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Direito ao esquecimento 5 pontos sobre a decisão do STJ JOTA Info

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11/4/2018 Direito ao esquecimento: 5 pontos sobre a decisão do STJ - JOTA Info
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STJ
Direito ao esquecimento: 5 pontos sobre a decisão do STJ
Ao inovar em diversas questões, recente decisão gerará um alongado debate sobre seus fundamentos e
efeitos
CARLOS AFFONSO SOUZA
13/05/2018 07:30
Atualizado em 13/05/2018 às 09:29
Pixabay
Este texto integra a cobertura de novos temas pela equipe do JOTA. Apoiadores participam da
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Na última terça-feira, dia 08 de maio, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu
o julgamento do Recurso Especial nº 1.660.168/RJ, sobre direito ao esquecimento.
A Terceira Turma, por maioria, entendeu que provedores de busca na Internet não
podem apresentar como resultado de pesquisa pelo nome da autora da ação
qualquer conteúdo que faça referência à suposta fraude em concurso para a
magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ).
O processo está em segredo de justiça e seu acórdão ainda não foi redigido. Na
sessão de julgamento, o ministro Sanseverino aderiu à divergência aberta
anteriormente pelo voto do ministro Bellizze e seguida pelo ministro Moura Ribeiro.
Restaram vencidos a ministra Nancy Andrighi e Ricardo Cueva.
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O voto decisivo do ministro Sanseverino, que era o último que faltava, ainda não está
disponível. Todavia, com base no áudio da sessão (em que foi feita uma leitura de
seu voto) podemos suscitar alguns questionamentos que serão relevantes para o
futuro desse debate, não só no STJ, mas também nos demais tribunais nacionais.
1. Todo absolvido será esquecido?
A autora da ação, que atualmente é promotora, �gurou em processo apreciado pelo
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no qual se debateu a possibilidade de anulação
de concurso para juiz do TJRJ. Três questões foram analisadas pelo CNJ: (i) a
marcação identi�cadora das provas (cuja perícia não indicou irregularidades); (ii) o
número de parentes aprovados no concurso (que o CNJ entendeu não ser por si só
evidência para anulação do certame); e (iii) o suposto vazamento do gabarito da
prova de Direito Tributário, que teria sido reproduzido na prova da então candidata.
Como a candidata (e Autora da ação) terminou não sendo aprovada no exame oral,
essa acusação �cou “esvaziada”, conforme consta em notícia no site do próprio
CNJ. Levando ainda em consideração que os magistrados aprovados no concurso já
estavam em pleno exercício das funções, o CNJ entendeu, por 7 votos a 4, não
anular o concurso para evitar maior prejuízo.
Essas informações sobre o processo decidido pelo CNJ são importantes para que
se possa conhecer qual foi o embasamento fático que motivou a Autora a pedir a
desindexação de conteúdos em provedores de busca na Internet. Ao proferir seu
voto, o ministro Sanseverino a�rmou que, ainda hoje, ao se procurar pelo nome da
Autora, notícias sobre a decisão do CNJ e as investigações sobre a suposta fraude
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no concurso aparecem como os resultados mais relevantes quando inserido na
chave de pesquisa tão somente o nome da Autora.
“Essas notícias causam dano à honra e à intimidade” – concordou o ministro – e
assim a�rmou que o pedido é “perfeitamente abarcado pelo direito ao
esquecimento”. Em ponto no qual trata de ponderação de interesses, concluiu o
ministro: “Na tensão que se coloca entre o direito fundamental à informação e as
liberdades públicas do cidadão, o primeiro deve ceder”.
Valerá acompanhar como esse precedente será explorado por futuros litigantes que
apelarem ao chamado direito ao esquecimento. Pessoas que vierem a ser
absolvidas de acusações de crimes poderão naturalmente tentar usar essa decisão
para remover os mais diferentes resultados de busca na Internet, o que sem dúvida
será especialmente grave para a tutela da liberdade de expressão e para o acesso à
informação, sobretudo quando os casos envolverem pessoas que exercem cargos
públicos, como no caso dos autos.
