimento. b) Inquéritos policiais militares: estão a cargo da policial judiciária militar, composta por integrantes da carreira. Salienta-se que é cabível inquérito militar no âmbito da polícia civil, coexistindo os procedimentos. c) Inquérito civil Público: é aquele presidido pelo MP com o objetivo de reunir elementos para a propositura de uma Ação Civil Pública. A jurisprudência entende que é possível o oferecimento de ação penal (denúncia) com base em provas colhidas no âmbito de inquérito civil conduzido por membro do Ministério Público (RE 646.893). d) Investigação pelo Ministério Público: o Ministério Público pode realizar diretamente a investigação de crimes. Adota-se aqui a teoria dos poderes implícitos. Segundo essa doutrina, nascida nos EUA (Mc CulloCh vs. Maryland – 1819), se a Constituição outorga determinada atividade- fim a um órgão, significa dizer que também concede todos os meios necessários para a realização dessa atribuição. Ou seja, como a CF/88 confere ao MP as funções de promover a ação penal pública, é lógico se deduzir que ela também atribui ao Parquet todos os meios necessários para o exercício da denúncia, dentre eles a possibilidade de reunir provas para que fundamentem a acusação (art. 129, I). Ademais, a CF/88 não outorgou à Polícia o monopólio da atribuição de investigar crimes. Desse modo, não é inconstitucional a investigação realizada diretamente pelo MP. Esse é o entendimento do STF e do STJ. Fundamentos constitucionais: Além da doutrina dos poderes implícitos, a doutrina cita como fundamento constitucional que autoriza, de forma implícita, o poder de investigação do MP os seguintes dispositivos constitucionais: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; (...) VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas. Fundamentos Legais: Além dos fundamentos consitucionais, a doutrina também cita alguns fundamentos legais a autorizar Lei Complementar n.° 75/1993, também de forma implícita, autoriza a realização de atos de investigação nos seguintes termos: Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I - notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; (...) V - realizar inspeções e diligências investigatórias; (...) VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; Parâmetros que devem ser respeitados para que a investigação conduzida diretamente pelo MP seja legítima: Segundo o STF (RE 593727/MG), para que as investigações realizadas diretamente pelo Ministério Público sejam válidas, é preciso que sejam seguidos os seguintes parâmetros: 1) Devem ser respeitados os direitos e garantias fundamentais dos investigados; 2) Os atos investigatórios devem ser necessariamente documentados e praticados por membros do MP; 3) Devem ser observadas as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição, ou seja, determinadas diligências somente podem ser autorizadas pelo Poder Judiciário nos casos em que a CF/88 assim exigir (ex: interceptação telefônica, quebra de sigilo bancário etc); 4) Devem ser respeitadas as prerrogativas profissionais asseguradas por lei aos advogados; 5) Deve ser assegurada a garantia prevista na Súmula vinculante 14 do STF (“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”); 6) A investigação deve ser realizada dentro de prazo razoável; 7) Os atos de investigação conduzidos pelo MP estão sujeitos ao permanente controle do Poder Judiciário. e) Investigação por particulares: na prática, não existe, porque é muito difícil. Contudo, o particular poderá denunciar, verbalmente ou por escrito, à autoridade policial a ocorrência de uma infração penal: Art. 5º. (...) §3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridadepolicial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito. 4º Natureza jurídica do inquérito policial O inquérito policial tem natureza de ato administrativo, de caráter informativo e preparatório para a ação penal. Rege-se pelas regras do ato administrativo em geral. 5º Características do inquérito policial a) Discricionariedade: porque a autoridade policial possui liberdade de conduzir as investigações da forma que melhor lhe aprouver. Exatamente por isso que a autoridade policial poderá ou não atender aos requerimentos patrocinados pela vítima (ou seu representante legal) e pelo indiciado: Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. A discricionariedade da autoridade policial, contudo, não é ilimitada. Inicialmente, nas infrações penais que deixem vestigio, ele está obrigado a deferir a realização de exame de corpo de delito requerido pelas partes. Ademais, em que pese não exista hierarquia entre os juízes, promotores e os delegados, a autoridade policial é obrigada a realizar as diligências, devidamente justificadas, requeridas pelos juízes e promotores: Art.13. Incumbirá ainda à autoridade policial: II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; Art. 16. O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia. b) Escrito: o inquérito, por exigência legal, sempre deverá ser escrito. Os atos produzidos oralmente serão reduzidos a termo: Art.9o. Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade. Nada impede, contudo, que outras formas de documentação (exemplo: gravações de som e de imagem) sejam acrescentadas ao inquérito policial, a fim de conferir a este maior legitimidade. c) Sigiloso: o inquérito policial é um procedimento essencialmente sigiloso, é dizer, não se admite que estranhos à persecução e que a imprensa tenha acesso ao conteúdo do inquérito, mas, por questões óbvias, tal sigilo não se estende ao magistrado e ao membro do MP. A exigência do sigilo tem como objetivo preservar a figura do indiciado, principalmente se ele for inocente, evitando, portanto, a condenação sumária pela opinião pública. Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes à instauração de inquérito contra os requerentes Cumpre ressaltar que o STF entende que o caráter sigiloso do inquérito não poderá ser oposto contra o próprio investigado, cujo defensor tem o direito de ter acesso ao que já foi documentado no inquérito policial: STF - Súmula Vinculante nº 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. Negativa de que o réu tenha acesso a termos de declaração prestados por colaborador premiado e que não digam respeito aos fatos imputados ao acusado: Não viola o entendimento da súmula vinculante nº 14 a decisão do juiz que nega a réu denunciado com base em um acordo de colaboração premiada o acesso a outros termos de declarações que não digam respeito aos fatos pelos quais ele está sendo acusado, especialmente se tais declarações ainda estão sendo investigadas, situação na qual existe previsão de sigilo, nos termos do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 (STF - Rcl 22009 AgR/PR). Conforme entendimento do STF, a súmula vinculante nº 14 assegura ao defensor legalmente constituído o direito de acesso às “provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, consequentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentados no próprio inquérito ou processo judicial” (STF HC 93.767). Outro motivo que impediu o acesso do referido réu está no fato de que os outros 02 termos de declaração ainda estavam sob sigilo prévio, conforme determina o art. 7º da Lei nº 12.850/2013: Art. 7º. O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto. §1º - As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas. §2º - O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento. §3º - O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia, observado o disposto no art. 5º. Este sigilo tem 02 objetivos básicos: a) Preservar os direitos assegurados ao colaborador, dentre os quais o de “ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados” (art. 5º, II) e o de “não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito” (art. 5º, V, da Lei nº 12.850/2013); e b) Garantir o êxito das investigações (art. 7º, § 2º e art. 8, § 3º). d) Oficialidade: porque o delegado – quem preside o inquérito policial – faz parte de órgão oficial do Estado. e) Oficiosidade: o inquérito policial pode ser instaurado de ofício pela autoridade policial? Depende do tipo de ação penal cabível para o crime que se deseja investigar. Vejamos: Ação penal INCONDICIONADA. Ação penal CONDICIONADA e Ação penal PRIVADA. Nas ações penais incondicionadas, a autoridade policial deverá atuar de oficio, instaurando o inquérito e apurando os fatos. Dispensa-se, portanto, qualquer autorização para agir (CPP, art. 5º, I). Art. 5o. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I - de ofício nas ações públicas incondicionadas. Nas ações penais privadas ou condicionadas à representação, a autoridade depende de requerimento ou autorização da vítima (ou do seu representante legal) para iniciar o inquérito policial. Art. 5º. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. §4o - O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado. §5o - Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la. f) Indisponibilidade: por ser deordem pública, o inquérito policial uma vez iniciado NÃO poderá ser arquivado, devendo ser levado até o final (CPP, art. 17). Veja que a autoridade policial tem discricionariedade para iniciar ou não o inquérito, mas, uma vez iniciado, o delegado de polícia não pode dispor dele. Exatamente por isso que só quem poderá arquivar o inquérito policial é a autoridade judicial: Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito. g) Inquisitivo: diz-se que o inquérito policial é inquisitivo porque as atividades persecutórias ficam concentradas nas mãos da autoridade policial e não há oportunidade para o contraditório e a ampla defesa. Isso ocorre para dar agilidade às investigações. Exatamente porque não há oportunidade para o contraditório e para a ampla defesa no inquérito policial que, se no decorrer da ação penal, o acusado não se defender nem exercer o contraditório, o magistrado não poderá valer-se somente do inquérito policial para proferir sentença condenatória. h) Dispensabilidade: o inquérito não é imprescindível para a propositura da ação penal. Isso é tão verdade que a denúncia ou a queixa podem ter por base inquéritos não policiais. Contudo, se a base da denúncia ou da queixa foi o inquérito policial, este deverá acompanhar a inicial acusatória apresentada: Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. 6º Prazos O inquérito policial não pode se estender indefinidamente, dispondo, portanto, o CPP e a legislação extravagante sobre prazos para sua conclusão: a) Regra geral Se o acusado estiver PRESO. Se o acusado estiver SOLTO. Se o indivíduo estiver preso, o prazo para conclusão do inquérito policial será de 10 dias, contados da data da prisão. É cabível prorrogação? NÃO se admite a prorrogação do prazo para conclusão do inquérito quando o indiciado estiver recluso. Se o indivíduo estiver preso, o prazo para conclusão do inquérito policial será de 30 dias, contados da data de instauração do inquérito. É cabível prorrogação? SIM. A lei não fala em tempo de prorrogação nem quantas vezes esta poderia vir a ocorrer, de modo que Nestor Távora entende que a prorrogação poderá ocorrer por tempo e pela frequência que se mostrar necessário, desde que haja autorização judicial para tanto. b) Prazos especiais: Inquérito a cargo da polícia federal. Crimes contra a economia popular. Se o acusado estiver PRESO: o prazo será de 15 dias, prorrogável por igual período, quando houver autorização judicial. Se o acusado estiver Nos crimes contra a economia popular, independentemente do acusado estiver preso ou solto, o prazo será de 10 dias. SOLTO: o prazo será de 30 dias, prorrogável por autorização judicial. Aplica-se nesse caso a regra geral. Lei de Drogas. Inquéritos MILITARES. Se o acusado estiver PRESO: o prazo será de 30 dias, prorrogável uma vez (total de 60 dias). Se o acusado estiver SOLTO: o prazo será de 90 dias, prorrogável uma vez (total de 180 dias). Esses prazos podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária. Se o acusado estiver PRESO: o prazo será de 20 dias. Se o acusado estiver SOLTO: o prazo será de 40 dias, prorrogável por mais 20 dias (total de 60 dias). 7º Valor Probatório O inquérito policial tem valor probatório relativo, pois carece de confirmação por outros elementos colhidos durante a instrução processual. É por isso que o magistrado NÃO pode julgar com base somente no inquérito policial: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. 8º Vícios Os vícios ocorridos no inquérito policial não atingem a ação penal. Temos esse entendimento porque, uma vez sendo dispensável, não teria o inquérito o condão de macular a fase processual. 9º Incomunicabilidade O CPP prevê a possibilidade de, por conveniência na investigação e por interesse da sociedade, o acusado ficar incomunicável pelo prazo máximo de 03 dias: Art. 21. A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despacho nos autos e somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir. Contudo, é uniíssono na doutrina o entendimento de que esse artigo não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, que não admite a incomunicabilidade sequer em situação de estado de defesa. 