Recentemente, o ex-Secretário de Saúde do Governo do Estado do Rio de Janeiro,
Sérgio Cortes, foi absolvido do crime de obstrução de Justiça. Poderia ele então
buscar a desindexação de notícias (verídicas) que relatassem as acusações e
investigações realizadas? O mesmo poderia ser pleiteado pelo ex-Presidente
Fernando Collor, absolvido do crime de peculato?
O ministro Sanseverino alegou que a desindexação era devida para atender a
particularidades do presente caso e porque a “Autora exerce importante função
pública”. Será relevante acompanhar como esse argumento será utilizado em ações
futuras, já que, em verdade, a “importante função pública” desempenhada pelo autor
ou Autora é geralmente um motivo utilizado para se restringir a aplicação do direito
ao esquecimento, realçando o interesse da coletividade em ter acesso à informação
sobre as atividades e o histórico daqueles que exercem cargos públicos.
2. Como implementar? URLs e monitoramento
A jurisprudência consolidada no STJ reconhece a necessidade de que as vítimas de
danos causados na Internet indiquem o endereço especí�co através do qual o
conteúdo ilícito está sendo veiculado. Esse endereço é associado à indicação
precisa das URLs (uniform resource locators).
O Tribunal já a�rmou que “se em algum blog for postada mensagem ofensiva à
honra de alguém, o interessado na responsabilização do autor deverá indicar o URL
das páginas em que se encontram os conteúdos considerados ofensivos. Não
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compete ao provedor de hospedagem de blogs localizar o conteúdo dito ofensivo
por se tratar de questão subjetiva, cabendo ao ofendido individualizar o que lhe
interessa e fornecer o URL. Caso contrário, o provedor não poderá garantir a
�delidade dos dados requeridos pelo ofendido.” (STJ, 3º T., REsp 1.274.971/RS, Rel.
Min. João Otávio de Noronha, julg. 19.03.15)
Sendo assim, conforme concluiu o ministro Cueva em outro julgamento: “A
jurisprudência do STJ, em harmonia com o artigo 19, § 1º, da Lei 12.965/2014
(Marco Civil da Internet), entende necessária a noti�cação judicial ao provedor de
conteúdo ou de hospedagem para retirada de material apontado como infringente,
com a indicação clara e especí�ca da URL.” (STJ. 3º T., REsp 1.568.935 – RJ, Rel.
Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julg. 05.04.16)
O julgamento do REsp nº 1.660.168/RJ destoa desse posicionamento consolidado
ao simplesmente exigir que resultados de busca sejam desindexados, mas sem o
apontamento exato de quais seriam os conteúdos considerados desabonadores.
Ao não se restringir ao universo fechado de certas URLs, a decisão corre o risco de
gerar um dever de monitoramento por parte dos provedores sobre conteúdos que
potencialmente poderiam ser reconhecidos como desabonadores à honra da Autora.
Essa vinculação entre a indicação de URLs e a ausência de um dever geral de
monitoramento é crucial para a dinâmica de cumprimento das decisões judiciais na
rede. Sem esse controle, �ca até mesmo difícil saber quando a decisão foi
�nalmente cumprida, já que o réu passa a deter um dever de supervisão sobre novos
conteúdos.
Esse detalhe não escapou à ministra Nancy Andrighi emdecisão na qual asseverou
que “a necessidade de indicação do localizador URL não é apenas uma garantia aos
provedores de aplicação, como forma de reduzir eventuais questões relacionadas à
liberdade de expressão, mas também é um critério seguro para veri�car o
cumprimento das decisões judiciais que determinar a remoção de conteúdo na
internet. Conferindo precisão às ordens judiciais, torna-se mais difícil ao requerido
escusar-se de seu cumprimento. Em sentido contrário, em hipóteses com ordens
vagas e imprecisas, as discussões sobre a obediência ao Juízo e quanto à aplicação
de multa diária serão arrastadas sem necessidade até os Tribunais superiores. Por
esses motivos, o Marco Civil da Internet elenca, entre os requisitos de validade da
ordem judicial para a retirada de conteúdo infringente, a “identi�cação clara e
especí�ca do conteúdo ”, sob pena de nulidade.” (STJ, 3ª T., REsp. 1.629.255-SP, Rel.
Min. Nancy Andrighi, julg. 22.08.2017)
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O entendimento pela não existência de um dever de monitoramento antecede no
STJ a aprovação do próprio Marco Civil da Internet. Já em 2013, a Terceira Turma
decidiu que: “Não se pode exigir do provedor de compartilhamento de vídeos a
�scalização antecipada de cada novo arquivo postado no site, não apenas pela
impossibilidade técnica e prática de assim proceder, mas sobretudo pelo risco de
tolhimento da liberdade de pensamento. Não se pode, sob o pretexto de di�cultar a
propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na web, reprimir o direito da coletividade
à informação. Sopesados os direitos envolvidos e o risco potencial de violação de
cada um deles, o �el da balança deve pender para a garantia da liberdade de criação,
expressão e informação, assegurada pelo art. 220 da CF/88.” (STJ, 3ª T., REsp
1.403.749 – GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julg. 22.10.2013)
Ao encerrar o julgamento sem exigir a indicação das URLs (e criando assim um
dever de monitoramento para as empresas ré), a Terceira Turma inova com relação
a esses dois entendimentos consolidados. Será importante acompanhar se essa
decisão realmente representará um divisor de águas para a Turma ou se, dadas as
citadas peculiaridades do caso, foi apenas um hiato criado para atender essas
qualidades próprias do caso narrado.
De qualquer forma, a ausência da indicação de endereços especí�cos, como visto,
poderá implicar óbice para o acompanhamento do cumprimento da decisão,
gerando novas controvérsias sobre o caso.
+JOTA: STJ: em 85% dos acórdãos ofensa é o motivo para pedido de remoção de
conteúdo
3. O que vamos �ltrar hoje?
Uma das principais consequências da não indicação de endereços especí�cos é o
encaminhamento do caso para a instalação de �ltros nos provedores de busca na
Internet.
O voto do ministro Bellizze aponta para o fato de que a solução encontrada na
Turma para o caso seria a de evitar que conteúdos desabonadores continuassem a
aparecer nas chaves de pesquisa quando se buscasse tão somente pelo nome da
Autora. Mas como esse resultado seria atingido?
Uma resposta seria a implantação de �ltros nos provedores de busca que
impedissem a apresentação de qualquer conteúdo na Internet que contivesse o
nome da Autora e a expressão “fraude em concurso para juiz”, quando um usuário
buscasse pelo nome da Autora em provedores de pesquisa. Resta evidente, todavia,
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que essa solução está fadada a gerar mais controvérsias do que aquelas que se
procurou resolver.
Primeiro porque podem existir matérias jornalísticas que mencionem o nome da
Autora e não utilizem a expressão “fraude em concurso para juiz” para relatar as
investigações feitas na época. Esses conteúdos continuariam a aparecer mesmo
após o cumprimento da decisão judicial.
Então seria melhor �ltrar por expressões mais genéricas, como, por exemplo,
“fraude” ou “concurso”? Rapidamente se percebe que essa medida vai bloquear na
pesquisa conteúdos que facilmente poderiam ir além daqueles ensejadores do dano
que se procura combater.
Pode-se a�rmar que esse bloqueio só teria efeito caso se procurasse pelo nome da
Autora, podendo os mesmos conteúdos ser acessados caso fossem buscados em
provedores de pesquisa com outras palavras-chave. Então a decisão não está
ordenando o apagamento do resultado como um todo, mas apenas que ele voltasse
como resultado de pesquisa feita em provedor de busca pelo nome próprio da
Autora.