10º Indiciamento O indiciamento é o ato pelo qual a autoridade policial informa ao suposto autor de que ele é o principal foco do inquérito, é dizer, de que ele é apontado pela autoridade policial como o provável ao autor de um determinado fato criminoso. Por razões óbvias, só é possível falarmos em indiciamento quando temos provas relevantes que vinculam o sujeito à prática delitiva. Se o indiciamento é feito sem o lastro mínimo de indícios, poderá ser impetrado “habeas corpus”. a) competência para realizar o indiciamento O indiciamento é ato privativo da autoridade policial (delegado). Assim, não é possível que o indiciamento seja realizado pelo membro do Ministério Público ou determinado pelo magistrado. Requisição dessa natureza por parte do magistarado seria incompatível com o sistema acusatório, que impõe a separação orgânica das funções concernentes à persecução penal, de modo a impedir que o juiz adote qualquer postura inerente à função investigatória. Em suma, O indiciamento é ato privativo da autoridade policial, segundo sua análise técnico-jurídica do fato. O juiz não pode determinar que o Delegado de Polícia faça o indiciamento de alguém (STJ - RHC 47.984/SP e STF HC 115015/SP). Assim, caso o delegado entenda por não indiciar ninguém no inquérito policial, não há nada que o magistrado ou membro do MP possa fazer. b) Indiciamento envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função Em regra, a autoridade com foro por prerrogativa de função pode ser indiciada. Existem duas exceções previstas em lei de autoridades que não podem ser indiciadas: a) Magistrados (art. 33, parágrafo único, da LC 35/79);b) Membros do Ministério Público (art. 18, parágrafo único, da LC 75/73 e art. 40, parágrafo único, da Lei nº 8.625/93). Excetuadas as hipóteses legais, é plenamente possível o indiciamento de autoridades com foro por prerrogativa de função. No entanto, para isso, é indispensável que a autoridade policial obtenha uma autorização do Tribunal competente para julgar esta autoridade (Ex: em um inquérito criminal que tramita no STJ para apurar crime praticado por Governador de Estado, o Delegado de Polícia constata que já existem elementos suficientes para realizar oindiciamento do investigado. Diante disso, a autoridade policial deverá requerer ao Ministro Relator do inquérito no STJ autorização para realizar o indiciamento do referido Governador). Ressalta-se, contudo, que não é o Ministro Relator quem irá fazero indiciamento. Este ato é privativo da autoridade policial. O Ministro Relator irá apenas autorizar que o Delegado realize o indiciamento (HC 133835 MC). 11º Arquivamento do inquérito policial Caso MP entenda que, mesmo após todas diligências realizadas, o delito não foi completamente elucidado em relação a sua materialidade e autoria, pedirá o arquivamento do inquérito policial. Esse arquivamento deverá ser promovido pelo Ministério Público e homologado pelo magistrado. Segundo a doutrina majoritária, o arquivamento do inquérito policial é cabível nas seguintes situações: a) Falta de pressupostos processuais ou de condições da ação; b) Falta de justa causa (isto é, falta de lastro probatório mínimo para o exercício da ação). a) decisão que homologa o arquivamento e coisa julgada Em regra, a decisão que homologa o arquivamento do inquérito policial não é atingida pela imutabilidade da coida julgada. Assim, é possível pedir o desarquivamento do inquérito. Contudo, para que isso seja possível, é preciso que hajam novas provas: STF - Súmula nº 524: Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas. Cumpre esclarecer ainda que o CPP autoriza, mesmo após o arquivamento, que, sem necessidade de se instaurar um novo inquérito policial, a autoridade policial continue realizando diligências para captação de novas provas. Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. b) Motivações de arquivamento que não permitem o desarquivamento Embora a regra é que o arquivamento não faça coisa julgada material, os tribunais superiores entedem que o arquivamento realizado sob determinados fundamentos são atingidos pela eficácia imutável da coisa julgada, não podendo mais ser desarquivados. São eles: 1º Atipicidade (fato narrado não é crime) e Existência manifesta de causa excludente de culpabilidade O STF e o STJ entendem que o inquérito policial arquivado por atipicidade e existência manifesta de causa excludente de culpabilidade da conduta faz coisa julgada, não podendo ser desarquivado, mesmo que surjam provas novas. 2º Existência manifesta de causa excludente de ilicitude O STJ entende que o inquérito arquivado em função de manifesta causa excludente de ilicitude (Ex: legítima defesa) faz coisa julgada, não podendo ser desarquivado. Segundo o aludido tribunal, o art. 18 do CPP e a súmula nº 524 do STF realmente permitem o desarquivamento do inquérito caso surjam provas novas. No entanto, essa possibilidade só existe na hipótese em que o arquivamento ocorreu por falta de provas, ou seja, por falta de suporte probatório mínimo (inexistência de indícios de autoria e certeza de materialidade). Assim, no caso de arquivamento por causa excludente de ilicitude, há incidência da coisa julgada (REsp 791.471/RJ). O STF, contudo, possui entendimento contrário. Para a Suprema Corte, o arquivamento de inquérito policial em razão do reconhecimento de excludente de ilicitude NÃO faz coisa julgada material. Logo, surgindo novas provas seria possível reabrir o inquérito policial, com base no art. 18 do CPP e na Súmula 524 do STF (HC 95211 e HC 125101/SP). 