Fica então a dúvida sobre se esse �ltro seria feito pelo nome completo ou se apenas
pelo primeiro nome da Autora. Porque �ltrar apenas pelo primeiro nome e as
expressões “fraude” e “concurso” poderiam fazer desaparecer da busca conteúdos
que nada tivessem a ver com o caso dos autos.
Talvez aqui valha apontar o caminho perigoso que o STJ começaria a trilhar com o
estabelecimento de modelos de �ltragem que criariam um inventário de regras
próprias sobre o que pode e o que não pode ser encontrado na rede usando essa ou
aquela palavra-chave.
Sendo assim, vale esperar para ver como o acórdão do caso vai determinar que seja
feita a desindexação. Esse detalhamento será especialmente determinante para que
se possa entender como as empresas ré deverão atuar para dar cumprimento à
decisão judicial. O risco nada desprezível é gerar uma solução que possa não
agradar à Autora por �ltrar de menos ou, ao contrário, impedir a exibição de
conteúdos legítimos por �ltrar em excesso. Nos dois extremos o propósito da
decisão seria frustrado.
+JOTA: “Direito ao esquecimento não é censura”, diz ministro do STJ Luís Felipe
Salomão
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4. De olho na Europa
As transformações pelas quais atravessa a proteção de dados no Direito europeu
não passaram desapercebidas no julgamento do caso. Na leitura de seu voto, o
ministro Sanseverino menciona o caso Google Spain, decidido pelo Tribunal de
Justiça da União Europeia. A�rmou o Ministro que se tratou de caso em que um
cidadão espanhol não queria ver fatos “inadequados ou irrelevantes” encontrados a
partir de busca por seu nome em provedores de pesquisa. No caso, Mario Costeja,
ao procurar por seu nome em buscadores, encontrava a notícia de execução de um
bem imóvel de sua propriedade para o pagamento de dívidas. A informação
constava em uma edição antiga do jornal La Vanguardia que havia sido digitalizada.
O Tribunal de Justiça da União Europeia reconheceu o direito do cidadão espanhol a
ter o resultado de busca que lhe ofendia desindexado das ferramentas de pesquisa.
Segundo o ministro Sanseverino, o importante caso europeu é “muito semelhante ao
dos autos”.
Nesse particular, vale lembrar que a decisão europeia em nenhum momento fala em
instalação de �ltros por palavras-chave, mas tão somente determina a desindexação
de resultados de busca especí�cos. Segundo decidiu o Tribunal de Justiça da União
Europeia: “[N]a medida em que, no caso em apreço, não parece haver razões
especiais que justi�quem um interesse preponderante do público em ter acesso a
essas informações no âmbito dessa pesquisa, o que, todavia, cabe ao órgão
jurisdicional de reenvio veri�car, a pessoa em causa pode, ao abrigo dos artigos 12.°,
alínea b), e 14.°, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46, exigir a supressão
das referidas ligações dessa lista de resultados.” Portanto, o que a decisão europeia
determinou foi a remoção de links de buscadores (também conhecida como
desindexação).
Um outro ponto dissonanteentre o caso europeu e o presente é o fato de que Mario
Costeja não é um ocupante de cargo público, cujo passado possa interessar à
coletividade. Nos autos do processo decidido pelo STJ está o pedido de uma
integrante do Ministério Público, o que afasta uma inicial semelhança entre os
casos.
De qualquer forma, vai ser cada vez mais importante acompanhar como os tribunais
nacionais interpretarão os precedentes e as transformações legislativas ocorridas
no continente europeu. Nessa direção, o Ministro Sanseverino de forma apropriada
cita a entrada em vigor do novo regulamento europeu sobre proteção de dados. O
tema dos autos é tratado em seu artigo 17.
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JOTA: Uma ex-BBB tem o direito de ser esquecida?
5. Cancelamento ou esquecimento?
Em seu voto, o ministro Sanseverino a�rmou que o direito ao esquecimento possui
base legal no Brasil. Para isso, lembrou que, antes mesmo da aprovação do Marco
Civil da Internet, o STJ já havia admitido o direito ao esquecimento para casos que
envolveram meios de comunicação social, “o que se aplica à Internet”, em situações
em que foram divulgadas informações inverídicas ou ofensivas aos direitos da
personalidade. Citou para tanto o conhecido caso da Chacina da Candelária.