3º Existência manifesta de causa extintiva da punibilidade Em regra, O STF e o STJ entendem que o inquérito policial arquivado por existência manifesta de causa extintiva da punibilidade, não podendo ser desarquivado, mesmo que surjam provas novas. Esse entendimento, contudo, não se aplica nos casos em que o arquivamento se deu por morte do agente e a certidão utilizada era falsa. c) Quando informativo MOTIVO DO ARQUIVAMENTO É POSSÍVEL DESARQUIVAR? 1) Ausência de pressuposto processual ou de condição da ação penal SIM 2) Falta de justa causa para a ação penal (não há indícios de autoria ou prova da materialidade) SIM 3) Atipicidade (fato narrado não é crime) NÃO 4) Existência manifesta de causa excludente de ilicitude STF: SIM STJ: NÃO 5) Existência manifesta de causa excludente de culpabilidade NÃO 6) Existência manifesta de causa extintiva da punibilidade NÃO, salvo nos casos de certidão de óbito falsa. 12º Recurso contra o arquivamento A decisão homologatória do pedido de arquivamento é irrecorrível, não havendo contemplação legal de recurso para combatê-la. Todavia, o indiciado deve ser intimado, não só para ter ciência do ato, mas também para opor-se a eventual denúncia oferecida em momento posterior, uma vez destituída de prova nova. Também não há de se falar em ação privativa subsidiária da pública, se houver a manifestação pelo arquivamento, afinal, ela só tem cabimento nas hipóteses de inércia do MP, e se o promotor requereu o arquivamento, certamente não está sendo desidioso. 13º Arquivamento do inquérito policial pelo MP e a discordância do magistrado Caso o magistrado discorde do promotor quanto ao pedido de arquivamento, ele não é obrigado a atender ao arquivamento. Com base no art. 28, o magistrado deverá remeter os autos ao Procurador Geral de Justiça, para que a deliberação seja feita pelo próprio órgão superior do Ministério Público. O Procurador Geral, ao seu turno, poderá acatar as alegações do magistrado e determinará que outro promotor promova a denúncia, estando esse novo promotor obrigado a promover a denúncia. Esse novo promotor não poderá pedir o arquivamento. Afinal, ele atua por delegação (como longa manus) do Procurador Geral. Portanto, se o próprio Procurador Geral quiser promover a denúncia, ele pode. Se, por acaso, o Promotor Geral entender válido o pedido de arquivamento do promotor original, a sua decisão pelo arquivamento, agora, vinculará o magistrado, que deverá obrigatoriamente homologar o pedido de arquivamento. Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador- geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender. Sistemática do pedido de arquivamento se o investigado tiver foro privativo no STJ: Imagine, por exemplo, que um Subprocurador-Geral da República, atuando por delegação do Procurador Geral da República, instaurou procedimento de investigação contra um Governador do Estado (art. 105, I, “a”, da CF/88). Ao final, o membro do MPF concluiu que não havia elementos para oferecer a denúncia e requereu ao STJ o arquivamento do procedimento. O STJ poderá discordar do pedido? NÃO. Se o membro do MPF que atua no STJ requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação que tramitem originariamente perante o STJ, este, mesmo que não concorde com as razões invocadas pelo MP, deverá determinar o arquivamento solicitado. Como o pedido foi feito por um Subprocurador-Geral da República, se o STJ discordar, ele não poderia remeter os autos para análise do Procurador-Geral da República,aplicando, por analogia, o art. 28 do CPP? NÃO. Não existe esta possibilidade de remessa para o PGR. NÃO se aplica o art. 28 do CPP neste caso. Isso porque os membros do MPF que funcionam no STJ atuam por DELEGAÇÃO do Procurador-Geral da República Em suma, não há que se falar em aplicação do art. 28 do CPP nos procedimentos de competência originária do STJ. O MPF pediu o arquivamento, este terá que ser homologado pela Corte (Inq 967/DF). 