O caso dos autos seria distinto – conforme leitura do voto pelo Ministro – porque a
análise recai sobre a possibilidade de se “obrigar os sites de busca a alterar a
indexação e a remover de seus resultados os links que remetem a páginas com
informações pessoais a respeito de cidadãos que não quiseram ter os seus nomes
associados a atos que eles considerem inadequados, desabonadores ou
descontextualizados ocorridos a vários anos.”
O ministro a�rmou ainda que o Marco Civil da Internet trata da proteção da
intimidade e da vida privada. Entre os dispositivos citados aparece o artigo 7º, X,
que, segundo o ministro, seria uma forma de direito ao esquecimento. A redação do
artigo diz que é direito dos usuários a “exclusão de�nitiva dos dados pessoais que
tiver fornecido a determinada aplicação de internet, a seu requerimento, ao término
da relação entre as partes, ressalvadas as hipóteses de guarda obrigatória de
registros previstas nesta Lei”.
A mencionada norma do Marco Civil reproduz a redação típica do chamado direito
ao cancelamento de dados. A menção ao “término da relação entre as partes” deixa
isso ainda mais claro. No caso dos autos, não existe relação entre a Autora e os
provedores de busca na Internet que, quando do seu término, pudesse ensejar o
apagamento de dados.
O direito ao cancelamento usualmente não gera controvérsias sobre ponderação de
direitos fundamentais. Previsto em diversas leis de dados pessoais, basta ao
consumidor, por exemplo, ao �nal da relação contratual informar que não desejaria
que seus dados permanecessem sendo tratados pela empresa. Existe até mesmo
discussão se esse efeito dependeria de um aviso por parte do titular dos dados
pessoais ou se o cancelamento deveria ser automático.
O risco de se assemelhar cancelamento com esquecimento é justamente a ausência
no exercício do direito ao cancelamento de ponderações envolvendo a liberdade de
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expressão e o acesso à informação, que são típicos dos debates sobre o chamado
direito ao esquecimento. Sendo assim, ao a�rmar que o dispositivo do Marco Civil
da Internet que trata de cancelamento é também uma implementação do direito ao
esquecimento, o STJ desenharia um enquadramento para pedidos de desindexação
ancorados no esquecimento que não teriam qualquer condicionante mais exigente
no texto legal do que a simples requisição do usuário. Esse resultado não levaria em
consideração , por exemplo, questões como o cargo público ocupado pelo
solicitante.
Em recente nota sobre a aprovação de uma futura Lei de Dados Pessoais no Brasil, a
ONG Artigo 19 ressaltou os perigos de se entender os dispositivos típicos de
cancelamento como sendo uma forma de direito ao esquecimento. Segundo o texto
da Artigo 19, é importante “evitar interpretações que possam ensejar reivindicações
do ‘direito ao esquecimento’, como uma possível confusão com relação ao direito de
cancelamento dos dados pessoais.  O ponto central de nossa proposta é que o
projeto de lei não permita a solicitação de exclusão de informações que sejam de
comprovado interesse público. Para isso, é necessário uma ressalva explícita ao
interesse público quando se tratar do cancelamento dos dados pessoais.”
Esses são apenas cinco pontos importantes que merecem um acompanhamento
por todos aqueles que se interessam pelo debate sobre o chamado direito ao
esquecimento e a responsabilidade de provedores de aplicações na Internet. Ao
inovar em diversas questões com relação aos precedentes anteriores da Terceira
Turma, essa recente decisão sem dúvida gerará um alongado debate sobre seus
fundamentos e efeitos.
CARLOS AFFONSO SOUZA – Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da PUC-Rio. Doutor
em Direito Civil pela Uerj. Diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio).
Pesquisador afiliado ao Information Society Project da Faculdade de Direito da Universidade de Yale.
Advogado.

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