13º – Espécies de arquivamento a) Arquivamento implícito: ocorre o arquivamento implícito – também denominado de arquivamento tácito – quando o Ministério Público, ao propor a denúncia, deixa de incluir nela algum fato investigado ou algum dos indiciados. Esse arquivamento implícito se consuma quando o juiz não se pronuncia quanto à referida omissão. Também ocorre arquivamento tácito quando o promotor pede expressamente o arquivamento de somente uma parte dos fatos investigados (arquivamento objetivo) ou de somente alguns indiciados (arquivamento subjetivo). A jurisprudência majoritária não aceita o arquivamento tácito, por falta de previsão legal quanto a isso. b) Arquivamento indireto: ocorre quando o MP deixa de oferecer a denúncia por entender que o juízo é incompetente, requerendo, assim, a remessa dos autos ao órgão competente. Caso o magistrado discorde disso, ele poderá invocar o art. 28. Exceção ao princípio do “kompetez-Kompetez”: segundo Marinoni, o princípio do “Kompetenz-Kompetez” estabelece que todo juízo detém competência para examinar a sua própria competência para determina causa. É dizer, todo magistrado possui, em tese, competência para se julgar ou não competente para a causa. O arquivamento indireto, contudo, acaba por se tornar uma exceção a esse princípio. Isso porque, caso o magistrado discorde do MP, afirmando que tem competência para causa, deverá invocar o art. 28 do Código de Processo Penal, enviando o caso ao Procurador Geral. Nessa situação, caso o Procurador Geral entenda que o magistrado, de fato, é incompetente para causa, remeterá os autos a outro magistrado, impedindo o magistado orginário de fazer a “kompetenz-Kopetenz”. Trata-se de situação muito criticada pela doutrina, já que causa a supressão do judiciário. c) Arquivamento originário: se o requerimento de arquivamento já parte do próprio Procurador Geral, nas ações em que atue originariamente, não há como o relator do tribunal invocar o art. 28. O que poderíamos ter, com base no art. 12, XI, da lei nº 8.625/1993 (Lei Nacional do Ministério Público), é a deliberação do Colégio de Procuradores, quando provocados administrativamente, para ver se designam outro membro da instituição, em substituição ao Procurador Geral, para oferecer denúncia ou se mantém o arquivamento. 14º Inviabilidade de mandado de segurança impetrado pela vítima para evitar o arquivamento de inquérito policial Existe alguma providência processual que a vítima possa adotar para evitar o arquivamento do IP? Ela pode, por exemplo, impetrar um mandado de segurança com o objetivo de impedirque isso ocorra? Não. A vítima de crime de ação penal pública não tem direito líquido e certo de impedir o arquivamento do inquérito ou das peças de informação. Isso poque o processo penal rege-se pelo princípio da obrigatoriedade, de forma que a propositura da ação penal pública constitui um dever, e não uma faculdade, não sendo reservado ao “Parquet” um juízo discricionário sobre a conveniência e oportunidade de seu ajuizamento. Por outro lado, não verificando o Ministério Público que haja justa causa para a propositura da ação penal, ele deverá requerer o arquivamento do IP. Cumpre ressaltar ainda que esse pedido de arquivamento feito pelo Ministério Público passará ainda pelo controle do Poder Judiciário, que poderá discordar, remetendo o caso para o PGJ(no caso do MPE) ou para a CCR (se for MPF). Assim, há em nosso ordenamento um sistema de controle de legalidade muito técnico e rigoroso em relação ao arquivamento de inquérito policial, inerente ao próprio sistema acusatório. Nesse sistema, contudo, a vítima não tem o poder de, por si só, impedir o arquivamento. Cumpre salientar, por oportuno, que, se a vítima ou qualquer outra pessoa trouxer novas informações que justifiquem a reabertura do inquérito, pode a autoridade policial proceder a novas investigações, nos termos do citado art. 18 do CPP (STJ - MS 21.081-DF). 15º - Desarquivamento O desarquivamento, conforme ensinamentos de Nestor Távora, é um ato privativo do Ministério Público, sem necessidade de intervenção judicial, quando o promotor estiver convencido da existência de novas provas. Lembre-se de que, mesmo após o arquivamento, a autoridade policial continuará podendo colher novas provas, devendo remetê-las prontamente ao magistrado. Uma vez entregue o inquérito policial ao Ministério Público, e caso o promotor se convença que realmente se trata de novas provas, oferecerá a denuncia, operando-se, assim, o desarquivamento. Bibliografia consultada para elaboração da apostila e indicada para aprofundamento do tema: – Código de Processo Penal para concursos – Fábio Roque e Nestor Távora; – Curso de Processo Penal – Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar; – Dizer o Direito (http://www.dizerodireito.com.br/)